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KfW Crop Trust consultancy - promoting use of genetic diversity to enhance climate change resilience in agriculture View project
Conservation and Sustainable Use of Cultivated and Wild Tropical Fruit Diversity: Promoting Sustainable Livelihoods, Food Security and Ecosystem Services in South
and South East Asia (GEF UNEP) View project
All content following this page was uploaded by Walter Simon de Boef on 28 May 2014.
Financiado pelo:
Programa de Capacitação “Estratégias integradas e participativas no manejo e uso
de agrobiodiversidade” (Projeto: NFP/BRA/619), pelo Programa de Financiamen-
to de Educação Superior dos Países Baixos (NFP), da Organização para Coopera-
ção Internacional em Educação Superior dos Países Baixos (NUFFIC), P.O. Box
29777, 2502 LT Den Haag, Países Baixos; www.nuffic.nl/nfp.
Tradução:
Revisão: Jó Saldanha e Renato Deitos
Capa:
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.
Copyright ©
Impresso no Brasil
Outono de 2007
Agradecimentos ............................................................................. 9
Lista de autores ............................................................................ 11
Siglas ............................................................................................ 14
Anexos
Quadros
Ferramenta participativa Linha do tempo,
utilizada no programa de agrobiodiversidade
em Santa Catarina (2005-2006) ............................................. 148
Textos complementares
Ensaios e canteiros de diversidade nos municípios
de Novo Horizonte, São Lourenço e em seis
outros do Oeste catarinense ................................................... 174
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NEABIO
O NEABio é composto por um grupo de professores universitá-
rios, pesquisadores e estudantes, associado aos Programas de Pós-
Graduação em Recursos Genéticos Vegetais e em Agroecossistemas da
Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis. Tem como
proposta de trabalho desenvolver e incentivar ações de pesquisa, de
ensino e de extensão junto a comunidades de agricultores familiares,
na linha temática da conservação, do manejo e do uso da agrobiodiver-
sidade. A partir de ações participativas, o grupo se propõe a promover
a soberania alimentar e o desenvolvimento socioeconômico de comu-
nidades locais com base em quatro princípios:
•Valorização do conhecimento tradicional e científico, dentro
de um contexto integrado de participação;
• Utilização de estratégias de produção baseadas na sustenta-
bilidade dos sistemas agrícolas de produção familiar;
• Utilização de métodos participativos e integrados de pesquisa,
de ensino e de extensão;
• Promoção do manejo e uso do germoplasma local como es-
tratégia de conservação da agrobiodiversidade.
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EDITORES
Walter Simon de Boef
Coordenador do Programa de Capacitação no Brasil
Wageningen International, Universidade e Centro de Pesquisa de
Wageningen
NEABio, Universidade Federal de Santa Catarina
Wageningen, Holanda/Florianópolis
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CONTEXTO HISTÓRICO
Santa Catarina é um estado relativamente “jovem”, tomando-se
como referência o desenvolvimento agrário moderno e o uso de tecno-
logias e insumos, como fertilizantes sintéticos, agrotóxicos e meca-
nização. No início do século XX, grande parte do seu território era
coberta por uma densa floresta atlântica, com poucos indígenas da
tribo Guarani. Cerca de duzentos mil habitantes praticavam uma
forma semipermanente de agricultura itinerante. A “colonização” de
grandes porções do meio rural aconteceu na metade do século XX, por
meio da derrubada de florestas virgens e da expulsão dos povos indí-
genas. Foi uma continuação do processo de desmatamento e de colo-
nização que imigrantes de origem portuguesa e açoriana haviam
começado, ao longo da costa, desde o final do século XVIII até o
século XIX. Também imigrantes de origem alemã, italiana, polone-
sa e austríaca ocuparam terras no vasto interior de Santa Catarina, que
foram divididas em lotes viáveis para produção familiar. As famílias
agricultoras européias trouxeram consigo seus hábitos e começaram
a praticar um tipo de agricultura “tradicional”, caracterizada pela
diversificação na produção de plantas cultivadas e de animais, prin-
cipalmente para subsistência. Conhecimentos e práticas indígenas,
espécies nativas tropicais e subtropicais, variedades agrícolas e raças
animais e conhecimento de sistemas de cultivo mesclaram-se a um
sistema de produção rural “europeu” de agricultura permanente.
A partir da década de 60, a introdução de culturas comerciais
(principalmente tabaco) e a criação industrial de animais (sobretudo
suínos e aves domésticas) apressaram o processo, resultando numa
“modernização parcial” da agricultura. Essa transformação foi estimu-
lada pelo governo militar brasileiro da época, que pretendia acelerar o
progresso e a economia do país por meio da industrialização da agri-
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NEABIO E ANCHIETA
As atividades em Anchieta chamaram a atenção do NEABio,
que decidiu estabelecer uma parceria informal com grupos de agri-
cultores e organizações desse município. Desde 2002, o NEABio e
seus parceiros investigam e apóiam os agricultores no manejo, na
conservação e no uso das variedades locais de milho crioulo. O po-
tencial de produção e os valores nutricionais e medicinais dessas
variedades foram analisados e iniciou-se um plano participativo de
desenvolvimento de sementes para melhorar geneticamente uma
das variedades de milho, de grande potencial agronômico. A par-
ceria resultou em três dissertações de mestrado a respeito do milho
crioulo em Anchieta e três projetos, em curso, de pesquisa de dou-
torado.4,5
O governo brasileiro, no período 2003-2006, pretendeu for-
talecer a posição da “agricultura familiar”, enfatizando a impor-
tância do setor para o desenvolvimento rural e para a economia
doméstica, complementares ao setor de produção em larga esca-
la, altamente industrializado e orientado para a exportação. Uma
vez que a pesquisa e a educação formais anteriores provaram-se
inadequadas para apoiar o agricultor familiar, abordagens parti-
cipativas envolvendo multiatores no desenvolvimento de pesquisa
e de tecnologia emergem como instrumentos para atingir os atuais
objetivos do governo. Como o NEABio visa a trabalhar nessa pers-
pectiva com os parceiros de Anchieta e de outros municípios do
Oeste de Santa Catarina, recebe apoio de agências federais para
continuar a desenvolver trabalhos dessa natureza no estado.
