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N ota ~ c)2, LJt-eRa1-0Q cl. :r:..

Palestra sobre
lírica e sociedade

U anúncio de lima palesrra sobre lírica e sociedade dev


pro\'()car, em muiros dos senhores, lIm ceno desconforto. Esra
rflo esperando lima dessas consideraçóes sociológicas que poden
ser alinhavadas a bel-prazer sobre qualquer objero, assim comI
há cinqÜenra anos se invenravam psicologias e, h,i rrinra, feno
menologias de rodas as coisas imagináveis. Além disso, ficarã<
desconfiados de que o exame das condições sob as quais derer
r
minadas configurações Gebilde] foram criadase recebidasque
se inrromerer no lugar da experiência delas mesmas; de que su
bordinaçães e relações deixarão de lado a percepção da verdad(
ou inverdadc do próprio objeto. Os senhores levanrarão a sus.
peita de que um intelectual pode acabar se rornando culpadc
daquilo que Hegel reprovava no "intelecto formal", ou seja, pai
[er uma perspecriva geral do rodo, ficar acima da exisrência sino
guiar de que hlla, isroé, simplesmenre não vê-Ia,apenas eriquerá.
Ia. O que incomoda em um procedimcl1[o como este sed espe-
cialmenre sensível, para os senhores, no caso da lírica. Afinal.
rrara-se de manusear o que há de mais delicado, de mais fdgil.
aproximando-o justamente daquela engrenagem, de cujo con-
[aro o ideal da lírica, pelo menos no senrido rradicional, sempr(
prcrendeu se resguardar. Uma esfera de expressão que [em sua

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Notas de literallJra I Palestra sobre lírica e sociedade

e~sêl)cia prccisamcnrc em nflo reconhecer () poder da socializa- rem o poderde evir;]rpor complero° riscodepermanecer na
ção, ou em suped-Ia pc/o ptlt/;()Jda disr;'lIlcia, COlHOno caso de conringência
<- de umaexistcnciameramcnteisolada.
Baudelairc ou de Nierzsche, deve ser arrog.anrcl11enrc transfor- Essa universalidade do teor lírico, contUdo, é esscncialmen-
mada, por esse tipo de consideração, no cOlHdrio do modo co- te social. Só entende aquilo que o poema diz quem escura, em
mo concebe a si mesma. Quem seriacapazde falar de lírica c so- sua solidão, a voz da humanidade; mais aineb, a prÓpria solidi'io
ciedade, pergunl;trão, sen;io algul-m tol:llmcn t~' dcs:lIl1par:Hlo dapalavralíricaépré-traçadapelasocicebdc individualisra l', CITI
pelas musas? úlrima an,lIise,aromísrica, assim como. inversamenrc.sua capa-
Obviamenre. eSS;1suspeita sÓ pode sei cnf"n:nl:HI:Iqu:mdo cidade de criar vínculos universais [(rI(~~~JJJ('il/c \!c/'!Jim/lit'!JI.:{'Új
composições líricas nflo si'ioabusivall1clm.' lOIl1:ldascomo ohje- \'íve da densidadede sua individuação.Por isso mesmo,o pen-
tos de demonstração de teses sociol6gicls, mas sim quando sua S:lJ'sobre a obra de arte esd aurori'l.adoc compromcl"ido a per-
refcrência ao socialrevela nelasprÓpriasalgo de csscncial.algo gllJ1lar concrcramenre pelo teor social, a não se satisf"azercom o
do fundamenro de Slla qualidade. A referência ao socialni'io deve vago sentimenro de algo universal e abrangente, Esse tipo de
levar para fora da obra de ane, mas sim levar mais fundo para determinação pelo pensamento não é uma reflexão externa e
dentro dela, É isso o que se deve esperar, e até a mais simples alheia à arte, mas antes uma exigência de qualquer configuração
reflexão caminha nesse sentido. Pois o teor [Gehalt] de um poe- lingÜística. O material próprio dessa configuração, os conceitos,
ma não é a mera expressão de emoções e experiências individuais. não se esgota na mera intuição. Para poderem ser estericameme
Pelo contrário, estas só se tornam arrísticas quando, jusramente intUídos, os conceitos sempre querem ser também pensados, e
em virtude da especificação que adquirem ao ganhar forma es- o pensamento, uma vez posro em jogo pelo poema, não pode
tética, conquistam sua participação no universal. Não que aquilo mais, a seu comando, ser sustado,
que o poema lírico exprime renha de ser imediaramc/He aquilo Essepcnsamcnro, porém, a inl"erprctaçãosocialda lírica, co-
que todos vivenciam. Sua universalidade não é uma {l%nté c/c.' mo aliás de todas as obnt~ de arte, I~ãopode porranto ter em mira,
tom, não é a da mera comunicação daquilo que os outros sim- sem mediação, a assim chamada posição social ou a inserção so-
plesmente não são capazes de comunicar. Ao contrário, o mer- Cialdos interesses das obras ou até de seus aUtores, Tem de esta-
gulhono individuadoelevao poemalírico ao universal por ror- helecer,em ve7,disso, como o fOr/Oeleuma sociedade,mmada
\ nar manifesto algo de nflodisron.:ido,de não caplado, de ainda C0l110unidade em si mesma contraditória. aparece na obra de
não subsumido, anunciando desse modo, por anrecipação, algo arte; mostrar em que a obra de arte lhe obedece e em que a ultra-
de um estado em que nenhum universal ruim, ou seja, no fun- passa. O procedimento tem de ser, conforme a linguagem da filo-
do algo particular, acorrenre o ourro, o universal humano. A sofia, imancnte. Conceitos sociais não devem ser trazidos de fora
composição lírica tem esperançade eXHair. da mais irrcsrrita ;\$composições líricas, massim dcvemsurgir da rigorosaintuição
individuação, o universal. O risco peculiar assumido pela lírica, delas mesmas. Aquela frase das Máximas e reflexõesde Goethe',
entretanto, é que seu princípio de individuação não garanrc nun- que diz que o que não entendes tU também não possuis, não vale
ca que algo necessário e autêntico venha a ser produzido. Ela não somente para o relacionamento estético com obras de arte, v.ale

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Notas de literatura I
Palestra sobre lírica e sociedade

