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Parte I Parte II
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23/01/2020 DefesaNet - Guerra Informação e Híbrida - GUERRA HÍBRIDA - EMPREGO pela RÚSSIA Parte II
Frederico Aranha
Pesquisador Independente.
aranha.frederico@outlook.com
Advertência: tradução livre.
Pela perspectiva do PLA, o conflito demonstrou que o equilíbrio na guerra havia pendido
fortemente em favor de forças menores, altamente tecnológicas. Ficaram particularmente
impressionados com o empego pelos americanos de novas tecnologias, tais como rede de
computadores (Network), munição guiada de precisão (PGM), Global Positioning System (GPS),
telecomunicações globais e Drones (Veículos Aéreos não Tripulados – VANTs). Concluíram que o
conjunto dessas técnicas deu aos americanos um nível de informações sem precedentes acerca
das forças adversárias e isso foi fundamental para sua subsequente destruição.
O PLA realizou um majestoso desfile para comemorar os seus 90 anos em Agostos 2017.
Os analistas do PLA, então, iniciaram estudos para dominar essa vantagem informacional. Essa
iniciativa originou um processo em duas etapas. Primeiro, ativaram um programa de caráter
tecnológico, adquirindo equipamentos e sistemas de armas avançadas. Outrossim, iniciaram altos
estudos em busca de opções para mitigar a desvantagem perante um inimigo dotado de alta
tecnologia. Nasceu daí, em fevereiro de 1999, a publicação do livro Unsrestricted Warfare, da
autoria de dois Coronéis da Força Aérea do PLA, Qiao Liang e Wang Xiangsui
(http://www.c4i.org/unrestricted.pdf). A tese exposta na obra baseia-se na ideia de que é
contraproducente confrontar a alta capacidade operacional dos americanos no campo de batalha,
de modo que é preciso afastar o foco do conflito da arte da guerra convencional. Eles deduziram
que isso pode ser feito ampliando o domínio da conflagração, para incluir vários elementos do
poder nacional.
Eles classificaram a síntese dessas ideias como “guerra total modificada que vai além dos
limites”. O pilar chave desse conceito é explorar os benefícios de “combinações” dos tipos de
organizações entre os vários domínios do poder nacional. De acordo com Balacevicius (cit.), os
autores concebem que a chave da vitória no “campo de batalha” de campos de batalha é
compreender e coordenar o emprego efetivo de quatro tipos específicos de composições:
- Omnidirecionalidade;
- Sincronia;
- Objetivos limitados;
- Ações ilimitadas;
- Assimetria;
- Economia de meios;
- Coordenação multidimensional; e
- Ajustamentos e Controle de Todo o Processo
Três desses princípios são de especial interesse do Ocidente para entender a “guerra híbrida” em
nível estatal. Incluem a Omnidirecionalidade, Sincronia e Assimetria.
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23/01/2020 DefesaNet - Guerra Informação e Híbrida - GUERRA HÍBRIDA - EMPREGO pela RÚSSIA Parte II
(...) Com o emprego do método das combinações, podem ser criados cenários e disputas
completamente diferentes: se o lado atacante concentrar grandes capitais sem que a nação
inimiga tenha conhecimento, e lança um súbito ataque ao seu mercado financeiro e, depois de
causar uma crise econômica, implanta um vírus no seu sistema de computadores que permita a
invasão e manipulação de dados, ao mesmo tempo que ataca a infraestrutura de forma que a
rede nacional de eletricidade, os correios, a malha de transações financeiras, as comunicações
telefônicas e telemáticas, e a mídia de massa entrem em colapso, causará o pânico na
população, distúrbios generalizados e crise política (...).
Na sua análise, Liang e Xiangsui divisam o centro de gravidade da ação focado em criar o caos
social, sucedendo-se a crise política. Uma vez que a crise tenha evoluído suficientemente, as
forças militares convencionais podem ser empregadas, mas somente o necessário para garantir a
autoridade do novo status quo.Ao imprimir essa feição assimétrica, os autores concluem que a
assimetria, núcleo desse tipo de guerra, pode ser empregada para identificar e explorar pontos
fracos do inimigo. Eles sustentam que países pobres, países debilitados e não-Estados têm
usado algum tipo de método de combate assimétrico contra adversários poderosos, como meio
para equilibrar o confronto. Isto é, quando uma nação enfrenta um inimigo dotado de tecnologia
superior, a chave para o sucesso consiste em mover a luta da operação puramente militar, para
uma mais ampla interpretação da guerra, uma que especificamente inclua Guerra Financeira,
Guerra Cultural, Guerra Midiática, Guerra Tecnológica, Guerra Psicológica e Guerra Cibernética,
para apontar apenas algumas.