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RESULTADOS PRELIMINARES
Os participantes possuíam históricos variados. De um total de
mais de cem pessoas envolvidas nos diferentes estágios do progra-
ma, sessenta eram originárias do Oeste de Santa Catarina e da re-
gião das encostas. Cerca de 60% dos participantes eram agricultores
familiares em posição de liderança ou representantes de jovens pro-
dutores. Eles faziam parte de programas de treinamento em agricul-
tura, de associações de produtores ou de outras organizações que
apóiam os agricultores familiares a se manterem no meio rural e na
agricultura. Esse grupo de participantes formou o núcleo das equipes
e do programa de treinamento. Um segundo grupo (20%) de partici-
pantes era constituído por estudantes universitários e profissionais en-
volvidos com formação, pesquisa ou extensão agrícola nas universi-
dades. Um terceiro grupo (20%) era composto, em sua maioria, de
jovens profissionais de ONGs, extensionistas municipais e professo-
res de ensino médio compromissados com o desenvolvimento rural.
Representantes da sociedade civil lideraram e elaboraram a forma de
trabalhar das equipes. Os profissionais de educação pública, de
pesquisa e de extensão agrária, mesmo fazendo parte do grupo-alvo e
interessados em participar do treinamento, não conseguiram assumir
compromisso com o grupo durante os processos de aprendizagem e
de ação, delineados durante o curso sob orientação dos facilitadores.
A abordagem integrada e participativa que se seguiu foi resul-
tado de uma seleção de equipes locais constituídas por membros da
sociedade civil e do setor público (ONGs, governos municipais e
lideranças locais de agricultores). A estruturação de equipes em agro-
biodiversidade, em nove municípios, é o produto mais perceptível
do processo de treinamento.10
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CONSIDERAÇÕES CONCEITUAIS
O programa de treinamento passou por uma evolução gradual,
estimulado pela sua própria estrutura de aprendizagem e ação. Du-
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BIODIVERSIDADE
Riquezas vivas estão sendo perdidas em nosso planeta, espe-
cialmente nas últimas décadas. As conseqüências dessas perdas nem
sempre são visíveis, e este é considerado um dos dilemas a ser en-
frentado no futuro. Quando se observa sob a perspectiva da história
da Terra vê-se que essa diversidade desenvolveu-se num período
recente. Em particular, na agricultura, a diversidade também tem
sido moldada pela forma de viver dos seres humanos, que vêm usan-
do e desenvolvendo os recursos biológicos disponíveis. Nesses pro-
cessos naturais e humanos, a biodiversidade tem apresentado ga-
nhos e perdas contínuos. Entretanto, percebe-se que, nas últimas
décadas, esse equilíbrio tornou-se negativo.
Biodiversidade ou diversidade biológica refere-se à variedade
de formas de vida, à diversidade genética e às comunidades que
essas formas de vida formam. Podem ser distintos sistemas biológi-
cos, como florestas, savanas, campos, desertos, lagos, etc. Eles são a
soma e o produto dos diferentes níveis de diversidade na natureza.
Basicamente, distinguem-se três níveis:
• Diversidade genética;
• Diversidade de ecossistemas;
• Diversidade de espécies.
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BIODIVERSIDADE NA AGRICULTURA
Os termos em biodiversidade foram desenvolvidos no campo
da ecologia, disciplina que estuda as relações entre diferentes níveis
de diversidade. Os três níveis – referidos anteriormente – também
podem ser usados, de forma semelhante, para descrever a diversida-
de biológica na agricultura, ou seja, a agrobiodiversidade:
• Diversidade de sistemas de produção ou de agroecossistemas;
• Diversidade de plantas cultivadas, de animais e de outras es-
pécies;
• Diversidade varietal e outras diversidades genéticas.
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PERDA DE BIODIVERSIDADE
A degradação dos ecossistemas naturais em todo o mundo, so-
bretudo nas regiões tropicais, está bem documentada. Sabe-se que
florestas tropicais de planície, como a Floresta Atlântica, em Santa
Catarina, até pouco tempo eram áreas naturais tropicais menos per-
turbadas. E que as florestas da Amazônia contêm mais da metade das
espécies totais da Terra. Elas conseguiram chegar aos dias de hoje
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ESTRATÉGIAS DE CONSERVAÇÃO
Conservação biológica pode ser definida como o esforço para
manter a diversidade de organismos vivos, seus habitats e a inter-
relação entre os organismos e seu ambiente.3 Essa definição enfatiza
que conservação não se refere apenas a um indivíduo de espécies de
plantas e animais, mas também inclui todos os aspectos de biodiver-
sidade que formam os ecossistemas. As práticas atuais de conserva-
ção diferem de uma abordagem de biodiversidade do ecossistema e
da perspectiva genética. Na conservação da natureza, o interesse
maior é no habitat e no ecossistema, enquanto para a biodiversidade
agrícola o foco principal está em conservar a diversidade genética.
Pouco se avançou no desenvolvimento de um sistema global para a
conservação genética que aborde a biodiversidade nos três níveis e,
no caso de agrobiodiversidade, inclua o componente humano.