la/IJI)cITIpara a teoria estética: nada que não esteja nas obras, em ~ em si mesma social. Implica o proresto ,contra uma siruação so-
sua forma específica, legirima a decisão quanro àquilo que seu cial que todo indivíduo experimenta como hostil, alienada, fria
reor, o que foi poeticamenre condensado, represema e1l1termos c opressiva, unla siruação que se imprime em negarivo na confi-
sociais. D,eterminá-Io requer, sem dúvida, não sÓo saber da obra guração lírica: quanto mélisessasituação pesa sobre ela,mais in-
de arte por dentro, como também o da sociedade fora dela. IV!as flexivelmente a configuração resisre, não se curvando a nada de
esse saber só cria vínculos quando se redescobre no puro aban- hcrerÔnomo e consliruindo-se inreiramente segundo suas prÓ-
donar-se à própria coisa. Recomenda-se vigil;lI1cia, sobrerudo, prias leis. Seu disranciamenro da mera existência roma-se a medi-
perante o conceito de ideologia, hoje dehulhado até o limite do da do que há nestade f~tlsoe de ruim. Em protesto contra ela, ()
suportável. Pois ideologia é inverdade, falsa consciência, menri- poema enuncia o sonho de um mundo em que essasituação ~;eria
ra. Ela se manifesta no malogro das obras de ane, no que estas difcrcnre. t\ idiossincrasia do espíriw lírico contra a prepor('.ncia
têm de falso em si mesmas, que deve ser apontado pela crítica. das coisas'é uma forma de reação à coisificação do mundo, ;1
Mas dizer de grandes obras de arte, que rêm sua essênciano po- dominação das mercadorias sobre os homens, que se propagou
der de configuração e apenas por isso são capazes de uma recon- d.esde o início da Era Moderna e que, desde a Revolução Indus-
ciliação tendencial das contradições fundamentais da exisrência trial, desdobrou-se em força dominanre da vida. Mesmo o culto
real, que elas são ideologia, não é simplesmenre fazer injusriça ao à coisa [Ding/eult],pretendido por Rilke, já perrenceao círculo
próprio teor de verdade dessas obras, é também falsear o conceito encanrado de tal idiossincrasia,como uma rentativa de assimi-
de ideologia. Este não afirma que rodo o espírito serve apenas lar e resolver na expressão subjetivamente pura as coisas aliena-
para que alguns homens eventualmente escamoteiem evenruais das, creditando metafisicamente em favor delas essa sua aliena-
interesses particulares, fazendo-os passar por universais, mas sim ção. A fraquezaestética desse culto à coisa,seu gesto afetadamen-
quer desmascarar o espíriro determinado a ser Gllsoe, ao mes- te misterioso e sua misrura de religião e artesanato, denuncia ao
mo tempo, apreendê-Io conceirualmenre em sua necessidade. mesmo tempo o rcal poder da coisifJcação,que não se dcixa mais
Obras de arte, entretanto, rêm sua grandeza unicamente em dei- dourar por ne~';huma aura lírica, nem se resgatar pelo senrido.
xarem [,1lar aquilo que a ideologia esconde. Seu prÓprio êxito, Quando se diz que o conceiro de lírica, para nÓsalgo ime-
clucr elasqueiram ou não, passaalém da f~ds;!cOIl~cjC:llci;1. di:lro Caté cerro pomo uma segunda natureza, rem um (adter
Permiram-me que tome como pomo de panida a prÓpria completamente moderno, apenas se está exprimindo de manei-
desconfiança dos senhores, que selltem a lírica como algo oposto ra diferente essa percepção da essência social da lírica. De modo
à sociedade, como algo absolutamente individual. f\ a(C'lividade an,l!ogo, a pintura de paisagens e sua idéia de "natUreza" sÓ se
dos senhores faz quesrão de que isso permaneça assim, de que a desenvolveram autonomamente na Idade Moderna. Sei que es-
expressão lírica, desvencilhada do peso da objeriviebdc, evoque [Ou exagerando ao dizer isso, e que os senhores poderiam retru-
a imagem de uma vida que seja livre da coerçáo da pd.xis domi- car com muitos conrra-exemplos.O mais incisivoseria Safo. Não
nante, da utilidade, da pressão da auroconservação obrusa. Con- falo da lírica chinesa, japonesa ou ,írabe, pois não a leio no ori-
rudo, essa exigência feita à lírica, a exigência da palavra virginal, ginal e nurro a suspeira de que atravésda tradução ela é apanha-

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Notas rle literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

da por um mecanismo adapra!ivoque torna cO!llplctamcnreim- à alienação. A pura subjetividade dessas composições, aquilo que
possível o enrendimenro adequado. Mas as manifesrações mais nelasparece harmÔnico e não fraturado, testemunha o contr;Í-
anrigas do espírito lírico, no senrido específico que nos é f:lIl1i- rio, O sofrimento com a existência alheia ao sujeito, bem como
liar, só reluzem csporadiGlI1!(,Il!l', assim COl1l0cerros (lIndos da _o_o.ali;ís, sua harmonia não é propriamcl1-
o amor a essa L'xist0ncia
pintura amiga às vezes anrecipam, carregados de press;ígio, a idéia re nada mais que a consonància rcdpmel desse sofrimento e desse
da pinrura de paisagens.Elasnão estabelcccm a 1~)l"fn;1.
Aqueles amor. Os versos de Cocrhe "\F/lrtc Imr, balde / rubes! dll d/ld/'
grandes poetas do passado r('moro que s;io (lassil~cados pl'lns !Espera um pouco, logo i lU repousar;ís também] ainda rêm o
conceiros hisrÔrico-litedrios corno repn:Sl'llIa!IIi.'Sd;1lírica, p(Jr ~~l~Sro
de cOl1sohç,"ío:sua ahissal bekza (: inscpadve! daquilo que
exemplo Píndaro e Alccu, mas também hoa parte da ohr;t de eles calam, da represcl1lação de um mundo que rejeita ;1paz.
\Valther von der Vogclweide, estão a uma disdncia dcscoll1un;11 Somenre ao companilhar o luto por essa sitUaç;io o rom do poe-
de nossa mais primária represcfllaçãodo que seja a Iíríca. Falra- ma reafirma que, apesar de rudo, h;ípaz. Quase seríamos tenra-
Ihes aquele cadter do imediaw, do desrnatcrializado. quc nos dos a ir buscar em auxílio, no poema vizinho de mesmo ríntlo,
habituamos a considerar, justa ou injusramenre, como critério o verso "Ach, ich bin eles Tl'eibens müde" [Ah, estou cansado da
da lírica, e que apenas uma rigorosa formação [Bildul1g] culru- faina], para servir de inrerpretação ao "Wanderers Nachdied"
ral nos permite superar. [Noturno do andarilho]. Este poema certamente deve sua gran-
Entretanto, aquilo que entendemos por lírica, alHesmes- dezaao Euo de que náo bla de nada alienado e perturbado r, de
mo que tenhamos ampliado hisraricamcnre esse conceiro ou o que, nele próprio, o desassossego do objeto não é contraposto ao
direcionado criticamente conrra a esfera individualista. contém sujeira: pelo contrário, o poema reverbera o desassossego do pró-
em si mesmo, quanto mais "pura" ela se oferece, o momento da prio sujeito. É prometida uma segunda imediatidade: o que é
fratura..o cu quc ganha voz na lírica é um eu que se derennina humano, a própria linguagem, aparece como se fosse ainda uma
e se exprime como opostO ao coletivo, à objetividade; sua iden- vez a criação, enquanto tudo o que vem de fora se extingue no
tificação com a narureza, à qual sua expressão se refere, também eco da alma. Esse elemento humano, porém, é mais que aparên-
não ocorre sem mediação. O eu lírico acabou perdcndo. por as- cia, torna-se verdade integral porque, graças à expressão verbal
sim dizer, essa unidade co'm a natureza, e agora se cmpenha em do bom cansaço, ainda paira sobre a conciliação a sombra cio
restabelecê-Ia,pelo <lnimisrnoou pc/o mergulho no prÓprio eu. anseio,e mesmoda morre: no verso" \f/ar/e 1lI1J', balde"a vida
'$omente através da humanização há. de ser devolvido à nature- inreira se transforma, com enigmático sorriso de tristeza, no breve
za o direitOque lhe foi tirado pela dominação humana da naru- instante que antecede o adormecer. O rom de paz testemunha
reza. Mesmo aquelas composições líricas nas quais não se imis- que a paz não foi alcançada, sem que entretanto o sonho tenha
cui nenhum resíduo da existência convencion.lI e objetiva, ne- sido rompido. A sombra não rem nenhum poder sobre a ima-
nhuma materialidade crua, as mais alras composições conheci- gem da vida que rerorna a si mesma, mas somente ela confere
das por nossa língua, devem sua dignidade justamenre à força ao sonho, como Últimalembrança de sua deformação, a pesada
com que nelas o eu desperra a aparência da natUreza. escapando profundidade sob a canção sem peso. No semblanre ela namre-
Notas do literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