Empregando esses métodos uma nação ou uma entidade não-estatal pode minimizar o impacto
de superioridade tecnológica e o consequente incremento no poder de combate que tal vantagem
pode proporcionar a uma força militar convencional. Assim agindo, o país pode forçar o inimigo a
lutar numa guerra de tipo particular, a qual, se aplicada corretamente, ocorreria num número de
campos de batalha diferentes e mais complexos do que seriam previamente. É exatamente o que
a Rússia está fazendo agora na Europa Oriental.
É difícil dizer o quanto os russos foram influenciados pelo enfoque chinês da guerra híbrida. É
flagrante que muitos dos conceitos chaves sustentando a filosofia daUnrestricted Warfare,
particularmente as ideias de coordenação, sincronia, o “campo de batalha” constituído de vários
campos de batalha, criando o pânico social e a crise política, e o judicioso emprego da força
militar, caracterizaram recentes operações levadas a efeito pela Rússia. Da mesma forma, muito
dessa filosofia tem sido articulada em pronunciamentos públicos de oficiais superiores, acerca da
visão russa do futuro conflito no contexto da “Guerra de Nova geração”.
O conceito da “Guerra de Nova Geração” foi abordado publicamente pela primeira vez num artigo
de autoria do General de Exército Valery Gerasimov intitulado Tsennost’ nauki v predvidenii (‘The
Value of Science Is in the Foresigth’), publicado em 27 de fevereiro de 2013 na revista
eletrônica russa Voenno-promyshlennyi kur’er (‘Military Industrial Courier’)(5). Nele, Gerasimov
alinha uma série de princípios-chaves que embasam o pensamento russo do emprego da
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Gerasimov acredita que medidas específicas necessárias para implantar as mudanças incluirão o
emprego de Forças Especiais ligadas a grupos internos de oposição do Estado-alvo, a fim de
criar uma frente operacional estendendo-se profundamente pelo território do inimigo. Essas ações
serão associadas com operações de informação, guerra cibernética, guerra jurídica, guerra
econômica e qualquer outra atividade ligada diretamente à estratégia selecionada. Salienta
que inicialmente todas essas ações poderão ser adotadas, porém modificadas constantemente
para atender exigências peculiares de uma situação em constante alteração (7). Os russos
confiam que tais métodos, empregados apropriadamente em sequência, podem num curto
período de tempo lançar um Estado próspero e estável numa condição de caos, crise social e
guerra civil, tornando-o suscetível à intervenção estrangeira. Em que pese Gerasimov reconheça
que tais eventos não sejam, do ponto de vista ortodoxo, parte do que se consideraria situações
de guerra, acredita que se tornarão típicos dos conflitos do século XXI.
A ideia de implodir um Estado via convulsão social, ainda que antes da declaração de guerra, é
uma prescrição importante da metodologia da “Guerra de Nova Geração”. A esse respeito,
Gerasimov considera que (...) as rígidas regras da guerra mudaram .... (assim) o foco dos
métodos de conflito se alterou em direção ao amplo emprego de medidas de caráter político,
econômico, informacional, humanitário e outras tipicamente não-militares ... aplicadas em
coordenação com o potencial dos protestos da população alvo. O exemplo que usa para ilustrar
seu ponto de vista é a intervenção da NATO na Líbia, onde uma zona de exclusão aérea e um
bloqueio naval combinaram-se com o emprego de operadores privados lutando ao lado de
formações armadas da oposição.
Gerasimov entende que as novas tecnologias da informação permitiram que muitas dessas
mudanças fossem possíveis, abrindo as portas para o amplo uso de ações assimétricas visando
reduzir o potencial de combate do inimigo, particularmente por meio de “Operações de Influência”
(8).