A conservação de recursos genéticos tem sido abordada com
duas estratégias que parecem se complementar: a conservação ex
situ, que significa a conservação dos componentes da diversidade
biológica fora do seu habitat natural; e a conservação in situ, que
significa a conservação de ecossistemas e habitats naturais, man-
tendo e recuperando populações viáveis de espécies nos seus pró-
prios ambientes e, no caso de espécies domesticadas e cultivadas,
nos ambientes onde elas desenvolveram as propriedades que as di-
ferenciam.4
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CONSERVAÇÃO IN SITU
Conservação in situ, conforme já mencionado, visa a deixar
espécies no seu habitat natural, permitindo adaptação e evolução
contínuas. Essa estratégia é uma adaptação daquela usada em con-
servação da natureza. Esses conceitos são aplicados em conserva-
ção de agrobiodiversidade, particularmente para conservar espécies
semi-silvestres ou parentes silvestres de espécies cultivadas. Teori-
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Hans Schiere
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FUNÇÃO RAZÃO
Redução de riscos No caso de incidência de doenças, algumas
espécies de animais podem ser menos
suscetíveis do que outras. E quando
os cultivos não completam seu ciclo,
podem ser usados como forragem.
Uso de espécies Ovelhas sobrevivem de espécies vegetais
adaptadas diferentes daquelas usadas por vacas ou
porcos; algumas raças bovinas para carne,
mais rústicas, podem resistir a condições mais
difíceis do que raças leiteiras.
Dinâmica de fluxo É comum observar famílias pobres que
de dinheiro iniciam com poucas galinhas, para poupança,
até terem capital suficiente para comprar
cabras e ovelhas e finalmente adquirirem
cabeças de gado.
Tradição e emoção A maioria dos animais pode ser usada para
conservar e/ou estimular valores emocionais
e culturais, não importa se são galinhas ou
coelhos de estimação cuidados pelas crianças
(valor emocional ou educativo), ou animais
maiores como vacas, touros ou cavalos.
Melhor uso de recursos Coelhos e galinhas comem as sobras da
cozinha e da horta; porcos alimentam-se de
sobras de tubérculos, de grãos ou soro de
leite. Cabras e vacas usam restos dos
cultivos, e animais de baixa produtividade
podem usar as sobras dos animais mais
produtivos que recebem o melhor alimento
da unidade de produção.
Dinâmica do sistema Animais que comem biomassa disponibilizam
e reciclagem de nutrientes para os cultivos mais rapidamente
nutrientes do que quando a biomassa é deixada para
compostar ou para decompor a campo.
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1. Qualset, C.O., et al. Locally based crop plant conservation. In: Maxted, N., Ford-
Lloyd, B.V., Hawkes, J.G. (eds). Plant genetic conservation. The in situ approach.
Londres: Chapman & Hall, pp. 160-175, 1997.
2. Opole, M. Revalidating women’s knowledge on indigenous vegetables:
Implications for policy. In: De Boef, W.S., et al. (eds). Cultivating knowledge, genetic
diversity, farmer experimentation and crop research. Londres: Intermediate Tech-
nology Publications Ltd., pp. 157-164, 1993.
3. Spellerberg, I.F.; Hardes, S.R. Biological conservation. Cambridge: Cambridge
University Press, 1992.
4. Definições de acordo com a Convenção da Diversidade Biológica; UNEP, 1992.
5. Berg, T., et al. Technology options and the gene struggle. NORAGRIC Occasional
Papers Series C. Ås: Norwegian Centre of International Agricultural Development,
Agricultural University of Norway, 1991.
6. Ertug Firat, A.; Tan, A. In situ conservation of genetic diversity in Turkey. In:
Maxted, N., Ford-Lloyd, B.V., Hawkes, J.G. (eds). Plant genetic conservation. The
in situ approach. Londres: Chapman & Hall, pp. 254-262, 1997.
7. Worede, M.; Tesemma, T.; Feyissa, R. Keeping diversity alive: an Ethiopian
perspective. In: Brush, S.B. (ed). Genes in the field. On-farm conservation of crop
diversity. Boca Raton FL: Lewis, pp. 143-163, 1999.
8. Hardon, J.; De Boef, W.S. Linking farmers and plant breeders in local crop
development. In: De Boef, W.S., et al. (eds). Cultivating Knowledge, genetic diversity,
farmer experimentation and crop research. Londres: Intermediate Technology
Publications Ltd., pp. 64-71, 1993.
9. Almekinders, C.J.M.; De Boef, W.S. (eds). Encouraging diversity. Conservation
and development of plant genetic resources. Londres: Intermediate Technology
Publications, 2000.
10. Agricultores nodais são aqueles que, numa comunidade, possuem os maiores conhe-
cimentos e interesse sobre a diversidade, a produção e a seleção de sementes, a ecolo-
gia da produção e os usos de diferentes cultivares. Apresentam características de pesqui-
sadores e querem compartilhar conhecimentos e materiais com os outros agricultores.
11. Fonte original: Almekinders C.J.M.; De Boef, W.S. The challenge of collaboration
in managing crop genetic diversity. ILEIA Newsletter 15 (3/4): pp.5-7, 1999.
Traduzido e modificado por Canci, I.J. Relações do conhecimento formal e informal
no manejo da agrobiodiversidade no Oeste de Santa Catarina. Florianópolis-SC:
Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal de Santa Catarina (Dissertação de
Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Recursos Genéticos Vegetais), 2006.
12. Almekinders, C.J.M.; Louwaars, N.P. Farmers’ seed production. New
approaches and practices. Londres: Intermediate Technology Publications, 1999.
13. Ogliari, J.B., et al. Análise Genética da Diversidade de Variedades Locais de
Milho (Zea mays L.). Relatório Final de Pesquisa do CNPq. Florianópolis-SC:
NEABio, p. 18, 2004.
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SISTEMAS DE CONHECIMENTO
A abordagem participativa distingue dois tipos de sistemas de
conhecimento: os sistemas tradicionais (ou locais) e os científicos.
É possível fazer um paralelo entre eles e os sistemas formal e infor-
mal de melhoramento de plantas (Capítulo 2.5). O ponto de contato
convencional entre os dois sistemas é a transferência da tecnologia,
usando fluxo linear de informação; no caso, tecnologias de melho-
ramento genético e germoplasma. Por sua vez, o melhoramento ge-
nético participativo objetiva conectar o sistema local com o científi-
co. A Tabela 3.1.1 mostra uma caracterização dos dois sistemas,
acrescida do DPT (desenvolvimento participativo de tecnologia). O
DPT é uma abordagem que une ambos os sistemas, ou seja, é uma
maneira alternativa de desenvolver a tecnologia.