l.a t.:m repouso, do qual seapagaram os tra~'osde qualqucr serne- reacionário que vai intensificando seu louvor ao Anâen R{~r;i1lle,
lhança humana, o sujeito inrerioriza sua própria nulidade. Im- até chegar à exclamação: "E a quem, meus senhores, devemos
perceptivelmenre, a ironia roça em silêncio o que há de conso- agradecer pela revolução de 1789, a quem, senão a Luís XVI?".
lador no poema: os segundos que anrecedcm a bcrn-aven rurança Os senhores poderiam aplicar isso à minha concepção de lírica
do sono são os mesmos que separam da morre a curta vida. Essa e sociedade: nela a sociedade desempenharia o papel do rei exe-
sublime ironia, depois de Goerhe, decaiu em sarcasmo. Mas sel11- curado, e a lírica o papel daqueles que o combateram; mas a lí-
pre foi burguesa: a exalração do sujciro liberrado rraz consigo, rica pode tão pouco ser explicada a partir da sociedade quanto
como sua sombra, o rcbaixamclHodo sujei(o ,Icondiçío de algo o mérito da revolu~'ão pode ser atribuído ao monarca que ela
permut.ivel, de mero ser para ourro; a personalidade {Tal.consi- derrubou, mesmo que as tolices do rei tenham contribuído de-
go a humilhação do "O que você pensa que e". 1\ :lurenricída-
d d "N n .. . cisivamente para que ela irrompesse naquele momento históri-
e o oturno, enrretanto, esta em scu Instante: o que esta por co. Resrasaberse o depuradode Doré era efetivamenteapenas
trás de sua força destl"uriva ahlSta-o da esfera do jogo, enquanto um propagandista estúpido e cínico, tal como o desenhista o ri-
essacapacidadede destruição ainda não exercenenhuma violên- dicularizou, ou se em sua piada involunrária não h.t mais verda-
cia sobre o poder não-violento da consolação. Costuma-se dizer de do que admite o saud.íve/ bom senso; a fJlosollada história
que um poema lírico perfeito tem de possuir rotalidade ou uni- de Hegel teria muiro com que contribuir para a reabilitação da-
versalidade, tem de oferecer, em stla limitação, o rodo; em sua quele deputado. No entanto, a comparação não é inreiramente
finirude, o infinito. Se isso for algo mais que um lugar-comum justa. Não se trata de deduzir a lírica da sociedade; seu teor so-
daquela estética que rem sempre;\ mão, corno panacéia univer- cial é justamente () espontâneo, aquilo que não é simples conse-
sal, o conceito do simbólico, emão isso mostra que em cada poe- qÜência dasrelações vigentes em dado momento. Mas a filoso-
ma lírico devem ser encontrados, no lIIt'rlilllJ/do t'spírito .~uhjt'- fia -- novamcnte a de Hcgd - conhece a proposição cspecula-
tivo que se volta sobre si mesmo, os sedimentos da relação his- riva que diz que o individual é mediado pelo universal e vice-
tórica do sujeira com a objetividade, do indivíduo com a socie- versa. Ora, isso quer dizer que rambém a resistência conrra a
dade. Esse processo de sedimentação sed tanco mais perfeito pressão social não é nada de absoluramenre individual; nessa re-
quanto menos a composição lírica tematizar a relação encre o eu sistência agem arristicamente, arravés do indivíduo e de sua es-
e a sociedade, quanto mais involuntariamenre essa relação for. pontaneidade, as forças objetivas que impelem para além de LIma
cristalizada, a partir de si mesma, no poema. situação social limitada e limiranre, na direção de uma siruação
Os senhores poderão objerar-me quc, determinando as coi- social digna do homem; forças, portamo, que tàzcl11parte de LIma
sas desse modo, eu reria sublimado a tal palHa a relação earre lí- constiruição do todo, não meramenre da individualidade infle-
rica e sociedade,por temer o sociologismogrosseiro,quc no fun- xível, que se opõe cegamenre à sociedade.Se, em virrude de sLla
do nada mais resta dessa relação: exaramenre o não-social no poe- prÓpria subjetividade, pode-se falar do reor lírico como sendo
ma lírico
. seria agora
.... o seu elememo social. Poderiam recordar- objetivo - caso comrário não seria possível explicar o simples
me aquela caricatura de Gusrave Doré, de UI11deputado ulrra- faro que fundamenta a possibilidade da lírica como gênero ar-

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Notas de literatura I Palestra sobre lirica e sociedade

