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rrp «a Eliane, Rosanne e Marcelo. A colegio Por outro lado compreende obras de pensadores cujas idéias influenciaram e continuam in- fluenciando a vida das pessoas no campo da politica, da economia e, sobretudo, das relagdes interpessoais. Uma caracteristica marca a trajetéria pessoal des- ses pensadores: a urgéncia de ruptura, de ultrapassa- gem. Por isso mesmo, sofreram forte contestacdo e até descrédito; tiveram que lutar corajosamente por suas idéias. Hoje continuam despertando, além de certa curio- sidade, a luta apaixonada pelas grandes questées hu- manas: impossivel ficar indiferente. Procuramos, aqui, na medida do possivel, forne- cer um painel abrangente da vida e obra desses grandes decifradores da alma humana. Houve uma certa preo- cupacao didatica com 0 acompanhamento e organiza- cio das idéias por meio de atividades desafiadoras e textos complementares que podem levar 4 busca de caminhos pouco conhecidos. Para compreender 0 segredo dessa aventura, s6 mesmo a sabedoria de Guimaraes Rosa: “as pessoas da nao estao terminadas, elas esto sempre mudando... afinam ou desafinam. Verdade maior! ce A possibilidade de comecar a compreender e decifrar a alma humana marcou o século XX, em seu inicio. Explo- rador das profundezas da alma, Carl Gustav Jung, junta- mente com Freud, firmou as bases de um conhecimento cientifico da psique. © trabalho de investigacdo da psique feito por Jung foi muito pessoal. Nao se realizou somente por meio da exploracao e da compreensao dos contetidos inconscien- tes de seus pacientes, enquanto psiquiatra e psicanalista. Jung procurou também se analisar, ensejando durante um periodo de sua vida uma verdadeira “viagem’” ao seu pré- prio mundo interior. Atento a seus sonhos, fantasias e ima- gens, Jung desenvolveu e, de certa forma, ampliou a con- cepcao de inconsciente. Através do estudo dos mitos, das religides e de diferentes culturas pode adentrar contetidos universais da psique humana. Foi da totalidade da experiéncia, do estudo e da intui- ao criativa, que Jung construiu sua vasta obra. Nela procu- rou descrever a psique em seus mais diversos aspectos, sem deixar contudo de manifestar sempre uma atitude de pro- fundo respeito para com 0 “mistério” da alma humana. Procurar descrever as idéias de Jung e sua concepcao original da psique constituiu-se sempre tarefa das mais ar duas e diffceis, Embora fosse, de maneira geral, simpitico s tentativas feitas por outros de organizar suas idéias, jung costumava se sentir pouco satisfeito com os resultados. Para. ele 0 cardter fugidio de seu pensamento refletiria 0 fugidio da propria psique. Inimeros livros de introducio as idéias de Jung, foram e vém sendo escritos. Entre nés, a doutora Nise da com jung — Vida e obra, realizou trabalho pioneiro. Ind- meras geragdes de psiquiatras, psicdlogos, assistentes so- ciais, terapeutas ocupacionais e estudiosos conheceram um pouco da psicologia analitica e da vida do grande psiquia- tra suigo através do livro da doutora Nise. Com jung — O homem criativo, Luiz Paulo Grinberg realiza um trabalho primoroso, original e renovador no am- bito dos textos de introducdo e apresentagao a psicologia de Jung. Seu livro é muito mais que uma simples introdu- 0 aos conceitos da psicologia analitica. Dizendo-se “preo- cupado com o Jung na pratica”, o autor procura tornar os conceitos mais aplicaveis a0 nosso dia-a-dia. De maneira criativa e com rara sensibilidade, busca uma forma de o leitor ir se aproximando de Jung. Convidado a registrar suas lembrancas, emogdes e ima- gens quando da leitura, 0 leitor, seja ele um estudante que esta comecando ou nao, tem plena interatividade com 0 texto, muito bem ilustrado. No final de cada capitulo o au- tor propoe atividades, na sua quase totalidade vivenciais, que possibilitam a assimilacao e a integracéo do conheci- mento “na pratica” dos conceitos estudados, Paulo Grinberg, médico psiquiatra pela Escola Brasileira de Psicologia Analitica (SBPA, realizou trabalho notavel e Gnico com seu Jung — O homem criativo. Carlos Roberto Lacaz ME nttoduigao ete ree re ee eee EH 1. Caminhando com a propria luz 2. A descida ao inconsciente E53 3. A Terra da Psique EF 4. A danga da energia EG 5. Sonhos e complexos E23 6. Arquétipos e inconsciente coletivo Ed 7. Elaboracao simbélica: 0 opus e a individuagao _ EE 8. Um homem criativo EA Glossario E22 Jung e seu tempo ES Bibliografia 7 11 38 62 89 1 133 171 205 221 See eee 232 Eee eee 235 . Sempre me preocupei com o Jung na pratica. Para que tanta teoria, tantos conceitos? $6 poderiam servir a um propésito: a vida. Procurei neste livro fazer uma ten- tativa de tornar tais conceitos um pouco mais apli- caveis ao nosso dia-a-dia, aos nossos probleminhas e relacionamentos. Para isso pincei alguns, fundamentais a meu ver, da volumosa produgao que constitui a obra de C. G. Jung. Conhecé-la pode tornar-se uma aventu- ta, um convite para viajar pela vida e seus mistérios. Espero que o leitor possa aproveitar a teoria na pratica. Os textos de Jung sdo povoados de imagens, fanta- sias e sonhos, a maior parte dos quais experienciados e vividos por ele. Seus escritos expressam sua propria vida. Os livros nasceram de experiéncias interiores e, como ele proprio afirmou, representam a elaboraco de um periodo profundo e criativo da crise psicolégica em que esteve mergulhado dos 37 aos 42 anos de idade. Uma boa maneira de se aproximar de Jung é ima- ginar-se diante de uma pintura ou escultura. O olhar passeia pelas linhas, cores e formas, construindo uma perspectiva geral. Vocé sente e percebe muitas coisas, mas nao forma um Gnico conceito légico. Movimen- tando-se, adiantando-se ou recuando diante de suas idéias e reflexdes, como diante de um quadro repleto imagens, vocé é convidado a participar das sensa- ces e emocées do artista. Claro que vocé pode apenas contemplar a obra sem interagir com ela. Vocé pode visitar um museu ou uma exposicao de artes plasticas, decorar os nomes de alguns pintores, reconhecer a es- cola a que pertencem e qual seu estilo. Mas isso talvez nao acrescente muito a sua vida. Diante da hist6ria e dos conceitos que iremos es- tudar, procure envolver-se com o texto, perceber as ima- gens que ele suscita em vocé, que lembrancas desperta. Se algo nao ficou claro ou nao provocou nenhuma emo- cao, vocé pode voliar atrés. Tentar novamente. Ou, entao, aguardar. £ bem provavel que mais adiante estabelecera alguma nova relacdo com aquilo que ficou para tras. Aproveite para registrar suas emogdes e lembran- Gas enquanto estiver estudando. Se associar algum so- nho, meméGria ou reflexao ao capitulo que esta lendo, escreva a lapis, nas margens. Faca marcas ao lado dos pardgrafos: “concordo”, “nao tem nada a ver comigo”, “tenho duvidas”, “nao entendi nada’. Desenhe, rabis- que, interaja! No final de cada capitulo vocé encontrard algu- mas propostas de atividades, quase todas praticas e vivenciais. Aproveite suas anotacées pessoais para desenvolvé-las. No capitulo 1, vocé conhecerd um pouco da vida de Jung, a fase de formacao das bases de sua personali- dade, como se deu sua opcao pela psiquiatria, o encon- tro ea ruptura com Freud e um pouco do clima cultural e cientifico da virada e do inicio do século XX. No capitulo 2, encontraremos Jung na crise da meia-idade, sua descida ao inconsciente, numa viagem a partir da qual ele descobriu e desenvolveu a maior parte de seus conceitos. E um pouco de cultura geral: Que tal conhecer algo a respeito de alquimia, rel € mistérios, saber quem foram alguns dos pensadores que, de certa maneira, influenciaram as idéias de Jung? A partir do capitulo 3, comegaremos a penetrar na Terra da Psique, para visitar algumas de suas belezas naturais e alguns de seus pontos turisticos. Imagine-se caminhando por uma trilha: vocé depara com a vegeta- (So fechada de bosques e florestas, campos para des- bravar, atravessa rios, penetra em grutas, mergulha em cachoeiras, hd escarpas para escalar, desfiladeiros para cruzar e albergues aconchegantes para recarregar as energias e descansar. Vocé poderé perceber a presenca de algum animal de grande porte, ouvir ruidos estra- nhos, enxergar bichos e, quem sabe, travar contato com seres do mundo da fantasia. Mandala, Sombra, Persona, Anima, Animus, He- 16i, Unus Mundus e Si-Mesmo sao palavras escolhidas por Jung para nomear as formas geogrdficas que com- poem as paisagens na imensidao da Terra da Psique. Conceitos como simbolo, complexo, imago, arquétipo, inconsciente coletivo, fungao transcendente, extro- versio, introversao, energia psiquica, sincronicidade e individuagao sao desenvolvidos na tentativa de descre- ver e mapear as relagGes e processos que ocorrem den- tro da dimensao psiquica. No capitulo 4, “A danga da energia”, nos aprofun- daremos um pouco na maneira como se dao a interacdo e as trocas de energia entre os sistemas consciente e inconsciente e estudaremos os movimentos da energia psiquica e a importancia dos simbolos na transforma- Gao da personalidade. Chegaremos finalmente ao mundo dos sonhos (ca- pitulo 5). No capitulo seguinte desceremos um pouco mais as camadas mais profundas do inconsciente cole- ivo, onde “habitam” os arquétipos. Ali vocé podera conhecer, entre outros, 0 arquétipo do Heréi, que se confi- coersetcotmnoarndioastirtawecet. | CAMINHANDO COM re y é1 id = ee PRorR iz No capitulo 7 teremos um pouco da visao de Jung SEE EEE EEE Eee EEE cit sobre o desenvolvimento psiquico, os estagios da vida e 0 : aa Ce processo de individuagiio. Depois, uma descrigdo das : fases de uma psicoterapia junguiana e de sua diferencia- : ao relativamente a outras formas de abordagem do in- - consciente. : No capitulo 8 e ao longo de todo 0 texto vocé per- : ceberé que varios aspectos do pensamento de Jung apre~ sentam paralelos com idéias encontradas, por exemplo, ha fisica atémica, na filosofia, na religido e na mitolo- gia. Nesse capitulo apresentaremos também as princi- pais idéias nas quais ele se baseou para desenvolver seus conceitos. No final vocé encontrara um glossério dos princi- pais termos e conceitos utilizados na psicologia analiti- ca de Jung. Utilize-o como uma espécie de guia de |) viagem. Caberd a vocé desenhar seu préprio roteiro con- cebido ao longo do texto. O glossario também servird como referéncia caso vocé queira aprofundar-se em al- gum dos temas propostos ¢ ler a obra de Jung. Entéo, mochila as costas, cantil, canivete, bussola, alimentos, caderno de anotacées, didrio de bordo, cordas, maquina fotografica, equipamento de primeiros socorros 8 mo e um bom par de ténis: vamos iniciar a viagem! e ndo o contrario. O que sou e 0 que escrevo sdo uma s6 coisa. Todas as minhas idéias e todos os meus esfor¢os, eis 0 que sou. Minha vida é a quintesséncia do que escrevi u June conhecer, entre outros, 0 arquétipo do Heréi, que se con gura na psique principalmente na adolescéncia, duran- te a passagem ao mundo adulto, mas também em todas as idades, quando estamos diante de novos desafios No capitulo 7 teremos um pouco da visao de Jung sobre o desenvolvimento psiquico, os estgios da vida eo processo de individuacao. Depois, uma descrig&o das fases de uma psicoterapia junguiana e de sua diferencia- cao relativamente a outras formas de abordagem do in- consciente. No capitulo 8 e ao longo de todo 0 texto vocé per- ceberd que varios aspectos do pensamento de Jung apre- sentam paralelos com idéias encontradas, por exemplo, na fisica atmica, na filosofia, na religido e na mitolo- gia, Nesse capitulo apresentaremos também as princi pais idéias nas quais ele se baseou para desenvolver seus conceitos. No final vocé encontrar um glossario dos princi pais termos e conceitos utilizados na psicologia anal ca de Jung. Utilize-o como uma espécie de guia de viagem. Caberd a vocé desenhar seu préprio roteiro con- cebido ao longo do texto. O glossario também servird como referéncia caso vocé queira aprofundar-se em al- gum dos temas propostos e ler a obra de Jung. Entdo, mochila as costas, cantil, canivete, bissola, alimentos, caderno de anotacées, didtio de bordo, cordas, maquina fotogréfica, equipamento de primeiros socorros mao e um bom par de ténis: vamos iniciar a viagem! A PROPRIA LUZ EE ESS = Minha vida é a quintesséncia do que escrevi endo o contrario. O que sou e 0 que escrevo sdo uma s6 coisa. Todas as minhas idéias e todos os meus esforgos, eis 0 que sou. June ! a INFANCIA: G SEGREDO DA CRIA’ ‘Muito mais que de fatos e acontecimentos externos, a biografia de | ‘Jung esta permeada de descidas e viagens ao inconsciente: sto imagens de sorihos, fantasias e reflexdes interiores que ele foi cuidadosamente regis- ‘rando e buscando compreender. ‘Como ele préprio afirma no inicio de suas Memérias, a lembranca a maioria dos fatos externos de sua vida esfumou-se em seu espiito ou, entio, desapareceu. Por outro lado, os encontros com a realidade do in- consciente, onde sempre h abundancia e riqueza, impregnaram profun- damente stia meméria, Carl Gustav Jung nasceu em 26 de julho de 1875 em Kesswil cidade as margens do go Constance, na Logo apés seu nascimen- to, a familia mudou-se ingen, passando a sr no presbitério do cas- telo de Laufen, onde seu pai, Johann Paul Achilles Jung (1842-1896), exer- cia as fungdes de pastor protestante da Igreja Re- formada Suica, Além de ter-se preparado para 0 Ennle Preiswerko Johann Paul Achillea, pais da Sung, Sua mie, Ei uum pastor da Bi que exercia a fungao d 0 casal teve trés filhos: Paul, que morreu com poucos dias de vida; Carl, que nasceu dois anos depois; e Gertrudes, nascida quando o segun- do fitho estava com 9 anos. 0 primeiro sonho do qual Jung se recorda aconteceu quando ele tinha mais ou menos 3 anos de idade. Extremamente significativo, esse sonho marcou toda a sua vida. Preiswerk Jung, (1848-1923), era a filha cagula de Samuel Preiswerk, erudito e dotado para a poesi esco por uma cova escura com uma escada de peda e chego a um salao conde ha um trono real dourado sobre 0 qual esté apoiado uma espécie de {als ou pénis gigante com um olho no topo da cabesa (1) havia algo em 1 sobre o trono, come um tronco de arvore de uns trés metros de quase meio metro de didmetro [..] feito de couro e de carne, com uma cabega arredondada, sem rosto nem cabelos. No alto, havia um ti unc, Memerias, sonhos, reflexies, p. 25-6.) Muitos anos depois, Jung compreendeu que aquele enorme pénis significava um félus ritual, uma imagem da criatividade. Como uma es- pécie de divindade, o fadlus representava a primeira descida corajosa a0 mundo do inconsciente ¢ o contato com sua criatividade, Foi uma espé- cie de iniciagio do menino Jung no reino das trevas e nos mistérios da ‘Terra da Psique (1975: 28), momento fundamental em sua vida, quando inconsciente, como ele mesmo afirmou, sua mou que esse primeiro sonho para que a mais intensa luz possivel se produzisse na escurido”, Era o principio de uma busca e do contato com 0 mundo da fantasia e do mistério que perdurou ao longo de toda a sua vida, jo ¢ sensfvel, Jung teve muitos momentos de intensa so- lo torres com cubos de madeira, desenhando quadros de batalhas ou enchendo um caderno com DorrGes de tinta para os quais criava interpretagées fantasticas. Aos 6 anos, contava histérias sobre pressas em um livro negou a ensinar-Ihe latim, enquanto a mae Ihe 5s exdticas, particularmente da India, im- , 0 Orbis pictus (Imagens do 3 Universo), do século XVII, Em sua obra encontramos muito do fascinio que tinha por aquelas imagens do Oriente, particularmente em Simbotos da transformagéo. Dos 7 aos 9 anos, uma de suas brincadeiras preferidas era manter uma pequena fogueira acesa dentro do buraco de um velho muro no jardim de sua casa. 0 fogo deveria estar sempre aceso. Outras criangas aju- davam a recolher a madeira, mas somente ele podia ter contato e cuidar diretamente do fogo. Em frente a esse muro, havia uma pedra, a sua pedra, sobre a qual Jung sentava-se durante horas, merguthado em pensamentos do tipo “estou sentado sobre ela...; masa pedra também pode pensar ‘ele & que esta sentado sobre mim..’; entdo, sou aquele que esta sentado sobre a pedra, ‘ou sou a pedra na qual efe esta sentado?”