Vous êtes sur la page 1sur 261

LINCOLN TAVARES SILVA

OS SENTIDOS ATRIBUÍDOS PELOS PROFESSORES DE GEOGRAFIA


À EDUCAÇÃO AMBIENTAL: OLHARES SOBRE A QUESTÃO.

PETRÓPOLIS

2003
i

LINCOLN TAVARES SILVA

OS SENTIDOS ATRIBUÍDOS PELOS PROFESSORES DE GEOGRAFIA


À EDUCAÇÃO AMBIENTAL: OLHARES SOBRE A QUESTÃO.
.

Trabalho apresentado ao Programa de Pós-Graduação em


Educação da Universidade Católica de Petrópolis – UCP, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profª. Drª. Margot Campos Madeira

PETRÓPOLIS

2003
ii

SILVA, Lincoln Tavares.


Os Sentidos atribuídos pelos Professores de Geografia à Educação Ambiental:
olhares sobre a questão. / Lincoln Tavares Silva; orientação: Prof.ª Dr.ª
Margot Campos Madeira. Petrópolis, 2003. 260 f.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em


Educação da Universidade Católica de Petrópolis – UCP.

1. Educação. 2. Representações sociais. 3. Educação Ambiental.


iii

LINCOLN TAVARES SILVA

OS SENTIDOS ATRIBUÍDOS PELOS PROFESSORES DE GEOGRAFIA À


EDUCAÇÃO AMBIENTAL: OLHARES SOBRE A QUESTÃO.

Trabalho apresentado ao Programa de Pós-Graduação em


Educação da Universidade Católica de Petrópolis – UCP, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Banca Examinadora:

Profª. Drª. Márcia Magalhães Gomes


Universidade Católica de Petrópolis - UCP

Profª. Drª. Nilda Alves


Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ

Orientadora: Profª. Drª. Margot Campos Madeira


Universidade Católica de Petrópolis - UCP
________________________________________________________

________________________________________________________

________________________________________________________

Trabalho ________________ em ___/ ___/ 2003

PETRÓPOLIS

2003
iv

Na pessoa do Lucas, meu filho, dedico


este trabalho aos meus familiares que
souberam esperar e respeitar
meus caminhos, quase nunca trilhados
com certezas, com horas, partidas e
destinos combinados.
v

AGRADECIMENTOS

À Orientadora e fraternalmente amiga, Margot Madeira. Esta pessoa, de individualidade forte


e coração largo, desde o primeiro encontro, na seleção para o Mestrado, parece ter apostado
que ia dar pé. Espero poder continuar aprendendo sempre, com ela e com o Prof. Madeira (o
Vicente), aquilo que se espera de alguém que leva a sério a tarefa de ser professor e de fazer
pesquisa em Educação. Se Calvino os tivesse conhecido, poderia utiliza-los para espelhar
através de seu profissionalismo o que são o leve, o exato e o múltiplo.

Aos colegas do Mestrado, principalmente aos da linha das Representações Sociais. Sem eles e
sua força, sua perspicácia, insistência e resistência seria, realmente, difícil o sobe e desce da
Serra (Tamine, Etelka, Cida, Miriam, Cláudio e Fátima, a turma do “Buteco”).

Aos docentes do curso de Mestrado em Educação, em particular aos professores Luiz


Fernando Tura, Márcia Magalhães e Marisol Barenco aos quais devo boas ajudas e um
tratamento acadêmico singular.

À professora Nilda Alves, pela convivência próxima, mesmo quando distante. Pela empatia,
pelo estímulo, pela consideração e pelos escritos que movimentam os neurônios dos
educadores atentos (e até os dos desatentos).

Aos colegas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a quem agradeço na pessoa da


Professora Maria Luiza Tindó, que em todas as situações demonstraram apreço pelo
investimento que empreendi. Aos docentes e servidores que têm convivido comigo no Centro
de Educação e Humanidades da UERJ e que supriram, em todos os momentos, de formas
diversas, minhas agruras e compartilharam algumas de minhas esperanças.

Em particular agradeço aos amigos do Departamento de Geografia da UERJ, pelo apoio mais
que logístico, mais que fraterno, mais que acadêmico (Alexander, Alexandre, Hindenburgo e
Marta).

Ao amigo Nival, a quem conheci no cotidiano do trabalho universitário e cujo respeito e


estima muito me ajudaram na reflexão sobre o que vem a ser e o que realmente vale a pena ser
na carreira acadêmica.

À Universidade Católica de Petrópolis (UCP) pelo investimento nas pessoas, torcendo que
este iniciativa seja duradoura, cresça e possa atender aos desígnios de um Programa de Pós-
Graduação de qualidade inquestionável.

À paisagem do percurso que fiz, às dezenas, do Rio até Petrópolis, às vezes com escalas, mas
sempre bela. Que possamos ter juízo para que outros sintam o mesmo prazer.

Por último, mais não menos importante, aos amigos da Geografia, professores e professoras,
grandes parceiros, para quem o trabalho só começou, com quem espero partilhar esta e outras
novas propostas e projetos que abram perspectivas, aproximações, realizações voltadas para o
realce dos valores do nosso trabalho, com nossos alunos.
vi

RESUMO:

SILVA, Lincoln Tavares . Os Sentidos atribuídos pelos Professores de Geografia à Educação


Ambiental: olhares sobre a Questão. 2003. 260 f. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Católica de Petrópolis, Petrópolis,
2003.

O presente trabalho objetiva captar os sentidos atribuídos por professores de Geografia que atuam no Estado do Rio de
Janeiro ao que se convencionou chamar de Educação Ambiental-EA. Baseando-nos na abordagem teórica das
representações sociais fundamentada por Serge Moscovici e Denise Jodelet, em nosso trabalho, partimos de uma
preocupação que norteou toda a pesquisa. Centramos estudos em conhecer melhor, a partir do princípio que
caracteriza a representação como uma forma de saber prático ligando um sujeito a um objeto, o que/como pensam
os(as) professores(as) de Geografia, “a partir do seu lugar”, sobre a prática educativa ambiental. Entendemos que as
práticas estabelecidas pelos docentes pesquisados inserem-se em tempos-espaços não cristalizados, sujeitos às
dinâmicas sócio-culturais que ora seguem, ora modificam, ora transgridem as regras estabelecidas por atores
hegemônicos (Estado, mercado etc). Através dos questionários, buscamos captar aspectos aventados pelos professores
relacionados aos processos constituintes de suas representações, ou seja, como as relações estabelecidas pelos
mesmos, na articulação do ensino da Geografia e a Educação Ambiental, se constituem através dos processos de
objetivação e ancoragem. O outro instrumento de campo que possibilitou captar mais profundamente as
representações dos professores de Geografia foi a entrevista. Ela serviu para aprofundar e esclarecer as ações,
discursos, possíveis contradições, propostas, valores, normas, entre outros aspectos aventados pelos sujeitos. Houve
uma gama de polarizações a respeito da EA, constituídas dentro e fora do ambiente escolar. Tais polarizações são
resultantes possíveis das inserções diferenciadas dos sujeitos nas culturas e das táticas desenvolvidas pelos mesmos
para cada um dos contextos vividos. Resultam de sínteses, retrocessos e avanços, compartilhados ou não, de uma
novidade, no emaranhado dos espaços-tempos-relações.
Palavras-chave: Formação docente; Representações sociais, Ensino de Geografia.
vii

ABSTRACT:

SILVA, Lincoln Tavares . The Meanings of Environmental Education for Geography


Teachers: a discussion of the environment problem. 2003. 260 f. Dissertação (Mestrado
em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Católica de
Petrópolis, Petrópolis, 2003.

The study aimed to investigate the meanings referred by Geography teachers from the State of Rio de
Janeiro to the notion of Environmental Education. The adopted theoretical framework was the Theory
of Social Representations proposed by Serge Moscovici and Denise Jodelet. In this context, we
considered that a representation reflects the way by which a subject practically understand a
phenomenon – in other words, we were concerned with the Geography teachers´ points of view,
developed from their specific pedagogical experience, about the environmental educative practice..
We supposed that the established practices raise and flourish in a non-crystallized space-time
continuum, influenced by socio-cultural dynamics that may follow, disobey or change rules defined by
hegemonic agents (State, market etc). Using questionnaires specifically developed for the study, we
searched to assess opinions related to the constitutive process of the teachers´ representations, that is,
how the relations elaborated by them are defined in the articulation of Geography teaching and
Environmental Education, by means of the ‘objetivation’ and ‘anchor’ process. We also interviewed
the teachers, in order to analyze more deeply the actions, speech, contradictions, propositions,
attitudes, references, and values of the teachers, among other aspects . The results revealed the
existence of many contrasts regarding Environmental Education, in and out the school context. These
contrasts can be possibly due to the different insertions of the teachers in their cultures, and to the
diversity of the options chosen for coping with their daily teaching routine. The evidences suggested
that these options are produced by a complex process that involves synthesis, advances and defeats of
something new in the teaching process, being them shared or not, in the frame of space-time
relationships.
Keywords: social representation, Geography teaching , teacher education
viii

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................ 9
1.2 O Cenário Ambiental Contemporâneo e suas contradições................ 12
1.3 Relações entre Consumo e Cidadania na Dimensão Ambiental.......... 21
1.4 Afirmando a Complexidade da Questão Ambiental............................. 29
1.5 O Cenário Científico: polissemia e fragmentação nas discussões 37
ambientais.................................................................................................
1.6 Educação, Meio Ambiente e Representações Sociais: tecendo 48
pertinências...............................................................................................
1.7 Por Caminhos e Por Trilhas: opções metodológicas............................. 53
2 PRODUZINDO “ENREDOS”: PERCURSOS E RELAÇÕES 63
ENTRE A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E A GEOGRAFIA...............
2.1 A Educação Ambiental: avanços e permanências................................. 64
2.2 A Geografia: historiando Alguns de seus caminhos no Brasil............. 72
2.2.1 Percursos do Ensino da Geografia no Brasil......................................... 72
2.3 O Encontro no Caminho: a Geografia e suas possibilidades de 86
contribuição à Educação para com o Meio Ambiente..........................
3 COM QUEM CAMINHAMOS? OS PROFESSORES E 94
PROFESSORAS DE GEOGRAFIA......................................................
4 SOBRE OS DOCENTES DE GEOGRAFIA E SUAS REDES DE 144
TRILHAS E CAMINHOS NOS SENTIDOS PARA A EA.................
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS: UM MAPA A SE FAZER................... 231
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA......................................................... 241
APÊNDICE
A - MODELO DE QUESTIONÁRIO APLICADO AOS 259
PROFESSORES DE GEOGRAFIA......................................................
9

Os Sentidos atribuídos pelos Professores de Geografia à Educação


Ambiental: olhares sobre a Questão.
Lincoln Tavares Silva
Chassez le naturel, ll revivent au galop.
Destouches

1 – INTRODUÇÃO

A presente dissertação objetiva entender os sentidos atribuídos por professores de

Geografia, que atuam no Estado do Rio de Janeiro, ao que se convencionou chamar de

Educação Ambiental1 (EA).

Torna-se fundamental, antes de tudo, discutirmos, mesmo que de forma parcial, sobre

a temática ambiental, sua inserção na contemporaneidade e suas relações com a Educação e,

particularmente, com o ensino da Geografia. Como aproximação inicial, serão apresentados

aspectos que consideramos articuladores de temáticas que permitirão nortear nossas ações

com os sujeitos do processo educativo que serão investigados neste projeto.

Não se sugere aqui dicotomizar a argumentação sobre discurso e prática, entendendo

que toda prática carrega implícita ou explicitamente um discurso, e vice-versa, mas, sim,

indiciar, tentar discutir e entender qual a relação entre o que se espera da Educação

Ambiental, o significado atribuído à mesma, e como este é traduzido pelos professores de

1
Educação Ambiental (EA) é o termo corrente no meio científico e no senso-comum e, a partir desta
constatação, fizemos a interlocução com os sujeitos ora investigados. Há autores que propõem outras formas de
tratar a relação entre o Meio Ambiente e a Educação. Tomamos como exemplo, Fontes (2001) que distingue a
educação sobre o meio ambiente, como uma aquisição de saber que, não exigindo necessariamente a ação
ambiental por parte dos sujeitos, é caracterizada pela transmissão de informações e fatos e não pela ação; a
educação no/pelo meio ambiente, correspondendo à educação pela ação exigida a seus sujeitos, no ambiente e; a
educação para o meio ambiente, estabelecida pela ação dos sujeitos para, ou a favor de, o meio ambiente. Esta
última, sendo uma educação para a ação ambiental. A ação se caracteriza pelo seu caráter educativo e, portanto
duradouro. Nos agrada, particularmente, a proposição para/para com o meio ambiente, pois entendemos, como
voltaremos a frisar mais adiante, que a mesma não tipifica a Educação Ambiental como uma nova modalidade de
educação, como por exemplo o é a Educação a Distância. A EA valoriza, na Educação, a dimensão ambiental.
Além disso, julgamos acertado incorporar a idéia de ação, explicitada por Fontes (2001) que coaduna com a
perspectiva de Freire (1970, 1983). Para este último, o conhecimento se dá através da práxis, pela reflexão e
ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Quanto à abreviação EA, ressaltamos que a mesma será
utilizada, indistintamente, neste trabalho.
10

Geografia. Sobre o saber geográfico, investigado a partir dos professores que militam neste

campo de conhecimento, estaremos constatando a forma de sua inserção neste contexto

complexo, condição vista por diversos pensadores, como indispensável para o tratamento das

questões da contemporaneidade.

Algumas idéias serão debatidas perpassando por críticas ao discurso hegemônico do

Desenvolvimento Sustentável, pelos modelos de consumo e apropriação desigual do trabalho

humano e do Meio Ambiente, assim como, pela apresentação e argumentação em torno de

posturas que vissem maior participação e solidariedade entre os sujeitos envolvidos nos

processos sociais e, em particular no processo educativo voltado para o fortalecimento da

cidadania e para execução da EA.

Autores como Edgar Morin, Milton Santos, Felix Guattari, Michel de Certeau, Isabel

de Carvalho, Carlo Ginzburg, Bader Sawaia, Boaventura de Souza Santos, entre outros nos

servirão de base para discussões que trilham caminhos que aproximam e enredam nosso

intento ao contexto societário contemporâneo. Além disso, para o entendimento e análise dos

processos constituintes do constructo das representações sociais, abarcando a contextura na

qual os sujeitos estão inseridos, nos basearemos em trabalhos produzidos por Denise Jodelet,

Serge Moscovici, Margot Madeira, Marcos Reigota, entre outros.

Também intentamos discutir como os aspectos do meio ambiente variam e dependem

dos cenários culturais, históricos, geográficos, políticos, tecnológicos e sociais e dos desígnios

e pretextos envolvidos em cada um deles. Da mesma forma, objetivamos não perder o alcance

das situações vividas pelos professores cotidianamente, nas suas ações e práticas sociais. Nem

sempre estas ações e práticas se concretizarão de forma clara. Todavia, os indícios e pistas

desta investigação servirão como guias realimentando-a e dando-lhe sentido, oportunizando o

entendimento das estratégias, das táticas, das contradições e das complementaridades

existentes na relação entre os professores de Geografia e suas impressões a respeito da EA. As


11

questões relativas aos espaços-tempos-relações que caracterizem tais sujeitos, assim como, a

própria conjuntura da educação ambiental e do ensino da Geografia também nortearão as

relações e as aproximações registradas nos relatos dos professores e nas informações advindas

de questionários por eles respondidos.

Desse modo, as condições dos docentes, nas suas dificuldades conjunturais e

estruturais, nas suas alternativas e sugestões práticas, nos instrumentais teóricos por eles

indicados, serão enlaçados aos sentidos e às finalidades atribuídas a Educação Ambiental.

Estas, por sua vez, refletem valores e crenças, que são estabelecidos nos tecido social de

forma não cristalizada, mas que junto com as normas e símbolos associam-se aos modelos de

pensamento e de conduta que são utilizados pelos indivíduos para se apropriar dos objetos de

seu ambiente. Por conseguinte, esta investigação sobre a incorporação da EA e a forma como

a mesma é efetivada ou não nas ações educativas em diferentes vivências, é parte de um

mosaico maior, que se junta a outros mosaicos, que se movem ora mais, ora menos, sem

perder o amálgama que permite a constituição de uma totalidade socialmente criada e enleada.

A idéia é de produzir enredos, que tenham como roteiro as formações dos professores,

os tempos de exercício de magistério, um pouco das instituições que marcam e marcaram suas

trajetórias, suas condições de apoio e efetivação nos trabalhos com a EA, as redes e níveis de

ensino nas quais atuam ou estão vinculados, algumas relações a partir de aspectos de gênero,

das suas cargas de trabalho, de fatores que os aproximem e os diferenciem na associação da

Geografia, do seu ensino, com a educação Ambiental, assim como, seus interesses sobre a

EA, suas formas de torná-la familiar e concretizá-la cotidianamente, levando em conta a

coerência e as contradições entre discursos e práticas sobre o tema em questão. Com isto, o

que talvez encontremos sejam as sínteses possíveis, os fios mais ou menos visíveis ou

sensíveis de um novelo, cujo emaranhar não se iniciou agora e muito menos aqui se encerrará.
12

Como já apontamos, a base de nossa investigação apóia-se na Teoria das

Representações Sociais, uma teoria em processo, ainda não acabada, que assume um caráter

complexo, abarcando o cognitivo e o social, mas que prima por uma consideração que nos

ajuda pela sua simplicidade: “A representação social é sempre representação de alguma coisa

(objeto) e de alguém (sujeito). As características do sujeito e do objeto nela se manifestam.”

(JODELET, 2001, p.27).

1.2 - O CENÁRIO AMBIENTAL CONTEMPORÂNEO E SUAS CONTRADIÇÕES

As idéias e concepções que surgem inicialmente num círculo restrito e que se tornam

pouco a pouco universais constituem um fenômeno típico da história da humanidade.

Habitualmente, estas idéias e concepções quando universalizadas se tornam imponderáveis,

pertencentes ao “mundo das idéias” e, muito raramente ao “mundo material”, reificando

tempo-espaço-relação. Há, entretanto, situações que envolvem simultaneamente as idéias, o

espaço-tempo simbólicos, e o “mundo material”, abrangendo, portanto, todo o universo do

homem. Atualmente, a humanidade encontra-se numa encruzilhada, no momento de decidir

como continuará a estabelecer sua relação de sobrevivência na Terra. Esta questão envolve

todos os mundos.

Diversos são os pensadores, das mais variadas correntes e posturas político-filosóficas,

que ao discutirem o momento pelo qual passamos na história da humanidade, dedicam apreço

especial à problemática do meio ambiente. Rodríguez (1997) chega a caracterizar a crise

civilizatória desta transição de milênio como tendo em seu bojo um profundo caráter

ambiental. Demonstra-se uma incapacidade de criação, em curto prazo, de soluções culturais

em relação ao uso abusivo e predatório dos bens ambientais2.

2
Redclift (2000, p.114), a este respeito já afirmara que “há uma confusão fundamental subjacente à questão da
incerteza, que caracteriza as questões ambientais. É a confusão entre as limitações do que sabemos sobre a
natureza (fatos científicos) e as limitações da ciência, com a qual exploramos e compreendemos a natureza”.
13

Os efeitos civilizacionais que a mercantilização de todas as coisas (a água, o mar, o

sol, as mulheres, as crianças, os órgãos do corpo humano, o sangue, o esperma, o óvulo)

produzem o definhamento da dádiva, do gratuito, da oferta, da solidariedade. Quase há o

desaparecimento do não-monetário, provocando a erosão dos valores3 que não sejam os do

apetite do lucro, do interesse financeiro e da sede de riqueza e de progresso.

No contexto contemporâneo, Morin & Kern (1996, p.64) apontam para um momento

de agonia planetária e policrise. Como conseqüência, os autores advertem que “[...] o

progresso não é automaticamente garantido por nenhuma lei da história. O futuro não é

necessariamente desenvolvimento. O futuro chama-se agora incerteza.”. Ocorrem problemas

de primeira evidência como a desregulação econômica mundial, o desregramento

demográfico, a crise ecológica e do desenvolvimento e, como segundas evidências uma

conjuntura atual com perspectivas futuras de agravamento. Tais problemas pedem, segundo

Morin (2000a), tratamentos cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,

transnacionais, globais e planetários, buscando-se o “pensar global/agir local, pensar

local/agir global” (MORIN & KERN, 1996, p. 139). Para os autores, não se pode destacar um

único problema que subordine todos os outros. Não há somente um problema vital. É a

intersolidariedade complexa dos problemas, antagonismos, crises, que constitui o problema

vital principal.

Buscando ultrapassar a cegueira fragmentária do pensamento civilizacional redutor

hodierno, no caminho da complexidade, há que ser superada a visão de mundo “baseada no

modelo hegemônico do homem branco, adulto, técnico, ocidental; [...] deve pelo contrário,

revelar e despertar os fermentos civilizacionais femininos, juvenis, adultos, multi-étnicos,

multiculturais...”. (MORIN & KERN, 1996, p.97). Com isso, incorpora-se um duplo

3
Em relação aos valores, tecidos através das redes cotidianas, Alves (2002, p.19) os considera como “[...]
conhecimentos especiais, cuja maneira de reprodução/transmissão/criação se dá de forma ainda não inteiramente
conhecida e que, circulando/sendo tramados em nossas tantas redes cotidianas de viver e de significações, são
responsáveis pelas ações que desenvolvemos em todas as circunstâncias da vida.”.
14

imperativo complexo de defesa democrática das singularidades culturais e da promoção das

hibridações e mestiçagens relativas aos povos e as culturas. Ambos os autores (p.95),

advertem que “[a] civilização da civilização exige a intercomunicação entre sociedades e,

mais ainda, a sua associação orgânica à escala planetária.”. É essa multiplicidade, diversidade

e mesmo complexidade que faz da unidade do homem, uma totalidade complexa. Trata-se de

se fazer da espécie uma humanidade, do planeta uma casa comum para a diversidade humana.

Diante da necessidade e da possibilidade de mudança, a natureza humana e a natureza

da sociedade assumem uma dimensão política, ou seja, viver, nascer e morrer situam-se, mais

que nunca, no campo político. Ao mesmo tempo, o planeta, enquanto tal, politiza-se e a

política4 planetariza-se. As discussões sobre as ameaças nucleares, sobre a degradação dos

ecossistemas, sobre a alteração da biosfera, sobre a transmissão de epidemias, sobre a

ampliação das desigualdades, fazem, “[de] fato, a política ser levada a assumir tanto o destino

e o futuro do homem como o do planeta”. (MORIN & KERN, 1996, p.117).

Em relação ao contexto abordado, as conferências em torno da temática do meio

ambiente, desde 1972, permitem constatar que a crise ambiental é, a um só tempo,

generalizada e global. Esta se reflete sob diferentes enfoques e âmbitos: ecológico

(degradação do patrimônio natural), ambiental (superação da capacidade de sustentação

ecossistêmica), ecopolítico (dos sistemas de poder reguladores dos usos e posses) e cultural

(da exposição da necessidade de mudança no modelo civilizacional), conforme arrazoado de

Guattari (1990).

Em função da emergência da questão ambiental, a Comissão Mundial de Meio

Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) resolveu, principalmente, ao longo das duas últimas

4
Concordamos com os autores que a política tem sua importância, mais não deve ser absolutizada. “Nada escapa
à política, mas tudo que é politizado continua de algum modo fora da política.” (MORIN & KERN, 1996,
p.119).
15

décadas, estimular a discussão e a implementação da proposta de Desenvolvimento

Sustentável.

Desenvolvimento Sustentável tornou-se uma palavra chave para a discussão


e ação porque ela parece capturar um amplo sentimento de que o estado da
Terra é algo precário. (MANNION apud WILBANKS, 1994, p. 541)5

A temática e teorização sobre a sustentabilidade6 divulgadas no texto do famoso

Relatório Brundtland (1988), sob o título de “O Nosso Futuro Comum”, dão respostas aos

anseios e preocupações levantados após as discussões da Conferência de Estocolmo em 1972.

As proposições surgiram como chamariz para a UNCED/92 (United Nations Conference on

Environment and Development) realizada na cidade do Rio de Janeiro.

As idéias básicas de Ecodesenvolvimento7 e de Desenvolvimento Sustentável8, já

então bastante discutidas em diversos trabalhos, objetivam a promoção de um crescimento

econômico que seja compatível com a preservação da natureza. Desta forma, propunham

responder às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade das gerações futuras

5
WILBANKS, T. J. Sustainable Development in Geographic Perspective. Annals of the Association of American
Geographers, 84 (4), p.541-56, 1994.
6
O conceito de sustentabilidade é visto como um ponto central na discussão ambiental. Por ele se interpretam
propriedades e atributos dos diferentes sistemas ambientais que compreendem a capacidade de funcionamento,
de produção e de renovabilidade de suas características críticas. Como apontara Rodríguez, desenvolver a
sustentabilidade é um requisito imprescindível em todo processo de desenvolvimento que incorpore a dimensão
ambiental com qualidade, como parâmetro de partida (RODRÍGUEZ, 1997). Para Alva, “A sustentabilidade
pode ser entendida como um conceito ecológico – isto é, como a capacidade que tem um ecossistema de atender
às necessidades das populações que nele vivem – ou como um conceito político que limita o crescimento em
função da dotação de recursos naturais, da tecnologia aplicada no uso desses recursos e do nível efetivo de bem-
estar da coletividade.”. (ALVA, 1997, p. 60-61).
7
Segundo Sachs a concepção de ecodesenvolvimento, que posteriormente foi trocada por desenvolvimento
sustentável, começou a ser gestada a partir da reunião da Organização das Nações Unidas (ONU-EPHE) em
1972. O ecodesenvolvimento seria um “...conceito que podemos definir como um desenvolvimento desejável do
ponto de vista social, viável do ponto de vista econômico e prudente ecologicamente.” (SACHS, 1980, p.719).
8
A Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) apresenta o Desenvolvimento
Sustentável como um “processo de mudança social no qual a exploração dos recursos, o sentido das inversões, a
orientação do desenvolvimento tecnológico e as reformas institucionais se realizam em forma harmônica,
ampliando-se o potencial atual e futuro para satisfazer as necessidade humanas” (CMMAD. 1988, p.49). De
acordo com Becker (1993, p.133), o Desenvolvimento Sustentável relaciona-se a “algo mais que um
compromisso entre o ambiente físico e o crescimento econômico – ele significa uma definição de
desenvolvimento que reconhece, nos limites da sustentabilidade, origens não só naturais como estruturais. Cabe
assim, reconhecer na relação homem-natureza os processos históricos através dos quais o ambiente é
transformado, e a sustentabilidade será uma decorrência de uma conexão entre movimentos sociais, mudança
social e, conseqüentemente, possibilidade de políticas mais efetivas.”.
16

atenderem às suas próprias necessidades (CMMAD, 1988). A solução dos problemas partiria

da concepção do “pensar global, agir local”9.

Não querermos retirar a importância da popularmente chamada ECO/92, como um

fórum que, num momento de ampliação e difusão da comunicação global sobre o tema

ambiental, fez com que várias vozes do mundo pudessem demonstrar suas existências. No

entanto, diversas críticas podem incidir sobre o paradigma do Desenvolvimento Sustentável,

se não o derrubando, pelo menos conduzindo a um repensar sobre esta concepção que,

durante as últimas décadas, quase monopolizou as discussões ambientais.

Partimos da premissa de que a detecção do esgotamento do estilo de

desenvolvimento/crescimento, até agora vigente, nos deve conduzir à busca dos processos

sociais que detonaram a(s) crise(s). É nesses processos sociais que podem surgir soluções,

sabendo-se que as mesmas não advirão das simplificações impostas pelo frenesi tecnológico

que hoje domina às sociedades.

A realidade na qual a discussão ecodesenvolvimentista se apresenta, sugere, todavia,

que barreiras de difícil transposição coabitam com a realização dos propósitos que

conduziriam ao chamado Desenvolvimento Sustentável (GONÇALVES, 1996). As

contradições inerentes à nossa época se fazem presentes também nos postulados do chamado

desenvolvimento harmônico10. Sem ter a pretensão de esgotar a temática, podemos expor

alguns desses contra-sensos, que assombram as idéias e as práticas de sustentabilidade

difundidas num período de globalização (SANTOS, 1991).

9
Concordamos plenamente com Morin & Kern (1996), para quem, as questões são interdependentes no tempo e
no espaço, sendo preciso mobilizar o todo. Supera-se a abordagem reducionista que consiste em remeter-se a
uma única série de fatores para resolver, a totalidade dos problemas que atravessamos. Isto é menos a solução
que o próprio problema. Para estes autores, a fórmula complexa da antropolítica não se limita ao “pensar global,
agir local”. Ela exprime-se pelo “acasalamento pensar global/agir local, pensar local/agir global”.
10
Mais discussões a respeito do Desenvolvimento Sustentável podem ser encontradas no estudo detalhado
realizado por Foladori & Tommasino (2000).
17

O problema do desenvolvimento desigual para as sociedades humanas e nocivo para

os sistemas naturais já é bastante conhecido (SMITH, 1988). Esta afirmação incita um

questionamento: se é sabido e notório que o desenvolvimento equilibrado e sustentado da

humanidade é algo consensual, justificável e legítimo, por que o mesmo não se dá com

eficácia na prática? Quais são as contradições existentes nas propostas que corroboram ao

ecodesenvolvimentismo?

Um primeiro ponto pode ser relacionado à sua aceitação, quase que acrítica, alienada

em relação às dinâmicas sóciopolíticas concretas. Esta forma de concordância também

marcou, durante algum tempo, outras interpretações e processos presentes na conjuntura atual,

tais como, a Planetarização, a Globalização, a Mundialização ou o Capitalismo Mundial

Integrado, segundo já criticaram Morin & Kern (1996), Santos (1994) e Guattari (1990). Estas

aceitações podem nos conduzir a uma sensação de imersão, em função das várias

territorialidades totalitárias e universalistas por elas configuradas. Conforme adverte

Gonçalves (1996), não podemos esquecer que essas territorialidades são processos e têm seus

sujeitos, configurando a existência de interesses diversos e, por vezes, conflitantes.

A crítica à perfeição da proposta de Desenvolvimento Sustentável visa superar o

simples “enverdecimento” do discurso capitalista, sob o signo neoliberal. Layrargues (1996)

analisou o discurso dos empresários ditos verdes e comprovou a sua incoerência,

demonstrando que a racionalidade empresarial é sempre econômica, visa o lucro e, acopla-se

à racionalidade ecológica do Desenvolvimento Sustentável tornando-a simples retórica.

Ao não promover nenhuma mudança estrutural no aspecto civilizacional, esse

discurso, em verdade, escamoteia a análise das dimensões da sustentabilidade (ecológica,

ambiental, social, cultural e outras), impedindo que elas sejam transformadas em critérios

objetivos de política pública. Ao contrário, vivemos num cenário em que os programas de

ajuste estrutural, impostos por organismos internacionais de financiamento e controle


18

econômico, infligem um receituário que reduz os gastos públicos e desregulamenta as

relações de troca, viabilizando a dinâmica de expansão do capitalismo monopolista

globalizado.

Deste modo, em níveis diferenciados, são propostas soluções para os problemas que

supõem mudanças superficiais nas instituições e regras do sistema econômico e financeiro

mundial, sem imprimir uma mudança profunda em nossa forma de organização social e de

interação com os ciclos da natureza (GUATTARI, 1990).

Ampliando a contradição hodierna estabelecida é, justamente, no momento em que o

Estado vem sendo “esquartejado”, como motor do desenvolvimento, e quando o planejamento

governamental é criticado, que o Desenvolvimento Sustentável parece assumir importância. O

que surpreende é que, se pensarmos em sustentabilidade em paralelo à utilização dos recursos,

temos que estabelecer regras claras que a viabilizem, ou seja, um horizonte bem planejado,

voltado também ao longo prazo (gerações futuras), o que necessita de decisões, que mal ou

bem, só têm sido tomadas pelos setores públicos pertencentes ao Estado (BOFF, 1994).

Explicita-se o conflito, numa ótica globalizante, entre idéias estranhas ao mercado

como gerações futuras e longo prazo e a racionalidade que privilegia a alocação ótima dos

recursos no curto prazo. Este fato se comprova ao percebermos a contínua importância dada à

matriz econômica de aumento de produtividade, acumulação e inovação tecnológica

(RIBEIRO, 1995), na qual se quer são previstas resoluções sobre um problema estrutural que

afeta diretamente às condições ambientais em diversas partes do mundo: a pobreza.

Segundo Boff (1996), uma das bases dos documentos de cunho ecodesenvolvimentista

é que a pobreza e a degradação ecológica se condicionam e se produzem mutuamente. Em

função disso, o que polui, se pensa, é a miséria e, quanto menos miséria, menos poluição e

mais ecologia. A aceleração do processo desenvolvimentista ajudaria a garantir um optimal


19

equilíbrio ecológico. Não se vai as razões reais da pobreza, da miséria e da degradação

ambiental.

Apesar do exposto, fogem ao domínio do mercado aspectos como os impactos globais

ligados aos fenômenos climáticos, a biodiversidade, a recuperação de ecossistemas e outros.

Todavia, é espantoso notar como o discurso ecodesenvolvimentista fez uma grande

quantidade de adeptos. Dos mais capitalistas, até uma boa gama dos mais socialistas, espera-

se um sim como resposta ao Desenvolvimento Sustentável. Nasce daí outro questionamento:

quem, realmente, seriam os atores sociais promotores do Desenvolvimento Sustentável?

Configurar-se-iam como os mesmos que criaram e ampliaram a base social do estilo hoje

dominante? (EVASO et al., 1996). O que seria melhor, financiar o desenvolvimento de carros

mais econômicos e com conversores catalíticos ou estimular e financiar, de modo

privilegiado, o transporte público coletivo e de massa eficiente?

Fala-se muito, inclusive, na privatização da natureza, que serviria para garantir a

sustentabilidade do desenvolvimento, a partir do momento em que fosse possível atribuir um

“preço correto” à natureza. Isso evitaria, para alguns, a ambigüidade existente no trato com o

meio ambiente, desconsiderando que, em quase sua totalidade, os recursos naturais e os

processos ecológicos consistem ou ocorrem em patrimônios públicos.

A inexistência, pela alienação da população ou pela ineficácia da ação do Estado,

quando não por ambos, de um ator cujo razão de ser social consista no trato dos recursos

naturais seria suprida pela sua incorporação à uma lógica de funcionamento privada,

atualizada em conformidade com a modernização capitalista. Só há algo que escapa

inexoravelmente: esta lógica superpõe-se e entra em choque com pelo menos uma outra,

insubmissa, que rege o funcionamento dos ciclos vitais da natureza (MOTA, 2001).
20

Observamos que a noção de sustentabilidade11, principalmente nos países semi-

periféricos e periféricos, é estabelecida através de reducionismos12 de uma ou outra restrição

ambiental no processo de acumulação capitalista, sem o real enfrentamento no aspecto

institucional e político que regule a propriedade, o controle, o acesso e o uso dos recursos

naturais. Fala-se em conservadorismo dinâmico pelo qual a inércia dos sistemas sociais

vigentes camufla, resistentemente, as transformações sociais, aceitando o discurso

transformador, precisamente para garantir que o mesmo não tenha eficácia ou seja posto,

realmente, em prática (EVASO et al., 1996)13.

Pleiteamos que há que se reverter a atual onda neoliberal, ou, na pior das hipóteses,

colocar seus postulados no devido lugar. Para isso, o Estado deve ser forte na sua função

reguladora e no planejamento estratégico, sem recorrer aos ranços do passado, deixando para

a ação privada as atividades de natureza estritamente produtiva ou de infra-estrutura

(BORÓN, 1995). Seguindo as proposições de Amador (1997), necessário se faz passar pela

11
Na verdade entendida por alguns autores como “as sustentabilidades”, a saber: “a sustentabilidade ecológica,
incorporando a exploração dos recursos naturais, os custos ambientais, os subsídios necessários para a
urbanização e o planejamento ambiental; a sustentabilidade social, abarcando questões como a pobreza, as
desigualdades étnicas, os direitos políticos, a desigualdade regional e os acessos ao emprego, saúde e a educação;
a sustentabilidade política, levando em conta a cidadania, problemas culturais, econômicos, sociais e políticos,
incluindo os relacionados à instituição política e constitucional das nações e; a sustentabilidade individual,
contemplando valores, crenças, ética e desejos ancorados na arqueologia virtual, interna ‘que possibilite a
reflexão individual no desenho coletivo’.”. (SANTOS & SATO, 2001, p.39).
12
A este respeito vale a pena levar em conta a observação de Redclift (1987 e 1994), fundamentada na
constatação da dificuldade básica em compatibilizar a igualdade social e a sustentabilidade com o
desenvolvimento econômico. Este autor critica, entre outras coisas, o fato de mesmo os educadores ambientais
estarem, freqüentemente, presos às preocupações de caráter especificamente científico ou aos aspectos
eminentemente tecnológicos, deixando de lado dimensões sociológicas importantes na discussão da
sustentabilidade. Acselrad (2000, p.75) também critica a visão sobre a sustentabilidade baseada na idéia de que
existe uma forma social durável de apropriação e uso do meio ambiente, “dada pela própria natureza das
formações biofísicas, ignorando a diversidade de formas sociais de duração dos elementos da base material do
desenvolvimento”. Esta visão imputa um determinismo ecológico e, para o autor, “deve ser superada no sentido
de afastar as visões indiferenciadoras do espaço e do meio ambiente”. Esta constatação, afasta também a
perspectiva de que o espaço e os bens ambientais possam ter um único modo sustentável de uso, ou uma única
lógica de duração, a lógica hegemônica.
13
Morin & Kern (1996) já esclareceram que, muitas vezes, os fatos e acontecimentos perceptíveis escondem
fatos ou acontecimentos não percebidos, podendo mesmo ocultar uma realidade ainda não-visível. Este
pensamento nos mostra que é preciso saber interpretar a realidade antes de conhecer onde está o realismo. A
nossa realidade não é mais do que a nossa idéia de realidade. Existe uma relação de complexidade e incerteza
entre a idéia e o real. “A idéia pode impor-se ao real, mas este nem por isso se conformará à idéia.” (p.106). Na
luta entre a idéia e o real, o real nem sempre é o mais forte. A realidade nem sempre rejeita espontaneamente ou
imediatamente a idéia que a contradiz.
21

análise das causas reais da pobreza e da deterioração ambiental. Estas resultam exatamente do

tipo de desenvolvimento que se pratica, altamente concentrador, explorador de pessoas e bens

da natureza. Caso contrário não superaremos a essência perversa que o capitalismo ora

vigente tem nos imputado.

Preocupados com a perspectiva de alienação possível, alguns autores vêm

retrabalhando a questão do desenvolvimento sustentável de forma crítica, sob uma nova ética

que desafie os pressupostos político-mercadológicos e produtivistas do capitalismo. Entre eles

podem ser destacados os trabalhos de Bermann (1992), Herculano (1992) e Carvalho (1994).

Em todos estes trabalhos uma preocupação ressalta: a superação de um modelo societário

baseado no consumo exagerado, degradante e desigual.

1.3 - RELAÇÕES ENTRE CONSUMO E CIDADANIA NA DIMENSÃO


AMBIENTAL.

Para refletir sobre a dimensão ambiental e a sua relação com o consumo, é preciso,

antes de tudo, começar alertando sobre os perigos envolvidos nesta mediação analítica.

Ensaiamos proporcionar, sem esgotar, uma discussão pautada em aspectos que envolvam a

conformação na qual os diferentes sujeitos sociais encontram-se presentes, de acordo com

seus comprometimentos, contradições sociais, visões de mundo e perspectivas de consumo.

Ressaltamos que o objetivo de discutir as influências e determinações econômicas e

culturais, impostas verticalmente pela racionalidade hegemônica reforçadas, em tempos de

globalização, pelas relações estabelecidas entre os consumidores e o meio ambiente, permite

constituir um retrato das estratégias dominantes e alienantes utilizadas. Possibilita também, ter

indícios sobre possíveis “brechas” que permitirão ações de defesa da cidadania e da vida nos

diferentes lugares do planeta.


22

Partimos de uma constatação inicial básica, capaz de nortear a reflexão acerca do

consumidor e do cidadão, inclusive do ora chamado consumidor verde:

em lugar do cidadão surge o consumidor insatisfeito e, por isso, voltado a


permanecer consumidor. Sua dependência em relação aos novos objetos
limita sua vocação para obter uma individualidade e reduz a possibilidade
dos encontros interpessoais diretos e enriquecedores, porque simbólicos em
sua própria origem (SANTOS, 1993a, p.17).
Nessa perspectiva, o consumidor-usuário é aquele indivíduo a ser persuadido,

objetivando que os padrões de produção e consumo se mantenham suficientes para realização

da acumulação e da circulação desigual do dinheiro em seu estado puro (SANTOS, 2001).

O meio ambiente e as discussões ambientais não poderiam ficar de fora desta lógica

perversa. Eles passam, cada vez mais, a ser incorporados, não somente pelo capital que

degrada, mas pela suposta ação sustentável do mesmo que pleiteia “salva-los”. Estabelece-se

outra forma para consumi-los.

Sob esse ponto de vista, devemos, desde já, esclarecer que nosso posicionamento é

amplamente favorável às discussões sócio-ambientais e à constituição de uma ética ambiental

que sejam, ao mesmo tempo, uma utopia14 e uma cultura15, que examinem as condutas

14
Segundo Schmidt (1983, p. 22) “a realidade é, além disso, tudo aquilo em que ainda não nos tornamos, ou
seja, tudo aquilo que a nós mesmos nos projetamos como seres humanos, por intermédio dos mitos, das escolhas,
das decisões e das lutas.”. Já Canclini (1996, p. 263-264) afirma que a utopia faz parte da vida social enquanto
“dispusermos de uma certa emancipação, ou ao menos tivermos vontade de que a emancipação e a renovação do
real continuem fazendo parte da vida social.”. Outro que nos fornece uma reflexão acerca da utopia é Santos
(2001, p. 332) ao afirmar que “por utopia entendo a exploração, através da imaginação, de novas possibilidades
humanas e novas formas de vontade, e a oposição da imaginação à necessidade do que existe, só por que existe,
em nome de algo radicalmente melhor por que vale a pena lutar e a que a humanidade tem direito. A minha
versão de utopia é, portanto, duplamente relativa. Por um lado, chama a atenção para o que não existe enquanto
(contra)parte integrante, mesmo que silenciada, daquilo que existe, ou seja, para aquilo que pertence a uma
determinada época pelo modo como está excluído dela. Por outro lado, a utopia é sempre desigualmente utópica,
dado que a sua forma de imaginar o novo é parcialmente construída por novas combinações e escalas daquilo
que existe, e que são, na verdade, quase sempre meros pormenores, pequenos e obscuros, do que realmente
existe. A utopia requer, portanto, um conhecimento da realidade profundo e abrangente como meio de evitar que
o radicalismo da imaginação colida com o seu realismo.”.
15
A propósito da influência da cultura na relação do homem com seu meio ambiente, podemos nos remeter a
Hall (1971), cujo trabalho aborda o espaço e o ambiente como produtos culturais. Hall (p.231), objetiva mostrar
a cultura como uma dimensão oculta, “uma realidade escondida que escapa ao nosso controle e constitui a trama
da existência humana”. Para tanto, propõe o termo proxemie designando o conjunto de observações e teorias que
têm por finalidade o uso que o homem faz do espaço e do ambiente. Enquanto trama da existência humana, uma
teia de significados, a Cultura assume, segundo Geertz (1989), uma dimensão semiótica. O comportamento
humano articula a cultura através de suas ações. Este autor (p.24), advoga que “Como sistemas de signos
interpretáveis [...], a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos
23

destrutivas e predatórias das sociedades industriais e pós-industriais, abrindo espaço para

concepções preservadoras e preventivas que possibilitem repensar os usos e costumes da

modernidade e seus impactos nas vidas humanas e ambientais.

Coma afirmara Sposati (2001), é difícil estabelecer o que compõe um padrão básico de

qualidade de vida que faça parte da cultura cidadã de todos, permitindo concluir que “[...] os

fundamentos sobre um produto adequado ainda estão fortemente calcados em apreensões

individuais, apreensões subjetivas, que são recortadas pelas técnicas de marketing e pela forte

desigualdade social [...]” (SPOSATI , 2001, p.16). Para a autora, urge a necessidade de serem

estabelecidas e difundidas condições básicas e substantivas de qualidade de vida para todos,

sem excluir a dimensão ambiental destas condições.

É nesse aspecto que voltamos a questão do consumidor e do cidadão. Como o

consumo mudou de figura ao longo do tempo, as empresas hoje não enredam o consumidor

somente para assegurar a autonomia de uma produção. Atualmente, as empresas hegemônicas

produzem seletivamente o consumidor antes mesmo de produzir os produtos, ou seja, “[...]

um dado essencial para o entendimento do consumo é que a produção do consumidor, hoje,

precede à produção dos bens e serviços.” (SANTOS, 2001, p.48).

O consumidor verde, por mais que seu ativismo o queira convencer do contrário, não

foge a essa rede seletiva. Este consumidor verde não consegue deixar de ser

o indivíduo que reproduz, em seu nível mais profundo, na sua estrutura de


instintos, os valores e os padrões de comportamentos que servem para
manter a dominação, enquanto a dominação se torna cada vez menos
autônoma, menos ”pessoal”, mais objetiva e mais universal. O que o domina

sociais, os comportamentos, as instituições, ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem
ser descritos de forma inteligível, isto é, descritos com densidade.”. Morin (2000b, p. 56), a respeito da
diversidade cultural, afirma que “Diz-se justamente a cultura, diz-se justamente as culturas.”. O autor segue,
apresentando a cultura como “constituída pelo conjunto dos saberes, fazeres, regras, normas, proibições,
estratégias, crenças, idéias, valores, mitos, que se transmite de geração em geração, se reproduz em cada
indivíduo, controla a existência da sociedade e mantém a complexidade psicológica e social. Não há sociedade
humana, arcaica ou moderna, desprovida de cultura, mas cada cultura é singular. Assim, sempre existe a cultura
nas culturas, mas a cultura existe apenas por meio das culturas.”
24

é o aparelho econômico, político e cultural, que se tornou uma unidade


indivisível construída pelo trabalho social (MARCUSE, 1970, p.3).

A universalidade da cidadania e da liberdade que a modernidade preconiza não ocorre

para todos e, perversamente, a legitimidade desse paradigma se reproduz no imaginário,

independentemente da qualidade de seus resultados práticos. Bem como já abordara Marcuse

(1970, p.3), “Psicologicamente, é só isso o que aqui nos preocupa, a diferença entre

dominação e liberdade está se tornando menor.”. Dá-se pelo consumismo e pela

competitividade, uma alienação do sujeito, igualando o consumidor ao cidadão, o

consumismo à cidadania.

Cabe inferir, que ao tratarmos de cidadania não falamos de uma visão ingênua da

mesma. Temos em mente suas múltiplas dimensões e estruturações em sociedades capitalistas

intituladas como democráticas. Nestas sociedades, o conteúdo contraditório e ambivalente da

problemática da cidadania reflete a existência de um terreno de disputa social, política,

econômica e cultural, envolvendo restrições, exclusões, inclusões e negociações. Assim, como

apontara Afonso (2001), a cidadania se transforma em uma categoria dinâmica e inacabada.

Para este autor,

se por um lado, as políticas sociais e educacionais, em um contexto


capitalista, podem ser interpretadas como instrumentos de controle social e
como formas de legitimação da ação do Estado e dos interesses das classes
dominantes, por outro lado, também não deixam de poder ser vistas como
estratégias de concretização e expansão dos direitos sociais, econômicos e
culturais, tendo, neste caso, repercussões importantes na melhoria das
condições de vida dos trabalhadores e dos grupos sociais mais vulneráveis às
lógicas da exploração e da acumulação capitalistas (AFONSO, 2001, p.22).

Também compete esclarecer, ao tratarmos da participação dos cidadãos nos processo

sociais, que atentamos para o modo como a idéia de participação foi igualmente desvirtuada

pelos paradigmas16 e racionalidades hegemônicos presentes na ciência e no pensamento

16
Para Morin, “O paradigma desempenha um papel ao mesmo tempo subterrâneo e soberano em qualquer teoria,
doutrina ou ideologia. O paradigma é inconsciente, mas irriga o pensamento consciente, controla-o e, neste
25

clássicos, causando confusões que, ora tornaram a participação instrumento de objetividade

racional e coletiva, ora tornaram-na lugar de preocupação com a individualidade e com a

afetividade (SAWAIA, 2001).

Essa situação se agrava, ao verificarmos que, até no denominado movimento

ambientalista, manifestam-se posições de aceitação e de abandono de premissas básicas. Em

troca do direito de participar da elaboração de políticas setoriais, parte de seus integrantes e

ativistas incorporam-se às “ações verdes” promovidas por agentes do mercado (firmas e

empresas) que, de modo oportunista, utilizam como “bandeira” atos isolados de preservação

associados, geralmente, às explorações, ditas racionais, dos recursos naturais (ALEXANDRE,

2000). Como aponta este autor, deu-se a banalização da problemática sócio-ambiental, que

passou a ser anexada para justificar e premiar os empreendedores do chamado ecobussiness.

Estes negócios tornaram-se relevantes, principalmente quando os ditos “empresários verdes”

se deram conta de que os investimentos milionários mundiais, envolvendo o controle

ambiental, já faturavam, na década de 1990, no mundo, mais que a indústria bélica e, no

Brasil passaram do bilhão por ano.

Alexandre deixa claro que:

na pauta dos conflitos e discussões dos maiores problemas sócio-ambientais,


o cerne da problemática ambiental, entretanto, não é tratado, ou seja,
mudanças drásticas nos valores morais e estilos de vida. Sempre transparece
que arranjos setoriais e particularizados darão respostas à crise sócio-
ambiental generalizada que é conseqüência do modelo de desenvolvimento
econômico neoliberal predominante no mundo globalizado e requer sempre
mais produção com mais estímulo ao consumo, gerando um processo de
alienação no trabalho com repercussão na cultura, no lazer etc.
(ALEXANDRE, 2000, p.30).

Nesse contexto novo, ainda dificilmente interpretado e desvendado e, por conseguinte,

confuso tanto na mente dos estudiosos quanto no senso comum, a relação da sociedade com a

sentido, é também supraconsciente. Em resumo, o paradigma instaura relações primordiais que constituem
axiomas, determina conceitos, comanda discursos e/ou teorias. Organiza a geração deles e gera a geração ou a
regeneração.” (MORIN, 2000a, p. 26).
26

natureza permanece obscurecida. O distanciamento entre o homem e a natureza impede a

visualização daquilo que todos buscam. Acontece a incorporação da natureza e a sua redução

a um recurso natural, a uma mercadoria que, em última instância, passa a ser adquirida sob o

signo da apropriação com qualidade, servindo com perfeição aos discursos técnico-científicos

atualizados, viabilizando a dita geração racional da riqueza, assim como, novas pesquisas

politicamente corretas sobre esses recursos.

Observamos que uma série de vieses são omitidos nos discursos sobre o meio

ambiente, sendo que a corrida pela matéria-prima e a materialização de novas necessidades

transformam tudo que é ambiental em mercadoria. O entendimento adequado somente será

possibilitado pela análise crítica dos mesmos. Caso contrário, persistirá o domínio da visão

mercadológica, na qual toda a natureza se torna passível de utilização direta ou indireta, ativa

ou passiva, econômica ou política.

Instala-se o reino anônimo do dinheiro em estado puro17, que progride, associado ao

reino anônimo da técno-burocracia. Estes estipulam os lugares sociais, com ações

diferenciadoras e desintegradoras, através do espírito da competição e da fabricação do

sucesso. Tudo é intermediado pela técnica e por seus agentes. Para que estes possam ser

alcançados, o homem produtor subordina-se ao homem consumidor, aquele ao produto

vendido no mercado, e esse último às forças libidinais cada vez menos controladas, num

processo em que se cria o consumidor para o produto e não o produto para o consumidor. É

este homem que perde a identidade com seu entorno.

Em paralelo às fragmentações surgem tentativas humanas de recomposições. Assim

sendo, a natureza ressurge por meio de demandas passíveis de consumo através das

decorações dos lares, da busca do descanso, dos paraísos ecoturísticos, atingindo um afã
17
Segundo Santos, “O consumo, tornado denominador comum para todos os indivíduos, atribui um papel central
ao dinheiro nas suas diferentes manifestações; juntos, o dinheiro e o consumo aparecem como reguladores da
vida individual. O novo dinheiro torna-se onipresente (...) O resultado objetivo é a necessidade, real ou
imaginada, de buscar mais dinheiro.” (SANTOS, 2001, p. 56).
27

ecológico, que acentuou a procura do “natural” em todos os domínios, chegando até à

alimentação. Nem as paixões escaparam. Nelas tanto pessoas, quanto lugares e paisagens,

consomem e são consumidas depressa, criando, paradoxalmente, amores que se enfraquecem

ao se multiplicarem, se fragilizando com o tempo, de tal modo, que novos amores matam os

antigos.

Nesta espiral, inclui-se o homem, insatisfeito em seu desejo de estar no mundo e

dominá-lo com o outro. Consumir o satisfaz e não o satisfaz, o consumo não é felicidade. O

consumo e suas redes querem integrar. Mas, como já argumentara Lefebvre (1991, p.104),

“[...] integrar o quê?”. Aliás, o próprio Lefebvre, indica que o fim, o objetivo, a legitimação

oficial dessa sociedade18 é a satisfação, entendida como uma saturação tão rápida quanto

possível. De fato e em verdade, paira um mal-estar, centrado na crise de valores, das idéias, da

arte, da cultura efêmeros.

Além disso, há o mandamento tecnológico que possibilita a produção em grande

escala, utilizando um mínimo de emprego de mão-de-obra, deslocando o imperativo social do

eixo renúncia-trabalho, para o da acumulação e do consumo. Neste sentido, é possível

constatar que

o imperativo do gozo substitui a interdição do excesso, e embora gozar


plenamente seja impossível para o ser humano, é isto o que o supereu,
reproduzindo os discursos dominantes e os valores em circulação, exige dos
sujeitos. [...] estamos diante dos efeitos produzidos pelo apagamento das
diferenças. [...] mas não daquelas artificialmente mantidas, e sim das
diferenças subjetivas, condição de nossa humanidade, de nossa incompletude
humana, de nossa dependência em relação ao outro. [...] o cidadão ideal da
sociedade de consumo acredita que possui e domina o objeto de desejo, uma
série infindável deles, e que portanto está livre da condição de desejar o
desejo do outro. [...] quanto às diferenças de direitos, de privilégios e de
distribuição de riquezas, bem – a suposição de uma anulação geral da
semelhança na diferença nos torna cada vez mais indiferentes a elas (KEHL,
1999, p. 94-95).

18
A qual o autor intitulou de “Sociedade Burocrática de Consumo Dirigido”. (LEFEBVRE, 1991, p.77).
28

A grande questão, é que uma forma social não existe descolada de um sistema

simbólico e de uma totalidade social nas quais faça sentido. Ocorre uma falsa premissa, que

se reforça pela oferta de mercadorias e pela onipresença das solicitações da publicidade,

lançadas, agora, pela mídia eletrônica: nada se perdeu, e temos à nossa disposição uma

infinidade de objetos para simular o objeto perdido de nosso mais-gozar. Não há separação

por camadas ou cortes entre o consumo do objeto e o consumo dos signos, imagens,

representações de que o objeto fornece com o meio e os suportes sensíveis. “Consumo

imaginário, consumo do imaginário – os textos de publicidade – e consumo real não têm

fronteiras que os delimitem.” (LEFEBVRE, 1991, p. 100).

A constante insatisfação se tornou o principal motor, alavancando e dinamizando o

sistema. Os objetivos essenciais são reduzidos pelo inflar do desejo sobre as coisas, sobre sua

conquista e aquisição. Os indivíduos medem o valor das mercadorias que intercambiam e se

medem uns pelos outros, assim como, aferem seu próprio valor, pelo valor das mercadorias

que trocam (KEHL, 1999). Neste processo, com certeza, não sentem o que as mercadorias

escondem. O consumo instala sua fé por meio dos objetos que nos cercam em nosso

cotidiano, pela presença imediata e, pela promessa ou esperança de obtenção de algo que o

homem não consegue definir .

Para Baudrillard (1995), acomoda-se, com a sociedade de consumo, uma sociedade de

aprendizado do consumo, condicionadora social do mesmo. Esta sociedade cria um novo e

específico modo de socialização, contribuinte de um sistema econômico em alta

produtividade, gerando o que Mészáros (1971, p.53) adjetivou como “uma sociedade de

consumo que produz desperdícios.”. Em nosso país, segundo observado por Santos (1993a,

p.40), temos o denominado “consumidor mais-que–perfeito”: um não-cidadão que, às vezes,

se julga, através do voto, enquanto eleitor, um completo cidadão, embora seja impedido de

realizar suas potencialidades, como participante ativo e dinâmico de uma comunidade. Na


29

verdade, acaba por se constituir, como consumidor, apenas num “imbecil feliz”, conforme

citado por Santos, a partir da alusão de Laborit (1986, p. 201).

1.4 – AFIRMANDO A COMPLEXIDADE DA QUESTÃO AMBIENTAL

Como o cidadão imperfeito acaba alijado do entendimento do próprio quadro da vida,

da natureza e do entorno humano, carregado de significações sobrepostas, devemos buscar o

entendimento complexo desse quadro a fim de apreendermos que a capacidade de utilizar o

território não apenas divide, como separa os homens, ainda que eles apareçam como se

estivessem juntos (SANTOS, 1993a).

No mundo atual, o poder hegemônico capitalista se deslocou, se desterritorializou, em

extensão, ampliando seu domínio sobre o conjunto da vida social, econômica e cultural, e em

intenção, infiltrando-se no seio dos mais inconscientes estratos subjetivos. Nesta teia

enganosa, o indivíduo participa como usuário. Compromete-se a comprar o ar puro, a água

pura, os bosques, ou a consumir a natureza artificializada e instrumentalizada ao extremo.

Quem não pode pagar, até mesmo por bens essenciais que deveriam ser públicos, fica

excluído do gozo desses bens. Há a materialização constante de novas necessidades, inclusive

redescobrindo a natureza, visando obter uma suposta vida digna e humanizada, que se

estabelece pela tentativa de transformá-la em mercadoria, assim como, criar novos mercados e

usuários.

O homem produz um “espaço natural” artificial, principalmente nas grandes cidades.

Mas como esta produção, com base numa racionalidade hegemônica, está a serviço de um

conjunto de idéias e agentes hegemônicos, na escala do lugar e nos diferentes lugares

produzem-se, em paralelo, a carência e a escassez. Santos (2001, p.129) considera que “a

situação contemporânea revela, entre outras coisas, três tendências: uma produção acelerada e

artificial de necessidades; uma incorporação limitada de modos de vida ditos racionais; uma

produção ilimitada de carência e escassez”.


30

Para os não-possuidores, viver na escassez gera conflitos e até guerras. A cada dia

enfrentam uma nova experiência de escassez. Individualmente não têm força de negociação.

Sua sobrevivência está baseada na renovação imperativa de suas experiências, fundadas em

bens infinitos, tais como, a solidariedade e a liberdade. Suas ações não deixam de caracterizar

a vitória do “fraco” sobre o mais “forte”. Desenvolvem táticas baseadas em astúcias, que

permitem a sobrevivência criativa “dentro do campo de ação do inimigo”, superando as

estratégias de consumo pré-determinadas pelas firmas, pela mídia mercadológica e as regras

estabelecidas pelo Estado, em prol das mesmas. Acabam, como apontara Certeau (1994), por

realizar operações de uso que aproveitam as ocasiões e dão pertinência ao tempo vivido,

transformando o desfavorável em favorável. Mudam, com a rapidez dos “homens lentos”19,

por continuidades e permanências, a organização de espaço, através das práticas cotidianas.

“As táticas do consumo, engenhosidades do fraco para tirar partido do forte, vão desembocar

então em uma politização das práticas cotidianas.” (CERTEAU, 1994, p.45).

Ocorre que hoje, não somente os pobres sentem no cotidiano a experiência da

escassez. A chamada classe média vem passando, nos últimos anos, de forma progressiva,

uma situação existencial cada vez mais incerta no que diz respeito ao emprego, ao salário, a

moradia, a saúde, ao lazer, a aposentadoria, a qualidade de vida e ao endividamento constante,

que colocam em risco suas aspirações de futuro sempre emergente. Como seus privilégios de

consumo são banalizados no corpo social fragmentado, as soluções oferecidas

estrategicamente pelo mercado e pelo Estado não destacam as classes médias como

determinantes para a partilha do poder. Enquanto “consumidores-mais-que-perfeitos”,

tendem a culpar, por sua situação nova e desconfortável, aqueles que, como o mercado e a

mídia, possibilitaram sua herança existencial dantes privilegiada, os políticos. Assim, como

reflexo, acabam por desejar menos política, resultando menos participação.

19
Expressão utilizada por Milton Santos para caracterizar os pobres, os “de baixo”.
31

Segundo Santos (2001, p.138) “a atual experiência da escassez pode não contribuir

imediatamente à desejável expansão da consciência”. Mas, passada a fase inicial de

manifestações individualistas, um momento posterior, com reflexões mais aprofundadas no

tecido social, pode gerar um nível qualitativo superior, caracterizado por apreensões mais

sistêmicas e complexas do processo social e da totalidade em movimento. Esta condição pode

possibilitar, por sua vez, a instalação de um processo importante de busca de novos valores.

Como efeito, apesar de um dos elementos, ao mesmo tempo ideológico e

empiricamente existencial da globalização, ser a centralidade do consumo, as atuais relações

instáveis de trabalho, os problemas ambientais, a expansão do desemprego, o crescimento das

violências e a baixa do salário médio, entre outros, contrastam em relação à multiplicação dos

objetos e serviços, à degradação das relações pessoais e ambientais, tornando improvável o

acesso aos mesmos, assim como, impossível suas obtenções para grande parte da população.

Tais impactos refletem-se nas classes médias submetidas às visões oferecidas pela

propaganda ostensiva e pela ideologia contida nos objetos e nos discursos. Os símbolos pré-

contruídos, o império das normas, satura-se, gerando conflitos, apontando os limites das

ideologias e, permitindo a ampliação do campo da consciência e da participação (SANTOS,

2001).

Entendemos que no período atual, supera-se, através de análises complexas, a visão da

participação como um fenômeno dicotomizado entre razão e emoção, entre público e privado

ou como algo produzido e vivido fora do sujeito. Ao falarmos em participação estamos

nos posicionando sobre concepções de sociedade, de cidadania, de ética e de


justiça, bem como sobre educação popular e movimentos sociais,
desigualdade e exclusão social. [...] falar que o ser da participação é definido
fora dele, na sociedade, e que, portanto, varia historicamente, não é afirmar
que a participação está fora do indivíduo, independente da subjetividade e
que é, ontologicamente, um fenômeno objetivo. [...] o ser da participação é
definido na sociedade e na subjetividade. [...] o ato de participação do sujeito
é determinado pelos modelos dominantes de participação social, mas é
32

organizado num contexto de subjetividade como experiência existencial,


impregnada de emotividade. (SAWAIA, 2001, p.120 e 123).

O processo de tomada de consciência é diferenciado segundo os lugares, as classes

sociais ou situações profissionais e os indivíduos. Todavia, para qualquer mudança neste

estado de coisas, todo cuidado é pouco. A consciência da diferença pode conduzir

simplesmente à defesa individualista do próprio interesse, sem alcançar a defesa de um

sistema alternativo de idéias e de vida. Não vamos aqui confundir individualismo e

individualidade20. Tratamos de uma contextura social baseada na existência de

individualidades fortes que ultrapassam a barreira da práxis repetitiva e se instalam em uma

práxis libertária21.

Em consonância com essas idéias, Kostrowichi (1988) já atentava que, qualquer que

seja nosso pensamento sobre os problemas ambientais, devemos ter em mente, sempre, que

estes problemas são, antes de tudo, sociais. Nesse sentido faz-se mister, por um lado, o

conhecimento das fontes psicológicas de avaliação relacionadas ao ambiente, aos hábitos

culturais, à receptividade, à informação, e de outro, às motivações biológicas das escolhas. O

conhecimento das bases psico-fisiológicas tem um papel particularmente importante no

estudo dos problemas ambientais. Sem integrarmos os aspectos psicológicos e sociais no

modelo de compreensão e “otimização” do meio, nos arriscamos a construir ou propor

soluções e mudanças que, embora sejam plenamente justificáveis do ponto de vista científico,

serão recebidas “friamente” ou mesmo tratadas como “desumanas” e, por conseqüência, não

serão aceitas pela sociedade. Esta visão aproxima-se da elaborada por Guattari (1990), para

20
Não advogamos valorizar perspectivas individualistas. Ao contrário, foge-se do individualismo enquanto
momento ilusório de liberalização das individualidades para melhor domina-las através do mercado e de outros
instrumentos de dominação. Como apontara Sawaia, realizada desta forma, a ação individualizadora cria um
“Momento que reconhece a multiplicidade entre os homens e a liberdade de ser diferente, mas impede a
comunicação entre os diferentes e trabalha num sentido de esmagamento uniformizante.” (SAWAIA, 1998, p.
100).
21
Ver práxis em LEFEBVRE, H. Critique de la vie quotidienne. Paris: Éditions l’Arche , V. I: “Introduction”,
1958, p. 240.
33

quem é essencial que se organizem novas práticas micro-políticas e micro-sociais, novas

solidariedades, uma nova suavidade, juntamente com novas práticas estéticas e novas práticas

analíticas das formações do inconsciente. Certeau (1994) chama a atenção, para a necessidade

de serem pensadas todas essas práticas até aqui tão negadas pela própria epistemologia da

ciência e, aprofunda ao afirmar que :

Cada vez mais coagido e sempre menos envolvido por esses amplos
enquadramentos, o indivíduo se destaca deles sem poder escapar-lhes, e só
lhe resta a astúcia no relacionamento com eles, “dar golpes”, encontrar na
megalópole eletrotecnicizada e informatizada a “arte” dos caçadores ou dos
rurícolas antigos. A atomização do tecido social dá hoje uma pertinência
política a questão do sujeito. Comprovam-no os sintomas que são as ações
individuais, as operações locais e até formações ecológicas pelas quais se
preocupa, no entanto, de modo prioritário, a vontade de administrar
coletivamente as relações com o meio ambiente (CERTEAU, 1994, p.52).