dstico: seu efeito sobre outros que não o poera em monÓlogo _. real' dessa camada, nãoéalgoexrernoaela.O insrantedo auto-
consigo mesmo -, isso só ocorre se a obra de arre líricl. ao re- ~squecimenro. no qual o sujeito submerge na linguagem, não
trair-se e recolher-se em si mesma, em scu disr;lncialllC'nro da consiste no sacrifício do sujeira ao Ser. Não é um insranre de
superfície social, for motivada socialmelHc. por sohre a cabeça violência, nem sequer de violência contra o sujeito, mas um ins-
do auror. O meio para isso. porém. é a lin~uagem. O paradoxo tante de reconciliação: a linguagcm fala por si mesma apenas
específico da configuração lírica. a subjeri\.jebdc que se reverre quando deixa de falarcomo algo alheio e se rama a própria voz
em objetividade, está ligado a essa prim,1'l.iada conformação lin- do sujeiro. Onde o eu se esquece na linguagem, ali ele est,í in-
gÜística na lírica, da qual provém o primado da linguagem na teiramentc presenre: senão a linguagem, convertida em abraca-
criação literária em geral, aré nas formas em prosa. Pois :1prÓ- dabra sacralizado. sucumbiria ~ reificação, como ocorre no dis-
pria linguagem é algo duplo. Arravés de suas connguraç:ões, a curso comunicarivo. ivias isso nos leva de volra à quesrão da re-
linguagem se molda inreiramente aos impulsos subjerivos; um lação real enrre indivíduo e sociedade. Não apenas o indivíduo
pouco mais, e se poderia chegar a pensar que somcnre ela os b.z é socialmente mediado em si mesmo, não apenas seus conteÚ-
amadurecer. Mas ela conrinua sendo, por outro lado, o meio dos dos são sempre, ao mesmo tempo, rambém sociais, mas, inver-
conceitos, algo que estabelece uma includvcl rderência ao uni- samente, também a sociedade configura-se e vive apenas em vir-
versal e à sociedade. As mais altas composiçÔes líricas são, por [llde dos indivíduos, dos quais ela é a quinressência [IlIbegl'ijf].
isso, aquelas nas quais o sujeiro, sem qualquer resíduo da mera Se cerca vez a grande filosofia construiu a verdade, hoje sem dÚ-
matéria, soa !lê.linguagem, até que a própria linguagem ganha vida desdenhada pela lógica da ciência, de que S.lIjeime objeto
voz. O amo-esquecimento do sujeiro, que se entrega à lingua- não seriam pólos rígidos e isolados, mas só podem ser determi-
gem como a algo objetivo, é o mesmo que o cadter imediara e nados a partir do processo em que se elaboram e modificam mu-
involunt,írio de sua expressão: assim a linguagem estabelece a ru;1me~te, então a lírica é a conrraprova estética desse filosofema
~ediação entre lírica e sociedade no que h;í de mais intrínseco. dialérico. I:Jo poema lírico o sujeito nega, por idemificação com
Por ISso, a lírica se mostra mais profundamenre assegurada, em a lingll<lgem,tamo sua mera contradição monadológica em re-
termos sociais, ali onde não f.11aconforme o gosto da sociedade, lação à sociedade, quanto seu mero funcionar no intcrior da so-
ali onde não comunica nada. mas sim onde o sujeitO, alcançan- ciedade socializada. Quanto mais cresce, porém, a ascendência
do a expressão feliz, chega a uma sintonia com a própria lingua- desta sobre o sujeira, mais prccária é a situação da lírica. A obra
gem, seguindo o caminho que ela mesma gosraria de seguir. a~Ba~;d~laire foi a primeira a registrar esse processo, na~"edida
Mas a linguagem, por outro lado, também não deve ser em que, como a mais alra conseqÜênciado vefeltJCh11lel'z [dor do
absolurizada enquanto voz do Ser, oposra ao sujeira lírico, como mundo] europeu, n,ão se comenrou com os sofrimenros.do in-
agradaria a muitas das reorias onrolÓgicas da linguagem em voga divíduo, mas escolheu como tema de sua acusação a própria mo-
atUalmenre. O sujeito, cuja expressão é necess;íria, cm Elce da dernidade. enquanto negação completa do lírico, extraindo dela
mera significaçãode conreúdosobjetivos, para que se alcanceessa suas flíscas poéticas, por força de uma linguagem heroicamente
camada de objetividade lingüística, não é um adendo ao próprio :?stilizada. Em Baudelairc já se anuncia um elemento de deses-
Notas de literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

ríscico: seu efeito sobre outros que não o poeta em monÓlogo lcor dessa camada, não é algo exrerno a ela. O installte do <luro-
consigo mcsmo -, isso só ocorre se a obra de arfe lírica. ao re- ~squccimenro. no qual o sujeitO submerge na linguagem, não
trair-se e recolher-se em si mesma, em scu disranciamcnro da consiste no sacrifício do sujeiro ao Ser. Não é um instante de
superfície social. for morivada socialmente. por sobre a cabeça violência, nem sequer eleviolência contra o sujeira, mas um ins-
do autor. O meio para isso. rorém. é a lin~~uag(:m.
O paradoxo tante ele reconciliação: a linguagem fala por si mesma apenas
específico da configuração lírica, a subjer.i\"idade que se re\lene quando deixa de hl/ar C0l110algo alheio e se torna a própria voz
em objetividade, está ligado a essa prim,l'l.ia da conformaç;10 lin- do sujeira. Onde o eu se esquece na linguagem, ali ele eSr;l in-
gÜística na lírica, da qual provém o primado da linguagem na teiramelHe presenre; senão a linguagem, convenida el11abraca-
criação literária em geral, até nas formas em prosa. Pois a prÓ- dabra sacrali'l.ado. sucumbiria à reificação, como ocorre no dis-
pria linguagem é algo duplo. Através de suas conl~gurações, a curso comunicativo. Mas isso nos leva de volra à quesrão da re-
linguagem se molda inteiramente aos impulsos subjetivos; um lação real entre indivíduo c sociedade. Não apenas o indivíduo
pouco mais, e se poderia chegar a pensar que somcl1[e ela os faz é socialmente mediado em si mesmo, não apenas seus conteÚ-
amadurecer. Mas ela continua sendo, por outro lado, o meio dos dos são sempre, ao mesmo rempo, rambém sociais, mas, inver-
conceitos, algo que estabelece uma ineludvcl referência ao uni- samente, rambém a sociedade configura-se e vive apenas em vir-
versal e à sociedade. As mais alras composições líricas são, por tUde dos indivíduos, dos quais ela é a quinressência [IlJbegri.ff1.
isso, aquelas nas quais o sujeira, sem qualquer resíduo da mera Se cena vez a grande filosofia construiu a verdade, hoje sem dÚ-
matéria, soa n;;.linguagem, até que a própria linguagem ganha vida desdenhada pela lógica da ciência, de ques.ujeiwe objero
voz. O aUto-esquecimento do sujeiro, que se entrega à lingua- não seriam pólos rígidos e isolados, mas só podem ser detenni-
gem como a algo objetivo, é o mesmo que o caráter imediatO e Ilados a panir do processo em que se elaboram e modificam mu-
involunr;írio de sua expressão: :lssim a linguagem esrabelece a tu,lmenre, então a lírica é a conrraprova esrérica desse filosofema
mediação entre lírica e sociedade no que há de mais intrínseco. dialérico.l:'Io poema lírico o sujeito nega, por idenritlcação com
Por isso, a Ifrica se mostra mais profundamente assegurada, em a lingÚagem, tanto sua mera contradição monadológica em re-
termos sociais, ali onde não f.11aconforme o gosto da sociedade, lação à sociedade, quanto seu mero funcionar no interior da so-
ali onde não comunica nada, mas sim onde o sujeito, alcançan- ciedade socializada. QuantO mais cresce, porém, a ascendência
do a expressão feliz, chega a uma sintonia com a própria lingua- desta sobre o sujeito, mais predria é a situação da lírica. A obra
gem, seguindo o caminho que ela mesma gostaria de seguir. a~13a~ld;lajre foi a primeira a registrar esse processo, na~~~edida
Mas a linguagem,por outro lado, rambém não deve ser "emque, como a mais alra conseqÜênciado V7eltJdJluerz[dor do
absolurizada enquanto voz do Ser, oposta ao sujeito lírico, como mundo] europeu, n,ãose contentoucom os sofrimenros.doin-
agradaria a muitas das teorias onrolÓgicas da linguagem em voga divíduo, mas escolheu como tema de sua acusação a própria mo-
atualmente. O sujeira. cuja expressão é necess,íria, em Elce da dernidade, enquanro negaçãocomplera do lírico, exrraindo dela
mera significaçãode conreÜdosobjetivos,para que sealcanceessa suas hlíscas poéticas, por força de uma linguagem heroicamente
c1Il1aclade objetividade lingÜística, não é um adendo ao próprio ~srjlizada. Em Baudelaire já se anuncia um elemento de deses-