. Acompanhado de um sentimen- to de obscuridade e fascinio, Jung perguntava-se quem seria o que, naguela estranha relagio. Por volta dos 10 anos, esculpiu um peque~ no homem de uns seis centimetros de altura, pin- tou-o de preto, preparou-Ihe um casaquinho de lie fez-Ihe uma caminha dentro de um estojo de lapis. Ao lado do homenzinho colocou um seixo de rio, alongado e polido, que pintou de varias cores. Como Jung tinha a sua pedra, o homenzi- nho também deveria possuir a dele. Depois, es- condeu dentro de uma viga do sétio o estojo com la e carregou por muito tempo a Esse ritual serviu para compensar sua in- seguranga e sensacdo de divisao interior. Muito ccriativamente, quando as coisas se tornavam di ficeis, 0 menino Jung subia a seu esconde contemplava o homenzinho e colocava junto dele um rolinho de papel escrito numa caligrafia se~ creta que ele mesmo inventara. Cada ato de en- trega de um novo rolinho tinha um cardter solene e sagrado. Os rolinhos formavam uma es- pécie de biblioteca do homanculo. Tais rituais duraram um ano e marcaram o apogeu de sua infancia. Biinquedo de criangas da tibo Ceralé, ca, semelhante ao fe Jung. O homenzinho e sua pedra foram uma primeira tentativa de dar forma ao segredo, traco essencial da juventude. Cerca de vinte ¢ cinco anne depois, ao ler sobre as churingas, as pedras em que os aborigines austra: lianos encontrou uma refe- réncia que dava um cial a seus rituais de infancia. ‘As churingas eram esfregadas sobre 0 corpo para curar doengas, sen- do utilizadas nos rituais de iniciagao por meio dos quais 0 novo adepto recebia os ensinamentos e a forga vital de seus ancestrais. [No fundo, esse homenzinho representava um cabiro, uma divindade rela- cionada com a origem da vida e a eriatividade, embrulhado em seu manto, ‘oculto na Aista (caixinha), munido de uma provisdo de forga vital, a pedra ‘oblonga e escura. Guxe, op. Pp. Quando, anos depois, Jung tornou-se psiquiatra, gragas is suas pré- prias experiéncias pessoais foi capaz de perceber que os pacientes também possuem um segredo, uma hist6ria que nao é contada e que, em geral, ninguém conhece. Esse segredo que cada um possui foi fundamental na abordagem psicolégica das pessoas que 0 procuravam em seu consult6rio. Para mim, a verdadeira terapia comeca somente ap6s exarminarmos a his- t6ria pessoal do paciente. Esta representa o segredo que o desesperou, 20 ‘mesmo tempo que encerra a chave de seu tratamento. & indispensdvel que ‘© médico possa descobri-la, propondo perguntas que digam respeito ao homem em sua tolalidade e ndo limitar-se apenas aos sintomas. as, op. ADOLESCENCIA: INICIACAO E PASSAGEM PARA A VIDA ADULTA mais bem vestidas do que ele, que passavam férias nos Alpes e jé haviam filhos de pessoas poderosas, Jung compreendeu que era pobre, Assistia &s aulas de sapatos furados e meias molhadas, ‘Seu pai no passava de um simples pastor protestante de aldeia. Enfrentar o sentimento de pena que comegou a ter por ele, a inveja qi sentia dos garo ‘os professores, as aulas de religiao, os fracassos nas aulas de desenho e de matemética, que detestava, tudo comegou a se tor- nar insuportavel. Entao aconteceu um episédio do qual tirou enorme proveito. Cer- nava voltar a pé para avila onde morava, tomou um soco de um garoto, bateu com a cabega no chio ¢ ficou zonzo durante quase meia hora. Naquele momento, ainda caido no chio, ocorreu-the uma idéia luminosa: por causa daquela pan- cada, néo precisaria mais ir& escola! partir de entéo, sempre que tinha de voltar ao colégio ou seus pais, o obrigavam a fazer a ligio de casa, Jung inventava um desmaio, Os pais, muito preocupados, consultaram varios médicos, mas nenhum conseguia descobrir a causa dos desmaios. Enquanto isso, o menino passava o dia fazendo 0 que mais adorava: sonhar, desenhar ou pintar — mergulhar no mundo dos mistérios da natureza, Mas, no fundo, ele tinha a impressao de estar fugindo de si mesmo. Uma vozinha, uma espécie de “grilo falan- te” Ihe dizia que aquilo tudo no passava de uma farsa que ele préprio havia criado. Um dia, quando o pai conversava com um amigo no jardim da casa, ouviu-o dizer que estava muito preocupado, pois temia tratar-se de uma doenga incuravel e que no sabia o que seria do filho, caso no pudesse ganhar a vida como simples pastor, uma vez que, levando o pequeno Carl a0s médicos, havia perdido 0 pouco dinheiro que tinha. Ao ouvir o pai, © menino deu-se conta do que estava fazendo e decidiu vencer aquele esta- do que, de certo modo, ele mesmo havia criado, Foi ao escrit6rio do pai, sentou-se a escrivaninha e tentou concentrar-se na graméatica. Apés dez minutos de esforgo, desmaiou, Assim que recobrou os sentidos, tentow concentrar-se novamente nos cadernos dizendo a si mesmo: “Com todos. 1 diabos! Nao vou mais desmaiar!”. Mas tornou a cair apés quinze minu- tos. Bsforgou-se, e depois de meia hora veio a terceira crise. Nao desistiu, ¢ trabalhou mais uma hora, Os acessos néo voltaram. Subitamente senti-me hem melhor do que nos meses anteriores... Foi assim que fiquei sabendo como se instala uma neurose... Pouco a poucs, a lembranca de tudo 0 que ocorrera se avivou e compreendi nitidamente que eu mesmo montara toda essa historia vergonhosa... isto seria 0 marco do meu destino, (Gime, op. eit, p- AL) Com efeito, as crises nao se repetiram mais e Jung conseguiu vol- tar ao colégio apés algumas semanas. A partir de ento, ele possufa um novo segredo e passou a ser mais responsavel e firme consigo. Nessa épo- ca, com 12 anos, teve conscientemente, pela primeira vez ele mesmo. Entrou, pela primeira vez, em contato com sua identidade profunda. Passou a sentir-se bastante orgulhoso de si, percebendo sua importancia ¢ autoridade, Todas essas descobertas tinham alguma relagéo com seu tesouro escondido no sot hominculo e sua pedra. 16 camila m nove segredo: a “dupla personalidade” Ao mesmo tempo, surgia um conflito: “Como posso sentir tanta au- ‘dade dentro de mim, se nao passo de um garoto solitério, que nao sabe _ inatematica nem gosta de gindstica, cheio de fracassos e com colegas que _ desconfiam de mim?”. Um velho sentimento de divisio interior, ja conhe- _vido mas que ainda no havia tomado forma, finalmente emergiu: a sen- sacaio de se perceber como duas pessoas ao mesmo tempo. Uma experiéncia astante freqiiente na vida de muitas pessoas. Jung descobriu que, no fundo, havia nele duas personalidades. Uma, ue ele denominow personalidade né 1, era o garoto que freqitentava a 'scola e era menos inteligente, menos aplicado, menos decente e menos aasseado que os demais; a outra, a personatidade n? 2, era seu homem in- “terior: um velho desconfiado e distante do mundo dos homens, que vivia em contato com a natureza e com 0 mundo dos sonhos e da fantasia. ‘Como normalmente ocorre com a maioria dos adolescentes, a par- r de sua autodescoberta Jung passou a ver os pais de maneira diferente. Im sua mée, que morrets quando ele tinha 48 anos, desde pequeno Jung também reconhecia dois lados: uma mulher convencional, a esposa do pastor que partilhaya as opinides tradicionais, que exigia dele boas manei- yas e era uma mae amorosa; e uma outra mulher, mais misteriosa e liga da natureza animal, que se manifestava sempre de maneira inesperada e que muitas vezes, pr ipalmente a noite, Ihe causava medo. Com relacéo ao pai, que tinha explosées de afeto e mania de doen- as, Jung sentia pena e a ele fazia varias restricdes. Enxergava-o como um homem estagnado, que nao havia conseguido se desenvolver como pessoa. Um homem que nao enfrentava suas préprias davidas religiosas, prin palmente as concernentes & questo relativa a Deus, ‘As respostas dadas ao filho sobre as questdes teolégicas eram sem vida, meras racionalizacdes destituidas da vivéncia religiosa. Jung perce- bia a incapacidade do pai em reconhecer a propria falta de f€. Sempre que era questionado, o pastor defendia-se dizendo que as pessoas deviam “acre- ditar, e nao rac} ar”. O filho, entao, cobrava a tal fé, mas o pai desistia do confronto e recuava, A busca da verdade Jung nao se conformava. Ele havia tido uma fantasia muito forte, a época de sua primeira comunhio, na qual visualizava a imagem do pr6- Deus “defecando sobre uma igreja, demolindo-a”. Eis sua interpreta- ‘cho: era como se, dentro dele, a verdadeira experiéncia religi Deus 0 obrigasse a enxergar seu outro lado: um lado temivel, acima das tradigdes. Jung estava, outra vez, de posse de mais um segredo! Entio, era isso! Senti um grande alivio e uma libertagdo indescritive.. chorel Hagrimas de felicidade e gr: uma ihuminagao. Pize= ra.a experiéneia que meu pai néo tinha tentado — cumprira a vontade de Deus, Quando née & prova a coragem do homem, Deus no se prende a tradigdes... [como] Adio e Eva... [que] foram obrigados a pensar o que nao queriam, (unc, op. cit, p47) ‘Apesar das divergéncias, 0 velho pastor Paul sempre esteve presen te na vida do filho e o apoiou enquanto viveu. Mas quem ajudou Jung a elaborar suas questées a respeito de Deus, da fé e do conhecimento, foi a mée, ou melhor, a personalidade n? 2 dela. Depois da primeira comunhio e daquela terrivel visio que o havia atormentado a ponto de a mae achar que estivesse doente, Jung leu, esti- mulado por ela, o Fausto, do escritor alemao Johann Wolfgang von Goethe. Fausto era uma espécie de fil6sofo que aprendera a se abrir para a verdade, Inspirado pelo personagem, que funcionou como um balsam para a sua alma, inundada de emogGes e abarrotada de tantos segredos, Jung comecou a se aprofundar nas questdes conscientes que o afligiam, mergulhando na leitura dos clissicos da literatura alema e da filosofia. Em Fausto, Jung encontrou uma tentativa de reconciliar na perso- nalidade humana as tendéncias opostas do Bem e do Mal que o afligiam, “Muitos de seus pressentimentos em relagao ao problema de Deus, do es- pirito, da fé, ao conflito entre ciéncia e religido e a todas aquelas questoes rio respondidas por seu pai tinham rafzes e antecedentes hist6ricos. Uma vez que se interessava por varios campos de estudo, Jung nio teve muita facilidade para fazer sua escolha profissional. Sentia-se dividi- do; de um lado, seu interesse voltava-se para as a 100- logia, a paleontologia e a geologia. De outro, gostava da histéria comparada das religides ou ciéncias do espfrito, além da arqueologia dos povos da Antiguidade e da Pré-Histéria. Havia também uma certa pressio familiar: seis tios maternos, além do pai e do avd materno, eram pastores. Mas, curiosamente, o pai nao o queria tedlogo. O avd paterno, de quem herdou o nome, nascera em Mannheim, na Alemanha, estudara ciéncias ¢ medicina em Heidelberg e, como Samuel, ‘0 pai de sua mae, também mostrava inclinagdes poéticas. Por uma série de acontecimentos singulares, que nao cabe mencionar aqui, Carl Jung, ‘.av6, acabou se mudando para Basiléia, na Sufga, a fim de ensinar na uni- versidade. 18, ee Em meio a essa tensa meméria do avé € guiado por ‘sua tremenda vocacdo, ocorreu a Jung a idéia de estudar medicina. Assim, 205 20 anos, ingressou na Universidade da Basiléia, com uma bolsa de es- tudos que o pai Ihe conseguira. © tesouro da consciéncia e sua sombra Muitos anos depois, trabalhando em sua drvore genealdgica, Jung compreendeu que havia uma estranha e forte ligagdo entre as questes que ele levantava e as de seus antepassados, como se tivesse que dar solugao a0 que ficara incompleto ou sem resposta por parte de seus pais e avs. Quase como se houvesse um carma impessoal, transmitido por seus an- ‘tepassados. Era como se as perguntas que fazia a si mesmo a respeito da natureza e do espirito nao Ihe pertencessem, mas sim & prépria cultura na qual ele vivia Em meio as questées relativas & sua escolha profissional, Jung teve outro sonho bastante significativo. Avangava, & noite, em meio a uma tempestade ¢ a ama densa neblina, protegendo uma pequena chama que segurava em uma das mios. A luz ameagava extinguirse a qualquer momento e era preciso manté-ta acesa a ‘qualquer custo, pois tudo dependia dela. De repente, tive a sensaggio de que estava sendo seguido e, ao olhar para trés, percebi uma sombra gigantesca {que me acompanhava. Isso fez com que [utasse com tudo para salvar a Tuzinha. unc, op. cit, p. 86.) Quando despertou, interpretou a chama como sendo sua propria consciéncia. O conhecimento de si mesmo era 0 tinico e 0 maior tesouro que possuia e, apesar de muito mais fragil que aquela enorme sombra, sua ‘inica luz. Percebeu que era a personalidade n* 1 quem levava a luzinha e que, portanto, sua tarefa era continuar na tempestade: progredir nos estudos e ganhar o pao de cada dia, em meio a todas as complicagdes e frus- tragdes e acompanhado pela personalidade n?2, que o seguiria como uma sombra. Assim, investiu muito nos estudos, obtendo o diploma de mé- dico com distingao. No quarto ano de medicina, época em que devia optar por uma es- pecialidade, aconteceram alguns fatos que o marcaram profundamente. ‘Sem qualquer razdo aparente, objetos e méveis de sua casa se partiram em pedacos: primeiro, uma enorme mesa circular de nogueira; logo depois, tum armério de e inalmente, uma faca de pao, cujos pedagos Jung conservou até o final da vida, Ele relacionou esses episédios as sessdes espiritas que alguns de seus parentes, inclusive a mie, estavam realizando com sua prima, Helene Preiswerk, uma jovem médium de 15 anos. A avé materna, Augusta, também era espirita, ¢ 0 avd Samuel mantinha em seu escritério um sofa especialmente reservado para o espirito de sua falecida primeira mulher, ‘Madalena, com quem dialogava secretamente uma vez por semana. Jung decidiu, ent, organizar encontros regulares, para estudar cientificamente aqueles fendmenos paranormais. Esses encontros condu- ziram-no a um ponto de io do qual, pela primei- va vez, adquiria conheciment percebeu que 0s espiritos que Héléne recebia e que falavam atra- ‘vés dela eram aspectos dissociados de sua psique, fendmenos psiquicos objetivos que, apesar de serem inconscientes, faziam parte da sua perso- nalidade e procuravam vir & luz. Tais experiéncias continuaram por dois ‘anos e resultaram em sua tese de doutorado, Mas seria adequado a um médico que estudara numa tradicional universidade européia envolver-se com esse tipo de fendmeno, numa épo- ca em que a ciéncia pautava-se pelo determinismo e pela razao? Dezenas de anos antes, Jung com certeza teria sido condenado a fogueira. le inicio de século XX convivia-se com duas visdes de mundo, separadas: a mecdnica, cientifica, ligada & andlise € & reflexio, e a intuitiva, relacionada a fantasia e & imaginagio. De um lado, ‘0 mundo da razao e dos fatos objetivos; de outro, a realidade dos sonhos e da subjetividade. da filosofia positivista no pensamento cientifico da época deixava pouco espago para o estudo de fendmenos que nao fossem iveis de se repetir e comprovar dentro dos laboratorios. Assim, é pos- sivel que Jung tenha sido visto até mesmo como charlatéo ou mistico. Positivismo Sistema filos6fico cujo maior expoente foi opensador francés Augusto Comte. Seu surgimento esté diretamente relacionado com as profun- das transformagoes sociais e progressos técnicos acorridos na socieda~ de européia nos séculos XVIlle XIX. Cornte, que nascera nesse_ acreditava ser poss/vel realizar uma teorganizacio racional da socie- dade pela aplicacao do conhecimento ciemtfico. ‘O termo positivismo é uma referéncia 3 fase amadurecida do espiri- to humano, em que, segundo Comte, o homem estaria preparado para abandonar as explicagoes teoldgicas e metafisicas dos acontecimen- tos, em favor do pensamento racional associado a observagao atenta dos fendmenos e experimentacdo. 