Jänis Bërzins (referido por Balecevicius, cit.) – Managing Director for the Center for Security and
Strategic Research at the National Defense Academy of Latvia – autordoPolicy Paper nº 02, 2014
- Russia’s New Generation Warfare in Ukraine: Implications for Latvian Defense Policy (9),
enfatiza esse ponto. Ele sustenta: Os russos adotam a ideia
das
“Operações de Influência” como o item mais importante dos seus planos operacionais e usam
todos os níveis do poder nacional para torna-las possível. Acrescenta: Essas competências
incluem proficientes comunicações internas, operações indiretas, operações psicológicas e
comunicações externas eficientes. Explica que os russos (...)tem demonstrado uma compreensão
inata dos alvos-chave e sua possível reação .... Armados com essas informações eles sabem o
que fazer, quando fazer e que consequências poderão advir.
Os russos pensam que todas essas mudanças na condução de conflitos reduziram a importância
dos engajamentos diretos por grandes formações militares convencionais, os quais acreditam se
tornarão gradativamente coisa do passado. No caso de ser necessário uma operação
convencional para “acabar” com o inimigo, acreditam que possam ser empregadas ações do
tipo standoff (i.e., fogo indireto e/ou de precisão em profundidade a partir de várias plataformas)
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através de todo o território de adversário (para mais informações sobre este tema, ver Gareev,If
the War Come Tomorrow?..., nota 5). De acordo com Bërzins (cit.) os russos percebem que esse
câmbio em direção à guerra irregular e às operações ‘standoff’ borra o traçado entre os níveis
estratégicos, operacionais e táticos do conflito, bem como entre operações ofensivas e
defensivas. Essas ideias acerca do conflito futuro estão formalmente articuladas no que se
conhece como as oito fases da ‘Guerra de Nova Geração’. Essas fases proporcionam um
paradigma para compreender como os russos podem conduzir uma guerra híbrida estatal.
Conforme Bërzins (cit.), são elas:
2ª Fase: operações especiais (específicas) são empregadas para confundir líderes políticos e
militares, por meio de canais diplomáticos, mídia, e agências governamentais e militares. Isto é
feito mediante a divulgação de informes, ordens, diretivas e instruções falsas;
5ª Fase: estabelecimento de zonas de exclusão aérea sobre o país a ser atacado, imposição de
bloqueios e emprego extensivo de companhias privadas de militares em estreita cooperação com
unidades armadas de oposição;
6ª Fase: esta inclui o começo da ação militar, a qual é precedida por missões de reconhecimento
e subversivas em larga escala. Comporta todos os tipos, formas, métodos e forças, tais como
forças especiais, equipes aerotransportadas, espaço, rádio, eletrônica, diplomática, inteligência,
serviço secreto e espionagem industrial;
Cada uma dessas fases pode ocorrer gradativa ou simultaneamente, dependendo de situação
específica. De acordo com Gerasimov (cit.), essa nova doutrina manifesta-se no emprego de
métodos indiretos e assimétricos, a par do manejo das tropas numa esfera informacional
unificada. Se o conflito escalar, essas atividades poderão ser seguidas pelo maciço emprego de
armas de alta precisão, forças de operações especiais e robótica. Se necessário, a próxima etapa
poderá envolver ataques simultâneos a unidades e instalações inimigas, bem como batalha em
terra, ar, mar e no espaço informacional.
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Não obstante o fato de existir um certo número de similitudes entre a filosofia daUnrestricted
Warfare e a doutrina da “Guerra de Nova Geração”, é claro que os russos avançaram
significativamente criando o “campo de batalha de campos de batalha”. Subtrair as linhas
divisórias entre operações nos níveis estratégico, operacional e tático, e manter
uma network unificada é quase impossível sem a habilidade para conduzir e coordenar os vários
eventos nos diferentes campos de batalha de modo estrategicamente efetivo. De fato, alguns
acreditam que essa habilidade para sincronizar constitui a maior mudança nas recentes
operações russas. Kristin Vem Bruusgaard, Research Fellow at the Norwegian Institute for
Defense Studies (IFS) (10), lembrada por Bërzins (cit.), afirma:
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Uma das mais importantes alterações na estrutura burocrática estatal russa foi a criação do
Centro de Coordenação da Defesa Nacional, cujas atividades iniciaram em dezembro de 2014. O
Centro tem a tarefa de coordenar 52 autoridades executivas e três corporações estatais
engajadas na defesa da Rússia. Incluem as forças armadas, o Ministério do Interior, o Serviço
Federal de Segurança (FSB – sucessor da KGB) e o Ministério das Emergências.