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Notas de literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

pCr.0' que se equilibra no CII/IlCdo scu pníprio car;írcr parado- prÔpria voz, na qual se enIa_çal~1? ~~)~rimel1to e o sonho. 1\ afir-
xal. Quando a comradição enrre a linguagem poética e a comu- l11ãçiíõdesse direito inalienável tem sido uma constante, ainda
nicativa se intensificou ao extremo, toda lírica se tOrnou um jogo que de manei;a--impurae mUtilada,fragmemária e intermiten-
de tudo ou nada; não porque tenha se tOrnadoinimcligível,como re, a única possível para aqueles que têm o fardo para carregar.
pretenderia a opinião filisrin;l, mas porqllc. un icamen rc em vi 1'- UI!1acorrente subterrânea coleriva é o fundamcnto de toda líri-
tude de ter ramado consciência de si mesma enquanto lingua- (;1individual. Se esta visa efetivamemeo rodo e não meramente
gem artística, através de seu esforço cm alcançar lima objetivida- lima parte do privilégio, refinamento e delicadeza daquelc que
de absolUta, não limitada por qualquer preocllpa~:<locom a (0- pode sc dar ao luxo de ser delicado, então a substancial idade da
munica~:ão, ela ao mesn10 tcmpo se a(;lsla d;! ohjt'li\'ichdc do t'S- lírica individual (kriva csscnciall11cl1!cde sua panicipa(;;Í() nessa
pírito, da língua viva, criando um aparato poérico que substitUi corrente subterrânea coletiva, pois someme ela faz da lingua-
uma linguagem não mais presenre. O momento pocrizante c elc- gem o meio em que o sujeito se tOrna mais do que apenas sujei-
vado, subjetivamente violento, da cnfraquccida lírica posterior to. A relaçãodo Romantismo como Vollulier./[canção popular]
é o preço que ela tem de pagar para se malHeI'objerivamenre viva, é o exemplo mais visível disso, mas certamente não o mais inci-
sem ser desfigurada ou maculada; seu falso esplendor é o com- sivo. Pois o Romantismo persegue programaricamcnte uma es-
plemento do mundo desencantado do qual ela se desprende. pécie de transfusão do coletivo no individual, e por issoa lírica
Tudo isso, sem dúvida, precisa ser resrringido para não ser individual buscava,atravésda técnica, a ilusão da criação de vín-
mal interpretado. O que afirmei foi que a configuraç;ío lírica é culos universais, sem que esses vínculos surgissem dela mesma.
sempre, também, a expressão subjetiva de um antagonismo so- Em contraste, os poeras que desdenhavam qualquer emprésrimo
cial. Mas como o mundo objetivo, que produz a lírica, é um da linguagem coletiva freqüentemente participavam dessa cor-
mundo em si mesmo antagonísrico, o conceitO de lírica não se rente subterrânea coletiva, em virtude de sua experiência histó-
esgota na expressão da subjetividade, à qual a linguagem confe- rica. Çito Baudelaire, cuja lírica não apenas é um rapa na cara
re objetividade. Não apenas o sujeira lírico incorpora de modo do juste mifí.eu, como também de rodo essesentimento burguês
decisivo o rodo, quanto mais adequadamcntc se manifesta, mas \ de compaixão social, que no entamo, em poemas como "Les
antes a própria subjetividade poérica deve sua existência ao pri- petires vieilles" [As velhinhas] ou o da servente de grande cora-
vilégio: somente a pouquíssimos homens, devido ;'ISpressões da ção dos TableauxparisicJ1S[Quadros parisienses], era mais fiel
sobrevivência, foi dado apreender o universal no mergulho em ;'ISmassas, para as quais voltava sua m;íscara rdgica e arroganre,
si mesmos,ou foi permirido que se dcscnvolvessemcomo sujei- do que roda a poesia sobregente pobre fArml'leu/epocJie]."Hoje,
tos autônomos, capazes de se expressar livremenre. Os ourros, quandoo pressuposto daqueleconceirodelíricaquetomo c{;-mo
contudo, aqueles que não apenas se cnconrram alienados, como ponto de partida, a expressão individual. pareceabaladoaré o
se fossem objetOs, diante do dcsconcerrado sujei ro poético, mas ámago na crisc do indivíduo, a corrente subterrânea da lírica
qlletambém foram rebaixados liter;l]menre;, condição de obje- aflora com violência nos mais diversos pontos, primeiro como
(O da hisrória, têm tanto ou mais direiro de rarearem busca da mero fermento da própria expressãoindividual, mas logo tam-
Notas de literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

bém como possível antccipação de urna simação que ultrapassa "NotUrno". As duas composições sobre as quais quero dizer al-
a mera individualidade. Se as traduções não enganam, García go parricipam, cerramente, da corrente subterrânea coleriva. Mas
Lorca, que os agentes de Franco assassinaram e que nenhum re- gosraria de chamar a atenção dos senhores sobrerudo para o
gime totalidrio teria podido suportar, é porrador de tal (Órç1; e modo como, nelas. diversos graus de uma relação contradirÓria
o nome de Breclu se impõe como o do lírico que' soube preser- fundamental da sociedade são exposws por intermédio do su-
var a inree:ridade
J da line:uagem
,-I sem ll UCtCl1ha,:ido ohrig;ldo
1.. a jeiw poético. Devo reperir que não se trata da pessoa privada do
pagar o preço do esorerismo. Ahstenho-mc de julgar se aqui o poeta, nem de sua psicologia, nem de sua chamada "posiç~ioso-
princípio poérico de individuação h)j efeti\';\I1)C'lHesuperado t'm cial". mas do prÓprio poema. tomado como relÓgio solar hisrÔ-
um princípio superior, ou se o ~illllbmenro disso l: a rq~ress:io e rjco-tilosórico.
o enfraquccimcnto do Ctl. Talveí'. o vigor mkli\'o d;llírica con. 1':111
primciro 11.I~;lr,
~()sraria de ler para os scnhorcs o poc-
temporânea se deva, em larga mcdida. aos rudimclltos lingÜís- lHa "Aufeiner \XIanderung" [r:,m uma caminhada], de MÓrike:
ricos e anímicos de uma condição ainda n;io ilHciramCllle indi-
viduada, pré-burguesa no senrido mais amplo do rcrnJO -- o /11 I.'ÍI1/i'l'1Il/rl/icf,c's SllirlldwlI IreI il'f, l'ill,

dialeto. A lírica tradicional, porém. como a mais rigorosa nega- {li rim SlrlUSCI/ /ÍlXI mlfl' A /mlrl.l'(f,l'ÍI/.