20 HB oe Uma revolugao cultural A partir da titima década do século XIX, porém, a ciéncia positivista assou a ser criticada e a soberania da razdo contestada. A visio mecinica e unilateral do homem, da mente e da natureza havia destrufdo os mitos s e muitas certezas de ordem metaffsica. Se, por um lado, 0 no cientifico tinha levado as conquistas cientificas, que haviam de maneira extraordindria para o bem-estar material do indi- ‘viduio e da sociedade, por outro, conduzira ao empobrecimento da espiritua- lidade, a um mundo desencantado, em que deixava de haver lugar para a a de seus mitos. (0s fendmenos irracionais passaram também a ser estudados ¢ co- megaram a atrair a atenco de muitos escritores e pensadores. “Dizer € representar ‘0 indizivel tornou-se uma obsesso” (Brapuury & McFARiaNe, 1989: 56). 0 inconsciente, nosso lado irracional — e principalmente o tipo € 0 grau de influéncia que uma mente poderia exercer sobre outra —., pas- sou a ser sistematicamente investigado, Por volta de 1882, quase vinte anos antes de Jung publicar sua tese sobre os fendmenos ocultos, foi fundada nos Estados Unidos a Sociedade de Pesquisa Psfquica, que, cautelosamente, estudava os fendmenos con- siderado: eis”, ¢ isso exatamente por serem irracionais: o magne- tismo ipnose, 0 sonambulismo, 0 animismo, 0 automatismo, a telepatia e as alucinagdes, Um médico vienense, Franz Anton Mesmer (1734-1815), havia ficado famoso por conseguir tratar com sucesso uma gama variada de doencas nervosas por meio do magnetismo animal. Ele reduzira técnicas como a sugestao e a simpatia psiquicas a um campo ‘magnético que podia ser manipulado com barras de ferro e fmas de aco. Com relacdo hipnose, Jean Martin Charcot (1825-1893), neurologista francés, demonstrou que certas pessoas, ao passarem por uma situacdo de estresse emocional muito intenso, podiam ficar com um brago paralisado ‘ou sem conseguir andar. Para demonstrar que isso era possivel, ele hip- notizava pessoas saudaveis e, por meio da sugestio, fazia com que elas desenvolvessem quadros de paralisia, surdez ou cegueira momentanea, Quando passava o estado de transe hipnético, elas voltavam completamente a0 normal. Um novo paradigma comecava entio a firmar-se com grande vigor nos varios campos da cultura, submetendo a mente a uma tensdo que obri- ver com o lado subjetivo da realidade e buscava integrar as duas ‘empenhavam: ca da raza (ver n ca da quar al alates, ta dimensto"), Havia na virada do século a idéia de um complexo infinito de relagdes a se cruzarem entre si. O mundo comegava a ser visto como um enorme poema. Coisas antes tidas como perpetuamente excludentes passavam a ser consideradas componentes de um fluxo, de um continua dos opostos — sim e nao, vida e morte, homem e mulher, deus e demé- nio lado a lado, contrariando as regras do bom senso, entrelacando-se, mis- turando-se... © espiito de um poeta esté constantemente amalgamando experiéncias “spares; a expeviéncia do homem comum € caética, irregular, fragments ia, Ble se apaixona ou Ié Spinoza, e essas das cias nao tm nada a ‘yer uma com a outra, nem com o barulho da méquina de eserever ou com 0 cheito do que esté sendo cozinhado; no espirita do poeta, essas exper estio sempre formando novos conjuntos. (Buos, Apud Braoauny & McPamane, ‘Modernismo p. 62-65.) 0 soberano intelecto corria o risco de virar um ditador e governar sozinho e isolado, e, pior, solteiro, sem a presenga de uma companheiral Com o resgate do outro lado, abria-se a possibilidade para o feminino e as cemogoes. A fantasia, a imaginago, 0 sonho e a linguagem do mito come- ‘avam a ser Valorizados e ganhavam espago para sua expressio. O desco- nhecido, assim como a subjetividade, passavam a ser encarados como realidades em si, cheios de vida e de significados. Néo era mais posstvel en- caixar todo o mundo subjetivo num conjunto de leis gerais e absolutas, espremidas dentro de f6rmulas matematicas previsivels A realidade torna-se paradoxal Depois desse rompimento, muitos das conceitos que foram fragmen- tados tiveram que ser reordenados e reestruturados. Um dos marcos des- sa revolugdo cultural foi, sem davida alguma, a publicago, em 1900, de ‘A interpretacao dos sonhos, de Sigmund Freud. E logo, dois anos depois, ‘Jung iria expor em sua tese de doutorado os resultados das observagdes relativas & prima espfrita, fazendo uma revisio dos coneeitos de sonambu- lismo, amnésia e de outros fendmenos considerados “discutiveis” Apesar de comecar a haver alguma abertura e um resgate dos fend- menos da alma — a fantasia, a imaginagéo, os sonhos, enfim, 0 incons- ciente —, via-se ainda com os éculos do determinismo e do principio de causa e efeito, E essa éa melhor (e pior) maneira de o intelecto e a critica racional manterem o controle sobre 0 outro lado, Seria necessério ocorrer, dentro da propria ciéncia, de destronar a ambigio da fisica classica em descrever o mundo de modo inico e objetivo, livre da subjetividade. Esse salto foi dado, no século XX, pela fisica moderna: a realidade tornou-se tao paradoxal, que nenhum sis tema fechado de conceitos, objetivo e auto-suficiente, pode corresponder aela (ver mais adiante a leitura complementar “Espaco e tempo: constru- (bes relativas”), ideal do cientista do século XIX que acreditava que todos os fend- menos podiam ser repetidos indefinidamente e que com uma pequena mar- gem de erro se obteriam sempre as mesmas respostas, passou a ter um limite: alguns fendmenos podem ser estudados dessa maneira, mas nao todos, Os cientistas modernos abandonaram a ilusio de que é possivel ad- uirir um conhecimento absoluto da natureza, Preocupam-se mais em des- crever do que em definir os fendmenos, conforme procedem em relacio & matéria nas pesquisas de fisica atOmica. Sabe-se por meio desses estudos que a simples presenca do pesquisador afeta o resultado da experiéncia. Com os fenomenologistas descobriu-se que 0 mundo externo, tal como o enxergamos, esté in mamente ligado & nossa percepedao, & nossa presenga nele como obser- vadores conscientes. Isso implica que o universo adquire existéncia concreta unicamente como resul- tado dessa percepeiio. Portanto, s6 € possivel compreender 0 mundo se nos incluirmos nele como pai pantes. Como disse Jung, se preten- demos nao ter uma visio unilateral da realidade e nao nos tornar dita- dores em nossa prépria casa, so necessarios tanto 0 pélo objetivo da realidade, comandado pela ra- 20, quanto 0 pélo subjetivo, ex- Alber Einstel lade da dimensiio presso pela linguagem mitica da ‘espago-tempora da céncia fantasia, dos sonhos e da imagi- nacio. Foi em meio a essa teia simbélica de experiéncias fragmentérias — muitas vezes opostas e contraditérias mas que, no fundo, buseam alguma relacao e significado para a alma e para a existéncia — que Jung, profun- damente sintonizado com o espirito de sua época, desenvolveu sua obra, Para ele a realidade ¢ resultante do processo psicol6gico, do encontro en- tre 0 comportamento objetivo das coisas ¢ a nossa visio subjetiva delas, Voltemos agora a sua hist6ria e a seix caminho pessoal. ‘Mare Chagall Homenagem a Apolinaire (1911-12): vivemos om Uma teia do relagées. O ENCONTRO DE DUAS FORCAS A opcao de Jung pela psiquiatria, para decepcao de seu professor de clinica médica que o havia convidado para ser seu assistente, veio quando ele se preparava para os tiltimos exames. Ao estudar 0 manual de psiquia- tria que tinha deixado para o final, encontrou para psicose a definigao de cao profunda, uma espécie de iluminacdo que o fez compreender que sua meta nio poderia ser outra que nao a psiquiatria. a psiquiatria poderiam conflui os dois rios do meu interesse, ito num (nico percurso. Ali estava 0 campo comum da expe- Fiéncia dos fates bialégicas ¢ dos fatos espirituais, que até entdo eu buscara ente. Tratava-se, enfim, do lugar e ntro da natureza e do espirito se tornava realidade. (se, op. cit, p. 108.) Logo apés concluir o curso de medicina, com 25 anos, em 10 de dezem- bro de 1900, Jung assumiu 0 posto de médico assistente na trica Burghdlzli, em Zurique, sob dirego de Eugen Bleuler. com muitos doentes mentais em estado grave, pessoas apresentando quadros io. Passou também um semestre em Paris, estudando com Pierre Janet, onde aprendeu mais sobre os fendmenos discuti Eugen Bleuler ae Psiquiatra sufco que se tornou famoso ao escrever um manual de | substituia 0 ultrapassado conceito de deméncia precoce pelo termo esquizofienia. Naquela época, como nao existiam __nem medicamentos nem abordagens mais adequadas de tratamento, 0 doente piorava muito rapidamente, sofrendo uma desintegracao da personalidade, que ocorria principalmente com adultos jovens. Dai a denominacao deméncia precoce para esse estado. Bleuler procurou Humanitério e afetuoso, tratava os doentes antes de tudo como pessoas ¢ insistia na importincia de uma atitude positiva do médico para com eles, Suas atitudes tiveram grande influéncia sobre Jung Em 1907, Jung publicou seus estudos sobre A psicologta da demé cia precoce, demonstrando que aqueles sintomas que o doente mental apresentava, por mais incompreensiveis que pudessem parecer, estavam. carregados de significados: descreviam seu sofrimento, seus desejos e tam- bém suas potencialidades nao desenvolvidas. Tais manifestagies estranhas e bizarras devem ser vistas como simbolos de pensamentos que nao s6 podem ser compreendidos em termos cotidianos, como também existem. dentro de cada um de nés. Asemente do paradoxo, do caos inclufdo no cosmos que florescia no espirito moderno, comegava a desabrochar brilhantemente no pensamento de Jung. No final de suas Memérias, ele diz: “O homem deve sentir que vive num mundo misterioso onde acontecem coisas inauditas... 0 inesperado e 0 inabitual fazem parte do mundo. S6 entio a vida € completa” (JUNG, 1975: 308). Encontros e desencontros Em 1895, ano em que Jung ingressou na faculdade de medicina, Freud havia publicado juntamente com Joseph Breuer um outro livro re- voluciondrio: Estudos de histeria. Tratando o célebye caso da paciente Anna ,, que sofria de sintomas de paralisia histérica (quer dizer, de causa nao orgénica), Freud desenvolveu algumas das técnicas inovadoras que deram lugar ao nascimento da psicandlise. Ele descobriu que pacientes histéricos de sua carreira dos. foi um Jo de pesquisas que culminaram nna descoberta dos comple- xos inconscientes. Jung viu em Freud um companheiro de via- gem e enviow-lhe copias de seus trabalhos a respeito da dos complexos inconscientes, confirmando as concepgées freudianas sobre mecanismo do 7 calgue, ou repressao. Am- bos encantaram-se um com ‘ outro, principalmente por- que os dois desenvolviaa trabalhos pioneiros e inédi- no campo da medicina € da psiquiatria. 1s esquegamos ro de uma festa uma pessoa sem convite. Dessa maneira, evita- mbrangas incomodas e emogdes dolorosas. A partir de 1906, Junge Freud passaram a se corresponder regularmente através de cartas, que posteriormente foram publicadas (359 cartas trocadas entre 1905 ¢ 1973) 0 primeiro encontro entre os dois dese erm 27 de feve- reiro de 1907, au ng Freud, j4 bem mais velho que ele, com 50 anos. Tal visit fioou celebre ung Freud conversaram durante treze horas e, 0, estabeleceram uma estreita colaboragéio que durou apror Js. Nesse perfor ia, analisaram mutuamente seus sonhos, tro- 20s. Como numa verdadeira paixio! como ele O austrfaco Freud, que costumava tratar rou esse encontro com Jung, 0 psiquiatra porque se abria para a psicat is de neuroses, conside- ico, crucial por duas razde: undo das psicoses e de para o mundo cientifico internacional. Logo se formaram dois centros de psicandlise: um em Viena, ao re- dor de Freud, e outro em Zurique, em torno de Jung, que passou a se de- dicar & causa psicani | fundamental no nia de Sandor Ferenczi, outro psicanalista, para realizar conferéncias na em Massachusetts. Ali, Jung apresentou seus trabalhos com do de palavras e sobre a teoria dos complexos incons- lo por Jung durante essa viagem que durou sete sema- 30 desce-la, Asparedes datav 0 sak de vasos e dois eranios jque humana também havia evolufdo, do homem moderno se assemelhas assuntos que poderiam de- fe como ciéncia eafastéla do mundo académico, prefe- esas questes com ces”. Jung conta que, a me- dida que Freud ia contra- argumentando, seu diafrag- ma comecara a arder. Serd que se lembrava das discus- sdes com o proprio pai, 0 pastor Paul? Logo apés essa estra- nha sensagdo, ambos assus- faram.se com um forte estaloPod®mo8 comparar a psique Gom um 6 que aha daestante, na sala, 2 29780 c0P hunano, fb eo onde se encontravam. Acharam que a estante iria desabar sobre suas ca- becas. Imediatamente, Jung interpretou o fato: de exteriorizacao”. Interpretacao que Freud considerou puro di , baseado em pura intuiigzo, rep! fessor. E para Ihe provar que tenho razao, afirmo... que o mesmo est do se reproduzira”. Dito e feito! Mal havia pronunciado tais palavras, 0 ruido na estante se repetiu. Freud ficou horrorizado, da psique, principalmente no tocante & questo da senualidade ea sua atitude com relacao ao espirito, Para Freud, a cultura e a civilizagao humanas sao fruto da pulsao sexual — quer dizer, sublimada — para outras formas. nifestagio é a libido sexual, é algo que atividades e comportamentos humanos, das neuroses 2 criatividade. Essa concepeio acerca da formagao da cultura tocava no nervo cen- tral das buscas de Jung, que acreditava na existéncia de um impt para a