Verificamos, que as relações da humanidade com o socius, com a psique e com a

natureza tendem a se deteriorar cada vez mais, não só em razão de nocividades e de

degradações poluentes objetivas, mas também pelo desconhecimento e pela passividade

fatalista dos indivíduos e dos poderes com relação a essas questões consideradas em seu

conjunto (GUATTARI, 1990). Isto também vale para atentarmos em não nos deixar conduzir

por discursos ambientais que utilizam a mesma lógica dos atores hegemônicos, tentando

“provar” e “medir” o valor da natureza e dos recursos naturais.

Um exemplo disto pode ser visto na reportagem “O valor do verde”22 que apresenta

uma pesquisa sobre os benefícios proporcionados aos seres humanos pela ação de dezesseis

grandes ecossistemas terrestres estudados. Inferem-se valores que remontam a casa dos 33

trilhões de dólares anuais, relativos aos benefícios desses ecossistemas sobre as diversas

atividades humanas, incluindo as atividades produtivas mais modernas. Não obstante as cifras

sejam gigantescas, equivalendo a quase duas vezes toda a riqueza produzida no mundo

anualmente, seus impactos e influências foram mínimos. Seus resultados perderam-se num
22
O valor do verde: estudo calcula em cifrões os benefícios que alguns ecossistemas geram para a humanidade.
TRAUMANN, T. - Revista Veja, 04/06/97, p. 80-81.
34

turbilhão de cifras e notícias que, cotidianamente, assistimos sobre a economia e sobre a

ecologia, sem que haja qualquer correspondência com possíveis mudanças nas ações que,

efetivamente, possam promover a diminuição da degradação ambiental e dos desajustes sócio-

ambientais presentes em nossa sociedade. As distorções no processo servem como

desinformação. Ajudam muito mais aos lobbies relacionados às técnicas dominadas por

agentes hegemônicos que à população em geral.

De pouco adiantará apostar no milagre dos volúveis consumidores verdes

(CAIRNCROSS, 1992) que ascenderam e cresceram em diversos lugares do mundo,

principalmente nos países ricos, juntamente com a propaganda verde. Muitas dessas

propagandas são feitas para aproveitar o consumismo verde sem que realmente os produtos

enverdecidos comprovem seus efeitos ou benefícios para o ambiente ou para seus usuários.

Podemos associar esta discussão à anteriormente travada sobre o desenvolvimento

sustentável, na qual a modalidade legítima de duração (manutenção no tempo) é, em grande

parte, um meio de tornar objetiva a dominação de tal modalidade, uma estratégia23,

justificando sua difusão em substituição às modalidades tidas como não-legítimas. Neste caso,

como já apontara Acselrad (2000, p.76),

a perspectiva de fazer durar o meio ambiente enquanto capital, por exemplo,


seria um meio de legitimar as formas mercantis em lugar de formas não-
mercantis de regulação dos meios materiais do desenvolvimento; de
legitimar a propriedade privada em lugar das formas comunais de
apropriação dos recursos ambientais.

Na verdade, o “bom comportamento” ou a “boa reputação” verde, vem se tornando

apenas mais um dentre uma série de modalidades e indicadores de qualidade que

consumidores e empresas procuram quando compram ou quando vendem. Não há como

23
Segundo Certeau a estratégia é “o cálculo das relações de força que se torna possível a partir do momento em
que um sujeito de querer e poder é isolável de um ‘ambiente’. Ela postula um lugar capaz de ser circunscrito
como próprio e portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações como uma exterioridade distinta
[...]”. Para o autor, “[...] as estratégias escondem sob cálculos objetivos a sua relação com o poder que os
sustenta, guardado pelo lugar próprio ou pela instituição.”. (CERTEAU, 1994, p.46-47).
35

acreditar que estes consumidores possam ser, fora da lógica de sua transformação em

cidadãos, indivíduos que escapem à racionalidade econômica e à ideologia dominante da

sociedade industrial e pós-industrial de consumo.

Como apontara Portilho24, “o consumo verde, ao contrário de promover um

enfrentamento da questão da esgotabilidade dos recursos naturais, atende à continuidade dos

privilégios da sociedade afluente”, sendo claro que o consumo verde assume, em função da

ameaça ecológica alardeada, um caráter de consumo com obrigação “cívica”. Este

constrangimento difere, diametralmente, da recuperação do cidadão, através das diversas

práticas participativas, como ser consciente de seu pertencimento à coletividade, de possuidor

de identidade (individual e coletiva) e de direitos civis, políticos e sociais. Sinalizamos,

solidariamente, na direção de um modelo cívico autônomo, que não se subordina ao modelo

econômico25, partindo do cidadão para a economia e não ao contrário (SANTOS, 1993a).

Cabe sublinhar que, para alguns pensadores, o primeiro passo nesse projeto já está em

curso. Para apreendê-lo, Certeau (1994, p.52), nos indica a necessidade de investigação das

alianças microscópicas, multiformes, microbianas e inumeráveis daqueles que precisam criar,

manipular e gozar, a realidade fugidia e massiva de uma atividade social que joga com sua

ordem hegemônica. Através dela, entre suas “brechas”, os usuários se reapropriam do espaço

organizado, reorganizando-o pois, “Essas maneiras de se reapropriar do sistema produzido,

criações de consumidores, visam uma terapêutica de socialidades deterioradas, e usam

técnicas de reemprego onde se podem reconhecer os procedimentos das práticas cotidianas”.

24
PORTILHO, F. Consumo “verde”, democracia ecológica e cidadania: possibilidades de diálogo? Disponível
na World Wide Web: <http://www.rubedo.psc.br/Artigos/consumo.htm>, citado em 04 de fevereiro de 2003.
25
“O que condena o sistema de valorização capitalístico é seu caráter de equivalente geral, que aplaina todos os
outros modos de valorização, os quais ficam assim alienados à sua hegemonia” (GUATTARI, 1990, p.51).
36

Tal entendimento aproxima-se daquele que se baseia na perspectiva de

estabelecimento de uma cultura emancipatória, levando a cabo a subjetividade emergente26,

na qual os sujeitos se caracterizam pela presença efetiva, através da defesa de propostas com

argumentos, com capacidade de decisão e pela construção coletiva. Esta cultura emancipatória

se funda, por conseguinte, em formas novas de conhecimento, tornadas possíveis através de

solidariedades coletivas. Implica, como princípios, a coragem de construir uma utopia e

reinventar um mapa emancipatório, que não seja mais um mapa de regulação e, ao mesmo

tempo, reinventar uma subjetividade individual e coletiva, capaz de usar e querer usar esse

mapa.

A propósito, Guattari (1990) tem a convicção, de que a questão das subjetividades

colocar-se-á, progressivamente, à medida que se desenvolverem as máquinas produtoras de

signos, de imagens, de sintaxe, de inteligência artificial, derivando “uma recomposição das

práticas sociais e individuais agrupáveis segundo três rubricas complementares – a ecologia

social, a ecologia mental e a ecologia ambiental – sob a égide ético-estética de uma ecosofia”

(GUATTARI, 1990, p.23).

O mapa das emancipações contrapõe nos espaços estruturais27 o modo como os

mesmos estão regulados na atualidade. Especificamente, em relação aos espaços da produção,

do mercado e da cidadania, Santos (2001) indica, a constituição da produção ecossocialista, a

26
De acordo com Boaventura Santos, simultaneamente individual e coletiva, constituída por um conhecimento
prudente para uma vida decente, que vive na fronteira, desenvolvendo novas formas de sociabilidade,
hibridizando-se, de forma criativa, imaginária e descontínua como o barroco a partir de referências culturais
solidárias e emancipatórias do Sul (SANTOS, 2001). Convém mencionar que esta interpretação aproxima mais
ainda os dois Santos – Boaventura e Milton - para quem a centralidade da periferia, a ruptura com o centro do
sistema, sairão do Sul, dos países subdesenvolvidos, numa outra globalização, dos “de baixo”, que permitirá uma
revanche da cultura popular sobre a cultura de massa, assemelhando-se à valorização do barroco e do cotidiano
vivido solidariamente.
27
São eles: o espaço doméstico, o espaço da produção, o espaço de mercado, o espaço da comunidade, o espaço
da cidadania e o espaço mundial. “Estes espaços são os conjuntos mais elementares e mais sedimentados de
relações sociais nas sociedades capitalistas contemporâneas.” (SANTOS, 2001, p.272).
37

valorização das necessidades humanas e do consumo solidário e o surgimento de uma

democracia radical ou do socialismo-como-democracia-sem-fim28.

1.5 – O CENÁRIO CIENTÍFICO: POLISSEMIA E FRAGMENTAÇÃO NAS


DISCUSSÕES AMBIENTAIS

De acordo com Kostrowichi (1988), a maior parte das pesquisas científicas sobre o

meio ambiente, no qual o homem vive, têm sido feita pelos ecólogos e técnicos. São eles,

principalmente, os responsáveis pelo estado atual do conhecimento sobre o ambiente, e a

maioria dos trabalhos científicos divulgados neste domínio são obras suas. São eles enfim

que, de alguma maneira, impuseram à sociedade a concepção destas questões como problema

antes de tudo biológico, técnico e econômico. Entretanto, nem a técnica, nem as ciências

biológicas e, muito menos, a economia, apesar de suas importâncias reais, estão em condição

de resolver sozinhas estes problemas tão complexos.

Somada às preocupações ambientais, inerentes ao contexto contemporâneo

apresentado, surge uma outra evidência: na comunidade científica não existe um consenso

sobre o que vem a ser meio ambiente, em função do seu caráter difuso e variado, o que fez

com que Reigota (1995, p.14), preferisse aceitar a noção de meio ambiente como sendo uma

Representação Social (RS) “tendo em vista sua equivalência a um conjunto de princípios

construídos interativamente e compartilhados por diferentes grupos que através dela

compreendem e transformam sua realidade”.

Diversas são as definições de Meio Ambiente estabelecidas por profissionais de

diferentes campos do conhecimento e, mesmo dentro do mesmo campo é possível

encontrarmos definições distintas. Segundo Moraes (1997), Meio, para um geógrafo ou um

biólogo, é um habitat; para um economista, refere-se a instrumento ou fator (de produção, de

28
Para aprofundar, Santos (2001, capítulo 6, p. 229-344).
38

circulação etc.). Os exemplos poderiam ser multiplicados, assim como, a confusão gerada

pela diferenciação de linguagens e visões.

Para o ecólogo, Ternissien (1981, p.121),

meio ambiente é o conjunto, em um dado momento, dos agentes físicos,


químicos e biológicos e dos fatores sociais suscetíveis de ter um efeito direto
ou indireto, imediato ou a longo prazo sobre os organismos vivos e as
atividades humanas.

Para o geógrafo/economista Argento (1994, p.64), “é um conjunto estruturado de

dados em área (espaço).”.

Para outro geógrafo, Pierre George (1973, p.49),

meio ambiente é o meio global com o qual se defrontam as coletividades


humanas e diante do qual elas se encontram em situação de relacionamento
dialético, feito de ações e de reações, e que põe em campo todos os
elementos do meio. Dependendo do nível técnico da civilização dos grupos
humanos e da influência exercida pelo meio natural, o meio ambiente surge
predominantemente como obra da natureza ou como obra humana;
finalmente, em seu interior desenrolam-se processos físicos e fisiológicos
que os homens desencadeiam e controlam, ou aos quais devem se submeter,
tanto nas condições de sua existência como em sua própria substância.

De acordo com Morin (2000a), a revolução das recomposições multidisciplinares está

longe de ser generalizada e ainda somos vítimas da enorme disjunção natureza/cultura,

animalidade/humanidade, sempre desmembradora de nossa natureza de ser vivo, estudada

pela biologia, e de nossa natureza física e social, estudada pelas ciências humanas. Estes

desmembramentos são derivados, entre outros aspectos, da racionalidade científica29 baseada

29
Interessante perceber a influência da tradição filosófica nesta construção. Stengers & Schlanger (1989, p.24-
25), apontaram que “Na tradição filosófica que associamos aos nomes de Platão e Aristóteles, o intelecto tem o
poder de atingir, para além das aparências contingentes, o próprio ser das coisas”. Os conceitos traduzem, na
interpretação de Acselrad (2000, p.75), este poder. Haveria, segundo o autor, uma relação de forças entre os
fenômenos e os cientistas que os pretendem descrever, pois o conceito daria a quem o opera algum tipo de poder
de previsão, de generalização ou de legitimação científica de práticas sociais. Desta forma, o conceito traduz o
poder de o intelecto atingir o ser das coisas, tendo, por conseguinte, o poder de objetivar representações, fazendo
valer como legítimos, no real concreto, os esquemas ordenadores e classificatórios da construção intelectual. A
enunciação conceitual é, portanto, também produtora de ordenamentos, divisões e classificações no interior do
mundo social. Em relação a este aspecto, Chartier (1990, p.17-18), já apontava que “os esquemas geradores das
classificações e das percepções, próprios de cada grupo ou meio, são verdadeiras instituições sociais que
39

numa concepção positivista e cartesiana a respeito da natureza “como sendo uma espécie de

mecanismo passivo, eterno e reversível, passível de se deixar desmontar e depois relacionar

sob a forma de leis.” (FONSECA, 2001, p.40).

Carvalho (2001) argumenta que é sob o domínio de uma tradição naturalista e

cientificista, advinda das ciências naturais, que emerge o campo ambiental30. Esta

caracterização, conforme aludido pela autora, subsume o meio ambiente à natureza e esta

como espaço do natural em contraposição ao mundo humano.

Tal situação é atualmente questionada, com a emergência de um saber ambiental

problematizador da razão instrumental, apontando para um campo discursivo ambiental não

naturalista. Abandona-se uma conceituação realista ou naturalista de meio ambiente, na qual o

mesmo encontra-se reduzido às suas condições e leis físicas de funcionamento. Aproxima-se,

em oposição, uma visão das questões ambientais como questões evidenciadas através dos

sentidos culturais e políticos em ação nos processos de interação sociedade-natureza, nos

tempos e nos espaços31. Deste modo, permitem e são interpretações mobilizadoras dos

diversos interesses e intervenções humanas no meio ambiente. A humanidade ao produzir sua

cultura, cria no seio de suas relações, normas, valores e regras de convívio que são peculiares

incorporam sob a forma de categorias mentais e de representações coletivas as demarcações da própria


organização social”.
30
Carvalho (2001) utiliza-se da noção de campo ambiental, espaço estruturado e estruturante, que inclui uma
série de práticas e políticas, pedagógicas, religiosas e culturais, organizadas de forma mais ou menos instituída,
no âmbito do poder público ou em diferentes esferas da sociedade civil, reunindo sujeitos diferenciados,
militantes, especialistas e profissionais, que formulam conceitos e adquirem visibilidade através de um circuito
de publicações, eventos, documentos e posições sobre os temas ambientais. A autora apoiou-se na contribuição
de Pierre Bourdieu advinda da noção de campo social. O adjetivo ambiental será utilizado neste estudo, de forma
semelhante à feita por Carvalho, ou seja, designando o conjunto heterogêneo de atores e diversidades de práticas,
valores e crenças que demarcam a constituição deste campo, cujo eixo comum alude à valorização da natureza e
do meio ambiente como um bem.
31
Por esta razão, a crise ambiental contemporânea, encontra-se conjugada, como apontado anteriormente, ao
contexto policrísico, no qual se instala um verdadeiro dilema civilizacional, caracterizado não somente por uma
desordem na biosfera, mas sobretudo, por uma série de conflitos civilizacionais do ramo hegemônico ocidental
com as outras civilizações. As mesmas são postas em risco, julgadas como inferiores e desvalorizadas em suas
relações mais harmônicas com a natureza. Esta cultura dominante, projeta seus paradigmas e valores culturais
pelos quatro cantos do planeta, minando tanto a diversidade biológica, quanto a cultural. Como evidenciara
Layrargues (2001, XVII), “[...] é sensato supor que o enfrentamento da crise ambiental deve ocorrer em sintonia
e articulado com o enfrentamento da crise cultura e social que assola o planeta, posto que ambas as crises são
derivadas da mesma lógica, a qual tem origem nos fundamentos do surgimento da civilização ocidental
moderna.”
40

ao seu modo seu vida. Dessa maneira, a natureza em diferentes momentos históricos é

concebida de diversas formas.

É na Grécia do século VI a. C. que nasce, com a Filosofia, uma forma de reflexão

sobre a natureza, os homens e o seu universo. Essa produção de novas idéias e valores acerca

do significado da natureza, encampada pelos filósofos gregos, ocorre num momento de

grande dinamismo do mundo grego. Resulta daí o fato da Grécia marcar a cultura ocidental

pela dicotomia entre a natureza e a sociedade. Os gregos abandonam a mitologia e buscam na

racionalidade, esta concepção de natureza (orgânica, imutável) que sobreviveu em todo o

Império Romano e, se manteve praticamente inalterada durante todo o período da Idade

Média cristã.

A natureza como domínio do selvagem, ameaçador e esteticamente desagradável, em

contraposição à civilização é a interpretação que está na base do ethos moderno

antropocêntrico (CARVALHO, 2001). Durante a Idade Média, a natureza foi, com Santo

Agostinho, inspirado em seu mestre Santo Ambrósio, lugar do carnal, da bestialidade e, após

o abrandamento de Santo Tomás de Aquino, o lugar da graça de Deus (LENOBLE, 1990),

habitada por um homem que em si detém a escolha entre o trilho do bem e o do mal. Depois

da Revolução Científica do século XVII o seu caráter vai ser outro.

Nesse contexto, se constrói, historicamente, a representação da natureza como lugar da

rusticidade, do incultivado, do selvagem, do obscuro e do feio. A cidade, contrapondo-se à

natureza selvagem, era o lócus da civilidade. A natureza era tida como o Outro da civilização.

O pensar cartesiano, a autonomia do sujeito pensante, agora livre dos valores culturais e

tradicionais, que o subjugam junto com as determinações da natureza, constitui a base da

educação e, por conseguinte, de todo procedimento metodológico das ciências naturais.

Com o fim da sociedade feudal e a emergência do capitalismo, trazendo um novo modo

de produção, instituindo as suas relações sociais, vai se estabelecer uma nova visão de
41

natureza. Assim, esta deixa de ser a “mãe nutriente” e dadivosa, para ser a máquina que se

opera/manipula, desde que se conheçam as regras de seu funcionamento. Como argumenta

Moreira (1993, p.21), “a evolução da ciência moderna está comprometida desde o

Renascimento com o projeto histórico da construção32 técnica do capitalismo.”

Embora possamos registrar a existência do denominado naturalismo arcádico no século

XVII, valorizando a vida no campo como um corretivo moral contra os males da cidade, é o

“império da Razão” que norteará o mundo burguês em ascensão. Essa reconceituação de

natureza foi confiada a filósofos como Copérnico, Galileu, Kepler, Bacon, Descartes, Newton,

entre outros, sendo que a burguesia, em alguns casos financiava estes novos filósofos e,

conseqüentemente, o desenvolvimento das concepções que ajudaram a formular. Ao fim e ao

cabo, são todos homens de invento, mais tarde representados nas figuras de Arkwright,

Kartwright e Watt, percussores da Revolução Industrial.

Qualquer esforço para pensar o homem e a natureza em sua forma orgânica e integrada

torna-se agora mais difícil, até porque a divisão não se dá unicamente enquanto pensamento.

A divisão social e técnica faz parte do mundo concreto dos homens. Houve, portanto, com a

civilização industrial, inaugurada pelo capitalismo, uma cristalização da idéia de natureza

objetiva e exterior ao homem.

Desse modo, seguindo os passos de Moreira (1993), podemos dizer que primeiro

dessacralizou-se o mundo divino e, depois, em seqüência, racionalizou-se o mundo

dessacralizado, desumanizou-se a natureza e, desnaturou-se o homem. A argumentação

filosófica cartesiana baseia-se na divisão espírito-matéria, persistindo na concepção judaico-

cristã de separar corpo e alma/razão e corpo. O homem de Descartes era a imagem e

32
Caracterizada por Alves (1999, p.115) como “[...] ordenada, linear e hierarquizada, por um único e obrigatório
caminho [...]”.
42

semelhança de Deus e a natureza apenas um mundo exterior que, como tal, era um recurso a

ser explorado. Nesse contexto, o homem perdeu-se enquanto natureza. Desnaturalizou-se.

Além disso, é importante destacar que a dominação da natureza tem sido, também, a

própria história da dominação do homem pelo homem, estabelecendo aquilo que Moreira

(1993) denominou de tricotomia, ou seja, a separação natureza-corpo-mente.

Nos primórdios da existência humana os antigos mitificavam a natureza fazendo-a

interagir, representativamente com as limitações de sua existência e de sua consciência

(LENOBLE, 1990). De outra forma, na gênese da ciência, passa a se estabelecer um homem

que se avoluma diante da natureza, como nunca. Este homem entende os signos da natureza

de acordo com algo, por ele, nela engendrado – o modelo das máquinas, a universalidade dos

números, a precisão das figuras geométricas – e jacta-se de seu manipulador conhecimento,

tão diferente do advindo da contemplativa ciência grega. Esta manipulação faz-se via uma

associação entre técnica e ciência.

Cabe destacar que, no século XVIII, o conhecimento do mundo objetivo, rompeu, de

forma mais brusca, com esta metafísica, principalmente, com a de Descartes. Neste período,

Hume, Condillac e, um pouco antes, Locke vieram retirar do homem a propriedade de

substância pensante que foi atribuída a este pelo legado cartesiano, transformando a alma em

uma mecânica de sensações, reveladora das aparências que passam. Disso, resultou a reação

da afetividade promovida por Rousseau que culminou no movimento romântico (LENOBLE,

1990 e CARVALHO, 2001). Em Rousseau, há uma radicalização do conceito de natureza, o

que não implica numa natureza pacificada. Para tal filósofo, há que haver uma educação da

natureza, não uma volta a mesma. Um aprendizado guiado pelos sentidos, no qual, através da

observação dos fenômenos da natureza, se realiza um distanciamento em relação a esta.

Essas concepções, que podem ser consideradas como parte das raízes do interesse

contemporâneo pela natureza, nasceram como crítica aos efeitos evidenciados com a
43

deterioração do meio ambiente e da vida nas cidades, causados pela Revolução Industrial. Tal

reação da afetividade foi, em muito, o reflexo de um mundo que passou por um processo de

desencantamento, de queda dos antigos valores, sem que novos emergissem.

A visão romântica da natureza opõe-se à que preconiza uma natureza universal, baseada

na universalização dos valores técnicos, uniformizantes e racionais. A mudança de atitude do

homem frente à natureza, que caracterizou a gênese da ciência, implicou em uma situação de

desaconchego pela incompatibilidade entre o “mundo em que se vivia, amava e morria” e o

mundo da quantidade e da geometria. Com o romantismo, a natureza é concebida não como

máquina, mas com um aspecto interno (natureza humana), externo (ordem natural), possuidor

de liberdade e criatividade, livre de normatizações. Atualizados, muitos dos elementos da

experiência romântica, estão presentes, segundo Carvalho (2001), no campo ambiental33.

Desse modo, podemos notar que a discussão sobre o meio ambiente depende, entre

outros aspectos, das posturas metodológicas, operacionais, formas e focos de abordagem

sobre a questão, que por sua vez dependerão do contexto social e cultural no qual estão

inseridos. Concordamos com Galvão (1992) para quem, concebido como um sistema aberto,

integrando sociedade e natureza em suas múltiplas interações, o ambiente não pode ser

entendido, simplesmente, como equivalente à natureza ou ao meio físico. “Nessa equivalência

evidencia-se uma concepção equivocada de ambiente como mero suporte material de bens e

recursos naturais dos quais o homem se utiliza para prover sua subsistência, reprodução e o

exercício de suas atividades” (GALVÃO, 1992, p.14).

33
A autora destaca, na página 53, que “a valorização da natureza contra o artificial e o feito humano e, ao mesmo
tempo, a ênfase num sujeito humano, vinculado com totalidades orgânicas como a natureza, a humanidade ou a
Nação, como instância de transgressão contra uma ordem geral estabelecida, das padronizações e
uniformizações. O sujeito ecológico também vive a ambivalência da boa e terrível natureza e, como os
românticos, renuncia a ser um sujeito trágico, apostando na reconciliação e nas forças reparadoras, ainda que
viva ameaçado pela visão da catástrofe e do aniquilamento (do humano) que insiste, como um recalque, em
refigurar a cena harmônica.”. Para Carvalho (2001, p.45), “esse fenômeno vai repercutir tanto na emergência das
chamadas novas sensibilidades para com a natureza, a partir do século XVIII na Inglaterra, quanto nas idéias de
valorização do mundo natural selvagem (Wilderness) nos Estados Unidos, principalmente no século XIX.”.
44

Por essa distorção, há uma omissão de que os próprios processos ditos naturais, podem

já ter incorporado, em suas configurações e dinâmicas, a ação humana milenar. Torna-se

impossível negar que o ambiente é produto da relação homem-meio, sociedade-natureza, ou

seja, a natureza recriada pela sociedade, a natureza da qual o homem é parte integrante e, não

apenas a natureza onde o homem atua como mero “agente antrópico”, dotado de capacidade

de ação maior que a dos outros animais. Desta forma, repensa-se a concepção de meio

ambiente como produção social, concomitantemente espaço e tempo, natural e social,

entidade concreta e representação.

Como afirmou Giddens (1995, p.239)

[...] existe uma série de situações nas quais a humanidade deveria se afastar
das intervenções que afetam o meio ambiente, ou tentar eliminar os efeitos
colaterais. Entretanto, a maioria dos modos de vida com os quais temos que
lidar são sistemas ecossociais: eles dizem respeito ao meio ambiente
socialmente organizado. [...].Na maioria das áreas ambientais, não
poderíamos começar a desenredar o que é natural e o que é social – mais
importante ainda, procurar fazer isso é geralmente irrelevante para os
esforços a fim de elaborar programas de ação. Isso nos livra da tarefa
impossível de ter de afirmar que Los Angeles é, de alguma forma menos
natural que um vilarejo inglês; e nos incumbe de fazer julgamento sobre
todas as paisagens ou arenas ecológicas. ‘O meio ambiente’ não deveria ser
usado como uma forma sub-reptícia de contrabandear a ‘natureza’. Los
Angeles é uma parte do meio ambiente tanto quanto uma campina.

Enquanto meio e instrumento de criação e reprodução da organização social no espaço

terrestre, o meio ambiente respalda estes processos permitindo

o conhecimento e a percepção da natureza pelo homem; o nível técnico de


seu instrumental de ação; o domínio cultural de seu saber, capacitando-o a
ajustar-se, sobrepor-se ou conviver com a natureza, numa atitude de simples
exploração, ou de valorização e multiplicação de seu potencial de recursos; o
reconhecimento e aceitação do próprio espaço terrestre como recurso
primeiro da natureza à disposição do homem (GALVÃO, 1992, p.14).

Por entendermos o meio ambiente como produção social, devemos apreendê-lo pelas

suas interações econômicas, culturais, sociais e políticas que são engendradas pela sociedade

no seu processo de construção histórica. Atualmente, o que verificamos é que, apesar de todos
45

os progressos econômicos e materiais, crescem, também, as desigualdades e desequilíbrios

sócio-ambientais. De acordo com Morin & Kern (1996), a própria tecnociência, "mola

propulsora" do período hodierno, seria um fator fundamental no agravamento do cenário de

crise contemporânea ao comandar o problema do desenvolvimento e o problema de

civilização, além de determinar a perspectiva frente à explosão demográfica e à ameaça

ecológica. Santos (1996) argumenta que, ao mesmo tempo em que se instala uma tecnosfera

(através do meio-técnico-científico informacional), cria-se, paralelamente, uma psicosfera.

Ambas - tecnosfera e psicosfera - são locais, mas constituem o produto de uma sociedade

bem mais ampla que o lugar. São produtos do artifício, criando tecnificações além de sentidos

e subjetividades.

Situado neste contexto, apenas o simples controle da marcha da tecnociência não daria

fim à tragédia do desenvolvimento e ao problema civilizacional, não poria fim à cegueira

produzida pelo pensamento fragmentado, parcelar e redutor, além de não suprimir aos

problemas demográficos e ecológicos. Este fato se daria em razão da tecnociência depender

do conjunto da civilização que hoje depende dela (MORIN & KERN, 1996). A quebra do

isolamento é, para estes autores, fundamental no tratamento do problema, que por sua vez,

deve ser conduzido de maneira diversificada, segundo as regiões do planeta.

Alguns autores chegam inclusive a entender que, atualmente, estamos em um novo

momento, no qual “[a] crise que perpassa o mundo contemporâneo está levando a

humanidade a um ‘ponto de mutação’, cujo resultado não poderá ser outro senão o da

transformação profunda de toda a nossa sociedade e cultura” (CAPRA, 1987, p.73).

Nosso sistema de ensino, inserido em todo este painel de fragmentações e disjunções,

também não vem corrigindo esses “desenvolvimentos”, ao contrário, obedece a eles. A

argumentação de Morin (2000b, p.84), fundamenta tal crítica ao captar que


46

[...] o que agrava a dificuldade de conhecer nosso Mundo é o modo de


pensar que atrofiou em nós, em vez de desenvolver, a aptidão de
contextualizar e de globalizar, uma vez que a exigência da era planetária é
pensar sua globalidade, a relação todo-partes, sua multidimensionalidade,
sua complexidade [...].

Por ora, compete frisar que todas as tentativas de mudanças só podem se dar no

mundo, do qual tomamos parte, não apenas como uma criação do espírito, pois ele, o mundo,

existe concretamente (SANTOS, 2000). É dele que devemos partir para construir outra coisa,

ou seja outro mundo, um mundo melhor. O seu movimento faz com que, no campo do

conhecimento, cada saber se relacione com os demais e com que as disciplinas se

transformem.

Caminhamos para superar a inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre

os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e, por outro lado,

realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,

transnacionais, globais, planetários. Com o processo de informação, de inserção, de

apreensão, de busca, de enredamento do mundo, pelos sujeitos, através das disciplinas, todas

mantendo sua relação com mundo, é que se pode formar a metadisciplina, uma “vontade de

filosofar nas disciplinas”.

É o mundo que permite que se estabeleça um discurso inteligível, um canal de

comunicação e solidariedade entre os saberes e os sujeitos dos saberes. É a possibilidade de

um discurso intercambiável que permite estabelecer a metadisciplina no sentido da

fertilização mútua dos conceitos que não são impenetráveis. É nesta “religação dos saberes”

(MORIN, 2001) através da reforma paradigmática do pensamento, religando e diferenciando,

contextualizando práticas sociais em curso, que se poderá explicitar a necessidade de

superação dos problemas atuais, fortificando a aptidão em interrogar e em ligar o saber à

dúvida. Cabe desenvolver a aptidão para integrar o saber particular à própria vida e não
47

somente a um contexto ou tendência global, estabelecendo a competência para os sujeitos

colocarem a si mesmos os problemas fundamentais de sua condição e de seu tempo.

Concordamos com o posicionamento apresentado por Morin (2000b), segundo o qual,

temos a necessidade de fundar “princípios para o conhecimento pertinente” que sejam capazes

de apreender os problemas globais e fundamentais para neles inserir os conhecimentos

parciais e locais. É preciso ensinar e aprender os métodos que permitam estabelecer as

relações mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo.

Como afirmara Guattari (1990, p.25), “menos que nunca a natureza pode ser separada da

cultura, e precisamos aprender a pensar ‘transversalmente’ as interações entre ecossistemas,

mecanosfera e Universos de referências sociais e individuais”.

Por esse caminho, nos aproximamos de idéias relacionadas a uma abordagem

renovada da ciência e de um entendimento mais amplo do movimento do mundo. Abre-se o

olhar, menos distanciado, sobre as questões ambientais enquanto questões sociais, convidando

os sujeitos a participarem dos conflitos e das soluções com “seus” conflitos e com “suas”

soluções. Supõe-se uma cultura emancipatória, tal como aludido por Santos (2001), segundo

a qual os sujeitos pertencem à subjetividades e à solidariedades coletivas, centradas na

construção de um paradigma social emergente, firmado no estabelecimento de um senso

comum emancipatório. Este projeto somente dar-se-á pela constituição e uso de ações que

objetivem conhecer quer o senso comum dos envolvidos, quer as alterações desse senso

comum, ao longo do processo, na direção da emancipação. O senso comum emancipatório

requer um novo conhecimento, que soma o saber acadêmico com o saber popular, provocando

um novo senso comum argumentativo do desejo de mudança.


48

1.6 – EDUCAÇÃO, MEIO AMBIENTE E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: tecendo


pertinências.

Em se tratando de aspectos relacionados às questões ambientais, um ponto destacado

no trabalho de Kostrowichi (1988) nos chamou a atenção. Ele se refere à educação, em seu

sentido amplo, englobando a transferência e o trabalho com as informações sociais feitas por

meios e formas dinâmicos, partindo de saberes pertinentes que envolvam todo sistema

educacional, indo para além dele, se concentrando sobre questões fundamentais e não

periféricas. Em nosso país Ab’Saber (1993) advoga uma reconceituação da EA associada à

rediscussão do Sistema Educacional Brasileiro sob o enfoque da Antropologia cultural e da

Sociologia do conhecimento com avaliação realista da estrutura, composição e finalidades

contemporâneas.

Na conjunção entre Educação e Meio Ambiente, buscando práticas educativas não

fragmentadoras e reducionistas, apoiamos a visão de Reigota (1995), indicadora de prática

pedagógica não exclusivamente voltada para a transmissão de conhecimentos de ecologia.

Pensamos que uma Educação para com o Meio Ambiente baseada no estabelecimento de uma

nova aliança (PRIGOGINE & STENGERS, 1991) entre a humanidade e a natureza e, na ética

nas relações econômicas, políticas e sociais pode ser um dos caminhos para a mudança.

A visão de Educação para com o meio ambiente não cria uma "modalidade nova" de

Educação, mas aporta novidade à mesma, pela necessidade de reconhecimento dela sobre a

importância da questão ambiental e do questionamento dos valores que guiam a relação

sociedade-natureza. Não se trata de propor a criação de uma nova disciplina, mas propor tal

visão em cada uma das disciplinas. Também consideramos que esta perspectiva deve se abrir

para a realização efetiva da prática educativa ambiental pautada na identificação das

representações das pessoas envolvidas no processo educativo..


49

Entendemos, em concordância com a acepção cunhada por Madeira & Alloufa (1996,

p.15), que a

[...] educação é um processo de construção pessoal e social das


representações dos indivíduos e grupos. Ela é a relação interpessoal e grupal
do ensinar e aprender, na interação de um processo histórico,
contextualizado em um espaço e um tempo. Isto abre outra via para a
consideração da cultura, em sua relatividade e em sua universalidade [...].
Ainda segundo Madeira (2001, p.125), neste processo [...] a cultura e o
conhecimento são continuamente, transmitidos e (re)construídos,
envolvendo a totalidade do sujeito em suas relações com o(s) outro(s)[...].
Esta forma de pensar se aproxima da expressa por Milton Santos (2002)
quando ele aponta que [...] em cada sociedade, a educação deve ser
concebida para atender, ao mesmo tempo, ao interesse social e ao interesse
dos indivíduos. É da combinação desses interesses que emergem os seus
princípios fundamentais e são estes que devem nortear a elaboração dos
conteúdos do ensino, as práticas pedagógicas e a relação da escola com a
comunidade e com o mundo [...].

Uma investigação sobre os professores e sobre seus pensamentos a respeito da EA

pode ser um passo essencial para as discussões sobre as questões ambientais, nas quais a

necessidade do pensar coletivo sobre a prática educativa escolar se transforma em práxis,

através do maior comprometimento dos envolvidos (ANDRÉ, 1990). Sem conhecermos os

sujeitos que concebem as práticas em EA, não poderemos realmente absorver a dinâmica das

suas representações e, menos ainda, contribuir para o processo educativo analisado34. Por

conseguinte, de forma similar a Madeira (2000, p.183), neste trabalho, caracterizamos as

representações “como sistemas de interpretação que regem nossa relação com o mundo e com

os outros e organizam as comunicações e as condutas sociais.”.

34
Nesta linha de pensamento, este trabalho se aproxima ao de Reigota (1995) que pode analisar as
representações sociais de meio ambiente de professores secundários de diferentes regiões do Brasil. Seus estudos
demonstraram que existe uma relação entre as representações sociais de meio ambiente, as quais o autor
denominou de antropocêntricas, globalizantes e naturalistas, e o estilo das práticas pedagógicas cotidianas por
eles desenvolvidas. Os professores cujas representações sociais de meio ambiente possuem característica
antropocêntrica têm suas práticas pedagógicas centradas na transmissão de conteúdos científicos, os que
apresentam práticas globalizantes alternam a transmissão de conteúdos com atividades inovadoras e aspectos não
imediatos do meio-ambiente e, para os que apresentaram representações naturalistas verifica-se uma
identificação do meio ambiente com a natureza, principalmente como a primeira natureza, com práticas
pedagógicas centradas para o conhecimento da mesma, preservada ou deteriorada.
50

Jodelet (2001, p.17) afirma que as representações “nos guiam no modo de nomear e

definir conjuntamente os diferentes aspectos da realidade diária, no modo de interpretar esses

aspectos, tomar decisões e, eventualmente, posicionar-se frente a eles [...]”.

Segundo Reigota (1995), a Pedagogia Dialógica de Paulo Freire considera

fundamentais as interações comunicativas, nas quais as pessoas são ouvidas em busca de se

estabelecer um objetivo comum e se põem de acordo, para estabelecer seus planos de estudo e

ação. Supera-se a visão do particular abstrato quando isolado do seu contexto e do todo do

qual faz parte. Devemos nos remeter, incessantemente, da parte para o todo e, do todo para a

parte. É também necessário, como argumenta Santos (1996), reconhecer o movimento

conjunto do todo e das partes, através do processo de totalização (compreendendo passado,

presente e futuro). Há um sincronismo entre esta perspectiva de entendimento da totalidade

social35 e o constructo de representações sociais, a medida em que estas trazem em si a estória

e a história, deixando de ter sentido a dicotomia entre afetivo, emocional, subjetivo,

individual e seus opostos. Desta forma, “a representação de um objeto é tanto a síntese

possível a um dado indivíduo, num determinado tempo e espaço, de um processo no qual ele,

em sua totalidade, está envolvido, quanto leva marcas da inserção deste mesmo indivíduo na

totalidade social” (MADEIRA & ALLOUFA, 1996, p.15).

Falamos do contexto de representações sociais dentro das relações sociais que,

conforme apontado por Sawaia (1998, p.105),

não são apenas cognitivas ou sociais, elas têm carga afetiva, bem como os
sentimentos não são pulsões naturais nem funções unicamente orgânicas,
biológicas, universais; são representações sociais que além da singularidade,
expressam determinações sociais complexas.

35
Para Santos (1996, p.94), “a totalidade é o conjunto de todas as coisas e de todos os homens, em sua realidade,
isto é, em suas relações, e em seu movimento. Sendo processo histórico é por isso processo de complexificação.
Deste modo a totalidade se vai fazendo mais densa, mais complexa, sempre incompleta, num incessante processo
de totalização.”.
51

Levando em conta seu aspecto cognitivo, as representações sociais envolvem a

pertença social dos indivíduos com as implicações afetivas e normativas, somando

interiorizações de experiências, práticas, modelos de condutas e pensamento, socialmente

produzidos e comunicados (JODELET, 2001).

Nesse cenário, Prigogine & Stengers (1991) procuram chamar a atenção para a

importância da subjetividade (da consciência enquanto ser) nas atividades científicas e

cotidianas com a natureza, abandonando o paradigma racionalista-reducionista de ciência e de

exploração dos “recursos” naturais. Em trabalhos que associaram a abordagem das

representações sociais às questões ambientais diferentes autores36 já comprovaram que não se

trata de saber quantitativamente mais, mas qualitativamente melhor sobre as questões que um

determinado grupo pretende estudar e onde pretende atuar. Por este entendimento, tratamos os

sujeitos envolvidos nos processos sociais como complexos, reunindo objetividade e

subjetividade. Incorporam-se nas análises a liberdade, a ética e a criatividade.

36
A este respeito, indicamos, entre outros, os trabalhos de: Nascimento-Schülze (2000), Moraes, Lima Jr. &
Schaberle (2000) e Reigota (1995). No trabalho de Nascimento-Schülze (2000), a autora, utilizando a técnica da
evocação livre de palavras, pode captar uma representação naturalista de meio ambiente em três grupos por ela
pesquisados (moradores locais de Florianópolis, turistas e agentes de turismo da Ilha de Santa Catarina). O meio
ambiente foi identificado, principalmente, como natureza. Nas respostas não foram privilegiadas visões
relacionadas aos contextos, preocupações e dimensões político-sociais que poderiam acompanhar a visão
ambientalista. A diferença captada para os grupos derivou, segundo a autora, dos interesses e diferentes práticas
sociais desempenhados pelos mesmos. Os turistas e agentes de turismo revelaram uma representação relacionada
à admiração e ao usufruto da natureza, enquanto os moradores locais acentuaram a importância da preservação
da natureza. Outro estudo que destacamos coube a Moraes, Lima Jr., & Schaberle (2000). Neste, os autores,
através de entrevistas, captaram duas tendências principais de representações sociais de meio ambiente. Estas
tendências, segundo os mesmos, aproximam-se da identificação proposta por Reigota (1995), ao observarem-se
posturas “naturalistas” (ora contando somente com elementos da natureza, ora incluindo as atividades humanas,
como ação negativa no “meio ambiente) e “globalizantes” (inclusão explícita da figura humana, relacionando o
sistema social ao ambiental). Também ficou evidenciado que a visão “naturalista” predominou entre os
profissionais da área de Ciências da Vida, Ciências Exatas e da Terra, enquanto a representação “globalizante”
predominou entre o grupo da área de Ciências Humanas e Sociais e de Educação. Os autores associaram esta
diferença à existência, no primeiro grupo, de uma visão de mundo fragmentada, onde as conexões e as
interdependências do meio ambiente não são devidamente consideradas. Para o segundo grupo, inferiram uma
visão de mundo integrada, na qual o meio ambiente está inserido num sistema de referência mais amplo e
articulado. Além desses trabalhos, podemos destacar outros que também associam representações sociais e meio
ambiente, tais como: Crespo & Leitão (1992); Arruda (1995, 2000); Reigota (1999).
52

Desse modo, todo estudo de representação passará por uma análise das características

baseadas no entendimento de que ela é uma forma de conhecimento e, como já apontara

Jodelet (2001, p.28),

qualificar esse saber de prático se refere à experiência a partir da qual ele é


produzido, aos contextos e condições em que ele o é e, sobretudo, ao fato de
que a representação serve para agir sobre o mundo e o outro, o que
desemboca em suas funções e eficácia sociais. A posição ocupada pela
representação no ajustamento prático do sujeito a seu meio fará com que seja
qualificada por alguns de compromisso psicossocial.

Acreditamos que a apreensão e a análise das representações sociais de envolvidos no

processo educativo sobre a EA, podem constituir num caminho para a captação de sentidos e

ações, viabilizando a compreensão dos seus sujeitos, espelhando, como escrevera Madeira

(1991, p.142), “a dialética entre o que aí está e o que já está em gestação.”. Desta forma,

estaremos tomando os sujeitos em sua totalidade complexa e em construção, entendendo que

“[...] o constructo, assim colocado, abre espaço para que as questões educativas sejam

analisadas no jogo das relações que as originam e sustentam, ao mesmo tempo esta análise

visa captar sua organização e as articulações que as determinam.” (MADEIRA, 2000, p. 184).

Também consideramos que os sujeitos sofrem pressões das representações dominantes

na sociedade e, é nesse meio que pensam e exprimem seus sentimentos. Soma-se a este

contexto, o discernimento de que suas representações são ao mesmo tempo produzidas e

adquiridas, fugindo da visão estática e preestabelecida dos modelos clássicos de interpretação

da realidade. A abordagem das representações sociais se adequa a uma sociedade complexa,

que se apresenta em transformação, em vias de se fazer (MOSCOVICI, 2001).

Paralelamente, ao fato de enquadrar-se neste contexto complexo e inteligível, através

da abordagem das representações sociais, ao nosso ver, a Educação para com o ambiente

assume o caráter de Educação Política. Desta forma, possibilita, exatamente, no entendimento

do jogo das relações que as originam e sustentam, a superação de sistemas autoritários,


53

tecnocráticos e populistas. Esta intenção, também está presente na conquista de uma

Educação para cidadania, ao incutir valores democráticos de respeito à igualdade e à

liberdade, além de incentivar e motivar a participação ativa dos cidadãos na esfera publica,

defendendo seu direito à qualidade de vida condigna.

Como afirmado por Segura (2001), no ensino formal, a escola, historicamente, sempre

tratou o conhecimento gerado pelos saberes disciplinares de forma estanque, classificatória,

quantitativa, com base no acúmulo de informações. As premissas da EA questionam este

modelo unidimensional e unilinear, abrindo a perspectiva expressa de entendimento da EA

como multidisciplinar na estrutura e interdisciplinar na dinâmica. Este atributo possibilita

integrar todas as atividades escolares, todas as disciplinas e os diversos atores (entre eles os

professores e professoras), através do estabelecimento intencional de nexos e vínculos entre

os mesmos, visando superar as compartimentações (hiperespecializações) do conhecimento

científico. Conforme aludido por Madeira (2000, p.126), a partir de trabalhos de Gilly

(1989;1980), “professor, aluno, escola, etc. são sínteses de relações multifacetadas que,

continuamente fazem e refazer a definição de seus limites, articulando diferentes níveis e

dimensões”. Desta forma, a própria escola, enquanto tempo-espaço-relação, que não se

concretiza à revelia dos processos sociais, refletindo-os e influenciando-os, tem que se

redefinir e se redimensionar. Acreditamos que entre os possíveis vínculos que encaminham as

resignificações do espaço-tempo escolar, encontra-se a EA. A este respeito, concordamos com

Segura (2001, p.53), ao advogar que “a questão ambiental não inventou a

interdisciplinaridade, mas talvez foi a principal responsável pela sua revalorização na matriz

epistemológica.”.

1.7 – POR CAMINHOS E POR TRILHAS: opções metodológicas.

Em avaliação feita pelo Programa de Estudos Interdisciplinares de Comunidades e

Ecologia Social da UFRJ, Maciel, Ferreira & Preuss (1994) demonstram que os objetivos da
54

EA no Brasil acabam por restringir-se somente à difusão e informação em escolas, unidades

de conservação e comunidades37. Outro viés já aludido em pesquisas (PEDRINI, 1998), é que

a introdução da EA é, em geral, incipiente nos currículos. Não há como meta principal uma

ação transformadora com a mudança de hábitos, posturas e condutas.

É bastante difundido, inclusive por meios oficiais38, que as pesquisas existentes

evidenciam a defasagem entre os discursos propagados e a prática em EA. Além disso, a

população, em geral, não relaciona o estilo de desenvolvimento existente no Brasil com as

mazelas provocadas pela degradação ambiental do território. Como poderemos apresentar

adiante (Capítulo 2), leis existem, portarias existem, grupos de trabalho intra e

intergovernamentais também. Só que a consciência ambiental fica restrita a pequenos

segmentos organizados em torno de algumas causas episódicas. Há inclusive uma indefinição

nas formas de tratamento e composição da temática ambiental. Como então promover

consciência ambiental?

Baseando-nos na abordagem teórica das Representações Sociais fundamentada por

Serge Moscovici e Denise Jodelet, em nosso trabalho, partimos de uma preocupação que

norteará toda a pesquisa. Vamos centrar estudos em conhecer melhor, a partir do princípio

que caracteriza a representação como uma forma de saber prático ligando um sujeito a um

objeto, o que/como pensam os(as) professores(as) de Geografia, “a partir do seu lugar”, sobre

a prática educativa ambiental? Como promoveremos esta investigação? Estes

questionamentos se aproximam muito dos formulados por Jodelet (2001, p.28) a respeito das

pesquisas com as representações,

37
Esta conclusão é corroborada por Loureiro (2002, p.71), historiando que “A Educação Ambiental no Brasil só
ganha projeção social e reconhecimento público na década de 1990, mesmo figurando oficialmente na
Constituição Federal de 1988, Capítulo VI, sobre meio ambiente, no seu artigo 225, parágrafo 1°, inciso VI,
onde se lê que compete ao poder público “promover a Educação Ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente”, e de observarmos experiências concretas,
mas isoladas, desde meados dos anos setenta.”.
38
Documentos do MEC/PRONEA (1997) e Crespo & Leitão (1992).
55

Quem sabe e de onde sabe?"; "O que e como sabe?"; "Sobre o que sabe e
com que efeitos?". Estas perguntas desembocam em três ordens de
problemáticas: a) condições de produção e de circulação; b) processos e
estados; c) estatuto epistemológico das representações sociais. Estas
problemáticas são interdependentes e abrangem os temas dos trabalhos
teóricos e empíricos.

Entendemos que as práticas estabelecidas pelos docentes pesquisados inserem-se em

tempos-espaços não cristalizados, sujeitos às dinâmicas sócio-culturais que ora seguem, ora

modificam, ora transgridem as regras estabelecidas por atores hegemônicos (Estado,

mercado). Esta contextualização, tempo-espaço-relações sociais, norteará os caminhos

metodológicos na tessitura39 da relação entre Geografia, EA e os atores aqui pesquisados, os

professores de Geografia.

A viabilização da presente proposta pressupõe, como orientação da pesquisa empírica,

a abordagem qualitativa, buscando apreender e analisar as representações sociais dos

professores de Geografia sobre a Educação Ambiental. Pretende-se, na análise do material

captado por meio de procedimentos complementares, dialogar com todas as questões surgidas

ao longo da pesquisa, num contexto de complexidade, apontando, caso possível, sugestões

para o trabalho a partir da Geografia numa perspectiva educativa ambiental.

A abordagem das representações sociais permite captar valores e modelos de

pensamento e de conduta que são utilizados pelos indivíduos para se apropriar dos objetos de

seu ambiente. Na perspectiva apontada por Jodelet (1984), podemos observar que os

fenômenos que caracterizam esta teoria apresentam-se sob formas variadas, com diferentes

graus de complexidade, permitindo interpretar e pensar a realidade cotidiana. A autora,

também enfatiza que a noção da representação social se apresenta na interface entre o

psicológico e o social. Desta forma, produz-se, enquanto conhecimento socialmente elaborado

e partilhado, um conhecimento prático (SÁ, 1998).

39
Argumentada, por Alves (2002, p.13), como “[...] processo de criação de conhecimento no cotidiano [...]”, em
oposição à Construção, “[...] autodenominado processo moderno de criação do conhecimento na ciência [...]”.
56

É Jodelet (1989, 2001) quem indica perspectivas importantes para o estudo das

representações sociais pela consideração de seu encadeamento e articulação. As

representações sociais são uma atividade cognitiva, pela qual o sujeito constrói e atribui

sentidos aos objetos de seu entorno. Neste dinamismo, elas articulam dimensões de contexto e

de participação. Pela representação, o sujeito dá sentido e exprime sua experiência no mundo

social. Assim sendo, as representações têm, na linguagem, um espaço privilegiado. Atuam e

se atualizam nas práticas discursivas dos sujeitos, enquanto socialmente situados, pela

comunicação, pela parceria social e pelas trocas que se estabelecem. Tais colocações

implicam a consideração das práticas sociais dos sujeitos, suas comunicações e condutas

cotidianas. Nestas representações, estão refletidas e refratadas normas institucionais, valores,

modelos e símbolos que vão definindo o jogo das relações grupais e intergrupais.

Esta abordagem se aproxima do entendimento do cotidiano dos atores envolvidos, no

qual estão incluídas as práticas e táticas da vida cotidiana. A apreensão das táticas, pelo

caminho das representações sociais, permite ampliar a compreensão das práticas não apenas

como iguais ou diferentes, mas como ações e maneiras de fazer e estar no mundo, que são

tecidas à revelia das normas instituídas, instalando dinâmicas e mecanismos sócio-político-

culturais de ordem-desordem-reorganização-desorganização. Este jogo, por sua vez,

determina a dinâmica das representações dos membros do grupo por si mesmos, pelos outros

que integram este grupo e por outros de grupos diversos (JODELET,1984 e SÁ, 1998).

Em seu estudo Jodelet também proporcionou, através de reflexões a partir da Teoria de

Moscovici, uma caracterização das representações demonstrando que as mesmas estão sempre

referidas a um dado objeto. São contexturas e, portanto, se fazem não como uma reprodução

do objeto, mas como criação que articula um já existente à novidade. Computam autonomia e

criatividade. Nesta perspectiva teórica, afirma-se que as representações têm sempre uma

característica imagética, baseada na propriedade de intercambiar o sensível e a imagem, a


57

percepção e a concepção, integrando características simbólicas e significantes. Deste modo,

nos estudos de representações, fica clara a preocupação com elementos complexos inerentes à

Teoria e à sua aplicabilidade, no que diz respeito às imagens mentais, às representações

referenciais e aos sistemas de relações captados e presentes.

Em trabalho recente, Abric (2000) apontou quatro funções essenciais para as

representações sociais, que permitem orientar as análises da dinâmica das relações sociais e

das práticas investigadas. São elas: a função de saber (permitindo compreender e explicar a

realidade), a função identitária (definindo a identidade e permitindo a proteção da

especificidade dos grupos), a função de orientação (guiando as condutas e as práticas) e a

função justificadora (possibilitando, a posteriori, a justificativa das tomadas de posição e das

condutas).

Por se caracterizarem como dinâmicas e explicativas, as representações, como

apontaram Oliveira & Werba (2001), são necessariamente relacionais, portanto sociais. As

representações sociais introduzem uma teorização dinâmica, na qual as práticas culturais, a

história, a tradição são levados em conta, assim como, a realidade contemporânea,

incorporando duração e manutenção, inovação e metamorfose. Soma-se a isto, a consideração

da teoria das representações permitir o entendimento do social como algo coletivamente

edificado, e o ser humano como sendo produzido através do social. Neste caso, a teoria aceita

a existência de conteúdos contraditórios e complementares, abrindo aos estudos e pesquisas a

possibilidade de não descartar achados conflitantes. Trabalha com as diferenças de modo

enriquecedor para compreensão do fenômeno investigado, ou seja, leva em conta as

dimensões dialéticas e dialógicas (OLIVEIRA & WERBA, 2001).

Ao assumir o papel de uma teoria que não se apresenta pronta, fica evidenciado, como

conseqüência, não existir uma metodologia exclusiva para a investigação das representações

sociais. Já salientamos que este trabalho caminhará por bases qualitativas, o que não quer
58

dizer que instrumentos e informações advindas do campo não possam ser tratados

quantitativamente. Não acreditamos que esta dicotomia deva ser mantida, discordando da

possibilidade de que alguma metodologia ou até mesmo pensamento possa dar conta da

totalidade de forma absoluta ou excludente.

Devemos levar em conta alguns aspectos que, ao nosso ver, hoje influenciam as

pesquisas em torno do ensino da Geografia, da Educação, da Educação para com o meio

ambiente, dos sujeitos envolvidos e das representações a serem buscadas nesta relação.

Entendemos que em nosso estudo, os sujeitos estarão inseridos numa totalidade social em

movimento complexo, em contato com os impactos das verticalidades (mídias, empresas), no

ambiente e na apreensão do mesmo e, com as resistências das horizontalidades,

principalmente daqueles que Santos (1996) chamou de os “de baixo”. Além disso, poderão

integrar às densidades comunicacionais que vão se estabelecer, mesmo com a chuva de

informações catastróficas sobre o meio ambiente e sobre sua crescente artificialização. Por

fim, poderão participar da criação de novas solidariedades e estratégias de interpretação e de

sobrevivência, permissoras de ações contra-hegemônicas. Mas estes sujeitos,

fundamentalmente, estarão vivendo o contexto das incertezas inerentes ao processo

pedagógico e ao entendimento das relações complexas tecidas pelas ações sócio-ambientais.

Quanto aos instrumentos de pesquisa, optamos por escolher questionários e

entrevistas. Estes instrumentos têm características próprias, mas permitem uma aproximação

gradativa do objeto e dos sujeitos estudados. Os questionários possibilitam, de forma mais

extensiva, captar informações, opiniões, percepções valores, normas, modelos e outros

aspectos dos indivíduos na diversidade de seus meios. Permitem inclusive que lancemos mão

de tipos diferentes de perguntas. Nossa intenção é compor um instrumento com o predomínio

de questionamentos fechados, mas a formulação estratégica de algumas questões abertas foi

necessária, servindo de subsídio para a etapa seguinte complementada pelas entrevistas.


59

Informações sobre a profissão, a postura enquanto educador, as impressões sobre a EA

refletem valores, modelos e símbolos dos sujeitos. Desta forma, a caracterização da população

a ser pesquisada é fundamental e o instrumento do questionário, refletindo os contextos nos

quais a mesma se constitui, é tomada como suporte rico neste momento.

Entendemos, a partir da Teoria das Representações Sociais, que os conhecimentos

advindos do saber científico se transformam no cotidiano, se amoldam em senso comum. Dois

processos caracterizam esta transformação: a objetivação e a ancoragem. Quando recebemos

uma noção nova, derivamos esta noção, deslocando-a partir das noções que compõem nosso

universo mental, nossa visão de mundo. A aproximação daquilo que não é familiar para algo

mais familiar, integra a novidade. Visamos captar como isto é feito, pelos sujeitos que são

professores e professoras de Geografia, em relação à EA. Que aproximações, que derivações e

que deslocamentos de conceitos são veiculados no intento da prática educativa ambiental.

Interessa-nos compreender, por exemplo, se tomam a parte pelo todo e como deslocam, no

cotidiano, os contextos apropriados no saber científico. As informações são destacadas e

deslocadas do campo científico que as originou. Estas informações deixam de ser do grupo de

especialistas que as concebeu, sendo apropriadas pelo público que, projetando-as como fatos

de seu universo, pode dominá-las. Neste deslocamento há ressignificação em outro contexto,

consubstanciando uma apropriação. Na verdade, a tessitura deste saber científico, acaba sendo

não exclusivamente científica. Ela está relacionada com a história e a cultura do sujeito, com

as relações das quais o mesmo participa e influi. Enquanto processo que regula a análise das

representações sociais, a objetivação garante uma racionalidade, “tornando concreto o que é

abstrato, muda o relacional do saber científico em imagem de uma coisa.” (DOISE, 2001, p.

190). A objetivação se torna expressão de uma realidade vista como natural. Neste processo,

os conceitos teóricos são constituídos em um conjunto imagético coerente no qual se pode

captar cada elemento individualmente e em suas relações com o conjunto. Ao mesmo tempo,
60

este conjunto garante a coerência entre a teoria que está a se integrar e teorias ou visões de

mundo próprias aos sujeitos. O conjunto imagético ou modelo figurativo vai permitir

concretizar, de modo coordenado, cada um dos elementos, tornando-os seres de natureza

(naturalização). As figuras, elementos do pensamento, tornam-se elementos da realidade,

referentes para o conceito. Moscovici & Hewstone (1984) propõem que a objetivação das

representações sociais se processa através da figuração, da ontologização e da

personificação40. A objetivação revela a tendência do pensamento social para a construção

estilizada, imagética e significante, sendo esta construção seletiva e subordinada a valores

sociais.

Desse modo, a objetivação é filtrada pelos valores existentes nos diferentes grupos. Os

valores são apreendidos através do entendimento de outro processo: a ancoragem. A filtragem

do conhecimento científico, por estes valores, é moldada através da ancoragem. Não se trata

mais, como na objetivação, da constituição formal de um conhecimento, mas de sua inserção

orgânica num pensamento constituído. A objetivação não se dá sem a existência da

ancoragem. Este processo consiste na incorporação do estranho, do novo, numa rede de

categorias mais familiares. Como apontara Jodelet (2001, p.38) “[...] a ancoragem enraíza a

representação e seu objeto numa rede de significações que permite situá-los em relação aos

valores sociais e dar-lhes coerência.”. O processo de ancoragem, marcado pela sua

complexidade e situado numa relação dialética com a objetivação, articula as três funções de

base das representações sociais: 1) função cognitiva de integração da novidade; 2) função de

interpretação da realidade; 3) função de orientação das condutas e das relações sociais

(JODELET, 2001, p.38-39).

40
Segundo Ordaz & Vala (2000, p.91), “a figuração refere-se à tradução de conceitos em imagens e a
ontologização refere-se à atribuição de características de coisas ou seres às idéias e às palavras.”. Da mesma
forma, os autores apontam que “[...] a personificação é também um modo de conferir materialidade a um
conceito [...]. Por exemplo, no campo de difusão das teorias científicas, a personificação designa a associação
entre uma dada teoria e um rosto que se torna símbolo dessa teoria.”.
61

Através deste processo captamos como as representações sociais, uma vez

constituídas, se tornam socialmente funcionais, instrumentalizando o saber na interpretação e

gestão do ambiente e, refletindo aqueles valores, modelos e os símbolos, tecidos na cultura e

incorporados de forma afetiva. Deste modo, as representações associam-se a categorias e

imagens cotidianas e se ligam a pontos de referência conhecidos. De acordo com Arruda

(2000, p.72), “as representações sociais constituem uma forma de metabolizar a novidade

transformando-a em substância para alimentar nossa leitura de mundo, e assim incorporar o

que é novo.”. Como todos os processos sociais, inclusive os que incorporam novos conceitos

e noções, são marcados pelos valores, modelos e símbolos, os diferentes grupos têm

evidenciados, de forma mais ou menos concretizada, mais ou menos explicitada ou sutil, estes

valores, crenças, práticas, normas etc. Através dos questionários, buscamos captar aspectos

aventados pelos professores relacionados aos processos constituintes de suas representações,

ou seja, como as relações estabelecidas pelos mesmos, na articulação do ensino da Geografia

e a Educação Ambiental, se constituem através dos processos de objetivação e ancoragem.

Conseguimos investigar com o instrumento do questionário noventa e um (91) professores de

Geografia.

O outro instrumento de campo que possibilita captar mais profundamente as

representações dos professores de Geografia é a entrevista. Ela serve para aprofundar e

esclarecer as ações, discursos, possíveis contradições, propostas, valores, normas, entre outros

aspectos aventados pelos sujeitos. Constituem-se em entrevistas conversacionais, gravadas

com a concordância dos sujeitos, na quais mantemos uma interação com base no cotidiano do

sujeito entrevistado. Embora tenhamos um objeto a ser pesquisado, estamos abertos ao que

diz o entrevistado, apoiando os caminhos percorridos pelo mesmo nas inferências que se

aproximam ou se afastam do objeto, sem perder a riqueza de que esta construção livre traz

indícios dos valores que norteiam os processos inerentes às representações dos mesmos a
62

cerca do objeto. Permitem também, ultrapassar alguns limites existentes nas informações

obtidas pelos questionários, ao possibilitarem maior espontaneidade aos sujeitos. Além disso,

o contato face a face facilita a flexibilização e a perspectiva de obtenção de indícios verbais e

não-verbais, assim como, de informações menos “frias” e mais detalhadas, mais aproximadas

das práticas efetuadas pelos sujeitos. Não nos baseamos na quantidade de entrevistas, na

exaustão do número de entrevistados, mas na qualidade das pistas e dos esclarecimentos sobre

os valores, normas e práticas que interferem nas idéias e pensamentos que norteiam ações dos

sujeitos em relação à EA. As entrevistas são realizadas pela interação de sujeitos, que não se

negam em seus papeis. O entrevistador é aquele que não sabe e quer compartilhar com aquele

que sabe algo, aquele que se propõe a compartilhar daquilo que sabe, enquanto entrevistado.

Estas entrevistas são analisadas a partir da leitura exaustiva do material, e a leitura confronta e

complementa os aspectos advindos do instrumento do questionário.