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TIPOLOGIAS DE PARTICIPAÇÃO
A aproximação entre pesquisadores e agricultores pode ser
analisada por meio das várias formas de participação nas relações
entre pessoas, a exemplo dss sete apresentadss na Tabela 3.1.2. Essa
tipologia é útil para compreender as interações entre agricultores e
técnicos no melhoramento participativo dos cultivos.
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Basicamente, a SPV:
• Fornece opções de variedade para agricultores, sob condi-
ções específicas de ambiente;
• Promove testes com abordagem participativa;
• Seleciona e dissemina variedades preferenciais.
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HISTÓRICO
Nas duas últimas décadas, a conservação nas unidades de pro-
dução familiares e o manejo dos recursos genéticos, particular-
mente o melhoramento genético participativo (MGP), tornaram-se
conhecidos como uma abordagem singular para a conservação da
diversidade dos cultivos locais pelos agricultores familiares. De-
senvolvida para superar as limitações e as deficiências nos siste-
mas de melhoramento genético conduzidos pelo setor formal, esta
abordagem busca desenvolver as variedades que melhor se adaptam
às condições ambientais locais e de manejo, atenta às diversas ca-
racterísticas que os agricultores e os consumidores valorizam em
suas localidades específicas. Por princípio, um dos genitores local-
mente adaptados é utilizado para hibridação, visto que permite reter
alguns alelos úteis do complexo gênico. O MGP é uma resposta a
vários impactos negativos que ocorreram no sistema de produção
agrícola dos últimos cinqüenta anos, principalmente a forte erosão
genética (causada por mudanças nos sistemas de produção, no uso
da terra e na comercialização); a erosão do conhecimento e da cultu-
ra dos agricultores para lidar com os novos estresses bióticos (pra-
gas e doenças) e abióticos (corrente de ar, frio, calor); e a baixa taxa
de adoção de variedades do setor formal por agricultores localiza-
dos em áreas específicas e difíceis decorrente da pouca ênfase em
valores culturais e de uso.
O melhoramento participativo de cultivos (MPC), termo “guar-
da-chuva” mencionado no Capítulo 3.2, envolve uma gama de abor-
dagens diferentes, desde iniciativas lideradas por pesquisadores até
outras, lideradas pelos agricultores. O projeto in situ do Bioversity
Internacional27 focalizou no desenvolvimento do MPC em um am-
biente de liderança dos agricultores no qual eles decidiram os obje-
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METODOLOGIA
As atividades do MPC, no projeto de conservação in situ, foram
iniciadas com as seguintes perguntas da pesquisa, a serem respondidas:
• As variedades dos agricultores podem ser conservadas in situ?
• O MPC pode contribuir para a intensificação e a conservação
da diversidade de variedades locais nas unidades de produção fami-
liares e para o fornecimento de benefícios à comunidade?
• O MPC pode ser alcançado sem a perda de diversidade gené-
tica?
Os passos do MPC são habituais ao melhoramento de plantas
convencional; entretanto, a metodologia e as abordagens para o es-
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Resgate
Avaliação considera aspectos sociais
culturais e antropológicos
Caracterização
Criação
Melhoramento participativo
Conservação e produção
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A METODOLOGIA
Denomina-se Sistema de avaliação rápida da qualidade do
solo e da sanidade dos cultivos42 a metodologia que permite aos
agricultores medidas relativas de sustentabilidade mediante a com-
paração ao longo do tempo, num mesmo agroecossistema, ou me-
diante a comparação de dois ou mais agroecossistemas que estão
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Conclusão
Esta é uma atividade dinâmica e participativa que permite a
troca de conhecimentos e de percepções. Contudo, a metodologia
empregada ainda é uma ferramenta bastante preliminar, necessitan-
do ser desenvolvida e ajustada. Os agricultores tomam conhecimen-
to dos processos sinérgicos e das interações existentes entre os indi-
cadores determinados, percebendo que o bom funcionamento de uma
determinada área de produção acarreta no bom funcionamento de
outras e que esses sinergismos e interações são responsáveis pelo
bom desempenho do sistema de uma maneira geral. Após a reali-
zação da prática, deve haver uma discussão entre agricultores e
técnicos sobre os problemas mais críticos, que merecem atenção, e
também sobre as possíveis intervenções necessárias para superar
as limitações apontadas pelos indicadores e pelo diagnóstico. A
metodologia apresentada é um passo na direção de permitir que os
próprios agricultores possam observar seus sistemas de forma rá-
pida e tomem decisões direcionadas à melhoria dos atributos que
estão insatisfatórios, melhorando as funções do agroecossistema
como um todo. Permite também que eles percebam e concluam
sobre o nível de sustentabilidade da unidade produtiva, sua evolu-
ção no tempo e a comparação entre unidades produtivas sob dife-
rentes sistemas de manejo, identificando quais os mais saudáveis e
a razão de funcionarem melhor.
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AS FERRAMENTAS DO DRP
Muitas vezes, a metodologia DRP refere-se a um conjunto de
métodos participativos como uma “caixa de ferramentas”. Os méto-
dos podem ser utilizados por pessoas com distintos níveis de expe-
riência. Porém, a eficácia e a pertinência da aplicação das várias
ferramentas diferem conforme a experiência e o grau de “saber fa-
zer” de quem as aplica.
Há cinco aspectos importantes a serem considerados no uso
eficaz das ferramentas:
1. Criatividade: Elas devem ser usadas de maneira criativa,
ajustando-as à situação particular do processo. Uma improvisação
inspirada nas condições locais pode apresentar melhores resultados
do que uma aplicação cega e rígida de regras preconcebidas.