ulo 3) tanto quanto na de qualquer outro, como, Além 50, a libido sexual ndo estaria simplesmente a servigo das necessidades biol6gicas, mas englobaria a espiritualidade, como ocorre segundo algumas 1ides do Oriente. Como iria demonstrar posteriormente em suas obras, Junga libido poderia ser sexualizada ou nao. Hoje se sabe que a questo se- xual foi um dos pontos principais da divergencia entre ambos. Essa dife- renga pressupunha pontos de parti- da diversos sobre o funcionamento psfquico que implicavam modelos diferentes de ser humano. Na visio dualista de Freud, o fundamento da psique humana seriam as pulsdes, fragmentadas em esséncia, Decorre dai que, para o modelo freudiano, 0 Sublimacao Processo postulado por Freud para explicar atividades humanas sem relacdo aparente coma sexua- lidade mas que, segundo ele, te- m como elemento propulsor a ncaa pul sexual. pulsio é sublimada ao ser derivada para um novo cbjtivo ndo-sexal que visa zados, Enexca Pstquiew/Linioo tea seal A libido segue seu desenvolvimento superego, tabu do incesto, compleno de Epo) cde maneita autinoma, elaboracao simbélica Disposigao inata, ito de ener- 29 ee ia psiquica, O sonho relatado anteriormente sobre os dois crinios cons- tituiu uma espécie de introducao para esse livro e também redespertou seu antigo interesse pela arqueologia. Comesou, entao, a se aprofundar nos: estudos sobre mitologia e simbolismo dos povos antigos — 0 que ia de en- contro & recomendagao de Freud para que os psicanalistas também estu- dassem os mitos. Jung leu com interesse a obra de Friederich Creuzer em quatro volumes sobre 0 Sémbolismo e mitologia dos povos antigos (1810- 12) e continuou a linha de pesquisa de Bleuler na_ compreensao do conteti- do dos delirios como manifestagao de complexos arcaicos inconscientes. Em sua busca, Jung deparou com um artigo publicado alguns anos antes por um psicélogo, Theodor Flournoy, que tratava da producio fan- tastica de uma paciente, Miss Miller, uma americana que durante uma via- gem a Europa havia tido varias visdes e inspiragdes poéticas muito ricas em material simbélico. (0 material publicado ajudou Jung a organizar a verdadeira miscela nea de idgias e imagens com que lidava. E entio, a partir de seus conhe ‘mentos e das fantasias de Miss Miller, nasceu o livro que definiu sua ruptura definitiva com Freud: Simbolos da transformagdo. 0 original, escrito em alemao, esta repleto de citacées em latim, grego, inglés e francés. Nele Jung demonstra toda sua erudigzo, como se estivesse liberando um materi mulado dentro de si durante anos. Ha referéncias & Biblia, aos Upanishades, a0 Epico de Gilgamesh, & Odisséia, a varios poetas ¢ fildsofos (Goethe, Nietzsche), a arquedlogos, a lingtistas, a historiadores da religiao, a estudio- ‘sos de mitologia, além de a psiquiatras e a psicanalistas contemporaneos. ‘Mas o principal nesse livro sio as trés novidades que Jung traz para 0 mundo psicanalitico. Duas dizem respeito diretamente ao conceito de libi- do, que passa a ser considerado simplesmente como energia psfquica (de carater nao exclusivamente sexual) e seu surgimento na forma cristalizada de simbolos universais. A terceira refere-se ao mito do herdi solar e sua luta para se diferenciar do mundo matriarcal do inconsciente. Esse mito, dentre ‘08 diversos discutides no livro, assume uma importancia em particular. Sigfried ou Sig-Freud? Em 1912, Jung dé uma série de conferéncias sobre a Nova York, publicadas no ano seguinte (vol. 6 das Obras completas). Eis 0s pontos de discordancia: Jung propde uma revisdo da teoria da libido, primeiro com relagao as perversoes e & psicose e, depois, em relacio & neurose. Para ele, as raizes da neurose nao deveriam ser necessariamente atri- .s& infancia, mas a um conflito atual (“é como atribuir as dificulda- des da Alemanha no século XIX as conquistas romanas”, dizia ele). A questo da neurost ia aos fantasmas sexuais dos desejos in- cestuosos pela mae (complexo de H:dipo), mas deveria ser colocada da se- 30 ae : uinte maneira: “o que o paciente esta tentando evitar?”, “qual a dif dade da qual ele esté tentando escapar, hoje? ‘Apesar das divergéncias, no ano seguinte Freud encarrega Jung de defender a psicandlise no Congresso Internacional de Medicina (Londres, agosto/1913). No entanto, Jung apresenta suas pr6prias idéias a respeito da psicandlise como uma evolugio. Nessa conferéncia, a0 falar sobre os sonhos, Jung da o seguinte exemplo: Um jovern neurético sonha que “esta subindo um lance de escadas com a ime © a irmd. Ao atingirem o topo, Ihe avisam que sua irmé estava para ter uma evianga terpretagdo ortodoxs apontatia o desejo incestuoso do rapa, No ent guna se Jung, “seo ato de subir a escadavia pode ser terpretado como um equivalente do ato sexual (trepar), por que olhar para as figuras da mie, da da crianga de maneira concreta? Por que nito interpreti-las simbolicamente (Eswnencer, 1970: 698.) Jung nao concordava que o sonho expressasse apenas a realizago dos desejos sexuais infantis reprimidos. Cada contetido onirico, para ele, i a funcao de simbolo, que, etimologicamente, significa “aquilo que tune”. O sono Ziga a consciéncia ao inconsciente. Além disso, 0 simbolo fala por si: se vocé sonha com uma cobra, a cobra no € sinal, nao quer dizer nenhuma outra coisa; é uma cobra. Cabe interpreta nao apenas por ‘que a pessoa sonhou com uma cobra, mas também para que a cobra sur- i onho. io daquele ano, 1913, por discordarem em relagdo a concei- tos bisicos sobre a natureza do inconsciente, Freud e Jung romperam sua igacdo. Depois disso, nunca mais se reencontraram. Ao mesmo tempo em que se separou do pai da psicandlise, Jung rompeu também com a Asso- ciagdo Psicanalitica Internacional (fundada em 1910), da qual era presiden- te, renunciou ao cargo de editor doJahrbuch e abriu mao de sua carreira te vinte anos depois. Significativamente, 0 ¢do, que trata da formagao da consciéncia e de sua diferenciacéo do incons- ¢, ilustrada pela trajetéria do heréi solar que morre para poder nado por Jung de “O sacrificio". Ele proprio, he ems periodo de solidao, a partir d caram, Um soho de 18 de mento-de sua vida: bro de 1913 sinteti A partir dese sonho, Jung percebeu quanto esta ‘orrencial desabou para varrer todos os vestigios do atentado, (unc, 1965: 160.) identificado secretamente com Siegfried — o herdi da mitologia germanica que repre- sentava, para os alemaes, a imposigio herdica da prépria de abrir mao istas e das am- preendeu a i dos s interesses, das ct Osacrificio do que parecia ser uma ncipe her carreira de sucess sua projecéo de zer algum sent com o pai sua reli agora, podia se 1. [Em busca da quarta dimensio] Esses pintores [Picasso, Braque, Metzinger, Delaunay, Léger, entre outros], se ainda observam a natu: reza, j4 nao a imitam e evitam cui- dadosamente a representagio de crifica tudo &s verdades, as necessi dades de uma natureza superior que ntade —e A arte moderna repele, de um modo geral, a maioria das técnicas de agradar utilizadas pelos grandes artistas do passado, Estamos cai nhando para uma arte inteiramente nova, que sera para a pintura, tal como a conhecemos até agora, 0 que a mtisica ¢ para a literatura, Sera pintura pura, assim como a miisica 6 literatura pura. ‘Oamador de misica experimen- ta, ao ouvir um concerto, uma ale- sia de ordem totalmente distinta da ia experimentada ao ouvir os os naturais, como 0 murmirio de um riacho, 0 estrépito de uma torrente, o sibilar do vento numa floresta ou as harmonias da lingua- gem humana fundadas na razdo nao na estética. Do mesmo modo, 0s novos pintores hao de proporcio- nar 20s seus admiradores sensacoes artisticas que decorrer en- te da harmonia das luzes fmparé O objetivo secreto dos jovens pin- fores das escolas extremistas € fazer pintura pura. Trata-se de uma arte pléstica inteiramente nova, Bla esté apenas em seu comego e ainda nao & {20 abstrata como gostaria de s Osnovosartistas foram violenta- Bes geome as figuras geométricas sio a esséncia do desenho. A geometria, ciéncia que tem por objeto a extensao, suas di- mensdes ¢ relagdes, sempre deter- minouas normase regras dapintura, Até agora, as trés dimensoes da _geometria euclidiana bastavam para quietagdes que o sentimento do ito desperta na alma dos gran- des artistas. Os novos pintores nao tem a pretenso, ndo mais que seus predece: de ser geémetras. Mas podemos dizer que a geometria 6 para as artes plisticas o que a gra- mitica é paraa arte do escritor. Hoje, dernos sao designadas pelo termo quarta dimensdo. Encarada do ponto de vista plasti- co, a quarta dimensao parece decor- és dimensdes conhecidas: ‘ imensidade do espago que, num dado momento, se eterniza em todas as direcdes. E 0 proprio espago, a dimensio do infinito; 6 ela que dota de plasticidade os objetos. Confere-thes as proporgdes que me- recem na obra. Acrescente-se, enfim, que a quar- ta dimensao — essa expres: - pica que se deve analisar ¢ explicar, de modo quea ela se ligue algo mais que um mero interesse historico — velo a sera manifestacdo das aspira- Ges e inquietudes de um grande néimero de jovens artistas que con- templamas esculturas egipcias, ne- Bras e ocednicas, meditam sobre os varios trabalhos ram por uma arte subl Desejando atingir as proporcées do ideal, nao mais se limitando & humanidade, os jovens pintores nos oferecem obras mais cerebrais que sensuais. Afastam-se cada vez mais da antiga arte das ilusoes de éptica e das proporcdes locais para expri- mir a grandeza das formas meta- fisicas. Bis por que a arte atual (cu- bismo), se nao é a emanagao de crencas rel apresenta na caracteristicas da grande arte, ou seja, da arte religiosa | renovar incessan- temente a aparéncia de que a natu- 33. reza se reveste aos olhos dos seres humanos. Sem os poetas, sem os artistas, a monotonia natural nao a aborrecer 0s homens. A ideia sublime que eles tém do uni- verso desabaria com rapidez verti- ginosa, A ordem que encontramos na natureza, € que nao passa de um. efeito da arte, em breve se desvane- ceria, Tudo mergulharia no caos. Nao haveria mi a vida desapareceria, e em toda par- te reinaria o vazio impotent Os poetas ¢ artistas determinam as caracteristicas de sua época, € 0 Por vezes se tem aventado, espe~ cialmente a propésito dos pinto- res mais recentes, a possibilidade de ‘uma mistificago ou de um erro co- letivos. Ora, no se conhece em toda a histéria da arte um Gnico exem- plo de mistificagio ou erto artistico coletivos. Existem casos isolados de fraude € erro, mas os elementos convencionais que em grande parte compdem as obras de arte garanter. fade de que tais exern~ m. Se a nova escola de pintura nos apresentasse um s6 desses casos, seria um acontecimento tao extraor- dindrio que poderfamos consideré-lo um milagre. Conceber um caso sim seria conceber que de rep numa nagdo, todas as criangas nas- cessem privadas de cabega, de uma ‘ou de um brago, concep¢ao Nao ha na arte erros ou mi cagées coletivos. 0 que ha sao ape- nas épocas diversas e diversas escolas de arte. Muito embora jetivo que cada uma delas persegue nao seja igualmente elevado, igual- mente puro, todas sao igualmente respeitaveis e, segundo as idéias que se fazem da beleza, cada escola ar- tistica é sucessivamente admirada, desprezada e de novo admirada. 2. [Espaco e tempo: construgées relativas] A fisica moderna confirmou, de forma dramatica, uma das idéias ba- que utiliza- para descrever a natureza si0 jtados, ¢ nao sio caracteristicas da realidade, como tendemos aacre- ditar, mas criagbes da mente, partes do mapa e néo do tervitério. Sem- pre que expandimos 0 reino de nossa experiéncia, as limitagoes da nossa mente racional tornam-se evi- dentes, levando-nos a modificar, ou mesmo abandonar, alguns de nos- ‘sos conceitos, Nogdes de espago e tempo figu- ram, de forma destacada, em nosso mapa da realidade. Essas nogbes ser- vem para ordenar coisas ¢ eventos no ambiente que nos cerca, razao pela qual sao de suprema importan- idiana e em nossas tentativas de compreender a natureza através da ciéncia ¢ da fi- losofia, Todas a leis da fisica exigem ‘os conceitos de espaco e tempo para sua formulagio. As profundas mo- dificagdes desses conc efetuadas pela teoria da rela de, constituiram, sem sombra de divida, uma das maiores revolugdes éncia. © obedecendo as leis da geometria euclidiana, mas também na nogio do tempo como uma dimenséo se- parada, que é igualmente absoluto dentemente Ocidente, essas nogdes de espaco ¢ tempo achavam-se tio profun- damente enraizadas nas mentes isofos e cientistas que eram sradas propriedades gemufnas inquestionaveis da natureza, A crenga de que a geometria é€ inerente & natureza, endo apenas ‘sua origem no pensamento grego. Estes acreditavam que seus teoremas icos eram expressées de verdades eternas e exatas acerca do mundo real e que as formas geomé- tricas eram manifestagoes da beleza absoluta. A geometria era conside- yada uma com l6gica ¢ beleza, creditando-se-lhe uma origem divina. Daf a maxima da grega, sempre sustentou que espaco ¢ tempo so construcdes da mente, Foi preciso que surgisse Einstein para que cientistas e fi sofos percebessem que a geometria no é inerente & natureza, mas fora imposta a ela pela mente humana A teoria da relatividade] se ba- seia na descoberta de que todas as medidas de espago e tempo sio re- ia, por antes de Einstein, que a posigao de um obje- tomo espaco s6 pode ser definida em relagao a alguin outro objeto, o que e € efetuado com a ajuda de trés coordenadas; € o ponto a partir do qual as coordenadas sio medidas pode ser denominado loca- lizagdo do “observador”. No tocante ao tempo, contudo, a situagiio na fisica classica era com- pletamente diferente. A ordem tem- poral de dois eventos era toma- a como independente de qualquer observador. As especificagdes que diziam respeito ao tempo —tais co- mo, “antes”, “depois”, ou “simul- taneamente’— era creditado um significado absoluto, independente cde qualquer sistema de coordenadas. Binstein reconheceu queas espe- ficagdes temporais também sao relativas e dependem do observador. Na vida cotidiana, a impressdo de que podemos dispor os eventos a nosso redor numa seqiiéncia tem- poral tinica € criada pelo fato de que a velocidade da luz — aproxi- madamente 300 mil km/s — é tio elevada, comparada a qualquer ou- travelocidade que conhecemos, que 35, ee podemos partir do pressupasto de que estamos observando os eventos ho mesmo momento em que ocor- rem, Tal suposigio contudo é incor- rela. Aluznecessita de algum tempo servador. Normalmente, esse tempo € tio curto que a propagagao da luz pode ser considerada instantinea; entretanto, se o observador se des- Jocar @ uma alta velocidade com re- Jago aos fendmenos observados, 0 lapso de tempo entre a ocorréncia de um evento e sua observacao de- sempenharé um papel crucial no es- tabelecimento de uma segiiéncia de eventos. Einstein compreendeu que esse se a diferentes velocidades or Go 0s eventos de forma igualmente diversas no tempo. Para as veloci- dades comuns, as diferengas s4o t0 pequenas que néo podem ser detec- tadas; mas quando 0s eventos apro- ximam.