A análise que objetivamos é compreensiva e criativa. Não busca colocar em “formas”

os indícios e informações obtidas dos sujeitos. As categorias, que advém da análise do

material, surgem exatamente para esclarecer esta análise, ultrapassando, sempre que possível,

os limites dos questionários. Não nos preocupamos em criar idéias únicas, tipologias rígidas

ou em camuflar as polissemias reveladoras dos sentidos. O que também não inviabiliza que

regentes ou referentes básicos possam existir, com roupagens e nuanças diversas, com as

combinações, partilhas e contradições inerentes aos processos e às articulações que objetivam

ou ancoram a relação entre o ensino de Geografia e a EA. Deste modo, mais dez (10)

entrevistas, com quarenta e cinco (45) a sessenta (60) minutos de duração média (tempo

regulado pelas respostas dos sujeitos), foram realizadas com os sujeitos e integram-se ao

instrumental da pesquisa ora proposta.

De modo algum o aspecto científico fica depreciado, muito pelo contrário, ele

transcende os limites dos procedimentos cartesianos ao incorporar, na sua realização, uma


63

racionalidade, como proposta por Madeira (2001, p.132), caracterizada por “uma construção

que articula, ao nível dos sujeitos, o psíquico, o social e o histórico, no concreto das relações

que assinalam e articulam as partes de uma dada totalidade social, num tempo e num

espaço.”. Esta proposta de racionalidade vai além da abstração generalizante e absolutizada,

assumindo caracteristicamente estatuto de construção simbólica, historicizada e

circunstanciada. Aproxima-se, deste modo, de idéias como as de Calvino (1990) através das

quais o mundo pode ser visto e analisado, sem perder o caráter científico, com leveza e

exatidão, dentro de uma concepção que leve em conta e respeite a existência da

multiplicidade.

[...] a leveza para mim está associada à precisão e à determinação, nunca ao


que é vago e aleatório [...] leveza lugar de valor no presente e como projeto
no futuro [...] a leveza é um modo de ver o mundo fundamentado na filosofia
e na ciência [...] Exatidão quer dizer principalmente três coisas: 1) um
projeto de obra bem definido e calculado; 2) a evocação de imagens visuais
nítidas, incisivas e memoráveis e 3) uma linguagem que seja a mais precisa
possível como léxico e em sua capacidade de traduzir as nuanças do
pensamento e da imaginação [...] mostra esse conhecimento das coisas
enquanto relações infinitas, passadas e futuras, reais ou possíveis, que para
elas convergem [...] como método de conhecimento, e principalmente como
rede de conexões entre os fatos, entre as pessoas, entre as coisas do mundo
[...] no sentido em que vê o mundo como um “sistema de sistemas” [...] uma
pluralidade (multiplicidade de métodos interpretativos) das linguagens como
garantia de uma verdade que não seja parcial.

CAPÍTULO 2 – PRODUZINDO “ENREDOS”: percursos e relações entre a educação


ambiental e a Geografia.

É nosso intento poder compreender, como foram alguns dos caminhos e talvez

descaminhos, percorridos pelos saberes e fazeres da educação ambiental, da Geografia e, em

particular, dos seus ensinos nos últimos tempos. Não faremos aqui uma exposição extensa

pois, tanto a evolução da EA, quanto a da Geografia já foram abordadas de forma profunda

por outros estudos. Cabe frisar que não compreendemos nenhum dos campos de saber ora
64

abordados como estanques ou como disciplinas técnicas reificadas à parte das práticas

sociais41.

Num primeiro momento centraremos nossa atenção no contexto percorrido pela EA.

Em seqüência, não paralela e nem linear, apontaremos para a Geografia e seu ensino, visando

produzir um encontro necessário e evidente ao fim do capítulo entre todas estas noções.

2. 1 - A EDUCAÇÃO AMBIENTAL: avanços e permanências.

Partindo de documentos elaborados pelo Ministério do Meio Ambiente, Recursos

Hídricos e da Amazônia Legal42 uma possível definição de Educação Ambiental (EA) estaria

relacionada

ao processo participativo, revisor de conceitos sobre o mundo e a vida em


sociedade, conduzindo o ser humano e a coletividade na construção de novos
valores sociais, na aquisição de conhecimentos, atitudes, competências e
habilidades para a conquista e a manutenção do direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado.

A Educação Ambiental se insurge num contexto derivado do uso inadequado dos bens

coletivos planetários em diferentes escalas espaço-temporais (PEDRINI, 1998). O ponto de

partida desta nova mentalidade, tomou caráter oficial após a Conferência das Nações Unidas

sobre Ambiente Humano (1972) em Estocolmo. Na mesma, foi concebido o Plano de Ação

Mundial que, em particular, recomendou o estabelecimento de um programa internacional de

Educação Ambiental como elemento crítico para o combate à crise ambiental no mundo.

Entre os passos recomendados estariam a capacitação dos professores e o desenvolvimento de

novos métodos e recursos institucionais para a realização da EA. Três outros encontros

41
A postura aqui assumida tem por base nossa experiência como professor de Geografia, atuante em diferentes
níveis de ensino e corrobora-se, em referências e trabalhos, tais como, Alves (2002 e 1999). Esta autora, faz
questão de frisar sua acepção sobre a questão disciplinar de forma bastante evidente. “Entendemos não haver
“disciplinas” práticas. [...] Compreendemos que o currículo praticado incluí uma série de componentes entre
os quais podemos lembrar: disciplinas, práticas, seminários, pesquisas etc.” (Alves, 2002, p.16).
42
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, DOS RECURSOS HÍDRICOS E DA AMAZÔNIA LEGAL.
PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL - PRONEA Antecedentes Históricos, Linhas de Ação e
Ações Prioritárias, Relatórios, Brasília, 1997, 14p.
65

significativos ocorreram nos anos de 1977 em Tbilisi, na ex-URSS (CEI, Geórgia), onde se

realizou a Primeira Conferência Intergovernamental em Educação Ambiental, em Moscou

(1987) e em 1992 no Rio de Janeiro (CONUMAD/ECO-92).

Em Tbilisi43, em reunião promovida pela UNESCO, algumas prerrogativas foram

realçadas visando a execução da EA. Dentre elas destacamos: a base na ciência e na

tecnologia para a adequada apreensão dos problemas ambientais, fomentando uma mudança

de conduta quanto à utilização dos recursos ambientais; o dever de se dirigir tanto pela

educação formal como informal à pessoas de todas as idades; a função de despertar o

indivíduo a participar ativamente da solução de problemas ambientais do seu cotidiano; o fato

de ser necessária e permanentemente global; além de sustentar-se numa base interdisciplinar

que demonstre a dependência entre as comunidades nacionais, estimulando a solidariedade

entre os povos da Terra.

Em Moscou (1987), numa conferência não governamental, houve o reforço aos

conceitos consagrados em Tbilisi e um encaminhamento significativo no que diz respeito aos

aspectos cognitivos e aos afetivos da EA. Este encaminhamento reorientou o processo

educacional, via plano de ação, para a Educação Ambiental, a ser praticada na década de 90.

Para tanto, deveriam ser desenvolvidos modelos curriculares; intercâmbios de informações

sobre o desenvolvimento de currículos; desenvolvimento de novos recursos institucionais;

promoção de avaliações de currículos; capacitação de docentes e licenciandos em EA;

capacitação de alunos de cursos profissionalizantes, priorizando o turismo pela sua

característica internacional; melhoria da qualidade das mensagens ambientais veiculadas pela

mídia ao grande público; criação de um banco de programas audiovisuais; desenvolvimento

de museus interativos; capacitação de especialistas ambientais através de pesquisa; utilização

de unidades de conservação ambiental na capacitação regional de especialistas; promoção de

43
UNESCO/UNEP. Intergovernmental Conference on Environmental education. Final Report, Tbilisi, CEI,
1977.
66

consultorias interinstitucionais em âmbito internacional e informação sobre a legislação

ambiental, além de outras medidas não menos importantes (PEDRINI, 1998).

Na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento

(CNUMAD-92), oficialmente denominada de Conferência de Cúpula da Terra, várias

decisões, das quais o nosso país é signatário, foram tomadas. Entre elas destacamos: a criação

da Agenda 21, na qual o capítulo 36 aborda a promoção da educação, da consciência política e

da capacitação em EA; a inclusão da Educação nas Convenções sobre Mudanças Climáticas e

sobre a Diversidade Biológica; a Carta Brasileira para Educação Ambiental, criada

paralelamente ao evento, apontando para as necessidades de um compromisso real de todas as

esferas do poder público para o cumprimento e complementação da legislação e das políticas

de Educação Ambiental, com dimensão multi, inter e transdisciplinar, em todos os níveis de

ensino, com participação das comunidades de forma direta ou indireta; o Tratado de

Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global estabelecido,

via sociedade civil, através do reconhecimento da educação como um processo dinâmico em

permanente construção, logo baseado numa aprendizagem permanente, modificável e

respeitadora de todas as formas de vida.

Infelizmente, como aponta Pedrini (1995, p.125), o documento mais valorizado após o

evento, a Agenda 21, acabou por não contemplar adequadamente a EA, pois “[...] é

inapropriada aos países pobres, como o Brasil. Um documento contraditório, considerando as

ideologias conflitantes presentes nos diferentes países partícipes.”.

Devemos realçar que a preocupação em aproximar o meio ambiente à educação não é

tão recente em nosso país. Só não possuía a denominação de Educação Ambiental. Com o seu

conceito geral de meio para a preservação ambiental ou da natureza, anterior a Conferência de

Estocolmo, ela era citada como Educação Conservacionista, sanitária, ecológica, etc.

(VALLEJO et al., 1989). Com enfoque restrito à sua dimensão ecológica da natureza, já era
67

mencionada no Decreto Legislativo Federal n°3 de 13 fevereiro de 1948 (FBCN/CESP,

1986). Portanto, a preocupação em educar o público, via provento de Parques Nacionais, para

a preservação ambiental, mesmo que inicialmente numa concepção limitada à abordagem

naturalista, já totaliza quase 50 anos.

O efetivo surgimento do campo ambiental no Brasil está relacionado à década de

1970, simultaneamente ao momento de discussão da questão ambiental, pela primeira vez, em

escala mundial na Conferência de Estocolmo (ONU-1972). Nesta década, marcada pela

vigência da ditadura militar brasileira e pelo “Milagre Econômico” por ela empenhado, a

postura que mais assinalou a posição do Brasil sobre o Meio Ambiente se fez representada

oficialmente na Conferência de Estocolmo. Tal postura foi registrada num cartaz que

anunciava:

Bem vindos à poluição, estamos abertos a ela. O Brasil é um país que não
tem restrições. Temos várias cidades que receberiam de braços abertos a sua
poluição, porque o que nós queremos são empregos, são dólares para o nosso
desenvolvimento.

Essa iniciativa catastrófica, advinda do Ministério do Interior, foi motivo de amplas

críticas ao país e ao regime de crescimento adotado naquele momento. Por conseguinte, as

grandes discussões e conquistas do campo ambiental brasileiro somente terão espaço e

ganharão visibilidade na década posterior. Como argumenta Carvalho (2001, p.146),

é a penas a partir dos anos 80 que começa a configura-se um espaço próprio


dessa prática educativa. Desse modo, se o campo ambiental nasce nos nossos
anos de chumbo, a EA cresce nos anos da abertura política e da ascensão dos
novos movimentos sociais. [...] é a partir desse momento que alguns
educadores passam a se chamar de ambientais.

Um dos reflexos mais diretos desta configuração é que, em verdade, no plano

nacional, somente em 1981 a Lei n° 6.938 dispôs sobre os fins, mecanismos de formulação e

aplicação da Política Nacional do Meio Ambiente, consagrando a Educação Ambiental em


68

todos os níveis do ensino, inclusive na educação comunitária. O intento desta lei era preparar

para participação ativa da sociedade na defesa do meio ambiente.

Neste período, década de 1980, são organizados alguns encontros estaduais e

nacionais que podem ser caracterizados como espaços de estabelecimento de uma identidade

social, em torno das práticas educativas, voltadas para o meio ambiente. Em concomitância,

sob o aspecto da Lei, o Parecer 226/8744, do antigo Conselho Federal de Educação, deu a EA

caráter interdisciplinar e recomendou sua realização em todos os níveis de ensino, assim

como, estipulou sua disseminação em nosso país, por Centros de Educação Ambiental, a

partir de 1991. Neste mesmo ano, o MEC baixou portaria45, recomendando a instituição da

EA como conteúdo disciplinar em todos os níveis de ensino, mas objetou a constituição da

mesma como uma disciplina específica.

Na segunda metade da década de 1980 e no início da década de 1990, o debate

ambiental penetrou no cenário político, inclusive com a criação do Partido Verde. Mesmo

assim, esta entrada das questões e dos atores ambientais não se deu sem conflitos internos ao

campo dos movimentos sociais. Carvalho (2001, p.147) infere que a temática ecológica

provocou resistência da parte dos movimentos de base e sindicais, que “tendiam a ver a

preocupação ambiental como exógena, de classe média.”. Somente ao longo da década de

1990 é que os movimentos populares e sindicais se tornaram mais permeáveis à questão

ambiental, incorporando, em muitos casos, essa dimensão em lutas e interesses específicos,

entre os quais podemos citar, a Amazônia, as reservas dos seringueiros, os movimentos

feministas, as condições de exploração da natureza e do trabalho humano no campo e na

cidade.

44
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA Conselho Federal de Educação, Parecer n° 226/87. Brasília,
Documenta, 1987.
45
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Política de Educação Ambiental; Linhas de Ação. Brasília, Assessoria de
Educação Ambiental da Secretaria Executiva do MEC, 1991, 12p.
69

É nesse contexto de transição democrática, entre as décadas de 1980/90, que a

constituição de 1988, visando garantir o princípio do direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado (artigo 225) incumbe ao Poder Público “promover a Educação

Ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do

meio ambiente”. Em outra esfera, as constituições estaduais também consagram, em seus

textos, a promoção da Educação Ambiental, seguindo, pelo menos oficialmente, o artigo

constitucional.

Com o Plano Decenal de Educação para Todos (1993-2003), a dimensão ambiental

fica explícita, principalmente, nos objetivos referentes à satisfação das necessidades básicas

de crianças, jovens e adultos e da ampliação dos meios de alcance da educação básica.

Também, ampliam-se os espaços para a discussão da dimensão ambiental na educação através

dos Fóruns de Educação Ambiental, reunindo centenas de participantes, gerando outros

encontros regionais e locais, em pontos diversos do país. Importante salientar que a EA será

atravessada por transformações sociais e políticas inerentes ao período de mudanças de

paradigmas e de crise conjuntural do Estado, na década de 1990. Este período, marcado pelo

pensamento e ação neoliberais, acabará por proporcionar a entrada mais efetiva das

Organizações Não-Governamentais (ONGs) em diversos campos, incluindo o da Educação

Ambiental.

Não estamos afirmando que o Estado tenha deixado de deliberar normativamente

sobre a EA, ao contrário. No ano de 1994 foram aprovadas as diretrizes para implantação do

Programa Nacional de Educação Ambiental (PRONEA), com a participação de quatro

ministérios: Meio Ambiente, Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, Educação e do

Desporto, Cultura e Ciência e Tecnologia. Em 1996 criou-se, via Conselho Nacional do Meio

Ambiente (CONAMA) a Câmara Técnica Temporária de Educação Ambiental, além do


70

Grupo de Trabalho de Educação Ambiental, diretamente vinculado ao Ministério do Meio

Ambiente.

Por outro lado, ainda há necessidade de se promover uma ação articulada entre as

esferas do Sistema Nacional do Meio Ambiente e do Sistema de Educação, nos três níveis

governamentais. Segundo documentos do Ministério do Meio Ambiente, a coletividade deve

participar deste processo, como seu objeto e, como seu agente, sempre que possível. A

inserção do meio ambiente como um tema a ser tratado de maneira diferenciada na escola

ocorreu em 1997, quando a Secretaria de Educação Fundamental, ligada ao Ministério de

Educação e do Desporto, publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais. Neste documento, o

meio ambiente é apresentado como um tema transversal, a ser trabalhado nos currículos dos

ensinos fundamental e médio. As diretrizes apontadas estão baseadas na necessidade do

desenvolvimento de valores, atitudes e posturas éticas. Os seus procedimentos, balizam o

oferecimento aos alunos de conhecimentos que lhes permitam posicionar-se frente às questões

ambientais.

A Política Nacional de Educação Ambiental, lei nº 9.795 de 27 de abril de 1999,

aprovada em 25 de fevereiro de 2000, estabelece as diretrizes da EA no Brasil. Em seus

capítulos mostra como abordar a questão ambiental de forma articulada a nível local, nacional

e global. A referida Lei destaca: a atuação individual e coletiva na solução de problemas

ambientais pela parceria de instituições públicas e privadas; o reconhecimento e respeito à

pluralidade e à diversidade individual e cultural; o estímulo e fortalecimento de uma

consciência política das práticas sociais, sobre a problemática ambiental; a Educação

Ambiental em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-

formal, apoiando as iniciativas e experiências locais e regionais e; a produção de material

educativo, junto ao princípio de difusão de conhecimentos, metodologias, tecnologias e

informações sobre a questão ambiental, numa perspectiva de multi, inter e


71

transdisciplinaridade. A Educação Ambiental se viabiliza de forma interdisciplinar, pois a

dimensão ambiental envolve as mais diferentes áreas do conhecimento.

Não obstante todas essas normatizações, recomendações oficiais e incorporação de

idéias, a princípio instigantes, tais como as de, valores, cidadania, ética, concordamos com

Pedrini (1998) que, as organizações públicas enunciam políticas ambientais e não

educacionais e a coordenação de sua aplicação apresenta-se centralizadora e destituída de

referencial holístico de ação. Apesar da ampla estrutura normativa no Brasil e de seu tempo

de existência, sua ineficácia é notória. A falta de condições concretas para desenvolve-la,

finda-se no discurso normativo. Torna-se quase impraticável a EA, em sua essência, pela

ausência de redefinições nas políticas públicas, pois os governos estão submetidos a um novo

paradigma de Estado (DOWBOR, 1995), baseado na globalização e na descentralização da

gestão pública. Além disso, a própria dimensão da política educativa, em suas diferentes

esferas, parece ainda não ter se dado conta da necessidade de estabelecer um papel menos

normativo e mais compreensivo e articulador, no entendimento da diferentes realidades sócio-

ambientais vividas pelos sujeitos.

Soma-se a essa conjuntura uma outra. Os Fóruns de Educação Ambiental, eventos de

expressiva importância, referenciando produções e ações para a EA brasileira, ao congregar

diversos profissionais e ativistas na área, acabam demonstrando uma grande variedade de

concepções de EA. Tal situação, muitas vezes, cria competição no lugar da cooperação e da

contribuição entre as instituições, nas quais os trabalhos são desenvolvidos.

Desse modo, inviabiliza-se a compreensão da rede de possibilidades de trabalho com

valores, condutas e práticas ambientais mais harmônicas, embora não hegemônicas, já

existentes nos espaços escolares e fora deles. Aqui voltamos a destacar que, mais que nunca é

preciso superar estas fragmentações e, “pensar global/agir local, pensar local/agir global”.
72

Apesar de todos os contratempos, Carvalho (2001, p.151) indica avanços advindos dos

debates ambientais, a partir da década de 1990, ao salientar que:

Em que pese o baixo impacto das resoluções ante o processo de globalização


econômica, os debates ambientais - tanto em termos de políticas públicas
quanto da ação coletiva [...] passaram a constituir uma referência para as
discussões e ações no campo ambiental.

2.2 - A GEOGRAFIA: historiando alguns de seus caminhos no Brasil

Nesta parte do trabalho nos concentraremos em apresentar alguns aspectos da

Geografia que se relacionam a sua inserção e caracterização no contexto científico e

acadêmico e, principalmente sua configuração no que tange a formação de professores. Estes

aspectos serão, particularmente, contextualizados no âmbito da realidade brasileira, sem que

com isso estejamos nos fechando para influências advindas de outras realidades sobre este

campo de conhecimento em nosso país. Procurar-se-ão também elementos que permitam

estabelecer interfaces entre e Geografia, seu ensino e a Educação para com o meio ambiente.

2.2.1 - Percursos do Ensino da Geografia no Brasil

Sabe-se que a Geografia, enquanto saber sistematizado, teve e continua tendo, ao

longo de sua história, correntes paradigmáticas de pensamento, que através de diferentes

pressupostos e métodos de investigação da realidade influenciaram a formação de Geógrafos

e professores de Geografia. Entre estas correntes, podemos listar, a título de exemplo: a

Geografia Tradicional, Positivista, que teve como seus percussores os alemães Alexander von

Humboldt e Karl Ritter, praticada sobretudo até meados do século XX, com suas correntes

Determinista (Frederich Ratzel) e Possibilista (Paul Vidal de La Blache); Geografia Regional,

Positivista (anos 50 do séc. XX), considerada como uma "fase de transição"; as Geografias

Pragmáticas, Teorética e Quantitativa, ou "Nova Geografia", Neopositivista, dos anos 50 a 70

do mesmo século; a Geografia Humanística, baseada no homem e em seus aspectos


73

psicológicos, calcada por correntes como o Existencialismo e a Fenomenologia, a partir dos

anos 80 do século XX; e, de forma mais marcante que esta última, em período semelhante, a

Geografia Crítica, utilizando-se do Materialismo Histórico Dialético, ou somente da Dialética,

para entender e atuar socialmente no cotidiano.

Cada uma das correntes de pensamento geográfico insere-se no contexto histórico e

político dos momentos em que foram pensadas, e averiguamos que é possível encontrarmos,

para algumas análises, principalmente as mais recentes, estudos geográficos baseados na

multiplicidade de métodos e na revisão de pressupostos existentes nas diferentes correntes

citadas.

Na Antigüidade, egípcios, gregos, romanos, fenícios, árabes, persas, chineses e

astecas, dentre outros povos, desenvolviam um conhecimento geográfico "independente" e

diferenciado dos demais, de acordo com as suas próprias necessidades de entendimento do

mundo que os cercava. Este conhecimento era principalmente descritivo, ou matemático.

Descrições de viagens realizadas, de povos e paisagens observadas nos locais percorridos, e

teorizações e experimentos diversos eram realizados por filósofos, físicos, comerciantes, entre

outros. O mesmo ocorreu durante a Idade Moderna, na qual os povos ocidentais, que

passavam a dominar cultural e economicamente as novas terras por eles descobertas,

esforçavam-se por tentar explicar o que viam.

Estes períodos constituem a fase do conhecimento geográfico em sentido generalista,

pois estava disperso dentre outras formas de conhecimento, e dentre vários objetos de estudo

distintos, não sistematizados. A Geografia tem sua origem na Antigüidade Clássica, e até o

final do século XVIII, não se pode falar da Geografia como saber sistematizado.

A Ciência Geográfica, como forma de conhecimento humano ordenado e organizado,

com métodos minuciosos e objeto de estudo específico, começa a surgir somente em fins do

século XIX, em torno de 1870. Os alemães Alexander von Humboldt e Karl Ritter,
74

contemporâneos, desenvolvem uma sistematização dos conhecimentos geográficos passados e

presentes, dando uma característica própria e exclusiva à Geografia, tentando a unicidade

Humanidade-Natureza, enquanto método de estudo da realidade. Seus precursores mais

ilustres foram Bernard Varenius (séc. XVII) e Emmanuel Kant (séc. XVIII).

Os primeiros debates sobre a formação em Geografia, ocorreram no processo de sua

institucionalização no século XIX, aproximadamente entre 1860 a 1890, em países europeus

(Alemanha, França, Grã Bretanha, entre outros). Para Capel (1983) e Lacoste (1989), um dos

mais importantes elementos explicativos para a institucionalização dessa ciência, no referido

século, se deve às demandas realizadas pela sociedade da época. Dentre as mesmas, os autores

destacam a necessidade de formar professores para a docência, num momento histórico em

que ocorreu a rápida expansão da população escolarizada, elemento entendido como

primordial para o processo de desenvolvimento do modo de produção capitalista. O objetivo

fundamental da Geografia nas escolas primárias e secundárias era o de construir e/ou afirmar

os ideais patrióticos junto à população dos diferentes Estados nacionais europeus.

De maneira geral, esta função ideológica da Geografia é evidenciada quando a mesma

ganha o status de ciência na Alemanha, no século XIX, passando a ser denominada Geografia

Moderna. É nesta época que a disciplina passa a ser ensinada em todas as escolas alemãs e nas

universidades, tendo um papel importante no processo de unificação Alemão e, também, na

derrota da França na guerra Franco-Prussiana.

Vlach (1988), explica que a Geografia teve uma função primordial na construção do

nacionalismo patriótico, explicitando a relação desse com o progresso, ambos frutos do

capitalismo. A autora enquadra o nacionalismo como sendo uma das maneiras de ofuscar a

divisão social produzida pelo sistema capitalista, no qual o discurso da necessidade de

progresso da pátria seria um complemento ideal para que, à medida que todos concordassem

em se sacrificar pela pátria, esta se imporia acima das classes sociais, dos partidos, respaldada
75

pelo Estado que a vigia, a dirige, a protege e a reproduz. Essa concepção pode ser aliada às

reflexões de Ginzburg (2001) sobre o mito do patriotismo no estabelecimento do Estado

nação. Esse último constituía-se numa espécie de mito fundador, a partir do qual se

legitimava, construía ou reforçava a idéia de país, de unidade nacional, junto à população.

Conforme argumentado por Katuta (2002), predominavam os discursos

exacerbadamente descritivos, naturalizadores e naturalizantes das características de

determinados lugares, concebidas e/ou abordadas como naturais (clima, relevo, vegetação,

língua, população, costumes, entre outros), ou próprias de um determinado Estado nacional,

negando portanto, as condições sócio-históricas sob as quais esse último foi edificado.

Segundo Capel (1983), como antes do século XIX não existiam cátedras em

Geografia, profissionais de outras áreas (historiadores, filólogos, botânicos com formação

histórica, matemáticos, políticos, eclesiásticos, militares, naturalistas, navegantes,

comerciantes, farmacêuticos, zoólogos, geólogos, professores de outras cátedras do ensino

superior, entre outros), pertencentes às Sociedades Geográficas executavam as funções de

estudiosos e pesquisadores, que respaldavam as ações imperialistas dos Estados nacionais

europeus. Essas funções somente passaram a caber aos profissionais geógrafos, no último

terço do século XIX, com a institucionalização dos cursos superiores de Geografia.

Com a premência do atendimento às necessidades educacionais das escolas

elementares, que demandavam por um discurso geográfico justificador e legitimador do

Estado burguês, verifica-se que a formação em nível superior na área de Geografia na Europa

foi pensada. Em relação ao nível universitário, Trindade (2000) relaciona a institucionalização

da Geografia ao surgimento da Universidade Moderna, caracterizada pela sua ligação e

sujeição às complexas relações entre sociedade, conhecimento, Estado e poder.

Essa sujeição, não somente restrita à Geografia, permitirá a Capel (1983), caracterizar

a Ciência Geográfica produzida entre 1870 a 1890 como “filha do imperialismo”, pois a
76

realização de pesquisas e trabalhos na área, estava, em grande parte, relacionada com

objetivos imperialistas ou era por estes apropriados. Entre os exemplos que corroboram esta

concepção de Capel, podemos citar a oposição entre o pensamento alemão Ratzeliano, de

leitura determinista das pessoas e do ambiente e o pensamento francês de Lablachiano,

percussor do possibilismo. O primeiro fundamentou as concepções sobre a Geopolítica, de

base naturalista e generalista, contrapondo-se, conforme observado por Sansolo & Cavalheiro

(2001), ao segundo, cuja base metodológica associava-se a perspectiva regional, que conferia

aos lugares singularidades próprias.

Quando nos remetemos ao Brasil, encontramos uma trajetória similar no contexto da

Geografia. De acordo com Rocha (2000), até o século XIX os conhecimentos geográficos

ensinados nos estabelecimentos educacionais existentes não estavam organizados a ponto de

constituírem uma disciplina escolar específica. Neste período, em que os jesuítas foram os

responsáveis quase que exclusivamente pela educação formal ministrada no país, o ensino dos

conhecimentos geográficos era secundarizado no currículo previsto. Lançava-se mão, dentre

outras coisas, de informações de caráter geográfico, bem ao estilo da Geografia Tradicional,

no que ela tinha de mais descritiva. A descrição de um dado território, bem como do povo que

nele habitava, era um dos recursos utilizados pelos professores para melhor elucidar um

trecho analisado. Também, de forma análoga ao que já apontamos no período da Antigüidade,

Rocha (2000), indica que a concepção de Geografia que perpassava estes saberes era a da

Geografia matemática, cuja principal característica foi a forte influência, por esta recebida,

das ciências matemáticas. Os professores, ao realizar os ensinamentos sobre a Terra, deveriam

fazê-lo em conexão com os conhecimentos da astronomia, cosmografia, da cartografia, bem

como da geometria.

Como conseqüência dessa situação, que no Brasil durará mais de duzentos anos, a

Geografia não teve assento nas escolas enquanto disciplina escolar. Não existiram, também
77

cursos de formação de professores(as) para atuar com o ensinamento destes saberes. Os

conhecimentos geográficos, por serem de grande, porém exclusivo, interesse do Estado, eram

pouco disseminados nas salas de aulas.

Anselmo (2002), em texto que associa a formação do professor de Geografia ao

contexto da formação nacional brasileira, afirma que a ciência geográfica, propriamente dita,

passou a ganhar importância com a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro

(IHBG), em 1838, e da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro (SGRJ), em 1883. A partir

das inferências desta autora, podemos observar que foi somente no século XIX que o ensino

de Geografia adquiriu maior importância na educação formal existente no país.

Com a criação do Imperial Colégio Pedro II, localizado na antiga Corte, a disciplina

Geografia passou a ter um novo status no currículo escolar. Influenciado pelo modelo

curricular francês, no novo estabelecimento de ensino predominavam os estudos literários,

mas, apesar de não serem a parte mais importante daquele currículo, nele também estavam

presentes as Ciências Físicas e Naturais, a História, as Línguas Modernas e a Geografia

(ROCHA, 2000).

Os primeiros momentos da trajetória da Geografia como disciplina, através influência

e ação do professor Carlos Delgado de Carvalho, garantiram a mesma um espaço no campo

escolar. De forma similar, no estado de São Paulo, o professor Everardo Backheuser ensaiava

outra iniciativa de institucionalização do ensino da Geografia através do Curso Livre de

Geografia Superior. Apesar do espírito de rompimento com o padrão mnemônico de então,

representado pelos professores Delgado de Carvalho, Everardo Backheuser e outros

colaboradores da época, principalmente os do Colégio Pedro II, manteve-se quase que

inalterado, em suas características principais, o contexto que caracterizava a Geografia escolar

com uma nítida orientação clássica, ou seja, descritiva, mnemônica, enciclopédica e distante

do vivido pelos alunos.


78

Conforme aludido por Anselmo (2002), o movimento de renovação educacional que

caracterizou a década de 1920, produziu impacto sobre a renovação da Geografia da época,

através da modernização da disciplina e da sua atualização. Tal movimento visava a

constituição de um sentido prático para atuação da mesma. Todavia, convivia-se ainda com

um contexto no qual grande parte dos professores que ministravam as disciplinas, na então

educação secundária, procediam de outras formações acadêmicas, o que era fato comum, mas

já carregado de sentidos negativos. Lourenço Filho, em 1929, criticava que estes docentes

constituíam-se na verdade de médicos “sem clínica”, bacharéis “sem causas”, ou seja, de

profissionais sem êxito nas suas profissões, que somente realizavam exposições para os

alunos cujas funções eram anotar e decorar. Esta realidade só começará a mudar, conforme

aponta Rocha (2000) com a entrada em funcionamento dos primeiros cursos de formação de

professores de Geografia no Brasil.

Machado (2002) realizou estudo que permitiu perceber como, a partir da década de

1930, foram implantadas importantes instituições de ensino e pesquisa em Geografia no

Brasil. Estas instituições chegam a ecoar inclusive para os demais países latino-americanos,

encontrando-se entre elas: o Conselho Nacional de Geografia e Estatística (1937), o Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (1938), a Associação dos Geógrafos Brasileiros (1934) e

os Cursos de Geografia e História da Universidade de São Paulo (1934) e da Universidade do

Distrito Federal (1935). Segundo a autora, tais instituições promoveram impulsos à produção

geográfica brasileira, implementaram formas de organização e metas, redirecionaram a

Geografia e sua produção e, também, delimitaram seu contorno científico-disciplinar.

O contexto da formação nacional brasileira teve, em todo o processo histórico que lhe

é próprio, uma forte orientação autoritária. À medida que foi se consolidando uma via de

implementação do capitalismo moderno, tornava-se, segundo Anselmo (2002), imprescindível

um pensamento geográfico que justificasse e sustentasse a idéia de nação que ia se compondo.


79

Rocha (2000) nos indica que foi através do decreto n°19.851, de 11 de abril de 1931, que o

ministro Francisco Campos renovou o ensino superior brasileiro com a introdução do sistema

universitário. Com este decreto foram criadas as Faculdades de Educação, Ciências e Letras,

espaços acadêmicos que passaram a abrigar, dentre outros cursos, o de Geografia.

Pela primeira vez, surgiam professores que haviam tido uma formação que os

qualificava para o exercício do ensino de Geografia, formação esta assentada numa concepção

científica dessa ciência, bem como numa pedagogia renovada. É importante destacar que

Delgado de Carvalho, de forma mais efetiva, teve um papel de fundamental neste momento,

tendo inclusive participado da assinatura do manifesto dos Pioneiros da Educação, por ocasião

da IV Conferência Nacional de Educação em 1931.

De acordo com Barros (2002), são estas mudanças implementadas por políticas do

Estado que beneficiam a consolidação da Geografia enquanto ciência e disciplina escolar a

partir da década de 1930. Para ministrar aulas nessas faculdades foram trazidos geógrafos

franceses, alemães e italianos, que se dedicam exclusivamente na construção desta ciência no

Brasil e na formação das primeiras gerações de geógrafos, principalmente com destino ao

ensino secundário, que acontece no ano de 1937. Destaca, apropriadamente, a autora, na

mesma linha de raciocínio de outra autora já citada, Anselmo (2002), que o caráter científico

do conhecimento geográfico vai se adequar e adequará ao discurso nacionalista objetivado

pelo Estado. Nesta relação institucional, assumida pelos intelectuais, principalmente os

liberais e progressistas da época, é que se via a solução para os problemas da existência deste

ramo do saber, assim como, a viabilização racional para a construção da nação brasileira.

Portanto, na década de 1930, no contexto da política nacionalista, e de um novo tipo

de desenvolvimento capitalista no Brasil, agora com suas atividades baseadas na indústria e

no comércio interno, é que a Geografia terá seu reconhecimento enquanto ciência, atingindo

seu momento de maior peso e influência junto ao Estado e à sociedade brasileira. Como
80

impacto, tanto em seus primórdios, quanto ainda hoje, são, principalmente, as instituições

públicas que continuam mantendo os cursos de Graduação e Pós-graduação de Geografia em

nosso país.

Essa posição da Geografia se consolida em 1942, com a Reforma Gustavo Capanema,

então Ministro da Educação e Saúde do governo de Getúlio Vargas. Como um aprimoramento

da reforma anterior, esta deixava ainda mais clara a função da educação na formação da

consciência patriótica e na consolidação de uma integridade nacional, objetivos claros da

política educacional coordenada pelo Estado na época. O Estado permanece ainda definindo

os currículos e questões administrativas do ensino médio e superior (BARROS, 2002).

Cabe aqui entendermos que atribuir à década de 1930 como um marco para a

Geografia no Brasil é também contextualizar a esta última, enquanto ciência e,

principalmente, enquanto disciplina escolar, dentro de um escopo de utilização veicular para o

discurso do Estado centralizador e nacionalista. Por trás do Estado estava a sociedade

burguesa que se rearticulava para restaurar as condições para o mercado. Este contexto não

impactará somente sobre Geografia e o seu ensino, ele estará presente na racionalidade

técnica fundante da própria concepção das Licenciaturas no Brasil.

Sobre estas, afirma Pereira (2000), foram criadas a partir das antigas faculdades de

Filosofia, conseqüência de uma preocupação com a regulamentação do preparo de docentes

para a escola secundária. O modelo inicial dos cursos ficou conhecido como “3+1”, no qual o

conjunto das disciplinas denominadas de “pedagógicas”, que, em geral, tinham duração

aproximada de um ano, justapunha-se ao conjunto das específicas ou de conteúdos específicos

que tinham duração em média de três anos, daí a denominação “três mais um”.

Esse modo de entender a formação docente, conhecida como “Modelo da

racionalidade técnica”, segundo o mesmo autor, concebe o professor como um técnico, um

especialista que aplica com rigor, no seu cotidiano de trabalho em sala de aula, as regras
81

oriundas do conhecimento científico e pedagógico. Neste sentido, para formar tal profissional

é necessário um conjunto de disciplinas científicas e pedagógicas que fornecerão as bases para

a sua ação. O estágio supervisionado, é entendido como um momento de aplicação de

conhecimentos e habilidades científicas e pedagógicas em sala de aula. Qualquer semelhança

com os cursos de licenciatura em Geografia que ainda temos, não é mera coincidência.

Para as licenciaturas implementadas no Brasil a partir da década de 1930, entre as

características ressaltadas por Pereira (2000), inclusive voltadas para a Geografia, podemos

citar: separação entre teoria e prática na preparação profissional; priorização da formação

teórica em detrimento da prática; concepção da prática como mero espaço de aplicação de

conhecimentos teóricos e, por fim, crença de que para ser um bom professor ou geógrafo,

basta o domínio da área de conhecimento específico em que se vai atuar. Fundamentada neste

modelo, uma maior difusão de cursos de formação de professores de Geografia ocorreu a

partir da década de 50 do século XX. Nas universidades públicas e mesmo em instituições de

ensino privadas, novas turmas ingressavam e qualificavam profissionais para atuar com a

docência nos diferentes níveis de ensino.

Conforme constatado por Rocha (2000), com a entrada em vigor da Lei n°4024/61,

que estabelecia as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, os cursos de formação de

professores(as) de Geografia passaram a ter uma nova regulamentação. Esta nova legislação

passou a exigir um currículo mínimo de caráter nacional para todos os cursos de graduação.

Para atender ao estipulado foram fixados em Resolução de 19 de dezembro de 1962, os

mínimos de conteúdos e de duração do curso de Geografia.

Mesmo com o advento da legislação conservadora do período militar, materializada na

Lei n°5540/68, que promoveu a chamada Reforma Universitária, os mínimos previstos na

Resolução anterior foram mantidos em vigor, acrescentada a obrigatoriedade do ensino-


82

aprendizagem das matérias pedagógicas, Educação Física e Estudos de Problemas Brasileiros

(ROCHA, 2000).

A Lei n°5692/71, organizou a educação básica oficial brasileira em dois níveis de

ensino: o primeiro e segundo graus. A mesma legislação ao organizar o currículo escolar,

estabeleceu um núcleo comum e uma parte diversificada, que constituiriam o currículo pleno

do estabelecimento de ensino. Fazendo parte do currículo pleno, as autoridades educacionais

do período, marcado pela ditadura militar no Brasil, introduziram os Estudos Sociais na grade

curricular das escolas de primeiro e segundo graus. Ainda segundo Rocha (2000), o Parecer

n°853/71 definiu que o ensino dos Estudos Sociais deveria ocorrer sob a forma de

“atividades” nas quatro primeiras séries do primeiro grau e na forma de “área de estudo” nas

quatro séries finais do mesmo curso. Frise-se que esta área de estudos deveria ser constituída

pelos conhecimentos oriundos da Geografia, História e Organização Social e Política do

Brasil.

A introdução dos Estudos Sociais nas escolas de primeiro e segundo graus fazia parte

de um processo mais amplo de reforma da educação brasileira, iniciada já no mesmo ano em

que os militares deram o golpe e assumiram o comando do Estado brasileiro. Numa nítida

política de tornar mais precária ainda a formação dos(as) professores(as) brasileiros(as), em

17 de janeiro de 1972 o Conselho Federal de Educação reduziu, por força da Resolução n°1, a

duração das licenciaturas curtas para 1200 horas, sem alterar, entretanto, o currículo anterior.

A “toque de caixa”, os professores obtinham sua “qualificação para o exercício da docência”

no tempo recorde de três meses, numa formação aligeirada que favorecia os interesses do

mercado.

Verifica-se que inúmeras instituições de ensino superior fecharam suas licenciaturas

plenas em Geografia, optando pelos cursos de Estudos Sociais, fato evidenciado sobretudo em

instituições particulares que viram nas licenciaturas curtas um grande filão econômico
83

(ROCHA, 2000). Com algumas modificações do projeto original, as mudanças que acabaram

sendo implantadas na estrutura dos cursos de licenciatura curta em Estudos Socais, na década

de 80, permitiram que os licenciados que tivessem interesse e, freqüentassem mais dois anos

letivos de caráter específico em Geografia ou em História, recebessem o diploma de estudos

adicionais, que lhes garantiria os mesmos direitos dos licenciados plenos. Devido à pressão

promovida por estudantes, professores e sobretudo pelas entidades representativas das

categorias atingidas, estes cursos foram sendo aos poucos eliminados. Entretanto, suas

seqüelas ainda hoje são sentidas no interior das escolas brasileiras.

No momento atual, vivemos um processo de reformas curriculares em função das

mudanças ocorridas com a entrada em vigor da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (Lei n°9394/96). Os cursos de formação estão sendo obrigados a rever seus projetos

pedagógicos, o que inclui, evidentemente, a revisão dos seus currículos. O Ministério da

Educação e Cultura (MEC), assumindo para si o papel de reformador das propostas

curriculares, impõe a sua política de Diretrizes Curriculares Nacionais. Estas, refletindo uma

postura adotada pelos últimos governos, buscam adequar os cursos de formação à lógica do

mercado de trabalho. A ênfase dos cursos deixa de ser assentada na sólida formação teórica,

passando a ser priorizada a aquisição das chamadas competências e habilidades por partes

dos(as) futuros(as) profissionais.

Em paralelo a esses momentos, a Geografia e o seu ensino vêm, através de seus

profissionais, caracterizando-se desde 1978, a partir do Encontro Nacional de Geógrafos

realizado em Fortaleza-CE, por uma explosão critica contrária ao positivismo e à chamada

Geografia “tradicional”. Nas décadas de 70 e 80 do século XX, surgiram questionamentos no

interior da Geografia, a respeito dela mesma, que produziram uma crise no pensamento

geográfico brasileiro. Num balanço do período Santos & Bernardes (1999) apontam o

trabalho de Manoel Corrêa de Andrade, datado de 1977, como tendo uma importante visão
84

sobre as transformações que sofria a disciplina naquele momento. Andrade chamava atenção

para os riscos que corríamos caso, saltássemos de uma Geografia de cunho local e culturalista,

para uma Geografia abstrata e quantitativa, na medida em que ambas se distanciavam de uma

preocupação social do mundo, tal como este se constitui.

Os profissionais de Geografia passamos a duvidar da visão epistemológica vigente, ou

seja, o positivismo, o neo-positivismo e os modelos da escola francesa, entendendo que estas

visões não explicavam a realidade de nossos países, cada vez mais em desigualdade sócio-

econômica em relação aos países ricos. Em “crise produtiva”, buscamos novos paradigmas

para compreender os problemas do cotidiano, em especial do espaço geográfico. Nos últimos

tempos, incorporam-se discussões e produções ligadas à questões mais subjetivas, rompendo

assim, tanto com o positivismo, como com o marxismo ortodoxo.

Pinheiro (2002) afirma, para as décadas de 1980 e 1990, que as diversas discussões

desencadeadas fomentaram em vários geógrafos a necessidade de recorrer às raízes filosóficas

do pensamento geográfico, buscando na sua história outros caminhos para o estudo e a

pesquisa da Geografia e do seu ensino. Tratando das questões filosóficas, vários

pesquisadores abraçaram a discussão, o que resultou em uma infinidade de eventos, artigos e

publicações. Nunca houve tanta fertilidade na produção de trabalhos sobre o ensino de

Geografia como a desencadeada daquele momento ao período atual.

Na busca de explicações mais plurais que promovam a superação da fragmentação do

conhecimento e de práticas pedagógicas que permitam a compreensão das diferentes

realidades, a articulação da Geografia com outros campos do saber, como a Antropologia, a

Sociologia, a Biologia e as Ciências Políticas, através dos seus profissionais e seus

instrumentais analítico-metodológicos, tem sido uma prática marcante.

Ao questionar os paradigmas societários hegemônicos, os profissionais de Geografia

demos conta da importância da mudança na utilização da mesma na escola. A discussão sobre


85

o ensino de Geografia passou a ser realizada no contexto das contradições da sociedade,

sobretudo com o advento da mundialização da cultura e da globalização da economia e, de

suas diferentes implicações locais (SANTOS, 1988).

Pontuschka (2001) destaca, além da importante produção geográfica sobre o ensino

colocada á disposição dos professores de Geografia e dos formadores de professores no país

nas décadas de 1980 e 1990, a melhoria na qualidade dos livros didáticos, principalmente para

o Ensino Médio. Acrescenta ainda, o papel fundamental da Associação dos Geógrafos

Brasileiros (AGB) na promoção de eventos, com o objetivo principal de pensar o ensino de

Geografia no país. Estes encontros têm congregado tanto os professores das universidades,

quanto aqueles dos ensinos fundamental e médio. Já faz parte do calendário de eventos em

escala nacional, no Brasil, o chamado “Encontro Nacional de Geografia - Fala Professor”,

além dos Encontros Nacionais de Didática e Prática de Ensino de Geografia. Atualmente,

existem acervos de dissertações e teses versando sobre o ensino e a aprendizagem da

Geografia, assim como, linhas de pesquisas estruturadas sobre estes campos.

Se levarmos em conta somente o último Encontro Nacional de Geografia (João

Pessoa- PB, 2002), poderemos observar que foram apresentados no “Espaço de Diálogo”46

referente ao Eixo de Ensino da Geografia, mais de cento e oitenta (180) trabalhos completos,

configurando-se, deste modo, no eixo de maior procura e apresentação de trabalhos do evento.

Observamos também que uma constante diversificação nas temáticas relativas ao Ensino da

Geografia tem se dado, abordando o Ensino de Geografia propriamente dito, a Educação

Ambiental, a Formação do Professor, o Perfil do Estudante de Geografia, a Educação Popular

e a Cidadania, a Interdisciplinaridade e Ensino de Geografia, as Novas Tecnologias e Ensino

de Geografia, o Material Didático em Geografia, o Trabalho de Campo como Instrumento

46
Atividade que contempla a apresentação de trabalhos e da qual tanto os apresentadores como os participantes
sem trabalhos inscritos têm a oportunidade de discutir, apresentar experiências e trocar informações.
86

Didático, o Ensino, a Pesquisa e a Extensão, os Recursos Pedagógicos, as Experiências

Didáticas com Geotecnologias na Formação do Geógrafo e a Cartografia Escolar.

Resgatando algumas idéias de Santos & Bernardes (1999, p.21), talvez possamos

entender as razões dessa valorização do ensino da Geografia e da incorporação de temáticas

emergentes na discussão do mesmo, ainda mais se entendermos que a educação se faz como

um projeto, um caminho, cuja base da emoção e da sensibilidade constituem a fonte do

presente, o resgate do passado, e as perspectivas de futuro, todos entrelaçados.

[...] a Geografia precisa voltar-se à compreensão da existência humana e, ter


em conta a dimensão ética para que, nos trabalhos, a emoção e a
sensibilidade estejam presentes. Limitamo-nos, muitas vezes, a constatar o
resultado do trabalho do homem na modificação da crosta terrestre e, nossas
preocupações morais são, no máximo, a posteriori, enquanto a preocupação
moral só é a priori se o nosso pensamento se voltar para o futuro.

2.3 – O ENCONTRO NO CAMINHO: a Geografia e suas possibilidades de contribuição


à educação para com o meio ambiente.

A esse respeito, as ciências acumuladoras de estudos ambientais “interativos”, que

associam ambiente e sociedade e trabalham com diversas escalas de tempo-espaço-relação,

têm papel importantíssimo no cenário educacional. Entre elas, destacamos a Geografia. Há,

porém, que se repensar os problemas ambientais à luz dos conhecimentos por ela já

consolidados e aproveitar seus potenciais de associação.

A Geografia, por conta de um “modelo” adotado no seu surgimento, enquanto

disciplina escolar, tem sido vista, de acordo com Rocha (1996), como disciplina que enumera

para cada porção territorial estudada, o relevo, o clima, a vegetação, a população, a

agricultura, as cidades e as indústrias. Esta visão, fortemente influenciada pelo pensamento

positivista, imprimiu durante várias décadas, no Brasil e em diversos países do mundo, uma

caracterização descritiva, empiricista, fragmentária e dicotômica ao saber geográfico e ao seu

ensino. A situação parece refletir representações que vem se repondo como idéia reguladora
87

da razão científica, de forma semelhante ao que Sawaia (1998) identificou ao tratar da

separação constituída por sistemas de representações acerca do uno e o múltiplo, do sujeito e

o objeto nas análises do pensamento ocidental.

Atualmente, novas práticas político-pedagógicas se fazem presentes, chegando-se a

exprimir a emergência de um profissional de Geografia caracterizado com Geógrafo-

Educador – Rocha (1996) e Vale (1997). Um profissional questionador sem ser discriminador,

que “[...] sabe incorporar, donde venham, aportes que ajudem à compreensão de realidade em

termos totais.” (SANTOS, 1993, p.132).

Nessa perspectiva, sua formação volta-se a permitir a análise da realidade social,

econômica, cultural, política, ambiental, marcando uma unidade na diversidade, sem

desconsiderar que as diferentes realidades devem ser percebidas e contextualizadas

criticamente, através da compreensão do espaço geográfico como

[...] um conjunto indissociado em que participam, de um lado, certo arranjo


de objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e de outro, a vida
que os preenche e os anima, ou seja, a sociedade em movimento. (SANTOS,
1994, p.26).
A problemática ambiental, segundo Rodrigues (1994), é que irá colocar em evidência

a necessidade de se compreender o espaço, não como fetiche, mas como uma forma de

verificar as contradições entre os modos de apropriação da natureza e a produção social. A

este respeito, uma das preocupações que devemos ter recai sobre a visão que a Geografia tem

a cerca da relação homem-natureza na atualidade. Recorreremos a Milton Santos nesta

tentativa de tomada de consciência.

Segundo o autor (SANTOS, 1988), o homem constitui, no âmbito da natureza, uma

forma de vida que se distingue das demais através do trabalho, tornando-o capaz de produzir.

Na sua relação com a natureza o homem assume uma atitude de invenção. Nesta invenção, o

trabalho é um processo de troca recíproca e permanente entre Homem e Natureza. O homem


88

realiza ações a fim de suprir as condições necessárias à manutenção da espécie. O homem

necessita aprender a natureza a fim de apreendê-la. Deste modo, a relação entre o homem e o

seu entorno é um processo sempre renovado que tanto modifica o homem quanto a natureza.

É, a todo tempo, uma múltipla modificação entre ambos e por ambos. Até Hartshorne (1978)

já apontara no século XIX a impossibilidade de se desvincular o estudo do homem do estudo

da natureza, assim como, especificamente para a Geografia, não haveria sentido em se estudar

a natureza desvinculada do homem.

Podemos observar que os grupos humanos, no início descoordenados, ao longo do

tempo, adquiriram coesão com seu meio, era “o tempo da natureza amiga” e do “homem

amigo”. De acordo com Santos (1994), a história do homem sobre a terra é a história de uma

ruptura progressiva entre o homem e o entorno. A partir deste momento, o problema espacial

ganha contornos jamais vistos.

Com a evolução da história humana, a economia mundializada desfaz os modelos

particulares de associação do homem com a natureza. Todas as sociedades adotam, de forma

mais ou menos intensa, um único modelo técnico que se sobrepõe à multiplicidade de

recursos naturais e humanos (ai incluídas as culturas). Com esta enorme mudança a natureza

continua sendo una porém, foi socialmente se fragmentando e, é agora unificada pelas firmas,

Estados e classes hegemônicas (SANTOS, 1996).

Por esta linha de raciocínio, dentro do atual sistema da natureza, o homem se afasta da

possibilidade de relações totalizantes com seu próprio entorno. O que parece estar em suas

mãos é concreto, mas não para ele, são partes desconexas do todo. Como então ele se

identificaria com seu entorno?

Não que haja uma mundialização da natureza, mas há uma natureza unificada em uma

economia mundializada. Este processo é econômico e, é, por sua vez, controlado pelos atores
89

hegemônicos em escalas estranhas ao lugar, causando impactos verticais – verticalidades47 - e

destruindo, ou tentando destruir e comandar as ações solidárias ao lugar – horizontalidades48.

Parece que a única base reativa é o espaço compartilhado no cotidiano, ou seja, o lugar.

“Lugar este onde os homens estão juntos, sentindo, vivendo, pensando, emocionando-se”

(SANTOS, 1996, p.258).

É neste ponto que fica clara a necessidade do entendimento da estrutura do meio

ambiente que se objetiva pela prática educação ambiental. No começo da história humana, a

sociedade era contida pela natureza. Hoje não. A natureza é contida pela sociedade. Desta

forma, é enganoso o ensino da EA que escamoteia o fato de que, a cada momento, é a

sociedade em movimento que dá valor a cada pedaço da natureza. Nesta transição entre

milênios, a natureza, como realidade histórica, não existe por si só. Como o espaço e como o

planeta, inteiro, a natureza é objeto do exercício das idéias do homem, do seu trabalho e das

suas intenções, paixões e da sua cultura.

Autores como Sansolo & Cavalheiro (2001) entendem que cabe a Geografia

considerar o meio natural no espaço geográfico, mesmo naqueles lugares intensamente

transformados pela sociedade. Na visão destes autores, os processos naturais não deixam de

existir e devemos incorporá-los nas análises a respeito das transformações produzidas pelas

sociedades. As questões ambientais envolvidas seriam resultados das inter-relações sociais

com a natureza, não devendo ser excluídos para tanto os processos naturais em suas diversas

escalas de ocorrências.

Ao proporcionar um desvendamento sobre as relações espaciais entre


sociedade e natureza, aí estará a grande contribuição da Geografia para um
processo de Educação Ambiental. (SANSOLO & CAVALHEIRO, 2001,
p.115).

47
Segundo Santos “a idéia de verticalidade vem desses vetores que se instalam nos lugares e que pouco se
importam com o que está em seu entorno. É o que corresponde, sobretudo, às ações das empresas globais.”
(SANTOS, 2000, p.53).
48
Como horizontalidade apreende-se “o resultado da vizinhança, da coabitação, da coexistência do diverso...”.
(SANTOS, 2000, p.53).
90

Não podemos deixar de lado, e, muito menos, não justificar, que é a perspectiva de nos

aproximarmos de como a EA é interpretada pelos professores de Geografia que poderá nos

permitir o entendimento de suas práticas, inclusive da compreensão da prática educativa em

torno de valores, contradições, complementações e condutas que possibilitem ou não uma

visão mais integrada de Educação e do meio ambiente. Isto se justifica, inclusive, visando

permitir futuras ações que promovam e ampliem as discussões e as práticas educativas

ambientais de forma mais integrada entre este campo de saber e os demais.

Pensamos que os processos de cooperação e de luta, inerentes à vida cotidiana

promoverão continuamente interações e comunicações, reivindicando a consciência do outro e

ações intersubjetivas. A atribuição de significados aos processos e contextos, como por

exemplo, os do meio ambiente, ocorre a partir da experiência cotidiana do lugar/espaço onde

se vive, ao que Fischer (1994) denominou espaço de vida4941. Cabe ao profissional de

Geografia, dentro de um contexto complexo, entender que a sociedade humana se realiza no

espaço banal (espaço de todos), no lugar, no cotidiano, em um movimento também complexo,

cheio de determinações, de mediações e surpresas. Cabe também que entendamos as práticas

desses profissionais como uma combinação das possibilidades e impossibilidades inerentes

aos seus cotidianos. É neste contexto complexo, que os mesmos podem contribuir, lançando

mão de instrumentais de ação apreendidos na suas práticas como Geógrafos-Educadores.

Neste sentido, é interessante frisar que Morin, um sociólogo, apontara que a

Geografia, antes aprisionada e marginalizada por “disciplinas vitoriosas”, privada do

49
Esta perspectiva, inferida por Fischer, é interessante, pois chama a atenção para o fato de que o lugar onde se
vive é o ponto de partida para o estabelecimento do sentido do meio ambiente a ser transmitido,
significativamente pelo seu vivente. Para o autor, viver remete às relações que organizam e são organizadas
neste espaço vivido e, que o caracterizam, diferenciando-o significativamente de outros. “A relação dos
indivíduos e dos grupos com seu ambiente é assim o resultado de processos complexos nos quais intervêm uma
multiplicidade de fatores culturais, espaciais e institucionais, próprios de um dado contexto”. (FISCHER, 1994,
p.195).
91

pensamento organizador, torna-se ciência complexa por princípio, reencontra suas

perspectivas multidimensionais, complexas e globalizantes, “Uma Ciência da Terra dos

homens.” (MORIN, 2000a, p.29).

A propósito do pensamento complexo Morin & Kern revelam-no como sendo

[...] um pensamento que reúna o que está separado e compartimentado, que


respeite o diverso sem deixar de reconhecer o uno, que tente discernir as
interdependências de um pensamento radical (que vai à raiz dos problemas);
de um pensamento multidimensional; de um pensamento organizador ou
sistêmico que conceba a relação todo/partes, tal como se começou a
desenvolver nas ciências ecológicas e nas ciências da Terra; de um
pensamento ecologisado que, em vez de isolar o objeto estudado, o considere
na e pela sua relação auto-eco-organizadora com o seu ambiente - cultural,
social, econômico, político e natural; de um pensamento que conceba a
ecologia da ação e a dialética da ação e seja capaz de uma estratégia que
permita modificar ou anular a ação empreendida; [e] de um pensamento que
reconheça o seu inacabamento e negocie com a incerteza, nomeadamente na
ação, porque só há ação no incerto (MORIN & KERN, 1996, p.138).

Giddens (1989), também sociólogo, afirma que a maioria dos cientistas sociais trata o

tempo e o espaço como meros ambientes de ação e aceita irrefletidamente a concepção do

tempo que, enquanto tempo cronometrável, é característico da moderna cultura ocidental.

Para o autor, com exceção dos recentes trabalhos de geógrafos, os cientistas sociais não foram

capazes de construir seu pensamento em torno dos modos como os sistemas sociais são

constituídos através do espaço-tempo. Este aspecto é corroborado por Santos (1989), mais um

sociólogo, ao enfatizar que o pensamento clássico privilegiou as metáforas temporais, assim

como, o pensamento moderno privilegia, pois a sua metáfora fundadora é a idéia de

progresso, acompanhadas pelas ciências sociais através da metáfora do desenvolvimento. Ao

realizar estes privilégios, fez-se com que a História aspirasse legitimamente a ser concebida

como ciência social global. Mais recentemente, assiste-se a um certo renascimento do espaço.

A Geografia, que é por excelência, a ciência do espaço, testemunha bem esta transformação

intelectual e cultural. Até a década de 70 a Geografia reduzia o espaço às relações sociais

ocorrendo no espaço e, por isso quase perdeu seu próprio “espaço científico”. Esta lógica
92

derivou das raízes Clássicas da Geografia, baseadas na neutralidade da ciência moderna,

desconectada das contradições sociais e refletiu-se no tratamento de questões fundamentais

como a do meio ambiente. Agora, mais que recuperada a dimensão espacial, trata de

investigar o que nas relações sociais resulta especificamente no fato de estas ocorrerem no

espaço50.

Os argumentos apresentados parecem contrapor-se ao de alguns pesquisadores tais

como Argento (1994) que insistiu na participação mais pragmática (mais técnica) na

compreensão multidisciplinar sobre o meio ambiente, visando dar respostas práticas aos

indivíduos de acordo com suas necessidades. Por outro lado o caráter pragmático serviria para

a valorização (espécie de Marketing ou lobby) da ciência que o seguisse garantindo mercado

de trabalho para seus profissionais em função de sua aplicabilidade direta, seu suposto maior

rigor científico e poder de decisão.

Para Galvão (1992), obliterada em sua conceituação inicial pela preocupação com

relação ao aprofundamento analítico-genético dos fatos observados na relação homem-meio,

aquela visão global de ambiente como entidade natural/social acabou por perder-se na

Geografia, cindindo-se na visão dicotomizada de uma Geografia Física e uma Geografia

Humana, com seus diferentes campos de especialização. A autora afirma que, atualmente, o

ressurgimento do ambiente, como preocupação global da sociedade e dos mais diversos

campos de saber, traz à Geografia a retomada de seu objeto, sob foco metodológico mais

definido e consistente, constituindo mesmo questão epistemológica de fundamental

importância para o seu fortalecimento como ciência e prática social51.

50
Neste raciocínio, aproxima-se das idéias de Lefebvre (1974, p.478-479), “O investimento espacial, a produção
de espaço, não é um incidente de percurso, mas uma questão de vida ou morte. As idéias, as representações, os
valores, que não conseguem inscrever-se no espaço sem produzir uma morfologia apropriada, caso contrário,
dissecam-se em signos, viram fantasmas”.
51
Também argumentado em Soja (1993, p.13), a respeito da Geografia, “[...] deve estar sintonizada com as lutas
emancipatórias de todos os que são marginalizados e oprimidos pela geografia específica do capitalismo [...]. E
deve estar especialmente em sintonia com as particularidades dos processos contemporâneos de reestruturação”
93

A questão ambiental coloca a necessidade de releitura do espaço sendo imprescindível

considerar e compreender a complexidade da apropriação, produção, do consumo, da

distribuição, a complexidade ecossistêmica e as relações que se estabelecem, ao longo do

tempo e no espaço, das organizações societárias com a natureza. Em nosso entendimento, esta

releitura há que passar pelos espaços escolares e, em particular, pelo ensino de Geografia.

Para a perspectiva geográfica, a questão ambiental envolve diferentes dimensões: a

funcional, inerente à dinâmica dos diversos sistemas físicos, biológicos e sociais que integram

o ambiente; a espacial, determinada pela ocorrência, utilização e valorização dos bens e

recursos, seu potencial e disponibilidade; a temporal que, sincrônica ou diacronicamente,

projeta e incorpora esses bens e recursos na dinâmica da organização ambiental; a

tecnológica, que determina processos operacionais de utilização dos recursos e bens; a

cultural, que se define pelo nível de percepção e valorização daqueles bens e recursos; a

social, que se consubstancia na acessibilidade a esses bens e recursos; e a política, que implica

estratégias de aferição e uso dos recursos e bens, dentre os quais o próprio espaço pode ser o

mais importante (GALVÃO, 1992).

Qualquer das situações abordadas pela Geografia referentes à questão ambiental (da

água, da erosão, do solo, do subsolo, da cobertura vegetal, entre outras) evidencia e pressupõe

a atuação humana e não pode se afastar dela. A esse respeito, o geógrafo polonês,

Kostrowichi (1988), aponta para o papel da cultura e das tradições culturais, em particular, na

formação da atitude diante do meio ambiente. Ao excluirmos as fontes culturais, estaremos

abdicando das condições de compreender por que os programas de manejo racional do meio

ambiente, objetivamente tomados como razoáveis e precisos do ponto de vista científico, são

aceitos por algumas sociedades enquanto outras, situadas num mesmo nível social e

econômico, os negligenciam ou os rejeitam. Cabe salientar que não basta a persuasão

e, continua afirmando (p. 116) que “[...] nenhuma revolução social pode ter êxito sem ser, ao mesmo tempo, uma
revolução conscientemente espacial”.
94

cientificada, como também as proibições e as prescrições para que se superem ou modifiquem

hábitos e tradições culturalmente enraizadas. O autor verifica que mesmo quando as

condições de vida estão ameaçadas de forma nitidamente visível, todos os propósitos e todos

os programas de melhoria serão rejeitados, se eles não se mostrarem adequados às tradições

culturais da sociedade.

Cabe apontar que os profissionais de Geografia, como afirmara Santos (1994),

sabemos que seja qual for a ação do homem – técnica, econômica, política, cultural, moral –

ela é um dado da criação de lugares na superfície da Terra. A interpretação dos lugares,

unitários e complexos, é, ao seu modo, uma filosofia das técnicas, também empreendida, para

o autor, pela Educação. Assim como os profissionais de Geografia, pretendem realizar tal

filosofia, os educadores são também filósofos, quando recusam a aceitar as coisas como se

fossem apenas objetos e buscam entender o que dentro delas representa o próprio homem, na

realização de sua história e da sua vida. É justamente para nos debruçarmos como

pesquisadores desse mundo, que precisamos ter coragem para vivê-lo e entendê-lo,

transformando a Geografia (e outras ciências) em disciplinas e práticas coletivas (SOUZA,

1993).

Escolhemos adotar a teoria das representações sociais, na perspectiva discutida e

difundida por Moscovici e Jodelet, pois esta incorpora a complexidade, ao entender o homem

como ser complexo, que modela e remodela o objeto a ser conhecido nas relações

interpessoais sem fragmentá-lo. Todavia, não desconsidera que a modelagem e a

remodelagem se dão dentro da sociedade e de uma rede de relações sociais, que está pautada

em variados modelos conceituais e sistemas ideológicos de pensar que devem ser entendidos e

captados pelos diferentes estudos e pesquisas (MOSCOVICI, 1995).