ção estética dos valores da burguesia, tem permanecido até hoje, /IIIS t'Í1I1'1IIr~llill'll h'wlt'l' dml,

justamente por isso, ligada à sociedade burguesa. Ü/Ja tlt!IJ l'l'Ídl.l'lcll /J/lIl1u',!/lor

Hi/ll(ILg, bort I//r/II Go!r(r;;lockl'1ltihll' sclJ((lebl'll,


Mas porque consideraçôes de princípios n;io s:ío suf'icien- UI/d cinc Stil1l1lJ1' .I'I.ht'ÍIII I'il/ Nr/(hligrl//l'IIdlOr,

tes, eu gostaria de concretizar, em alguns poemas, a rel:lção que f)".f.i tlie Blfi/m /}{,/;I'll,

o sujeito poético, que sempre representa um sujeiro coletivo mui- D(m dic Liifrc lebl'll, .
to mais universal, manrém com a realidade social que lhe é al1- DaJs iil hohl'l'elll ROI dic Rusm ICllchll'l/ lior.

ritérica. Nesse processo, os elemcntos matni;lis, dos quais ne-


/,"'Ig I;ie'!t id; JI/flll/e'l/rI, IWI/;ddll 11I11I1'1I.
nhuma composição de linguagem, Ilem mesmo a p(}(~ficpur(', é
Wie ich /}illllllJ 11(11'.1'
Tllr gekollllllm,
capaz de despojar-se intei ramente, precisa rão de inrerpreração fC/} weÚs es wtll}r/ich se/bl'l' lIic/;t.
ranto quanto os assim chamados elemcnros f()l'Inais. Scd espe-
Ach hiel', /(Iie li/Xt die \";1e/1so lirbt!
cialmente enfatizado o modo como ambos se inrcrpenetr;lm, pois
Der Hilllllld lUogl i'l jil/1j!llI'lJt.'1II Ce'II'fib!e',
somenre em virtude dessa inrerpel1<.:na~j()() pocma lírico captura
Riirkllllirts die Sttlrll il/ goldl/cm [(III/c/);
realmenre, em seus limires, as badaladas do rempo histÓrico. No \\?ie rr/1/sc!}t der Erlm!Jnc;" I(lie I'Ilwcht im Gmilr! rlie AfiiMe!
emanto, não gosraria de me arer a pocmas como o dc Gocrhc,
fch bill ,uie Iml//ml. in:<!J:flihrt-
do qualj:i comentei alguns aspectos sem :udid-Io a fundo. m;lS () MI/se', rill h"SI IllI'ÍI/ /-/I'1'Zbl'1'iif/J'l
sim escolherei obras mais recelllCS,versos quc n;io sesingulari- AI Íl eÍlIi'lII Liebesf,'l/Icf,.'
Dll11 incondicionalque caracrerizao
por aquela<lLltcnricidade
Notfls de líteralwa I Palestra sobre lírica () sociedade

Entrei numa am~ívd cidadezinha. proximidade mais prÓximacom a da mais exrrema disrância. 1\
Wmla conhece a cidadezinha apenas como cenário fugidio, não
Nas ruas o rllhor da tarde resplandecia.
Dc uma janela aberta. cntão.
como paradeiro. A grandeza do sentimento que se prende ao
Por cntrc floreiras ricamcnte em flor enca nto causado pela voz da rapariga, e não escura apenas aque-
E botão. ouviam-se' os sons de UIlldOllr;lllo carrilh,lo. la voz, mas :1de toda a natun.'za, em coro, só se l11anifesra para
al~1l1do centÍrio limirado, soh a ondulação pÜrpura do céu. onde
E urnavozqucparcciarouxi'Híis em (111'0.
Fazendo as flores rn::ll1erl'm. :\ cidade dourada e o riacho murmurante se conjugam em ilJltl-
Fazcndo os arc's re'\'iI'CI'cm. go. Para isso conrrihui, no plano da linguagem. um demenro de
I 111lI:ff;1Iic!t1t/t.
como de uma ode. imponderavdmcnlc rcnnado c
Fazcndo qual brasa brilh:lrt'111as rosa.. em ';Jgo.
quase impossível de ser lixado no deralhe. Como se soassem de
Ali fiquei parado.extasiadode prazer. longe, os rirmos livres evocam esrrofes gregassem rima, assim
E na vcrdad(~não consigo pcrcehe'r como, por exemplo, o pathos que irrompe no verso final da pri-
Como os pOr!'õesda cidade ClItr;lI1spus. meira estrofe, cujo efciro é obrido apenas com o mais discrero
Ah, como aqui o mundo é pura luz! dos recursos, a inversãoda ordem das palavras:"Dassin hoherem
O céu ondula em plírpul'O rorvclinho Rot c!ieRosen leuchten vor" [Fazendo qual brasa brilharem as ro-
E hi atr;ísdesvanecea ciebdcem dourado fulgor; sas em fogo]. Decisiva é a palavra !v/use [Mllsa], no final do poe-
Como murmura o riacho entre os alnos. como murmura ma. É como se essa palavra, uma das mais desgasradas do Clas-
lao fllndo o moinho sicismo alemão, hrilhasseuma vez mais. como que :1lu? do sol
Estou ébrio. perdido cm c()n~llsão- poenre, por estar arribllída ao genills /oci [espírito do lugar] da
() Musa, tocasrc o meu coração am:Ível cidadezinha. (~como se, mesmo a ponco de desaparecer,
Com um sopro de amor! eia ainda possuísse rodo aquele poder de encantamento que, em
invocações à Musa com termos da linguagem moderna, costU-
A imagem que se impõe é a daquela promessa de felicida- ma descambar em algo simplesmente cÔmico. Em praticamen-
de ainda hoje proporcionada a quem visira. no dia cerro. lima te nenhum ourro aspecto se prova tão perfeira a inspiração do
cidadezinhado sul da Alemanha, mas sem a menor concessão ao poema quanro no faro de que, no ponco crírico, a escolha da pa-
pitoresco, ao idí/io da cidade pequena. O pocma transmireo scn- lavra maischocanre, cuidadosamenrepreparada pelo latenregesto
rimemo de calor e de ahrigo 1.'11111111
espaçocsrreiro.(' no el1fal1fo lingiiísrico grego, resgaraa intensa dinâmica do rodo, como lima
é ao mesmo tempo uma obra de esrilo elevado. IÚO mandada cadência musical. ;\ lírica consegue, no espaço mais exíguo, ter
pelo tom do conforTável e do aconchegante, ncm disposta a lou- êxito naquilo que a épica alemã, mesmo em concepções como
var senrimenralmenre a estreireza comra a v:lsridJo. Oll a felici- l{alllfllll1 IIne!Dorothea de Goerhe, renrava em vão alcançar.
dade em cada esquina. Rudil11elHarl's. :I Uhul:l l' :I linguagem i\ inrerprer:1\;ão social de rall'xito diz respeito ao gratl de
auxiJiam. em igual medida. ;lllnj(ICIJ' aniSlic,ll11l'IHl' a uropia da ,:xperi['ncia histÓrica que sc cvidencia no poel11a. Em nOllll' da