-se da velocidade da fuz, dio origem a efeitos comensurdveis. Na fisica de alta energia, onde os even- tos sio interagdes entre partfculas que se deslocam quase a velocidade da luz, arelatividade do tempo ébem estabelecida, = ATIVIDADES Arelatividade do tempo também nos obriga a abandonar 0 concei- to newtoniano de espaco absoluto. Considerava-se que esse espaco con- tinha uma configuragao definida de matéria a cada instante; agora, con- tudo, que a simultaneidade € vista como um conceito relativo, depen- dendo do estado de movimento do observador, no ¢ mais possivel distante que ocorre em algum ins- tante particular para um observador pode ocorrer antes ou depois para ‘um segundo observador. Nao € possi- vel, portanto, falar-se acerca do“ verso num dado instante” de ra absoluta; 0 espago absol pendente do observador nao existe A teoria da relatividade demons- trou, assim, que todas as medidas, do-nos a abandonar os conceitos de espaco e tempo absolu- {quel as coordenadas de espa- co tempo sio apenas 0s elementos deuma linguagem utilizada por um observador para descrever seu meio ambiente. 5p. 12530.) 1. Forme um grupo de mais ou menos seis pessoas. A partir da lembran- a dos segredos da infancia, criem uma Tescos, aventuras e situacées diferentes que cada um ia, de mitologia ou nas historias em qua- Grinhos, buscando associagdes e para pesquisar em livros de hi ria baseada em fatos pito- u. Vocés podem los para enriquecer 0 relato. Aproveite para criar em uma pintura uma imagem que represente o sew segredo dent 2 Pesquise sobre alguns dos movimentos inovadores que na virada e nas primeiras décadas do século XX estavam acorrendo em diversos cam- os da cultura (ciéncias, artes e literatura). Por exempl nf 1 e n? 2, concentre-se no tema escolha profi Quando e como esses dois lados das pessoas costumam “brigar” e como eles podem se comunicar e se entender? Entreviste alguns profiss sobre essas questdes e crie um ditlogo entre os “dois lados”. Depois dis- cuta com seus colegas. Invente, para dramatizar, um didlogo entre as personalidades nt 1 e nino que ia mal na escola, dialogando com a personalida Iho cheio de autoridade. 1 2 Com base no relato do episédio dos desmaios de haga explicagbes podem ser dadas para sua neurose? 3 Qual era o principal conflito vivido por Jung e que paralelos podemos mundo existentes no ini 4. Quais as principais diferencas na concepeao de espago e de tempo, nas iental, segundo o fisico Fritjof Capra? (Veja tex- 1, Nova 1993. ‘idade, Bertrand Russell. Lisboa, Publicagées ra. So Paulo, Cultrix, 1986, Rio de Ja PARA SABER MAIS. ), Nova Fronteira, 1982. 37. a A DESCIDA AO INCONSCIENTE Aqueles que entrarem, abandonem as esperangas. Dante ENCONTRO COM O MITO PESSOAL Acreditando na autonomia do inconsciente, Jung decidiu decifrar o significado de suas imagens, tanto de sonhos quanto de fantasias. Para isso, desenvolveu seu proprio método de investigagao: seria fundamental interagir com os contetidos do inconsciente, porém sem perder o contato com a realidade externa. Isso poral iconsciente, podemos encontrar tanto fascinantes te monstros devora- dores. Sabendo intuitivamente do perigo e lembrando-se dos varios doen- tes com os quais cor ‘0s quanto terri J6gica sob a qual vivia nessa época era tanta, que por que pudesse estar adoecendo. Esse tipo de crise da meia-idade, que costuma levar a uma grande transformagao da em revista, busca do efeito algum so inconsciente e as suas imagens. Uma das primeiras lembrangas que surgiram foi daquela época em que brincava sozinho, construindo casinhas e castelos com blocos de pe~ dra, A ocorréncia da lembra ou a uma espécie de resgate; foi como a sua crianga interior. hago, Jung entregou-se, nos inter- a construg3o de uma cidade corajosamente abandonay-se ao impul- te suas funtasias, mas principalmente as condigdes psfquicas ¢ emocionais sob as quais elas surgiam. A decisao de se confrontar com o inconsciente se deu no dia 12 de dezembro de 1913, alguns dias antes do sonho do “assassinato de Siegfried”, relatado anteriormente, Sentado em meu escritério, considerei mais uma vez os temores qu tia e, depois, me abandonei & queda. O solo pareceu ceder sob meus pése fui como gue precipitado numa profundidade obscura. Finalmer tre me diante de ura caverna, Entre e, do outro lado, percebi rmelho que cintilava na cadaver de um adolescent fesearavelho negro. Entao, do fundo das 4guas surgiu um rubro sol nascen- te. Ofuscado pela luz, tentei repor a pedra no orificio, mas nesse momento tum Kiquido fez pressio e escoou pela brecha. Era sanguel Um jato espesso jorrou e sents néusea, Afina, 0 ato estancou e a visto terminow. lawxe, op. cit, p. 159.) Apés o impacto dessa primeira visio, Jung passou sistematicamen- te a fazer descidas cada ves mais profundas ¢ descobriu alguns persona- gens com os quais iniciou uma série de dislogos. Uma das figuras presentes nesses encontros com o inconsciente tornou-se para ele uma espécie de guru, Jung chamou-o Filemon ¢ desenhou ¢ pintou cuidadosamente sua imagem num caderno, o Livro vermelho. Era a imagem de um velho com sas, semelhantes as de um martim-pescador, ¢ com chifres de touro; tra~ iia um feixe de quatro chaves, uma das quais segurava como se fosse abrir uma porta. Flemon, personagen| ‘ia intmidace edo acohimente a Gragas aos dilogos com Filemon, Jung chegou a conclusio de que existe uma realidade ‘ica objetiva. Descobriu que h4 na alma muitas coisas que nao sao fabricadas pelo eu, mas tém vida propria e se fazem por si mesmas, independentemente da nossa vontade, sendo como “persona- gens da imaginacao”. ‘Outtra dessas personagens que marcaram muito Jung em suas ex- ploragées do inconsciente foi uma figura feminina que ele chamou Ané- ‘ma (ver glossério). Ela funcionava como uma espécie de mensageira para transmitir & consciéncia as imagens do inconsciente. Sempre que estava perturbado e irvitado, Jung costumava perguntar & sua Anima o que se pas- sava. Assim que urna imagem surgia, a irritagdo se esvafa e ele se punha a buscar a compreensio de seu contetido. Apenas fantasiar e dar um tratamento estético as imagens ¢ fanta- sias do inconsciente nao bastava. Era indispensdvel a sua compreensio. Assim, Jung procurava transformar cuidadosamente cada contetido, ten- tando, na medida do possivel, no s6 compreendé-lo racionalmente, mas principalmente realizé-lo na vida. ‘Nao se tratava simplesmente de deixar que as imagens emergissem e encantassem. A parte mais di I, sofrida e trabalhosa era justamente entregar-se ao esforgo de compreendé-las e confrontar-se com as conse- aiiéncias éticas que a compreensao suscitava. Tais confrontos implicavam mudangas e sacrificios por parte do eu. Durante essa época de mergulhos na imaginagao, Jung sentia que sua “Ancora” eram a familia e 0 trabalho. A ilha no centro do lago Ser assimilado pelo inconsciente é um dos grandes perigos quando se lida com seus conteiidos. E 0 que ocorre, por exemplo, sob o efeito de algumas drogas pesadas, que podem prodi uma “viagem” sem volta, ‘uma bad trip: as defesas do ego se afrouxam, a consciéncia tem suas por- tas abertas e é invadida pelo inconsciente. Nessa invasdo, o inconsciente age como as aguas do mar, que ao subir avangam sobre a praia e podem levar tudo o que estiver em set caminho. ‘Sempre que sentia essa pressdo, para nao ser tragado pelas imagens do inconsciente Jung dizia a si mesmo que era um médico, tinha seu tra- balho e pacientes para atender, morava na Seestrasse, 228, em Kiisnacht, tha de um rico industrial de Schafthausen, com quem eve cinco filhos), et. 0 todas essas experiéncias, tornow-se claro que havia uma wvolvimento psfquico. Jung descobriu que existe uma espé- cie de centro regulador ¢ coordenador da nossa vida psiquica, que corres- Jung estava com 43 anos 4 a quando as “descidas” diminui o esto de sua vida elaborando to o gue havia xp manta e registra, A custa de um esforgo her6ico, naquela fase. A crise ‘para cle uma oportunidade de descobri 4 imagem de Deus que temos em nés, & qual ele rtugués, Si-Mesmo — ver glossirio), s acontecimentos da nossa vida, tanto inte- ponde simbolicamente denominou Seif (ou, em po Ele percebeu que todos o: es quanto exteriores, fantasias, sonhos e sensagies, as pessoas com que Nos rel as escolhas profissionais, nossas “viagens” ito é a realizagio de nossa tot ‘sio simbdlicos. Nossas emogoes, sentimentos, amos, i nossas ligagées afet isso tem um fio condutor cujo prop " vetomo seres no mundo. A busca da realizagio dessa totaidade, ue ele de- vominoa individuagao, € a meta do processo de desenvolvimento psiquico. | ‘Alguns anos depois, em 1927, novamente por meio de um sonho, a Jung confirmou sua idéia quanto’ existéncia de um centro regulador desse processo de desenvolvimento, o ponto culminante das experiéncias indi- revaats equteconfere uin sentido a vida de cada um. Nenhum de nds vem jo mundo por acaso e a vida de cada individuo tem uma finalidade tinica. (Stevens, 1993: 260), Jung abriu um caminho para a humanidade. go da vida"), numa noite de inverno, € stava na cidade de Liverpo encontrava-me muma praga ampl tetrdes estavain dispastos de forma radiada tro encontrava-se um lago, no meio do dda chuva e da neblina 20 redot se erguia uma érvore sl a, onde desembocavam varias runs, Os quat- redor da praca e em seu cen A GENESE DA OBRA Contestando a sobs ja do racionalismo cientifico e a viséo dualista que dividia 0 mundo em psique, de um lado, e realidade concreta das coi- tas, de outro, Jung partiu para a busca de um ponto de vista que fosse ca- 1 tais aspectos. Procurou, entao, desenvolver w pode holistica, uma psicologia qu Para ele a psicologia seria a tinica ciéi jiadora capaz de coneiliar ‘e a coisa, sem violentar nenhuma delas, Para diferenciar sua psicologia da psicandlise de Freud, Jung denominou-a psic nalitica — também chamada por alguns autores de arquetfpica ( (Byington). Ele definiu seus novos conceitos no ti ivro que escreveu ern 1921, Tipas psicolégicos. Dois tipos de pensamento Como disse Jung, “tudo o que escrevi possui um duplo fundamento” (Vox Feanz, 1992: 12). Para el, existem dois modos de pensar. Um € 0 cha- mado pensemento dirigido, por meio do qual submetemos nossas idéias jo ato voluntério do julgamento. Tem a ver com nossas escolhas, com essa vontade, O pensamento dirigido € pratico, objetivo e direcionado, produzindo uma espécie de planejamento da realidad ido exterior (par exemplo, “eu quero algo, entao devo fazer isso € ja ao mundo das idéias (por exem- entio ag As idéias vao se sya depende da- plo, no caso da légica superpondo como num edi quele que esté embaixo. Filésofos como Arist: eles, Santo Tomés de Aquin | a le 19, Spinoza, ¢ Hegel costumavam pensar dessa forma. Também Freud, a0 constrains teria siamo deservendo eu aos como um dette ie so, vai desvendando o mistério do crime md. para chegar ao culpado. no ge tte mode de pensar Echamao essoiatbu ou anaagc. Pum Pensamento | mais organico e menos linear, em que as it seclam sem ua diregao necessariamente objetiva ss da ie algo bastante diferente e até mesmo esquisito. No entanto, aparentemente, tratar-se de idéias sem a Fina ies so, Kirkegard, Nietasche, também Jang, pensavam des ora sent nines ahazes de cicundar as imagens que compte o pensa- trent scat, deer peer qu ees conteios aparentemen- avagantes relacionam-se numa es spécie de t significadosinterligados, manifestando-se por meio de uma gama mu a de simbolos. a © pensamento associativo tem muito a ver com a fantasia, 2 «fo € 0s sonhos. Como os sonhos, as fantasia so uma expressi0 nat Vda is ineonsciente, Surgem quando introduzinnos a palavrinha se “E se eu fi- ,-0 que aconteceriat”, “E se fosse por ali e nao por aqui?”. Podemos dizer que essa outta forma de pensamento, a seu modo, também “prepara” a realidade, explorando outros caminhos e buscando analogias, até chegar a uma solugo. Quantas vezes ndo sonhamos com situagBes de nosso cotidiano? E nosso inconsciente tentando aunillar 0 ex na busca de solugdes. Linguagens do inconsciente ‘jung definiaa fantasia como “uma fluéncia da atividade criadora do espirito ou imaginagao, produto ou combinagio de elementos psiquicos carregados de energia” (June, Tipos igicos, § 799). Considerava a ‘maginagao como urna das principais fungbes da psique, a expressio dire- ta da atividade vital e a tinica forma pela qual a ene! festa na consciéncia. A intengo de Jung nao era diminuir a importéncia do intelecto, mas simplesmente. restabelecer um eqt entio soberana, e a im Ha doi Jos de fantasia: a ativa e a passiva. ‘A primeira é sus fragmentes inconscientes e comp6-os por meio de associagdes até fque, 20 final, como nium mosaico ou quebra-cabeca, surge uma imagem compreensivel daquilo que se pretendia ver. das fantasias passivas so todas aquelas “viagens” ¢ devaneios nos quais entramos quando sonhamos acordados ou quando a consciéncia ¢ siterada pelo uso de determinadas drogas. Por se tratar de um produto que esti fora do controle da mente consciente, a fantasia passiva requer um eS forgo consciente para compreendé-le, sob pena de ficar na inconsciénéia. lim dos grandes méritos de Freud foi ter comecado a libertar a fan tasia — isto é, a maneira de pensar do inconsciente — das amarras da neue da psiquiatria organicista da época, que buscavam somente causas piologicas para os distirbios mentais. Quando iniciou suas pesquisa, ele splesmerte permitia que seus pacientes falassem liveemente o que bes viesee 4 cabeca, sem preocupagao com censura, ou seja, sem represséo — método que ele denominou associacdo livre. imeiro médico a conferir crédito’ linguagem do incons- ciente ¢ perceder a importincia e o significado daqueles ‘absurdos” nam emergir quandoamente consciente no esténo controle das Associago ive no diva (com base em Mosalco i, da Maurits Escher) Filosofia, religides e mistérios Jung insi im ecu insstia no fato de que, como toda ciéncia, sua psicologia tam- hem estaa sujlta aos preconceitos ¢ condicionamentos subjetivos do ob- vador. Assim, para evitar uma tendenciosidade g) e iosic rosseira, sempre lhe rec ai pareceu mores vel a documentagao e a comparacéo do material de sua 1¢0 dos sonhos e dos contetidos do inconsciente com fontes his- Devido a i sacs ni A eeponsa idade ética e moral que suscitava o trabalho de rvestigacdo das imagens do inconsciente, Jung sempre se esforgou em que aqueles contetidos da experiéncia psiquica no representavam visando sempre a uma compreensao da natureza humana com relagdo a to- talidade, seja ela individual, seja ct ral. Para desenvolver suas intuigdes, ele foi buscar inspiragio numa gama imensa de referéncias culturais e histéricas, tracando varios parale- los entre elas e as cigncias humanas, a hist6ria das religiées, a mitologia, a antropologia, a poesia e a arte. Seus estudos estenderam-se também 20 gnosticismo, 2 alquimia e as filosofias do Oriente. ‘A abordagem que fazia de todas es- sas experiéncias do ser humano — reli- giosas, misticas, artisticas ou de outra Termo empregado por atureza — era fenomenolégiea, isto & Jjungrelativamente