CAPÍTULO 3: COM QUEM CAMINHAMOS? Os Professores e Professoras de


Geografia.
95

Neste capítulo buscaremos apresentar algumas das evidências que possibilitem

aproximações em relação aos sujeitos desta investigação. Tais aproximações, em momento

algum, se pretendem neutras ou isentas. Admitimos que espelham a postura analítica do

investigador sem, no entanto perder de vista o rigor necessário à busca de indícios52.

Assumimos, com Ginzburg (1989) os limites intrínsecos a toda investigação que jamais

esgotará, em suas apreciações a complexidade das relações que aborda.

As análises sucessivas do material procuram estabelecer a pertinência e a coerência

desses indícios, bem como seus nexos, de forma a permitir uma aproximação dos sentidos

relativos às vivências docentes dos professores53 que militam no ensino da Geografia em

relação à Educação Ambiental. Assim, de modo gradual, demarcaremos caminhos para a

montagem do mosaico, ainda que parcial, de seus contextos e redes de relações, enquanto

educadores e professores graduados em Geografia.

Como já apontamos (Capítulo 1 – item 1.7), foram considerados sujeitos desta

pesquisa cento e um (101) professores de Geografia, que atuam em diferentes níveis, esferas e

52
Segundo Ginzburg (1989, p.143) “Por volta do final do século XIX, emergiu silenciosamente no âmbito das
ciências humanas um modelo epistemológico ao qual até agora não se prestou suficiente atenção.”. “Por trás
desse paradigma indiciário ou divinatório, entrevê-se o gesto talvez mais antigo da história intelectual do gênero
humano: o do caçador agachado na lama, que escruta as pistas da presa.” (GINZBURG, 1989, p.154).
Argumenta ainda (p.153) que “‘Decifrar’ ou ‘ler’ as pistas dos animais são metáforas. Pressupõem o minucioso
reconhecimento de uma realidade talvez ínfima, para descobrir pistas de eventos não diretamente
experimentáveis pelo observador”. Com isso, sua base de pensamento e ação não se prende ao paradigma que
fundamentou o pensamento científico moderno, enfatizando (p.156) que “O grupo de disciplinas que chamamos
de indiciárias (incluída a medicina) não entra absolutamente nos critérios de cientificidade deduzíveis do
paradigma galileano. Trata-se, de fato, de disciplinas eminentemente qualitativas, que têm por objeto casos,
situações e documentos individuais, enquanto individuais, e justamente por isso alcançam resultados que têm
uma margem ineliminável de casualidade: basta pensar no peso das conjeturas.”. Além disso, Ginzburg (1989,
p.163) deixa claro os limites da cientificidade que hegemonicamente se impôs ao explicar que: “O verdadeiro
obstáculo à aplicação do paradigma galileano era a centralidade maior ou menor do elemento individual em cada
disciplina. Quanto mais os traços individuais eram considerados pertinentes, tanto mais se esvaía a possibilidade
de um conhecimento científico rigoroso. Abriam-se duas vias: ou sacrificar o conhecimento do elemento
individual à generalização (mais ou menos rigorosa, mais ou menos formulável em linguagem matemática), ou
procurar elaborar, talvez às apalpadelas, um paradigma diferente, fundado no conhecimento científico (mas de
toda uma cientificidade por ser definir) do individual. A primeira via foi percorrida pelas ciências naturais, e só
muito tempo depois pelas ciências humanas. O motivo é evidente. A tendência a apagar os traços individuais de
um objeto é diretamente proporcional à distância emocional do observador.”.
53
Estaremos empregando os termos: professores, docentes e sujeitos, simplesmente no intuito de facilitar a
leitura do texto. Não concordamos com nenhuma discriminação hierárquica e enfatizamos que o grupo
investigado é composto por professoras e professores, trabalhadoras e trabalhadores, homens e mulheres.
96

locais de trabalho, formados em diferentes momentos e lugares nos últimos trinta anos,

escolhidos aleatoriamente. Com noventa e um (91) dos pesquisados, mulheres e homens,

todos professores e professoras de Geografia, começamos nossa busca de indícios, sinais e

representações através de questionários. Este instrumento, em sua primeira parte, congregava

questões, que permitiram levantar informações relativas à formação, ligadas aos espaços-

tempos envolvidos na mesma, bem como tempo de magistério, locais de trabalho, esferas e

níveis de atuação profissional e outros elementos necessários a uma caracterização preliminar.

Não nos interessa fazer desta mediação uma pirotecnia estatística, mas também, sempre que

necessário, acoplaremos ao texto evidências que possam ser sentidas e percebidas melhor,

através de gráficos ou tabelas, de modo a permitir um delineamento mais claro de quem são

estes professores.

A maioria dos sujeitos realizou sua graduação em Geografia da década de 1980 em

diante, conforme podemos constatar no Gráfico 1. De acordo com o que foi desenvolvido no

Capítulo 2 (item 2.2.1), este período coincide com um momento de abertura da Geografia,

grande reflexão sobre seus temas, conceitos e metodologias, visando realçar seu papel ligado

ao planejamento e ao estudo crítico da realidade brasileira. Como já assinalado, os

profissionais de Geografia passaram a questionar o positivismo, o neopositivismo e os

modelos que somente possibilitavam interpretar o mundo e realizar as atividades de ensino,

sob padrões estereotipados em relação à realidade brasileira. A crise produtiva da Geografia e

a adoção de uma visão crítica em relação à realidade social, inserem-se no contexto de

abertura democrática do próprio país. Já argumentamos que esta mudança não ficou restrita

aos bancos das universidades ou produziu um caminho único no pensamento geográfico. Ao

contrário, possibilitou uma gama variada de posturas metodológicas, associando, inclusive, a

Geografia a outros campos de saberes.


97

No campo ambiental brasileiro, igualmente apontamos que foi a partir da mesma

década que a prática educativa ambiental ganhou espaço e visibilidade, impulsionada pela

abertura lenta, porém constante, do país para os movimentos de reivindicação com cunho

democrático.

27% 14%

23%
19%
6% 5% 6%

até 1970 entre 1971-1975 entre 1976-1980


entre 1981-1985 entre 1986-1990 entre 1991-1995
após 1995

Gráfico 1 - Distribuição percentual de sujeitos, por ano de formação na Graduação.

Tanto para a Geografia, quanto para a EA, começaram a ser organizados fóruns de

discussão, de organização e de ação que hoje são retratados como pioneiros para estes

campos. A ampliação deste horizonte se deu na década de 1990, já superado o tempo da

ditadura militar, e inseridos (Geografia, EA e o país) no período da globalização econômica e

da mundialização das relações e discussões políticas e culturais. Este momento marca uma

nova crise no Estado brasileiro caracterizada pela desregulamentação, privatização e

crescimento do endividamento externo, causando diminuição dos investimentos em setores

sociais básicos.

Apesar disso, o aporte de textos nacionais e internacionais passou a ser constante,

principalmente, nas universidades públicas e nos congressos de Geografia e de EA.

Ampliavam-se as discussões sobre o ensino da Geografia nos diversos níveis de formação.


98

Este período caracteriza-se, também, pela intensificação progressiva da mobilização social

que culminará com ampliação, no país, dos momentos de democracia. Tal processo irá,

gradativamente, desnudar as mazelas sociais que foram reforçadas durante o período da

ditadura militar brasileira, gerando uma crítica aberta, crescente e mais ou menos organizada

desta ditadura. A crise nos mobilizou para busca de resistências e novas formas de

organização e de táticas de sobrevivência.

Importante destacar que nas oitenta e seis (86) respostas obtidas nesta questão, tanto

temos os que se formaram ainda durante a ditadura militar (quase 36%), quanto os que se

graduaram posteriormente, nos atuais momentos da democracia brasileira pós-ditadura

(aproximadamente 64%). Este último grupo pode ter, não somente o acesso, mas em diversos

momentos, o convívio mais estreito com profissionais também afeitos a uma melhor formação

acadêmica, na qual a liberdade de expressão pode se aliar ao fortalecimento e expansão de

programas de pós-graduação e qualificação docente nas universidades brasileiras. Deste

modo, o grupo teve professores cuja prática efetiva do ensino, pesquisa e extensão estava se

consolidando fora da tutela e das proibições inerentes ao regime de exclusão. Não que tudo

fossem “flores”. Ao mesmo tempo em que saíram do regime ditatorial, passam a evidenciar,

de forma aberta, aos problemas sociais e econômicos. Estes problemas colocam em risco a

qualidade e até a importância de suas formações e atuações profissionais e políticas. Situações

como a fome, o desemprego, a habitação, decorrentes de duas “décadas perdidas”, competem

com outras mais específicas da educação, da pesquisa, da formação e das condições de oferta

e trabalho dos docentes nos diferentes níveis de ensino.

Ainda considerando o Gráfico 1, ressaltamos que 23%, ou seja, vinte sujeitos têm

formação bastante recente, de 1995 até 2001, o que nos remete a este outro momento da

história do país caracterizado pelo estabelecimento do Estado neoliberal. Neste, conforme


99

reiterado por Höfling (2001), as políticas sociais54, usualmente entendidas como as de

educação, saúde, previdência, habitação, saneamento, entre outras, são consideradas pelos

agentes hegemônicos como um dos maiores entraves ao desenvolvimento e responsáveis, em

grande medida, pela crise que atravessa a sociedade. A intervenção do Estado constituiria uma

ameaça aos interesses e liberdades individuais, inibiria a livre iniciativa, a concorrência

privada, e poderia bloquear os mecanismos que o próprio mercado é capaz de gerar com

vistas a restabelecer o seu equilíbrio55. Em oposição a estes postulados e, entendo educação

como uma política pública social56, somos discordantes em relação aos neoliberais ao

defendermos e cobrarmos a responsabilidade do Estado, em relação ao oferecimento de

educação pública a todo cidadão, em termos universalizantes.

Este contexto se reflete nas Universidades, mormente nas públicas, onde o

conhecimento, o tempo de escolarização e os critérios de produtividade passaram a ser

estratégicos. Como advoga Vaidergorn (2001), a aplicação das recomendações dos órgãos

internacionais no Brasil “neoliberal” privilegia a formação de nível superior fora do sistema

universitário público, apontado como “atrasado” devido aos seus custos, preferindo-se uma

outra, na qual os critérios de “qualidade” são os empresariais. Como decorrência, a

internacionalização da produção científica, paralela à manutenção dos quadros sociais

injustos, pelo sucateamento do ensino público e crescimento da participação privada no setor,

se fazem fortemente presentes na atualidade brasileira. Este quadro demarca um afastamento

do Estado da sua função/dever de executor, delegando a agentes outros (ONGs e empresas

privadas nacionais e multinacionais) a responsabilidade na execução das políticas sociais.

54
“[...] que se referem a ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas,
em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais, visando a diminuição das desigualdades estruturais
produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico.” (HÖFLING, 2001).
55
“O livre mercado é apontado pelos neoliberais como o grande eqüalizador das relações entre os indivíduos e
das oportunidades na estrutura ocupacional da sociedade.” (HÖFLING, 2001).
56
As políticas públicas são aqui compreendidas como as de responsabilidade do Estado.
100

Os professores universitários, por sua vez, têm sido tentados a moldar seus interesses

profissionais aos acenos dessa concepção empresarial de educação. A possibilidade de

realizar pesquisa e extensão nos últimos anos passou a ser também focalizada pelas

Instituições de Ensino Superior (IES) privadas. Para estas, atualmente, o reconhecimento e a

possibilidade de financiamento (muitos dos quais advindos de órgãos do próprio Estado) se dá

segundo as mesmas regras a serem seguidas pelas IES públicas. Para tanto, estas IES privadas

têm que abrir postos de trabalho para docentes qualificados com a finalidade de obtenção de

recursos destinados pelo Estado e outros órgãos financiadores para os campos da pesquisa

acadêmica e da extensão universitária. Como a história da pesquisa e da extensão na maioria

destas instituições é recente, os quadros docentes das mesmas acabam por ser compostos

pelos professores recém formados ou por docentes bastante experientes e titulados,

geralmente advindos das IES públicas. Os mesmos, envolvidos em grupos e projetos de

pesquisa, acabam por garantir condições de trabalho e salário, geralmente superiores às

encontradas em várias universidades públicas, que passam pelo sucateamento anteriormente

apontado.

Sem querermos imputar culpa aos docentes, entendemos que o sistema neoliberal,

centrado na possibilidade de concorrência no mercado e ainda, de pleito para a participação

em projetos financiados pelos órgãos de pesquisa oficiais, submete às mesmas regras de

“qualidade” e aferição instituições com origens e finalidades diferenciadas. Deste modo, o

investimento privado no ensino superior acaba se beneficiando pela lógica própria

estabelecida. Este investimento, financeiramente rentável, ao ser comparado com os

dispêndios estatais nas IES públicas, provoca a visão de que o ensino superior, quando gerido

como negócio lucrativo, seguindo aos parâmetros e regras de aferição do Estado, parece ser

uma forma bem compensadora e democrática de ampliação de acesso ao nível superior.


101

Dado esse quadro, as conseqüências que se avizinham já podem ser perfeitamente

imaginadas. Dentre elas, a diminuição das verbas para a educação superior pública e o seu

desvio para as escolas privadas, em nome de uma duvidosa necessidade de qualificação das

últimas (atestada, por exemplo, pelos exames nacionais dos alunos formandos em cada curso),

e da oferta de bolsas de estudo financiadas pelo Estado aos seus alunos. Além disso, instala-se

um quadro que termina criando uma falsa competição entre as mesmas, já que os fins de cada

uma são diferentes (VAIDERGORN, 2001).

Os momentos não são descontínuos e acabam por ser vividos de forma direta ou

através de “heranças” advindas de processos constituídos em tempos diferentes. Neste

sentido, mesmo os que ingressam agora nas redes de ensino, ainda podem sofrer os

efeitos das incertezas inerentes a uma democratização relativamente recente, assim

como, os resquícios de ações antidemocráticas que relembram os períodos de ditadura.

Da mesma forma, enfrentam o período contemporâneo de descentralização e

sucateamento do investimento público, que também afeta a ação do educador, pondo em

questão o papel do mesmo enquanto trabalhador que merece ser dignamente

remunerado. Corroborando a reflexão de que “[...] o tempo não é uma linha, mas uma

rede de intencionalidades.” (MERLEAU-PONTY, 1971, p.420), o contexto comum é

vivido tanto pelos que exercem a profissão há muito tempo, quanto pelos recém

ingressos na carreira do magistério.

Neste trabalho, em relação ao tempo de exercício do magistério, verifica-se, que

no momento da pesquisa (final de 2001), a maior incidência de sujeitos se deu na faixa

entre 11 a 15 anos (Gráfico 2). Igualmente, importa destacar que há uma distribuição

equivalente para os grupos de professores com 6 a 10 anos e 16 a 20 anos de magistério

(18 sujeitos em cada). Se atentarmos para a distribuição do número de professores que

compõem as duas últimas faixas, de 26 a 30 anos e acima de 30 (12 sujeitos), verificamos


102

que este total iguala-se ao número dos que exercem a docência há menos de cinco (05)

anos.

25
25

20 18 18

15 12
9
10
6

5 3

0
até 5 anos 6-10 anos 11-15 anos 16-20 anos 21-25 anos 26-30 anos Acima de 30

Gráfico 2 - Distribuição dos sujeitos por tempo de exercício do magistério, em anos.

Apenas 20% dos professores encontra-se, pelo menos em tese, próximo à

aposentadoria, o que poderá ser observado no Gráfico 3. Alguns indícios serão levantados

sobre esta distribuição, atentando que nossa pesquisa buscou aleatoriamente aos sujeitos, não

se concentrando, especificamente, em nenhuma dependência administrativa ou rede de ensino.

O período que se estende de meados da década de 1980 ao início da década de 1990 foi

marcado pelo resgate dos concursos públicos, principalmente no setor do magistério. Também

a rede privada promoveu, no mesmo período, concursos seletivos para docentes. Neste

sentido, tal período, inserido no contexto da transição para a democracia e para o momento

pós-ditadura militar, favoreceu o ingresso dos professores nas redes de ensino, principalmente

nas redes públicas. Cabe ainda, seguindo estas pistas, aventar que o número de concursos

públicos, por sua vez, vem diminuindo frente às recentes transformações e flexibilizações do

trabalho. Os professores hoje são admitidos, em diversos lugares, de forma precária e

temporária. Além disso, são oferecidas, mormente pelas redes públicas, condições de
103

trabalho, também temporárias, nas quais os docentes acabam por ocupar o lugar de outros,

sem concurso, através de duplas-regências ou “dobras” de trabalho. Deste modo, supomos que

os sujeitos, com formação mais recente, encontram um outro momento de inserção na esfera

profissional. Não é que menos professores de Geografia estejam se formando, mas afigura-se

que menos vagas são oferecidas, principalmente em concursos públicos57. As faixas de

professores que computam mais de 21 anos de magistério, possuem menos sujeitos, ao nosso

ver, por se inserirem em outro período de pouca oferta de vagas, anterior ao momento de

abertura democrática do país. Com isso, não vislumbramos ter esgotado o campo de

possibilidades que sustentam a distribuição do Gráfico 2. Para apreciá-lo, outros aspectos

podem ser agregados às informações encontradas.

57
Também cabe levar em consideração, a partir de pesquisa divulgada pela ILO (OIT - Organização Internacional
do Trabalho) e pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) o alerta para
o risco de uma “escassez mundial de professores”. O estudo foi elaborado por ocasião do Dia Mundial do
Professor, e constata que o salário médio do professor brasileiro, em início de carreira, é o terceiro mais baixo,
no conjunto de 38 países desenvolvidos e em desenvolvimento comparados. Apenas o Peru e a Indonésia
pagam salários menores a seus professores no ensino primário. O salário anual médio de um professor na
Indonésia é US$ 1.624. No Peru, esse valor chega a US$ 4.752. No Brasil é de US$ 4.818. O valor, no Brasil, é
metade do encontrado nos vizinhos Uruguai (US$ 9.842) e Argentina (US$ 9.857) e, muito abaixo da média dos
valores praticados nos países desenvolvidos. O maior salário nesse nível de ensino foi encontrado na Suíça
(US$ 33.209). O resultado do Brasil melhora um pouco, quando se comparam os salários no topo da escala de
professores do ensino médio. Nesse nível de ensino, há sete países que pagam salários mais baixos do que o
Brasil, levando em conta o total de 38. Para chegar a esses valores, a Unesco usou 1999 como ano para
comparação. Os valores em dólares foram calculados considerando o PPP (sigla em inglês para poder de
paridade de compra). Esse indicador leva em conta o custo de vida em cada país. Por isso, o salário em dólar de
um professor, segundo o estudo, não pode simplesmente ser convertido para real com base na cotação oficial.
Um outro problema comum em quase todos os países é o aumento da relação de alunos/professor em sala de
aula. Esse e outros fatores, segundo a Unesco, contribuem para a decadência das condições de trabalho e
desencorajam novos professores. No caso da relação de alunos/ professor, de um total de 43 países onde foi
possível comparar o indicador, o Brasil apresentou a sexta maior média de alunos/professor no ensino primário:
28,9. No ensino médio, o Brasil tem a maior relação (38,6) na comparação com 33 nações desenvolvidas e em
desenvolvimento. “A formação dos educadores é praticamente feita por eles mesmos. Quem ganha tem de
assumir até três empregos e não pode se dedicar. Há relação direta entre salário do professor e desempenho
dos alunos”, diz Juçara Dutra Vieira, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação. Em
São Paulo, o acúmulo de aulas em escolas públicas chega a 64 aulas semanais. (Para Unesco, Brasil paga
pouco a professor. GOIS, A. Folha de São Paulo, em 08/10/2002, Pesquisa da Unesco revela “escassez mundial
de professores”, France Presse, em 04/10/2002 e UNESCO/ILO, 2002).
104

20%
7%
27%
20% 10%

20% 13% 3%

até 5 anos 6-10 anos 11-15 anos 16-20 anos


21-25 anos 26-30 anos Acima de 30

Gráfico 3 - Distribuição percentual dos sujeitos pelo tempo de exercício de magistério,


em anos.

O que aventamos é que os docentes em questão inserem-se como praticantes da

profissão. Isto demonstra que embora a carreira do magistério não seja uma das mais

concorridas ou prestigiadas em termos salariais e que, o curso que forma o professor de

Geografia não esteja entre os mais procurados, os profissionais que nele apostam, acabam por

conseguir trabalho. Muitas vezes se submetem aos esquemas de sobrecarga para garantir suas

sobrevivências. Porém, outras finalidades e objetivos que os conduzem a esta situação não

devem ser descartados.

São sujeitos que vêm se inserindo no trabalho, em diferentes momentos, desde a

ditadura, resistindo e persistindo às crises econômicas da década de 1980, participando dos

primeiros movimentos sindicais, das greves, fazendo os primeiros concursos públicos e até

alguns privados. Continuaram no desempenho da profissão durante a democratização do país,

conviveram com a liberdade de expressão, experimentaram e vêm experimentando as

transformações no campo social, político e econômico. Passam, como todos os trabalhadores


105

assalariados, pelo neoliberalismo, sentindo a desvalorização do salário e a dificuldade do

Estado em investir no setor da educação. Mas, neste tempo, estes sujeitos, professores de

Geografia, cujo material de trabalho são as relações dinâmicas da sociedade no espaço, ora

mais, ora menos organizados, em categoria ou individualmente, também conquistaram

vitórias. Destacamos, que os mesmos tiveram potencializada a possibilidade de se encontrar

durante seu tempo de vida dedicado ao ensino da Geografia, contribuindo para isto a

importância atribuída à promoção de encontros nacionais, regionais e locais de professores de

Geografia, desde a década de 1980 até os dias de hoje. Quando utilizo a expressão

potencializar, o faço em função de que os sujeitos se encontram em menor número,

cotidianamente, em diferentes espaços-tempos de trabalho, mas muitas vezes, pela quantidade

excessiva de obrigações, mal têm condição de se falar ao fazê-lo. Mesmo nestes difíceis

encontros cotidianos, alguma troca pode ser viabilizada.

Outro aspecto a considerar na caracterização contextualizada dos sujeitos refere-se à

situação do exercício do magistério, antes mesmo da conclusão da Graduação. Mais da

metade dos professores indicou ter tido experiência prática como professor, seja na área de

Geografia ou não, antes do término do Curso Superior (Gráfico 4).

49%

51%

exerceram o magistério antes da conclusão da Graduação


exerceram o magistério após a conclusão da Graduação

Gráfico 4 - Distribuição percentual dos sujeitos, considerando a experiência de


magistério anterior à Graduação.
106

Essa evidência pode estar associada a diversos aspectos. Fundamentalmente, ela se fez

presente em função da necessidade de trabalhar dos alunos de Geografia e, da possibilidade de

fazê-lo, durante alguns anos e ainda hoje, via licença de magistério à título precário em

escolas particulares ou, no pior das hipóteses, assumindo turmas, mesmo sem o registro

provisório, em estabelecimentos privados diferenciados (escolas de ensino básico ou cursos

preparatórios para o vestibular). Tal saída encontrada pelos sujeitos, através de “brechas” no

instituído, têm efeitos diversos. Em geral, recebem salários ou pagamentos inferiores aos

pisos salariais e acabam por adequar seus horários de estudo na Graduação aos horários de

trabalho. De outro modo, adquirem experiência que, se por um lado desgasta, em função da

jornada trabalho-estudo, por outro, possibilita vivenciar mais efetivamente, antes ou durante

os estágios supervisionados e práticas de ensino, diferentes realidades de sala de aula. Nesta

situação, a vivência antecipada da prática na sala de aula e na escola pode influenciar e ser

influenciada pelas objetivações e ancoragens que orientam suas condutas. Mesmo antes dos

conhecimentos adquiridos nos cursos de Graduação e, mais especificamente, nas disciplinas

voltadas para a formação na licenciatura, os docentes têm que tomar posições e propiciar

condições com a quais, muitas vezes, só admitiam se defrontar nas práticas ou estágios

supervisionados dos cursos de licenciatura. Nestes cursos, a teoria será filtrada por estes

professores à luz da prática docente cotidiana antecipada. A prática concretizada pelos

mesmos, por sua vez, também é filtrada pelos valores e referentes que estes “alunos-

professores” possuem. No encontro/embate, o cruzamento do saber da teoria com as variadas

necessidades e demandas, tais como elas são decodificadas pelos sujeitos envolvidos, tece o

saber da prática e é por ele tecido, alinhavando diferentes contextos. Muitas vezes, no

encontro/embate é que os sujeitos percebem como a teoria e a prática caminham juntas para a

superação ou formulação de situações cotidianas diversas.


107

Cabe inferir que ao começarem a trabalhar um pouco antes de receber seus diplomas,

os professores, ao nosso entendimento, já se inserem numa ciranda que os toma como

trabalhadores, mesmo antes de oficialmente qualificados. Compreendemos tal contexto como

uma forma de sobrecarga e uma oferta (oportunidade), que ao mesmo tempo se materializa

como exigência e expropriação. Mas este quadro acaba sendo incorporado ao conjunto das

experiências que vão compondo as práticas destes docentes, ao longo dos tempos-espaços

progressivamente vividos.

Tudo o que argumentamos, leva em conta que mesmo com os encontros e

desencontros da vivência do magistério, as partilhas na carreira docente, as agruras de uma

desvalorização salarial ou profissional, os momentos extra-escolares comuns, os sujeitos não

podem ser encarados como uma massa homogeneizada ou indiferenciada. Eles estão inseridos

em contextos amplos, mas também em realidades específicas, em cotidianos próprios,

diferenciados e aproximados pelas culturas das quais participam e por aquelas com as quais

buscam interagir. E esta contextura não flui linearmente. Enreda-se de acordo com valores,

desejos, acordos, normas, limites, regras, crenças, que acabam por interferir nos processos

sociais mais amplos e nas ações de cada um dos sujeitos envolvidos nos mesmos.

O quadro de que tratamos impacta também sobre as instituições. Quando aventamos

que cursos preparatórios e estabelecimentos de ensino privado de menor prestígio ou menor

formalização aceitam nos seus quadros, profissionais ainda não diplomados, por outro lado,

também temos em mente as hierarquizações existentes entre os estabelecimentos de ensino

públicos e privados de acordo com uma gama variada de aspectos (tradição, disputa por

concurso, salário, localização, preço, infra-estrutura, clientela etc.). Estas, em nossa

compreensão, do mesmo modo, irão contar nas escolhas e trajetórias docentes dos professores

em geral e, dos sujeitos aqui estudados. As hierarquizações não se restringem aos que iniciam

o trabalho sem a efetiva diplomação. Estendem-se aos que passam a trabalhar somente após a
108

diplomação e, mais ainda, acabam por influenciar as escolhas, práticas e investimentos dos

docentes ao longo da carreira. Com isto, acreditamos que a prática docente vai se

constituindo, e não se constitui exclusivamente pela formação acadêmica inicial dos sujeitos.

Quando contextualizamos, temos por base a idéia de que a prática docente exercida

pelos profissionais que foram pesquisados re-elabora o saber da teoria por eles apropriada na

sua formação. Ao longo do tempo, esta prática sofre diferentes influências, deformações,

adaptações, reformas, articulações e partilhas. Mas não só o tempo influencia a prática

docente. Os espaços vividos e compartilhados também se integram ao referencial temporal e,

com as relações sociais que lhes dão forma e movimento, sintetizam, na vida de indivíduos e

grupos, conjunturas dinâmicas que articulam a acumulação desigual dos tempos-espaços e o

cotidiano ramificado continuamente. Em função destas colocações, torna-se impossível supor

a existência de sujeitos cristalizados.

É a partir dessa compreensão que passaremos a discutir alguns dos espaços - contextos

- lugares que fazem parte da vida dos sujeitos e que abrem perspectivas para sua formação,

qualificação, trabalho, sobre-trabalho e, igualmente, para a diversificação de sua atividade

profissional, de suas convivências e para a constituição de suas representações de Educação

Ambiental.

Podemos constatar que a maioria dos professores obteve sua formação de graduação

em instituições públicas (Gráfico 5) o que também acompanha o perfil apresentado para os

que fizeram alguma pós-graduação. Este perfil público na formação acadêmica docente reflete

uma tendência da Geografia como, principalmente, ligada ao Estado e desenvolvida por

órgãos públicos, inclusive no seu aprimoramento e qualificação profissional em nível de pós-

graduação, conforme já desenvolvido no item 2.2.1 do Capítulo 2.

Os cursos de graduação em Geografia, tanto para o bacharelado quanto para a

licenciatura, embora não sejam os mais concorridos e disputados, exigem disponibilidade de


109

tempo e deslocamento daqueles que neles ingressam, além de uma infra-estrutura para a

realização de trabalhos de campo, estudos de meio e atividades laboratoriais e equipamentos

específicos (principalmente os ligados às atividades de coletas, medições e análises de

amostras e materiais do ambiente). Tais exigências, demandam das instituições que os

promovem, infra-estrutura e custos relativamente elevados, que não são compensados por um

conjunto de ingressos diferenciado daqueles que procuram cursos tradicionalmente mais

valorizados (medicina, direito, engenharias etc.) e, que provêm, geralmente, de classes sociais

mais abastadas.
Graduação Pós-Graduação

No exterior

Privada

Pública

Privada

Pública

0 10 20 30 40 50 60 70 80

Gráfico 5 - Distribuição dos sujeitos, por caráter da Instituição formadora.

Como decorrência, observamos um contingente bem menor de instituições privadas

que abrigam, no rol de seus cursos, os bacharelados ou as licenciaturas em Geografia.58 O

Estado, com um poder de financiamento e com a necessidade de formar, tanto para o campo

do planejamento quanto para a docência em diversos níveis, acaba por arcar com a

manutenção dos melhores dos cursos de Graduação e Pós-graduação de Geografia no país.

58
Estudos do INEP (2001) apontam que num total de 12.155 cursos de Graduação presenciais no Brasil, 4.401
são públicos e 7.754 são privados. Do total 2.197 formam professores para matérias específicas, sendo 1.176 em
instituições públicas e 1.021 em instituições privadas. Para a licenciatura em Geografia, 217 cursos são
oferecidos no país. Nas instituições públicas temos 136 e 81 dependem administrativamente de entidades
privadas.
110

Em consonância com o painel retratado, um indício a ser considerado é que a maioria

dos sujeitos foram formados nas três principais universidades públicas existentes no Estado

do Rio de Janeiro (Gráfico 6). Localizadas na Região Metropolitana do Estado. Estas

universidades influenciam todo território fluminense. Mantidos pelo Estado nas esferas

federal e estadual, os cursos de Geografia das mesmas são dotados de laboratórios, equipados

com computadores e têm garantidas suas atividades características, tais como, trabalhos de

campo, análises de laboratórios, participações em eventos científicos e oferta de bolsas de

pesquisa e extensão para os seus integrantes.

30
30 26

25
18
20
13
15

10

5 1

0
Graduação na Graduação na Graduação na Graduação em Graduação em
UFRJ UERJ UFF outras IES IES Privadas
Públicas

Gráfico 6 - Distribuição dos sujeitos, segundo Instituições formadoras.

Ainda que atingidas pelos impactos das crises econômicas e pela redução dos

financiamentos públicos das últimas décadas (ALTMANN, 2002), as condições oferecidas

pelas IES públicas se mantêm, avalizando uma reconhecida qualidade à formação59. A

59
Dados do INEP (2001) comprovam que a formação em cursos de graduação públicos em Geografia, formam
muito mais profissionais que o seus equivalentes privados. De um total de 395.988 concluintes de ensino
superior em cursos de Graduação presenciais, 132.616 o fizeram em instituições públicas e 263.372 concluíram
seus cursos em instituições privadas. Os que concluíram uma graduação para lecionar em matérias específicas
(biologia, desenho, física, história etc.) somam ao todo 51.237 sujeitos. Entre eles, 23.975 cursaram instituições
públicas e 27.298 se graduaram em instituições privadas. Podemos averiguar que 4.587 fizeram curso de
Geografia e obtiveram diploma de licenciatura. O número de professores de Geografia formados em instituições
públicas chega a 2.996, enquanto os que fizeram seus cursos no âmbito privado computam 1.591 pessoas.
Confirma-se uma tendência não exclusiva, mas muito particular ao curso de Geografia. Ele continua sendo
propiciado, principalmente, por de instituições públicas de ensino superior.
111

procura por estes cursos tem aumentado, em paralelo ao aumento da concorrência nos

vestibulares públicos para os cursos de Geografia de nosso Estado. A valorização deste campo

de saber parece caminhar a par e passo com a necessidade de professores para a disciplina nas

escolas de ensino básico públicas e privadas do Estado60.

Pela da concentração da origem de formação nessas universidades e da presença em

eventos científicos, desde encontros de estudantes no tempo da graduação, até encontros em

escalas local, regional e nacional, grande parte dos profissionais de Geografia acaba por se

encontrar de tempos em tempos.61 As dificuldades de consolidarem posições de categoria,

entretanto, ainda hoje são evidentes, tanto para os que se dedicam ao trabalho como

geógrafos, quanto para os licenciados em Geografia62. Os primeiros tentam garantir sua

importância como profissionais ligados ao planejamento e a intervenção nas ações das

políticas sócio-ambientais do Estado e no âmbito das empresas públicas ou privadas que

executam as mesmas (MARANGONI, 1987 e ANDRADE, 1987). Já os professores, buscam

firmar tanto a importância da valorização da educação no contexto social, quanto a da

60
Sob um aspecto pragmático cabe recordar que um “reforço” a importância da Geografia foi dado pelo MEC,
ao introduzi-la no Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica). Este sistema visa a monitorar a
eqüidade e a eficiência dos sistemas escolares. As provas são realizadas de dois em dois anos com alunos das 4as
e 8as séries do ensino fundamental e da 3a série do ensino médio. A base desse sistema de avaliação é amostral e
também são aplicados questionários contextuais com diretores, professores e alunos. Seguindo receituário do
BIRD (Banco Mundial), a ênfase do exame foi dada às habilidades cognitivas: linguagem, ciências, matemática
e, adicionalmente, habilidades na área de comunicação (LAUGLO, 1997). Nessa seleção, diversos outros
conhecimentos são deixados de lado. Deste modo, até 1997, foram realizadas provas de Português, Matemática e
Ciências e, somente em 1999, passaram a ser alvo de avaliação a História e a Geografia.
61
Conforme já apontamos no Capítulo 2 (item 2.2.1).
62
Alguns eventos de profissionais de Geografia têm características que facilitam e estimulam o comparecimento
dos sujeitos. São geralmente encontros realizados nas férias escolares, o valor da inscrição para participantes é
relativamente baixo, da mesma forma para os que vão apresentar trabalhos, a grande maioria destes é aceita e há
diversificação na possibilidade de apresentações de trabalho. Formados e formandos, professores universitários e
professores das redes de ensino básico podem, indistintamente, apresentar atividades, experiências, entre outros
aspectos. Aos diversos participantes é permitido opinar sobre o rumo das atividades. O número de participantes
nos últimos Encontros Nacionais têm sido sempre superior a 3.500 pessoas. Estas características facilitam as
trocas, abrem possibilidades para intercâmbios, ainda que as dificuldades para a integração da categoria
(Geógrafos ou professores de Geografia) continuem.
112

Geografia como campo de saber cuja compreensão permite consolidar as ações necessárias à

cidadania plena e ao entendimento da realidade mundial63.

Quanto à participação em programas e cursos de pós-graduação, os sujeitos se

concentram nas três universidades públicas mencionadas (Gráfico 7). A maioria busca sua

Pós-graduação na própria Geografia. Apesar disto, podemos afirmar, como é o nosso caso,

neste trabalho, que outras áreas64, tais como, Educação, Engenharia, Planejamento Urbano,

Desenvolvimento Agrário, Sociologia, são alvo dos profissionais de Geografia que buscam

ampliar suas qualificações (GALVÃO, 1987).

O Gráfico demonstra como o perfil público também predomina na formação em pós-

graduação dos sujeitos. A existência de tais cursos, principalmente com perfil strictu senso se

efetiva com maior incidência nas instituições públicas mantidas pelo Estado, pois as mesmas

viabilizam a atividade da pesquisa científica, com seu financiamento e com a existência de

corpo docente mais qualificado e titulado para a maior parte dos cursos em questão.

Esse perfil de busca pela qualificação tem um contexto que se baseia no cenário

nacional estabelecido, principalmente, a partir da década de 1990, no qual há impacto efetivo

da exigência desta qualificação para melhoria salarial e permanência, em diferentes níveis, no

mercado de trabalho para os professores como um todo. No caso dos professores dos anos

63
Saviani em dois textos de 1986 demonstra preocupação em relação a esta desvalorização do magistério, desde
o período da formação universitária ao apontar “[...] cursos de licenciatura, vê-se de imediato, que eles refletem
o caráter secundário à educação e ao ensino da universidade. Constituem, via de regra, meros apêndices das
diferentes formas de bacharelado desempenhando, na prática, a função cartorial de garantir requisitos
burocráticos que permitirão converter bacharéis em professores.” (SAVIANI, 1986a, p.41). Em outro artigo, o
mesmo autor se utiliza da Geografia para acrescentar mais polêmica a tal situação “[...] geógrafo, uma vez que
tem por objetivo o esclarecimento do fenômeno geográfico, encara a geografia como fim. Para o professor de
geografia, entretanto, o objetivo é outro: é a promoção do homem, no caso do aluno. A geografia é apenas um
meio para chegar aquele objetivo. Dessa forma, o conteúdo será selecionado e organizado de modo a atingir o
resultado pretendido. Isto explica porque nem sempre o melhor professor de geografia é o geógrafo, o que pode
ser generalizado nos seguintes termos: nem sempre o melhor professor de uma determinada ciência é o cientista
respectivo.” (SAVIANI, 1986b, p.53).
64
Estas outras áreas recebem profissionais em Geografia tendo em vista articulações que o conhecimento
supostamente apreendido pelos mesmos permite realizar, integrando aos processos sociais, políticos,
econômicos, educacionais, culturais ou técnicos a dinâmica espacial ou territorial.
113

iniciais do ensino básico, a obtenção de diplomas de graduação, em ritmo acelerado, vem

sendo exigida65.

15
16
Pós-graduação na UFRJ
14 12
Pós-graduação na UFF
12
Pós-graduação na UERJ
10
7 Pós-graduação em outras IES
8 6 públicas
5 Pós-graduação em IES privadas
6
Pós-graduação em instituição no
4 exterior
1
2

Gráfico 7 - Distribuição dos sujeitos, segundo instituições formadoras em Pós-


graduação.

Cabe ressaltar que essas exigências inserem-se num contexto mais amplo,

estrategicamente encadeado, verticalizado nas ações, em acordo com o pacote de reformas

educativas proposto pelo Banco Mundial (BIRD) que contém como elementos:

a) Prioridade depositada sobre a educação básica; b) Melhoria da qualidade


(e da eficácia) da educação como eixo da reforma educativa, qualidade esta
centrada nos resultados verificados no rendimento escolar; c) Prioridade
sobre os aspectos financeiros e administrativos da reforma educativa, dentre
os quais assume grande importância a descentralização; d) Descentralização
e instituições escolares autônomas e responsáveis por seus resultados66, com

65
Segundo Vaidergorn (2001), circula com desenvoltura a proposta que agrega ao modelo atual de universidade
(com ensino, pesquisa e extensão) a possibilidade de escolas superiores de formação profissional de alto nível,
outras de formação superior técnica, e outras de formação geral, todas possibilitadas pela nova LDBEN. Um dos
resultados é a proliferação de "Institutos Superiores de Educação", escolas que passaram a formar rapidamente
licenciados em nível superior, cuja qualidade e conseqüências para o ensino básico ainda não foram aquilatadas.
“A lógica que rege tais medidas é própria da nova direita modernizadora, uma concepção de política que vem de
outros tempos e que se apossou do Estado brasileiro. Mesmo revestida de um discurso adequado às exigências
das instituições de fomento econômico mundial, pretende substituir todas as demais concepções que de alguma
forma visam atingir uma ‘justiça social’, fundamentada na extensão da cidadania.”.
66
Para Altmann (2002), de acordo com o receituário do Banco Mundial, os governos devem manter
centralizadas apenas quatro funções: (1) fixar padrões; (2) facilitar os insumos que influenciam o rendimento
escolar; (3) adotar estratégias flexíveis para a aquisição e uso de tais insumos; e (4) monitorar o desempenho
escolar.
114

controle pelas comunidades; e) Convocação para uma maior participação dos


pais e da comunidade nos assuntos escolares; f) Impulso para o setor privado
e organismos não-governamentais como agentes ativos no terreno educativo,
tanto nas decisões como na implementação; g) Mobilização e alocação
eficaz de recursos adicionais para a educação como temas principais do
diálogo e da negociação com os governos; h) Um enfoque setorial; i)
Definição de políticas e estratégias baseadas na análise econômica; j) Um
sistema de avaliação, com hierarquização das escolas, resultando em salários
diferenciados aos professores (TORRES, 1996, SEABRA, 1998 e
ALTMANN, 2002).

Nesse sentido, o governo federal elaborou os Parâmetros Curriculares Nacionais, que

têm por objetivo constituir uma referência curricular nacional. Estabelecidas as metas e os

padrões de rendimento, foram implementados sistemas de avaliação que devem monitorar o

alcance das mesmas. Assim, diversos sistemas de avaliação, nacionais e internacionais, foram

implantados na década de 1990, como o Saeb  Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Básica , o Enem  Exame Nacional de Ensino Médio , o Exame Nacional de Cursos

(Provão), a Avaliação dos Cursos Superiores. O Laboratório Latino-Americano de Avaliação

da Qualidade de Educação e o Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (PISA)

são exemplos de projetos internacionais de avaliação (ALTAMANN, 2002).

No caso das Universidades, as regras de competitividade e a racionalidade

produtivistas instaladas no país nas últimas décadas demandam, para a disponibilização de

verbas e financiamentos públicos, uma corrida pela titulação e capacitação, para além da

graduação, no caso dos professores que somente a possuem. Conforme verificado por

Vaidergorn (2001), algumas medidas ensaiadas  como a exigência de prestação de contas

de todas as instituições de ensino superior, que deverão destinar no mínimo 60% das suas

receitas para o pagamento de professores  ao lado de cortes de verbas, principalmente das

universidades federais, e outras medidas administrativas vêm apontando para uma tendência

de “privatização” do ensino superior. Como reflexo do contexto estabelecido, podemos

observar no Gráfico 8 a grande diferença entre os cômputos de obtenção da Pós-graduação

pelos sujeitos antes da década de 1990 e deste período para cá.


115

Apesar dos efeitos perversos dessa dinâmica, direcionada por padrões de qualificação

e méritos de ascensão mercadológicos do receituário neoliberal, efeitos-colaterais positivos

também se fizeram irromper. Surgem interesses, cada vez mais efetivos, por pesquisas

relacionadas aos processos educacionais, às ações docentes e aos cotidianos escolares que se

rearticulam entre as “brechas” do instituído pelas regras, ausências e presenças do Estado e do

mercado, no campo educacional.

45
40
35
30
25
20 41
15
10
5
0 4
Pós-graduação até 1990 Pós-graduação de 1991 em diante

Gráfico 8 - Distribuição dos sujeitos que realizaram alguma Pós-graduação, segundo


período.

Esses estudos denunciam o contexto estabelecido e dão aos sujeitos que os vivenciam

fundamentação e capacidade de argumentação contra as estratégias do Estado privatizado67 e,

permitem que caminhos alternativos possam ser propostos e defendidos por estes e outros

docentes. Mais ainda, promovem a abertura de diálogos com outras áreas afins, diminuindo a

fragmentação provocada pela falta de articulação entre os saberes.

Desse modo, seria empobrecedor entender que as práticas docentes, constituídas nos

tempos-espaços-relações se circunscrevem a determinações ou imposições, ignorando as

67
Recomendamos entre outros os artigos de: Altmann (2002), Torres (1998) e Corragio (1996).
116

sutilezas e astúcias das ações cotidianas dos sujeitos. Não é pela imposição que estas ações se

realizam, dando dinâmicas diferentes e mudando as práticas. Os sujeitos fazem, já no

presente, deslocamentos nas imposições do passado e, naquelas que se apresentam para seus

futuros. E o impacto destas práticas dos docentes, para além das regras rígidas, com certeza se

faz sentir cotidianamente nas escolas.

Na dialética estabelecida, esse movimento, favorecerá inclusive as instituições

privadas que poderão contar com profissionais pós-graduados advindos de programas de Pós-

graduação públicos que passam a atuar, ocupar e credenciar seus cursos emergentes. Como

conclusão evidente, as IES (Instituições de Ensino Superior) privadas acabam por ser

beneficiadas pelo processo de formação de especialistas, mestres e doutores maciçamente

realizado nas IES públicas (federais e estaduais)68. Este benefício também se reverte em

oportunidade de emprego e salários para os docentes, nestas IES privadas compelidas pela

necessidade e obrigatoriedade de qualificação e melhoria dos seus quadros.

Entendemos ser importante, ir além da formação inicial dos docentes e até da

qualificação obtida por alguns sob a égide da titulação (Pós-graduação). Acreditamos, que a

pesquisa e entendimento sobre a formação do professor assume outro caráter, quando não nos

fixamos unicamente na sua formação inicial. Somente ela não possibilitaria compreender a

pessoa do professor e sua experiência, assim como, a profissão de professor e seus saberes

específicos e, a escola, na sua cultura e nos seus projetos educacionais. A prática docente e a

formação docente não são resultantes lineares da formação inicial ou de uma titulação

posterior. Ambas (prática e formação) refletem a produção possível que os sujeitos têm a

partir dos espaços e tempos vivenciados no contexto sócio-cultural.

68
Segundo dados extraídos do documento “Resultados e tendências da Educação Superior no Brasil” (2000), o
número de matrículas na Pós-graduação por dependência administrativa registrava em 1999: 51,6% de
matriculados em mestrados de instituições federais, 33% nos das estaduais e 15,4% nos de instituições privadas.
Para os doutorados os números correspondem, respectivamente, a 43,5%, 47,3% e 9,2%. Fonte: MEC/INEP
(2000).
117

Concordamos com Dias-da-Silva (1998), quando argumenta que os professores

aprimoram seu trabalho ao longo da carreira e que a experiência prática confere à prática

pedagógica uma qualidade potencialmente superior. Tal idéia, embora seja aceita por grande

parte dos próprios professores, apenas recentemente começa a ser reconhecida pelos

estudiosos que buscam a compreensão do trabalho educativo e, sobretudo, caminhos para a

ação e na formação dos professores. A mesma autora frisa que a concepção do

desenvolvimento profissional docente, baseada na proposta de um continuum de formação,

em que a formação básica é apenas o início de um processo de trabalho docente, que ocorrerá

ao longo da carreira é, infelizmente, recente. Do mesmo modo, quando os professores se

titulam (qualificam), é importante que os pesquisadores e os próprios professores

reconheçamo-nos como sujeitos de nossos trabalhos. Para Dias-da-Silva (1998) não basta

pretender que o professor acredite que a criança ou um adolescente devam construir e serem

sujeitos do conhecimento. Há que se considerar que também o professor precisa ser

reconhecido como sujeito de seu fazer cotidiano. Neste sentido, analisa a autora: “é preciso

que o próprio professor tenha condições para que ele próprio construa seu conhecimento sobre

seu próprio trabalho.”.

Desde meados dos anos 1980, idéias como profissionalização e/ou proletarização do

magistério, cultura escolar, socialização profissional, feminização do magistério, etapas da

carreira docente e formação continuada, bem como pensamento, tarefas, tomadas de decisão,

saberes, crenças e valores dos professores passam a fazer parte do universo dos estudos

educacionais em todo o mundo. Segundo Marin (1998), há um grande número de pesquisas

demonstrando as precárias condições de trabalho do professor (que assumem também a forma

de despreparo profissional para a organização do conteúdo escolar e dos procedimentos

didáticos), o baixo status profissional, a baixa remuneração do serviço prestado e as

dificuldades para enfrentar, eficazmente, as características apresentadas pelo corpo discente.


118

Tais aspectos, entre outros, acabam por significar entraves à realização dos ideais propostos

para a escola, sobretudo para a escola pública e, contribuem para a produção do fracasso

escolar e da baixa qualidade do ensino. Em conseqüência, nos últimos anos, estudos

envolvendo professores de Ensino Básico de escolas públicas (DIAS-DA-SILVA &

CHAKUR, 1989; DIAS-DA-SILVA, 1994),

revelam que os mesmos olhos que podem ver um funcionário público com
mordomias funcionais ou um profissional assoberbado de trabalho, com
jornada de trabalho injusta e mal remunerado... são capazes de ver que o
mesmo profissional que atua sob uma prática autoritária e elitista, se ressente
pelo fracasso dos alunos, se vê desesperançado e "sem saídas"... Um
profissional solitário, que não tem nenhum investimento em sua qualificação
e sequer dispõe de tempo adicional para ela. Um profissional que, muitas
vezes, está dando muito mais do que recebeu, pois também é fruto desse
mesmo sistema de ensino. Sistema que, menosprezando a educação, coloca,
em segundo plano, também seus agentes formais, obrigando-os a uma
formação limitada e também precária, em cursos que são vistos como
concorrentes desprezíveis para os (cursos) profissionalizantes de médicos,
dentistas ou engenheiros (DIAS-DA-SILVA,1998). A autora adverte que
poucos foram os estudos brasileiros que, ao invés de penalizarem, foram
capazes de ser empáticos com estes “profissionais dos dilemas”. E como o
fenômeno educativo não é um jogo de mocinhos e bandidos, a questão-chave
para os estudiosos neste momento é decifrar quem são e como trabalham os
professores.

Dessa forma, não podemos deixar de lado, em relação aos sujeitos aqui estudados, a

preocupação com os espaços vividos pelos mesmos em suas práticas pedagógicas cotidianas.

A inserção dos mesmos nas esferas de atuação pode ser observada na Tabela 1. Fica

evidenciado que a maioria trabalha no ensino público. Na verdade, mais da metade dos

pesquisados só trabalha neste último. Dos noventa e um (91) sujeitos, cinqüenta e quatro

atuam exclusivamente na rede pública, vinte e seis (26) lecionam tanto na rede pública quanto

na rede privada e, a minoria, onze (11), vincula-se, exclusivamente, a esta última.69

69
Mais uma vez, nos apoiaremos em informações do INEP (2002), provenientes do Censo 2002, que permitem
apontar que 2.419.585 professores se encontram exercendo atividades em sala de aula na Educação Básica
brasileira. Destes, 1.925.375 encontram-se no ensino público e somente 494.210 encontram-se na mesma
condição no ensino privado. Para o Estado do Rio de Janeiro os números são, respectivamente: 224.928; 155.565
e 69.363. Deste modo, confirma-se uma outra tendência, no último Censo, da maior parte dos empregos para
professores no Brasil ainda serem da responsabilidade do Estado (setor público). Os sujeitos aqui pesquisados
não fogem a esta tendência.
119

Tabela 1 - Distribuição dos sujeitos, segundo rede de atuação.

Redes de atuação N %
Só na rede pública 54 59.3
Só rede privada 11 12.1
Redes pública e privada 26 28.6
Total 91 100.0

Cabe assinalar que a distribuição acima se modifica se considerarmos que aqueles que

atuam em ambas as redes, vinculam-se também à pública, o que permite afirmar que o total de

sujeitos que trabalham nesta rede de ensino é bem maior (Gráfico 9).

Em função dessa realidade, são vários os cruzamentos entre tempos-espaços de prática

docente que, no momento da pesquisa (ano de 2001), puderam ser observados. Mesmo para

aqueles que trabalham na rede pública, existe a possibilidade de acumular vinculações ou

contratos, seja entre as esferas federal, estadual e municipal, seja em cada uma das esferas.

Redes
pública e
80 privada
70
26
60
50 Somente
40
rede pública

30
20 54

10
11

0
somente rede privada rede pública

Gráfico 9 - Distribuição dos sujeitos, segundo redes de ensino.

Nesse sentido, chamamos a atenção de que o somatório das vinculações será superior

ao total de sujeitos. Isto se verificará no Gráfico 10 e, também, em outros Gráficos e Tabelas


120

apresentados a seguir, nos quais a unidade de contagem não será o sujeito. Este cenário trás

indícios de uma outra realidade do magistério no país. O das múltiplas jornadas de trabalho.

Muitos professores acabam por trabalhar em torno de 45 aulas semanais, sendo raros

os casos em que parte desse tempo (em geral entre 10% e 20%) é dedicado aos trabalhos

extraclasse. Com isto, muitas das atividades inerentes ao ensino têm que ser realizadas em

casa pelo docente. A sobrecarga de horas extraordinárias e duplas-regências tem efeitos

particularmente nocivos sobre as condições de trabalho (e de saúde dos educadores), uma vez

que torna mais acentuadas as condições já estressantes do trabalho realizado em “condições

normais”. Em relação a estas últimas (condições normais), se ainda levarmos em conta que

número adequado de alunos por classe deve situar-se entre 20 e 30 no máximo, pensando que

as classes menores favorecem o estudo e a atenção docente mais próxima e efetiva,

observamos que no Brasil, não raro, o número de alunos é superior a 50 por classe. Há

professores que chegam a lecionar para até cerca de mil alunos, em até mais de vinte classes

(CNTE, 1997).

Privada 11
Municipal 20
Estadual 15
Federal 2
Municipal + Privada 19
Estadual + Privada 11
Federal + Privada 6
Estadual + Municipal 20
Federal + Estadual 5

0 5 10 15 20 25

Gráfico 10 - Distribuição da vinculação dos sujeitos nas redes de ensino.


121

Novamente, queremos reforçar que o interesse em captar as vinculações dos sujeitos

visa indiciar não somente a sobrecarga de trabalho, mas também a versatilidade do mesmo. É

importante termos em mente que professores, não são robôs que de forma automática

reproduzem por igual os conteúdos e as ações nos diferentes espaços-tempos nos quais se

inserem e, também não são vistos igualmente pelos diferentes sujeitos com os quais acabam

por conviver. As regras de trabalho e os acordos das convivências ora se aproximam, ora se

distanciam, em função das diferentes realidades experimentadas. Deste modo, os docentes

têm ainda um papel central na questão da educação, que se diversifica cotidianamente. Os

professores experimentam diferentes demandas de diversas culturas e dão sua parcela de

contribuição para consolidar ou não os valores, modelos e símbolos, inerentes a estas

combinações culturais. Os sujeitos acabam, ao viver em diferentes instituições, com diferentes

pessoas, se exaurindo, estabelecendo hierarquias, prioridades, configurando diferentemente

suas práticas e propostas. Como advoga Dias-da-Silva (1998), “[...] o ceticismo, a recusa ou

desânimo não têm impedido que a maioria dos professores continue a lecionar, assim como (é

sempre importante repetir) [...], a maioria das famílias brasileiras continua a colocar seus

filhos na escola” 70.

Neste trabalho, acreditamos na produção de culturas diversas, em concomitância com

espaços-tempos diversos. Esta pluralidade também é incorporada e disseminada pelos

professores. Destacamos que, assim como Dias-da-Silva (1998), não partilhamos uma visão

ingênua, ufanista ou cegamente otimista a respeito da atuação dos professores. Segunda a

autora,

há professores que dão mostras concretas do ‘faz-de-conta’ escolar, indícios


claros de corrupção pedagógica. Tais corruptos são evidentemente maus
70
Fontana (2000) afirma que “Como instituição, a escola ocupa um lugar específico na divisão social do
trabalho: cabe-lhe administrar um modo de circulação (utilizando-se de textos falados ou escritos) e de
estabilização de algumas formas de interpretação do processo de produção do conhecimento, sobre outras. A
realização dessa tarefa tanto medeia, quanto se faz pela mediação de uma outra – a normalização do
comportamento da criança (do jovem ou do adulto) tendo em vista as exigências inscritas nesse modo de
circulação do conhecimento.”.
122

professores. Na verdade, maus profissionais. Maus profissionais são


possibilidade em qualquer área de trabalho. Nesse caso, talvez o problema
resida no sistema que permite que os corruptos pedagógicos mantenham-se
lecionando, ou que os acoberta com uma cumplicidade perniciosa.

Se apreciarmos as informações obtidas através dos sujeitos que concretizam a

vinculação, cumpre destacar o predomínio da inserção em uma só rede (52%), assim

distribuída: 37 vinculados à esfera pública e 11 à esfera privada. Considerando o Gráfico 11, é

possível afirmar que a rede pública absorve 59% dos sujeitos quer com um único vínculo,

quer combinando-os, dois a dois.71

9%

Público + Privado

19% 12% Público + Público

52% Público + Público + Privado


40%
Privado

Uma dependência
administrativa do Público
20%

Gráfico 11 – Distribuição percentual dos sujeitos, segundo vinculação.

Frisamos que tal constatação é coerente com levantamentos do Inep (2002) para a

distribuição de funções docentes, segundo Dependência Administrativa72. É oportuno

71
Observe-se que, conforme a legislação trabalhista vigente, profissionais do ensino e da saúde podem acumular
no máximo dois vínculos em dependências administrativas públicas.
72
Em relação a esta informação, é oportuno remeter aos dados do INEP/MEC (2002). Para as funções docentes
no Ensino Fundamental de 5ª a 8ª séries existem 800.753 professores. Destes 669.266 trabalham em
estabelecimentos públicos e somente 131.487 estão em instituições privadas. No Estado do Rio de Janeiro,
totalizam-se 73.952 docentes, sendo 54.008 em instituições públicas e 19.944 em instituições privadas. Para o
Ensino Médio, registram-se no Brasil 468.310 docentes, 352.785 dependem administrativamente do setor
público e somente 115.525 encontram-se sob a dependência do setor privado. No Rio de Janeiro, encontram-se
123

ressaltar, no sentido da sobrecarga de trabalho e da diversidade, já comentadas anteriormente,

que 48% dos sujeitos, associam dois ou três vínculos. Com incidências bem próximas, 20% e

19% encontram-se, respectivamente, os docentes que atuam com dois vínculos, seja um

público e outro privado, seja exclusivamente no ensino público.

Também é possível constatar que 9% são trabalhadores que têm mais de um vínculo

no ensino público e também prestam serviço no magistério privado. Mesmo os que têm um

único vínculo no ensino público ou privado podem possuir mais de um registro, matrícula ou

contrato de trabalho. Já há algum tempo, é prática comum a docência em mais de uma

instituição privada. Da mesma forma, é corriqueira a atuação de professores com mais de uma

matrícula como servidor efetivo ou por contrato de trabalho temporário, nas esferas do serviço

público (duplas matrículas acompanhadas por dobras de regências ou duplas regências). Esta

tendência banalizou-se entre os professores que militam nas redes públicas municipais de

educação e mesmo na rede estadual. Como resultado, mais uma conseqüência negativa pode

ser prevista: a dificuldade ou inexistência de solidez no trabalho coletivo na escola, agravada

pela falta de convivência profissional entre os professores. Com a precarização do trabalho

docente, surgem também a itinerância e a rotatividade de professores, ocasionando,

internamente, pouco envolvimento dos mesmos com seus alunos, os quais, muitas vezes,

sequer sabem o nome de seus professores (MARIN, 1998).

Quando verificamos a preponderância da incidência da atuação dos professores na

esfera pública, cabe ressaltar que a maioria tem participação no ensino Municipal. Considere-

se que a rede Municipal de ensino da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro é uma das

maiores da América Latina (possui 1036 escolas e 37 mil professores)73 e, a este contingente,

devemos adicionar a atuação de docentes em outras redes municipais de educação existentes

50.128 deste total. Atuam como funcionários do setor público 33.985. Pertencem aos quadros de assalariados da
iniciativa privada um total de 16.143.
73
Fonte: Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (SME/RJ). Disponível na
World Wide Web, citado em 09 de fevereiro de 2003, < http://www.rio.rj.gov.br/sme/numeros.htm>.
124

no estado74. Logo a seguir, tem-se a participação na rede Estadual e, em menor escala, nas

instituições Federais de Ensino (Gráfico 12).

74
Segundo dados do INEP (2002) o número de funções docentes em dependências municipais no Estado do Rio
de Janeiro de 5ª a 8ª séries é de 28.137. Nas mesmas séries do Ensino Fundamental, para dependências estaduais
o valor é de 25.419 e, no âmbito federal encontram-se 452 docentes. Ao averiguarmos os valores para o Ensino
Médio, no mesmo estado, encontraremos respectivamente, para dependência municipal, estadual e federal: 757;
32.090 e 1.138. Sob dependência administrativa privada, os valores para 5ª a 8ª séries e para o Ensino Médio são
19.944 e 16.143, respectivamente. Na constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN) de 1996, Rodriguez (2001) chama atenção da orientação do governo federal, pela lógica
descentralizadora que comandou estas leis, diminuindo a oferta direta de serviços educacionais no Ensino
Fundamental por parte da União, reforçando o seu papel coordenador e eqüalizador. Assim, após a resistência de
quase uma década dos prefeitos municipais e governos estaduais para conduzir um processo articulado de
descentralização da oferta educacional entre as esferas governamentais, houve a intervenção do governo federal
por meio da Emenda Constitucional nº 14/96 e da lei 9324/96, as quais concretizam um novo cenário de
coordenação do processo. Como manobra, quando da promulgação da Emenda constitucional que constitui a
base para implantação do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério), o governo federal reduziu o percentual dos seus recursos vinculados que deveriam
ser aplicados no ensino fundamental. Este percentual caiu de 50%, segundo regia o artigo 60 das disposições
transitórias da Constituição de 1988, para 30%. Por lei, 60% desta verba deve ser gasta com remuneração de
professores. Obviamente, ao se tratar de descentralizar, coube aos municípios manter escolas, em especial de
Educação Infantil e de Ensino Fundamental, o que, aliás, está prescrito expressamente no inciso VI do artigo 30
da Constituição Federal de 1988: “compete aos Municípios: VI – manter, com a cooperação técnica e financeira
da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental”. Segundo Saviani (1999), a
consideração das dificuldades técnicas e financeiras que muitos municípios teriam para organizar a curto ou
mesmo em médio prazo os seus sistemas de ensino, está expressa também no texto constitucional quando, ao
estabelecer no inciso VI do artigo 30 a competência inequívoca dos municípios de manter programas de
Educação Pré-escolar e de Ensino Fundamental, acrescenta que isso será feito com a cooperação técnica e
financeira da União e dos Estados. Curiosamente, entretanto, se a Constituição se refere ao sistema municipal de
ensino e a LDBEN dá respaldo legal para a sua implantação, no que toca aos planos de educação nem a
Constituição nem a LDBEN prevêem a formulação de planos municipais de educação (SAVIANI, 1999).
Efetivamente, a Constituição se refere no art.14 ao plano nacional de educação a ser estabelecido por lei e a
LDBEN estabelece como incumbência da União “elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios” (Art. 9º, I) e como incumbência dos estados “elaborar e
executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação,
integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios” (Art. 10, III). E quando trata das
incumbências dos municípios a LDBEN estabelece que cabe a eles “organizar, manter e desenvolver os órgãos e
instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e
dos Estados” (Art. 11, I). Portanto, nem a Constituição nem a LDBEN prevêem a competência dos municípios
para elaborar planos de educação. Este contexto, acaba por demonstrar algumas das contradições do processo de
descentralização educacional ocorrente em nosso país. Todo esse otimismo em relação aos efeitos da educação é
problematizável. A prioridade é dada à educação básica, cabendo ao setor privado outros investimentos, como no
ensino superior. Acreditar que a oferta de um ensino básico garantirá, a todos, oportunidades iguais no mercado
de trabalho e na vida social é uma grande ilusão. Com esse tipo de investimento, há uma segmentação da
população entre aqueles que só dispõem dos serviços básicos e os que obtêm serviços mais amplos (ALTMANN,
2002). Com isso, argumenta Corragio (1996), há uma redistribuição dos serviços públicos dos setores médios
para os pobres, acompanhados de uma redução da qualidade e da complexidade. As diferenças entre escolas se
ocultam sob a aparência de um mesmo certificado de aprovação. Segundo o autor, é uma falácia o fato de que a
educação básica vá garantir acesso ao mercado de trabalho. Seria necessário, outrossim, um desenvolvimento
que garantisse crescimento das demandas por trabalho, o que exigiria investimentos em outros níveis de
educação, em outros setores econômicos, assim como em outras instituições além do mercado. Percebe-se que
não é suficiente ter acesso ao ensino secundário para ter sucesso no mesmo e que não é suficiente ter sucesso
nele para ter acesso a certas posições sociais. Cabe alertar, que em ritmo acelerado, as prefeituras de diferentes
municípios do país sem planos educacionais concretos e amplamente discutidos, passaram a se inserir de forma
veloz no Ensino Fundamental. Ofertas de vagas para alunos e concursos públicos foram realizados, abrindo
vagas para professores em segmentos diferenciados do Ensino Fundamental. Apesar disso, as dificuldades
apontadas nos permitem indiciar que, para o Estado do Rio de Janeiro, o papel da rede estadual de ensino é ainda
125

50
45
40
35 43 50
30
25
20
15
10 12
5
0
Federal Estadual Municipal

Gráfico 12 - Distribuição das atuações dos sujeitos no ensino público

Essa configuração reflete mudanças da realidade educacional brasileira, atingida pela

ótica do oferecimento em escala dos serviços educacionais. Embora se apresente com um viés

democratizante, tal tendência, aumento da oferta de educacional básica, legalmente respaldada

(Constituição de 1988 e Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996), foi

operacionalizada de tal forma que o Estado pode ir se retirando do protagonismo das Políticas

Sociais, do sistema público de ensino, para ser árbitro de um jogo no qual parece não tomar

partido: garante a competência dos atores, reduzindo as distâncias entre consumidores (pais,

alunos e comunidades locais) e produtores de serviços da educação (escolas e professores). A

prestação deste serviço, por sua vez, varia segundo espaços-tempos-relações, em geral,

condizentes com as condições de reivindicação ou de pagamento pela comunidade (clientela)

bastante significativo no atendimento à Educação Básica, aí incluído o Ensino Fundamental. Outro fator
histórico a registrar é a presença de algumas unidades federais de ensino que acabaram por permanecer na antiga
capital do país e se manterem ativas mesmo com o deslocamento da sede do governo federal para Brasília. Desta
forma, o número relativamente próximo de vinculações e atuações dos sujeitos que trabalham na rede estadual e
na rede municipal insere-se neste contexto realçado. A presença de instituições federais de ensino, em menor
número, também não deixa de estar contemplada no cenário acima desfraldado.
126

servida. Desta forma, “Essa retirada não produz liberdade, mas desigualdade e descontrole em

um mercado desregulado  a educação, onde seus referentes de poder passam a ter um

exercício mais oculto e as mudanças escondem-se atrás de uma maior democratização”

(ROSSI, 2001).