2. Interação: Para que os participantes do DRP compreendam
e consigam comunicar melhor as suas idéias, percepções e preocu-
pações, é preciso estimular a interação, de forma que cada um se
sinta envolvido e motivado para se expressar.
3. Repetição: Várias ferramentas podem ser utilizadas para ob-
ter informações sobre um mesmo tema ou tópico de pesquisa. Os va-
riados métodos facilitam às pessoas se expressarem de distintas ma-
neiras, contribuindo com mais informações a respeito de um mesmo
assunto ou de aspectos que eles consideram estar relacionados.
4. Informalidade: É fundamental estabelecer um ambiente in-
formal de colaboração, evitando (ou reduzindo) projeções e expec-
tativas habitualmente provocadas pelo modelo clássico de especia-
listas que “sabem” e grupos-alvo de ações que “não sabem nada”.
5. No local: Visitar as pessoas em suas comunidades, ou acom-
panhá-las aos locais que apresentam um interesse específico para
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FERRAMENTAS PARTICIPATIVAS
Os seguintes grupos de ferramentas participativas estão dispo-
níveis:
• Mapas;
• História e tempo;
• Tabelas ou matrizes para a caracterização;
• Aspectos sociais e institucionais;
• Aspectos específicos da agrobiodiversidade.
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HISTÓRICO
Em nível mundial, o conjunto da biodiversidade agrícola está
sob os cuidados e manejo das comunidades rurais. Com o objeti-
vo de manter e aumentar o valor da biodiversidade agrícola como
um recurso para os povos rurais pobres e para a humanidade como
um todo, as comunidades e as instituições precisam ser apoiadas,
fortalecidas e auxiliadas a acessar e manejar a sua biodiversida-
de agrícola para contribuir no seu sustento. As comunidades ru-
rais que dependem de biodiversidade também precisam colaborar
com outras agências, receber novos conhecimentos e materiais de
outras instituições parceiras e de comunidades envolvidas no ma-
nejo da agrobiodiversidade. O objetivo de tal processo é assegu-
rar que as comunidades tenham a capacidade de manejar a sua
biodiversidade agrícola, uma vez que elas dependem e continuam
influenciando na formação e na adaptação da diversidade parti-
cular para satisfazer as suas necessidades, conforme os distintos
ambientes.
A falta de poder sobre os próprios recursos é a pior forma de
pobreza. Isso nega o acesso às informações e recursos para a sua
sobrevivência. A pesquisa formal e os programas de desenvolvimento
costumam falhar quando não envolvem os agricultores e/ou não for-
talecem a capacidade das comunidades locais para o manejo dos
seus recursos de biodiversidade. A pouca capacidade dos agriculto-
res e das comunidades para tomar decisões em assuntos relaciona-
dos ao manejo e à conservação da biodiversidade agrícola e para
implementar decisões são problemas que freqüentemente impedem
os esforços organizados dos agricultores para acessar conhecimento,
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METODOLOGIA
O empoderamento da comunidade é a estratégia fundamental
da abordagem de manejo comunitário de biodiversidade. Dentro
desse contexto, empoderamento da comunidade significa dar supor-
te a processos de tomada de decisão e ao controle dos recursos da
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i. Cada membro deve trocar duas variedades locais por ano, no mínimo.
ii. Cada membro deve participar do programa de crédito grupal.
iii. Cada membro deve usar adubo orgânico e um mínimo de agrotóxicos,
para conservar a biodiversidade associada e os polinizadores.
iv. A comunidade deve ter um registro comunitário de biodiversidade para
identificar fontes de sementes, conhecimento tradicional associado, documenta-
ção e troca de experiências.
v.Os membros da comunidade com menos recursos e as mulheres têm prio-
ridade para implementar o plano de execução do manejo comunitário de biodiver-
sidade.
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METODOLOGIA
As instituições locais (grupos de mulheres; organizações co-
munitárias de base; organizações de povos indígenas; grupos de
agricultores; clubes; escolas, etc.) organizam a feira da diversi-
dade com a ajuda técnica de pesquisadores e profissionais de de-
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Quadro 4.3.1
A Festa do Milho Crioulo em Anchieta
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Quadro 4.3.2
Ensaios e canteiros de diversidade nos municipios de Novo Horizonte,
São Lourenço e seis outros do Oeste catarinense
Ensaios de diversidade
As mesmas variedades foram testadas em dois ensaios, com quatro
reaplicações. Um deles foi implantado em uma estação experimental do Centro
de Pesquisa para a Agricultura Familiar (CEPAF), da Epagri, em Chapecó, e
outro, no estabelecimento da família de um jovem agricultor, membro da equipe
de agrobiodiversidade no município de Novo Horizonte. As unidades foram
implantadas, avaliadas e colhidas pelas equipes de agrobiodiversidade locais e
pelos próprios membros da comunidade. O ensaio na unidade de produção fa-
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Canteiros de diversidade
Como os estabelecimentos rurais dos agricultores participantes do projeto
distavam bastante entre si, decidiu-se implantar dois canteiros de diversidade nos
municípios de Novo Horizonte e São Lourenço e mais sete nos outros municípios
que participaram do programa. Esses canteiros serviram para que os agricultores
das redondezas tivessem acesso ao conhecimento das diferentes variedades de
milho que estavam sendo cultivadas no ensaio e observassem o comportamento
das características qualitativas.
Resultados alcançados
Os ensaios e os canteiros de diversidade do milho foram importantes para
dar início a um processo de aumento da diversidade genética do milho nesses
municípios. As ações devem ser ampliadas, visando a agregar valor ao produto,
como uma estratégia eficiente de incentivar a manutenção da diversidade de espé-
cies e de variedades. Além de estimular o cultivo de variedades locais e crioulas,
a unidade de demonstração de milho também poderá servir de referência para que
trabalhos similares com outras espécies sejam desenvolvidos, incrementando a
diversidade genética no decorrer do tempo.