Alguém pode perguntar se o conceito do Centro remete à ideia chinesa de criar o “domínio
ampliado”, integrando os diversos interesses nacionais e as exigências nacionais de segurança
no grande mapa da situação estratégica. Se esse é o caso, a Rússia pode agora criar e
simultaneamente coordenar sua versão do “campo de batalha” composto de diversos campos de
batalha”. Mais do que isso, entende-se que os russos mudaram as regras do “Jogo da Guerra”.
Conclusão
A adoção e emprego pela Rússia da “Guerra de Nova Geração” validou as teorias chaves da
“Guerra Híbrida”. As operações na Ucrânia mostraram que os russos deslocaram com maestria o
centro de gravidade do conflito do nível operacional, quando as forças militares convencionais
cumprem a ação predominante, para a esfera estratégica, em que a integração do planejamento
estratégico e a coordenação das ferramentas de Estado torna-se o denominador crítico.
Balacevisius (cit.) enfatiza que (...) a eficiência devastadora desse tipo de Guerra pode ser
constatada no seio da NATO hoje em dia. Mais de dois anos após a anexação da Criméia, a
aliança não desenvolveu ainda uma estratégia coerente para se contrapor às atividades de
guerra híbrida da Rússia na Ucrânia. Esta inércia gerou entre alguns membros da NATO apoio ao
objetivo da aliança de simples proteção, ao passo que outros questionaram abertamente a
capacidade de enfrentar os russos. O sucesso russo com a ‘Guerra de Nova Geração’ significa
que eles vão continuar a refinar e empregar essa doutrina para alcançar seus alvos estratégicos.
Mais do que isso, ao longo do tempo eles vão se tornar mais eficientes, à medida que a
experiência cria sofisticação tanto no processo como na reação (...).
Com base em tudo o que foi exposto, esboça-se a convicção de que não é mais possível confiar
em soluções convencionais para problemas não-convencionais, como tem sucedido.
NOTAS
(7) Esses eventos caracterizaram-se por operações cinéticas e acinéticas, com prevalência
destas últimas. As operações cinéticas indicam a movimentação de elementos físicos e as forças
e energia associadas a eles, ao passo que operações não-cinéticas se relacionam com a ação
para influenciar determinada audiência, mediante mídia impressa ou eletrônica, operações
cibernéticas, guerra eletrônica ... etc. Estrategistas e teoristas de defesa e da segurança vêm
discutindo há décadas o surgimento de “guerras novas”, juntamente com outras nomenclaturas
associadas, sendo que a essência dessas discussões assemelha-se à evolução apontada por
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Gerasimov. Está muito claro que guerras do passado, por exemplo, entre as forças “azul” e
“vermelha”, num campo de batalha definido, são exatamente isto – guerras do passado.
(8) De acordo com o AFDD 2-5 (US Air Force Doctrine Document), “Operações de Influência” são
aquelas focadas em intervir nas percepções e condutas de líderes, grupos ou populações
inteiras. São empregadas habilidades para acometer ações, operações de proteção, ordens de
comando e, ao mesmo tempo, lançar informações precisas para obter efeitos por todo o plano
cognitivo. Esses efeitos podem resultar em ações contaminadas ou em alterações no ciclo de
decisões do adversário. As competências militares das “operações de influência” são as
operações psicológicas (PYSOP), ações diversionárias (MILDEC), operações de segurança
(OPSEC), operações de contra inteligência (CI), operações de affaires civis (PA) e operações de
contrapropaganda. (...) Essas atividades das “operações de influência” permitem ao Comando
preparar e delinear o campo de batalha, transmitindo informações e indicativos selecionados para
os ouvintes-alvo e configurando as percepções dos tomadores de decisão, colhendo informações
amigáveis, defendendo contra sabotagem, protegendo contra a espionagem, reunindo informes e
comunicando informação selecionada sobre atividades militares para a audiência global.
(9) http://www.sldinfo.com/wp-content/uploads/2014/05/New-Generation-Warfare.pdf
(10) http://www.iiss.org/en/publications/survival/sections/2016-5e13/survival--global-politics-and-
strategy-august-september-2016-2d3c/58-4-02-ven-bruusgaard-45ec
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