Seguindo no caminho de mapearmos os espaços-tempos dos sujeitos pesquisados,

podemos apreender em que níveis de ensino os licenciados em Geografia atuam, na Tabela 2,

a seguir:

Tabela 2 - Distribuição da atuação dos sujeitos por nível de ensino.

Percentual de atuações
Nível de ensino em que atua N° de em relação ao total de
atuações sujeitos

Universitário 16 17.6
Médio 52 57.1
Fundamental 64 70.3
Em todos 5 5.5
Obs.: A soma dos valores absolutos e relativos ultrapassa o total de sujeitos (91)
e os 100%, respectivamente, porque um mesmo professor pode atuar em mais de
um nível de ensino.

A consideração dos valores desta Tabela, associada à análise dos gráficos anteriores,

reforça a afirmação da sobrecarga de trabalho dos sujeitos. A premência de combinar lugares,

esferas, níveis, turmas/tempos e, conseqüentemente, o acúmulo de trabalho, consomem o dia-

a-dia destes professores. A luta pela inserção e manutenção no mercado de trabalho e a

necessidade da combinação de fontes e salários diversos estão marcadamente presentes no

grupo. As relações negociadas na cultura de cada escola, em cada um dos tempos-espaços, de

forma não homogênea, segundo diferentes normas e hierarquizações, de acordo com

diferentes sentidos atribuídos aos alunos, professores e comunidades comportam a

complexidade das astúcias e acomodações ideológicas possíveis dentro destes diferentes

tempos-espaços-relações. Cabe salientar, que esta condição de sobrecarga pode ter, inclusive,
127

sido iniciada antes mesmo dos sujeitos terem conseguido seus diplomas de graduação.

Lembremo-nos, conforme analisado nas páginas 106 e 107 deste Capítulo, que dos noventa e

um (91) pesquisados, quarenta e três (43) já trabalhavam como professores antes da obtenção

de seus diplomas de graduação. Este contexto que acaba por gerar uma desmotivação pela

falta de condições de trabalho, pela instabilidade no emprego, pelas relações hierárquicas,

pelo universo burocrático e pela condição de simples assalariado a que vem sendo submetido

o professor se insere numa problemática maior. A “desqualificação” dos professores é apenas

um dos aspectos da desqualificação da própria escola. Esta, por sua vez, se insere no contexto

das políticas públicas instituídas no país nas últimas décadas, permitindo que a relação da

escola com a sociedade e com as comunidades se reduzisse à relação entre uma prestadora de

serviços e uma clientela. Com isto, o papel da escola e daqueles que nela labutam condiz com

a nova divisão social do trabalho. Sua base é a reestruturação produtiva do capitalismo, a

flexibilização do trabalho e a transformação de tudo que existe, inclusive a educação em

mercadoria. Há, segundo Rossi (2001), uma despolitização das práticas de gestão (e/ou de

administração) da organização escolar. Tal conjuntura vem ocorrendo com maior ou menor

intensidade em quase todos os países e sistemas escolares: ora (re)centralizando certos

poderes de decisão, ora descentralizando outros, compatíveis com estratégias de desregulação

e de privatização do setor público da educação (LIMA, 2000, p. 17).

Ainda em relação à Tabela 2 é preciso destacar que o nível de magistério com o maior

número de atuações, para os professores investigados, corresponde ao fundamental,

geralmente sob a responsabilidade das redes municipais públicas e de estabelecimentos

privados de ensino. Também merece destaque a grande participação docente no ensino médio,

sustentada, principalmente pela esfera estadual, pelas participações nos estabelecimentos

privados e, em menor número, pelas atuações em colégios federais públicos. Para o ensino

superior, registra-se um contingente total de atuações bem inferior aos do ensino básico. Neste
128

caso, os sujeitos atuam, principalmente, nas universidades públicas federais e estaduais e, em

número bem inferior, nas instituições de ensino superior privado. Há ainda casos, em número

bem menor, de professores que acabam por vivenciar suas práticas em todos os níveis de

ensino existentes, podendo atuar em uma única instituição ou em várias delas.

Mais uma vez, julgamos ser oportuno contextualizar essa configuração das atuações,

no âmbito da política pública de descentralização e crescimento da oferta de vagas no ensino

fundamental. Como decorrência da mesma, há oferta de concursos públicos e ingresso dos

sujeitos nas redes municipais. Ao invés de absorver grande parte da mão-de-obra qualificada

existente, as administrações municipais, visando diminuir custos com obrigações e direitos

trabalhistas, preferem oferecer esquemas de duplas regências aos seus corpos docentes. Desta

forma, não são abertos novos concursos e nem chamados candidatos já aprovados, integrantes

de listas de espera. A mesma lógica é seguida pelas outras dependências administrativas. Cria-

se e amplia-se um exército de reserva de mão-de-obra qualificada que, como sabemos, acaba

por empurrar para baixo as médias salariais da categoria. Isto não acontece só com os

professores, mas acaba por evidenciar uma das características da proletarização da profissão

docente. O trabalho acaba sendo oferecido em massa (em escala) pelos professores que atuam

em turmas cheias, dando vários tempos de horas-aula semanais e, somente não perde toda sua

qualidade pois os mesmos se superam para garantir, entre outras coisas, a própria

permanência no mercado de trabalho. Como um dos resultados, é comum ver professores

desgastados, readaptados e adoecidos pela dinâmica expropriante a qual estão submetidos75.

75
Esta conjuntura acaba por servir como instrumento de luta da categoria docente no sentido da garantia do
regime de aposentadoria especial aos 25 e 30 anos. O ensino possui características particulares, geradoras de
estresse e de alterações do comportamento dos que nele trabalham. Estudos realizados em diversos países da
América e da Europa têm demonstrado que os docentes estão permanentemente sujeitos a uma deterioração
progressiva da sua saúde mental. O estresse já é reconhecido por organismos internacionais como "enfermidade
profissional", cujos efeitos atingem inclusive o ambiente escolar. É considerado pela Organização Internacional
do Trabalho não somente como um fenômeno isolado mas “um risco ocupacional significativo da profissão”.
Por outro lado, as especialidades médicas ligadas ao maior número de dispensas para o pessoal docente são, em
diferentes países, as de psiquiatria , neurologia, otorrinolaringologia, reumatologia, traumatologia, hematologia e
doenças cardiovasculares, o que tem permitido caracterizar um quadro de doenças profissionais da categoria.
129

Acrescentamos a essa constatação que o quadro no qual os docentes estão inseridos

não se isola pela escola ou pelas instituições que formam os professores e alunos. Da mesma

forma, a profissão do magistério se encontra num cenário de desvalorização que não atinge

somente a educação ou especificamente o professor. Os trabalhadores, em diferentes porções

da terra, vêm sendo desvalorizados e precarizados quanto às suas inserções em seus ofícios e

os professores, enquanto trabalhadores, acabam por não escapar a esta desvalorização. Neste

sentido, Dias-da-Silva (1998) afirmou que

É fundamental registrar que o descaso ou a indiferença pelo magistério, o


desinteresse pelo estudo aprofundado de (novos) conhecimentos até a
agressividade de alunos ou pais, a sobrecarga de trabalho, o enfraquecimento
do poder do magistério ou mesmo a baixa expectativa com relação à escola,
parecem características deste “ofício” neste final de século e não simples
“defeitos” dos “algozes e incompetentes” professores brasileiros.

Não devemos também desconsiderar que, por outro lado, há uma variedade de trocas e

interpenetrações de atuações em esferas e níveis de ensino diferenciados, promovidas pela

dinâmica das inserções dos docentes enquanto táticas de sobrevivência e práticas

No Brasil é grande o número de professores “readaptados” (afastados temporária ou permanentemente para


atividades administrativas) afetados por uma ou algumas doenças desse conjunto, ou de professores que se
mantêm com sucessivas licenças-saúde e, não raro, como objeto de desprezo e como fonte de problemas para os
quadros docente e discente (CNTE, 1997). As péssimas condições de trabalho causam problemas de saúde para
os profissionais de educação do Estado do Rio de Janeiro e diminuem o tempo de exercício de suas funções. A
conclusão é da pesquisa Readaptação Profissional: a Ponta do Iceberg, feita pelo Centro de Estudos da Saúde do
Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh) da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Num universo de 150 mil
profissionais, 15.441 (mais de 10%) tiveram de mudar de atividade, entre 1993 e 1997, por causa de problemas
de saúde. O estudo foi elaborado para o Sindicato Estadual dos Trabalhadores em Educação (Sepe), com dados
da Secretaria de Administração do Estado. “Desde então, a situação não melhorou. Nos cinco anos estudados, os
casos de readaptação triplicaram entre as professoras e chegou a quase o mesmo entre os outros profissionais”,
diz uma das coordenadoras da pesquisa, a engenheira Jussara Brito, Doutora em Saúde Pública. Segundo ela,
tudo indica que a doença vem aparecendo cada vez mais cedo, pois a readaptação ocorre entre pessoas mais
jovens e com menos tempo de vida ativa. A diretora de Saúde do Sepe, Gesa Linhares Corrêa, explica que a
pesquisa, que hoje envolve também a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), foi a forma de o
sindicato lutar por melhores condições de trabalho para setor. “Quisemos dar uma base científica para as
questões levantadas pelos profissionais e, além disso, ampliar a área de atuação, envolvendo todos na busca de
soluções”, explica ela. “No dia-a-dia da escola, professores, serventes, merendeiras e outros profissionais de
ensino não têm tempo ou oportunidade de discutir seus problemas que, muitas vezes, são comuns. Com essa
pesquisa, que se estende até 2003, as questões começam a ser levantadas em conjunto e as soluções, buscadas
por todos.” (Escola deixa professores doentes, avalia pesquisa. On line, citado em 12 de fevereiro de 2003,
disponível na World Wide Web:
<http://www.uol.com.br/aprendiz/guiadeempregos/educadores/noticias/ge200901.htm#1 ).
130

profissionais, que enriquecem suas formações docentes. Esta afirmação pode ser comprovada

através do Gráfico 13.

9%
9%

55%
27%

Universitário Médio Fundamental Atuam em mais de um nível de ensino

Gráfico 13 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo exclusividade de atuação, por


nível de ensino.

Como sobreviver em um único nível de ensino, assim como, em uma única

dependência administrativa é algo quase impossível, os professores diversificam suas

inserções. Apesar das sobrecargas e da necessidade de astúcias diferenciadas delas

decorrentes, os mesmos multiplicam suas fontes de renda, seus parceiros e grupos de

convivência e, adaptam suas formas de ação e suas práticas docentes, contribuindo para ora

reforçar e ora refazer algumas das normas, dos valores, das culturas dos cotidianos escolares

nos quais estão inseridos. Quando participam ou não das atividades inerentes ao trabalho

docente objetivam suas práticas levando em conta os valores que são sedimentados ou

lentamente modificados nas vivências cotidianas diferenciadas. Positivando algumas regras e

ações e, negativando outras, tentam estabelecer seus espaços de atuação e preservação.

Outrossim, isto os enriquece tanto na prática docente quanto na articulação enquanto

categoria, assim como, enriquece ao processo educacional do qual os mesmos são sujeitos.
131

Em relação aos professores de Geografia, estudados neste trabalho, cabe salientar que

o contexto atual ainda apresenta um outro matiz. A quantidade de tempos desta disciplina na

grade escolar é relativamente menor que a de algumas outras disciplinas (Língua Portuguesa e

Matemática são exemplos disso). Para completar o exigido em seus contratos de trabalho, o

professores de Geografia acabam por ter mais turmas e, em conseqüência, mais alunos. Neste

sentido, mais sobrecarga. Por outro lado, podem ter mais contato com a realidade e a

diversidade da escola. Pensamos que poderiam e deveriam existir outras formas, menos

desgastantes, para que tal inserção pudesse ser feita, sem perder a riqueza decorrente do

vivenciar o cotidiano e mesmo os diferentes cotidianos escolares.76

Apesar do quantitativo predominante dos docentes pesquisados atuar no nível

fundamental, se considerarmos o maior nível de ensino no qual está inserido cada sujeito,

teremos a distribuição esboçada no Gráfico 14. Passamos a evidenciar que o ensino médio

torna-se, para a maioria dos professores, o maior nível de atuação.

São ao todo quarenta e cinco (45) docentes que se dedicam exclusivamente a este nível

ou que atuam no mesmo e no nível fundamental. Como os que se dedicam exclusivamente ao

nível médio são poucos (somente 8 docentes), podemos inferir que as trocas e necessidades de

planejamentos diferenciados são uma realidade do cotidiano destes professores.

O maior empregador no nível médio é o poder público estadual. Há um contexto

diferenciado de inserção da disciplina Geografia na grade curricular que segue o padrão de

número de tempos de aulas semanais inferiores aos de outras disciplinas (Língua Portuguesa e

Matemática). Como decorrência, o número de turmas e de alunos aumenta. Este último

76
Com condições de trabalho e salário melhores, docentes pertencentes a uma mesma rede de ensino poderiam
vincular-se a menos escolas e promover, em espaços-tempos determinados e produzidos coletivamente,
integrações inerentes aos cotidianos interescolares. Da mesma forma, poderiam conjugar tais experiências para
promover articulações entre níveis e redes de ensino diferenciados, valorizando o processo de produção do
conhecimento e da cultura em escala crescente. Estamos falando numa valorização da solidariedade entre
sujeitos e instituições no processo educativo e, como este não está isolado, do processo social.
132

aumento não é tão grande quanto o registrado no ensino fundamental, em função do corpo

discente matriculado no ensino médio estadual ser menor.

1
89 90 91 2 3 4
87 88 5 6
86 7
85 8
84 9
83 10
82 11
81 12
80 13
79 14
78 15
77 16
76 17
75 18
74 19
73 20
72 21
71 22
70 23
69 24
68 25
67 26
66 27
65 28
64 29
63 30
62 31
61 32
60 33
59 34
58 35
57 36
56 37
55 38
54 39
53 40
52 41
51 50 43 42
49 48 47 46 45 44

Universitário Médio Fundamental

Gráfico 14 - Distribuição dos sujeitos pelo maior nível de ensino em que atuam

A inserção no ensino médio sugere um padrão de hierarquização que se volta, muitas

vezes, para a preparação dos alunos para o mercado de trabalho ou para concursos, tais como,

os vestibulares. Desta forma, a abordagem e o nível de aprofundamento dos conhecimentos

geográficos se diferencia. Para alguns pode significar uma mudança de clientela, na qual

alunos de uma faixa de idade, a adolescência, ou mesmo adultos, já iniciados nos

conhecimentos geográficos, passam a ser alvo do trabalho de aprofundamento em tais


133

conhecimentos. Tal diferenciação, talvez não se reflita somente na forma de tratamento e

aprofundamento das temáticas geográficas.

Nesse raciocínio, estamos sugerindo haver uma hierarquia, que como tal, tem base na

diferenciação. Estar trabalhando num nível de ensino maior, quanto ao grau, com um público

cuja média de idade é, em geral, maior e com um contingente médio de alunos inferior, pode,

de alguma forma, expressar esta ascensão. Deste modo, tal diferença pode adquirir sentido de

ascensão. Chamamos a atenção que não estamos falando em ascensão salarial. Os níveis

salariais para o ensino público estadual e para seus equivalentes nos municípios do estado têm

se aproximando muito. O impacto salarial se reflete, mormente nas escolas privadas. Nestas, é

comum a diferenciação de pagamento para os níveis de ensino e, em alguns casos, para as

séries. Quanto maior o nível ou a série em que os docentes trabalham, maior o salário pago.

Chega a haver no âmbito de algumas dessas escolas uma separação entre a “equipe de

professores do ensino médio” e “a equipe de professores de ensino fundamental”. Quanto à

este último, o ensino fundamental, já verificamos que a conjuntura favoreceu sua expansão e

que esta também possibilitou o desenvolvimento de estratégias variadas para as

administrações pouparem concursos públicos e ampliarem seus quadros funcionais com

docentes. Muitos assumem, como já discutido, duplas matrículas que podem ser somadas a

duplas regências, tornando os professores exclusivos (25 sujeitos) sem lhes dar um regime de

dedicação exclusiva que aponte para um equilíbrio entre a dedicação e as condições de

trabalho e sobrevivência. Tal estratégia também é empregada no âmbito da rede estadual, com

impactos semelhantes.

Se antes tocamos no aspecto da diferença e da hierarquia entre os níveis fundamental e

médio, esta também pode se fazer presente para o nível superior. No caso, vinte e um (21)

professores têm como maior nível de atuação o superior. A própria denominação já sugere a

hierarquia. Sem querer reforçá-la, vamos atentar que os docentes trabalham no ensino
134

universitário. O contingente encontrado indica algo que, a princípio, parece pouco

significativo, mas traz uma conseqüência evidente: para os maiores níveis de atuação

correspondentes aos ensinos fundamental e universitário, as quantidades obtidas, para o total

dos sujeitos, aproximam-se (Gráfico 15). Todavia, se levarmos em conta que as maiores

atuações no ensino fundamental são exclusivas, no âmbito universitário somente existe

exclusividade para oito (08) dos sujeitos. Desta forma, treze (13) possuem alguma forma de

atuação no ensino básico. Alguns, aliam na mesma instituição, professores de colégios ou

institutos universitários, sua atuação em diferentes níveis. Outros atuam em instituições

diferentes, sem nenhuma integração ou articulação entre as abordagens e temáticas utilizadas.

Fundamental
27%
Universitário
23%

Médio
50%

Gráfico 15 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo o maior nível de ensino em


que atuam.

Essas diferenças outra vez podem apontar desigualdades e hierarquias. Dentro das

universidades, mesmo as que possuem planos de carreira/salariais idênticos, ainda é notório o

desprestígio sobre a inserção de professores de institutos e colégios de aplicação, que atuam

na interface do ensino básico e superior, nas práticas de pesquisa e extensão, entre seus

congêneres pertencentes a outras unidades universitárias responsáveis pelos cursos de

Graduação e de Pós-graduação. Aqui estamos retratando que existem, ainda hoje, estruturas
135

hierárquicas que se constituem concreta e simbolicamente, entravando a possibilidade do

conhecimento se enredar sem que se leve em conta estas estruturas. O cenário em questão nos

remete, inclusive, à problemática em torno do debate sobre a formação do professor-

pesquisador. Como critica Giovani (1998),

legítima, até agora, tem sido considerada a pesquisa acadêmica tradicional,


que se origina na academia, a partir de interesses e prioridades do
pesquisador para a coleta de dados, a descrição da realidade, a análise de
problemas, o estudo teórico e a proposição de soluções. No máximo, do
ponto de vista da aproximação ao universo da escola, considera-se relevante
o trabalho do pesquisador como consultor, especialista convidado ou
contratado, especialmente se o trabalho faz parte formal da estrutura interna
da universidade, como um centro, um instituto etc.

Em contraposição a essa lógica, na última década, tem se dado grande importância à

desmistificação da pesquisa como algo ao alcance apenas de alguns eleitos, de preferência

situados no “topo” da universidade. A defesa da formação do professor que articule teoria e

prática pedagógica, pesquisa e ensino, reflexão e ação didática vem sendo feita, até mesmo,

na universidade. A valorização da pesquisa em detrimento do ensino (em seus diferentes

níveis) no meio acadêmico tem trazido prejuízos enormes à formação profissional, e

particularmente, à formação de professores. Esta discussão perpassa pelo entendimento da

natureza do saber escolar como próprio da cultura, como criação didática original. O saber

escolar possui, então, identidade particular e não se constitui em um saber derivado e

transposto, inferiorizado em relação ao saber científico. Por outro lado, as disciplinas

escolares apresentam autonomia em relação às ciências ou aos saberes de referência dos quais

tratam. Assim, a escola não é um mero receptáculo de subprodutos culturais da sociedade,

mas também uma produtora ou criadora de configurações e significações cognitivas,

relacionais e sociais.

Ainda objetivando relacionar tempos-espaços de trajetórias dos docentes investigados

optamos por cruzar as informações relativas ao seu maior nível de ensino com seus tempos de
136

magistério (Gráfico 16). O Gráfico em questão possibilita que tenhamos a distribuição

percentual dos sujeitos em função de seu tempo de docência em anos, de acordo com o seu

maior nível de atuação no magistério. Podemos verificar como as faixas de tempo de

magistério impactam e são impactadas em função das maiores inserções dos professores, para

cada um dos níveis (Universitário, Médio e Fundamental). Esta associação talvez permita

constatar outros indícios em relação à hierarquia anteriormente aventada para os níveis de

ensino abordados.

Verificamos que neste cruzamento de tempos-espaços há uma distribuição bastante

assemelhada entre os níveis fundamental e médio, para os que se encontram nos primeiros 20

anos de carreira, entre os sujeitos desta investigação. Um ligeiro desequilíbrio sem faz

presente entre as faixas relativas a estes níveis para além dos 20 anos de magistério. Este

desequilíbrio aumenta, principalmente, nos últimos anos, o que evidencia uma inserção dos

sujeitos que atuam no ensino fundamental em outros níveis de ensino.

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Universitário Médio Fundamental

Até 5 anos 6-10 anos 11-15 anos 16-20 anos 21-25 anos 26-30 anos Acima de 30

Gráfico 16 - Distribuição percentual dos sujeitos, por tempo de exercício no magistério,


em anos, segundo maior nível de ensino em que atuam.
137

Já aventamos algumas das possibilidades que podem influenciar na mobilidade e

participação dos professores em diferentes níveis de ensino. Esta situação ocorre, mormente,

quando os mesmos buscam migrar de níveis menos prestigiados socialmente para os maiores,

ou ampliar sua participação nestes últimos, sem abandonar aquele no qual esta inserido. Para

isso, levam em conta a qualificação, os salários, o número de alunos e turmas, a autonomia, a

localização e as condições do ambiente de trabalho, entre outros aspectos. Esta mobilidade

parece ficar evidente se observamos como, no nível universitário, para o grupo em questão, a

maioria das inserções é efetivada a partir dos sujeitos com mais de 16 anos de magistério.

Sem desconsiderar que a exclusividade, mesmo para os que atuam no nível universitário, não

é uma característica marcante, o tempo de magistério parece influir, significativamente, para a

entrada dos sujeitos neste nível. A faixa de tempo de magistério para o nível universitário que

compreende o maior contingente de sujeitos, corresponde aos que possuem de 16 a 20 anos de

magistério. No nível de ensino universitário verificamos duas outras situações que merecem

alguma inferência. A primeira, diz respeito à não incidência de sujeitos na faixa de 26 a 30

anos de magistério. Esta situação parece refletir o momento de aposentadorias ocorrido nas

universidades brasileiras, principalmente na década de 1990, em função das mudanças nas

regras de aposentadoria, atingindo setores do funcionalismo público e, em particular, os

docentes. Este pode ser um indício que aponte a razão de não termos encontrado professores

nesta faixa, atuando no Ensino Superior. Por outro lado, aqueles que se aposentaram, alguns

deles inclusive em plenas condições de manutenção de continuidade da sua produção

acadêmica, podem ter regressado, sob outros regimes de trabalho ou não, em instituições

públicas ou privadas, atuando no nível universitário. À esta outra situação, acopla-se o

contexto de que nem todos os docentes solicitaram suas aposentadorias e continuaram

também atuando, no nível superior, até o momento pesquisado. Esta circunstância parece não

se refletir em relação ao ensino básico. Aqui inferimos que o desgaste e as condições de


138

inserção e produção dos professores atuam de forma diversa as existentes no ensino superior,

ou seja, as possibilidades de valorização profissional podem não crescer com a continuidade

do tempo de trabalho no ensino básico e mesmo, depois de conquistado o tempo necessário

para aposentadoria, contrariamente ao cenário e às perspectivas de produção acadêmica e de

condições materiais predominantes no nível universitário.

Outro elemento importante a ressaltar, é que o tempo de trabalho efetivo, para fins de

aposentadoria no magistério, para homens e mulheres que atuam na educação básica, é

diferenciado (para as mulheres são exigidos 25 anos de magistério e para os homens 30 anos).

Com isso, supomos ser coerente que após os 25 anos nos ensinos fundamental e médio,

tenhamos a diminuição da participação feminina. Deste modo, até os 25 anos, para ambos os

níveis do ensino básico, temos a presença de homens e mulheres, professores e professoras,

exercendo de forma ativa a profissão docente.

Em relação ao grupo de docentes investigados, há um equilíbrio na distribuição entre

sujeitos do gênero masculino e do feminino (são ao todo 44 professores e 47 professoras). O

Gráfico 17 demonstra a distribuição destes sujeitos, segundo gênero, para o maior nível de

ensino em que atuam.

O Gráfico espelha uma distribuição que configura uma tendência a inserção

hierarquizada e diferenciada entre os gêneros. Esta tendência tem impactos diretos nas

condições de sobrevivência e qualidade de trabalho dos professores. Embora possa ser

relativizada, em função da atuação não exclusiva ser marcante para os sujeitos desta pesquisa,

parece haver um desequilíbrio no acesso aos níveis mais elevados de ensino, privilegiando os

sujeitos do sexo masculino.


139

100%
90%
8
80% 21
70% 18
60%
Feminino
50%
Masculino
40%
13
30% 24
20% 7
10%
0%
Universitário Médio Fundamental

Gráfico 17 - Distribuição dos sujeitos, por maior nível de atuação, segundo gênero
masculino ou feminino.

Esse desequilíbrio se faz notar, principalmente pela incidência do gênero feminino,

como mais do dobro de ocorrências em relação ao masculino, atuando, exclusivamente, no

Ensino Fundamental. A partir deste, a incidência dos sujeitos do sexo masculino se amplia e

ultrapassa a do feminino. No nível de Ensino Médio, em relação aos professores e professoras

pesquisados, há pouca diferença de valores, mas começa a configura-se uma tendência inversa

ao registrado no Ensino Fundamental. Esta se ampliará um pouco mais no Ensino

Universitário77. Entendendo que os cruzamentos entre os ensinos médio e fundamental, foram

77
Dados oriundos do INEP (2001) apontam que no Brasil, no Ensino Superior, das 219.947 funções docentes
registradas, 127.238 são realizadas por sujeitos do sexo masculino e 92.709 do sexo feminino. Tal tendência se
confirma na Região Sudeste do país que possui 113.647 docentes atuando no nível superior. Deste 67.809 são
homens e 45.838 são mulheres. Para o Estado do Rio de Janeiro os números se apontam a mesma dinâmica. São
16.402 docentes do sexo masculino e 11.276 do sexo feminino, totalizando 27.678 docentes atuando no nível
superior. Apesar da Sinopse da Educação Básica (2002) não fornecer informações relativas à distribuição dos
professores quanto ao gênero, para os níveis de ensino Fundamental e Médio, julgamos necessário observar que
alguns autores nos fornecem indícios sobre a inserção de professoras no ensino básico. Em relação à profissão do
magistério fundamental e sua vinculação ao gênero feminino, Ramos (2002) advoga que esta somente se dará a
partir do final do século XIX e início do século XX. Baseada em Hypólito (1997), Ramos analisa o processo de
feminização do magistério, inserido no contexto do ingresso da mulher no mercado de trabalho capitalista. Apple
(1989, p.62) é outro autor que será levado em consideração por Ramos, na análise da inserção da mulher no
mundo do trabalho, na medida em que afirma que “[...] existem dois tipos de divisão de trabalho: a divisão
vertical do trabalho, na qual a mulher está hierarquicamente em desvantagem em relação aos homens, ocupando
os cargos de menor poder e prestígio dentro de um mesmo ramo de atividade; e a divisão horizontal do trabalho,
na qual ficam reservados às mulheres os mesmos ramos e tipos de atividade que apresentam menores salários e
menor prestígio.”. A distribuição encontrada entre os sujeitos deste trabalho, tende a conformar uma gradação ou
140

os que mais computaram a presença de docentes, e sugerindo que não percamos os contextos

de sobrecarga de trabalho, as professoras constituiriam o grupo mais sujeito a mesma. O que

não quer dizer que os docentes do gênero masculino, enquanto trabalhadores da educação, não

estejam sujeitos as mesmas influências existentes no contexto de condições de trabalho dos

professores como um todo.

A tendência que apresentamos em relação à permanência dos professores e professoras

no exercício do magistério pode sofrer variações. Em relação aos sujeitos em questão, esta

parece ser a situação (Gráfico 18).

100%
Acima de 30
26-30 anos
80%
21-25 anos
16-20 anos
60%
11-15 anos
6-10 anos
40%
0-5 anos

20%

0%
Feminino Masculino

Gráfico 18 - Distribuição percentual dos sujeitos, por tempo de exercício de magistério,


segundo gênero masculino ou feminino.

Encontramos, atuando nos diferentes níveis de ensino, após os 25 anos de magistério,

mais mulheres que homens. Entre os docentes que possuem mais de trinta (30) anos de

magistério, existem duas mulheres que atuam em estabelecimentos de ensino privado e um

homem que se encontra em instituição de ensino médio pública. Acreditamos que se confirme

hierarquia onde os sujeitos do gênero masculino ocupam, em maior proporção, os níveis mais elevados e
prestigiados de ensino na profissão docente. Deste modo, nos aproximamos do contexto analisado por Apple
(1989), Hypólito (1997) e Ramos (2002) em relação à inserção das mulheres na profissão do magistério.
141

a discussão anterior, de que as condições de docência em níveis mais elevados do magistério

e, em particular, no nível superior atuam de forma atrativa aos profissionais que já se

aposentaram ou poderiam fazê-lo.

Na faixa de 26 a 30 anos de magistério, labutando nos níveis do ensino básico, a

maioria dos sujeitos encontrados também é composta de mulheres. Quatro (4) dão aulas no

ensino público, três (3) no privado e duas (2) dessas trabalham em ambos. Os homens,

somente dois, encontram-se trabalhando nos ensinos público e privado. Estes, levando em

conta somente o magistério, ainda não completaram seus tempos necessários para

aposentadoria. Como averiguamos, a diminuição da presença das mulheres não ocorre.

Muitos professores e professoras, na combinação de matrículas e possibilidades de melhoria

de remuneração e qualidade de vida, completam seu(s) tempo(s) de magistério em algum(ns)

âmbito(s) e continuam a trabalhar para ampliar a sua renda ou completar seu(s) tempo(s) de

serviço em outro(s) âmbito(s). Mais uma vez, apontamos para a existência de um sobre-

trabalho que afeta, indistintamente a homens e mulheres, baseado na insuficiência das

condições materiais, e os leva continuar a exercer a profissão mesmo quando já alcançaram o

tempo necessário para aposentar-se. Ainda em relação ao Gráfico 18, ressaltamos o grupo

feminino que se encontra na faixa de 10 a 15 anos de magistério, ao dar sua contribuição,

principalmente, ao ensino fundamental e, outro grupo, relacionado aos sujeitos do sexo

masculino, pertencentes a faixa de 16 a 20 anos de magistério, que possui atuação de destaque

em relação ao ensino universitário.

Compete, por fim, assinalar que dos noventa e um (91) pesquisados, quarenta e dois

(42) fizeram algum tipo de pós-graduação. Todos os vinte e um (21) professores

universitários o fizeram. Dezesseis (16) dos que atuam no ensino médio possuem pós-

graduação e somente cinco (5) dos que atuam no ensino fundamental concluíram pelo menos

um curso de pós-graduação (Gráfico 19).


142

12%

Universitário
Médio
38% 50% Fundamental

Gráfico 19 - Distribuição percentual dos sujeitos pós-graduados, segundo nível de


ensino.

Essa distribuição corrobora a existência de uma hierarquia. Em um dos níveis (o

universitário) a necessidade da Pós-graduação se faz presente como uma exigência. Nos

outros níveis, vem se ampliando, de forma lenta e gradual, refletindo sobre o desempenho

profissional e sobre os planos salariais e de carreira, fazendo parte tanto das reivindicações

dos trabalhadores, quanto vem sendo incorporada pelos agentes do mercado, visando

selecionar profissionais mais qualificados ou titulados. Os mesmos passam a fazer parte das

“equipes” que servem como instrumento de propaganda das instituições para atraírem alunos

(clientes) ou para conseguir apoio das agências de financiamento governamentais e não-

governamentais para seus projetos. A titulação acadêmica diferencia inclusive nas disputas

dos docentes em concursos públicos e privados, ao convir como um instrumento de colocação

e garantia de emprego. Em relação aos sujeitos deste trabalho, podemos constatar que quase a

metade dos mesmos fez alguma Pós-graduação, o que demonstra uma busca, uma procura

pela qualificação e titulação apesar das situações de sobrecarga de trabalho já indiciadas. Os

professores procuram caminhos para melhorar seu desempenho profissional, ampliando suas

perspectivas de trabalho, de ascensão, de participação em diferentes tempos-espaços, de

enfrentamento, compreensão e articulação com as demandas já existentes a com aquelas que

passam a se apresentar. Como alerta Gimeno (1991, p.87):

A atuação do professor não consiste em solucionar problemas como se


fossem nós cegos que, uma vez solucionados, desaparecem... o cerne do
143

processo educativo reside na escolha de modelos de desenvolvimento


humano, na opção entre diversas respostas face às características dos grupos
e aos contextos sociais: o professor é um gestor de dilemas.

Ao levantarmos informações relativas à formação, ligadas aos espaços-tempos

envolvidos na mesma, bem como dos tempos de magistério, locais de trabalho, esferas e

níveis de atuação profissional e outros elementos necessários a uma caracterização preliminar

dos sujeitos, avaliamos ter indícios que nos servirão no entendimento das relações mantidas

pelos mesmos na consecução de suas práticas pedagógicas. A partir da década de 1980 a

Geografia brasileira passou a interpretar e atuar criticamente sobre a compreensão das

realidades mundial e brasileira. Estes são os momentos nos quais a maioria dos pesquisados se

inserem academicamente no seio deste campo de saber. A crítica às desigualdades e aos

desequilíbrios sócio-ambientais, à incompletude da cidadania e aos processos derivados do

neoliberalismo e da Globalização é vivenciada pelos professores de Geografia. Como

pudemos constatar, enquanto docentes e trabalhadores, estes sujeitos são vítimas de uma série

de decorrências das regras e normas político-econômicas que se estabeleceram em nosso país.

Em paralelo, desenvolvem táticas e práticas que lhes asseguram a sobrevivência no mercado

de trabalho. Nele e para além dele, em alguns ocasiões, conseguem trocar experiências com

seus pares em encontros e congressos. Em outros momentos, nos espaços escolares,

convivendo com burocracias e hierarquias, chegam-se ao conjunto variado de outros pares,

comungando angústias e projetos. Alguns, neste caso, não poucos, investem na qualificação

profissional, na busca por melhores remunerações e na garantia de seus diretos como

trabalhadores e cidadãos. Podem até conjugar atividades extra-magistério para melhoria da

qualidade de vida, mas, pelo que pudemos constatar, continuam apostando e investindo na

educação e na Geografia como formas de atuação profissional e cidadã.

Espelhados no aprimoramento da atuação profissional e no fazimento da cidadania,

entendemos que a relação que passaremos a investigar em maior profundidade, entre


144

professores de Geografia e Educação Ambiental, irradia-se como a absorção de uma

novidade. A mesma é um processo lento e que se faz nas relações sociais integrando história e

cultura, levando em consideração a pertença a diferentes grupos, complexos e plurais.

Igualmente, envolve o acesso a diferentes informações, canais de troca e sentidos, nem

sempre concordantes. Ao fim e ao cabo, a novidade é absorvida não da forma como foi

passada, transmitida. Ao recebe-la o outro, filtra a novidade a partir das idéias e valores que

possui, das experiências que vive e das vivências culturais nas quais se insere, influindo nas

condutas e práticas a serem objetivadas.

CAPÍTULO 4: SOBRE OS DOCENTES DE GEOGRAFIA E SUAS REDES DE


TRILHAS E CAMINHOS NOS SENTIDOS PARA A EA.

Os sentidos atribuídos aos fenômenos e processos sociais são polissêmicos e não

possuem uma clareza absoluta e determinada, garantindo uma variedade de pensamentos,

ações e condutas baseados em valores diferenciados. Com isto, criam-se redes emaranhadas

de significações sobre tais processos e objetos que ora enlaçam as ações, produzindo

solidariedades orgânicas, ora resultam em contextos contraditórios que dificultam o

entendimento dos mesmos processos, gerando conflitos e frustrações. Ambos, solidariedade e

contradição são sínteses provisórias na criação e atribuição dos sentidos. Tais sentidos são

conjugados às informações recebidas ao longo da vida, as quais, por sua vez, vão sendo

deslocadas para que os novos conhecimentos apropriados possam ser articulados aos

conhecimentos já existentes, naturalizando sua incorporação. Ao mesmo tempo, outros

sentidos, permanentemente, dão a ligadura a este emaranhado de informações,

conhecimentos, necessidades e demandas fundamentados nos valores que são vivenciados e

compartilhados pelos diferentes sujeitos. Os sentidos e as condutas constituem objetivações e

ancoragens e, conforme já mencionamos (Capítulo 1 – item 1.6), visamos captar como isto se

dá com professores e professoras de Geografia, em relação à EA. Que aproximações, que


145

derivações e que deslocamentos de conceitos e noções são veiculados no intento da prática

educativa ambiental. As posturas dos sujeitos a respeito das informações, conhecimentos e

demandas não são feitas fora deste contexto que busca torna-los familiares e inseri-los nas

discussões circulantes em seus cotidianos. Da mesma forma, não se fazem desvinculadas dos

valores que são produzidos e reproduzidos, socialmente, por tais sujeitos, nos diferentes

cotidianos.

Desse modo, nesta etapa do trabalho interessa-nos estabelecer relações entre os

sujeitos envolvidos na pesquisa e os aspectos apresentados pelos mesmos a respeito da

Educação Ambiental. Diversos questionamentos foram propostos para os professores

pesquisados. Busca-se apreender não somente aspectos específicos de suas inserções,

enquanto professores de Geografia, como possíveis responsáveis por um saber disciplinar

fragmentado. Indo além, entendendo estes docentes a partir de contextos variados e

respondendo a demandas que se ampliam e se tornam mais complexas, procuramos, via

entendimento da relação entre seu campo de saber e a EA, captar como as práticas

incorporadas ou não, desenvolvidas ou não em seus espaços-tempos-relações são

potencializadas ou não, em instituições nas quais estão inseridos. Todas estas observações não

desconsideram que aquilo que os professores propõem ou falam não são impressões de

indivíduos isolados. As indicações e falas são feitas no social e só se fazem nas relações com

o outro. O que faremos, a partir das impressões e falas dos docentes, é buscar indícios e pistas

que ora os aproximem, ora os distanciem, entendendo a dialogicidade e a complementaridade

dos sentidos que os mesmos atribuem a Educação Ambiental, a partir da sua condição de

professores de Geografia.

Também nos importou saber se, em relação à EA, existem ações dos professores fora

de suas instituições. Seguindo o mesmo escopo, procuramos perceber, através de indícios,

advindos da leitura exaustiva do material de pesquisa, como os projetos relativos à temática


146

em questão são, a partir do ressentimento dos docentes, apreendidos pelos seus alunos e até

por outros sujeitos do ambiente escolar. Esta conjuntura emaranhada acaba por envolver não

somente os diretamente pesquisados, mas espelha a forma como os mesmos se posicionam em

relação às ações e às inações de alguns de seus pares no cotidiano escolar. Não que

admitamos que as posturas destes docentes se restrinjam ao contexto das instituições de

ensino onde atuam, ou sejam unicamente constituídas por suas atuações como professores.

Deste modo, caminhamos, sem perder a compreensão de que as práticas e sentidos atribuídos

à EA pelos professores, também se associam aos momentos acumulados e vividos pelos

mesmos e, às interações advindas dessas experiências de vida nos espaços escolares e fora

deles. Isto pode, por exemplo, ocorrer em cursos de pós-graduação ou em Organizações Não

Governamentais (ONGs) das quais participem ou tenham participado.

Logo de início, ficamos instigados em saber que relações os professores possuem com

a EA, o que pensam sobre a mesma, que discursos produzem ao se defrontarem com a

questão, que práticas sugerem na aproximação Geografia-EA. Um questionamento simples

permitiu-nos levantar algumas pistas a serem analisadas. Este questionamento centrou-se em

demandar aos sujeitos que explicitassem o para que da Educação Ambiental nos dias de

hoje.

A leitura intensiva, atenta e saturante das respostas obtidas junto aos professores

permitiu-nos aglutinar, em três entendimentos, os emaranhados e as nuanças verificadas a

respeito da utilidade da EA na atualidade (Gráfico 20).


147

4% 10%

48% 38%

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma crítica

Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral

Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não


degradação por ações no particular e no mundo
Não respondeu

Gráfico 20 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo posicionamentos a respeito da


finalidade da Educação Ambiental nos dias de hoje.

Um primeiro grupo de professores atribui que a EA serve Para integrar novos

significados às práticas sociais, ampliando-as de uma forma crítica. Este grupo, minoritário,

teceu em sua alegação uma perspectiva mais complexa para a EA, fugindo ao discurso geral,

sem produzir, nesta apreciação inicial, uma ruptura entre o “natural” e o “social”. Embora o

grupo seja pequeno (10% dos sujeitos), a relevância dos aspectos aventados pelos mesmos,

para a Educação Ambiental, acaba por revelar uma complexidade que justifica a importância

da própria prática educativa ambiental para o contexto social. Estes aspectos incluem as

práticas sociais, as subjetividades, as ações cotidianas, a percepção ambiental e a superação

do binômio sociedade-natureza, para além do espaço escolar, como marcas comuns na

respostas evidenciadas. Partindo de indícios que permitem aproximações entre alguns


148

sujeitos, sem desconsiderar que existem nuanças que os diferenciam, pudemos constituir e

destacar textos comuns a este grupo78, a respeito da finalidade da EA:

Inseparável de uma concepção mais ampla do processo educacional como


um todo, a EA cumpre o papel de agregar um significado mais claro às
práticas sociais, no que diz respeito à relação sociedade/natureza/sociedade,
como um círculo virtuoso. A EA tem o valor, ainda, de permitir uma
abertura sobre os vários tipos de sustentabilidades, questionando-se os
modelos atuais de desenvolvimento (Questionário 1). Serve para construir
uma percepção ampliada do conceito de ambiente que não se limite ao
tradicional binômio sociedade-natureza mas que incorpore outras dimensões
da vida, inclusive as subjetivas (Questionário 5). A Educação Ambiental
atualmente é importante para que diferentes segmentos da sociedade possam
ter melhor conhecimento acerca das relações e formas que se estabelecem no
processo de apropriação do meio ambiente; exercer a cidadania e estimular a
participação comunitária na busca de soluções e de ações implantadas para a
melhoria da qualidade ambiental; desenvolver a percepção ambiental como
forma de identificar problemas no espaço vivido e participar ativamente das
discussões acerca das referidas soluções e ações (Questionário 77).

Para um segundo agrupamento, não totalmente homogêneo, mas que se pautou,

principalmente por vislumbrar na EA uma prática educativa que se ofereceria Para a

cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, encontramos um número maior de

sujeitos (38,4%). Não obstante os princípios apresentados sejam amplamente associáveis a

EA, as argumentações desenvolvidas são colocadas em discurso generalizado, no qual a

idealização norteia alguns pensamentos, absolutizando-os sem concretiza-los. Aproximando

os textos pelos quais os sujeitos procuravam esclarecer seus posicionamentos sobre esta

temática, teríamos o seguinte arrazoado:

A educação ambiental que é uma educação crítica da realidade vivenciada,


serve como um instrumento de formação da cidadania e de transformação de
valores e atitudes através da construção de novos hábitos e conhecimentos.
A EA é também criadora de uma ética conscientizadora para as relações
entre ser humano/sociedade/natureza (Questionário 4). [A educação
ambiental serve] Para promover uma conscientização geral de mudanças de
hábitos e costumes, do homem com o meio em que vive (Questionário 10).
Para a consolidação da cidadania. Os modernos conceitos de cidadania
compreendem a “responsabilidade e participação” logo ela é fundamental na

78
Por entendermos que se tratam de sentidos constituídos e enredados pela relação ensino de Geografia-EA,
tomamos por bem não separar as frases e impressões dos sujeitos em relação aos temas e respostas obtidas nos
questionários.
149

construção do cidadão (Questionário 24). Para construir consciências,


comportamentos e atitudes de cidadania (Questionário 36).

Esse grupo também apresenta, a tendência de abordar a EA como uma grande saída ou

solução de conscientização para questões da sociedade e da educação. Posiciona-se de forma

difusa a respeito de temas, tais como, a sobrevivência dos diferentes seres no meio vivido,

chegando a associar tal fato à conservação ou à preservação dos recursos ambientais, voltadas

para a melhoria da vida.

A EA se propõe a uma ação educativa que envolve transformação de valores


e práticas para uma reelaboração da relação homem (enquanto ser social que
vive no coletivo) e a natureza visando melhor eficácia das estratégias
conservacionistas e de melhor aproveitamento dos recursos naturais
(Questionário 13). A nível do ensino fundamental, principalmente, sendo
trabalhada tanto na teoria quanto na prática, [a EA] serve para buscar
maiores reflexões a respeito da necessidade de preservação da natureza,
enquanto melhoria da qualidade de vida e até mesmo como questão de
sobrevivência da humanidade (Questionário 42). Para melhorar as condições
do Meio Ambiente e portanto a qualidade de vida a partir da conscientização
das pessoas/construção da cidadania (Questionário 67).

O terceiro grupo também se identifica com a postura que considera a EA um

instrumento de conscientização. O diferencial para o mesmo está baseado no fato destes

professores concentrarem a justificativa para a EA em argumentos que se preocupam com a

preservação, a conservação, o respeito à natureza e às práticas sustentáveis, como finalidades

últimas. Este caminho traduz-se numa Educação Ambiental voltada Para conscientizar a

população e os alunos da importância da conservação, preservação e não degradação, por

ações no particular e no mundo. Entenda-se que na verdade, as ações no particular e no

mundo refletem um discurso muito próprio da Geografia, centrado na visão escalar dos

fenômenos. Os docentes que foram agrupados nesta perspectiva apontam como finalidade da

EA:

Conscientizar a população da importância da preservação ambiental


(Questionário 3). [...] conscientização dos alunos em relação à dinâmica da
natureza e a atuação do homem junto à esta, no sentido da preservação e do
uso racional dos recursos naturais (Questionário 11). Para a conscientização
dos alunos a cerca dos problemas causados pelo homem ao longo do tempo.
150

É também um alerta para a conservação da natureza (Questionário 15). Num


mundo cada vez mais globalizado, a EA deve ser usada para passar a idéia
de que a poluição da rua, do bairro, do rio que corta a cidade etc, pode trazer
conseqüências cada vez mais amplas, mais planetárias (Questionário 19).
Informar sobre, entre outros, qualidade de vida. Em relação à conservação de
recursos naturais e desenvolvimento sustentável e ao ambiente que
moramos, trabalhamos, circulamos (Questionário 65).

O grupo também apresenta algumas nuanças, mas a importância da natureza, da

proteção da vida, da conservação para o futuro como centro para conscientização é o seu

amálgama. Deste modo, nas contexturas dos sujeitos, a EA é desenvolvida:

Sistematicamente, para que as pessoas percebam que a preservação


ambiental é a preservação da própria vida (Questionário 20). Para
conscientizar a criança sobre a importância da natureza na vida dos seres
humanos (Questionário 37). [...] para conscientizar a população da
necessidade de se conservar o meio ambiente, para que as futuras gerações
não sofram as conseqüências (Questionário 81).

Em nosso entendimento, os sujeitos tendem a atribuir à população e aos alunos uma

negatividade que lhes retira o atributo atual de consciência. Tal situação, ao mesmo tempo,

focaliza a positividade na preservação, na não-degradação e na capacidade do docente de

conscientizar os outros e, a negatividade na população e nos alunos, como se estes grupos

fossem compostos por sujeitos cujas práticas não levam em conta tais aspectos.

Cabe registrar, que dos noventa e um (91) pesquisados, somente quatro (4) não

responderam a questão em tela. Este fato nos possibilitou utilizar a mesma como uma das

balizadoras de nosso trabalho, na medida em que permitiu aos docentes, um posicionamento

inicial bastante aberto, viabilizando também constatar aproximações e distanciamentos nas

posições apresentadas.

Em continuidade, igualmente, instamos os professores a responder sobre a relação

entre o ensino da Geografia e a EA. Todos indicaram que vêem relação entre os mesmos e,

quase todos apontaram como importante associar o ensino da Geografia à prática educativa

ambiental (Tabela 3).


151

Tabela 3 - Posicionamento dos sujeitos quanto à importância de associar o ensino da


Geografia à prática educativa ambiental.

Posicionamento dos sujeitos N %


Sim 87 95.6
Não/ Não respondeu 4 4.4
Total 91 100.0

Podemos afirmar que a Educação Ambiental é associada ao ensino da Geografia com

um nível de aceitação elevado. Mas, estas respostas ainda não nos permitem apontar que tipo

de relação é estabelecida pelos professores para que tal importância se concretize. A

característica aportada pela EA pode, neste sentido, ser comparada àquela que já averiguamos,

aos tratarmos do Desenvolvimento Sustentável (Capítulo 1 – item 1.2). Visto, por muitos,

como uma grande solução para a crise do padrão de desenvolvimento contemporâneo, tomado

como uma grande saída para a sociedade atual, pode também estar escamoteando formas e

práticas que, simplesmente, perpetuem e dêem uma nova maquiagem aos processos

econômicos e culturais hegemônicos. Deste modo, escondem os desequilíbrios sócio-

ambientais causadores das desigualdades e da pobreza delas decorrente.

Para ultrapassarmos os riscos da constatação absolutizada e reificada da associação

entre a EA e o ensino de Geografia, passamos a investigar, como o grupo de docentes

explicita esta associação. A riqueza das respostas apresentadas possibilitou a confecção do

Gráfico 21. Outrossim, nos preocupou captar nuanças advindas das respostas obtidas. Este

caminho não diferencia totalmente os sujeitos, nem os torna homogêneos pelas suas

aproximações. A grande maioria justificou como entende a possibilidade de relacionar EA e

ensino de Geografia e, somente seis (6) dos pesquisados fugiram à questão.


152

4% 7% 12%
4%
4%
2%

27%

22%

18%
Pela consideração dos significados do Meio Ambiente
Pela consideração do Espaço Geográfico
Pela consideração da relação homem/meio e sociedade/natureza
Pelo base teórica da Geografia e seus procedimentos
Pela articulação necessária entre conceitos e cidadania
Pela consideração dos elementos da natureza
Pela consideração da utilização da natureza pelo homem
Pela consideração da sustentabilidade
Fugiu à questão

Gráfico 21: Distribuição percentual dos sujeitos, segundo justificativas apresentadas


para a relação entre o ensino da Geografia e a Educação Ambiental.

A influência de um conceito chave para a Geografia, o conceito de Espaço

Geográfico, é marcante nas respostas advindas. A consideração, a construção, a utilização, o

destaque, o entendimento e a articulação deste conceito, visto, por alguns, como objeto da

Geografia, serviria, como base para o estabelecimento da relação entre o seu ensino e a EA.

Desta forma, o conceito de Espaço Geográfico, tão discutido, seja na formação no ensino

básico, seja nos Mestrados e Doutorados, é o balizador das relações para muitos dos sujeitos

pesquisados.

Em alguns registros, os professores incluem a EA na Geografia através do espaço, na

verdade, parecem ai incluir todas as relações sociais. Para outros, o espaço é o ponto de

intercessão entre EA e Geografia. Através dele se daria o contato com o meio ambiente ou

com as questões ambientais. Encontramos também, os que expressam que seria impossível

entender o espaço sem esta associação. Deste modo, o caminho possui nuanças, ora alargando
153

o significado e a utilização do conceito de Espaço Geográfico, ora estreitando-o e tornando-o

dependente de outros aspectos.

A geografia tem um papel fundamental na discussão sobre EA uma vez que


trabalha com o espaço geográfico (Questionário 7). A construção do espaço
geográfico não pode ser desconectado do entendimento das dinâmicas
ambientais (Questionário 9). Considerando que o objeto da Geografia (o
espaço) leva em conta a relação homem/natureza, tal associação é
indiscutível (Questionário 13). A educação ambiental trabalha com o espaço
e a comunidade e a Geografia também tem seu enfoque no espaço
(Questionário 31). Não existe espaço geográfico sem preservação ambiental
(Questionário 48). Não poderemos ensinar espaço, sem trazer os
conhecimentos de seu meio de sobrevivência (Questionário 50). O espaço
geográfico compõe todas as relações sociais e a integração/atuação com o
ambiente (Questionário 59). O ambiente está inserido no espaço geográfico,
portanto parece-me clara a necessidade de EA para que o aluno compreenda
as interações e conseqüências dos fatos ambientais que o atingem direta ou
indiretamente (Questionário 76).

Não se faz somente por esse caminho o papel da Geografia na possível associação com

a EA. Outros aspectos foram aludidos pelos docentes, permitindo um segundo agrupamento

que aponta para a constituição da relação EA-Geografia através da Base teórica da Geografia

e seus procedimentos. Integram esta categoria argumentações centradas em pensamentos

voltados para a Geografia, como uma fundamentação e abordagem, possuidora de princípios,

conteúdos e instrumentos que permitem ampla articulação, seja com a EA, seja com temas

afins, ou, de forma mais específica, com preocupações com a Terra, a sociedade e o lugar, no

qual o meio ambiente está inserido. O emaranhado de aspectos indicados pelos professores

nos permitiu a seguinte aproximação:

Pela própria história do pensamento geográfico e a natureza do que tem sido


reconhecido como seu objeto, a relação é estreita (Questionário 5). Os
conceitos e princípios geográficos são instrumentos poderosos de
compreensão da realidade e da relação entre sociedade e natureza
(Questionário 32). O conteúdo da geografia, independente da série, estimula
um trabalho com Educação Ambiental. Em especial na 5ª série, que a
“temática” cai como “uma luva”! (Questionário 44). A geografia aborda
diversas questões como cidadania e cultura, que a meu ver tem forte relação
com a EA (Questionário 65). Eles estão interligados. Não dá para ensinar
geografia sem falar em EA (Questionário 68). A abordagem geográfica (base
conceitual e procedimentos adotados para compreensão do meio ambiente e
das relações sociais no espaço) contribui fundamentando diferentes
propostas voltadas para EA (Questionário 77). Se entendemos o objeto da
154

geografia como uma mediação (relacional), a educação ambiental


desempenhará papel essencial nesta mediação (Questionário 82).

A Geografia e o seu ensino têm, sob a perspectiva da base teórica, tudo que é

necessário para a articulação com a EA. Funcionam como uma mediação relacional. Para

alguns, que integram esta categoria, de forma análoga ao que foi expresso anteriormente em

referência ao Espaço, é também impossível ensinar Geografia sem tratar da EA.

Há ainda, um grupo de professores que se aproxima, integrando uma mesma categoria,

por atribuir à Consideração da relação homem/meio e sociedade/natureza a possibilidade de

associar a Geografia à EA. Estes binômios constituiriam, segundo alguns, o objeto da

Geografia. De acordo com outros, o conhecimento geográfico do planeta contribui para a

conscientização e o estabelecimento da relação homem/natureza. Esta relação, tratada através

dos conceitos geográficos, consubstanciaria o entendimento do meio ambiente. Alguns dos

sujeitos desta pesquisa, de forma mais específica, apontam que a Geografia promoveria a

relação com a EA, através da associação dos conceitos físicos (Geografia Física) à sociedade.

Encontramos também, três outras sub-categorias ou perspectivas: os que vêem a Geografia

como portadora da interface sociedade/natureza, sendo, por isso, fundamental para a EA; os

que vêem a EA como reequilibradora desta relação (sociedade-natureza) analisada pela

Geografia; os que apontam que ambas, Geografia e EA, trabalham a relação dos elementos da

natureza com a sociedade. Ainda em relação a esta categoria, Consideração da relação

homem/meio e sociedade/natureza, podemos apreciar o surgimento da idéia de Geografia

como ciência de síntese, embora, a análise da utilização do ambiente pelo homem seja

proposta em conjunto com outras ciências. Neste caso, o eixo de onde convergiram as

respostas parte da Geografia ou da EA e sempre aponta as relações binomiais sociedade-

natureza, homem-natureza ou homem-meio. Os sujeitos inseridos nesta categoria, urdidos

pelo caráter binomial de suas colocações, podem constituir a seguinte seqüência, com
155

aproximações, diferenças e complementaridades, sobre a forma de relacionar o Ensino da

Geografia e a EA:

[...] A partir do próprio objeto da Geografia: a relação sociedade-natureza


(Questionário 2). A geografia também está voltada para o ensino ambiental,
uma vez que introduz os conceitos físicos e sua relação com a sociedade
(Questionário 6). O objeto de estudo da geografia tem como centralidade a
relação homem-meio (sociedade-natureza) (Questionário 18). A geografia
exerce papel de fundamental importância para a EA, já que nela está a
interface homem (sociedade) e Natureza (Questionário 37). É só pensar na
relação (ou inter) Homem-Meio Ambiente (Questionário 40). A geografia
analisa a relação sociedade/natureza e a EA visa reeqüilibrar esta relação
(Questionário 67). A Geografia, como ciência de síntese atua em conjunto
com outras ciências analisando a questão ambiental associada com a
ocupação humana (Questionário 71).

Num contexto no qual consideramos que a centralidade da Geografia é um indício

para a organização das idéias, destacamos um juízo que afirma ser impossível trabalhar

conceitos básicos, tais como, lugar, sociedade e natureza, sem relaciona-los à cidadania.

A geografia tem um importante papel na formação do cidadão e sua relação


com o meio ambiente (Questionário 16). É impossível pensar conceitos
básicos como: lugar, natureza e sociedade sem relacioná-los à cidadania
(Questionário 24).

Tanto para Geografia quanto para a EA a idéia de cidadania afigura-se com

consistente. Já discutimos, nos capítulos anteriores (itens 1.6, 2.1 e 2.2), como a cidadania

perpassa tanto as discussões atuais da Geografia, como as da Educação Ambiental. As

proposições que estabelecem uma relação necessária entre o ensino da Geografia e a EA

tomam a cidadania como uma dimensão prática que precisa da dimensão teórica dos conceitos

geográficos para sua realização e efetivação através da EA, passando a constituir a seguinte

categoria: Pela articulação necessária entre conceitos e cidadania.

O estudo do material obtido junto aos docentes, nos propiciou encontrar uma outra

perspectiva para a possibilidade de relação entre EA e o ensino da Geografia. Esta se dá Pela

consideração dos significados do Meio Ambiente. O diferencial se estabelece pela

centralidade do meio ambiente, visto por alguns, como algo que deve ser incorporado, com
156

seus significados, na interpretação geográfica da relação sociedade-espaço. A incorporação

pode ocorrer de forma clara e direta, calcada na veiculação dos conteúdos básicos, ainda que

assumindo a complexidade; ou de forma imprecisa que generaliza as relações, pelo

entendimento de que fazemos parte e utilizamos o meio ambiente, ou ainda, pelo fato de todas

as ciências estarem, para alguns, ligadas ao mesmo, considerando-o como uma questão

multidisciplinar. Igualmente, para alguns sujeitos, esta incorporação se dá, ao ser o meio

ambiente tomado como uma “categoria” geográfica. Em síntese, a relação é viabilizada pela

questão do Meio Ambiente e pelo tipo de interação assumida no discurso geográfico.

Encontramos, mais uma vez, a idéia de impossibilidade, neste caso a de se conhecer o meio

ambiente sem a Geografia. As posições assumidas não se excluem, são partes do todo, têm

diferenças, mas possuem o amálgama do Meio Ambiente.

Nesse grupo, destacamos algumas colocações que compõem tal contextura e, embora

esbocemos o Quadro 1, para facilitar a apreensão, temos em mente que não são posturas

isoladas e, se fazem, compartilhando o tecido social, no qual os professores estão inseridos.

Incorporação de forma clara e direta. Incorporação de forma imprecisa, generalizando


as relações.

O meio ambiente é uma das matrizes do Devido a geografia abordar temas ligados ao meio
pensamento geográfico, logo, a imaginação ambiente (Questionário 49). No que diz respeito ao
geográfica deve incorporar os significados do fato de sermos parte do ambiente e dele dispormos
meio ambiente na produção e interpretação da (Questionário 62). Não vejo como educar sem
relação fundamental sociedade espaço conhecer e para conhecer o meio ambiente é
(Questionário 1). A geografia, articulada com impossível fazê-lo sem a Geografia (Questionário
outras disciplinas afins é fundamental no 66). Como a “geografia” estuda as “categorias”
sentido de estimular o desenvolvimento de uma geográficas o “ambiente” faz parte deste estudo
conscientização em relação à importância do (Questionário 75). Porque o meio ambiente é a área
meio ambiente (Questionário 19). de atuação do homem (Questionário 84).

Quadro 1 - Formas de relação entre ensino de Geografia e EA, pela incorporação dos
significados do Meio Ambiente.
157

Conforme constatado no Gráfico 21, a Natureza também é utilizada pelos professores

como forma de justificar a relação entre o ensino da Geografia e a EA. São duas as nuanças

presentes neste entendimento: A consideração dos elementos da natureza e A consideração

da utilização da natureza pelo homem. Sob o primeiro aspecto, o quadro natural, os

elementos da natureza, conceituados pela Geografia, são considerados como melhor

entendidos pela EA. A Geografia, enquanto disciplina ligada à natureza e as coisas da mesma,

exerce papel importante na EA e na preservação ambiental. Ressaltamos, que no

questionamento realizado, nos baseamos na relação do Ensino de Geografia com a Educação

Ambiental e, as respostas e impressões destes professores, centraram-se na questão da

Natureza. Deste modo, o ambiental foi focado ou reduzido como natural.

Na medida em que a Geografia conceitua os elementos da natureza, ela ajuda


para um melhor entendimento sobre a EA (Questionário 22). As disciplinas
ligadas à natureza tem papel importantíssimo na educação e preservação
ambiental (Questionário 38).

Sob o outro enfoque, a dinâmica da natureza, sua apropriação, sua exploração e

preservação e o uso racional dos recursos, são os aspectos mais importantes. Nestes dois

casos, ora vigoram fragmentações baseadas em elementos naturais, ora se estabelecem visões

utilitaristas sobre a natureza como recurso. Em ambas as perspectivas, a questão social é

minimizada ou reduzida e, a separação e o destaque dado ao natural diferenciam este grupo de

forma mais marcante em relação aos outros já mencionados.

[A Geografia] Como disciplina que contempla a apropriação da natureza


pelo homem, acho interessante a abordagem do tema (Questionário 14). A
geografia também trabalha com a questão do meio ambiente segundo uma
perspectiva de análise diferente das ciências biológicas. A geografia analisa
a forma pela qual o homem se apropria da natureza (Questionário 34).

Optamos por destacar, ainda, uma última nuança captada nas respostas analisadas. A

mesma introduz o aspecto da consciência sustentável, Pela consideração da sustentabilidade.

Realça-se o discurso da existência de uma intimidade entre a EA e a Geografia, através do


158

relacionamento entre o homem, seus interesses e a vida. Todavia, para alguns, viabilizar esta

intimidade, valorizando o relacionamento anteriormente referido, é um dever do professor.

Cabe a este último a responsabilidade da formação, nos alunos, da consciência ambiental.

Entendemos que a intimidade condicionada, vista sob o prisma do dever e da norma, corre o

risco de ser menos agradável. Além disso, apesar das nuanças existentes, os encargos e

obrigações atribuídos à Geografia, aos seus professores e mesmo, aos outros docentes, não

garantem a tomada de consciência, por parte de nenhum dos sujeitos componentes do

processo educativo.

A relação [ensino de Geografia-EA] é marcada pelo entendimento de uma


consciência sustentável e crítica. A geografia pode e deve pontuar as
relações homem x espaço (Questionário 12). A EA cria uma intimidade com
a Geografia quando trabalha a relação do homem, seus interesses e a vida
(Questionário 28). Porque é dever do professor (todo ele), não só o de
Geografia, mas principalmente, ele de introduzir a consciência ambiental aos
seus alunos (Questionário 54).