80 81
Nota~; da litnratura I Palestra sobra lírica e sociedade

humanidade, da univer.did;ICIc do hllI11;II!O,() (llssicis/l1o alt:- vai :t/ém (l:1quiloque podia ser verdadeiramclllc akan~'ado cm
mão havia pretendido desemharaçaro impulso sllhjerivo, amea- sua época. A rão aclamada organicidade de sua produção nada
çado de contingência cm uma sociedade na CJualas rela~'c)esen- mais é, provavelmente. do que esse tino histÓrico-~lIosÓfico,quc
tre os homens j;í não eram imediatas, ma, permancciam me- quase nenhum OlUro poeta de língua alemã possuiu na mesma
diadas apenas pelo mercado. O Classicismn aspirava aUI11~1 oh- medida. Os traços supostamenre doentios de MÜrike, identifi-
jetivação do subjerivo, assim como Hcgcln<l filosofia, l' t('nl;\\';1 cados c relarados pelos psicÓlogos, e mesl110o esrancamcnto de
superar as comradições da vida realdos homens ;\1raVl-Sde slla sua produção no tilrimo período, são o aspecro negarivo de sua
reconciliação no espíriro, na idéia. A persisr~ncia dess;]s comra- extrema compreensão do que é possível. Os poemas desse p;íroco
dições na realidade, entretanro, acabou compromctendo a solu- hipocondríaco de Cleversulzbach, que costuma ser incluído no
ção espiritual:diante de LImavida desprovida de scntido. uma rol dos arristas ingênuos. sflo peças de virruosismo jamais supe-
vida que se esgota na az<il~lInados interesses concorrerw:s, uma radas por nenhum mestre da filrt pour f'art. Mõrike é rITosensí-
vida que a experiência artística percebe corno prosaica; diante de vel ao que há de vazio e ideológico no esrilo elevado quanro ao
um mundo em que o desrino dos homens individuais se cum- que h;í de tacanho, de apatia pequeno-burguesa e de cegueira
pre na obediência a leis cegas, a arte cuja forma d,í a impressão dianre da totalidade, no estilo Biedermeier, período em que se
de falar em nome de uma humanidade realizada converre-se em situa a maior pane de sua lírica. Nele, o espírito é levado a com-
mero palavrório. O conceiro de homem que o Classicismo ha- por, pela úlrimavez,imagensque não se traem nem pelo requinre
via alcançado se retrai, por isso, na existência privada do homem do drapeado nem pela vulgaridade da conversa de botequim,
singular, e também em suas imagens; somente nelas o humano nem pela grandiloqÜência de um dó-de-peiro nem pelos maus
parecia aindaestar a salvo. A burguesia te\'(' ncccssariamente de modos à mcsa. Como sobre o ~IOda navalha. cm N\i}rikc ainda
renunciar, tanto na política quanro nas /"(.)I')11aSestéticas, à idéia ressoam as reminiscências do estilo elevado, junro com os sinais
da humanidade como um rodo capaz de aurodetermina~'ão. É de uma vida imediata que ainda promeriam realização, quando
a fixação obrusa nessa esfera restrira do que ainda est;í preserva- i;íestavam, na verdade. condenados pela tendência histórica. A
do, também ela resultado de uma coerção. o que torna rão sus- ambos saÜdao poeta, em llma caminhada, apenas quando estes
peitos, então, ideais como os de conforto c aconchego. O prÓ- esrão presres a desvanecer. Ele já comparrilha o cadter parado-
prio sentido est;Í vinculado ;1cotHingência da Idicidade indivi- xal da lírica na incipienrc era indusrrial. Tão vacilanres e ~i';igeis
dual, àqualse atribui, por uma espéciede usurpação, uma dig- como essas pioneiras soluções de Mõrike foram rambém as so-
nidade que ela só alcançaria junro com a felicidade do rodo. r\ luções de rodos os grandes líricos que o sucederam, mesmo dos
força social da genialidade de IV!orike, porÓll, consisre na arri- que parecem separados dele por um abismo, como aquele Bau-
culação das duas experiências, a do estilo l'lcvado do Classicismo dclaire. cujo estilo Claudcl descreveu COl110um misto de Racinc
e a da miniatura privada do Romantismo, reconhcC\:ndo os limi- e dos jornalisras de seu tempo. Na sociedade indusrrial. a idéia
tes de al))bas as possibilidades e equilibrando-as rcciprocamcn- lírica da imediatidaek que se amo-regenera roma-se, na ml'dieb
rI"',com incompaJ";\ve! tino. Em nenhum impulso exprcssin) de quenãoevocaimporenreo passado rom;\ntico. cada \'C7,mais
;::111
Noras de literatura I Palestra sobre lírica e sociedade

III})~ilíbito lampcjo, em que o possível transcende sua prÓpria Agora o maio trama
impossibilidade. Agora devo ao fim
O curto poema de Stefan George, sobre o qual gostaria ain- Por tells olhos c teu sim
da de Ihes dizer algo, surgiu em uma fase muito mais tardia des- Dias a fio
se desenvolvimenro. É uma das célebres canções de Da Sil'hClltC' Viwl' em chama.
Rillg [O sétimo anel], um ciclo de composi~'()es cxlTcmamelllC
densas, que apesar da leveza do ritmo estão sobrecarrcgadas de Quanro ao estilo elevado, não há um segundo de dÜvida.
substância e livres de todo ornamenro .Illgcl1drtil.Sua arrojada ;\ felicidade das coisas prÓximas, que ainda toca o poema tão l11ai~
ousadia sÓfoi resgatadado vergonhoso conscrvadorisrno cultu- .lntigo de Ivlürike. esd interditada. Foi banida jusramelltc pOI
ral do Círculo de George quando o grande compositor Anton :tqude jJtltbo,inietzschcano da distância, do qual Ccofge se re-
von Webern a musicou; em Ceorge, '-- a idcolo!!ia
' e o (cor social conhecia como herdeiro. Entre Morike e ele jazem os inrimi-
estão separados por um abismo. A canção diz: danres despojos do Romanrismo: os res[Osdo idílio eStão irreme-
1m 1l'ílldr's-1/Jt:I}('11 diavelmente envelhecidos e degeneraram em pieguice. Enquan-
\\",Iar meillefrnge
[() a poesia de Gcorge, a de um indivíduo soberano, pressupõe
Nur trfiumcl'C'i. como condição de sua possibilidade a sociedade individualista
Nu r I;ichclll 1/111
r burguesa e o indivíduo cenrrado em si mesmo, um an<Ítema é
lançado ranro sobre o elemellto burguês da f()J'Inaconvencional
\V'm dll g~e:clJi'I/.
Aus IIlwa IWrlJ( qU:IIIIOsobre os (OUldldos hmgul'ses. No CIH<1I1ID, uma vez quc
essa lírica não pode Ellar a parrir de nenhuma oUtra eStrlHUra
Eill glllllz 1'lltjulJ( --
Nltll clriillgt der IJ/iI;
geral além da burgucsa, que ela rejeita não apenas ri priori C ta-
citamenre, mas também cxpressamenre, então ela fica represada
N/m I1I11SSich gflr
c renui: simula a parrir de si mesma, de forma aurocrática, uma
Um rleill illIg Itml h(llIl'
condição feudal. É esse elemento social que se esconde por tds
AlIe IfIge
1/1 sl'/IJ/I'IIII'bl'll. daquilo que o lugar-comum denomina a atirude arisrocnitica de
George. Ela não é a pose que exaspera o burguês,
. incapaz de.
No recerdo wntO manusear esses poemas, mas antes, por maIS que seu gesto seja
Foi mell pedido hostil à sociedade, ele é fruro da dialética social que nega ao su-
Só devaneio. jeiro lírico a identificação com o strltU.íquo e seu reperrÓrio de
Sóum sorriso formas, embora essesujeira esteja inrimamente ligado 11realida-
Tua resposta. de vigenre: ele não pode falar de nenhum ourro lugar que não
r\ noire cncharcada seja o de uma sociedade passada, ela mesma senhorial. Desse
Um brilho propaga.- passado é tomado de empréstimo o ideal de nobreza que dira a