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ESTRUTURA CONCEITUAL
O registro da biodiversidade comunitária é um método partici-
pativo desenvolvido pela equipe internacional do projeto in situ do
Bioversity International,7 voltado para uma gama de objetivos:
• A proteção do conhecimento tradicional e dos materiais ge-
néticos contra a biopirataria.
• A promoção da bioprospecção.
• O monitoramento da erosão genética.
• A preparação das unidades de produção familiares para o
desenvolvimento de ações de conservação.
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METODOLOGIA
O método foi usado por diversos tipos de instituições para dife-
rentes propósitos e, conseqüentemente, as metodologias para registro
da biodiversidade comunitária evoluíram em diferentes variações. Mais
recentemente, o método tem sido discutido, proposto e configurado
de forma diferente em distintas instituições, por diversas razões.
Dois tipos distintos de tipologia estão emergindo: o primeiro
consiste na listagem da biodiversidade economicamente valiosa para
a comunidade, assistida por um grupo de profissionais do governo ou
universitários; no segundo, ocorre o fortalecimento da comunidade
local para documentar recursos genéticos importantes e conhecimen-
to tradicional associado. A Figura 4.4.1 ilustra uma metodologia de
registro da biodiversidade comunitária que combina os objetivos do
registro, assegurando o controle do conhecimento e da informação
para a comunidade local e o governo.
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LIÇÕES APRENDIDAS
A lição mais importante originada nesse processo (e no desen-
volvimento da metodologia do projeto, no Nepal) é que os agriculto-
res notaram que um grande número de variedades locais é conservado
em poucas unidades de produção familiares, sendo, assim, altamente
vulneráveis à erosão genética e a perdas eventuais. Essa percepção
encorajou diversas famílias a se estruturarem para formar uma asso-
ciação de agricultores dentro de um dos municípios onde o projeto
de conservação trabalhou. A associação estabeleceu um banco co-
munitário de sementes, com recursos financeiros do governo local e
com apoio internacional, para armazenar sementes de variedades
locais raras de arroz, de legumes e de outras espécies cultivadas. O
propósito do banco comunitário de sementes é manter o registro da
biodiversidade comunitária, multiplicar as sementes tradicionais lo-
cais para aumentar o acesso e manter pequena quantidade delas em
armazenagem de curto prazo.15 A associação, mais adiante, criou o
comitê de manejo comunitário da biodiversidade para administrar o
banco comunitário de sementes, estabelecendo procedimentos para
a coleta e a distribuição de sementes. Mais recentemente, o comitê
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Flávia Londres
Nas últimas duas safras, agricultores familiares que tomaram crédito junto
ao Pronaf17 e que conduziram suas lavouras com sementes crioulas e perderam
suas colheitas, principalmente por problemas de estiagem, tiveram extrema difi-
culdade em acessar o seguro agrícola. As regras do seguro exigem que as semen-
tes utilizadas estejam no Zoneamento Agrícola de Risco Climático do MAPA
(Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), mas as variedades criou-
las não são registradas no Registro Nacional de Cultivares (RNC)18 e, conseqüen-
temente, estão fora do Zoneamento.
Nos últimos anos o Proagro acabou sendo pago por medidas excepcionais.
No entanto, o CMN – Conselho Monetário Nacional (o Proagro é vinculado ao
Banco Central) – tem insistido que seja pleiteado o cadastramento das variedades
crioulas no RNC, assim como sua inclusão no Zoneamento Agrícola, para que o
seguro possa ser acessado nas próximas safras.
Técnicos do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), do MAPA (li-
gados ao RNC e ao Zoneamento Agrícola) e o Grupo de Trabalho sobre Biodiver-
sidade da ANA (Articulação Nacional de Agroecologia) tentaram encontrar uma
fórmula para enquadrar as sementes crioulas no RNC e, posteriormente, incluí-las
no Zoneamento. Mas por diversas razões, de ordem técnica e política, essas nego-
ciações não avançaram e, atualmente, a viabilidade e a pertinência dessa proposta
são seriamente questionadas pelas organizações da agricultura familiar.
Questões técnicas: (i) as cultivares crioulas não se enquadram nos critérios a
serem preenchidos, em formulário, para a caracterização de cultivares no RNC.
Os critérios são altamente variáveis nas sementes crioulas, em oposição ao que
ocorre nas convencionais; (ii) em se considerando possível preencher esses cam-
pos do formulário, essas informações não estão facilmente disponíveis, tendo em
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JUSTIFICATIVA
Entender a quantidade e a distribuição da diversidade de cul-
tivos locais em nível de comunidade é uma informação básica ne-
cessária para o manejo da agrobiodiversidade pelos agricultores.
São escassas as metodologias participativas adequadas que aju-
dam os pesquisadores e os agricultores a entenderem os padrões
de distribuição da diversidade de cultivos agrícolas locais e as ra-
zões para tal distribuição. Antes de implementar uma estratégia
de conservação para cultivos agrícolas, espécies ou variedades, é
importante entender os potenciais riscos atuais e as potenciais
ameaças das espécies ou variedades. O nível de risco para a per-
da de diversidade genética pode ser avaliado por meio da análise
da área ocupada pelas plantas e pelo número de famílias de agri-
cultores que as mantêm. As razões que determinam o tamanho da
área plantada e o número de famílias que cultivam determinadas
espécies ou variedade são valiosas para formular um plano de con-
servação orientado para uma espécie ou variedade, em uma de-
terminada comunidade.
CONCEITO
O método de análise participativa quatro-células (APQC) de-
senvolvido pela equipe do projeto in situ,7 no Nepal, busca determi-
nar as razões e o risco da perda de diversidade genética de algumas
espécies ou variedades. O método para caracterizar a quantidade e a
distribuição foi desenvolvido no Nepal baseado na área média e no
número de famílias que plantam cada cultivo.19, 20 A APQC pode ser
usada de diferentes modos para entender a quantidade e a distribui-
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APLICAÇÃO E METODOLOGIA
Os objetivos dos métodos de APQC são:
• Identificar variedades: de espécies cultivadas raras, de carac-
terísticas únicas e de características comuns.