Bem como a cidadania, a tomada de consciência sobre a dimensão ambiental e as

ações de sustentabilidade são processos sociais que precisam congregar os sujeitos e os

saberes. Na atualidade, este tem sido um desafio constante, para os que nelas investem, em

função da estrutura, competitiva e hierarquizada, estabelecida pelos padrões e normas

culturais dominantes.

Considerando o conjunto de respostas analisado anteriormente, podemos captar alguns

pontos nodais nos diferentes caminhos pelos quais os docentes orientam e justificam a

relação entre a EA e o ensino da Geografia. Tentando explicitá-los, configuramos o gráfico a

seguir (Gráfico 22).


159

8% 12%
4%

9%

67%

Meio Ambiente Geografia Natureza Sustentabilidade Fugiram à questão

Gráfico 22 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo eixos de relação entre o ensino
da Geografia e a Educação Ambiental.

Mais uma vez, ressaltamos que nosso intento não é o de homogeneizar os sujeitos, em

suas respostas, mas perceber de onde derivam alguns de seus pensamentos, ou para onde vão

alguns de seus entendimentos. A presente postura poderá nos ajudar, ao longo do trabalho,

para estabelecermos pontes ou conectarmos fios entre estas respostas e as demais, advindas

dos mesmos sujeitos. Os eixos norteadores que pudemos inferir foram a Geografia, o Meio

Ambiente, a Natureza e a Sustentabilidade.

Estes eixos exprimem diferentes possibilidades de abordagem da relação, o que nos

permite aventar uma perspectiva variada de práticas para a mesma. Ainda que a maioria tenha

centrado o fio condutor da relação na Geografia, este se tece com nuanças que não se

excluem, mas que poderiam ser articuladas em função de sua possibilidade de embasamento

teórico e de sua pertinência, enquanto abertura para perspectivas de práticas. Estas

centralidades não são aqui admitidas como estanques. Todavia, cabe entendermos como elas

estão constituídas enquanto nós, que articulam entre si centralidades diferentes (eixos e

ramificações diversas na totalidade) e, até que ponto elas podem interferir na configuração de

práticas educativas centralizadoras (especializantes, fragmentadoras, disjuntoras e

totalitárias).
160

Passamos a propor o cruzamento entre as informações dos eixos de relação aqui

inferidos (Meio Ambiente, Geografia, Natureza e Sustentabilidade) e os posicionamentos

advindos dos sujeitos em relação à finalidade da EA. O objetivo foi estabelecer maiores

aproximações e detectar novos indícios, que nos permitissem captar relações entre a

finalidade e a aplicabilidade da Educação Ambiental nos dias de hoje e os entendimentos dos

sujeitos, no que diz respeito à relação entre o ensino da Geografia e a Educação Ambiental.

O Gráfico 23 apresenta a configuração desta associação ora proposta. Podemos

verificar como o posicionamento que apontou para serventia da EA no intento de

Conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não-

degradação, por ações no particular e no mundo, está presente em todos os eixos e se destaca

em três deles. Esta posição deixa entrever posturas de precaução em relação às ações humanas

sobre o meio ambiente, o que nos faz pensar, que estas ações são tomadas enquanto

causadoras de degradação, em escalas diversas ou associadas a este problema.

A conscientização da população e dos alunos, invariantemente apresentada em

discurso generalizado, serviria como um álibi que, garantindo a positividade do professor,

permitiria sua diferenciação em relação aos outros. Estes outros seriam os sujeitos a serem

“conscientizados” como caminho necessário para superar a não conservação e a degradação,

carregadas de negatividade. Entendemos que este grupo talvez não impute ao outro ou ao ser

humano, em geral, uma negatividade reificada, mas, por outro lado, toda positividade é

dirigida ao elemento conscientizador e às ações em diferentes escalas, centradas na

preservação, conservação e não-degradação, o que parece não congregar uma concepção de

Natureza como sistema aberto, não passivo, polimorfo, composto por uma totalidade

complexa.
161

30

25

20

15

10

0
Meio Ambiente Geografia Natureza Sustentabilidade

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma crítica

Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não degradação por
ações no particular e no mundo
Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral

Gráfico 23 - Relação entre os posicionamentos dos sujeitos a respeito da finalidade da


Educação Ambiental nos dias de hoje e eixos de associação entre o ensino da Geografia e
a EA.

Aqueles que centraram suas respostas na Sustentabilidade, os quais poderiam ter como

elemento central o discurso da não-degradação (conforme perspectiva originada no

Desenvolvimento Sustentável), acabam por valorizar, principalmente, a utilização da EA na

promoção da Cidadania e da mudança de valores, atitudes e ética, colocados de forma geral.

Deste modo, enquanto alguns centram suas impressões na idéia de conscientizar outros, de

modo específico, para a preservação, existem igualmente, os que apontam para a necessidade

de mudar valores e constituir cidadania. Todavia, esta articulação entre cidadania e mudanças

de valores e ética é feita, pelos sujeitos, em discurso geral, com níveis e formas de

concretização incipientes.

Outra constatação importante se refere à presença, mais efetiva no eixo da Geografia,

do posicionamento que entende a EA como Para integrar novos significados às práticas


162

sociais, ampliando-as de uma forma crítica. Além deste posicionamento, cabe ressaltar que os

outros dois também aparecem com maior ocorrência relacionados ao eixo da Geografia.

Os sujeitos permitem entrever indícios de que focalizam, a partir de seus

conhecimentos específicos nesse campo de conhecimento, a ponte entre a EA e o ensino da

Geografia. Neste caso, no processo de objetivação dos conhecimentos a cerca da EA, é

possível apreender um movimento de focalização (MOSCOVICI, 1978) pelo qual as

informações são filtradas por um direcionamento dos olhares que parte dos conhecimentos

prévios, definidos a partir de seus espaços profissional e pessoal específicos. Para aqueles

que, em maioria, apontaram esse eixo como fio condutor da relação entre o ensino da

Geografia e a EA, detalhamos um pouco mais o cruzamento ora em questão, o que

proporcionou apreender matizes que merecem ser observados e analisados (Gráfico 24).

Averiguamos que, no que diz respeito às nuanças existentes entre o grupo que centra

na Geografia a relação entre o seu ensino e a EA, ocorrem alternâncias entre as

argumentações predominantes, quanto à finalidade da EA na atualidade: ora temos, como

igualmente relevantes, as argumentações fundadas na conservação e não-degradação e, na

cidadania e mudança de valores, ora, estas posições, se alternam, em conjuntos orientados

pela relação homem/meio – sociedade/natureza ou pela base teórica da Geografia e seus

procedimentos. Neste último conjunto, chama a atenção a maior incidência do grupo que

entende como intenção da EA a integração de novos significados às práticas sociais, de

forma crítica. Esta incidência é diametralmente oposta ao que ocorre para o conjunto

orientado pela relação homem/meio – sociedade/natureza, no qual esses novos significados

não são aludidos.


163

10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
Pela consideração do Pela consideração da Pelo base teórica da Pela articulação necessária
Espaço Geográfico relação homem/meio e Geografia e seus entre conceitos e cidadania
sociedade/natureza procedimentos

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma crítica

Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não degradação por ações
no particular e no mundo
Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral

Gráfico 24: Relação entre os posicionamentos dos sujeitos a respeito da finalidade da


Educação Ambiental nos dias de hoje e eixo de associação entre o ensino da Geografia e
a EA centrado na Geografia.

Entendemos, que os que apontam para associação entre o ensino da Geografia e a EA,

baseados na Geografia e, mais especificamente, para a consideração da relação homem/meio

e sociedade/natureza, centram-se nestas dicotomias, expressando algum efeito negativo das

ações humanas sobre a natureza. De outro modo, interpretamos que aqueles que centram na

base teórica da Geografia e seus procedimentos a associação entre o ensino da Geografia e a

EA, demonstram um equilíbrio não dicotômico e mais diversificado em relação ao

cruzamento feito. Estes assinalam a predominância da cidadania e das mudanças de valores,

mas não desconsideram a importância da inversão da degradação e da incorporação crítica, de

novos significados às práticas sociais.

Entre os grupos, encontramos diversos sujeitos que indicaram, indistintamente, a

importância dos conceitos e de embasamentos teóricos na relação entre o ensino da Geografia


164

e a Educação Ambiental. Esta propensão dos docentes vai ao encontro de um outro

questionamento, dirigido aos conceitos por eles empregados, com o intuito de relacionar o

ensino da Geografia à EA. Buscamos averiguar se os conceitos geográficos seriam fios que

aproximariam a Geografia da prática educativa ambiental. Entendemos que a idéia de

aproximação só se faz com êxito, quando efetivada como caminho em comum, trilha

compartilhada, na qual todos se aproximam entre si. Igualmente, tentamos captar, no caso de

confirmação desta perspectiva, que conceitos geográficos servem como condutores na

concretização das formas de associação sugeridas pelos professores. Deste modo, solicitamos

aos mesmos que alguns daqueles conceitos fossem por eles indicados.

Como podemos apreender (Tabela 4), a maioria dos pesquisados afirma, que existem

conceitos geográficos que se aproximam da EA. Há, ainda, os que demonstram

desconhecimento sobre esta questão, mas somente um afirmou, em estilo direto, que, no seu

entender, não existem conceitos geográficos que se aproximem da EA. Entre os que não

responderam à questão, um justificou sua recusa, apesar disto não ter sido solicitado; entendeu

que “é a Geografia que tem interesse em conceitos da questão ambiental” (Questionário 13).

Esta perspectiva parece não ter admitido, em sua elaboração, a idéia de aproximação, como

caminho compartilhado.

Tabela 4 - Posicionamento dos sujeitos sobre a existência de conceitos geográficos em


proximidade com a Educação Ambiental.

Posicionamento dos sujeitos N %


Sim, existem conceitos geográficos
80 87.9
que se aproximam da EA
Desconhece esta questão 7 7.7
Não, não existem conceitos geográficos
1 1.1
que se aproximem da EA
Não respondeu 3 3.3
Total 91 100.0
165

No sentido de que as respostas ganhem em amplitude, à luz do complemento da

questão, solicitamos que os professores, livremente, apresentassem conceitos, configurando

partes dos caminhos que aproximam o ensino da Geografia e a EA. A Tabela 5 traz todos os

conceitos apresentados pelos pesquisados. Apesar da maioria ter apontado que existem

conceitos geográficos que se aproximam da EA, ao serem incitados a apresentá-los, alguns

dos pesquisados optaram por não responder a questão (16 sujeitos). No tratamento das

respostas, procuramos aproximar os conceitos de acordo com suas características comuns. Os

elementos ligados ao Espaço Geográfico, tais como espacialidade, escala espacial ou

organização espacial, foram reunidos, assim como, o fizemos, sempre que possível, para

outros conceitos, como por exemplo, o de Território (territorialidade, espaço vital).

É importante ressaltar, que nem sempre foram citados conceitos oriundos da Geografia

e, às vezes, foram apresentadas noções em lugar de conceitos. Estes deslocamentos em

relação ao questionado não são aqui encarados como obstáculos, mas, ao contrário, são

tomados como formas de aproximação e apropriação, no que diz respeito ao novo, trazido

pela dimensão da Educação Ambiental, em relação ao ensino de Geografia. Como já

afirmamos anteriormente, as informações e os conceitos destacados e deslocados de seu

campo científico original, são apropriados pelo público que, no intento de dominá-los, os

filtram, recortam e ressignificam, segundo contextos próprios, objetivando e

consubstanciando uma apropriação (MOSCOVICI, 1978).

Tabela 5: Conceitos geográficos e noções que aproximam a Geografia da Educação


Ambiental, segundo indicações dos sujeitos.
continua
Noções citadas N %
Espaço geográfico, espaço, espaço natural, espaço urbano, espaço rural,
27 33.8
ordenamento/organização espacial, forma e função e escalas espaciais
Paisagem 18 22.5

Território e territorialidades, geopolítica e espaço vital 18 22.5


166

Tabela 5: Conceitos geográficos e noções que aproximam a Geografia da Educação


Ambiental, segundo indicações dos sujeitos.
conclusão
Noções citadas N %
Vegetação, relevo, hidrografia, clima, solo, água, terra, encosta, atmosfera 13 16.3

Lugar 12 15.0

Sociedade, relações sociais, população 11 13.8

Desenvolvimento sustentável, sustentabilidade, desenvolvimento 10 12.5

Meio ambiente, ambiente 10 12.5

Natureza 10 12.5

Poluição, degradação, impacto ambiental, desmatamento, queimada, lixo 10 12.5

Ecologia, ecologia humana, ecossistemas, biomas, habitat, nichos, biodiversidade 9 11.3

Região 9 11.3

Trabalho, meio de produção, atividades humanas e atividades econômicas 9 11.3

Urbanização, cidade, crescimento urbano, expansão urbana 8 10.0

Assoreamento, erosão, desertificação, deslizamento, lixiviação, desmoronamento 7 8.8

Climatologia geográfica, biogeografia, pedologia 6 7.5

Matéria prima e recursos naturais 6 7.5

Ambientalismo, preservação e conservação ambiental 5 6.3

Geografia agrária, agricultura, agropecuária, plantio 4 5.0

Industrialização, indústria, revolução industrial 4 5.0

Biotecnologia, energia 3 3.8

Problemas sociais, pobreza, violência, racismo, fome, favelização 3 3.8

Cidadania 3 3.8
Ilhas de calor, chuva ácida, enchentes, efeito estufa, diminuição da camada de
3 3.8
ozônio
Uso do solo, ocupação humana 2 2.5

Geografia 1 1.3

Geotopo, geossistema, geoecologia 1 1.3

Todos os conceitos físicos 1 1.3

Percepção ambiental 1 1.3

Base: Professores que afirmaram existir conceitos geográficos que se aproximam da EA.

Obs.: A soma dos valores absolutos e relativos ultrapassa o total de professores que afirmaram existir
conceitos geográficos que se aproximam da EA e os 100%, respectivamente, porque a questão que deu
origem à tabela admite mais de uma resposta.
167

Cabe, ainda, salientar que o agrupamento proposto pode ser estabelecido segundo

outras conformações, estando sujeito, como qualquer categorização, à críticas. Para este

trabalho, julgamos, entretanto, que este agrupamento atende a uma primeira aproximação

entre os conceitos e noções indicados pelos professores. Possibilita, como exporemos adiante,

mapear outras aproximações. Igualmente, deverá se articular a diferentes aspectos já

mencionados e a demais questões que, em breve, serão abordadas.

Averiguamos que conceitos tradicionais da Geografia relacionados ao Espaço

geográfico, Paisagem e Território aparecem com diversas citações sendo objeto de escolha de

diferentes docentes, confirmando tendências anteriormente apresentadas para a associação

ensino da Geografia e a EA. O Espaço, a base teórica da Geografia e seus procedimentos são

admitidos como elementos decisivos para esta associação. Outras noções e conceitos bastante

utilizados na Geografia, tais como, os que enquadramos no grupo de Vegetação, relevo,

clima, solo também são realçados pelos professores. O mesmo pode ser apontado para o

conceito de Lugar.

Os aspectos relacionados à Sociedade, às relações sociais e à população surgem em

seqüência e, devemos ter em mente, que embora não sejam conceitos ou noções oriundas da

Geografia, são por ela intensamente empregados. A Geografia é uma ciência social e as

questões relacionadas às populações envolvem temas dos mais complexos para os Geógrafos

e professores de Geografia.

Podemos perceber outra série de noções que vai do grupo do Desenvolvimento

Sustentável, passando por Meio Ambiente, Natureza, Degradação Ambiental e Ecologia. Este

grupo acena para fatores que transitam entre os nós ou eixos que tratamos anteriormente,

embora também não sejam conceitos originários da Geografia. Sugerem uma coesão centrada

na apreensão com o Meio Ambiente, ora desviada pela preocupação causada pelos impactos

apresentados, permitindo uma interpretação negativa do papel do ser humano para com o
168

Ambiente, ora recuperada positivamente pelas indicações apresentadas no agrupamento

encabeçado pela Ecologia.

A Região, o grupo iniciado pelo Trabalho e o outro que articulamos à Urbanização,

parecem desconectados, mas seu entendimento relaciona-se aos aspectos sociais e às

características específicas da Geografia. Região e Urbanização são noções tradicionais da

Geografia e o Trabalho, associado às atividades econômicas de transformação do espaço, é

outro conceito fundamental, embora não original, amplamente necessário à compreensão

geográfica.

Outro conjunto que se aproxima, diz respeito aos conceitos relativos às questões

ambientais e às naturais, resgatando, inclusive, os impactos sobre o Meio Ambiente e a

Natureza. Neste grupo, temos do Assoreamento e lixiviação à Pedologia, dos Recursos

naturais à Conservação ambiental. São pares quase dialéticos, que exprimem encontros

conflituosos entre a dinâmica ambiental e os processos sociais.

Em seguida, uma dupla, englobando atividades estudadas tradicionalmente pela

Geografia, vêm agrupada: os contextos Agrário e Industrial. Parece, novamente, uma

oposição, porém, mais uma vez, são faces da mesma moeda. São atividades e ocupações

diversas do espaço sendo explicitadas na aproximação.

A próxima seqüência apresenta duas nuanças. A primeira nos conduz a uma

interpretação centrada na tecnologia (biotecnologia) e na sociedade atual, através do

estabelecimento de um meio técnico-científico. A segunda, não distanciada da primeira, mas

por ela agravado, centra-se nos impactos sócio-ambientais (violência, favelização, chuva

ácida, enchentes) e, possivelmente, numa saída para os mesmos, ao dar relevo à cidadania.

Por último, frisamos a existência de um conjunto cuja marca principal é a aparente

heterogeneidade. Ele se compõe de idéias como a de Cultura e Identidade cultural e,


169

apresenta conceitos ligados aos significados e entendimentos do Meio Ambiente (percepção

ambiental, qualidade ambiental, geossistemas, geoecologia). Nestes, há um viés bastante

atual de inserção e pesquisa no campo da Geografia. A idéia de sistema ambiental, a

incorporação de aspectos culturais e subjetivos dá a ligadura deste conjunto. Não são

conceitos exclusivamente geográficos, ou oriundos da Geografia, mas vêm sendo bastante

incorporados. Neste grupo, encontramos ainda a ocupação humana e o uso do solo, já

apontados sob outros aspectos. O conceito de Geografia, embora ele próprio esteja inserido

em todos os conceitos da Geografia, inclusive nos físicos, é também indicado por um dos

professores.

Não somente em relação aos conceitos, mas também para os agrupamentos e

cruzamentos propostos até este momento, podemos inferir que cada agrupamento sugerido,

parece refletir que os sujeitos, de forma diferenciada, dão maior ou menor destaque a partes

do objeto em questão, no caso a EA e sua relação com o ensino da Geografia. Tal constatação

pode refletir envolvimentos diferentes dos sujeitos para com este objeto. Na análise do

material pode-se entrever a existência de pontos de preocupação que são focalizados por

alguns a partir da Geografia e de seus embasamentos tradicionais e, para outros, o foco dirige-

se a incorporar, mais abertamente, noções menos tradicionais, inclusive, as originalmente não-

geográficas.

Objetivando ampliar a possibilidade de entendimento dos conceitos e noções aludidos,

optamos por constituir uma outra forma de agrupamento. A mesma se consubstancia na

identificação da redução ou da ampliação de abrangência no tratamento dado à complexidade

da questão ambiental. Entendemos, que conceitos e noções tomam parte num amálgama que

fundamenta as ações e práticas dos professores. Igualmente, refletem o nível de complexidade

e articulação das abordagens adotadas, podendo se restringir ao entendimento dos processos

naturais ou, de forma diversa, compreendem que as dinâmicas sócio-ambientais devem ser
170

tratadas de modo inseparável. Os agrupamentos inferidos, a partir das indicações advindas dos

docentes, constituem, ao todo, três conjuntos que foram destacados, diferenciando-se segundo

a complexidade e a articulação entre as características sociais e naturais. Desta forma,

aventamos ter encontrado indicações de cunho naturalista (centradas em elementos ou

processos eminentemente naturais), indicações de cunho social (diferenciadas pela

preponderância de caracterizações sociais) e indicações de cunho sócio-ambiental

(caracterizadas por conceitos e noções que articulam, necessariamente, para seu tratamento,

os processos naturais aos sociais)79.

A Tabela 6 reflete o total de vezes em que as noções e conceitos geográficos foram

indicados pelos sujeitos, já distribuídos segundo os agrupamentos aqui propostos, com base

nas ênfases inferidas, associadas aos processos naturais, sociais ou sócio-ambientais.

79
Entre os conceitos e noções interpretados como de cunho naturalista destacamos: vegetação, relevo,
hidrografia, clima, solo, água, terra, encosta, atmosfera, assoreamento, erosão, desertificação, deslizamento,
lixiviação, desmoronamento, natureza, matéria prima e recursos naturais, ecologia, ecologia humana,
ecossistemas, biomas, habitat, nichos, biodiversidade, geotopo, geossistema, geoecologia, climatologia
geográfica, biogeografia, pedologia e todos os conceitos físicos. Para a ênfase social, foram agrupados: região,
território e territorialidades, geopolítica e espaço vital, sociedade, relações sociais, população, lugar, meio,
meio técnico-científico informacional, trabalho, meio de produção, atividades humanas e atividades
econômicas, poluição, degradação, impacto ambiental, desmatamento, queimada, lixo, urbanização, cidade,
crescimento urbano, expansão urbana, industrialização, indústria, revolução industrial, cultura, identidade
cultural, problemas sociais, pobreza, violência, racismo, fome, favelização, geografia agrária, agricultura,
agropecuária, plantio, geografia, uso do solo, ocupação humana, saúde e todos os conceitos utilizados em
Geografia. Sob o agrupamento que utiliza conceitos e noções caracterizados como sócio-ambientais foram
indicados: desenvolvimento sustentável, sustentabilidade, desenvolvimento, paisagem, meio ambiente, ambiente,
ordenamento/gestão ambiental, qualidade ambiental, espaço geográfico,espaço, espaço natural,espaço urbano,
espaço rural, ordenamento/organização espacial, forma e função e escalas espaciais, biotecnologia, energia,
cidadania, ambientalismo, preservação e conservação ambiental, ilhas de calor, chuva ácida, enchentes, efeito
estufa, diminuição da camada de ozônio e percepção ambiental. Entendemos que outras associações e
agrupamentos podem ser realizados e alguns dos exemplos advindos dos professores podem inclusive ser
interpretados de forma diferente em seus cunhos por outros trabalhos. Como nos baseamos em aproximações,
fomos fieis às realizadas pelos sujeitos em suas respostas. Deste modo, quando encontramos noções e conceitos,
tais como, recurso natural, ou impacto ambiental, região e outros, eles estavam aludidos em conjuntos nos quais
a predominância ou a exclusividade centrava-se em uma das três ênfases propostas.
171

Tabela 6 - Distribuição de conceitos e noções geográficos, aludidos pelos sujeitos,


segundo ênfase em processos naturais, sociais ou sócio-ambientais.

Ênfase das Indicações N %


Indicações de cunho naturalista 52 22.3
Indicações de cunho social 99 42.5
Indicações de cunho sócio-ambiental 82 35.2
Total 233 100.0
Obs.: A soma dos valores absolutos ultrapassa o total de professores
que afirmaram existir conceitos geográficos que se aproximam da
EA. E os valores relativos são calculados levando em conta que a
questão que deu origem à tabela admite mais de uma resposta.

As informações constantes desta tabela permitem refletir que, embora as indicações de

cunho naturalista tenham sido referenciadas em menor quantidade, há, ainda, uma

predominância de alusão a conceitos ou noções que tipicamente enfatizam a fragmentação ou

separação entre o caráter natural e social.

O conjunto de indicações de cunho sócio-ambiental é superado pelo das indicações

que realçam o social. Anteriormente, nas análises referentes ao material sobre a relação entre

o ensino da Geografia e a Educação Ambiental (Gráficos 21 e 22), pudemos verificar que as

informações apontaram para o predomínio de eixos centrados na Geografia, no Meio

Ambiente, na Sustentabilidade e na Natureza. Estes eixos aproximam-se dos conceitos agora

examinados. Sem querermos ser conclusivos, a preponderância do caráter social sugere

proximidade em relação ao eixo que centrou na Geografia a associação entre o ensino da EA e

a mesma. O cunho sócio-ambiental aproxima-se das interações promovidas entre o Meio

Ambiente, a Sustentabilidade e a ênfase nos conceitos e noções de processos naturais; pode

acostar-se na interpretação que centrou o fio condutor da relação ensino da Geografia e

Educação Ambiental, na Natureza. Mais adiante tentaremos investigar até que ponto estas

possibilidades se confirmam ou não.


172

Conforme já discutimos, diferentes autores sugeriram tipologias em relação às

representações sociais captadas em suas pesquisas a respeito do Meio Ambiente. Reigota

(1995) chegou a indicar, em relação aos docentes por ele investigados, a existência de

representações naturalistas, antropocêntricas e globalizantes, a respeito do Meio Ambiente. Os

cunhos ou ênfases inferidos até este momento, nesta pesquisa, podem ou não ter aproximação

com as tendências sugeridas por outros estudos. Outrossim, a especificidade do grupo ora

estudado pode trazer novas acepções ou matizes voltados, primordialmente, à Educação

Ambiental. Deste modo, sem buscarmos, necessariamente, criar uma tipologia ou seguir

tipologias já estabelecidas e, visando aprofundar o entendimento sobre a questão dos sentidos

atribuídos a EA, outros questionamentos foram feitos aos sujeitos deste trabalho.

Quando elencamos a distribuição das ênfases agrupadas, segundo os sujeitos

investigados (Gráfico 25), podemos verificar uma mudança em relação ao arranjo dos

conceitos ou noções sugeridas pelos professores. Neste caso, de modo diverso ao que fizemos

anteriormente, não estamos levando em conta cada conceito ou noção apresentado, mas a

presença, ou não, das ênfases em relação aos sujeitos investigados.

Demonstra-se, com este gráfico, uma inversão entre as indicações com ênfase social e

sócio-ambiental. Esta ampliação na utilização ou na sugestão de noções e conceitos ora

caracterizados como sócio-ambientais, dá indícios de tentativas concretas de aproximação e

apropriação por parte dos sujeitos para o tratamento das questões sócio-ambientais na relação

entre o ensino da Geografia e as práticas educativas ambientais. As novidades estão

circulando de forma não-estática entre os sujeitos e para os sujeitos.


173

52

50

33

0 10 20 30 40 50 60

Indicações de cunho naturalista Indicações de cunho social


Indicações de cunho sócio-ambiental

Gráfico 25 - Distribuição das ênfases naturalista, social e sócio-ambiental, segundo


sujeitos pesquisados.

Embora ainda possamos verificar que muitos dos docentes norteiam seus pensamentos

entorno de conceitos e noções centradas no social ou no natural, vemos que, dos setenta e

cinco (75) docentes que indicaram conceitos e noções, cinqüenta e dois (52) já fazem menção

à utilização de noções menos dicotômicas (sustentabilidade, cidadania, geossistema, entre

outras) para que se possibilite, segundo suas indicações, a aproximação entre a Geografia e a

EA.

Desse modo, detecta-se a persistência de aspectos enraizados, havendo ainda uma

certa separação social – natural. Porém, ramificações diferenciadas também se evidenciam,

principalmente se aportamos à análise as noções sócio-ambientais como elementos ou

instrumentos que serviriam de base para a articulação entre a EA e o ensino da Geografia.

Entendemos que o processo de incorporação e de mudança é lento e sujeito a realinhamentos

sucessivos. Há persistências e emergências de posicionamentos, dotando os sentidos

atribuídos à EA de uma complexidade na qual as representações possuem o velho e o novo,


174

conjuntamente. Isto pode ocorrer porque os valores e símbolos, inerentes a alguns grupos, são

objetivados levando em conta que a manutenção de determinados discursos, em certas épocas,

pode causar menos problemas e enfrentamentos e, até mesmo, acabar proporcionando

vantagens imediatas.

Se aliarmos à distribuição das ênfases naturalista, social ou sócio-ambiental sugeridas

às respostas obtidas em relação ao proveito da Educação Ambiental nos dias de hoje (Gráfico

26), poderemos constatar outras aproximações. Verificamos que o posicionamento dos

docentes que apontam como finalidade da EA, [...] conscientizar a população e os alunos da

importância da conservação, preservação [...], possui maior incidência entre os docentes

cujas indicações de noções e conceitos que articulam a Geografia e a Educação Ambiental

sugeriram aspectos centrados no cunho naturalista. Esta tendência dá relevo aos aspectos da

Natureza, de tal forma, que ao ser humano e à sociedade passa a ser atribuído o papel de

coadjuvante frente aquela. Não se está imputando um negativismo ingênuo ou absolutizante

aos que seguiram por este caminho. No entanto, causa estranheza que a não-degradação e a

preservação centralizem a positividade, quando os processos que as originam têm, no social,

suas causas e impactos efetivos.

Não que essa forma de apreciar a utilidade da EA seja, exclusivamente, relacionada ao

grupo que dá ênfase aos processos naturais. O que ressaltamos, é que a finalidade da EA

ligada a preservação e não-degradação torna-se menos influente, ao levarmos em conta as

noções com ênfases sociais e sócio-ambientais. Deste modo, há, possivelmente, um jogo de

valores e símbolos, definindo prioridades e formas de atuação. Nestes casos, quando as

preocupações voltam-se para as ênfases sociais e sócio-ambientais, destaca-se a Educação

Ambiental com finalidade relacionada, principalmente, a Mudança de valores, atitudes e

ética. Chamamos a atenção, que esta mudança é proposta em termos de discurso geral,
175

demonstrando uma desvinculação entre a mesma e sua concretização através de práticas

cotidianas.

Para conscientizar a população e os


25 alunos da importância da
conservação, preservação e não
degradação na vida por ações no
20 particular e no mundo
Para integrar novos significados às
15 práticas sociais ampliando-as de
uma forma crítica

10
Para a mudança de valores, atitudes
e ética, colocados em discurso geral
5

0
Indicações de cunho Indicações de cunho Indicações de cunho Não respondeu
naturalista social sócio-ambiental

Gráfico 26 - Distribuição dos sujeitos, associando a relação entre seus posicionamentos


sobre a finalidade da EA nos dias de hoje e as ênfases naturalista, social ou sócio-
ambiental sugeridas.

Ainda em relação ao Gráfico 26, cabe assinalar, que para o grupo que entende como

finalidade da EA [...] integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma

forma crítica, a indicação de noções e conceitos de cunho naturalista é bastante reduzida. Por

outro lado, se levarmos em consideração que o grupo para o qual inferimos tal interpretação é

composto de nove (9) sujeitos, dos quais oito indicaram conceitos e noções tanto para ênfases

sociais quanto para ênfases sócio-ambientais. A idéia de novos significados ganha contornos

associados ao entendimento da articulação Geografia-Educação Ambiental, pela incorporação

da dimensão social e sócio-ambiental, em detrimento de concepções naturalizantes.

Tornamos a vislumbrar, que a existência de valores e símbolos diferenciados orienta

interpretações, influenciando determinadas concepções que se ampliam, reduzem ou


176

combinam, integrando ou não, em graus diversos, aspectos difundidos socialmente, às práticas

cotidianas.

Mais uma vez, enfatizamos, que a importância de ações e práticas não-degradantes e

preservacionistas não foi excluída. No entanto, para o conjunto de docentes que assumiram

esta opção, a necessidade de ir além, articulando novos significados e mudanças de valores às

práticas sociais, se fez presente nos registros advindos de suas indicações.

Em relação aos que não explicitaram a finalidade da EA, ainda que apresentassem

conceitos ou noções nos diferentes cunhos, é preciso esclarecer alguns aspectos: a) houve uma

distribuição rigorosamente homogênea na escolha dos cunhos apontados; b) tal característica,

se por um lado aproxima os sujeitos em termos incidência ou distribuição, por outro,

impossibilita uma interpretação mais específica sobre as raízes e implicações desta

proximidade, dada a ausência de resposta, quanto à finalidade da EA.

Podemos averiguar, após o cruzamento, como os dois últimos perfis apresentados no

Gráfico 26 guardam, entre si, grande semelhança para as ênfases social e sócio-ambiental, em

relação aos posicionamentos advindos das finalidades da EA. Nestes, os proveitos da

Educação Ambiental ultrapassam a utilidade da prevenção ou reparação, no que diz respeito

ao Meio Ambiente. Já, para os que centram a predominância de conceitos e noções no cunho

naturalista, a questão da EA voltada para a não-degradação e a conservação acaba por ter o

mesmo impacto que as outras finalidades apontadas para a mesma. Deste modo, há um

emaranhado de caminhos e trilhas que não se excluem, possivelmente constituindo um

conjunto de sínteses, combinações e organizações possíveis, associadas aos contextos e

culturas vividas, às parcerias e às diferenças existentes entre os sujeitos, orientando posturas

variadas em relação à EA.

Outra associação possível é a que propomos a seguir, levando em conta as ênfases

relacionadas aos conceitos aludidos pelos professores e os eixos que inferimos a partir das
177

respostas relativas a associação entre o ensino da Geografia e a EA. O Gráfico 27 demonstra

os resultados deste cruzamento. As indicações incidem de forma bastante diferenciada nos

quatro eixos propostos. Alguns aspectos ficam mais definidos. A preponderância da ênfase

social sugere proximidade em relação ao eixo que centrou na Geografia a associação entre a

EA e o ensino da mesma. Todavia, seu efeito se deu de forma mais expressiva em relação ao

eixo da Sustentabilidade.

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Meio Ambiente Geografia Natureza Sustentabilidade

Indicações de cunho sócio-ambiental


Indicações de cunho social
Indicações de cunho naturalista

Gráfico 27 - Distribuição percentual dos sujeitos, associando os eixos da relação entre o


ensino de Geografia e a EA às ênfases naturalista, social ou sócio-ambiental sugeridas.

A presença dos conceitos focados em aspectos sociais, também é bastante evidenciada

em relação aos dois outros eixos, possivelmente demonstrando como o tratamento das

questões ou processos naturais e ambientais carece do rebatimento no social. Para os que

centraram no Meio Ambiente a relação entre o ensino de Geografia e a Educação Ambiental

há um ligeiro predomínio da ênfase conceitual calcada em noções sócio-ambientais e uma

igualdade de incidência entre indicações sociais e naturalistas.


178

A ênfase sócio-ambiental incide de forma mais destacada entre os que tecem a relação

EA-ensino da Geografia pela Geografia. Todavia, esta ênfase também se faz presente nos

conceitos aludidos pelos que centraram a relação nos processos da Natureza. O cunho sócio-

ambiental não obteve, para o grupo em questão, um conjunto de respostas que apontasse para

a Sustentabilidade, na constituição da relação EA-ensino de Geografia. Se a Educação

Ambiental é aqui tratada como uma concepção nova que vai sendo incorporada pelos sujeitos

nas práticas educativas por eles exercidas, a questão da Sustentabilidade é mais recente ainda,

sendo pouco explorada, mesmo nos meios acadêmicos que tentam difundi-la. O avanço em

relação aos que se baseiam na Sustentabilidade para estabelecer a relação entre a EA e o

ensino da Geografia parece advir da predominância do social em relação ao natural. Este

aspecto, por outro lado, ainda reflete uma dicotomia marcada pela separação na utilização de

processos sociais e naturais. Deste modo, verificamos que mesmo entre os docentes que

apontaram para a Sustentabilidade como o ponto de encontro entre o ensino da Geografia e a

EA, a incidência dos conceitos e noções sócio-ambientais foi relativamente menor que as

indicações pertencentes às outras duas ênfases.

Embora a idéia de sustentabilidade esteja presente, ela vai ser objetivada, em maior

proporção, através de noções e conceitos que ora estão centrados nos elementos naturais e ora

invertem a centralidade para os processos sociais. Entendemos que as idéias de conservação,

preservação, não-degradação são assimiladas pelos sujeitos, mas a discussão a respeito da

sustentabilidade ainda se mostra distante.

Constata-se que, para os professores que centram na Geografia o fio condutor entre o

seu ensino e a EA, há uma gradação bem marcada entre as ênfases. As indicações de cunho

naturalista perdem em incidência tanto para as de cunho social quanto para as que

privilegiam noções de caráter sócio-ambiental. Este fato, ao nosso entender, corrobora a

idéias de que os docentes sinalizam para a incorporação de conceitos e noções não


179

necessariamente geográficos ao vislumbrarem a EA. Não que deixem de lado o tratamento

das questões espaciais. Também não abandonaram o entendimento dos processos naturais.

Mas, principalmente, em relação aos que constituem na Geografia a ponte que viabiliza

articular a EA ao ensino da própria Geografia, é possível captar um avanço em direção a

posturas ambientais menos naturalizantes.

Além disso, aos conceitos e às noções centrados no cunho social, integra-se a

possibilidade de abordagem mais complexa dos processos sócio-ambientais. A ênfase nos

conceitos e noções de processos naturais acostou-se com maior incidência na interpretação

que centrou o fio condutor da relação ensino da Geografia e Educação Ambiental, na

Natureza. No entanto, para os que enfatizaram na Natureza, a conexão entre o ensino da

Geografia e a EA, averiguamos não haver distinção ou priorização na incidência da ênfase nos

conceitos ou noções citados. Deste modo, houve um equilíbrio na indicação de todas as

ênfases entre os sujeitos que indicaram os processos relacionados à Natureza, para

consubstanciar a relação. É como se a mesma importância fosse atribuída a processos

diferenciados.

A tendência em igualar nos causa apreensão, pois a ênfase no tratamento,

parcialmente compreendida pelo cunho naturalista dos conceitos aludidos, acaba por colocar

os processos sociais e sócio-ambientais em segundo plano. Possivelmente, ocorre um

ordenamento valorativo, que ora prioriza alguns aspectos, ora torna-os secundários e, em

outros momentos, atribui igual importância entre estes e outros significados. Em nosso

entendimento, sem desprezar o conhecimento dos processos naturais, temos que incorporar

cada vez mais, de forma articulada, os processos sócio-ambientais na análise das questões

relativas à EA.

Conforme já abordamos (Capítulo 1, item 1.4), concordamos com Kostrowichi (1988)

que, qualquer que seja nosso pensamento sobre os problemas ambientais, estes problemas são,
180

antes de tudo, sociais. Caso não integremos os aspectos psicológicos, sociais e culturais nas

perspectivas de compreensão e otimização dos processos naturais e dos problemas ambientais,

nos arriscaremos a construir ou propor soluções e mudanças que, embora sejam plenamente

justificáveis sob a ótica científica predominante, não estarão tecidas na trama de culturas e

cotidianos. Por conseguinte, não serão aceitas e praticadas pela sociedade, em acordo com o

esperado.

Levando em conta ainda o total dos sujeitos que responderam ao questionário,

solicitamos a posição dos mesmos quanto ao interesse em participar de grupos para discussão

sobre a Educação Ambiental. A Tabela 7 permite averiguar que grande parte dos docentes

possui interesse em participar de grupos que tenham a EA como tema de discussão.

Tabela 7 - Distribuição dos sujeitos, segundo interesse de participação em grupos de


discussão sobre a Educação Ambiental.

Interesse em participar de grupos para discutir a EA N %


Sim 69 75.8
Não 11 12.1
Não sabe 10 11.0
Não respondeu 1 1.1
Total 91 100.0

Mais de 75% dos sujeitos afirma possuir interesse em participar de discussões sobre a

EA. Esta constatação permite que apontemos que apesar de toda a sorte de sobrecarga de

trabalho há, para a maioria dos integrantes do grupo em questão, uma disposição para se

incorporar e participar de grupos de discussão sobre a matéria. A idéia de participação

pressupõe envolvimento e engajamento e o interesse em discutir revela a disposição dos

docentes em se expor, com seus valores, suas práticas e suas concepções sobre a EA,

admitindo compartilhar, complementar e divergir na consecução de projetos comuns. Os

sujeitos que demonstram esta tendência em querer discutir a EA o fizeram de forma livre.
181

Entendemos sua manifestação de interesse como absolutamente genuína, levando em conta

que nada foi posto aos mesmos como contrapartida às suas respostas, de modo a pressioná-

los, com este ou aquele objetivo.

Como já verificamos, esses sujeitos não são folhas em branco. Trazem juízos

diferenciados em relação a associar sua prática docente cotidiana, calcada em sua formação

específica, à Educação Ambiental. Neste sentido, buscamos captar como se ramificam as

raízes destes interesses, segundo as concepções dos mesmos para a finalidade da EA. O

Gráfico 28 permite que observemos tal articulação.

100%

80%

60%

40%

20%

0%
Sim Não Não sei

Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação


e não degradação, por ações no particular e no mundo
Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral

Para integrar novos significados às práticas sociais, ampliando-as de uma forma crítica

Gráfico 28 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo finalidade da EA e interesse


de participação em grupos de discussão sobre a mesma.

Inicialmente, podemos averiguar como a distribuição entre os sujeitos que Não têm

interesse e Não sabem se querem participar, é praticamente a mesma. A idéia de

Conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não-


182

degradação, por ações no particular e no mundo predomina em todos os grupos de respostas,

porém é mais evidenciada nestes dois grupos. Alguns professores participam de projetos em

EA e, talvez, já tenham seus interesses contemplados. Outros sujeitos não participam de

projetos e não almejam engajar-se em tais discussões. Para os dois casos, não se observa a

presença dos sujeitos que inferiram como finalidade da EA Integrar novos significados às

práticas sociais, ampliando-as de uma forma crítica.

Em relação aos sessenta e nove (69) sujeitos que possuem interesse em discutir, de

forma coletiva a EA, a maioria advoga como finalidades da mesma, aquelas ligadas a

Conscientização da população e dos alunos da importância da conservação, preservação e

não-degradação, por ações no particular e no mundo e a Cidadania e a mudança de valores,

atitudes e ética, colocados em discurso geral. Embora estes propósitos sejam predominantes,

o grupo que mais nos chama a atenção é o que apontou como finalidade da EA estar

relacionada a Integrar novos significados às práticas sociais, ampliando-as de uma forma

crítica. Todos os sujeitos que se integraram nesta categoria, assinalaram também que estão,

efetivamente, dispostos a discutir, de modo coletivo, a questão da EA. Quando reunidos, os

grupos que se voltaram para estas duas últimas finalidades (da cidadania e dos valores e o

dos novos significados às práticas sociais) findam por predominar entre os que se dispõem a

participar de discussões sobre a EA.

Esses dois grupos, em maior condição de concretização, acabam por diferenciar os

sujeitos que possuem interesse em participar de discussões coletivas sobre a EA, daqueles que

realizaram indicações negativas sobre tal proposição. Entendemos que as idéias sobre os

valores e os novos significados são mais dinâmicas e menos redutoras que a idéia de

conscientizar para uma finalidade específica. A passividade atribuída a outros sujeitos

também fica reduzida, pois não há como admitir cidadania que não seja praticada ou
183

conquistada, valores que não pertençam a sujeitos e incorporações críticas que não sejam

refletidas em práticas sociais.

Através do Gráfico 29, poderemos considerar esses interesses relacionando-os aos

eixos que associam o ensino da Geografia à EA. Os professores que informaram não saber ou

não querer fazer parte de grupos para a discussão da EA, quando questionados sobre a relação

entre o ensino de Geografia e a Educação Ambiental priorizaram constituir seus focos sobre a

Geografia. Os mesmos, também indicaram para esta relação o caminho através do Meio

Ambiente e da Natureza. Não houve indicações relativas a Sustentabilidade, demonstrando,

em nosso entendimento, como a mesma ainda é pouco incorporada pelos sujeitos ora

pesquisados.

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
SIM Não Não Sei

Meio ambiente Geografia Natureza Sustentabilidade

Gráfico 29 - Distribuição percentual dos sujeitos, segundo eixos de relação entre o ensino
de Geografia e a Educação Ambiental e interesse dos sujeitos em participar de grupos de
discussão sobre a mesma.

Em relação ao grupo que diz Não saber, as incidências do Meio Ambiente e da

Natureza se destacam, reduzindo, um pouco, os posicionamentos voltados para o eixo da

Geografia. Para este grupo e para aquele que assinala Não querer participar de discussões
184

coletivas sobre a EA, sugerimos haver uma apreensão das questões educativas ambientais,

mais dependente dos elementos naturais.

Se levarmos em conta o grupo que se manifestou afirmativamente, em participar de

discussões coletivas sobre a EA, podemos averiguar que todos os eixos aventados são

registrados nas respostas. Este grupo, de forma similar aos demais, focaliza seu

posicionamento sobre a relação EA-ensino de Geografia na Geografia, mas incorpora sujeitos

(15) que vêm no Meio Ambiente, na Sustentabilidade e na Natureza outros caminhos para

realização desta associação. Neste caso, a questão dos valores e dos novos significados pode

se traduzir em diferença. Embora os processos naturais não sejam desprezados, eles não

incidem com a expressão observada nos outros dois grupos. Tal aspecto pode indicar um

desvio em relação à naturalização das posturas e dos discursos educativos sobre o meio

ambiente. Além disso, a novidade trazida pelo eixo da Sustentabilidade, somente é aportada

por estes sujeitos, o que não deixa de constituir uma significação nova no tratamento da

questão ambiental.

Uma vez captada a propensão dos sujeitos em participar de discussões coletivas sobre

a Educação Ambiental, interessou-nos apreender quantos dos mesmos já participam de

projetos, cuja preocupação esteja voltada para tal objeto. Admitindo para os sujeitos que não

responderam à questão, a condição de não participes, a Tabela 8 demonstra, claramente, que

menos de um terço dos sujeitos desta pesquisa pertence a grupos ou projetos que centram sua

perspectiva na EA. A maioria dos que tomam parte de discussões coletivas sobre a mesma, o

faz em seus locais de trabalho, nas redes formais de ensino. Há um grupo minoritário que

milita, possivelmente nos movimentos sociais, ligado às ONGs e outras instâncias. O ensino

formal é, ainda, o espaço privilegiado e mais próximo de confluência, destes docentes, com a

questão da Educação Ambiental.


185

Tabela 8 - Distribuição dos sujeitos, segundo participação em grupos ou projetos que


discutem a Educação Ambiental.

Participação em grupo(s) ou projeto(s) que discute(m) EA N %


Não 58 63.7
Sim, ligado(s) ao ensino formal 22 24.2
Sim, ligado(s) a ONGs e/ou outras instância 7 7.7
Não respondeu 4 4.4
Total 91 100.0

Entre outros aspectos, os movimentos sociais e as ONGs, na atualidade, atuam como

difusores de tendências e novidades. Tal característica, faz com que busquem adeptos, pessoas

que, necessariamente, pertencem a outros grupos na sociedade. Articulam, também,

instituições que, de forma distinta, se caracterizam por um maior nível de sistematização, no

campo das práticas sociais. Entre estas pessoas e instituições encontramos aquelas que se

voltam à educação.

O ensino formal, muitas vezes, é percebido como espaço de discussão e sistematização

de práticas sociais que, embora não tenham nele sua origem, acabam por atrair a atenção dos

sujeitos (professores e alunos). Gradualmente, estas práticas vão sendo introduzidas, debatidas

e assumidas, ao longo dos diferentes períodos ou anos de formação. A incorporação destas

discussões privilegia a composição e a organização de tais grupos, em relação a outros

grupos, nos quais a sistematização e a temporalidade dos encontros é menos efetiva. No

entanto, estas discussões podem se limitar, no contorno cultural, ao aspecto acadêmico das

instituições de ensino, deixando de contemplar o viés de militância e de prática social,

geralmente explicitado pelos movimentos sociais e ONGs.

A maioria dos professores demonstrou interesse em participar de grupos de discussão

a respeito da EA. Há uma lacuna entre este desejo e a possibilidade de investimento para sua

efetivação, tendo em vista que, pelo menos para o grupo em questão, o espaço-tempo do
186

ensino formal, é o que mais acaba sendo aproveitado e concretizado para grupos e projetos em

EA.

Entendemos que os docentes desta pesquisa, em sua maioria, nos dão pistas sobre

como compreendem a importância de associar a EA às suas práticas educativas em Geografia.

Outrossim, vêem significância e atribuem finalidades à EA na atualidade. Mais ainda,

gostariam de participar de grupos ou projetos para discuti-la. Demonstram que já privilegiam

os espaços escolares para esta prática, embora possamos verificar que, ainda, o fazem em

proporção reduzida, em comparação com a quantidade dos interesses manifestados.

A EA é ainda uma novidade nas instituições de ensino, um movimento de minorias,

mesmo sendo proclamada por órgãos de imprensa, por eventos educativos, por movimentos

sociais. É uma novidade no campo das práticas concretas na escola. Sua realização concorre

com uma gama variada de novidades, como por exemplo, a articulação com as comunidades

do entorno escolar, a realização de práticas democráticas na escola, a introdução da

informática educativa, entre outras. Há também uma gama de polarizações a seu respeito,

dentro e fora do ambiente escolar. Tais polarizações são resultantes possíveis das inserções

diferenciadas dos sujeitos nas culturas e das táticas desenvolvidas, pelos mesmos, para cada

um dos contextos vividos. Resultam de sínteses, retrocessos e avanços, compartilhados ou

não, de uma novidade, entre outras, no emaranhado dos espaços-tempos-relações.

Em nossa busca por indícios, interessou-nos investigar, um pouco mais, sobre estes

espaços-tempos-relações. O Gráfico 30 nos ajuda a verificar a distribuição daqueles que se

inserem em projetos de EA, segundo o maior nível de ensino no qual declararam atuar.

Considerando o Gráfico 30, podemos verificar que os sujeitos ligados à ONGs e outras

instâncias, que não as instituições de ensino formal, são, principalmente, os que atuam no

ensino universitário. Os mesmos, engajam-se nestas organizações, aliando as melhores

condições de disponibilidade do tempo-espaço que possuem, em comparação aos professores


187

do ensino básico e, acabam por criar parcerias que não se submetem aos entraves burocráticos

e carências materiais das instituições formais de ensino. Além disso, muitas vezes, atuam

como empreendedores, em função da experiência acumulada, em projetos de pesquisa e

extensão, enquanto práticas tradicionalmente vividas, no âmbito do ensino superior.

Sim, ligadoa a Ongs


e/ou outras instâncias

Sim, ligado ao Ensino


formal

0 2 4 6 8 10 12 14

Universitário Médio Fundamental

Gráfico 30 - Distribuição dos sujeitos que atuam em projetos de EA, segundo maior
nível de ensino onde se inserem.

Não que haja algum impeditivo para que os docentes do ensino básico atuem em

ONGs. Todavia, pela sobrecarga, tornam-se consumidos em seus tempos-espaços de trabalho

no ensino formal e, é neles que acabam por vivenciar suas experiências relacionadas a

projetos em EA. Não entendemos esta configuração como um demérito, mas como uma

possibilidade que deve ser potencializada, para a realização de projetos em Educação

Ambiental. Deste modo, o espaço das instituições de ensino não é exclusivamente

potencializador para os alunos. Também os professores encontram, cotidianamente, caminhos

que os desafiam, demandando a ampliação da criatividade no planejamento e na execução de

atividades, que permitam trilhá-los.


188

Sem desconsiderar a importância de projetos e grupos constituídos fora do ensino

formal e, levando em conta que alguns sujeitos já atuam em projetos e grupos revestidos desta

característica, cabe investigar, no ensino formal, onde estariam os empecilhos, para uma

maior integração e participação em projetos ou grupos, voltados para a Educação Ambiental.

No sentido de captarmos possíveis razões para essa participação, em projetos

institucionais, aquém do desejo manifestado pelos professores, pesquisamos, um pouco mais,

esta relação entre as instituições de ensino, nas quais os mesmos estão inseridos, e a existência

de projetos em EA. Além de buscarmos os empecilhos encontrados para a realização de tais

projetos, solicitamos, também, que todos os pesquisados apontassem que dificuldades, em

geral, as instituições apresentam para o desenvolvimento de projetos relacionados à Educação

Ambiental. A Tabela 9 aponta a distribuição das instituições de ensino, segundo o

desenvolvimento ou não de projetos voltados para a EA, levando em conta os sujeitos ora

pesquisados. Em relação aos espaços institucionais voltados ao ensino formal, nos quais

atuam os 91 professores, podemos verificar que menos da metade desenvolvem projetos em

Educação Ambiental.

Tabela 9: Distribuição dos sujeitos por instituição de ensino em que atuam, de acordo
com a existência de projetos em EA.

Atuação em instituição de ensino que desenvolve


algum projeto em EA N %
Sim 39 42.9
Não 47 51.6
Não sabe 5 5.5
Total 91 100.0

Entendemos que as instituições são compostas por sujeitos que direcionam suas

finalidades (institucionais e pessoais) de acordo com interesses e sentidos diversos. Mas, as

instituições de ensino, têm que estar voltadas, necessariamente para a educação. Esta, por sua

vez, deve incorporar valores, conhecimentos e responsabilidades inerentes ao tempo e às


189

relações sócio-espaciais, nas quais está inserida. A questão da EA, como já apontamos,

adquire significado primordial na atualidade. Faz parte dos conhecimentos complexos e

pertinentes e, por conseguinte, sua incorporação ao cotidiano das instituições e dos sujeitos

deveria e poderia ser almejada e viabilizada. Se levarmos em conta, que as respostas

afirmativas da Tabela 9 podem refletir, apenas, um momento, no qual um projeto temporário é

levado a cabo, as preocupações sobre a discussão da EA, como prática cotidiana e a sua

concretização em projetos permanentes, agravam-se.

Buscando investigar que obstáculos podem estar presentes no cotidiano dos

professores e das instituições de ensino, dificultando o desenvolvimento e a ampliação de

projetos relacionados à Educação Ambiental, questionamos os docentes a respeito dos

transtornos encontrados, nas instituições que, no seu entender, possuem projetos em EA

(Gráfico 31).

A dificuldade com a mobilidade dos alunos foi indicada pelos professores entre outras.

Tal situação, associa-se, principalmente, ao contexto do trabalho de campo ou do estudo do

meio, nos quais a saída extraclasse, para além das paredes da sala de aula e, mesmo, da

instituição de ensino, não se resume ao ato de sair em si80. Incorpora, em geral, a

possibilidade de arranjos institucionais, planejamentos prévios, envolvendo horários, obtenção

de meios, compreensão e o auxílio de outros profissionais.

80
O trabalho de campo é fundamental, podendo ser combinado com uma série de atividades relacionadas a
entrevistas, mapeamentos, coletas, textos, vídeos entre outras. Permite a integração transdisciplinar e estimula o
caráter lúdico da prática escolar. Também é uma prática que se adequa a diferentes tipos de pesquisa, devendo
ser entendido em duas etapas complementares. A primeira é teórica, baseada em leituras ou em visualizações
prévias (jornais, revistas, livros, fatos, trabalhos anteriores, entre outros). A segunda parte é prática, e se
confirma pela ida ao campo através da excursão (em geral com entrevistas ou questionários a serem realizados).
O relato ou o registro culminam, ao final do trabalho de campo, devendo os alunos ser orientados pelo professor
de modo a refletirem sobre as experiências vividas e seus relacionamentos com as questões teóricas a serem
abordadas. Outro ponto de vista que favorece tal atividade, diz respeito à atenção que a mesma desperta na
comunidade. Esta passa a poder incorporar uma nova forma de compreender e valorizar a escola ou a
universidade, pela sua aproximação, fundamentada e viabilizada com base em outras características (SILVA &
COSTA, 1999).
190

2%

31%
26%
24% 76%

17%

Falta de engajamento, entendimento, informação, conhecimento, clareza e participação


Dificuldade com a mobilidade dos alunos
Dificuldade de implantação,execução de projetos coletivos
Falta de recursos materiais e humanos e apoio institucional
Falta de tempo, formação,informação, para engajamento dos recursos humanos

Gráfico 31 - Distribuição percentual das dificuldades encontradas pelas instituições de


ensino que desenvolvem projetos em Educação Ambiental, segundo declaração dos
sujeitos.

Contudo, esta dificuldade não incide como uma das mais significativas, o que pode ser

interpretado sob dois enfoques. Por um lado, pode haver uma articulação sólida nas

instituições que desenvolvem a prática do estudo do meio, de tal modo, que a mesma não

consista em um aspecto que entrave aos projetos ou às discussões para a prática educativa

ambiental. Sob outro enfoque, há a possibilidade de que os projetos, que sejam praticados nas

instituições de ensino, não tenham como prática a saída a campo. Se esta prática não se

efetiva, ou se a mobilidade com os alunos fica restrita aos espaços intra-escolares, as

dificuldades inerentes ao estudo do meio podem acabar sendo minimizadas e menos

ressaltadas.

Outra situação apontada pelos docentes, diz respeito à falta de engajamento,

participação, clareza, conhecimento e entendimento centrados na figura do professor. Esta

condição, se faz presente como uma crítica dos docentes aos seus parceiros institucionais e, ao
191

nosso ver, sobre si mesmos, enquanto pertencentes à equipe de professores componentes

destas instituições. Neste caso, a falta de engajamento, ora prejudica a participação e a

atuação em projetos coletivos, ora é resultado do desconhecimento e da falta de entendimento

sobre o tema, o que também impactará, negativamente, sobre os projetos em EA. Tal postura,

sinaliza para uma resistência ao novo, ao desafio do coletivo, ao que necessita mobilização e

remobilização de tempo, valores e conhecimentos.

A implantação e a execução de projetos coletivos são também elementos destacados

pelos sujeitos, como dificuldades advindas das experiências institucionais em projetos de EA.

Em relação a estes aspectos, cabe observar a Tabela 10, a qual reflete o modo como o trabalho

é realizado nas instituições de ensino que possuem projetos. Não diferenciamos, neste estudo,

o tratamento aos termos interdisciplinar e multidisciplinar. Nos remetemos a apresentá-los,

tais como, foram sugeridos pelos professores, ou seja, sem distingui-los.

Tabela 10 - Conformação dos projetos existentes nas instituições de ensino, segundo a


integração dos sujeitos.

Forma como o trabalho é realizado N %


Em equipe interdisciplinar/multidisciplinar 22 56.4
Em equipe disciplinar 8 20.5
Individual 7 17.9
Não sabe 1 2.6
Não respondeu 1 2.6
Total 39 100.0
Base: Professores que trabalham em instituições que desenvolvem algum projeto em EA.

Nas instituições que desenvolvem os projetos em EA, aqueles que são realizados de

forma individual, se apresentam em quantidade bastante próxima, aos executados por equipes

disciplinares. Estas duas formas somadas, por sua vez, aproximam-se dos valores registrados,

em projetos realizados por equipe inter/multidisciplinar. Todavia, cabe ressaltar, que mais da

metade dos projetos é executada de forma inter/multidisciplinar, demonstrando um possível


192

avanço na integração entre diferentes sujeitos, nas instituições de ensino, para realização da

EA. Esta conformação, afirma uma característica básica da EA: seu caráter

inter/multidisciplinar. Tal característica, em nossa compreensão, ainda não está totalmente

disseminada. No entanto, as incidências ora registradas sugerem indícios, de que a mesma

começa a se destacar na proposição/execução de projetos em EA. Ainda assim, verificamos

que as dificuldades do trabalho em equipe podem ser tomadas como um obstáculo relevante

para o avanço de projetos institucionais, que necessitem da participação coletiva dos docentes,

desde a sua implantação (Gráfico 31, p.177).

As condições apontadas no Capítulo 3 deste trabalho, tais como: excesso de turmas,

itinerância entre escolas, precarização de contratação, salários aviltados, entre outros,

interferem de modo efetivo e negativo sobre todos os projetos que tenham características

inter/multidisciplinares, entre eles os voltados para a Educação Ambiental.

Além desses aspectos, os professores também destacaram a falta de tempo, de

informação e engajamento como características que dificultam a constituição dos projetos

apontados. Mais uma vez, as condições aventadas no parágrafo anterior devem repercutir

fortemente para tal situação. Neste caso, os professores explicitaram de forma mais direta o

que lhes falta. Esta ausência, por sua vez, impacta sobre a possibilidade de consolidação dos

projetos coletivos. A falta de engajamento ora verificada não é uma causa, mas sim, uma

decorrência da falta do tempo e de informação/formação para o trabalho docente com a EA.

Também foram apontados pelos sujeitos aspectos relacionados à falta de recursos

materiais e humanos e do apoio institucional necessário ao desenvolvimento de projetos em

EA, naquelas instituições de ensino que possuem tais iniciativas. A Tabela 11 demonstra

como a questão do apoio institucional impacta nos projetos reconhecidos. Verificamos que

não são todas as instituições, segundo apontado pelos docentes, que conferem apoio aos
193

projetos em EA existentes. Se ainda considerarmos a questão da carência de recursos

materiais e humanos, esta situação se torna mais grave.

Tabela 11 - Posicionamento dos sujeitos em relação à existência de apoio das instituições


de ensino aos projetos de EA ocorrentes nas mesmas.

Existência de apoio da instituição


na qual atua para projetos educativos ambientais N %
Sim 30 76.9
Não 5 12.8
Não sabe 3 7.7
Não respondeu 1 2.6
Total 39 100.0
Base: Professores que trabalham em instituições que desenvolvem algum projeto em EA.

Os problemas registrados não são exclusivos ou excludentes, eles podem ocorrer de

forma combinada em algumas instituições. Isto nos faz crer que as dificuldades encontradas

pelos sujeitos em relação ao desenvolvimento de projetos institucionais em EA não são

poucas. A falta de apoio material e de recursos humanos ocorre em nível institucional, no

ambiente escolar, mas deriva da inserção do mesmo no contexto educacional geral. Quando

há carência de verbas e de pessoal na instituição de ensino, isto reflete a política educacional

adotada pelos gestores político-administrativos hierarquicamente superiores. Por outro lado, a

falta de apoio institucional também se faz presente pela baixa valorização e reconhecimento,

por parte destes gestores, em relação às atividades docentes como um todo e, igualmente, às

que trazem consigo práticas educativas inovadoras. Não somente os valores individuais ou de

grupos e categorias específicas estão em jogo. Também os impactos desses valores são

confrontados com outras concepções e interesses existentes no tecido social e, defendidos por

grupos hegemônicos que se contrapõem às mudanças pleiteadas ou respondem às suas

demandas de forma apenas parcial. Tais dificuldades acabam por fornecer pistas, para
194

vislumbrarmos algumas das razões, para a quantidade de projetos institucionais bem inferior

ao desejo e interesse dos docentes em participar de grupos e projetos voltados para a EA.

Da mesma forma como buscamos captar as dificuldades presentes na realização de

projetos institucionais existentes voltados para a EA, solicitamos a todos os docentes que

apontassem possíveis entraves para implantação de projetos em EA pelas instituições em

geral. O Gráfico 32 demonstra a distribuição das dificuldades citadas pela maioria dos

docentes.

2%
29%

34%
20% 78%

15%

Dificuldades pela falta de interesse/engajamento/envolvimento/vontade/clareza/posição

Dificuldades de realização de Trabalho de Campo

Dificuldade na capacitação/qualificação de professores, no trabalho em equipes/projetos inter-


multidisciplinares
Dificuldades pela falta de recursos materiais e falta de incentivo/apoio institucional

Dificuldades pela falta de tempo/horários/espaços

Gráfico 32 - Distribuição percentual das dificuldades enfrentadas pelas instituições de


ensino para desenvolver projetos em Educação Ambiental, segundo indicação dos
sujeitos.

Constatamos que a distribuição ora configurada é muito próxima à registrada


anteriormente no Gráfico 31, embora no mesmo somente estivessem presentes as dificuldades
apontadas pelos docentes cujas instituições desenvolvem projetos em EA. Em função das
respostas advindas, com o Gráfico 32, evidenciamos haver uma similaridade entre o grupo de
problemas apresentados e, mesmo, uma proximidade proporcional na incidência destes, em
relação aos já observados no Gráfico 31.
195

No Gráfico 32 é possível verificar que três ordens de dificuldades correspondem a 78

% das situações indicadas: a) falta de tempos, horários e espaços; b) falta de recursos

materiais e de incentivo institucional; c) falta de capacitação e qualificação de professores

para o trabalho em equipes e projetos inter/multidisciplinares. Este percentual aproxima-se,

muito, do registrado no Gráfico 31 (um total de 76%) e, ao considerarmos as respostas dos

sujeitos vinculados a instituições de ensino que desenvolviam projetos em Educação

Ambiental, constatamos também uma proximidade temática: a) falta de tempo,

informação/formação para engajamento de recursos humanos; b) falta de recursos materiais

e humanos e de apoio institucional; d) dificuldade de implantação ou de execução de projetos

coletivos. Além disto, dificuldades na realização de trabalhos de campo (2%) e falta de

interesse, envolvimento, engajamento, clareza, vontade e posição dos professores (20%)

incidem, de forma assemelhada, aos entraves indicados no Gráfico 31, referentes às

dificuldades com a mobilidade dos alunos (2%) e com a falta de engajamento, entendimento,

conhecimento, informação, clareza e participação dos professores (24%).

Os docentes não se colocam à parte dos problemas e, mais ainda, não assumem uma

posição que desconsidere que nem todos têm interesse em se engajar de forma efetiva em

projetos de EA. Outrossim, também possuem clareza em relação aos obstáculos que persistem

na implantação e execução de projetos em EA. Estes, em nossa concepção, ao incidirem

expressivamente nas indicações dos professores, têm que ser superados ou diminuídos, para

que os interesses manifestados em participar de projetos coletivos em EA possam continuar se

efetivando. Quando projetos coletivos se instalam e se ampliam podem ter força de congregar

inclusive aos sujeitos menos participativos e mais resistentes às mudanças. Pelo menos para

os sujeitos em questão, já existem indicações de participações em projetos institucionais de 22

sujeitos (Tabela 8). Se levarmos em conta que 69 professores (Tabela 7) manifestaram

predisposição de se engajar, coletivamente, em discussões e projetos de Educação Ambiental,


196

concluímos que há potencial para, pelo menos, triplicar a participação dos mesmos nas

práticas docentes voltadas para a EA.

