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GERAIS 25
PRAZER[ EM ]
SOB A LENTE
AJUDAR
DA CULTURA
Leo Ângelo e Lucélia
participam de projeto de
videodocumentário em
bairro de Sete Lagoas sobre
artistas da comunidade
PÁGINA 28
Jovens de Curvelo, na Região Central de Minas, participam de cooperativa de escultores com trabalho que integra o desenvolvimento da comunidade onde vivem e a criação de oportunidades de profissionalização
SUCATAS REFAZEM
TRADIÇÃO CULTURAL
JUNIA OLIVEIRA mica e a autonomia andam juntos e para colher impressões de perto. anos. No horário em que não estão matéria-prima o que seria descartado
demarcam um território de formação, A cooperativa é um dos braços do nas instituições de ensino, eles apren- em lojas e oficinas. Assim surgiram
O que diria Guimarães Rosa se vis- cidadania e responsabilidade. Centro Popular de Cultura e Desen- dem os conteúdos escolares, a fazer o quatro fabriquetas: de móveis feitos
se os personagens e a vida simples do Na entrada das oficinas, os mode- volvimento (CPCD), uma organização próprio brinquedo, se envolvem com com madeira de demolição; doces, li-
homem sertanejo retratados em seus los expostos impressionam. Além de não governamental (ONG) fundada a horta e com a cozinha experimental cores e geleias; esculturas e objetos de
livros tomarem forma e se tornarem figuras típicas do sertão, como ho- em Belo Horizonte há 26 anos para para aproveitar as frutas do cerrado. ornamentação de sucata de ferro; e
arte pelas mãos de jovens em busca mens e mulheres do Vale, há ani- promover a educação popular e o de- bordados. Logomarcas para empresas
de um novo futuro? Talvez dissesse mais em tamanho natural, músico, senvolvimento comunitário a partir MULTIPLICAR O Dedo de Gente surgiu locais e embalagens também estão na
uma de suas frases eternizadas pela li- palhaço, dinossauro cuja cabeça é da cultura. Tem o apoio da Caixa Eco- da necessidade de alguns adolescen- lista das encomendas.
teratura, talvez soltasse algo novo ou um antigo ferro de passar roupa, nômica Federal, da Fundação Itaú So- tes ganharem dinheiro. Para evitar As unidades têm um eixo: apro-
apenas suspirasse. É… o escritor enten- avião com hélice de ventilador, entre cial e do Sebrae. A gestora de progra- que caíssem no mercado informal, os veitar a cultura da região, como fru-
dia muito bem a alma da beleza e da outras peças. O touro nelore, inspira- mas da Fundação Itaú Social, Márcia responsáveis pelo CPCD pensaram tos e flores do cerrado e o resgate de
simplicidade do povo e, por isso, fica- do num campeão da raça, chama lo- Quintino, relata que a iniciativa faz em alternativas e apresentaram duas pontos e riscos antigos, que enfei-
ria maravilhado com os “fazedores de go a atenção. A escultura, de 2,9m de parte das ações de educação integral opções a quem saía do Ser Criança: se tam tecidos diversos. “Precisávamos
coisas” de Curvelo, na Região Central comprimento, 2,05m de altura, 0,7m da instituição. “Queremos que, além tornar educador ou pôr a mão na de algo ambientalmente correto,
de Minas, ao se deparar com a mulher de largura, tem 24 barras de ferro de de ter uma capacitação técnica para a massa. De acordo com a presidente da que permitisse aos meninos usar
do Vale carregando lenha, a retirante construção, 4.232 peças de retalhos vida adulta, haja espaço para desen- cooperativa, Doralice Barbosa Mota, material reaproveitável”, diz Dorali-
com lata, o carro de boi e tantas outras de chapas e pesa 130 quilos. Os jo- volver todas as competências do jo- na época, um aluno escolheu ser mul- ce. A turma, que antes trabalhava na
esculturas feitas com sucata de ferro, vens empenhados na tarefa estuda- vem que eles são”, afirma. tiplicador e outros cinco resolveram informalidade, fundou a cooperati-
tudo inspirado na obra roseana. Na ram a raça e observaram vários as- Em Curvelo, o trabalho começou começar a trabalhar com tocos de ma- va em 1996. “Hoje, ela é uma escola
cooperativa Dedo de Gente, o com- pectos, como comportamento, mus- com o projeto Ser Criança, que pro- deira e a fabricar brinquedos. E, como de formação de cidadãos, que levam
promisso ambiental, os valores hu- culatura e hábitos do animal. Usa- move a educação por meio do brin- estava dando certo, foram incluídas como bagagem o conhecimento téc-
manos e culturais, a satisfação econô- ram livros e foram até uma fazenda quedo e atende meninos de 6 a 15 outras oportunidades, tendo como nico de uma profissão.”
FABRIQUETA
DE MEMÓRIAS
A jovem Carla Mariane Rodrigues quem está começando. Para ele, é sur-
Monteiro, de 19 anos, é um dos exem- preendente o processo por trás de ca-
plos do espírito de cidadania que arre- da peça: “Criar uma peça, vê-la encan-
batou cada cooperado. Ela trabalhou tando as pessoas e ter o reconheci-
com a comunidade em outro projeto mento disso é muito bom”, relata.
do CPCD e percebeu, naquele momen- Alguns já tentaram outros empre-
to, que não abandonaria o grupo tão gos, mas acabaram voltando. É o caso
cedo. Há dois anos e meio, ela conse- do estudante Wellington Rodrigues de
guiu uma vaga na cooperativa e, de- Aquino, de 22. O rapaz, da fabriqueta
pois de percorrer todas as fabriquetas de sucata de ferro, guarda na memória
para conhecer os trabalhos, parou na o primeiro cavalo tridimensional que
de bordado. O reconhecimento do que fez – uma encomenda que se tornou
é produzido na cidade, no estado e até um desafio a ser cumprido em uma
por pessoas de outros países dá o tom semana para uma apresentação numa
da satisfação desses verdadeiros artis- fazenda. “Voltei porque gosto mesmo.
tas. “Todos os nossos trabalhos vêm Não há em outras empresas um traba-
com uma história marcante. Na loja, o lho social e ecológico como fazemos
cliente não compra só o nosso produ- aqui. Este é o lugar onde aprendi mui-
to, mas também a história dele. É mui- to. Se um dia eu quiser abrir meu pró-
to especial estar aqui dentro”, diz. prio negócio, saberei como fazer.”
O trabalho exclusivamente ma- Atualmente, 84 jovens integram
nual também a encanta: “Resgatar a a cooperativa, que recebe adolescen-
cultura das nossas avós, que vai fican- tes a partir de 16 anos. A seleção
do perdida por causa das novas tecno- prioriza os egressos do Ser Criança,
logias, é maravilhoso”. O amigo Jona- jovens indicados pelo Conselho Mu-
than Fernandes dos Santos, coopera- nicipal da Criança e do Adolescente
do da marcenaria, conta que é gratifi- e outras instituições e aqueles que
cante ter entrado sem qualquer noção aguardam na fila. Hoje, 158 pessoas
Carla Rodrigues Monteiro, de 19 anos, participa de oficina de bordado: “Todos os nossos trabalhos vêm com uma história marcante” do ofício e agora poder ensinar a esperam uma chance.