a“expe- quando recorria a essas fontes, visava mui- Fenomenolégico riéncia pura’, Ou seja, a ‘maneira como 0 individuo —_ndmenos humanos e verificar que fungéo experimenta asi mesmo © desempenhavam na psique individual 20 mundo, atteriormente a qualquer teoria. ou coletiva do que realizar um estudo aprofundado da historia das religides e da filosofia. Em virias passagens de suas Obras completas Jung faz referéncias ‘a0 pensamento de diferentes fildsofos, poetas e pensadores. Alguns que, de uma ou outra mat influenciaram seu pensamento sio Immanuel Kant (1724-1804), Friedrich von Schiller (1759-1805), Friedrich Nietzsche (1844-1900) e os filésofos do inconsciente: Arthur Schopenhauer (1788- 1860}, Carl Gustay Carus (1789-1869) e Eduard von Hartmann (1842- 1906). Gnosticismo CO entusiasmo de Jung pelo misticismo de modo algum representou ‘uma rejeicao a tradigao espiritual crista, com a qual tinha fortes ligagdes, mas, sim, a tentativa de compreender as religides de mistérios dentro de uma perspectiva simbélica e “reativé-las... obrigando-nos a reconhecer nelas um espelho de uma parte de nés mesmos, que fora até entao inva- riavelmente ignorada” (Cianke, 1992: 128). Sua visdio sobre as religides, tanto na abordagem das tradigbes da teologia crista quanto na das religides orientais, € um dos pontos mais, polémicos de seu pensamento, Para ele, as religides, com seus cultos e pra- ticas rituais, procuram, muito mais do que representar averdade, nos dar um sig a vida e morte, expressando profundas neces- sidades psicolégicas da humanidade. As crengas seriam organizagies co- dificadas e dogmatizadas de uma experiéncia interior, que ele descrevew como numinosa (ver glossério), isto é, carregada de energi 48. at sian te 198 £1925, na sca das aes hss de sus eerie. Gs] napus esto ds gists, ue como ee peda af encontrado o mundo original do inconsciente”, Tentando resgatar as anti- n0 fas discuss6es com o pai, Jung invocava otestemunho de um erin, ‘descobriu no gnosticiemo ume. MeHlo seerelg supestamenee one indicagdo antiga de sua énfase Cad 205 Apdstolos por Cristo Res- no primado da experiéncia sobre suscitado, e conservado e transmitido a fée de algumas de suas pré- is inthe es [...], os tipos bésicos de atuacio psicolégica, 0 destaque a polaridade e a idéia € desenvolvimento individual 61 consttulao mundo neglgencade do inconsiente(Cusat, Tous oe Alquirnia i Foi na alquimia que Jung encontrou as rafzes de suas idéias e a Ponte entre o gnosticismo e a psicologia do inconsciente. Ele concebeu a alquimia como precursora da sua psicologia, as eins dos alain eam mis eaprincse eles er num cet sen, 0 meu mundo, (Eta ste tos, ercebi gue tan se encontrar o mundo dat imagens orate erptieo gue eleiond ns prc as conse qe hs tds ido ue, op. cit, p. 181.) : ° cristianismo ortodoxo, ao considerar pagaos os cultos & nature- 22, salorigava 0 espirito e reprimia a carne. A alquimia, por sua vee, for feta simboles a dos guais se entrava em contato com a matéria e : cténico (ligado a terra) da natureza, levando & a gamma lado cfnico Fevando a transformaggo a Numa de suas visitas & Escola da Sabedoria, fundada pelo filéso- cial alemdo Hermann Keyserling, que pretendia a integracao entre Oriente e cident, Jung omourse muito amigo de Richard Wilhelm, um jonério que havia traduzido para o alemao o cléssico li ivi i ivro Ges chines, 0 / Ching, ot eae Nessa é Alquimia ‘A alquirhia surgiu na China antiga hd mais ou menos 3700 anos. Baseads na filosofia taofsta do equilfbrio ¢ uniso entre os prineipios yin lemitino) e yang (masculino),enfatizava © autoconhecimento ¢ a transformagao da personalidade como meios para dar nascimento a0 ove homem dentro de cada individuo. Chegou ao Ocidente trazida pelos grezos, foi desenvolvida pelos drabes ¢ ressurgit no sécu Fleangando scu desenvolvimento maior durante 0 Renascimento (sé- alos XIV € XV). Desapareceu durante o século XVIl, por ser incompa~ tivel com 0 lluminismo. ‘Mediante uma sucessao de experiéncias de laboratério, mistas buscavam encontrar o elixir da longa vida ou pedra ‘Muitas das técnicas desenvolvidas por eles foram preservadas e deram origem 8 quimica moderna, Jung viu no contate com a para equilibrar 0 excessivo materialismo da cultura ocidental. Esse equi- ibrio corresponderia a uma volta para 0 mundo subjetivo de nossas gens interiores, que os orientais haviam desenvolvido por meio de suas icas, como a meditagio, a ioga eas artes m Em 1928, Wilhelm enviou a Jung um manuscrito sobre alqu chinesa — intitulado Segredo da flor de ouro —, pedindo-Ihe que acres- centasse comentiirios ao texto. Jung ficou entusiasmado ao ler 0 mate~ r ali encontrou uma confirmagSo a suas reflexdes. 0 manuscrito trazia a idéia de reconciliagao dos opostos, um dos aspectos centrais tan- to da filosofia hindu quanto do zen-budismo. Essa idéia de equilfbrio en- tre os opostos, ou caminho do meio, é fundamental na compreensdo do trabalho terapéutico de Jung. No processo de realizagao da identidade pro- funda do individuo, os elementos conscientes e inconscientes reconci- liam-se e sfo integrados na consciéncia, transformando a atitude do sujeito (ver texto complementar “O ocidental nao compreende o Oriente ‘Algum tempo depois, Jung tomou conhecimento do Ars auriferae volumina duo (1593), um tratado de alquimia escrito em latim. A partir JJe comecou um intenso trabalho de andilise e decodificacio de varios manuscritos antigos sobre alquimia. Cerca de quinze anos mais tarde, ele havia reunido uma das melhores colecdes da Europa sobre 0 assunto. ‘Ao decifrar o significado simbélico dos textos herméticos que ilus- travam as fases do processo da transformagio alquimica do ouro, Jung en- controu indicagdes que Ihe permitiam interpretar e simbolizar 0 processo de transformacao pelo qual ele préprio e muitos de seus pacientes estavam eee bs celle a seria, na realidade, uma projecio de contetidos in- scientes sobre as experiéncias que o alquimi i 5 sta realizava, fee laboratério, em busca da pedra filosofal mes © opus alquimico pode ser sari transormagio a pertool inde topes ee ea al steiner, do conscatecom neon heat com tne, Estudos sobre psicologia analitica, § 360.) ano tts de ung sobre a alas estéoorganizaos em suas Obras completes, nes volumes 12,1. e 14— tespetivament, olga _aaaina, Estados alquiics © ysterium coniunctons. compara so que ele faz entre o processo de transformao alquimica, ou opus. ¢ 0 Processo psicoterdpico esté no volume A prdtica da psicoterapia, Aexemplo dos alquimistas, 0 objetivo central de Jung era um s6: enetrar no segredo da personalidade. - Pode-se dizer que Jung renase: ¢ renascet ao emergit do perfodo de profun- da intospesio em que steve mergulhdo os 3 9842 anos dou de instrumento de seus instintos naturais s para tornar-se ele me mo Fol partir dessa experncia que ele desenolveu um dos ma aa Portantes conceitos de sua psicologia:o chamado processo de individuagao Bor meio do qual personalidad sfre uma transformagio radical oe, Kaneando amon, dla ab S-Mesmo come canto da personalidade. vn 2 elm e Jung publicram Sepredo da fr de oro — iro de vida chin8s, Nesse ponto, diz Jung, “minhas reflexdes ¢ pes. aquisas atingiam 0 ponto central de minha psicologia, isto ¢, a idéia de SelP” (unc, 1975: 183) nin ey Aus 86 aa que ele se sentiu em condigdes de “retornar ao mun- Gor Apart paso fer confrncas, rao vgs eve monografias que co nes © me q ntinham respostas as suas Preocupacdes de Participou regularmente, du lan urante vinte anos, do centro Eran , 03, fundado em 1882, em Ascona (lili), « cordenado por Olga Froce- ¥eplyin. Al tve a oportunidad de trea ila com muitos eruitos de ‘iplinas, como Karl Kerényi, com quem ° vie publicou virios livros obre mitologia; Gilles Quispe, estudioso do gnosticismo; Henry Corbin, estudioso do sufismo; Adolf Portmann, com quem d adres de ade Intuitivamente, Jung desenvolveu conceitos € modelos ae in cidos com 0s da fisica moderna, sugerindo a existéncia de fené pre) a apontam para um paral ya oie heahart ge 7 aie ; ‘incipio da complementari c For ec ux por intermedi de dis conceitos complements- a |, segundo Jung, ao conceito de ener peigiea, que poe er considerada ao mesmo tempo come Ta- téria e espirito. Da mesma forma, a idéia de rel lade do uni ae po aplica-se “tanto ao reino das pai feul s elementares ae oe ‘camadas mais profundas do inconscien! (Won Pranz, 1992a: ee vamos isso nos sonhos, nos quais lugares e tempos diferentes, do pi e futuro, mesclam-se com situagoes do presente. Sincroni Unta relagao complementar Buscando uma compreensio mais adequada da cae env pares concellos clissicos, Bohr considerava 2 onda ¢ Fe oc ees coraplementars ca mesma realidade, Ele esta Conscio do paralelo entre © conceito de complemen- taridade e o pensaimento chinés e, 20 a 6poca em que sua wuigBes & cién- 16s do Na natureza, existem coincidéncias para as quais nio conseguimos encontrar relagdes causais e que, no entanto, estabelecem algum tipo de correspondéncia entre as imagens interiores ¢ os eventos exteriores. como se 0 inconsciente tivesse conhecimento, de modo independente da cia, dos eventos que ocorrem num continuum de espago—tem- ig deu o nome de sincronicidade a esse fendmeno no qual coinci- déncias sem aparente conexdo de causa e efeito estabelecem entre si alguma relacio significativa para aquele que passa pela experiéncia. K o que ocorte, por exemplo, no caso dos sonhos premonitérios, que antecedem 0 surgimento irregular e bastante imprevi do material ‘Quando ocorre sincronicidade, todos os fendmenos verificados num mento da dualidade matéria—espi mundo tnico e comparti nos sessenta e quatro hexagramas do/ Ching. & dessa maneira, ‘0 chinés lida com o fenémeno da sincronicidade. No final deste capitulo, vocé terd um exemplo sincronicidade, presente na transcrigdo de um relato feito pelo navegador Amyr Klink. O VELHO SABIO Jung sentia uma profunda necessidade de gravar e esculpir suas idéias em pedra. A intimidade que tinha com esse simbolo o acompanha- va desde a infancia: primeiro houve o contato com a sua pedra, com a qual wva 0 fogo no interior do mun a churinga que pintou para 0 lo guardado no estoj te, 0 fascinio pela pedra filosofal dos alq Por volta de 1923, Jung comecou a construir sua forre: uma casa de ‘de um lago em Béllingen, distrito de Saint Meinrad. Para ‘aquecé-la e iluminé-la havia uma lareira na torre principal e lampa- rinas. Anos depois, ele ergueu urn monumento de pedra, em que gravou ‘uma estrofe de um alquimista do século XIV, Amaud de Villeneuve (Juxc, 1975: 199): Bis a pedra, de humilde apavéncia. [No que concerne ao valor, pouco vale — Desprezam-na 0s tolos B, por isco, mais « amam os que sabem. 0 projeto inicial consistia em uma espécie de cabana africana com ‘uma lareira no centro e beliches em volta. Correspondia aos sentimentos do homem primitivo interior de seu dono. A essa ampla estrutura circu- lar inicial foram posteriormente acrescentadas uma espécie de torre de dois andares, uma parte central e, anexa a esta, outra torre mais estreita, Anos mais tarde, Jung construiu também um patio que ligava a casa a0 lago; fi- nalmente, um andar superior foi adicionado & parte central. O conjunto for- mava uma quaternidade: quatro partes construfdas ao longo de doze anos. Quando terminou a construgdo, Jung compreendeu que, em seu conjunto, Ballingen representava um mandala, simbolo da totalidade ow Si-Mesmo: a torre principal com lareira significava o lado materi do ao reino da Mae, ¢ a outra torre, lugar de meditagdo onde ninguém en- trava sem sua permissdo, 0 lado espiritual. O patio era a abertura para a 0 andar superior, 0 eu ou centro da consciéncia desenvolvido Depois da morte de sua mulher, ocorrida em 195, Jung, ento com " ‘anos, passava a maior parte do tempo em sua torre. usava agua lo pogo, tirada com uma bomba, cortava lenha e co: a ya sua 2 ‘Estes atos ‘ges (one, 19% Na torre continuou desenvolvendo seu método de abordagem e re- lacionamento com o inconsciente, esculpindo ou fazendo inscrigdes em pedra e pintando suas imagens interiores. Transformou a torre num igen, a sua personalidade n? 2, Filemon, finalmente encontrava sua morada. As vezes... me espalho pela pz spalho pela paisagem e nas cots, € vi vor, so susurro das on, ra nuvens not nimals que surgem eeprom, Ste el a ¢ io nn ea radia existe a que do, Tudo possu a sua historia, que & também a minha historia, (..) Aqui ha lugar para o dominio nao-es a dos outros planos. oe at a use, op, cil, p. 198.) i Jung morreu de um atague cardfaco, com 85 anos, em junho de et at des fn ; imas palavras & governanta Ruth aje & noite vamos tomar aquele vinho ti ” le foram: “Hoje \quele vinho tinto gostoso! AS SEMENTES DE SUA OBRA Como disse Jung, “quanto mais penetramos na natu js cresce a nossa conviegdo de que a diversidade e a mu} fidade da natureza humana requerem a maior variedade de opi todos” (Juve, A pratica da psicoterapia, § 11). stamente enraizada em vivencias pessoais, 10 estudo do inconsciente seus clientes. £ possfvel comparé-la a um sistema vivo que se desenvolve fe se transforma concomitantemente com seu criador. Em 1929, aos 64 anos, Jung afirmou que a critica filoséfica 0 aju- dou a compreender que todo sistema psicol6gico, incluindo o dele, pos- sui o carater de uma confissio subjetiva. Desse modo, sua vida e seu trabalho cientifico sao inseparaveis: “O trabalho é a expresso do meu de- senvolyimento interior” (unc, Freud e a psicandlise, § 774). ‘ho lermos as obras de Jung, é possfvel perceber que muitas de suas {déias vao surgindo como sementes que brotam do fundo do ser e visam & ‘exploragio de possiblidades, sempre abertas & reavaliagdo, ao refinamen- to ea amplificagdo, Sua preocupacao era muito mais oferecer uma maneira de olhar e um meio para dar significado aos fenémenos ou fatos da expe- riéncia do que apresentar um conjunto de verdades sobre a psique. Para ieso ele desenvolveu hipoteses e sistemas que nos permitiriam comparar, ‘rganizay, tentar compreender e dar um sentido aos fendmenos psfquicos linear, Ele costumava partir de uma imagem ou idéia central e, por meio do pensamento associative, empre- gando uma logica orginica, passava a citcundé-la, buscando anal jaa crescer e desenvolver-se, muitas vezes de m: \pre- 1, como num caleidoscépio, mas sempre relacionada com a imagem ‘Apesar de sua recusa em construir um sistema de pensamento, en- ‘ontramos em seus escritos e em sua criatividade uma grande unidade de diregio e de sentido. Sung dava a sua psicologia o enfogue cientifico da hermenéutica, & arte de interpretar os simbolos ou o processo de desvendar alguma coi- sa que no esta clara. Para descrever sua abordagem, sso de compreensio dos so- Hermenéutica iginouse dentro da teol aja, em decorréncia da neces dade de esclarecer 0 significa hos ico desconhecido realizada por um. logo. Dizia ele: “os atos humanos, _dos textos sagradas, e fo dese seja ‘da historia, sejanaintera- _volvida pelo teologo alemao Schieiermacher (1768-1834), que ce, so como textos que atodo o campo da aampliou humana. expresso simbsl rias man b 1. [ Muitas coineidéncia: Magica emogio de conhecer um lugar que ha pouco tempo nio pas- sava de um ponto isolado ne ma- a, que nada me dizia além de ser 0 inicio da linha pontilhada que atravessava minhas carias néuticas em dirego ao Brasil... Mas por que Lideritz? Nao por acaso. Unico orto da Namtbi ido em qua- se 1500 km de costa rida e desa- bitada.... em situacao altamente estratégica para uma pequena em- barcagao que pretenda se ver livre da Africa. Logo que o plano amadureceu, € antes mesmo de definir 0 projeto do barco, uma diivida importante examinando cartas-pi mapas do Atlantico a respeito desses lugares. Minhas irmas, as gémeas, esta- vam passando os feriados de bro, més do meu aniver casa, em Paraty, Perguntei a elas se poderiam me ajudar, e recebi uma cartela escolar com dados resumi- dos de todos os paises do mundo. Procurei imediatamente no in- dice a Nam abri no lugar correspondente, ro de impresso, ¢ os dados sobre a Nai bia estavam em branco, Que azar, . por acaso] pensei, € esqueci a cartela, Poucas horas mais tarde, José, o carteiro, es- ntimero de uma assinatura da Re- sta Geogréfica Universal que uma amiga me mi aniversério, Abi : Comecei a ler tudo sobre traves- sias e, pouco tempo depois, termi nando um livro em francés a falava de algumas tentativas frus- tradas de eruzar o Atlantico Norte, observei que era o terceiro . secutivo que mencionava um radio- amador francés, Maurice, que i haviaacompanhado pelo radio mui- tas expedigbes polares e travessias em solitério. Tive uma incontro- lavel vontade de tentar um dia corresponder-me com otal francés. ices interessantes ele deveria ter! Na manhi seguinte resoh um passeio por mar até o si ‘0 de casa, e fui remando, len- com a correnteza. Nao nna diregio da mindscula € miste- riosa Liiderita. — Como?