Tal ação não se faz sem que investiguemos que problemas são os mais sentidos, nas

diferentes das realidades cotidianas vividas. Estes problemas podem se distinguir ou se

combinar, mas a discussão dos mesmos não pode ser ignorada, se realmente há a pretensão de

concretizar experiências duradouras em EA.

O Gráfico 33 nos dá algumas outras indicações a respeito dos impactos das

dificuldades aludidas pelos professores, segundo o maior nível de atuação dos mesmos nas

diferentes redes de ensino. Nesta discussão, os testemunhos dos professores e professoras,

advindos das entrevistas nos servirão como apoio para concatenar aspectos dos cotidianos

vividos pelos mesmos.

100%
80%
60%
40%
20%
0%
Universitário Médio Fundamental

Dificuldades pela falta de tempo/horários/espaços

Dificuldades pela falta de recursos materiais e falta de incentivo/apoio institucional

Dificuldade na capacitação/qualificação de professores, no trabalho em equipes/projetos inter-


multidisciplinares
Dificuldades de realização de Trabalho de Campo

Dificuldades pela falta de interesse/engajamento/envolvimento/vontade/clareza/posição

Gráfico 33 - Distribuição percentual das dificuldades apresentadas pelos sujeitos,


segundo maior nível de atuação dos mesmos.
As dificuldades relacionadas à falta de tempo, horários e espaços incidem de forma

evidente entre os professores que realizam seu maior nível de atuação no ensino básico.
197

Todavia, tais dificuldades, não deixam de ser apontadas, em menor proporção, pelos

professores que atuam no nível superior. Cabe ressaltar, que foi no ensino fundamental que as

questões de falta de tempo, horários e espaços se fizeram mais presentes. Estas questões se

relacionam, em nosso entendimento, à sobrecarga de trabalho hoje vivida pelos docentes que

militam no ensino básico, agravada pelas situações que obstaculizam os encontros dos

mesmos entre si, visando a constituição de equipes integradas nos planejamentos e ações

pedagógicos. Nas entrevistas com os sujeitos, pudemos constatar falas que se direcionaram,

fortemente para esta condição. No encadeamento discursivo, dois pólos vão se fazendo

nítidos: a) ele, professor, com seus anseios, seus modelos, imagens, valores e aquilo que foi

apropriado das informações provenientes da formação ou de atualizações; b) de outro a

escola, com seus limites e exigências concretos. São várias as passagens que traduzem tais

preocupações. Por hora, selecionamos duas como representativas desta ordem de

argumentação:

Eu acho que o que faz o professor se isolar não é a auto-suficiência, não! O


que faz se isolar é... é a forma de se trabalhar dentro da escola mesmo! O
dia-a-dia, a correria, a falta de tempo... O professor hoje em dia não tem
tempo pra planejar. E se você não planeja você não faz um trabalho melhor.
[...] e se o professor não tem tempo para se dedicar a estudo e planejamento,
o trabalho dele também fica repetitivo!... Eu tenho sentido muito isso!... É
diferente quando a gente, realmente, tem possibilidade de suspender aula,
planejar com pessoas da tua disciplina, montar um projeto, aprofundar
aquilo, avaliar para recomeçar. (Professor 1).
Eu tenho facilidade, por exemplo, esse ano fiz uma dobra na escola. Então
eu trabalhava só nessa escola! Então só de você não ter que estar se
locomovendo de um lado pro outro, isso já facilita.... Então só fico lá! Então
como eu fico mais dias, você acaba participando muito mais de tudo que
ocorre na escola. Agora, tem colegas que vão lá duas vezes por semana...
Né?... E... tem, trabalham em outra escola, três, quatro, cinco. [...] Um monte
de escolas, tem gente que tem particular! Então fica muito difícil! Eu vejo
isso. [...] Que eu vejo assim... Até colegas que... “Poxa, é legal, isso é legal!
Pô mas, tô sem tempo” e tal... Pode ser falta de compromisso das pessoas,
mas eu acho que tem a ver com essa questão de você estar com a carga
muito pesada. As pessoas estão muito, é... sobrecarregadas mesmo!
(Professor 2).
Com as peculiaridades de cada sujeito entrevemos, de modo invariante em todas as

entrevistas, indícios do reconhecimento de uma sobrecarga de trabalho que automatiza as


198

ações, esvaziando-as da prática reflexiva e prazerosa. O discurso oficial proclama a

irresponsabilidade ou o descompromisso dos profissionais que não se envolvem como as

ações ou programas das escolas. “Pode ser”, diz o Professor 2, numa clara restrição ao que é

proclamado. As narrativas, ainda que não explicitando uma crítica organizada, permitem

captar, nas frases inconclusas ou nas disjunções de tempo, pessoa e lugar, os antagonismos

dos sujeitos.

O que advogamos, e que a viabilidade de projetos e experiências em EA perpassa pelo

estabelecimento de condições institucionais para estes encontros, com a criação de espaços-

tempos, continuamente voltados para o desenvolvimento de tais projetos. A prática educativa

ambiental é mais que uma simples soma de tarefas, transformando-se em um amplo projeto.

Ações isoladas não configuram EA que, como projeto, deve possibilitar, aos sujeitos,

atividades e ações tecidas sobre o mundo vivido. Deste modo, a mesma não se resume a um

programa curto, exigindo continuidade, persistência e interações múltiplas.

Também foram indicadas dificuldades decorrentes da falta de recursos materiais e de

incentivo/apoio institucional. Estas dificuldades se fizeram presentes em todos os níveis de

ensino, sendo as mais pronunciadas. Refletem uma situação da educação brasileira como um

todo, marcada pela carência de investimentos no setor educacional, que afeta os anseios e

projetos realizados em qualquer dos níveis de ensino. Porém, de modo mais minucioso,

podemos verificar que a falta de recursos e de apoio institucional parece incidir de forma

mais pronunciada no nível médio. Esta condição pode ser creditada ao desequilíbrio nos

investimentos promovidos nos últimos anos em relação ao ensino básico, priorizando, através

do Fundef, o ensino fundamental em detrimento do ensino médio. Ao longo das

verbalizações, os sujeitos ao compararem o ensino fundamental e o médio ressaltam sempre

as dificuldades encontradas neste último, para levar a cabo um processo razoável de ensino,

embora isto não queira dizer que as condições do primeiro tenham sido otimizadas.
199

Nós já até pensamos, lá na escola, porque na época a gente até concorreria


num projeto do Instituto Aírton Senna... A escola concorreria a ganhar um
certo número de computadores, jogos infantis, coisa e tal... Simplesmente, a
própria instituição em que nós trabalhamos não deu incentivo em termos de
material!... [...] É, a escola do Estado, em termos de ambiental, para trabalho
é praticamente nulo, nos mapas disponíveis nas escolas ainda existe a União
Soviética!... [...] Ensino Médio, se eu quero pegar algum material, muitas
vezes eu pego na escola particular e levo o material para lá... Material que
não é meu! Trabalho lá e devolvo... Muitas vezes há falta de material... Tem
que pegar de outra escola para levar para o Estado, para eles [alunos]
poderem ter algum suporte de trabalho... (Professor 8).

Não que as condições no ensino fundamental sejam excelentes, mas, pelo menos,

segundo o posicionamento dos sujeitos ora investigados, neste nível de ensino não se destaca,

prioritariamente, tal carência. Inclusive, encontramos testemunhos sobre condições materiais

de instituições de ensino municipais, consideradas como razoáveis. A forma utilizada, no

entanto, para expressar estas condições, dá indícios de uma luta ou de esforços desusados: “a

gente consegue...” Em conseqüência, chamamos a atenção para insistência com que afirmam

ter conseguido pessoalmente algo, que deveria ser assumido pelo próprio poder público.

Isso para o professor do município do Rio já não é o problema não! A gente


consegue! [...] A gente consegue muita coisa. A gente consegue entrada
gratuita... A gente consegue material dentro da própria escola... A gente
consegue o fornecimento de material de parceiros... Estrutura não é tanto o
problema não (Professor 1).
Lá em Búzios, este ano, criaram uma casa que se chama [...] que é o
CEAPED (Centro de Aprimoramento Profissional de Educação). Tem
diversos vídeos, videoteca, livros... [...] É... Infra-estrutura não falta. O único
problema que nós tivemos lá este ano é que a escola ficou o ano inteiro em
obras! Mas a Secretaria de Educação tem um objetivo legal de estar sempre
aparelhando a gente, renovando, reciclando (Professor 9).

Outro aspecto emergente das dificuldades para realizar projetos de EA em instituições

de ensino se refere à questão da capacitação/qualificação de professores, no trabalho em

equipes e projetos inter/multidisciplinares. Tal dificuldade foi a que incidiu de modo mais

proeminente no ensino fundamental, mas sua presença nos níveis médio e superior também

foi significativa. Para o nível fundamental, obteve o mesmo peso das dificuldades materiais e

de apoio institucional. Para o nível médio é o segundo aspecto mais aludido. Por sua vez, no
200

ensino superior, a questão da capacitação/qualificação ficou pouco atrás da carência material

e de apoio institucional, refluindo para o tempo de graduação como se a mesma ainda

possuísse uma lacuna em relação à EA. Esta lacuna, em verdade, acaba por refletir-se para os

professores que atuam em todos os níveis. Deste modo, a incorporação da Educação

Ambiental revela uma necessidade reconhecida pelos próprios professores em se qualificar

para o trabalho coletivo com esta novidade não incorporada durante sua formação básica e,

ainda, pouco integrada às práticas docentes atuais.

Eu não sei se é a falta de preparo ou se é a falta de tempo! Acho que são as


duas coisas.... [...] estudar meio ambiente numa graduação, seja de biologia,
de ecologia, de geografia, é uma coisa! E trabalhar educação ambiental nas
escolas, é outra!... A gente não é preparado para trabalhar educação
ambiental... A gente tem que preparar ainda... Aí que eu falei que é uma das
dificuldades. A gente não foi preparado na graduação de geografia para
trabalhar educação ambiental! A gente teve sempre uma curiosidade, tentou
buscar algumas teorias, mas a gente ainda não tem essa prática. Eu acho que
há muita novidade nisso, em buscar essa prática, até sozinho mesmo!
(Professor 1).
Eu acho que existem questões de base que dificultam o trabalho da geografia
nessa questão ambiental! É um campo aberto para o profissional de
geografia. Agora eu percebo, por exemplo, quando eu quero trabalhar algum
assunto nessa parte de educação ambiental, me pergunto: será que eu vou
saber passar isto? Será que eu tenho conteúdo lá da geografia física para
trabalhar isto? [...] Eu acho que tem uma questão da metodologia do
professor, uma questão metodológica que a gente sente falta (Professor 3).
Olha, eu acho que falta muito a caminhar para trabalhar melhor esta
perspectiva ligada à educação ambiental mesmo, eu percebo...Ainda não
tem dentro da grade curricular nenhuma disciplina, nem obrigatória nem
eletiva, que trate deste conteúdo, com algumas práticas, algumas ações
ligadas a este conteúdo, especificamente. O que acontece é que dependendo
de cada professor, a perspectiva que ele adota de tentar trabalhar certos
temas... O Espaço Brasileiro, quando o aluno faz esta disciplina ele já tem
uma base de geografia física como climatologia, pedologia, geologia etc. Ele
já tem esta bagagem básica, o que agente faz ali é trazer estas noções básicas
e entendê-las dentro do contexto físico brasileiro e fazer uma associação com
o processo de ocupação que ocorre no território brasileiro... É claro,
privilegiando as peculiaridades das regiões brasileiras, seus condicionantes,
e entendendo as diferentes formas de ocupação, as diferentes formas de
associação e relação e os problemas decorrentes destes processos que hoje
nós estamos presenciando aí... E na medida do possível, discutir o ponto de
vista da legislação, das medidas de proteção ambiental, da fiscalização...
(Professor 10).
Como caminho para afirmação da própria positividade no exercício da profissão ou

para se distinguir dos demais, os sujeitos, com freqüência, elencam uma série de ações, ou de
201

tentativas para mostrar o próprio esforço no que concerne à EA. Se levarmos em conta que

nas diferentes instituições educacionais existem, na atualidade, outras ações inovadoras que

vêm sendo discutidas e incorporadas, em maior ou menor intensidade, podemos entender

como os sujeitos inseridos nestes contextos educacionais acabam se dividindo, se

fragmentando e, muitas vezes, passam a colocar suas prioridades específicas em choque ou

acima das discussões de projetos institucionais coletivos.

Cabe ressaltar, que o aspecto do trabalho inter/multidisciplinar ser apontado reflete um

entendimento dos docentes sobre características inerentes da EA, discutidas e defendidas por

muitos daqueles que acreditam na sua importância e relevância. Mesmo nas Universidades

esta questão ainda é obstaculizada pela fragmentação do saber, pela especialização exagerada

e pela falta de articulação de projetos e equipes. Muitas vezes, iniciativas se superpõem sem

que seus empreendedores tenham sequer informação sobre o que está ocorrendo ou sejam

convocados a integrarem seus esforços. Nega-se, assim, um princípio educacional básico: não

é a multiplicação paralela de ações que redundará na efetividade da formação. Ainda que não

seja invariante, a consideração desta questão está presente, de forma alusiva ou não, na maior

parte das entrevistas. Encontramos falas que abordam este problema de forma bastante clara:

Olha a integração não é só em relação ao meio ambiente... Quando a gente


fala em multidisciplinaridade na escola é sempre só ouvir falar... Todos os
assuntos, o professor fica muito independente do outro e cada vez é mais
difícil. Este ano, por exemplo, a gente não sabe nem os dias de reunião. Mas
tipo... o relacionamento de um professor com o outro é muito difícil, você
chega na escola na hora da aula, então você vai para a sala e você só sai
quando acabou a aula, ai você tem outra escola para ir ou já é tarde, vai para
casa e aí o relacionamento, o momento de integração entre as disciplinas, tá
cada vez mais difícil. [...] Qualquer interdisciplinaridade fica abalada com
isso (Professor 5).
Os professores que se formam...Eu acho que teria ainda um caminhar. A
gente só vai dar um passo realmente representativo quando houver um
trabalho em equipe, em grupo. Por que o que acontece hoje em dia? É muito
raro que os colegas tenham noção, o departamento é um departamento
pequeno, com vinte professores e, mesmo assim, a gente não tem a noção
exata do campo de trabalho, das abordagens que cada um utiliza dentro da
sua pesquisa [...] os conteúdos trabalhados, dependendo do professor [...]
Então, é difícil ter uma noção. Acaba ficando cada um enclausurado no seu
trabalho. Agora é que estão se abrindo um pouco mais para trabalhos em
202

equipe. E, até mesmo, como uma resposta às pressões dos órgãos de


fomento. Semana passada, nós fechamos um projeto com o CNPq que está
abrindo linhas de equipamento para as pesquisas, priorizando as pesquisas
realizadas por grupos às pesquisas individuais que, até recentemente, eram o
que acontecia dentro da academia. Isso faz interagir muito e, hoje em dia, o
que está sendo priorizado externamente salta destes grupos e não só por estes
órgãos, mas a própria Faperj, e também dentro da universidade é dado
estímulo para trabalhos em equipe, envolvendo professores e alunos de
diferentes áreas e formações. [...] é um processo que eu ainda acho lento
porque as pessoas acabam se tornando especialistas dentro da academia, em
alguma área da Geografia, e acabam verticalizando dentro daquele conteúdo,
quando, na verdade, deveria ser priorizado o corte horizontal. As pessoas
têm que começar a se falarem, estabelecer uma comunicação para garantir
uma interação maior entre os colegas, com trocas de experiências, de
abordagens, de perspectiva de visões e, não apenas dentro da Geografia. Isso
é uma coisa independente de ser dentro da área física e ambiental ou da área
humana. Eu acho que a Geografia ainda é extremamente endógena, é difícil
agente ver pessoas que aceitam ou utilizam contribuições de pesquisadores
de outras áreas, como Ciências Sociais, História, Planejamento Urbano...A
gente tem que começar a ler contribuições de outras ciências,
principalmente, na área ambiental que é muito vasta (Professor 10).

No ensino básico, a carência dos encontros e a falta de apoio e valorização da

qualificação do professor também entravam a constituição de trabalhos coletivos duradouros.

Até para conseguir liberação para freqüentar cursos de “capacitação”, os professores têm sua

vida dificultada pela excessiva necessidade de cobrir as aulas, em salas muitas vezes lotadas

de alunos ou em diferentes lugares onde trabalham. Tal situação demonstra que a formação de

equipes inter-multidisciplinares e, mesmo das disciplinares, leva e exige tempo e espaço

adequados, apoio, incentivo, valorização material e institucional, além, é claro, do esforço

pessoal para a continuidade dos trabalhos.

Eu acho que você não é professor só de uma instituição... De segunda a


segunda, preso em sala de aula... Aí entra a questão do tempo, tempo de
reciclagem! Eu sinto necessidade de fazer um curso de reciclagem, mas você
não tem tempo para isso! Você tem que se virar para o auto-sustento!
Concomitantemente, você vai ficando defasado em relação... Qual a tua
saída? A Internet! Te pergunto: o que existe na Internet pronto para o
professor de geografia, com relação, por exemplo, a área de educação
ambiental? (Professor 7).
203

Esta é uma dificuldade que perpassa todos os níveis e, para superá-la, a formação ou a

qualificação dos docentes deveria incorporar estas exigências e suas nuanças. A questão de o

professor ter, como profissional, necessidade de fazer face às exigências da própria

sobrevivência é um aspecto que não pode ser esquecido, quando se pensa em aprimoramento.

A dificuldade de realização do trabalho de campo foi apontada pelos professores que

têm seu maior nível de atuação nos níveis superior e médio. Esta preocupação não foi

refletida no grupo que atua no nível fundamental. A atividade de campo é tida como essencial

nos cursos de graduação em Geografia e, geralmente, é planejada como culminância de alguns

cursos ou disciplinas. Possui implicações que, muitas vezes, transcendem a ida ao campo em

si. Conforme já discutimos, dela podem derivar outras idas, pesquisas, estudos, projetos e

parcerias extensionistas. Igualmente, implica custos que se inserem no contexto marcado

pelas dificuldades de apoio institucional e material. Sua incidência diminuta no ensino básico

dá pistas para inferirmos que tal prática é pouco executada. Ainda mais, se levarmos em conta

que o conjunto das dificuldades apontadas revela barreiras para os encontros disciplinares e

inter/multidisciplinares que promovem a possibilidade de planejamento coletivo da atividade

de campo. Um dos professores que atua em instituição pública de ensino médio apontou que:

Mas a própria instituição que tem dinheiro não repassa! Porque dinheiro
existe! Eles é que não repassam... Por exemplo, ano passado e ano retrasado
nós fizemos trabalho de campo em Itatiaia, a sede da instituição na véspera,
depois de já termos recolhido parte do dinheiro... ficaram interessados, mas,
na véspera, disseram que não teria ônibus! Eu tive que tirar dinheiro do meu
bolso e outro professor também para que a gente não decepcionasse os
alunos. Fomos e assim, em termos de comportamento, foi dez! Saímos com
90 alunos! Foi um trabalho muito bom, muito bom mesmo! (Professor 8).

Conseguir que as atividades que fogem ao convencional e alteram a rotina do ensino

restrito às quatro paredes sejam realmente apoiadas pelos pares e incentivadas pelas

instituições é outro desafio. Este dificilmente se concretiza por iniciativas individuais. Além

disso, exige dos professores o entendimento de que reveses acontecerão, mas o empenho em
204

estabelecer acordos e parcerias institucionais é a saída para que tais ações possam se dar de

forma menos isolada e esporádica, conquistando seu espaço não só com outros profissionais,

como também com os alunos e as comunidades.

Por fim, em relação às dificuldades para viabilizar projetos em EA nas instituições de

ensino, foram apontados a falta de interesse, engajamento, envolvimento, vontade, clareza e

posição. Tais dificuldades estão presentes em todos os níveis de ensino. Verificamos haver

uma gradação que demarca uma incidência que decresce do ensino superior para o médio e

deste para o fundamental. Entendemos que no nível superior a diversidade e a fragmentação

das pesquisas instituídas, dilui a EA, enquanto tema de estudo, num universo diversificado de

aspectos. Por sua vez, demonstra que projetos que poderiam incorporar a dimensão educativa

ambiental ainda não o fazem, por falta de clareza daqueles que os promovem e, mesmo de um

desinteresse e desconhecimento dos professores sobre a importância de tal perspectiva.

Olha, sinceramente, dentro da Universidade esta parte esteve em falta... Eu


acho que a gente trabalha muito com temas teóricos, pouco práticos, alguns
até... Eu me lembro, tinha um embrião de projeto de educação ambiental...
No último ano fiquei até com esperança! Quando a gente fez a prática de
ensino nós fizemos este incentivo... (Professor 8).
Por exemplo, na minha formação eu tive... um semestre de educação
ambiental. Apenas um semestre. [...] Foi produtivo, mas eu acho pouco
(Professor 4).

No ensino básico, ao nosso entender, a fragmentação se dá de outra forma. Não se faz

pela pesquisa, mas pelos conteúdos e currículos disciplinares, muitas vezes, abordados de

forma rígida e desarticulada, caracterizando uma dependência quase inflexível em relação aos

mesmos. Embora as práticas normativas e reguladoras e os valores nos quais as mesmas se

baseiam estejam presentes e exerçam uma influência marcante, a dependência é, por vezes,

rompida, demonstrando que os professores atuam de modo astuto, tentando mediar situações

e, a partir delas abrir outras perspectivas.


205

A grade obriga. Você tem que cumprir a grade. Aquela turma tem que
receber seis tempos de Língua Portuguesa e só três de Geografia, três de
ciências e três de história... A Geografia tem um mínimo necessário. Eu não
posso ficar só em ambiente, ambiente, ambiente!... Você pega o pessoal de
Geografia... A coisa parece que vicia um pouco, sabe? Você entra na escola,
a preocupação é: “Eu tenho que segurar meu aluno dentro de sala, trabalhar
conteúdo, avaliar os conteúdos, lançar os conceitos na secretaria. Dispensar
na hora certa” ... (Professor 1)
[...] A gente fala da questão ambiental dentro do programa de Geografia,
mas a gente não tem alguma coisa diretamente voltada para a Educação
Ambiental. A Biologia, por exemplo, tem. A Biologia tem “Biologia e
Programa de Saúde”, e a gente poderia ter Geografia e dentro da grade
curricular a Educação Ambiental. Que a gente até fizesse uma parceria com
os biólogos, não é se apropriar, seria até interessante, mas a gente não tem
(Professor 3).
Num primeiro momento, avaliando, assim, a questão da educação eu acho
que, por ser mais abrangente a gente pega todos os currículos de todas as
disciplinas, tem muita coisa que precisa ser mudada. Muita coisa que está
sendo ensinada precisa ser repensada, até o óbvio que está sendo passado
para os alunos. [...] existe uma preocupação, o que não existe é uma
preocupação contínua. Efetiva, dentro do currículo, onde as crianças, jovens
trabalhem isso (Professor 4).

A questão dos conteúdos e dos currículos fragmentados e rígidos foi abordada com

preocupação por outros docentes.

Pelo que eu falei, da articulação...e, e até dentro do próprio currículo


fechado. Né? A gente que começa a ampliar, né? essa questão. Sobre a
educação ambiental, eu acho que é pouco trabalhado nas escolas. Você não
acha que é pouco trabalhado nas escolas? Eu acho que é, tipo assim, a gente
acaba se prendendo a cumprir o currículo. E aquilo (a EA) não está ali como
relevante no currículo. É o jogo de cintura que eu te falei que a gente tem
que ter. Né? Cada turma é um caso. Até o currículo pode ser o mesmo, mas
você acaba trabalhando de forma diferente (Professor 2)
[...] o conteúdo que a gente vê, cada série você tem um conteúdo e nessa
relação de conteúdo você não tem muito desta coisa dentro do conteúdo, a
não ser na 5ª série, onde você tem um plano geral da geografia, então você
até pode tocar bastante nisso. Em termos de 6ª série os conteúdos são
voltados para o Brasil, as regiões e os problemas, se pode colocar os
problemas ambientais também, então ainda tem um lance maior para voltar e
lembrar disto. Quando você chega na 7ª série você v6e a América e na 8ª vê
o mundo, isso tá ligado, com relação ao mundo existe, mas aí nós ficamos
voltados para o conteúdo da matéria e deixamos isto (a EA) de lado. [...] Eu
acho, eu acho...! que assim, fica claro que você trabalha com isso ou aquilo
da forma que achar melhor. Existe uma preocupação que eu tenho no
magistério com o aluno que sai daqui e vai para outra escola. Existe um
conteúdo que é comum e ele precisa. Ele não pode ter uma discrepância tão
grande, aqui ele aprende uma coisa e lá outra, completamente diferente. Por
este motivo, a gente segue, mais ou menos, as regras do jogo. Agora se entra
algo aí você age da maneira que você achar melhor, mas sem extrapolar
muito porque, certas escolas por aí não entram muito nessa coisa de...é
206

porque certas coisas você cria, cria projetos de acordo com a sua realidade e
com o seu momento, o que você acha que naquele momento é importante e
você acha que é melhor. (Professor 6).

Não que a fragmentação de conteúdos inexista no ensino superior. Todavia, as

tentativas de superar a rigidez em relação à mesma e, as necessidades e as possibilidades, cada

vez mais prementes, de ultrapassar a estas especializações e fragmentações vêm sendo

discutidas de forma ampliada, nos últimos anos, neste nível. Da mesma forma, não estamos

afirmando que os docentes do ensino básico não venham buscando superar tais

fragmentações.

Eu tive uma dificuldade de trabalhar com os colegas de geografia porque


eles não se sentiam a vontade para lidar com o tema. Então eu tive uma
ligação maior, por incrível que pareça com o pessoal de ciências, porque ali,
por exemplo, pegavam-se aspectos geográficos dos alunos... Aí você tem
que fazer uma ponte entre elas (Professor 9).

Todavia, as dificuldades nas condições de trabalho no ensino básico, principalmente

aquelas relativas à valorização dos tempos-espaços de encontro são quase impeditivas.

Enquanto nas IES existem condições de apoio e estímulo ao desenvolvimento da pesquisa e

da extensão, com tempos-espaços destinados especificamente ao planejamento e execução

destas atividades e ainda, valorização das mesmas no âmbito da carreira acadêmica, no ensino

básico os docentes se ocupam, quase que exclusivamente, pelas atividades de ensino, em sala

de aula, dentro das condições de trabalho e valorização profissional já mencionadas.

Conforme já observamos, a questão do apoio institucional incipiente inclui a situação do

retorno salarial e dos incentivos aos docentes que se qualificam e realizam trabalhos

inovadores.

Por outro lado, há coisas que fazem você não querer tomar partido na
instituição, ou seja, eu queria conseguir um laboratório para geografia!... Eu
não consigo isto. Por que? A falta de espaço, ou seja, você tem a sala, mas só
coloca aluno lá dentro, mas não tem mais sala. O espaço é só para botar
aluno dentro, mas não pode ser para um laboratório de geografia, está
entendendo? (Professor 7).
207

[...] Agora, o que eu acho também é que, eu pelo menos, quando era do
município, eu sentia falta de um apoio da própria secretaria municipal de
educação, em termos de liberação, de valorização do professor por estas
iniciativas: Se lê, faz um curso, ele faz um aprimoramento, ele está
investindo o tempo e o dinheiro dele e você não tem, muitas vezes, um apoio
concreto da SME e acaba sendo sobrecarregado!... Quando você consegue
um diploma de pós-graduação a incorporação não sai de imediato. Você tem
que demorar, tem que esperar... Não sei quanto tempo. [...] Eu acho que se o
professor tem uma iniciativa destas, tem que ter uma compensação em
algum lugar, como nós também. Você, claro, sai de uma dissertação de
mestrado porque quer ampliar os seus conhecimentos, você quer estabelecer
novos campos de discussão, se enriquecer profissionalmente, mas você, na
universidade, sabe que tem um apoio institucional, de uma liberação de
carga horária, seria este espaço... Você sabe que isto depois vai ser
convertido em ganho salarial efetivo, então dizer que estamos falando de
fome de saber... É claro que tem este lado, mas tem o outro lado da
valorização, de ser reconhecido e, o ganho salarial efetivo é parte desta
valorização te reconhecendo (Professor 10).

Estas diferenças discriminam e inferiorizam os trabalhadores por não contemplarem a

necessidade de propiciar situações contínuas de valorização do saber escolar, contribuindo

também para a diminuição de seu investimento e engajamento nas atividades e projetos que

carecem de trabalho coletivo para se estabelecerem de forma efetiva.

Aí vem outra questão, dentro da geografia. Aquela coisa da comparação da


educação e de fato tem um certo ranço nisto. Quem era voltado para a
licenciatura, como diz o João Rua [professor de geografia]: ensino pobre e
ensino nobre. Então, os geógrafos que vão trabalhar nas universidades,
pesquisas e tal e, o restante a “ralé”, que vai trabalhar com ensino no
fundamental e médio. Eu acho que a educação ambiental ainda sofre este
preconceito, quer dizer, por um lado o trabalho tá aberto pra gente, tá na
mídia direto, fala disto o tempo todo [...]. Por outro lado, dentro da nossa
área tem um certo preconceito, porque é educação, preconceito porque tem
que trabalhar integrada geografia física e humana, tem que trabalhar com o
fundamental e médio e, são poucas as pessoas que a gente vê nas faculdades
(Professor 3).
Coisa que eu escutava na faculdade, assim o engenheiro, o biólogo, todo
mundo menospreza a categoria magistério, quando você volta a falar com
esses profissionais você vê que eles ainda têm isso tudo na cabeça, porque
para eles o professor é aquele inferior que vai dar aula. [...] Em cursos, eles
ficam surpresos de saber que os professores tinham condições de fazer
trabalhos tão bons (Professor 5).

A conformação ora verificada permite constatar, para o grupo em questão, que apesar

de todas as dificuldades, os docentes do ensino básico apontam que não são a falta de

interesse, engajamento, envolvimento, vontade, clareza e posição os principais obstáculos a


208

serem transpostos na constituição coletiva da prática educativa ambiental. Situações

específicas da inserção do magistério na divisão social e política do trabalho, além de

preconceitos e discriminações acerca da incorporação de novas perspectivas pedagógicas de

ação impactam diretamente na elaboração, implantação e execução das iniciativas voltadas

para a EA. Os mesmos não podem ser ignorados, pelo contrário, devem ser amplamente

discutidos, relativizados e tomados em articulação às outras dificuldades.

É a resistência, é como por exemplo uma escola informatizada e querer


introduzir projetos ligados à informática, existe resistência. Primeiro porque
muitos não dominam a tecnologia e segundo porque têm que sentar e estudar
determinado programa para você utilizar. Então com a Educação Ambiental
também tem que ter conhecimento, principalmente de como as áreas se
interpenetram para você poder fazer algum projeto, se não fica um trabalho
de biologia, da geografia, dá... E não é isso! (Professor 8).

Os próprios professores mostram-se preocupados em relação a proporem saídas para

diversos problemas, na direção de realizarem trabalhos e projetos coletivos de qualidade, pois

captam a complexidade envolvida na questão. Em meio a hesitações, disjunções de tempo,

pessoa, lugar e temática específica vão construindo uma imagem considerada positiva do

professor, como aquele que integra a novidade, caracterizada nos projetos e cria ou se

aproveita das condições para que esta se concretize. Nesta articulação, está uma ambigüidade

forte, com freqüência camuflada e negada: as condições existem e ele pode se aproveitar das

mesmas ou elas não existem e é ele quem as deve criar? Ao longo dos discursos, estas

imagens vão sendo questionadas pelo próprio sujeito na lembrança das normas e, mais

profundamente, dos valores que delimitam seus espaços-tempos-relações profissionais. Tal

configuração assume as características de estilo e a história de cada um, mas é uma

invariância nestes casos.

Como eu tava falando, eu acho que seria o profissional poder ficar mais
tempo em um só local de trabalho, com isso o salário teria que permitir isso,
de não ter que se dividir o seu tempo em outras escolas, com outras turmas.
E, você teria mais profissionais dentro dessa mesma escola, porque se eu vou
ter mais tempo com a minha turma, eu vou precisar de outros professores, e
com isso, eu vou poder me integrar mais com eles. E um acompanhamento
209

maior de fora também! Porque a gente fica só entre as 4 paredes da escola.


Mesmo que você tenha vários profissionais de geografia, fica uma coisa um
pouco fechada. Você precisa ter também as pessoas de fora que vão integrar
um pouco, fazer uma parceria... [...] Se eu tiver menos turmas, mais
profissionais trabalhando comigo, e mais integração com profissionais fora
da escola, eu não ia ficar tão presa só a isso... A gente ia conseguir trocar e
planejar muito mais, caminhar muito mais a nível de projetos. [...] Agora, é
difícil saber. Né? Se andaria exatamente dessa forma. Trabalhar em menos
locais, mais tempo, melhor salário, mais profissionais, mais integração com
outros profissionais... Se seria, né? O suficiente pra você andar melhor com
esses assuntos, com esses projetos dentro da escola... O que surgiu pra
causar dúvida é o que acontece atualmente. E o que acontece atualmente é
bem diferente disso. Uma grande mudança. Por isso que eu falei que isso
talvez seja uma utopia. Porque tudo concorre pra você ter cada vez menos
tempo com aquele grupo de alunos. Já houve tempo em que a disciplina
tinha muito mais tempo na grade. Já houve tempo em que a dupla regência
nem existia. O professor trabalhava em uma escola só (Professor 1).

Outra tática muito presente, como forma de garantir coerência e fluidez discursiva

àquele que fala, é o recurso a frases feitas que se ajuntam dando um efeito de certeza e o aval

de que esta certeza reflete idéias, noções, modelos e símbolos aceitos pelo interlocutor. O

recurso a lugares comuns, gerais ou específicos a um campo profissional, deixa entrever a

incerteza, a insegurança e a dificuldade de expressão do sujeito sobre aquilo que fala ou que

pretende desenvolver.

[Falta] Um trabalho efetivamente transdisciplinar, no sentido mais amplo da


palavra. Isto eu também sinto falta e tenho buscado, na medida do possível,
ler contribuições dentro da área das Ciências Sociais, dentro do próprio
IPPUR, e até de outras regiões. Eu acho que o caminho seria... O problema é
que a universidade, quer dizer, o nosso departamento, já queria fazer
independente do convênio que o governo do Estado estabeleceu com a
UERJ, que era de promover cursos temáticos para professores. Foi uma
iniciativa que surgiu espontaneamente, independente do estabelecido... E
uma das funções não é só produzir conhecimentos, é evoluir no campo das
ciências geográficas e disseminar isto internamente ou para os nossos alunos
de pós-graduação. Mas também levar para aquelas pessoas que se afastaram
da academia e que estão atuando em sala de aula, levando conhecimento
geográfico para crianças e jovens. Este profissional a gente tem que trazer de
volta para a academia! Ele tem que participar! Sair do pedestal como se
tivesse as receitas e as fórmulas de sucesso e começar a ver o dia-a-dia, a
realidade nua e crua destes professores, em termos de relatos e experiências,
que procura fazer apesar de tantas dificuldades dentro de uma realidade de
recursos diferente da universidade. Então, o desafio também é para ter esse
profissional, não para que ele aprenda conosco, mas para que eles também
possam nos ensinar, nosso processo de aprendizado não é uma via só, é uma
via de mão-dupla. Eu acho que o professor do ensino básico, quando percebe
que há uma proposta para executar, que ele possa, efetivamente, colocar no
210

dia-a-dia dele, ele tem interesse sim! Eu acho que ele tem fôlego para isso
sim! (Professor 10).

Buscando averiguar como a questão dos espaços-tempos interfere não somente nas

dificuldades, mas também na forma como os professores aventam a finalidade da EA, cabe

observar o Gráfico 34. Podemos constatar que a incidência das diferentes finalidades

apontadas pelos docentes, parece assumir uma gradação, inclusive em relação aos que não

quiseram se posicionar a respeito da finalidade da EA. O grupo de professores que se insere

no nível fundamental com maior nível de atuação proporcionou-nos maior incidência de

posicionamento da Educação Ambiental como voltada Para conscientizar a população e os

alunos da importância da conservação, preservação e não-degradação, por ações no

particular e no mundo.

Essa forma de compreender a finalidade da EA tem sua incidência diminuída,

progressivamente, quando levamos em conta os sujeitos que possuem como maiores níveis de

atuação o médio e o superior. O entendimento da EA voltada Para a cidadania e a mudança

de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral possui menor variação entre os

níveis de ensino, mas apresenta-se em proporção de ligeiro destaque no ensino básico. Em

relação ao nível superior, divide a maior incidência com a finalidade baseada na Integração

de novos significados às práticas sociais, ampliando-as de forma crítica.

Essa finalidade, por sua vez, obteve proporções que decrescem do nível universitário

para o nível fundamental, embora esteja presente em todos os níveis de ensino. A proporção

das finalidades da EA parece se inverter entre os docentes que se diferenciam por maior nível

de atuação entre os níveis superior e fundamental. Chamamos a atenção de que no nível

médio, justamente para os propósitos de Conscientizar a população e os alunos para a

conservação, preservação e não-degradação [...] e de Integrar novos significados às práticas

sociais [...] há uma proximidade na distribuição. Sendo assim, os propósitos da EA calcados


211

na [...] Cidadania e nos valores, em discurso geral tornam-se os de maior incidência para

aqueles professores que possuem este nível como o maior em suas atuações. O mesmo não se

verifica entre os níveis superior e fundamental. A incorporação de novos significados é,

relativamente, mais expressiva entre os docentes que atuam no nível superior. Com isso não

afirmamos que os docentes do nível fundamental não tenham apontado para tal caminho.

Todavia, foi entre os professores que atuam no nível fundamental que a incidência de

posicionamentos voltados para a preservação e não-degradação mais se destacou.

100%

80%

60%

40%

20%

0%
Universitário Médio Fundamental
Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação, preservação e não degradação por
ações no particular e no mundo
Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma crítica

Não respondeu

Gráfico 34 - Distribuição percentual dos sujeitos, por maior nível de ensino onde atuam,
segundo finalidade atribuída a EA.

Ocorre como se a incorporação da novidade aportada pela EA se expressasse de modo

distinto. Ora segue posturas que assumem, para a questão ambiental, valores e práticas

sociais de forma crítica, abrindo um escopo mais amplo e explícito para a incorporação. De

forma diferenciada, há valores voltados para ações muito específicas, cujos aspectos se

baseiam num ponto de partida que é a conscientização para a relação homem-presevação-


212

natureza. Talvez uma outra gradação seja estabelecida. Nesta, no ensino superior, com maior

ênfase não há uma limitação em degradar ou não degradar. O que se apresenta é uma

discussão sobre valores mais amplos, que influenciam, entre outros aspectos, o degradar ou

não degradar. Para o nível fundamental, quiçá haja uma trilha inicial de sensibilização. Tal

trilha é aberta a partir de aspectos concretos e impactantes no meio ambiente que conduziriam

a ações focalizadas nestes próprios aspectos.

Outrossim, em função do tempo de magistério e sua relação com os propósitos

apontados pelos professores, coube constituir o Gráfico 35. O mesmo demonstra não existir

um padrão na atribuição das finalidades da EA, mas sim nuanças relativas a alguns grupos de

tempo de magistério. O propósito de Conscientizar a população e os alunos da importância

da conservação, preservação e não degradação, por ações no particular e no mundo se

destaca nos primeiros anos de magistério, principalmente nos grupos que se encontram nos

primeiros quinze (15) anos, e volta a se destacar no grupo que se situa entre os vinte e seis

(26) e os trinta (30) anos de magistério. Tal finalidade parece ter uma resistência ao tempo e

no tempo, estando presente em todas os grupos registrados.

A idéia de a EA servir Para integrar novos significados às práticas sociais,

ampliando-as de uma forma crítica se destacou entre os docentes que se encontram nos

primeiros dez (10) anos de magistério e voltou a se pronunciar, com menos ênfase, entre os

docentes que perfazem dezesseis (16) a vinte (20) anos de atuação no magistério. Esta

finalidade não foi aludida pelos sujeitos a partir dos vinte e um (21) anos de magistério.

Interessante constatar que as quedas relativas a esta finalidade parecem contrapor-se às altas

relativas ao propósito da EA voltado para Conscientizar a população e os alunos para a

conservação, preservação [...]. Talvez incorporar novos significados adquira uma dimensão

que atue dialogicamente em relação ao sentido de conscientizar a população e os alunos sobre

não-degradar.
213

14

12

10

0
0-5 anos 6-10 anos 11-15 anos 16-20 anos 21-25 anos 26-30 anos Acima de 30
-2

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma


crítica
Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso
geral
Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação,
preservação e não degradação por ações no particular e no mundo

Gráfico 35 - Distribuição dos sujeitos, segundo finalidade indicada para a EA, levando
em consideração os tempos de magistério apontados pelos mesmos.

Entre os sujeitos que se encontram nos primeiros vinte (20) anos de magistério, as

ocorrências a respeito do entendimento sobre a EA como sendo voltada Para a cidadania e a

mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso geral, acompanham os

crescimentos das duas outras curvas representativas das demais finalidades apontadas. Para os

sujeitos com mais anos de magistério, a finalidade que engloba, explicitamente, cidadania e

valores possui tendência em decrescer sem desaparecer. Por conseguinte, a diminuição da

incidência de tal finalidade aproxima-se, enquanto tendência geral, daquela que se configurou

entre os sujeitos que apontaram Para a integração de novos significados às práticas [...]. Por

outro lado, diferencia-se da mesma ao continuar mantendo registros entre os docentes com

mais de vinte anos de magistério, possuindo, inclusive, incidências maiores que as outras duas

finalidades apontadas, conforme podemos verificar para os grupos entre vinte e um (21) e
214

vinte e cinco (25) anos e, acima de trinta (30) anos de magistério. Deste modo, há um

decréscimo de respostas centradas na cidadania, na mudança de valores e na ética, enquanto

propósito indicado para a EA, entre os professores com mais de vinte (20) anos de magistério.

Tal situação, porém, não significa que o mesmo propósito seja, totalmente, abandonado pelos

professores.

No que diz respeito ao posicionamento dos sujeitos sobre como promover a

aproximação entre o ensino de Geografia e a EA, também realizamos cruzamentos entre este

aspecto e as inserções dos mesmos, por maior nível de ensino. O Gráfico 36 demonstra a

distribuição dos sujeitos sobre a forma de associar o ensino da Geografia a EA, levando em

conta seus maiores níveis de atuação.

A Consideração dos significados do Meio Ambiente é, predominantemente, apontada

pelo sujeitos cujas maiores inserções no magistério situam-se nos níveis médio e superior.

Esta posição suscita levar em contar a incorporação e o entendimento da polissemia sobre o

Meio Ambiente na configuração da relação entre o ensino da Geografia e a prática educativa

ambiental. O eixo do Meio Ambiente se faz, deste modo, bem mais presente entre os que

atuam em níveis de ensino mais elevados. Dá-se, possivelmente, pela incorporação destes

significados, de forma crítica, às práticas sociais. Por sua vez, para os sujeitos que centraram

a associação do EA-ensino da Geografia no eixo Geografia, podemos averiguar algumas

nuanças, demonstrando que embora focalizem tal associação no campo de saber da sua

formação, não necessariamente caminham de forma homogênea para tecê-la.

A Consideração do Espaço Geográfico se destaca entre os sujeitos dos ensinos médio

e fundamental. Isto demonstra que tal aspecto, característico do discurso geográfico, se faz

presente como elo de ligação para a prática cotidiana do ensino básico em termos de educação

ambiental. Incide como se os professores de Geografia, inseridos nestes níveis de ensino,

partissem explicitamente do espaço geográfico para estabelecer nós de articulação com a EA.
215

Não que os docentes que atuam no nível superior desprezem este tradicional embasamento da

Geografia. Contudo, outras nuanças, menos específicas, foram privilegiadas pelos mesmos.

Pela consideração dos


significados do Meio
Ambiente
14
Pela consideração do
Pela consideração da 12
Espaço Geográfico
sustentabilidade
10
8
6
4
2
Pela consideração da Pela consideração da
utilização da natureza 0 relação homem/meio e
pelo homem sociedade/natureza

Pela consideração dos


elementos da natureza
Pelo base teórica da
Geografia e seus
procedimentos
Pela articulação
necessária entre
conceitos e cidadania

Universitário Médio Fundamental

Gráfico 36 - Distribuição dos sujeitos, associando a relação entre o ensino de Geografia e


a EA ao maior nível de ensino onde atuam.

No que se refere à Consideração da relação homem-meio, sociedade-natureza,

observamos haver grande mudança entre os sujeitos, demonstrada através da distribuição por

níveis de ensino. Nesta consideração se tece o fio condutor que obteve maior incidência entre

os docentes que atuam exclusivamente no nível fundamental. A mesma reflete uma tentativa

de articular o social e o natural, revelando, no entanto, que tal separação causa preocupação e

se faz presente. Incide, possivelmente, em articulação com as idéias de Conscientizar para a

preservação e não-degradação, por ações no particular e no mundo.


216

Interessante ressaltar que tanto a relação constituída pelo espaço geográfico quanto

esta, a partir do binômio homem-meio, são utilizadas em livros didáticos de geografia quase

com um jargão. O risco de significarem panacéias que funcionariam como soluções para o

entendimento de todos os aspectos e problemas sociais, pode constituí-los em discurso

idealizado. Os professores situados no ensino médio não registraram, no grupo ora estudado,

um posicionamento que destacasse o binômio sociedade-natureza. Já aqueles docentes

inseridos em suas atuações no nível superior, centraram suas posições entorno deste aspecto.

Tal referência pode refletir-se em dois caminhos opostos, o do reconhecimento da dicotomia

ou o da tentativa de constituir um trabalho centrado na concepção dialógica. Juntamente com

a Incorporação dos significados do Meio Ambiente, este foi o posicionamento mais presente

no nível universitário. De algum modo, revela que mesmo entre os que tecem o enredo da

EA-ensino de Geografia a partir desta perspectiva, a possibilidade de existirem nuanças não

deve ser descartada.

A Base teórica da Geografia e seus procedimentos demarca outro posicionamento dos

sujeitos a respeito da relação ensino de Geografia-EA. Neste aspecto, mais uma vez, os

professores que possuem o nível médio como maior nível de atuação se destacam nas

referências. A questão dos conceitos e práticas próprias da Geografia é ressaltada pelos

mesmos. Tais docentes tentam evidenciar a relação, focalizando-a na teoria e nos

instrumentos geográficos. Este entendimento nos parece mais amplo e diversificado que

aqueles centrados no espaço geográfico e na relação sociedade-natureza. Por outro lado, não

deixa de ser um caminho pautado e fundamentado, nos seus passos iniciais, de forma centrada

na Geografia. Embora se manifeste de forma menos expressiva, tal caminho não é

desconsiderado pelos docentes que possuem seu maior nível de atuação no ensino

fundamental ou no ensino superior. Cabe ressaltar que sua incidência é semelhante, em ambos

os níveis.
217

Para os sujeitos que, no eixo da Geografia, apontaram que a associação entre seu

ensino e a EA se dá pela Articulação necessária entre conceitos e cidadania, dá-se uma

tentativa de expressar e concretizar, na prática, os elementos teorizados pela Geografia. A

mesma tentativa não incide com igual proeminência que as demais, demonstrando que a

incorporação de tais práticas é algo incipiente e, possivelmente, novo na Geografia. Deste

modo, não foi um aspecto indicado pelos professores que atuam no ensino fundamental.

Com isso não estamos afirmando que a cidadania seja uma dimensão desprezada pelos

docentes que atuam exclusivamente no ensino fundamental. Mas, a articulação entre os

conceitos oriundos da Geografia e a mesma não foi aventada como caminho para relacionar o

seu ensino e a EA. De forma pouco diferenciada, esta perspectiva tem nos níveis superior e

médio pequena incidência, o que, ao nosso entendimento, corrobora a tendência de que a

incorporação de forma reduzida do propósito de articular conceitos geográficos e práticas

voltadas para a cidadania ainda é uma tônica.

A Consideração dos elementos da natureza foi destacada, principalmente pelos

professores do ensino fundamental. Se estes sujeitos não apontaram para a articulação

anterior, foram quase os únicos a indicar os elementos da natureza na articulação ensino da

Geografia-EA. Por outro lado, os docentes inseridos no nível superior não apresentaram

posicionamentos nesta perspectiva e os professores que têm no ensino médio seu maior nível

de atuação, também pouco consideraram esta forma de promover a associação em questão.

Ainda situada no eixo que centrou na Natureza a possibilidade de relacionar EA-

ensino de Geografia, podemos examinar que a Consideração da utilização da Natureza pelo

homem não obteve uma grande incidência, mas, de modo diferenciado ao apresentado para a

Consideração dos elementos da natureza, os sujeitos que mais apontam sua importância

trabalham no ensino universitário. Neste caso, um cunho utilitarista, centrado na apropriação

da natureza pelo homem parece nortear o significado atribuído ao relacionamento entre a EA


218

e o ensino de Geografia. Com reduzida incidência tal significado também ocorreu no ensino

básico. Deste modo, a Natureza se faz presente mas não se destaca como eixo de maior

significância para os sujeitos em questão e, mesmo quando é destacada surge circunscrita ao

contexto da sua utilização pelo homem ou da sua consideração centrada e fragmentada através

de elementos.

A questão da sustentabilidade foi outra que pudemos verificar nas indicações dos

sujeitos como caminho de articulação entre o ensino de Geografia e a Educação Ambiental.

Tal perspectiva foi exclusivamente apresentada pelos professores que possuem suas maiores

inserções trabalhando no ensino médio. Como já inferimos, a sustentabilidade começa a

ganhar contornos e a ser incorporada pelos professores. Além disso, nos chama a atenção que

apesar de termos alguns sujeitos do nível superior e fundamental já inseridos em projetos

voltados para a EA, coube exclusivamente aos professores do ensino médio a indicação do

aspecto e da perspectiva da Consideração da Sustentabilidade, como fio que liga o ensino da

Geografia a EA.

Embora as formas por si só não expliquem processos, elas nos fornecem pistas e

indícios de tendências, presenças e ausências que ajudam a caracterizá-los. Deste modo, os

aspectos assumidos pelas distribuições nos ajudam a entender tendências. O formato de asa

delta ou bumerangue assumido pela distribuição assemelhada a um polígono verificada no

ensino médio tem seus vértices apontados para a Consideração do Espaço Geográfico, a Base

teórica da Geografia e seus procedimentos e para a Sustentabilidade. Também merece

menção a presença dos Significados do Meio Ambiente. Tais aspectos, em nossa compreensão,

denotam uma incorporação lenta do novo sem perder o foco nas bases do conhecimento

oriundo da formação, das exigências e demandas cotidianas do trabalho como professor de

Geografia.
219

A forma poligonal estabelecida no nível fundamental tem seus vértices, por sua vez,

quase totalmente direcionados para a Geografia, sem incorporar um de seus possíveis

relacionamentos, o de seus conceitos com a cidadania. Em grande parte, assemelha-se a um

quadrilátero, mas foge ao mesmo pelas ocorrências no eixo da Natureza, através da

compreensão de seus elementos. Esta forma parece não incorporar de modo significativo aos

novos e emergentes aspectos da discussão sobre a EA na atualidade. Aventamos, que esta

conformação pode ser reflexo das situações de dificuldades já apontadas, anteriormente, pelos

professores deste nível de ensino (Gráfico 33, p.184). Tais dificuldades incidiram com grande

expressão em relação às carências de tempos/horários/espaços de encontro e de

capacitação/qualificação dos docentes para trabalho em projetos inter/multidisciplinares.

Também indicam possíveis trilhas percorridas para aproximar ensino de Geografia e EA,

através de aspectos e informações ecológicas circulantes e conhecidas, a respeito de impactos

ambientais e posturas preservacionistas e conservacionistas. No ensino superior, a forma

assemelhada a um polígono não deixa de se fazer presente. Todavia, destacamos os vértices

voltados para três aspectos centrados na Geografia, embora, nenhum deles registre

predomínio de caminho para associação entre EA e o ensino da Geografia. Outro eixo

privilegiado pelos docentes do nível superior, expressou-se nos Significados do Meio

Ambiente. No entanto, ficou demonstrado que tais significados são aventados sem que a

questão da sustentabilidade seja aludida. Por outro lado, a Natureza é indicada através de sua

forma de utilização pelo homem. Deste modo, o novo ganha contornos de incorporação, tendo

por fios o Meio Ambiente e a Geografia, de forma menos diversificada em comparação ao que

apreciamos no ensino médio.

Igualmente, o tempo de magistério foi alvo de nossa atenção. A associação do ensino

de Geografia com a EA relacionada ao tempo de magistério dos professores pode ser

verificada no Gráfico 37.


220

8 Pela consideração dos


significados do Meio Ambiente

7
Pela consideração do Espaço
Geográfico
6
Pela consideração da relação
5 homem/meio e
sociedade/natureza
Pelo base teórica da Geografia
4
e seus procedimentos

3 Pela articulação necessária


entre conceitos e cidadania
2
Pela consideração dos
elementos da natureza
1

Pela consideração da
0 utilização da natureza pelo
0-5 anos 6-10 11-15 16-20 21-25 26-30 Acima de homem
anos anos anos anos anos 30 Pela consideração da
sustentabilidade

Gráfico 37: Distribuição dos sujeitos, associando a relação entre o ensino de Geografia e
a EA ao tempo de magistério dos mesmos.

A Consideração dos significados do Meio Ambiente se fez mais incidente para os

docentes que se encontram nos primeiros vinte (20) anos de magistério, principalmente entre

aqueles que no momento da pesquisa possuíam de 16 a 20 anos de atuação como professores.

Em relação ao mesmo grupo, tal forma de se considerar a relação EA-ensino de Geografia

situa-se entre as mais indicadas. Acima deste período de tempo de magistério há uma queda

na incidência da Consideração dos significados do Meio Ambiente por parte dos professores.

Nas faixas de 21-26 anos e acima de 30 anos a mesma não foi se quer apontada.

A Consideração da relação homem-meio, sociedade-natureza foi indicada em todas as

faixas de tempo de exercício de magistério. Destacou-se entre os docentes na faixa de até 5

anos, na de 11-15 anos e na dos que possuem mais de 30 anos de atuação no magistério.

Manteve constância entre os professores de 16 e 30 anos de docência. Esta forma de

considerar a relação EA-ensino de Geografia, sustentada nos binômios retratados, embora não
221

predomine, exclusivamente, em nenhuma das faixas, é uma das que mais focaliza a

associação apontada.

A Consideração do Espaço Geográfico também se destacou na faixa de 11-15 anos

de magistério e foi indicada em todas as outras faixas com exceção da última, acima de 30

anos de docência, para a qual não houve registro de incidência. Este conceito centraliza a

relação EA-ensino de Geografia em quase todas as faixas de tempo de atuação, estando

presente, principalmente dos seis (6) aos vinte (20) anos de magistério. A Consideração da

Base teórica da Geografia e seus procedimentos possui registros entre os docentes que se

encontram nos primeiros 25 anos de magistério, mormente nas faixas de 6 a 20 anos de

docência. Entre os professores de 6 a 10 anos de magistério, esta forma de associação

Geografia-EA foi apontada como predominante. Deste modo, a Base teórica da Geografia e

seus procedimentos também focalizam, em grande importância, os caminhos entre o ensino da

Geografia e a EA.

A Articulação necessária entre conceitos e cidadania foi indicada pelos professores

em duas das faixas de tempo de atuação no magistério (de 11 a 15 e de 21 a 25 anos). Deste

modo, se fez bem menos presente na distribuição entre as faixas de atuação que as formas de

associação baseadas na Consideração dos elementos da natureza e na Utilização da natureza

pelo homem. Estas por sua vez, embora não tenham incidido em todos os períodos apontados,

caracterizaram-se por uma incidência dos elementos da natureza, principalmente, nas duas

últimas faixas de atuação e por uma constância na incidência da Consideração da utilização

da natureza pelo homem, nas quatro (4) primeiras faixas de tempo de atuação docente

aventadas. Com as duas outras incidências, considerando os elementos da natureza

evidenciados nas faixas de 6 a 15 anos, somente os docentes que possuem 21-25 anos de

magistério não focalizaram a Natureza como fio condutor da relação entre o ensino de

Geografia e a Educação Ambiental. Para os docentes situados na faixa acima de 30 anos, o


222

eixo da Natureza divide a predominância com o da Consideração homem-meio, sociedade-

natureza. Este aspecto demonstra que mesmo não sendo os que mais centralizam os caminhos

para associar a EA ao ensino da Geografia, os processos naturais ainda possuem incidência

efetiva entre os professores de Geografia pesquisados. A Consideração da Sustentabilidade se

fez presente de forma semelhante nas faixas de até 5 anos, de 11 a 20 anos e de 26 a 30 anos

de docência. Nos demais intervalos não aconteceram indicações dos professores em relação à

mesma. Em nenhum dos casos em que se faz presente, há predomínio desta consideração e, as

suas incidências assemelham-se as ocorrências registradas para os professores que centraram

a associação EA-ensino de Geografia na Natureza.

A distribuição dos posicionamentos dos sujeitos sobre a relação ensino de Geografia-

EA pelas faixas de tempo de magistério demonstra uma variedade de caminhos,

principalmente para os vinte primeiros anos de magistério. Todavia, as indicações centradas

nos eixos da Geografia e do Meio Ambiente incidem de forma mais constante. As indicações

relacionadas à Sustentabilidade e aos aspectos da Natureza não tiveram a mesma expressão.

Em nosso entendimento, dá-se uma diminuição do uso e da influência de aspectos, noções e

conceitos da denominada Geografia física e, uma pequena incorporação em relação à questão

da sustentabilidade e das discussões a ela associadas. Estas duas situações não são

antagônicas, mas podem se torna caminhos isolados, caso não sejam contextualizadas e

entendidas sob o viés da complexidade, em associação aos demais conceitos geográficos e de

outros campos de conhecimento. Os momentos diferenciados de formação e qualificação e as

distintas vivências dos professores aliados aos movimentos de mudança da Geografia e da

ciência e as diferentes posturas e matizes ideológicos estão refletidos nestes caminhos.

Permanências também se fazem presentes, evidenciando valores a respeito do ensino da

Geografia e da Educação Ambiental. As contradições existentes entre permanências e

mudanças acabam por se integrar, na atualidade, se levarmos em consideração que diferentes


223

gerações convivem, compartilham, disputam e estabelecem acordos para que as ações

cotidianas possam ser viabilizadas. Alguns caminhos predominam, outros têm seu espaço

diminuído e, há os que somente agora surgem em picadas.

Além de se posicionar sobre a EA em relação a si próprios, os sujeitos também

puderam apontar como se colocam outros sujeitos em relação à prática educativa ambiental.

Deste modo, questionamos se, em geral, os discursos voltados para a EA condizem com as

práticas no cotidiano escolar. Mais ainda, pudemos buscar o que os professores sentem como

sendo o pensamento das pessoas, em geral, sobre e EA. A Tabela 12 e o Gráfico 38 refletem,

respectivamente as respostas advindas das duas situações.

Como verificamos, a maior parte dos sujeitos não afirma existir coerência entre

discursos e práticas, em geral, nas ações do cotidiano escolar voltadas para a Educação

Ambiental. Ao contrário, poucos são os que admitem que a harmonização entre discurso e

prática seja efetivada. Os professores que indicam nem sempre, raramente ou não haver tal

coerência constituem mais de 80% dos sujeitos. Por sua vez, este quadro possui nexos com

aqueles abordados em relação ao reduzido número de professores e instituições que

desenvolvem projetos ou discussões voltados para a EA. Acreditamos que sem desenvolver

ou pôr em prática iniciativas, projetos e discussões duradouras sobre a EA, não há como se

estabelecer, cotidianamente, nas instituições de ensino a tão propagada coerência entre

discurso e prática. Entendemos que o discurso é também uma prática, mas por sua vez, o

mesmo necessita de fundamentação teórica e de concretização na experiência cotidiana, para

que se estabeleça de forma mais ou menos duradoura. Como isto é incipiente entre os

professores e, como os mesmos não estão fora do contexto, o que os docentes apontam para a

situação em geral é, também, reflexo das suas situações específicas.


224

Tabela 12: Posicionamento dos sujeitos a respeito da coerência, em geral, entre os


discursos e as práticas observados sobre a EA no cotidiano escolar.

Coerência entre discursos e práticas sobre a EA N %


Sim 4 4,4
Nem sempre 40 44,0
Raramente 20 22,0
Não 18 19,8
Não sabe 4 4,4
Não respondeu 5 5,5
Total 91 100,0

Em relação ao admitido pelos sujeitos como sendo o que as pessoas, em geral, pensam

sobre a Educação Ambiental, várias situações foram aludidas. Tais situações encontram-se

sintetizadas no Gráfico 38.

Entre as diversas impressões expressas pelos professores, podemos destacar a que

aponta que as pessoas, em geral, pensam a EA como algo distante do vivido, dando-lhe pouca

importância ou vinculando-a pouco a sua realidade. Esta posição dos professores aproxima-

se daquela expressa pelos mesmos em relação às dificuldades apresentadas para a discussão e

execução de projetos sobre a EA, centrada na falta de interesse e engajamento dos docentes.

Mas, também reflete a preocupação dos sujeitos, em relação às finalidades da EA, em

incorporar novos significados às práticas sociais e em conscientizar a população para a

importância da preservação e para a cidadania e mudança de valores.

Em meio a tantos problemas sociais, a EA não deve ser deslocada do contexto social e,

muito pelo contrário, somente poderá ser entendida na sua relevância, se for incorporada às

discussões estabelecidas no campo da educação que, por sua vez, se concretiza no tecido

social. Valorizar a dimensão ambiental na educação é assumir que a mesma não pode estar
225

ausente das discussões e deve ser associada a outras dimensões sócio, político, econômicas e

culturais que orientam as ações e os valores embutidos nas práticas dos sujeitos.

Pensam que é necessária, importante,mas


difícil na prática.

Pensam que é coisa de


ecologista,naturalista

Vêem como politicamente correto, como


34% 5% 3% salvadora/redentora
10%
Pensam ser importante para a
preservacão/conservação

Pensam como algo distante do


vivido/realidade, pouco importante,
conhecido ou vinculado.
18% Desconhece/nunca debateu/criticou a
pergunta
14% 11%
5%
Vêem como discurso
contraditório/confuso/dual/escamoteado

Não Respondeu

Gráfico 38 - Distribuição percentual dos posicionamentos dos sujeitos a respeito de como


pensam, em geral, as pessoas sobre a EA.

Igualmente, merecem destaque as impressões que apontaram que a população, em

geral, acha a EA importante e necessária, mas difícil de ser posta em prática. Esta

preocupação também encontra ligação com as idéias indicadas pelos docentes sobre ações no

particular e no geral (conservação, preservação e não-degradação), para ampliar as práticas

sociais e para a mudança de atitudes aventadas como forma de viabilizar as finalidades da

Educação Ambiental. Há, do mesmo modo, semelhança entre a finalidade aludida pelos

professores em relação à conservação e preservação e aquela aventada, pelos mesmos, ao

considerar que a população em geral, atribui a EA uma importância no sentido da

conservação/preservação. Não podemos ignorar que os professores também fazem parte da

população e, assim como, contribuem e influenciam as discussões sobre os diferentes temas


226

que compõem seus contextos sociais, são, da mesma forma, influenciados pelos

posicionamentos advindos de outros sujeitos integrantes destes contextos sociais.

Constatamos que alguns sujeitos centram sua impressão sobre o pensamento da

população a respeito da EA, como sendo algo praticado, de forma circunscrita, por um grupo

peculiar: os ecologistas. Esta seria uma forma específica de distanciamento e afastamento da

questão em relação ao cotidiano vivido pela maioria das pessoas. O tratamento da EA torna-se

algo fragmentado e um interesse particular de alguns especialistas ou ativistas, representados

como ecologistas. Além disto, encontramos posições que entendem que as pessoas, em geral,

vêem a EA como um discurso politicamente correto, uma prática redentora. Ou seja,

possuem uma visão idealizada sobre a Educação Ambiental. Nestas duas situações aventadas

para os posicionamentos dos sujeitos sobre o pensamento da população a respeito da EA,

verificamos como idéias deturpadas devem ser discutidas pelos professores e demais

interessados nas práticas educativas ambientais, para que as mesmas se tornem menos

específicas e fragmentadoras. A incorporação da dimensão ambiental nos diferentes contextos

sociais somente se viabiliza, quando posições idealizadas ou restringentes são,

gradativamente, questionadas e ações e práticas concretas são viabilizadas.