• Documentar as razões por que as espécies cultivadas/varie-
dades são encontradas em um estado dinâmico na comunidade.
• Identificar o nível e as intervenções necessárias para a con-
servação de espécies cultivadas/variedades em uma determinada co-
munidade.
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Grandes áreas
A B
Muitas Poucas
famílias famílias
C D
Pequenas áreas
SEQÜÊNCIA DE PROCEDIMENTOS
Etapa 1: Elaboração de uma lista das variedades (locais e mo-
dernas) dos agricultores, do cultivo selecionado, por meio de:
• Realizar uma caminhada rápida por uma comunidade, em
transecto, para observação direta de informantes fundamentais (ho-
mens/mulheres), antes do grupo-foco de discussão.
• Inventariar os cultivos/variedades, listando todas as varieda-
des locais, e validar sua disponibilidade pela coleta de amostras.
• Listar as variedades obtidas durante a caminhada, a qual será
revisada no grupo-foco de discussão, pedindo-se aos participantes
que adicionem as variedades não-citadas.
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HISTÓRICO
As comunidades de agricultores mantêm números relativamente
grandes de variedades locais e tradicionais que contribuem com os
modos de vida em unidades de produção com menos recursos. Essas
variedades locais possuem quantidades significantes de variação
genética. Sistemas informais desempenham um papel central no for-
necimento de materiais para plantios (sementes, mudas, etc.). Parti-
cularmente, esse é o caso do Nepal, na Ásia, onde menos de 3% das
sementes de arroz (o cultivo principal do país) foram comprados do
setor formal em 1999-2000. Os agricultores familiares não apenas
manejam os plantios, mas também são os responsáveis pela manu-
tenção dos processos dinâmicos da diversidade de cultivos nas uni-
dades de produção. As redes de sementes de agricultores familiares
são um dos componentes principais do sistema informal, por meio
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METODOLOGIA
A fonte mais comum para obter dados sobre uma rede é uma
pesquisa sociométrica que consegue dados relacionais entre indivídu-
os em um sistema social. Diferentes técnicas de amostragem podem
ser usadas, tais como o mapa da comunidade (sem amostragem), a
amostragem representativa com a comunidade ou a amostragem de
bola de neve. Esta última é a mais comum. Nesse método, os entrevis-
tados são solicitados a indicar o nome de indivíduos das suas redes
sociais. Esse tipo de informação pode ser obtido no grupo-foco de
discussão, pedindo-se aos membros do grupo que listem os nomes de
agricultores localmente ativos e reconhecidos por seu conhecimento.
O propósito desse exercício deve ser definido no início do
mesmo. As seguintes etapas do processo podem ser usadas para en-
tender o contexto social de um sistema sadio de sementes:
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IMPACTOS
Beneficiando a conservação: A importância das redes sociais
e das trocas na manutenção de variedade em comunidades de agri-
cultores familiares ou tradicionais, combinada com o fato de a maioria
dos agricultores, em qualquer ano, manter as suas próprias semen-
tes/mudas e considerar a troca de sementes/mudas como uma opção
secundária, levanta importantes questionamentos sobre como se apre-
cia e se mantém a identidade da variedade. Essas redes de agriculto-
res nodais são consideradas instituições locais para o manejo de
recursos genéticos de plantas e têm sido usadas para a troca de se-
mentes/mudas de comunidade. Elas podem desempenhar um papel
significativo nos esforços de conservação já que manejam a maioria
dos recursos genéticos presentes na comunidade.
Enfrentando a vulnerabilidade genética: A diversidade ge-
nética encontrada nos cultivos individuais também é importante tanto
para assegurar possibilidades quanto pelo valor da produção. Em-
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LIÇÕES APRENDIDAS
Redes e análises de redes têm pouco valor de prognóstico a
menos que haja um certo grau de estabilidade no sistema. Redes de
semente estáveis e a presença de agricultores nodais respeitados
mudam ao longo do tempo. Se não houver estabilidade, o local não
será muito útil para conservação nas unidades de produção familia-
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O TRATADO INTERNACIONAL
O Tratado Internacional da FAO (TI-RGPAA) ou “Tratado de
Sementes” é um acordo intergovernamental para promover a con-
servação, o intercâmbio e o uso de recursos genéticos de plantas. O
TI foi acordado em 2001. Importante nesse tratado é que ele modifi-
cou o anterior, da FAO, sobre fluxos de recursos genéticos (Com-
promisso Internacional), tornando-o consistente com a CDB. Os prin-
cipais objetivos são similares aos da CDB:
• conservação e uso sustentável de RGPAA e
• repartição eqüitativa dos benefícios de RGPAA.
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Biodiversidade
• Institucionalmente, segundo o Sistema Nacional de Unida-
des de Conservação (SNUC),12 biodiversidade é definida como sendo
“a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreen-
dendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros
ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem
parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre
espécies e de ecossistemas”.