— reagiu ele. —Liideritz — respondi. — gracado, nao? Um nome alemao em plena Africal 7 —Vocé sabe qual € 0 meu nome! Senti-me envergonhado. O rapa fora tio gentile eu nem ao menos Ihe perguntara o nome. A resposta quase me derrubou da cadeira: — Henrique Liideritz. E, como eu duvidasse, ele me sua carteira de identidade: 1e Liideritz. Simplesmente incrivel! Eu estava sentado diante de um descendente direto de Adolf Litderitz (comerciante de Bremen, que fundou a cidade no inicio do século). Rimos, nervosos com a des- coberta, uma dessas inexplicéveis coincidéncias que desnorteiam 2 cabega das pessoas mais racionais... aes ene cfu mar Ri de Tove Oly 186. p26) ‘Um pouco cedo, talvez, mas encos- tei ebatina janelinha. Que susto tre- mendo! Veio para fora um casal Chamavam-se Michel € Frédérique. Eram franceses ¢ esta- vain ha dois anos navegando com duas criangas, que ainda dormiam. os0 café, Subitamente Michel hou para o relogio, pulou da mesa ¢ ligou um estranho receptor. Esta~ va atrasado para o seu comunicado habitual com o F6 CIU, no interior i Nao poss pensei. Jé tinha visto aquele prefixo antes. —— Nao é 0 Maurice? — pergun- tei de brincadeira. Parece inerivel, mas era ele mes~ ‘mo... Resolv, ento, aps té0 impres-~ sionante coincidéncia, tornar-me radioamador; meu futuro barco de- veria ter um radio. Hee Mas por onde comecar? Nao en- tendia nada do assunto, enum fim ms. de semana, viajando até Sao Paulo, recorri aos clasificados do Bsta~ dao... Atendeu um rapaz muito aten- cioso, visivelmente viciado em radio que, apés quarenta minutos inin~ terruptos de conversa, propos me dar algumas explicagées a0 Com 0 ouvido j4 doendo de tanto segurar o fone, concordei, € em se~ guida ele veio a minha casa. ‘Abri um mapa do Atlan e, meio sem graca, expliquel que pretendia, Interessado, ele me perguntou de onde pretendia sair para uma viagem tio incomum. — De um lugar muito engraca- do, um lugar na Namibia que ne~ m br hhece. Eapontei 2. [0 ocidental nio compreende 0 Oriente] ‘Como ocidental, e sentindo a sua maneira espectfica, experimentei a mais profunda estranheza dian- te do texto chinés [Segredo da flor de ouro| do qual se trata, verdade que um certo conhecimento das reli ides e filosofias orientais auxiliara de certo modo meu intelecto e mi- rnha intuigdo, a fim de compreendé- Jo, assim como entendo os paradoxos das concepgies religiosas primit em termos de “etnologia" ou de “re- go comparada”.[..] Mas Richard Wilhelm penetrou demais no segre- do ena misteriosa vivencia da sabe- doria chinesa, para permitir que essa pérola intuitiva desaparecesse nas Gavetas dos especialistas. E grande ‘a minha honra e alegria de ter sido designado para fazer 0 comentério Psicolégico desse texto chinés. [..] A singularidade do pensamento chings salta & vista, sendo compre- ensivel nosso emharaco no tocante 20 modo pelo qual ele poderia asso- iar-se & nossa forma de pensar. 0 erro habitual [...] do homem do Oci- dente lembra o do estudante que, no Fausto, de Goethe, recebe um mau canselho do diabo e volta as costas, com desprezo, para aciéncia, O erro 0 qual me refiro &0 de interpretar erroneamenteo éxtase oriental, to- mando ao pé da letra as praticas de ‘oga, numa imitagao deplorével. .] A imitacao ocidental ¢ tragica, por ser um mal-entendido que ig- ora a psicologia do Oriente (..] Nao se trata de macaquear 0 que é visceralmente estranho ands, ou de bancaro missionaiio, mas de edificar a cultura ocidental que sofre de mil ‘males. Isso deve ser feito, no entan- 0, no lugar adequatio, em busca do ‘auténtico europeu, em sua trivial dade ocidental, cam seus problemas matrimoniais, suas neuroses, suas ilusées politico-sociais e enfim com sua total desorientagao diante do mundo, Seria melhor confessar que no ‘compreendemos esse texto esoté- rico ou, entio, que ni compreendé mica, que permite olhar fundo e para dentro, desprendendo-se do mundo, s6 € possivel porque esses homens satisfizeram de tal modo as exigéncias instintivas de sua natu- Yeza, que pouco ou nada mais os impede de ver aesséncia invisivel da mundo? E acaso a condigio de pos- ertacdo desses ape- igdes e paixdes que nos detém no visivel, nao reside jus- tamente na satisfacdo plena de se tido das exigéncias instintivas, em lugar de uma repressao prematura determinada pela angistia? E nao se liberta o olhar para o espiritual quando a lei da terra tiver sido obe- decida? Quem conhecer a historia dos costumes chineses ou entiéo oI Ching através de um estudo minucioso, sabera que este livro sapiencial impregnou o pensamen- to chings hd mithares de anos. [..] 0 intelecto apenas prejudica a alma quando pretende usurpar a he- ranga do espirito, para o que nao estd capacitado de forma alguma. O espirito representa algo mais ele- vado que o intelecto, abarcando ndo 56 este ultimo como os estados afetivns. Ele é uma direcao e um principio de vida (yang) que aspiram as alturas luminasas e sobre-huma- nas. A ele se opde o feminino, obscu- 10, telirico (yin), com sua emocio- nalidade e instintividade que mer- gutham nas profundezas do fempo enas raizes do continuum corporal. is conceitos representam, sem divida alguma, esséncia da alma, A China nao pode prescindir dessas concepe6es, pois, tal como demonstra a historia de sua filosofia, centrais da alma a ponto de perder-se no engano de uma supervalorizagao erais de uma fungio p: isso mesmo, nunca dei nhecer 0 paradoxo e a polaridade de tudo o que vive. Os opostos se equi- libram na mesma balanga — sinal de alta cultura. Ainda que represen- te uma forga teralidade é um sinal de barbatie. / reagio que se iniciow no Ocidente contra o intelecto e a favor do eros ou da intuigdo constitui, na minha opinido, um sintoma de progresso cultural eum alargamento da cons- ioncia além dos estreitos limites de um intelecto tirdnico. Longe de mim a intencao de me- nosprezar a enorme do intelecto ociden © ATIVIDADES tével, portanto, que 0 europeu se renegue a si mesmo para it ‘Suas possi maiores se permanecesse fiel a si mesmo e se desenvolvesse a partir de sua esséncia tudo 0 que o Orien- 3. Histéria natural Cobras cegas sao notivagas. 0 orangotango é profundamente yreferem 0 isolamento. Certas arvores sé frutificam de 25 em 25 anos. Andorinhas copulam no véo. 0 mundo nao € 0 que pensamos. ond de. Gorge 1 Retina-se com seus colegas. Procurem se lembrar de sonhos em que vocés mantiveram algum contato com figuras desconhecidas. Criem um desenho que as represente e busquem associ: a outras imagens, pesquisando, por exemplo, em livros de arte, nos mitos, em contos de fadas, em revistas e gibis. Muitas vezes, ent cado das fi- sguras dos sonhos por meio de associagdes ajuda a esclarecer o sentido daquilo que o sonho quer nos dizer. 2 Faca uma pesquisa sobre a figura do Velho nos contos de fada. Que ca- ‘sticas de personalidad e atributos simbélicos vocé encontra pata PARA SABER MAIS 3 Faga uma pesquisa sobre algumas r daismo, budismo, , smo, islamismo, espiritismo, identi ificando simbolos centrais de cada uma delas. Ha nelas simbolos e aspectos sion, bélicos que se repetem? eee nio-orientais, t de uns ¢ outros. ui ‘elacione suas observagdes com i- ‘cages presentes no capitulo, : fee © QUESTOES TO que vocé entendeu i pens a respeito de pensamento dirigido : i ede - : pasceney, Cite exemplos dos dois tipas de pensamento, oe ‘om quais conceitos expostos neste capt 2 associa ot t capitulo voce c plementar “Histéria natural”? eoen testo cam : e ue vocé entende por heresia e 0 que vem a ser 0 gnosticismo? /oce ja vivenciou situagdes parecid: 1 i las com as descritas por no texto “Muitas coincideneas. por aaso"? Relacone a copes ccias vivenciais com o conceito de sincronicidade expe 5 Vocé conhece algum relato de pessoas (escritores, arti 7 ecidos seus) que, na maturidade ou velhice, fam trabalhos {ite corresponderiam a uma espécie de sintese da sua vid? (Vefa a his- ia da construgao da torre de Bollingen neste capitulo.) 6 Vocé concorda com as observagi yrda coi servagdes ¢ andlises que Jung faz no te plementar “0 ocidental nao compreende 0 Oriente”? oe * Seared da flor de ouro — Um livro de vida ching 4 & Richard Wilhelm. Pte ores, 1988 que conta 0 conto?, Jette Bonaventure. So Paulo, Paulinas, Jung 1992, Jung —~ Vida ve i 7 aie obra, Nise da Silveira. Rio de Janeiro, Paz ¢ Ter © O homem e seus simboto 5 Renate alos, Carl G. Jung, Rio de Janeiro, Nova Ol A TERRA DA PSIQUE Or ” SG tes; Em mim as “paredes divisorias” sao ae : E : s sit itas vezes tao 1s outros, elas sao mil ssa a que thes impedem a visio; eles pensam, por isso, que nao bd outro lado. L June PSIQUE NAO E SINONIMO DE MENTE CONSCIENTE Nos séculos XVI ¢ XVII a psicol 1745-1864), o psiquiatra que libertou doentes mentais, pensava-se na desordem psiquica como joria das vezes, na barriga e no diafragma. Cem anos de- Psiquiatria havia se tornado cerebral e abdomen foi trocado pela cabega. A psique passou a ser associada c mente e esta com a cabega e 0 cérebro. Pensadores e cientistas se trans- formaram em pesquisado- res da cabeca, procurando nela a chave da natureza humana, Contudo, a psicolo- gia_ moderna descobriu que a mente racional ou intelecto (consciente) é complementada por outra passando-sea que: como centro da pers dade total. Muito dessa descoberta, o po MO. Escher, Gasca 55): psiqUE NAO 8 igual a cabago, Hoje podemos dizer que a psique & fonte de todas as atividades hu- manas. Nada do que foi descoberto, invel construido até agora, rrenhum valor com que dotamos nossa cultura existe sem sua partl’Pa Gio, Uma vez que nossas experiencias sio prod pela psique, nao é poseivel separar os fendmenos que estudamos da psique que produziu. ‘Kasim, nenhum modelo de concepgao da psique deixa de ser nfluenciado pela subjetividade de seu criador. Essa € a dificuldade: a pstaue € tanto 0 sujeito quanto 0 objeto de estudo. No mundo das imagens hecimento e investigagao acerca da psique deve estar ia pessoal. O melhor meio de se dos relacionamentos, Qualquer enraizado obrigatoriamente na experiénci conhecé-la 6 a vivencia dos sonhos, das emocoes, enfim, dos simbolos que temos. ‘O contato e a familiaridade de Jung com as revolugées que oor iam na fisica moderna ajudaram-no a compreender que “as teorlas cien- Tifcas evam criagoes da mente e nao espelhos do funcionamento interior da natureza” (Ciarie, 1992: 63) ‘Como na descrigio do atome & crigdo da naturreza da psique leva a um paradoxo, Portanto, devemos Contentar com uma tentativa de organizar e descrever tals experiéncias, Sem nos preocuparmos com uma verdade fechada acerca de sua esséncia fou de sua natureza. [sso nto quer dizer que no possamos descrevé-la de tim modo verdadeiro e de importncia significativa para outros scves hu manos. da energia na fisica moderna, a des- q sma nem uma teoria geral, tendo formula tie- res que me servissem de instramentes [ Nunca acreditei que nossas percepgoes pudessem apreet de existincia. Toda compreenséo e tudo o que se comp ‘meemo, psiquico ¢, nesta medida, encontramo-nos irecuperavelme ‘Gonados num mundo exclusivamente psiquico. Bu no elaborei um (uve, Apud Vox Prat, Carl Gustat diretamente, 0 que estiver dentro de nossa conseiéncia. O que estiver fora, por definicdo, faz parte do desconhecido. E, dentro da consciéncia, s6 € possivel perceber as colsas através das ni sas imagens psiquicas. Formamos um modelo, uma imagem do mundo e, de averdo com ela, nos orientamos e nos adaptamos (04 N30) nto uma comida 6 podemos perceber, — gnica e espirit 6 spiritual, formam um s6 mundo. Nossa consciénci um lugar difere v« tm lug aiferente, you a uma sta onde dango eencontr virias pes a I, }, nam 7 sus aba, i ome oro, durmo, fico sem fazer nada. aguil que vv na viagom, na fest, no trabalho nina eaperincis com minha pega Assim, conforme Jung , “ CY i » “*vivemos apeni vos enas no mundo Devi ue baie imagens serem ou nao verdadeiras na im da 7 orincia qué elas possuem paraoiniviu ea sociedad, fo ponto de puramente psicolégico”, Sere renee na escola, a partir de AS POLARIDADES EO UNUS MUNDUS Sabemos, desde 7 08 antigos chine é 7 ; eses, da exist i tes qe interagem para mater oequiiro defor eer in € nossos estados afetivos. Opondo-se a ele, 0 ‘om sua emocionalidade oe mpo e nas raizes do conti eum corporal” (Jone & Wi oan & Wie, : 26) conn Oe rao Helio de Eso conerbe 0 ake ca cate ors pats, sano assim apeende ela em suas Hoinainan af 7 i igdes. Para ele, o ser humano € miiltiplo Henne in a lades internas que esto em luta constante: él : oposto, e vice-versa. E 7 tans ; E dele a famosa frase “N ams ds eno meso PustanetSem mine § loo a com end omsmo inci das polars, Sag snare ple is inferiores, com oe : res, corresponden vermelho eta gad an subst ogi mate tos instints , ‘ores, corresponded i ; 6s nies : lo 20 ultravioleta, pode mas esirituais. O paradoxo & que a8 dus dmensbee oe oF verso. O prin engloba o intelecto io feminino, ou yin, ia nas profundezas do Para nos forne a cer uma imagem de que os an esto unidos e que, portanto, nio en tao aie ven ater i ‘. modelo potenci Na Occonceito de Unus Mundus nos mostra como 61 & um espelho do universo (macrocosmo). eendermos a psique, devemos pensar em duas polari- Para compré inconsciente & 0s opostos dades fundamentais: o sistema consciente—' natureza~espirito, CONSCIENTE, NATUREZA ESPIRITO INCONSCIENTE, nao € 86 cérebro. fi, antes de tudo, um proceso em evo- _'Bsta € gerada a partir da propria ten- \hos, as polaridades, que ird resultar na producdo do imagens, fantasias, enfim, nos simbolos da psique. Cot im lado eo espirito empurrasse para outro. imbolos, que funcionam como verdadeiros © MODELO JUNG! Para representa por exemplo, no in berg emergindo do mar seria apenas a porgio jaz sob as dguas centr unguino, a psgue seria co Centres, lembrando uma eebola. camada mai consciéncia, enquanto as outras, ma profundos do incons leesconta “sistemas dindmicos 1 Varias imagens, Freud ou a imagem de um ice. mo uma peau ha de gel. A ont do iceberg onsciente) da montanba (inconsciente) que sc8sconcnteas (1859 rconscion ras harmoniosamente dindmicas. nee numa esfera complex inconsciente col dos Se een ute Ce dean versonalidade, consciente e inconcint, nid 98008 Se peg rer imag ln eee personalidade encontram expressao. 