Alguns sujeitos preferiram não inferir sobre o que pensam as pessoas, em geral, a

respeito da EA. O posicionamento se deu de duas formas: não respondendo a questão (10%)

ou apontando, criticamente, que não poderiam responder a mesma, tendo em vista não terem

pesquisado sobre o assunto. Esta posição parece levar em conta o respeito sobre o que o outro

pensa, não admitindo concebê-lo antes de, efetivamente, sabê-lo. Por outro lado, houve

docentes que afirmaram ser a EA pensada pelas pessoas, em geral, como um discurso

escamoteador, contraditório e confuso. Tal postura, também reflete uma posição crítica sobre

a EA. Todavia, o foco da crítica não incide sobre o distanciamento em relação ao vivido, mas

ao papel que a EA desempenharia dificultando e escamoteando a apreensão deste vivido. Esta


227

posição parece restringir a EA a uma estratégia específica, pertencente a um grupo que busca

difundi-la, objetivando escamotear a realidade. Não nos parece ser este o entendimento dos

professores que se predispõem a discutir, implementar e realizar projetos e iniciativas

coletivas voltadas para a Educação Ambiental. A idéia de discussão coletiva não expurga as

posturas ideologizadas e alienantes, mas pode permitir sua explicitação e discussão crítica.

Neste sentido, debater a EA e se empenhar em realizar projetos coletivos que levem em conta

esta dimensão, pode ser uma forma de trazer à tona problemas sociais que envolvem, além da

dimensão ambiental, outras dimensões e são pelas mesmas envolvidos. Deste modo, evitam-

se as propostas fragmentadas de solução dos problemas sócio-ambientais e mesmo, o discurso

imobilizador que se nega a discutir os temas sociais por que já estabeleceu, a priori, o que é

ou não relevante, o que merece ou não ser discutido.

Buscando aprofundar um pouco mais esta discussão, tentamos averiguar como se

apresenta a relação entre as posições dos sujeitos deste trabalho, sobre a finalidade da EA e o

que os mesmos aventaram, como sendo aquilo que as pessoas, em geral, pensam sobre a

mesma. O Gráfico 39 presta-se a tal perspectiva.

É interessante observarmos, que mesmo docentes que não delinearam sua indicação

sobre a finalidade da EA nos dias de hoje, demonstraram seu posicionamento sobre seu

entendimento a respeito do que as pessoas, em geral, pensam sobre a EA. Os dois aspectos

que se fizeram presentes para os mesmos seguem a perspectiva do entendimento da população

em relação à EA como algo distanciado em relação ao vivido (quase 80% dos que não

apontaram a finalidade da EA) ou como algo voltado para a questão da preservação e

conservação. Os professores que não apontam a finalidade para a EA na atualidade, parecem

manter coerência com o distanciamento que atribuem a população para tal tema. Como já

afirmamos, os professores também somos parte da população. Também estamos sujeitos às

aproximações e aos distanciamentos em relação às discussões que constituem o tecido da


228

diversidade social. Dentro desta diversidade, possuímos valores e instrumentais teórico-

práticos diferenciados que nos permitem ações sobre tal diversidade. Mas, não deixamos de

ser influenciados pelos diferentes valores e instrumentos dos demais sujeitos, ora

incorporando novas perspectivas de ação, ora nos tornando resistentes às suas incorporações.

Há sempre deslocamentos e adaptações frentes às demandas diversificadas, oriundas da

dinâmica irregular da totalidade social.

Não respondeu

Para conscientizar a população e os alunos da importância da conservação,


preservação e não degradação por ações no particular e no mundo

Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e ética, colocados em discurso


geral

Para integrar novos significados às práticas sociais ampliando-as de uma forma


crítica

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90%100%

Pensam que é necessária, importante,mas difícil na prática.


Pensam que é coisa de ecologista,naturalista
Vêem como politicamente correto, como salvadora/redentora
Pensam ser importante para a preservacão/conservação
Pensam como algo distante do vivido/realidade, pouco importante, conhecido ou vinculado.
Desconhece/nunca debateu/criticou a pergunta
Vêem como discurso contraditório/confuso/dual/escamoteado
Não Respondeu

Gráfico 39 - Distribuição percentual da relação entre as finalidades apontadas pelos


professores para a Educação Ambiental e dos posicionamentos dos mesmos a respeito de
como pensam, em geral, as pessoas sobre a EA.

O posicionamento que apontou que a população, em geral, não pensa a EA como algo

próximo ou vinculado a sua realidade também possui incidência marcante em todos os grupos

que apresentaram alguma finalidade para a EA. Esta forma de entender o pensamento das

pessoas foi predominante em duas das finalidades da EA inferidas e dividiu a predominância


229

na outra. Tal conformação demonstra não haver um padrão nas respostas entre o que os

professores entendem como objetivos da EA e o que as pessoas pensam sobre a mesma. Com

isto, não estamos afirmando que haja uma separação entre tais aspectos. Pelo contrário,

entendemos que os docentes, inseridos no contexto sócio-cultural, não explicitam unicamente

seus pensamentos sobre a EA, mas também acoplam suas preocupações a respeito dos

pensamentos de outros sujeitos sobre o tema. Na busca de propostas que permitam que tais

sujeitos se posicionem e ajam frente às situações cotidianas, os mesmos incorporam nas suas

táticas formas de mobilizar o interesse de outros parceiros. Estas formas de mobilizar podem

partir inclusive de impressões críticas que os docentes tenham em relação aos outros sujeitos

da sociedade. Neste sentido, não nos causa surpresa quando o grupo que aponta para a

finalidade da EA voltada para a Integração de novos significados às práticas sociais,

ampliando-as de forma crítica seja também um dos que atribui à população, em geral, uma

impressão da EA como algo distante do vivido, pouco importante, conhecido ou vinculado.

Essa perspectiva de percebermos como os sujeitos entendem, de modo diversificado as

questões e processos sociais, pode ser averiguada se levarmos em conta que a idéia de

preservar/conservar não é somente atributo da população, em geral. A mesma se fez presente

entre as finalidades da EA apresentadas pelos próprios professores. Além disso, se

observarmos o Gráfico 39, poderemos verificar que tal concepção sobre o que pensa a

população, não se restringe aos docentes que apontam a finalidade da EA voltada,

principalmente Para a questão da preservação, conservação e não-degradação. O discurso

da preservação parece ter sido incorporado e faz parte das preocupações manifestadas pelos

professores de forma direta ou espelhada pela visão que possuem do outro.

A idéia de ser importante e necessária, mas difícil na prática também esteve presente

em todos as perspectivas inferidas em relação às finalidades da EA, principalmente para os

docentes que trabalharam com as perspectivas de mudança ou incorporação de novos


230

significados. É como se os sentidos de mudança ou de incorporação do novo se defrontassem,

de forma mais efetiva, com as barreiras ou dificuldades já existentes e com as resistências às

tentativas transformações em proposição. Os professores vivenciam isto, e quando são

questionados a respeito da finalidade da EA, apontam seu juízo em uma direção que adquira

significado concreto de superação para estas barreiras.

Outro aspecto que se fez presente foi o que situou o pensar da população em geral

sobre a finalidade da EA como coisa de ecologista/naturalista. Deste modo, a visão

discriminatória e redutora parece não ser desconhecida pelos sujeitos, independentemente da

perspectiva que os mesmos possuam sobre a EA. Tal aspecto não pode ser ignorado nas

discussões sobre a incorporação da dimensão ambiental na educação. A questão ecológica

deve ser concebida dentro do sistema social que a engendra, e cabe aos diferentes sujeitos

deste sistema, e não só aos ecologistas, discutir e decidir sobre as condições que sustentam e

estabelecem as relações sócio-ambientais nos diferentes lugares e momentos. A educação é

palco privilegiado para que tais discussões e para que tomadas de decisões sejam

fundamentadas. Além disso, observamos que os discursos politicamente corretos e as

soluções redentoras, não são indicados como pensamentos predominantes em relação à

população. Inclusive não foram apresentados pelos professores que apontam como finalidade

da EA a Integração novos significados às práticas sociais, de forma crítica. Tal crítica se faz

não somente aos padrões do que seria o politicamente correto, mas também ao que é

contraditório, escamoteador e confuso nas discussões sobre a EA. Deste modo, nos parece

que os grupos tentam chamar a atenção para aspectos que ainda existem de forma

fragmentada na sociedade, que ora se somam, ora se contrapõem e não podem ser ignorados

por projetos relativos a Educação Ambiental. Conforme já afirmamos, as populações que

participam de tais iniciativas não são folhas em branco, possuindo concepções mais ou menos

elaboradas desta questão que devem ser captadas, entendidas e trabalhadas, levando em conta
231

o jogo de complementaridades e contradições presentes nos significados atribuídos para cada

um dos temas conhecidos.

Desse modo, entendemos que se é através da ecologia que a questão ambiental adquire

significado para um grupo, não devemos criticá-lo por isso. Indo além devemos trabalhar no

intento de que outros sentidos sejam incorporados e discutidos por este grupo em relação ao

seu cotidiano e em comparação a outros cotidianos hodiernos. Sabemos, à luz da teoria das

representações sociais, que tal incorporação não será pura e nem isenta, já que terá implicada

a marca daquele grupo e do seu cotidiano nas questões a serem debatidas e postas em prática

pelo mesmo.

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS : um mapa a se fazer.

Em nosso trabalho, desde o início, caminhamos sem perder a compreensão de que as

práticas e sentidos atribuídos à EA pelos professores de Geografia, se associam aos momentos

acumulados e vividos pelos mesmos e às interações advindas dessas experiências de vida nos

espaços escolares e fora deles. A relação que investigamos baliza-se na absorção de uma

novidade, filtrada a partir das idéias e valores que cada um possui, mergulhadas no plasma das

experiências e vivências culturais, nas quais os diferentes sujeitos se inserem, influenciando

suas condutas e práticas.

Três foram os entendimentos, os emaranhados e as nuanças verificados a respeito da

utilidade atribuída a EA, pelos professores de Geografia, na atualidade.

Um grupo de professores conferiu como finalidade da EA Integrar novos significados

às práticas sociais, ampliando-as de uma forma crítica. Este grupo teceu uma alegação mais

complexa para a mesma, incluindo as práticas sociais, as subjetividades, as ações cotidianas, a

percepção ambiental e a superação do binômio sociedade-natureza, para além do espaço

escolar, como marcas comuns nas respostas evidenciadas.


232

Houve um segundo agrupamento que se pautou, principalmente, por vislumbrar na EA

uma prática educativa que se ofereceria Para a cidadania e a mudança de valores, atitudes e

ética. As argumentações desenvolvidas são colocadas em discurso generalizado, no qual a

idealização norteia alguns pensamentos, absolutizando-os sem concretiza-los. Teve como

tendência abordar a EA como uma grande saída ou solução de conscientização para questões

da sociedade e da educação.

O terceiro grupo também se identificou com a consideração da EA como um

instrumento de conscientização. O diferencial para o mesmo baseou-se no fato destes

professores concentrarem a justificativa para a EA em argumentos que se preocupam com a

preservação, a conservação, o respeito à natureza e às práticas sustentáveis, como finalidades

últimas. Tal caminho traduz-se numa Educação Ambiental voltada Para conscientizar a

população e os alunos da importância da conservação, preservação e não degradação, por

ações no particular e no mundo.

Em relação aos dois últimos agrupamentos, os professores tendem a atribuir à

população e aos alunos uma negatividade que lhes retira o atributo de consciência. Tal

situação, ao mesmo tempo, focaliza a positividade na preservação, na não-degradação e na

capacidade do docente de conscientizar os outros sujeitos, cujas práticas não levam em conta

tais aspectos.

No que diz respeito à relação entre ensino de Geografia e EA, um outro conjunto de

nuanças evidenciou-se. Ele é composto por eixos centrados na Geografia, no Meio Ambiente,

na Natureza e na Sustentabilidade.

A influência do conceito de Espaço Geográfico, é marcante nas respostas. Para vários

docentes, tal conceito, amplamente investigado em diferentes níveis de ensino, serviria como

base para o estabelecimento da relação EA-ensino de Geografia.


233

Um segundo agrupamento, que aponta para a constituição da relação EA-Geografia

através da Base teórica da Geografia e seus procedimentos, como uma fundamentação e

abordagem, possuidora de princípios, conteúdos e instrumentos que permitem ampla

articulação, seja com a EA, seja com temas afins, ou, de forma mais específica, com

preocupações com a Terra, a sociedade e o lugar.

Outro grupo de professores se aproxima ao atribuir à Consideração da relação

homem/meio e sociedade/natureza a base associativa entre o ensino de Geografia à EA. O

eixo de onde convergiram as respostas parte da Geografia ou da EA e sempre aponta

aproximações, diferenças e complementaridades pautadas nas relações binomiais sociedade-

natureza, homem-natureza ou homem-meio.

Há docentes que, visando associar EA-Geografia, conferem à cidadania o papel de

dimensão prática a ser associada à dimensão teórica dos conceitos geográficos, para sua

efetivação através da EA. Deste modo, a relação se dá Pela articulação necessária entre

conceitos e cidadania.

Ainda calcados no estudo do material obtido junto aos docentes, tecemos uma outra

perspectiva para a possibilidade de relação entre EA e o ensino da Geografia. Esta ocorre Pela

consideração dos significados do Meio Ambiente. A centralidade do meio ambiente é tomada

como algo fundamental, que deve ser incorporado, com seus significados, na interpretação

geográfica da relação sociedade-espaço.

A Natureza também é inferida pelos professores como forma de justificar a relação

entre o ensino da Geografia e a EA. São duas as nuanças presentes neste entendimento: A

consideração dos elementos da natureza e A consideração da utilização da natureza pelo

homem. Nestes dois casos, ora vigoram fragmentações baseadas em elementos naturais, ora se

estabelecem visões utilitaristas sobre a natureza como recurso.


234

Ocorre ainda, uma última nuança captada nas respostas analisadas, calcada em outra

concepção que possui também tons de novidade. A mesma introduz o aspecto da consciência

sustentável, Pela consideração da sustentabilidade.

Ainda que a maioria tenha centrado o fio condutor da relação na Geografia, este se

tece com nuanças, não excludentes e que podem ser articuladas em função de sua

possibilidade de embasamento teórico e de sua pertinência, enquanto abertura para

perspectivas de práticas.

Como já afirmamos, a conscientização da população e dos alunos, invariantemente

apresentada em discurso generalizado, garante a positividade do professor, permite sua

diferenciação em relação aos outros. Estes outros seriam os sujeitos a serem

“conscientizados”, como caminho necessário para superar a não conservação e a degradação,

carregadas de negatividade. Toda positividade é dirigida ao elemento conscientizador e às

ações, centradas na preservação e conservação, o que parece não incorporar, conforma já

afirmamos, uma concepção de Natureza como sistema aberto e ativo, composto por uma

totalidade complexa.

Os professores de Geografia investigados permitiram entrever indícios de que

focalizam, a partir de seus conhecimentos específicos nesse campo de conhecimento, a ponte

entre a EA e o ensino da Geografia. Esta focalização abre caminho para que os processos

representacionais de objetivação e ancoragem se dêem. Deste modo, as informações e as

novidades são filtradas por um direcionamento dos olhares que parte dos conhecimentos

prévios, definidos a partir de seus espaços profissional e pessoal específicos.

Esta constatação nos fez caminhar pelos conceitos geográficos, inferidos pelos

sujeitos, na aproximação entre ensino de Geografia e EA. Embora as indicações de cunho

naturalista tenham sido referenciadas em menor quantidade, ainda ocorre uma referência a

conceitos ou noções que enfatizam a fragmentação ou separação entre o caráter natural e


235

social. Todavia, vários docentes já fazem menção à utilização de noções menos dicotômicas

(sócio-ambientais).

Há persistências e emergências de posicionamentos, dotando os sentidos atribuídos à EA de

uma complexidade, na qual as representações possuem o velho e o novo, conjuntamente. Isto

pode ocorrer porque os valores e símbolos, inerentes a alguns grupos, são objetivados,

levando em conta que a manutenção de determinados discursos, em certas épocas, pode

causar menos problemas e enfrentamentos e, até mesmo, proporcionar vantagens imediatas.

A finalidade da EA ligada a preservação e não-degradação torna-se menos influente,

ao levarmos em conta as noções com ênfases sociais e sócio-ambientais. Para estas últimas,

destaca-se a Educação Ambiental com finalidade relacionada, principalmente, a Mudança de

valores, atitudes e ética. Chamamos a atenção, que esta mudança é proposta em termos de

discurso geral, demonstrando uma desvinculação entre a mesma e sua concretização através

de práticas cotidianas.

Já a idéia de novos significados ganha contornos associados ao entendimento da

articulação Geografia-Educação Ambiental, pela incorporação da dimensão social e sócio-

ambiental, em detrimento de concepções naturalizantes. Se a Educação Ambiental é aqui

tratada como uma concepção nova que vai sendo incorporada pelos sujeitos nas práticas

educativas por eles exercidas, a questão da Sustentabilidade é mais recente ainda, sendo

pouco explorada, mesmo nos meios acadêmicos que tentam difundi-la. Embora a idéia de

sustentabilidade esteja presente, ela vai ser objetivada, em maior proporção, através de noções

e conceitos que ora estão centrados nos elementos naturais e ora invertem a centralidade para

os processos sociais. Os juízos voltados para a conservação, preservação, não-degradação são

assimilados pelos sujeitos, mas a discussão a respeito da(s) sustentabilidade(s) ainda se mostra

distante.
236

Foi possível constatar, para o grupo em questão, que apesar do conjunto de

dificuldades, os docentes apontam que não são a falta de interesse, engajamento,

envolvimento, vontade, clareza e posição os principais obstáculos a serem transpostos na

constituição coletiva da prática educativa ambiental. Situações específicas da inserção do

magistério na divisão social e política do trabalho, além de preconceitos e discriminações

acerca da incorporação de novas perspectivas pedagógicas de ação impactam diretamente na

elaboração, implantação e execução das iniciativas voltadas para a EA. Os mesmos não

podem ser ignorados, pelo contrário, devem ser amplamente discutidos, relativizados e

tomados em articulação às outras dificuldades.

A despeito de toda a sorte de contratempos e sobrecargas de trabalho, grande parte dos

docentes possui interesse em participar de grupos que tenham a EA como tema de discussão.

Quando reunidos, os grupos que se voltaram para as finalidades [...] da cidadania e dos

valores e [...] dos novos significados às práticas sociais findam por predominar entre os que

se dispõem a participar de discussões sobre a EA. Esses dois grupos, em maior condição de

concretização, acabam por diferenciar os sujeitos que possuem interesse em participar de

discussões coletivas sobre a EA, daqueles que realizaram indicações negativas sobre tal

proposição. Para estes últimos, constatamos haver uma apreensão da temática educativa

ambiental, mais dependente dos elementos naturais.

A questão dos valores e dos novos significados traduz uma diferença. Embora os

processos naturais não sejam desprezados, eles não incidem com a expressão observada nos

outros dois grupos. Tal aspecto pode indicar um desvio em relação à naturalização das

posturas e dos discursos educativos sobre o meio ambiente. Além disso, a novidade trazida

pelo eixo da Sustentabilidade, somente é aportada por estes sujeitos, o que não deixa de

constituir uma significação nova no tratamento da questão ambiental.


237

Menos de um terço dos sujeitos desta pesquisa pertence a grupos ou projetos que

centram sua perspectiva na EA. Há uma lacuna entre o desejo de participar destes grupos e a

possibilidade atual de investimento para sua efetivação. Em relação ao grupo de professores

investigados, o espaço-tempo do ensino formal é o que mais acaba sendo aproveitado e

concretizado com tal objetivo. Entendemos esta configuração como uma possibilidade que

deve ser potencializada, para a realização de projetos em Educação Ambiental. Deste modo,

sugerimos que o espaço das instituições de ensino é potencializador para os alunos e também

para os professores que além do desejo, cotidianamente, encontram desafios que demandam a

ampliação da criatividade no planejamento e na execução das atividades educativas.

Mesmo sendo proclamada por órgãos de imprensa, por eventos educativos, por

movimentos sociais, a Educação Ambiental é ainda uma novidade nas instituições de ensino.

É uma novidade no campo das práticas concretas na escola, concorrendo com uma gama

variada de outras novidades. De acordo com o que evidenciamos, há também uma gama de

polarizações a seu respeito, dentro e fora do ambiente escolar. Tais polarizações são

resultantes possíveis das inserções diferenciadas dos sujeitos nas culturas e das táticas

desenvolvidas, pelos mesmos, para cada um dos contextos vividos. Resultam de sínteses,

retrocessos e avanços, compartilhados ou não, de uma novidade, entre outras, no emaranhado

dos espaços-tempos-relações.

Averiguamos que a incorporação de novos significados é, relativamente, mais

expressiva entre os docentes que atuam no nível superior. Com isso não afirmamos que os

docentes do nível fundamental não tenham apontado para tal caminho. Todavia, estes últimos

voltaram-se de forma mais evidente para ações pautadas na preservação e não-degradação. A

incorporação da novidade aportada pela EA se expressa de modo distinto, ora seguindo

posturas que assumem, para a questão ambiental, valores e práticas sociais de forma crítica,

ora guiando-se por valores voltados para ações muito específicas, cujos aspectos se baseiam
238

num ponto de partida que é a conscientização para a relação homem-presevação-natureza.

Enquanto no ensino superior a ênfase é dada à discussão sobre valores mais amplos, que

influenciam, entre outros aspectos, o degradar ou não degradar, no nível fundamental, o

caminho é realizado a partir de aspectos concretos e impactantes no meio ambiente que

conduziriam a ações focalizadas nestes próprios aspectos.

Os professores puderam apontar como se colocam outros sujeitos em relação à prática

educativa ambiental. A maioria afirma não existir coerência entre discursos e práticas, em

geral, nas ações do cotidiano escolar voltadas para a Educação Ambiental. Em nosso

entendimento, este quadro possui nexos com aqueles abordados em relação ao reduzido

número de professores e instituições que desenvolvem projetos ou discussões voltados para a

EA. Acreditamos que sem desenvolver ou pôr em prática iniciativas, projetos e discussões

duradouras sobre a EA, não há como se estabelecer, cotidianamente, nas instituições de

ensino a tão propagada coerência entre discurso e prática. A incorporação da dimensão

ambiental nos diferentes contextos sociais somente se viabiliza, quando posições idealizadas

ou restringentes são, gradativamente, questionadas e ações e práticas concretas são

viabilizadas.

Os professores que não apontam a finalidade para a EA na atualidade, parecem manter

coerência com o distanciamento que atribuem a população para tal tema. Como já afirmamos,

os professores também são parte da população, estando sujeitos às aproximações e aos

distanciamentos em relação às discussões que possuem relevância e constituem o tecido da

diversidade social. Dentro desta diversidade de condições sociais e culturais, trazem

interesses, valores e instrumentais teórico-práticos diferenciados que os permitem agir sobre a

mesma. Além disso, são influenciados pelos diferentes interesses, valores e instrumentais dos

demais sujeitos, ora incorporando novas perspectivas de ação, ora nos tornando resistentes às

suas incorporações.
239

Tudo o que argumentamos, leva em conta que mesmo com os encontros e

desencontros da vivência do magistério, as partilhas na carreira docente, as agruras de uma

desvalorização salarial ou profissional, os sujeitos não podem ser encarados como uma massa

homogeneizada ou indiferenciada. Eles estão inseridos em contextos amplos, mas também em

realidades específicas, em cotidianos próprios, diferenciados e aproximados pelas culturas das

quais participam e por aquelas com as quais buscam interagir. E esta contextura não flui

linearmente. Enreda-se de acordo com valores, desejos, acordos, normas, limites, regras,

crenças, que acabam por interferir nos processos sociais mais amplos e nas ações de cada um

dos sujeitos envolvidos nos mesmos. Isto nos faz lembrar Castro (1997, p. 177 e 183), para

quem “A importância de pensar a vida cotidiana está em pensar pela sutura, pela rejunção,

pela tessitura, vislumbrando uma totalidade [...] O cotidiano nunca é definitivo, nem

completamente estruturado, várias portas conectivas abrem-se sobre ele.”.

A viabilidade de projetos e experiências em EA perpassa pelo estabelecimento de

condições institucionais para estes encontros (rejunções) cotidianos, com a criação de

espaços-tempos (portas conectivas), continuamente voltados para o desenvolvimento de tais

projetos. Ações isoladas não configuram EA. A prática educativa ambiental é mais que uma

simples soma de tarefas, transformando-se em um amplo projeto que deve possibilitar aos

sujeitos, atividades e ações tecidas sobre o mundo vivido. Deste modo, a mesma não se

resume a um programa curto, exigindo continuidade, persistência e interações múltiplas.

Tal ação, todavia, não se faz sem que investiguemos que problemas são os mais

sentidos, nas diferentes das realidades cotidianas vividas. Estes problemas podem se distinguir

ou se combinar, mas a discussão dos mesmos não pode ser ignorada, se realmente há a

pretensão de concretizar experiências duradouras em EA. Com as peculiaridades de cada

sujeito entrevemos, de modo invariante em todas as entrevistas, indícios do reconhecimento


240

de uma sobrecarga de trabalho que automatiza as ações, esvaziando-as da prática reflexiva e

prazerosa.

Deste modo, nos parece que os grupos tentam chamar a atenção para aspectos que

ainda existem de forma fragmentada na sociedade, que ora se somam, ora se contrapõem e

não podem ser ignorados por projetos relativos a Educação Ambiental. Conforme já

afirmamos, as populações que participam de tais iniciativas não são folhas em branco,

possuindo concepções mais ou menos elaboradas desta questão que devem ser captadas,

entendidas e trabalhadas, levando em conta o jogo de complementaridades e contradições

presentes nos significados atribuídos para cada um dos temas conhecidos.

Por fim, cabe potencializar os encontros entre professores e suas idéias e

posicionamentos sobre a Educação Ambiental. Julgamos ter dado um paço inicial,

objetivando inverter a lógica de que sabemos o que pensam os outros e, por isso, podemos

guia-los de forma ensurdecida. Longe de querermos ser guias, aventamos a possibilidade de

participar de encontros e com eles aprendermos outros caminhos, outras táticas e daí

puxarmos fios para novos trabalhos e reflexões. Por conseguinte, munidos de algumas

informações, pretendemos ir, em futuras buscas, mapeamentos, atrás dos sujeitos e, quem

sabe, nos tornemos, através de trocas, mais um dos nós que dão força a esta rede, viabilizando

o entendimento e a elaboração mais compartilhada de nossas práticas. Este estudo se

empenhou e continuará a espelhar os próximos intentos em estender o horizonte de que “não é

possível investigar o pensar do povo sem o povo, mas com ele como sujeito de seu pensar.

Não posso pensar pelos outros, nem para os outros, nem sem os outros.” (FREIRE, 1983).
241

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ABRIC, J-C. A abordagem estrutural das representações sociais. In: MOREIRA, A. S. P. &
OLIVEIRA, D.C. (Org.). Estudos interdisciplinares de representação social. Goiânia: AB
Ed. 2000. p. 27-38.

AB’SABER, A. A Universidade Brasileira na (re)conceituação da Educação Ambiental.


Educação Brasileira, São Paulo, v. 15, n. 31, p.107-115, 1993.

ACSELRAD, H. Sustentabilidade e território. In: HERCULANO, S., PORTO, M. F. S. &


FREITAS, C. M. (Org.). Qualidade de vida & riscos ambientais. Niterói: EdUFF. 2000. p.
49-87.

AFONSO, A.J. Reforma do Estado e Políticas Educacionais: entre a crise do Estado-nação e a


emergência da regulação supranacional. Educação & Sociedade, Campinas, v. 22, n. 75, p.15-
32, 2001.

ALEXANDRE, A. F. A perda da radicalidade do movimento ambientalista brasileiro: uma


contribuição à crítica do movimento. Blumenau: Edifurb/Ed. da UFSC. 2000. 116 p.

ALTMANN, H. Influências do Banco Mundial no projeto educacional brasileiro. Educ.


Pesqui. [online]. jan./jun. 2002, vol.28, no.1 [citado 26 Janeiro 2003], p.77-89. Disponível na
World Wide Web: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-
97022002000100005&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 1517-9702.

ALVA, E. N. Metrópoles (In)sustentáveis. Rio de Janeiro: Relume Dumará. 1997. 164 p.

ALVES, N. Tecer conhecimento em rede. In: __________. & GARCIA, R.L. (Org.). O
sentido da Escola. Rio de Janeiro: DP&A. 1999. p.111-120.

__________. A experiência da diversidade no cotidiano e suas conseqüências na formação de


professoras. In: VICTORIO FILHO, A. & MONTEIRO, S.C.F. (Org.). Cultura e
conhecimento de professores. Rio de Janeiro: DP&A. 2002. p.13-29.

AMADOR, E. S. Baía de Guanabara e Ecossistemas Periféricos: Homem e Natureza. Rio de


Janeiro: Edição do Autor. 1997. 539p.

ANDRÉ, M. E. D. A. A Avaliação da Escola e na Escola. Cadernos de Pesquisa, São Paulo:


Fundação Carlos Chagas/Cortez, 74, p.68-70, 1990.
242

ANDRADE, M. C. O Pensamento Geográfico e a Realidade Brasileira. BOL. PAULISTA DE


GEOGRAFIA, São Paulo: AGB/SP, vol. 54, p. 45-52, 1977.

__________. Perspectivas do papel do Geógrafo, como profissional, no Brasil. In: Boletim de


Geografia Teorética, Rio Claro: AGETEO, v. 16-17, n° 31-34, volume especial, p. 142-149,
1986-1987.

ANSELMO, R. C. M. S. A formação do professor de Geografia e o contexto da formação


nacional brasileira. In: PONTUSCHKA, N. N. & OLIVEIRA, A. U. (Org.). Geografia em
perspectiva. São Paulo: Contexto, 2002. p. 247-253.

APPLE, M.W. Educação e poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

ARGENTO, M. S. F. O Ensino da Geografia e a Educação Ambiental. Cadernos de


Geociências, Rio de Janeiro: IBGE, n. 11, p.61-65, 1994.

ARRUDA, A. Representações sociais e movimentos sociais: grupos ecologistas e


ecofeministas do Rio de Janeiro. In: Moreira, A. S. P. & Oliveira, D. C. (Org.). Estudos
Interdisciplinares de Representação Social. Goiânia: AB-Editora, 2000. p. 71-86.

__________. Ecologia e desenvolvimento: representações de especialistas em formação. In:


SPINK, M.J. (Org.). O conhecimento no cotidiano – As representações sociais na perspectiva
da psicologia social. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 234-265.

BARROS, M. C. L. A história da disciplina geografia nas décadas de 1930 e 1940: expressão


da fisionomia do estado. In: XIII ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 2002, João
Pessoa. Contribuições Científicas... João Pessoa: AGB, 2002. 1 CD-ROM.

BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Rio de Janeiro: Elfos, 1995.

BECKER, B. K. A Amazônia pós Eco-92: por um desenvolvimento regional responsável. In:


BURSZTYN, M. (Org.). Para pensar o desenvolvimento sustentável. São Paulo:
Brasiliense/ENAP, 1993. p. 129-143.

BERMANN, C. Limites e Perspectivas para um Desenvolvimento Sustentável. Tempo e


Presença, São Paulo: CEDI, n. 261, 1992.
243

BITTENCOURT, C.M.F. A Proposta de Educação Ambiental e as Muitas Dúvidas. In:


PONTUSCHKA, N. N. (Org.). Um Projeto... Tantas Visões - Educação Ambiental na Escola
Pública. São Paulo: AGB/SP, 1996. p. 9-16.

BOFF, L. Nova Era: A Civilização Planetária. São Paulo: Ed. Ática, 1994. 87p.

__________. Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres. São Paulo: Ed. Ática, 1996. 341p.

BORÓN, A. A Sociedade Civil Depois do Dilúvio Neoliberal. In: SADER, E. & GENTILI, P.
(Org.). Pós-Neoliberalismo – As Políticas Sociais e o Estado Democrático. São Paulo: Ed.
Paz e Terra, 1995. p.63-118.

BRASIL. Lei nº. 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a
Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, n. 79, 28 abr. 1999.

__________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais - 1ª.-


4ª. séries. Brasília, DF, MEC / SEF, 1997.

__________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais - 5ª.-


8ª. séries. Brasília, DF, MEC / SEF, 1998. 156p.

__________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais:terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros
curriculares nacionais. Brasília, DF, MEC / SEF, 1998. 174p.

__________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:


terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental:apresentação dos temas transversais. Brasília,
DF, MEC / SEF, 1998. 436p.

__________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais –


Ciências Naturais. Brasília, DF, MEC/SEF, 2000.

CAIRNCROSS, F. Meio Ambiente: custos e benefícios. São Paulo: Nobel, 1992. 267p.

CALVINO, I. Seis Propostas para o Próximo Milênio. São Paulo: Companhia das Letras,
1990. 141p.
244

CANCLINI, N. G. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de


Janeiro: Ed.UFRJ, 1996. 290p.

CAPEL SAEZ, H. La institucionalización de la Geografia en el siglo XIX. In: __________.


Filosofia y Ciência en la Geografia contemporánea. 2.ed. Barcelona: Barcanova, 1983. p. 77-
107.

CAPRA, F. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1987.

CARLOS, A. F. A. O Lugar no/do Mundo. São Paulo: Hucitec, 1996. 150p.

CARR, W & KEMMIS , S. Becoming Critical : Education, Knowledge and Action Research.
Brighton: Falmer Press, 1986.

CARVALHO, I. É Possível Fazer Educação Ambiental num País com Fome ? Revista
Educador Ambiental, São Paulo, n. 3, 1994. Encarte Especial Debates.

CARVALHO, I. C. M. A Invenção Ecológica: narrativas e trajetórias da educação ambiental


no Brasil. Porto Alegre: Ed.UFRGS, 2001. 229p.

CASTRO, G. Da fragilidade do homem-rede. In: __________., CARVALHO, E. A. &


ALMEIDA, M. C. (Org.). Ensaios de Complexidade. Porto Alegre: Ed. Sulina/ Ed. UFRN,
1997. p. 171-186.

__________., CARVALHO, E. A. & ALMEIDA, M. C. (Org.). Ensaios de Complexidade.


Porto Alegre: Ed. Sulina/ Ed. UFRN, 1997. 272p.

CERTEAU, M. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994. 351p.

CHARTIER, R. A história cultural: entre prática e representações. Rio de Janeiro: DIFEL,


1990.

CNTE - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO.


Saúde do Professor: estudo, estratégia e informação, como parte de campanha em defesa da
aposentadoria especial na Constituição Federal. 1997. Disponível em:
<http://www.aomestrecomcarinho.com.br/sau/11s_02.htm>. Acesso em: 30 jan. 2003.

COIMBRA, J. A. A. O Outro Lado do Meio Ambiente. São Paulo: CETESB/ASCETESB,


1987.
245

COMISSÃO MUNDIAL SOBRE O MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO


(CMMAD). Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: FGV, 1988. 430p.

CORRAGIO, J. L. Propostas do Banco Mundial para a educação: sentido oculto ou problemas


de concepção? In: TOMMASI, L. De; WARDE, J. M.; HADDAD, S. (Org.). O Banco
Mundial e as políticas educacionais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP, 1996. p.
75-124.

CRESPO, S. & LEITÃO, P. O que o brasileiro pensa da ecologia. Rio de Janeiro: Mast e
Cepem/CNPq, Agência Estado /ISER, 1992.

DE BASTOS, F. P. Pesquisa-Ação Emancipatória e Prática Educacional Dialógica em


Ciências Naturais. 1995. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação,
Universidade de São Paulo, 1995.

__________. & SAITO, C. H. Abordagem Energética na Educação Ambiental. ADVIR, Rio


de Janeiro: ASDUERJ, n. 13, p.11-19, 2000.

DIAS-DA-SILVA, M. H. G. F. O professor e seu desenvolvimento profissional: Superando a


concepção do algoz incompetente. Cad. CEDES. [online]. Abr. 1998, vol.19, no.44 [citado 26
Janeiro 2003], p.33-45. Disponível na World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32621998000100004&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

__________. Sabedoria docente: Repensando a prática pedagógica. Cadernos de Pesquisa,


São Paulo, n. 89, p. 39-47, maio 1994.

__________. e CHACKUR, C.R.S.L. O ensino de 5ª a 8ª séries: Pistas para a compreensão da


escola pública. Boletim do Departamento de Didática, Araraquara, n. 6, p. 29-40, 1990.

DOISE, W. Atitudes e representações sociais. In: JODELET, D.(Org.). As representações


sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 187-203.

DOWBOR, L. Globalização e Descentralização. In: SORRENTINO, M. TRAJBER, R. &


BRAGA, T. (Org.). Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental. São Paulo: Gaia, 1995.
p. 114-126.

EVASO, A. S., BITTENCOURT JÚNIOR, C., VITIELLO, M.A., NOGUEIRA, S.M. &
RIBEIRO, W.C. Desenvolvimento Sustentável: Mito ou Realidade ? Terra Livre, São Paulo:
AGB/São Paulo, n. 11-12, p.91-101, 1996.
246

FISCHER, G-N. Psicologia Social do Ambiente. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. 216p. (Série
Perspectivas Ecológicas: 5).

FOLADORI, G. & TOMMASINO, H. El concepto de desarrollo sustentable treinta años


después. In: Desenvolvimento e Meio Ambiente, Curitiba: Ed. UFPR, n. 1, p. 41-56, 2000.

FONSECA, T. M. G. Epistemologia. Psicologia social contemporânea: livro-texto.


Petrópolis: Vozes, 2001. p. 36-48.

FONTANA, R. C. Trabalho e subjetividade. Nos rituais da iniciação, a constituição do ser


professora. Cad. CEDES. [online]. abr. 2000, vol.20, no.50 [citado 25 Janeiro 2003], p.103-
119. Disponível na World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622000000100008&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

FONTES, P. J. Educação pela e para a Ação Ambiental. In: SANTOS, J. E. & SATO, M.
(Org.). A Contribuição da Educação Ambiental à Esperança de Pandora. São Carlos: RIMA,
2001. p. 355-365.

FREIRE, P. La Pedagogia Del Oprimido. San Salvador: Ediciones Cesprop, 1970;


__________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

GALVÃO, M.C.C. Pós-Graduação em Geografia – questão em debate. In:Boletim de


Geografia Teorética, Rio Claro: AGETEO, v. 16-17, n. 31-34, volume especial, p. 25-35,
1986-1987.

__________. Focos sobre a questão ambiental no Rio de Janeiro. In: ABREU, M.A. (Org.).
Natureza e sociedade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: SMCTE, 1992. p.13-26.

GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989.

GEORGE, P. O meio ambiente. São Paulo: Difel, 1973.

GIDDENS, A. A Constituição da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

__________.Para Além da Esquerda e da Direita. São Paulo: Unesp, 1995.


247

GILLY, M. Lês représentations sociales dans lê champ éducatif. In: JODELET, D. (Editeur).
Les représentations sociales. Paris: PUF, 1989. p. 363-383; também em Português em :
GILLY, M. As representações sociais no campo da educação. In: JODELET, D.(Org.). As
representações sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 321-342.

__________.Maître-éléve. Roles Institutionnels et représentations. Paris: PUF, 1980.

GIMENO, J.S. Consciência e acção sobre a prática como libertação profissional dos
professores. In: Nóvoa, A (Org.). Profissão Professor. Porto: Porto Editora, 1991.

GINZBURG, C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das
Letras, 1989. 281p.

__________. Olhos de madeira: nove reflexões sobre a distância. São Paulo: Companhia das
Letras, 2001. 312p.

GIOVANI, L. M. Do professor informante ao professor parceiro: reflexões sobre o papel da


universidade para o desenvolvimento profissional de professores e as mudanças na escola.
Cad. CEDES. [online]. Abr. 1998, vol.19, no.44 [citado 26 Janeiro 2003], p.46-58. Disponível
na World Wide Web: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32621998000100005&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

GONÇALVES, C.W.P. Geografia Política e Desenvolvimento Sustentável. Terra Livre, São


Paulo: AGB/São Paulo, 11-12, p.9-76, 1996.

GUARESCHI, P. & JOVCHELOVITCH, S. (Org.). Textos em Representações Sociais.


Petrópolis: Ed. Vozes, 1998. 325p.

GUATTARI, F. As Três Ecologias. Campinas: Papirus, 1990. 56p.

HALL, E. T. La dimension cachée, Paris: Le Seuil, 1971.

HARTSHORNE, R. Propósitos e Natureza da Geografia. São Paulo: Hucitec, 1978. 203p.

HERCULANO, S. C. Do desenvolvimento (in)suportável à sociedade feliz. In:


GOLDENBERG, M. (Org.). Ecologia, Ciência e Política. Rio de Janeiro: Revan, 1992.
248

HÖFLING, E. M. Estado e políticas (públicas) sociais. Cad. CEDES. [online]. nov. 2001,
vol.21, no.55 [citado 25 Janeiro 2003], p.30-41. Disponível na World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622001000300003&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

HYPÓLITO, A.L.M. Trabalho docente, classe social e relações de gênero. Campinas:


Papirus, 1997.

JODELET, D. Représentations Sociales: phénomènes, concept et théorie. In: MOSCOVICI, S


(Org.). Psychologie sociale. Paris: PUF, 1984. p. 357-378.

__________. Représentations sociales: um domaine em expansion. In: __________. (Org.).


Les Representations Sociales. Paris: PUF, 1989. p. 31-61; também em Português em :
JODELET, D. Representações Sociais: um domínio em expansão. In: __________. (Org.). As
representações Sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001. p. 17-44.

KATUTA A. M. A formação em geografia: dicotomia ou unidade? In: XIII ENCONTRO


NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 2002, João Pessoa. Contribuições Científicas... João Pessoa:
AGB, 2002. 1 CD-ROM.

KEHL, M. R. O fetichismo. In: SADER, E. Sete pecados do capital. Rio de Janeiro: Record,
1999. p.79-106.

KOSTROWICHI, A. S. Problemas Sociais da Política do Meio Ambiente. Rev. Geogr., São


Paulo, n. 7, p.65-74, 1988.

LABORIT, H. La Nouvelle Grille. Paris: Robert Laffont, 1986.

LACOSTE, Y. A geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas:
Papirus, 1989. 263p.

LAUGLO, J. Críticas às prioridades e estratégias do Banco Mundial para a educação.


Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 100, p. 15-39, mar. 1997.

LAYRARGUES, P.P. Educação ambiental e ambientalismo empresarial: um caso ideológico.


In: SEMINÁRIO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL E A NOVA ORDEM MUNDIAL, 1996,
Rio de Janeiro. Resumos... Rio de Janeiro: GEA/Casa da Ciência/UFRJ, 1996, p. 36-43.
249

__________. Prefácio. In: SANTOS, J. E. & SATO, M. (Org.). A Contribuição da Educação


Ambiental à Esperança de Pandora. São Carlos: RIMA, 2001. p.XIII-XVIII.

LEFEBVRE, H. Critique de la vie quotidienne. Paris: Éditions l’Arche, 1958.

__________. La production de l’espace. Paris: Antropos, 1974.

__________. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo: Ed. Ática, 1991. 216p.

LENOBLE, R. História da idéia de natureza. Lisboa: Edições 70, 1990.

LIMA, L. C. Organização escolar e democracia radial. São Paulo: Cortez/Instituto Paulo


Freire, 2000.

LOUREIRO, C.F.B. Educação ambiental e movimentos sociais na construção da cidadania


ecológica e planetária. In: __________., LAYRARGUES, P.P. & CASTRO, R. S. (Org.).
Educação ambiental: repensando o espaço da cidadania. São Paulo: Cortez, 2002. p. 69-98.

MACHADO, M. S. A Formação do Campo Científico-Disciplinar da Geografia no Brasil:


algumas considerações. In: XIII ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 2002, João
Pessoa. Contribuições Científicas... João Pessoa: AGB, 2002. 1 CD-ROM.

MACIEL, T. M. F. B., FERREIRA, M. C. & PREUSS, M. R. G. Étude Nationale sur la


Situation de L’Éducation Environnementale au Brésil. Rio de Janeiro: Programa de estudos
Interdisciplinares de Comunidades e Ecologia Social (EICOS-UFRJ), 1994. 46p.

MADEIRA, M.C. Representações Sociais: Pressupostos e Implicações. R. bras. Est. pedag.


Brasília, v. 72, n. 172, p. 129-144, 1991.

__________. Meninos de rua e a construção de sentido de educação. In: GRANATO, T. A. C.


(Org.). A educação em questão: novos caminhos para antigos problemas. Petrópolis: Vozes-
UCP, 2000. p. 182-194.

__________. Representações Sociais e Educação: importância teórico-metodológica de uma


relação. In: MOREIRA, A. S. P. (Org.). Representações Sociais: teoria e prática. João
Pessoa: Ed. Universitária UFPB, 2001. p. 123-144.
250

__________. & ALLOUFA, J. Representações sociais e Educação: que relação é esta ? In: II
COLÓQUIO FRANCO-BRASILEIRO EDUCAÇÃO E LINGUAGEM, 1996, Natal. Anais...
Natal: Université de Caen/ EDUFRN (RN), 1996. p. 11-15.

MARANGONI, A. M. M. C. O Geógrafo no Brasil: alguns problemas para o seu desempenho


profissional. In: Boletim de Geografia Teorética, Rio Claro: AGETEO, v. 16-17, n. 31-34,
volume especial, p. 137-142, 1986-1987.

MARCUSE, H. Five Lectures: Psychoanalysis, Politics and Utopia. Boston: Beacon Press,
1970.

MARIN, A. J. Com o olhar nos professores: Desafios para o enfrentamento das realidades
escolares. Cad. CEDES. [online]. Abr. 1998, vol.19, no.44 [citado 25 Janeiro 2003], p.8-18.
Disponível na World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32621998000100002&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. Rio de Janeiro: Livraria Freitas


Bastos, 1971.

MÉSZÁROS, I. The necessity of social control. London: The Merlin Press, 1971.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Política de Educação Ambiental; Linhas de Ação. Brasília,


DF, Assessoria de Educação Ambiental da Secretaria Executiva do MEC, 1991. 12p.

__________. Sinopse da Educação Brasileira 2002

__________. Sinopse do Ensino Superior 20001

__________./INEP. Resultados e tendências da Educação Superior no Brasil. Brasília, DF,


2000.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Parecer n° 226/87. Conselho Federal de


Educação, Brasília, DF, Documenta, 1987.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, DOS RECURSOS HÍDRICOS E DA AMAZÔNIA


LEGAL. PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PRONEA. Antecedentes
Históricos, Linhas de Ação e Ações Prioritárias, Relatórios, Brasília, DF, 1997. 14p.
251

MORAES, A. C. R. Meio Ambiente & Ciências Humanas. São Paulo: Hucitec, 1997. 100p.

MORAES, E. C., LIMA Jr., E. & SCHABERLE, F. A. Representações de meio ambiente


entre estudantes e profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Revista de Ciências
Humanas, Florianópolis: EDUFSC, Edição especial temática, p. 83-96, 2000.

MOREIRA, R. O Círculo e a Espiral: a crise paradigmática do mundo moderno. Rio de


Janeiro: Obra Aberta, 1993. 144p.

MORIN, E. O MÉTODO: a natureza da NATUREZA. Portugal: Publicações Europa-América,


1997. 363p.

__________ . A Cabeça Bem-Feita: reformar a reforma, reformar o pensamento. São Paulo:


Bertrand Brasil, 2000a. 128p.

__________. Os Sete Saberes Necessários à Educação no Futuro. São Paulo: Cortez, 2000b.
118p.

__________. & KERN, A. B. Terra-Pátria. Lisboa: Instituto Piaget, 1996. 163p.

__________. A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2001. 588p.

MOSCOVICI, S. A representação social da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

__________. Prefácio. In: GUARESCHI, P. & JOVCHELOVITCH, S. (Org.). Textos em


Representações Sociais. Petrópolis: Ed. Vozes, 1995. p.7-16.

__________. Das representações coletivas às representações sociais: elementos para uma


história. In: JODELET, D. (Org.). As representações Sociais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001.
p. 45-66.

__________. & HEWSTONE, M. De la science au sens commun. In: __________. (Org.).


Psychologie sociale. Paris: PUF, 1984.

MOTA, J. A. O Valor da Natureza: economia e política dos recursos naturais. Rio de


Janeiro: Garamond, 2001. 200p.
252

NASCIMENTO-SCHÜLZE, C.M. Representações sociais da natureza e do meio ambiente.


Revista de Ciências Humanas, Florianópolis: EDUFSC, Edição especial temática, p. 67-81,
2000.

OLIVEIRA, F. O. & WERBA, G. C. Representações Sociais. Psicologia social


contemporânea: livro-texto. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 104-117.

ORDAZ, O. & VALA, J. Objetivação e ancoragem das representações sociais do suicídio na


imprensa escrita. In: MOREIRA, A. S. P. & OLIVEIRA, D. C. (Org.). Estudos
interdisciplinares de representações sociais. Goiânia: AB-Editora, 2000. p. 87-114.

PEDRINI, A. G. Conferências Internacionais de Meio Ambiente de Estocolmo (1972) e do


Rio de Janeiro (1992): uma análise política de suas declarações. In: XIII SIMPÓSIO
NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1995, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro,
1995. p.125.

__________. Educação Ambiental – Reflexões e Práticas Contemporâneas. Petrópolis:


Vozes, 1998. 294p.

PENA-VEGA, A. & NASCIMENTO, E. P. (Org.). O Pensar Complexo: Edgar Morin e a


Crise da Modernidade. Rio de Janeiro: Garamond, 1999. 204p.

PEREIRA, J. E. D. As licenciaturas e as novas políticas educacionais para a formação


docente. Educação e Sociedade, Campinas: CEDES, n. 68, p. 109-125, 2000.

PINHEIRO A. C. Levantamento das pesquisas acadêmicas sobre o ensino de Geografia no


Brasil sob a forma de dissertações e teses – 1983/1997. . In: XIII ENCONTRO NACIONAL
DE GEÓGRAFOS, 2002, João Pessoa. Contribuições Científicas... João Pessoa: AGB, 2002.
1 CD-ROM.

PONTUSCHKA, N. N. A Geografia: pesquisa e ensino. In: CARLOS, A. F. A. (Org.). Novos


caminhos da Geografia. São Paulo: Contexto, 2001. p. 111-142.

__________., BITTENCOURT, C..M.F., NADAI, E. & KULCSAR, R. O “Estudo do Meio”


como Trabalho Integrador das práticas de Ensino. BOL. PAULISTA DE GEOGRAFIA, São
Paulo: AGB/SP, vol. 70, p. 45-52, 1991.

PORTILHO, F. Consumo “verde”, democracia ecológica e cidadania: possibilidades de


diálogo? Disponível em: <http://www.rubedo.psc.br/Artigos/consumo.htm>, Acesso em: 04
fev. 2003.
253

PRIGOGINE, I. & STENGERS, I. A Nova Aliança. Brasília: Ed. UNB, 1991. 246p.

RAMOS, L. M. P. C. Professor do ensino Fundamental e identidade feminina. In: XI


ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 2002, Goiânia.
Anais... Goiânia: UFG/UCG/ECF/UEG, 2002. 1 CD-ROM.

REDCLIFT, M. Sustainable development: exploring the contradictions. London/New York:


Routledge, 1987.

__________. Reflections on the sustainable development debate. The International Journal of


Sustainable Development and World Ecology, v. 1, n. 1, p. 3-21, 1994.

__________. Reavaliando o consumo: uma crítica a premissas da gestão ambiental. In:


HERCULANO, S., PORTO, M. F. S. & FREITAS, C. M. (Org.). Qualidade de vida & riscos
ambientais. Niterói: EdUFF, 2000. p. 49-87.

REIGOTA, M. Meio Ambiente e Representação Social. São Paulo: Cortez, 1995. 87p.

__________. Ecologia, elites e intelligentsia na América Latina: um estudo de suas


representações sociais. São Paulo: Annablume, 1999. 118p.

RIBEIRO, W.C. Por dentro da Rio-92. In: SANTOS, M., SOUZA, M.A.A., SCARLATO,
F.C. & ARROYO, M. (Org.). O Novo Mapa do Mundo – Problemas Geográficos de Um
Mundo Novo. São Paulo: Hucitec-ANPUR, 1995. p. 123-131.

ROCHA, G. O. R. Ensino de Geografia e a Formação do Geógrafo-Educador. Terra Livre,


São Paulo: AGB/São Paulo, n. 11-12, p.177-188, 1996.

__________. Uma breve história da formação do(a) professor(a) de Geografia no Brasil.


Terra Livre, São Paulo: AGB/São Paulo, n. 15, p. 129-144, 2000. Disponível em:
<http://www.cibergeo.org/agbnacional/terra_livre/Rocha.html>. Acesso em: 04 fev. 2003.

RODRIGUES, A. M. A questão ambiental e a (re)descoberta do Espaço: uma nova relação


Sociedade/Natureza ? BOL. PAULISTA DE GEOGRAFIA, São Paulo: AGB/SP, vol. 73, p.
35-71, 1994.

RODRÍGUEZ, J. M. M. La Geografia Física ante la Educación Ambiental: Desafios y


Perspectivas. In: VII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA FÍSICA APLICADA,
Curitiba (PR), 1997, Curitiba. Anais... Curitiba: UFPR, vol.2, 1997.
254

RODRIGUEZ, V. Financiamento da educação e políticas públicas: o Fundef e a política de


descentralização. Cad. CEDES. [online]. nov. 2001, vol.21, no.55 [citado 25 Janeiro 2003],
p.42-57. Disponível na World Wide Web:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622001000300004&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

ROSSI, V. L. S. Desafio à escola pública: tomar em suas mãos seu próprio destino. Cad.
CEDES. [online]. nov. 2001, vol.21, no.55 [citado 25 Janeiro 2003], p.92-107. Disponível na
World Wide Web: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622001000300007&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

SÁ, C. P. A construção do objeto de Pesquisa em Representações Sociais. Rio de Janeiro:


EdUERJ, 1998. 110p.

SACHS, I. Ecodesarrollo. Concepto, aplicación, implicaciones. Comércio Exterior. México


D.F.: 30, 7, p. 718-725, 1980.

SANSOLO, D. G. & CAVALHEIRO, F. Geografia e Educação Ambiental. In: SANTOS, J.


E. & SATO, M. (Org.). A Contribuição da Educação Ambiental à Esperança de Pandora.
São Carlos: RIMA, 2001. p. 109-131.

SANTANA, P. V. Da Socialização à Mundialização da Natureza. In: CARLOS, A. F. A.


(Org.). Ensaios de Geografia Contemporânea. Milton Santos:obra revisitada. São Paulo: Ed
Hucitec, 1996. p.47-54.

SANTOS, B. de S. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.

__________. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição


paradigmática. São Paulo: Cortez, 3° edição, vol. 1 - A Crítica da razão indolente: contra o
desperdício da experiência, 2001. 415p.

SANTOS, J. E. & SATO, M. Universidade e Ambientalismo – Encontros não são


Despedidas. In: __________. (Org.). A Contribuição da Educação Ambiental à Esperança de
Pandora. São Carlos: RIMA, 2001. p. 31-50.

SANTOS, M. Metamorfoses do Espaço Habitado. São Paulo: Hucitec, 1988. 124p.

__________. O Espaço do Cidadão. São Paulo: Nobel, 1993a. 142p.


255

__________. Os Novos Rumos da Geografia Brasileira. São Paulo: Hucitec, 1993b.

__________. Técnica, Espaço, Tempo - Globalização e Meio Técnico-Científico-


Informacional. São Paulo: Hucitec, 1994. 190p.

__________. A questão do meio ambiente – desafios para a construção de uma perspectiva


transdisciplinar. Anales de Geografía de la universidad Complutense. Madrid: Servicio de
Publicaciones - Universidad Complutense, n. 15, p. 695-705, 1995.

__________. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Hucitec,
1996. 308p.

__________. Território e Sociedade - entrevista com Milton Santos. São Paulo: Ed. Fundação
Perseu Abramo, 2000. 128p.

__________. Por Uma Outra Globalização - Do Pensamento Único à Consciência Universal.


São Paulo: Ed. Record, 2001. 138p.

___________. Deficientes Cívicos. Folha on-line, São Paulo, 23 de maio 2002. Disponível
em: <http://www.uol.com.br/fol/brasil500/dc39.htm>. Acesso em: 30 de maio 2002.

__________. & BERNARDES, A. Tarefas da Geografia Brasileira num Mundo em


Transformação: um momento de sua trajetória. Ciência Geográfica, Bauru: AGB/Bauru, n.
13, p. 4-22, 1999.

SANTOS, S. H. Reflexões Críticas sobre o Relatório Brundtland: As Questões do


“Desenvolvimento Sustentável” e da “Nova Ordem Econômica Internacional”. Rio de
Janeiro: Grupo de Defesa Ecológica, 1991. 10p. Mimeografado.

SAVIANI, D. Ensino público e algumas falas sobre a universidade. Col. Polêmicas do Nosso
Tempo. São Paulo: Cortez, v.10, 1986a.

__________. Educação: do senso comum a consciência filosófica. São Paulo: Cortez, 1986 b.

__________. Sistemas de ensino e planos de educação: o âmbito dos municípios. Educ. Soc.
[online]. dez. 1999, vol.20, no.69 [citado 04 Fevereiro 2003], p.119-136. Disponível na World
Wide Web: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
73301999000400006&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-7330.
256

SAWAIA, B. B. A falsa cisão retalhadora do homem. In: MARTINELLI, M. L., ON, M. L.


R. & MUCHAIL, S. T. (Org.). O Uno e o Múltiplo nas Relações entre as Áreas do Saber. São
Paulo: Cortez, 1998. p. 96-109.

__________. Participação social e subjetividade. In: SORRENTINO, M. (Coord.).


Ambientalismo e participação na contemporaneidade. São Paulo: EDUC/FAPESP, 2001. p.
115-134.

SCHMIDT, A. El concepto de naturaleza em Marx. México: Siglo Veintiuno editores, 1983.


224p.

SEABRA, O. C. L. Educação, território e cidadania: aprender a aprender ensinando. In:


CASTROGIOVANNI, A. C., CALLAI, H.C., SCHÄFFER, N. O. & KAERCHER, N. A.
(Org.). Geografia em sala de aula: práticas e reflexões. Porto Alegre: AGB/POA, 1998. p.25-
32.

SEARA FILHO, G. Educação Ambiental: Questões Metodológicas. Ambiente, São Paulo:


SEMA/SP, v. 6, n. 1, p.45-48, 1992.

SEGURA, D. S. B. Educação ambiental na escola pública: da curiosidade ingênua à


consciência crítica. São Paulo: Annablume/FAPESP, 2001. 214p.

SILVA, L. T. & COSTA, A. J. S. T. Uma proposta geográfica de educação ambiental


interdisciplinar. In: 5° ENCONTRO NACIONAL DE PRÁTICA DE ENSINO DE
GEOGRAFIA, 1999, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: PUC-Minas, 1999. p. 142-145.

__________.& DUARTE, R. G. Geografia e Educação Ambiental - discussões necessárias


para suas práticas. GEOUERJ, Rio de Janeiro: UERJ, n. 6, p. 57-68, 1999.

SMITH, N. Desenvolvimento Desigual. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1988. 250p.

SOJA, E. W. Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social crítica. Rio


de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993. 324p.

SOUZA, M. A. A. O Ensino da Geografia na Virada do Século. In: ___________ (Org.). O


Novo Mapa do Mundo – Natureza e Sociedade Hoje: Uma Leitura Geográfica. São Paulo:
Hucitec-ANPUR, 1993. p. 29-35.
257

SPOSATI, A. Movimentos utópicos da contemporaneidade. In: SORRENTINO, M. (Coord.).


Ambientalismo e participação na contemporaneidade. São Paulo: EDUC/FAPESP, 2001. p.
57-85.

STENGERS, I. & SCHLANGER, J. Les Concepts Scientifiques: invention et pouvoir. Paris:


La Découverte, 1989.

TERNISIEN, J. A. Dictionnaire usuel de l’environemment et de l’écologie. Paris: Guy le Prat,


Tome premier, 1981. p. 121.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural: mudanças de atitude em relação às plantas e aos


animais (1500-1800). São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

TORRES, R.M. Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do Banco Mundial.


In: TOMMASI, L. De; WARDE, J. M.; HADDAD, S. (Org.). O Banco Mundial e as políticas
educacionais. São Paulo: Cortez /Ação Educativa/PUC-SP, 1996. p. 125-194.

__________. Tendências da formação docente nos anos 90. In: WARDE, M. J. (Org.). Novas
políticas educacionais: críticas e perspectivas. São Paulo: PUC-SP, 1998. p. 173-191.

TRINDADE, H. Universidade, ciência e Estado. In: __________ (Org.). Universidade em


ruínas: na república dos professores. Petrópolis: Vozes/RS, CIPEDES, 2000.

UNESCO/INTERNATIONAL LABOR ORGANIZATION (ILO). More children, fewer


teachers: new UNESCO-ILO study sees global teacher shortage
causing decline in quality education. UNESCO/ILO. Disponível em:
<http://www.ilo.org/public/english/bureau/inf/pr/2002/45.htm>. Acesso em: 05 de outubro de
2002.

__________/INTERNATIONAL ENVIRONMENTAL EDUCATION PROGRAMME


(UNEP). Interdisciplinary Approaches in Environmental Education. Environmental Education
Series, n.14, p.1-52, 1985.

VAIDERGORN, J. Uma perspectiva da globalização na universidade brasileira. Cad. CEDES.


[online]. nov. 2001, vol.21, no.55 [citado 25 Janeiro 2003], p.78-91. Disponível na World
Wide Web: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
32622001000300006&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0101-3262.

VALE, J.M.F. Milton Santos: a face do educador. Ciência Geográfica, Bauru: AGB/Bauru,
Edição Especial Milton Santos, p. 137-138, 1997.
258

VALLEJO, L.R., GONÇALVES, D. R. P., COUTINHO, L. C., MOREIRA, P. S. C. &


QUARESMA, V. S. Análise Ambiental e Educação Conservacionista no Município de São
Sebastião do Alto (RJ). In: III CONGRESSO BRASILEIRO DE DEFESA DO MEIO
AMBIENTE, 1989, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, v.2, 1989. p.575-592.

VLACH, V. R. F. A propósito do ensino de Geografia: em questão, o Nacionalismo


Patriótico. São Paulo, 1988. 206p. Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1988.

WILBANKS, T . J. Sustainable Development in Geographic Perspective. Annals of the


Association of American Geographers, v. 84, n. 4, p.541-56, 1994.

WORSTER, D. Nature’s economy: a history of ecological ideas. Cambridge: Cambridge


University Press, 1994.
259

APÊNDICE A - MODELO DE QUESTIONÁRIO APLICADO AOS PROFESSORES


DE GEOGRAFIA

QUESTIONÁRIO DE LEVANTAMENTO SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL (EA)


COM PROFESSORES DE GEOGRAFIA – PESQUISADOR: LINCOLN T. SILVA
2002

PROFESSOR(A): _______________________________________________________________________________________________
E-MAIL: _______________________________ OUTRO CONTATO: ______________________________________________________

1) Em sua opinião, para que serve a EA nos dias de hoje ?


______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

2) Sua esfera de atuação no ensino é : pública ( ) federal ( ) estadual ( ) municipal ( ) privada ( )

3) Em que nível de ensino atua : ( ) universitário ( ) médio ( ) fundamental ( ) todos

4) Tempo aproximado de magistério : ________ anos

5) A sua instituição de ensino desenvolve algum projeto em EA ? ( ) Não ( ) Não sei ( ) Sim

Em caso afirmativo:
6) O trabalho é realizado de forma :
( ) individual ( ) em equipe disciplinar ( ) em equipe interdisciplinar/ multidisciplinar ( ) não sei

7) Há apoio ou atenção da sua instituição para projetos educativos ambientais ? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei

8) Pode indicar algumas dificuldades encontradas para a realização destes projetos ?


____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________

9) Você vê relação entre ensino de Geografia e EA ? ( ) Sim ( ) Não


10) Justifique sua resposta
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
______________________________

11) Em sua opinião, quais as dificuldades das instituições de ensino para a implementação de projetos em EA ?
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

12) Em que instituição você completou sua formação ? (Graduação e Pós-Graduação, se for o caso)
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

13) Pode apontar quando foi ?______________ _______________________________________________________________________

14) Você tem interesse em participar de grupos para discutir a EA ? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei

15) Existem conceitos geográficos que se aproximam da EA ?


260

( ) Desconheço esta questão


( ) Não. Não existem conceitos geográficos que se aproximem da EA.
( ) Sim, existem conceitos geográficos que se aproximem da EA.

16) Em caso de resposta afirmativa na questão anterior, poderia indicar conceitos geográficos que se aproximem da EA ?
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

17) Em geral, os discursos que você observa em EA, condizem com as práticas realizadas no cotidiano educacional ?
( ) Sim ( ) Não ( ) Nem sempre ( ) Raramente ( ) Não sei

18) Você acha importante associar o ensino da geografia à prática educativa ambiental ? ( ) Sim ( ) Não

19) Em caso negativo, poderia explicar o que o(a) leva a assumir esta posição ?
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

20) O que, em geral, as pessoas pensam sobre a EA ?


______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________________________________

21) Já participa de grupo(s) ou projeto(s) que discute(m) EA ?


( ) Não. ( ) Sim, ligado(s) ao ensino formal. ( ) Sim, ligado(s) a ONGs e/ou outras instâncias.

Vous aimerez peut-être aussi