84 .. 85
Notas clnlitoraturo I Palestra sohre lírica e sociedade

escolhade cada palavra. imagem c som no poema; e a rÓrmaé ção, principalmenre ao legado cIassicista. Esse estilo é alcança-
medieval de um modo quaseimperceptível, corno algo impreg- do não pelo recurso f.ícila certas figuras de ret6rica e a determi-
nado na configuração lingÜística. Nessesentido, o poema,assim nados ritmos, mas na medida em que economiza asceticamenre
como o conjunto da obra de George, é efetivameme nco-rom:ln- tUdo aquilo que poderia diminuir a distância em relação à lin-
rico.Não se evoca,porém. nem realidadesnem sons, massim guagem degradada pelo comércio. Aqui, para que o sujeito seja
um esrado de alma absorto. A larencia do ideal. artisricamenre c\paz de, em sua solidão, resistir verdadeiramente à reificação.
conquistada. a ausência de qualquer arcaísmo grosseiro, deva a ele l1ilopode nunca mais se refugiar no que lhe é prÓprio, como
canção acima de roda ficção desesperada.que da emreranro ofe- St'fosse sua propriedade; os vesdgios de um individualismo que.
rece; é tão impossível confundi-ta com a poesia que imira como nesse meio-rempo, j;í se enrregou ;\ turela do mercado, nos su-
mero enfeite de paredeos rnenesrréise a epopéia medievalquan- plemenros liter,írios, asslIstam: o slljeiro precisa abandonar a si
to misturá-Ia com o reperrÓrio da lírica do mundo moderno; seu mesmo, na medida em que se cala. Ele precisa se converter no
princípio de estilização resguarda o poema do conformismo. O recepr:íclllo, por assim dizer, da idéia de uma linguagem pura,
espaço deixado para a reconciliaçãoorg;lnica de elementos (011- que os grandes poemas de George buscam resgatar. Formado nas
flitanres, no poema, é tão reduzido quanro o que em sua época línguas románicas, e especialmente naquela redução da lírica ao
havia para o seu apaziguamcnro real: eles só são subjugados por mais simples, pela qual Verlaine a converreu em instrumento
seleção e por eIipse. Onde as coisas mais próximas, aquilo que para o mais diferenciado, o ouvido do discípulo alemão de Mal-
comumente se denomina experiências concreras imediaras, ain- larmé ouve sua própria língua como se fosse estrangeira. Supera
da são admitidas na lírica de George, elas siioconsentidas uni- a alienação da língua marerna, provocada pelo uso, e a intensifi-
camente quando pagam o preço da mito]ogização: nenhuma ca até o estranhamento de uma língua que pl'Opriamente j,í não
delas pode permanecer o que é. Assim, numa das paisagens do é mais falada,uma língua imagináriaem cuja composiçãoo poera
Sétimo anel, a criança que colhia amoras silvesrres é meramol'- imui porencialidadesjamaisrealizadas.As quatro linhas: "NUll
foseada, sem uma palavra sequer, em uma criança de conros de Imm iclJgari Um deil1 a/lg ((11e1
lJaarl Alie lage I /11sefmen febell"
t:1da. como se tivesse sido tocada pela l11;ígicabrural de uma va- [Agora devo ao fim / Por teus olhos e teu sim / Dias a ~Io/ Vi-
rinha de condão. A harmonia da canção é cxrorquida de uma ver em chama], que considero um dos momcntos mais E1scinan-
exrrema dissonância: ela se baseia naquilo que Valéry denomina- res da lírica alemã, são como uma citação, mas não de ourro poe-
va refus, uma implacável recusa a rodos os meios pelos quais a ta, e sim daquilo que foi irreparave\mente perdido pela língua:
convenção lírica imagina caprurar a aura das coisas.Esse proce- os Mimwlinger [poetas medievais alemães] teriam conseguido
dimento rerém apenas os modelos, as puras idéias formais e es- rrovar com êxito esses versos, se uma cerra rradição ela língua
quemas do lírico, quc, ao rejeitarem tOda e qualquer cOlHingên- alemf\, ou mesmo, seríamos remados a dizer, se a própria língua
cia, falam mais uma vez com imensa expressividadc. Em plena \lcmã tivesse rido êxiro. Era nesse espíriro que Borchardt queria
Alemanhaguilhermina,o esrilo elevado. do qualessalíricapo- :raduzir Dante. Ouvidos sutis rêm tropeçado nesse elíptico "gar"
kll1icall1eme se desvcncilha. nilo pode apc.'lara nenhuma rradi- "ao rim], que sem dÜvida subsritui "gtl11Z/117(1
gar" [ao fim e ao

86
cabo] e foi utilizado, em cerra mcdida, por quesrÓcs de rima presclHa o scr-cm-si da linguagem conrra sua servidão no reino
Pode-scadmilir tal crítica, COI)}Ose admitl' qUl' ;1 pala\'l";I, 1;1i dos Ill1s. iVlascom isso a lírica I~dacm nome do pensamcmo de
como foi encravada no verso, n;ío of('rece I1laisnenhum sClHidc uma humanidade livre, mesmo que a Escola de Gcorge o lenha
exato. Mas as grandes obras de arre S30aquelas quc. el11 SCllS dissimulado no culto inFerior das altUras. A verdade da lírica de
pontos mais problemâticos, acabam sendo k'lizcs. Assim como, George reside em sua consu mação do particular, na sensibilida-
por exemplo, as mais sublimes obras musicais não sc esgotam
,. de que repudia tanro o banal como até mesmo o selera, derru-
puramente na sua construção, mas a transcendem com um par bando os mllros da individualidade. Se a expressãodessa verda-
de notas ou compassos supérfluos, o mesmo ocorre nl.'sscpoe- de se condensou em lima expressãoindividual, inteiramente sa-
ma com o "gar", uma goctheana ''sedimcntação do absurdo", curada com a substància e experiência da prÓpria solidão, emão
pela qual a língua escapa da inrenção subjetiva que trouxe a pa- é justamenre essa [tia que se torna a voz dos homens, eIHre os
lavraao texto. É provavc!mclHe essemesmo "gl/r" qlH: csrahclcce <juais já não existe barreira.
a dignidade do poema, com a força de um déjri 1m: atravÓ dele
a melodia do poema se estende para além da mera signitlcação.
Na época em que a linguagem declina, Gcorge capta na prÓpria
linguagem a idéia que lhe foi negada pela marcha da histÓria, e
articula versos que soam, não como se fossem dele, mas como
se tivessem existido desde o começo dos tempos, e devessem per-
manecer assim para sempre. No clltaIHo, o (adrer quixoresco
dessa empreitada, a impossibilidadede uma ral poesia reparadora
c o perigo do arresanato,reforçam ainda mais o teor do poema:
o quimérico anseio da linguagem pelo impossível torna-se expres-
são do insaciável anseio erótico do sujeito, que no oUtro seali-
via. Foi preciso que a individualidade, intensificada ao exrremo,
reverresse em aura-aniquilação -- e qual é o significado do cul-
to do últimoGeorgeao amante Maximin, senão uma renúncia
à individualidade, apresenradade maneiradesesperadamente po-
sitiva - para alcançaressat1ntasmagoriaque a língua alemã. em
seus maiores mestres, sempre tateou em vão: a canção popular.
É somenteem virrudede limadiFerenciadolevada
, rão longc
, a
ponto de não poder mais suporrar sua prÓpria dill'rcnça, nã.o
poder mais suporear nada que não seja o ul1i\'crsalliberrado, no
indivíduo, da vergonha da individuação, que a palavra lírica re-

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