• Na área de conhecimento das ciências biológicas, especifica-
mente na ecologia, essa definição considera também que “diversi-
dade” é “a variedade e abundância de espécies em uma definida área
de estudo”.13
Patrimônio genético
• A definição legal de patrimônio genético diz que é a “informa-
ção de origem genética contida em amostras do todo ou de parte de
espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de molé-
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Conhecimento tradicional
• A definição legal atualmente utilizada no Brasil, na Medida
Provisória, conceitua o conhecimento tradicional associado como a
“informação ou prática individual ou coletiva de comunidade indíge-
na ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao
patrimônio genético”, incluindo-se técnicas de manejo de recursos
naturais, métodos de caça e pesca, conhecimentos sobre os diversos
ecossistemas e sobre propriedades farmacêuticas, alimentícias e agrí-
colas de espécies e as próprias categorizações e classificações de
espécies da flora e fauna, utilizadas por populações tradicionais.8
• Outras definições são: “Conhecimento ecológico local é o con-
junto de conhecimentos, de práticas e de crenças acumulados, que
evoluem por meio de processos adaptativos, passando por gerações
através da transmissão cultural, sobre as relações entre seres vivos e
entre esses e seu ambiente”14; o Conhecimento tradicional resulta de
atividades e práticas coletivamente desenvolvidas na floresta14; e “o
conjunto de saberes e saber-fazer a respeito do mundo natural e so-
brenatural, transmitido oralmente, de geração em geração”.15
• Como definição legal de acesso a conhecimento tradicional
associado tem-se: “É a obtenção de informação sobre o conheci-
mento ou prática individual ou coletiva, associada ao patrimônio
genético, de comunidade indígena ou de comunidade local, para fins
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Ângela Cordeiro
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PERSPECTIVAS FUTURAS
É legítima a preocupação de governos em deter a biopirataria,
buscando ter normas que estabeleçam uma relação mais justa e eqüi-
tativa entre quem abriga a biodiversidade e quem a explora econo-
micamente. É também legítimo o interesse de comunidades locais
de decidir sobre o uso e o acesso ao conhecimento tradicional asso-
ciado ao patrimônio genético. Mas isso não altera o fato de que a
opção por caminhos que legitimam o avanço da propriedade intelec-
tual sobre formas de vida, a extensão desse conceito para a “prote-
ção” do conhecimento tradicional e a repartição de benefícios como
simples negociações monetárias bilaterais empurram a sociedade
moderna para um beco sem saída.
Ao contrário do que foi preconizado, cada vez mais surgem
evidências de que a prescrição de normas restritivas de propriedade
intelectual como mecanismo universal para a difusão de inovação e
desenvolvimento econômico não pode ser generalizada, surgindo a
necessidade de flexibilizar as diretrizes propostas pela OMC, para
evitar o aprofundamento da desigualdade entre os países.40 Crescem
as controvérsias sobre a eficácia das patentes como principal indutor
do desenvolvimento tecnológico e econômico.41, 42 No Brasil, estudo
sobre documentos de patentes envolvendo 278 espécies de plantas
demonstra que 94,2% das patentes estão em mãos de detentores es-
trangeiros.43 Na Europa, embora seja crescente o número de paten-
tes obtidas por universidades, há poucas evidências de benefícios
monetários para as instituições de pesquisa, existindo, inclusive, a
possibilidade de as patentes exacerbarem as diferenças entre as uni-
versidades, prejudicando a produção científica.44
Em relação às espécies agrícolas, a situação atual revela elevada
concentração do mercado de sementes, processo acelerado a partir da
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MANEJO EVENTO
Abertura da roça Perturbação estimulando a colonização
Plantio da roça definido Estabelecimento de população
(unidade evolutiva) com limites
Plantio de diferentes espécies Habilidade de combinação ecológica
Plantio de diferentes Favorecimento de intercruzamento
variedades (hibridação)
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INTRODUÇÃO
Pode-se iniciar um texto com uma pergunta? Essa pergunta
no início do texto já é a própria resposta, é de se supor. Mas para
que essa pergunta, ou qualquer outra, seja respondida, antes preci-
samos saber se você, leitor/leitora, entendeu a pergunta, não é? A
apresentação de um texto muitas vezes procura envolver você na-
quilo que será contado a seguir, de modo que você possa chegar às
conclusões acompanhando a linha de raciocínio. Procura-se fazer
o mesmo aqui. Essa conversa inicia dessa maneira porque teremos
um tema em comum: o conteúdo que você estará lendo agora e lerá
a seguir. O tema da educação transparece a presença de alguém a
ser educado, de um conteúdo educacional e de algum educador ou
educadora. Falando sobre agrobiodiversidade isso não é diferente.
De alguma forma, todos participamos deste grande tema: educação
para a agrobiodiversidade. Participamos como consumidores, con-
sultores, estudantes, professores, técnicos, pesquisadores, comer-
ciantes ou agricultores. Todos, de alguma forma, estamos mistura-
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RESULTADOS E PERSPECTIVAS
Por meio da pesquisa, de estudos, de práticas e de demonstra-
ções, alternativas vêm sendo proporcionadas para a recuperação da
agrobiodiversidade e, conseqüentemente, para melhorias no meio
ambiente e na realidade econômica, social e cultural dos agriculto-
res familiares das comunidades envolvidas.
Os espaços de discussão criados demonstraram a importância
do resgate da agrobiodiversidade da região como alternativa de pre-
servação ambiental e de produção e renda para a agricultura campo-
nesa, despertando o interesse para a recuperação das espécies e va-
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que as práticas agrícolas dos Guarani Mbyá contri-
buem na manutenção in situ de várias espécies importantes para a
agricultura atual, garantindo a diversidade nesses ambientes. Infe-
lizmente, pela exigüidade da terra hoje ocupada pela comunidade de
Yakã Porã, seguida da impossibilidade de manejar áreas maiores, a
soberania alimentar desse grupo encontra-se comprometida. Assim,
verifica-se que o esforço maior dos Guarani, na aldeia, reside sobre-
tudo na manutenção e na preservação dessa agrobiodiversidade.
Também se observa que o manejo tradicional Guarani se en-
contra vivo nos espaços e na conformação atual da aldeia Yakã Porã,
como uma característica vibrante de sua cultura, sustentáculo de uma
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PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
As práticas de sementes crioulas de hortaliças destinam-se às
mulheres camponesas dos grupos de base do MMC/SC que desejam
estudar e desenvolver as experiências em suas unidades de produ-
ção e grupos.
As práticas de recuperação, produção e melhoramento de se-
mentes crioulas de hortaliças desenvolvem-se por meio de oficinas,
observando os princípios da educação popular, onde se “aprende a
fazer fazendo”. O estudo político e técnico parte do conhecimento
de cada mulher presente. As coordenadoras municipais fazem a ins-
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