3 CAO DA CONSCIENCIA OEGC DICAO D i ae a to ou idéia pode ser c \ imagem, emogio, sentiment r eons cient mnos que ei aso ao ego. Na € pss exis o : ie exo, a0 oe er eng (Nios psicooicos,§ 796), 0 eg 6 ator complex, 20 | esto relacionados todos os contetidos da conscién icia sem ser idéntico a el Sendo 0 ponto de referéncia central da consciéncia, to de todas as tentativas de adaptacio em nossas vidas rea da vontade, possuindo um importante papel dentro da econo, ca. Quando usamos as palavras ew ou me, mim, meu, estamos nos refe- {inte 20 ego. Ele é que vai capta,avalar, criticy,raciocina, organiony sentir ou int © significado das varias si ruagdes que a vida traz, de acor- do com o padrio de funcionamento da consciéncia naguele deterfvcks momento, ‘Aexperiéncia do ego apresenta duas bases interliga ©80 corporal, ¢ psiquica, que diz respeito a vontade, 4 centragao e & meméria, 0 ego dispoe de uma certa quantidade de energia, Pela concentra: S40 podemos escolher alguns contetidos e abrir mao de outros ¢. ace 4 energia para modificar processos reflexos ou ins azes de lembrar © que fizemos ontem e planejar o qu amanhi. Isso quer dizer que, para dar um sentido a existéncia, é necess4- rio termédio do ego cada um tem a consciéncia de que existe e o sen- timento de ser idéntico a si mesmo, Essa identidade do ego consigo mes- mo € baseada na consciéncia das ercepcdes do proprio corpo. Muitas das percepcoes cor- orais sé em parte atravessam a fronteira do campo da consciéncia. Agrande maioria permanece como drio, portan- 0, esforco e disposicéo conscientes Para conhecé-las, pressiv, 09 mnsagbes ‘Tente fazer o exercicio seguinte para experimentar coe oes corporais. Pega a outra pessoa ia para voce, pat gs instrugées. Sente-se confortavelmente numa poltrona o cadeira, dei- xe 05 pés ap aos Jbre o chao, solte os braces, fec ¢ os olhos e procure é do, solte sol velaxar. 30 de ‘V4 lentamente soltando 0 peso do compe. buscando a ee de fundar, Nao precisa se esparramar. / A medi aa ete ton ar iar sos estes comeram admin atu je a corpo com a cadeira aumer eo aa nas, cabeca © quads, / Respir (undo algumes ost or tee fe magine que, conform voce soa 0, #9 COP Aouna se mais pesado. / Se voce nao estivet c sepuinds rela to we nao se preocupe. ee sae Ye Woes Sate relaxadas € out a Bae ote reate-es mentalment./ Agra ainda mani SPATE echados tere tnagrar un posigao na cade, Missal ie ‘estao seus bragos, pernas € si ooo I a Prep qe or neces, Regre/Agora, devas Ya abi: Go 08 olhos e procure espreguicar-se © oles niente 6 25 eS yedor. / Levante-se e dé uma vol pelo. ambier a no oo 20 Maindo? Quais estao sendo suas percepcoes corporals? que teve e depois repita yarar suas exPe- ssoa as sensagoes Comente com a outra pes nsagaes qué tee co exercicio com ela. Ao final, voces poderdo trocar @ comp: rigncias. 0 DESENVOLVIMENTO DA CONSCIENCIA jel cia nao € algo ixoe immutvel, mas em desen- transformando ao longo do tempo iva, considerando-se 0 ee ere, Pode-se afirmar que a conscién ‘go sendo possvel availa de mado objetivo, jade historia que tenta compreender, ‘e detalhada descrigao da evolucio da cot temporineo de Junge fundador Para Jung, a consciés volvimento. Ela vem evotuindo e se deve ser vista sempre de torico e cultural no qu € relativizada pela histori uma vez que é parte da real Encontramos uma ciéncia na obra de Erich Neuman, con dda Bscola de Psicologia Analitica de Te da consent, tragand rll suman eae ne tatigios de desenvolvimento que mar c a manidade. : de consciencis f Mormmave a partir do inconsiente ¢ vai st desenv Ges (arquél rendo progressivamente, de acordo com alguns padres ( Se: somente 9 corpo (com os Gras, MUSCUlOS, 0880S, S ‘caram a historia tebro) evolui, mas também a consciéncia, Como se ela fosse um “6rgao” inyisivel que também cresce, desenvolve-se, adoece, necessita de cuidados ¢ transforma-se ao longo de nossas vidas Seguindo as obras de Jung e Neumann, Carl Byington, analista Quanto mais proxima do inconsciente estiver a consciéncia, maior 0 sew grau de indiferenciagao. Nesse caso, a consciéncia funciona “muito pré. das reacdes primérias instintivas de prazer/desprazer” (By1 ON, 100), Durante o desenvolvimento, tanto a consciéncia individual como a coletiva passam por estagios progressivos de diferenciagao do in- consciente, adquirindo uma capacidade cada vez maior de abstragao e de autonomia. Da mesma forma, 0 ego também cresce interagindo com o incons- ciente e com o meio ambiente. No bebezinho, inicialmente, o ego tem uma atitude passiva, Surge dda colisdo entre as necessidades corporais ¢ 0 meio ambiente. Uma vez es- tabelecido como sujeito, na infancia, o ego vai se desenvolvendo a partir de outros choques com 0 mundo interior e exter rr. Aas poucos comeca a ter uma atitude ativa diante do mundo. Ao buscarmos as solugdes para atender a nossas necessidades e realizar nossos desejos, estaremos formnan- do 0 ego e ampliando a consciéncia, O caminho para o crescimento ¢ fei- to a partir dos conflitos, medos e frustragies. A estabilidade do ego € relativa, Por estat sujei as influéneias do __ inconsciente, ele € capaz de reter sua identidade sé até certo ponto, As ve- 2es, 0 ego é assimilado, quer dizer, possuido pelos aspectos inconscientes a personalidade, sendo profundamente alterado por eles. S 0, quando estamos confusos, de cabega ‘cheia” ou “quente” e também quando estamos inspirados. Quem nunca perdeu a cabega, por bem ou por mal, por 6dio ou por paixao? Mas o ego também pode defender-se das influéncias do inconscien- te, Quando optamos conscientemente por excluir algo da consciéncia, li- damos com a supressio. “Nio quero pensar naquilo que aconteceu...” ot “Tenho que estudar; nao da para conversar sobre a viagem nesse momen- to” sio frases que demonstram essa disposigio do ego. No caso da excli- séo inconsciente de algum contetido ou emogio da consciéncia, falamos em Yepressdo. Trata-se de yecanismo de defesa. Aquilo que esquecemos ou reprimimos passa a integrar a Sombra (ver gloss Quando atingimos a idade adulta, o ego pode exercer de modo re nte independente, com auton receber as in st atra- © tajeto da consciécia ao lon da vida poe ex comma re jetéria que o sol percorre em seu. caminho pelo cee 4 pa a comega adescida, Ea desea represent revers de tds as ie lores que ram cletados pela an aid" eA SES 199 ne essa visdo, por vol la sey at ‘ : aa areeerte proud, ae pode resulta em una inverso de valores qu , metandia. aa Pcaeeeann Dizendo que o desenvolvimento se dé do int cio até o fim da vida, Jung tocou em um dos fortes preconeeitos do Ocidente, tido para sua existéncia. No Ori- te, 20 contririo, a figura do ve- 0 simbolo de sabedoria e a ele cabe a trans va. Para Jung, + nif viveria até os 70 ou 80 anos de idade, se essa longevidade nao tivesse sentido para a espécie. ignificado especial e nao pode ser considerado um mero apéndice la- mentavel do amanhecer da existéncia’ (Stevens, 1993: 266). Para que servem a consciéncia e o ego? : facdo a vie tanto A fungao principal da consciéncia € do ego éa adaptagéo a ot basi terior quanto exterior, Viver tende a se tornar mais facil mec ee cana oe se est, Par ene 0 8 balk com alguns instrumentos, tanto de observacao ae ae ‘as solicitagdes da vida, Chamamos tais instrumentos de ceteris ‘gicas. Na prética, nao deixamos de ter problemas, mas aptos para lidar com eles. i des ém da questio adaptativa, o des 0 a 60. ane finalidade a propria existencia, Para compreender 0 ser qu e ai s capazes de c 1s da criagio de significa "4 am de nés, necessitamos da criagio de anita um rumo a nossas vidas. Essa pos ae de rar lo a existéncia é desempenhada pela capa to da consciéncia e do consciéncia. que 0 ego cresce. $ cidade de simbolizar, seria muito di frustracdes, perdas e caréncias do dia-a-dia. viajando de carro numa estrada afastada, vol fome, mas ainda falta muito para chegar e n¢ caminho. Se ela nao for capaz de si trar comida ao chegar a casa, com certeza. sagdo de fome. Quando se deseja algo m alguém, a simbolizagao também desempenha um important pel. Em. eral, antes de partirmos para a acdo a fim de tentar realizar 0 desejo ¢sair sonhando ¢ imaginando o desejo realizado. Para ia da conquista, as vezes ha necessidade de um certo Isso néo seria possivel sem a ajuda da consciéncia e da simbolizaga A reflexdio sobre as caracteristicas de clareza ciente é uma capacidade relativamente nova na hi mem ede sua Psique. Quanto mais para tras nos voltamos, mais arcaico e dependente do consciente veremos que erao funcionamento da conscincia, Em ger * nos dar conta da importincia da consciencia para a humanida. de. Essa percepgao significaria olharmos para nossa propria consciencla, re fletir e nos darmos conta do proprio ato de conscientizacio. Pode-se dizer que tal reflexdio um novo paradigma para 0 homem moderno. Para Jung, a finalidade da vida humana poderia ser vis, fa como 2 propria construgdo da consciéncia, Segundo ele, a consciéneia, Portanto, néo € simplesmente uma espectadora do munde, dde sua criagdo, como se o mundo s6 pudesse existir a0 ser co relletido, Para estudar a consciéncia necessitamos tomar alguma distncia dela, pois s6 podemios observé-ta e descreve-la com o nosso ego, que €0 cea centro, Se o ego estiver muito identificado com os instrumentos de obser. vagio da consciéncia, a avaliagdo se tornard tendenciosa. Vamos estudar ‘um pouco mais a fundo. irecao da mente cons- OS TIPOS PSICOLOGICOS xda maneira de ver € relativa e todo julgamento de um ho- do de antemao pelo seu tipo de personalidade” (Junc, 1975: ico tem a ver com os diferentes modos de fian- ia e com as possiveis atitudes da co em itros € as coisas. cionamento da consciér relagio ao mundo, aos Duas atitudes: extroversao e introversio Se vocé se comporta de maneira confiante em relagéo ao mundo ral, direciona-se primeiro para o que esta fora, situa-se nas coisas e nos outros e, depois, volta-se para voc8. Vocé tende a freqitentar ambientes cheios de gent s idéias wos luga- res, invengGes grandes desempenhos. Mas atenc&o: uma atitude extro- vertida no é necessariamente sindnimo de adaptacao. Se voce ¢ introvertido, sua tendéncia diante das solicitagbes exter- nas € colocar um pé atrés e evitar, num primeira momento, que a emis- sdo de energia seja canalizada diretamente para o objeto. Aparentemente, sua primeira reagio perante as situagdes é de recusa. Entretanto isso nao tem, necessariamente, relagdo com medo ou com um modo de ser reacio- nério. E muito menos com timidez. 0 que ocorre € teresse di ge-se primeiro para dentro, para o mundo subjetivo das experiéncias interiores e, depois, para o relacionamento com os outros e com 0s objetos. Em nossa cultura, sendo as expectativas em geral direcionadas mais falso. Esses termos, introduzidos por Jung, popularizaram-se e, hoje em dia, costumam ser empregados de forma preconceituosa. Os dois modos de funcionamento da consciéncia sao igualmente validos ¢ esto normal- mente presentes em todos nés. 0 que diferencia uma pessoa extrovertida 60 predominio de um tipo de atitude sobre o outro. Todos possuimos uma verdade subjetiva e s6 podemos falar em desadaptacio ou doenca quando uma atitude psicolégica estiver exagera- damente desenvolvida, impedindo o surgimento da correspondente opos- ta. Como durante o crescimento ha a tendéncia de o individuo desen- volver predominantemente uma das duas atitudes, acorrespondente opos- Inrrowrie ta ficaré adormecida no inconscien- se primeiro para 0 sujei te e poderd ser desenvolvida com 0 pois para os objetos tempo. Assim, todo extrovertido & um introvertido introvertido se confronta, um di $n Potencial e todo com a extroversao. Para o equi olhar para dentro, evice-v s tene de vex er quando enserarae ma hg aoe trove introvertdo se dene, 3 vezes, levar ages Ye ae — Em: pes psicogicas, Jung publicou uma exten: thecingclientases, a respeto dessas quests nas diversas fens de en mou 0 cuidado de alertar sobre 0 fato de que sq considerada como a tinica possivel, izagdes € o seu emprego indisci sa pesquisa, reple- isso mesmo, a tipologia n& e tiva de alguém. Ela s6 tem validade se, rados 0 c i podem aj © inconsciente, AS quatro fuuncoes psicoldgicas Cada uma das duas ati mente, a tomar distincia do objeto, O mes Como vimos, as funsées psic: k liza para se orientar, © Pensamento, a sensacao, a intuigdo ¢ © sentimento, Elas so uma espéci ie de ct Taeegae Pontos cardeais da consciéncia, \éritos de Jung ao descrever a tipol Com relagio ao seu modo de operar na consciéncia, as quatro fun- ges de adaptagao opdem-se duas a duas: pensamento x sentimento e ser sacio intuicao. SENTIMENTO INTUI¢KO ~~ SENSACAO PENSAMENTO. 0 pensamento e 0 sentimento sao considerados fungdes de adapta ‘¢do racionais, pois seu funcionamento se dé pela reflexio, seguindo ase buscam aguilo que €razotveleortetoeadaplado, Po parecer estranho, mas sentimento também ¢ uma fango racional, En- quanto pensamento funciona por meio de j igamentes, aoa lor de algo. Por exemplo, - avalia, acrescentando e pesando 0 val li nen: te um cientista diria a seus colegas que “esta sentindo que suas experién- cias esto corretas”. A nao ser que ele seja um tipo sentimento. A sensacio ¢ a intuigio, seep ees e por sua vez, sao fungbes irraci CRs nais, pois operam como man radea pessoa perceber o mundo ea si mesma, Num primelro momento, soa pode mesmo abrir mao da razao e ater-se apenas ao fluxo dos acon- tecimentos. A intuigao, no entender de cepgao por meio do incons- Na linguagem do dia-a-dia, dizemos hando algo”, ou tendo um pressentimen- aque “estamos fareja emonigao. ; . ‘or tim ensagdo apesa de estar Tigada aos fatos, também € uma fangéo iraconal. Consist em wma percep ce sed or intermtio dos 6 {os dos sentidos, Chegando a uma festa, uma pessoa com a sensaca send, efor extrovert, em pouco tempo € cana de egstar 0 mao como as pesos eto vss pecs o po de mina. 2 aes < ve : m, a disposigdo das cadeiras eo espago dispo : thar dura peso introvertida, ea logo poder dr-se conta da impres séo que Ihe causa o ambiente. SENSACAO: diz. que algo existe PENSAMENTO: revela 0 que € esse algo SENTIMENTO: mostra 0 seu valor A idacles Além de adotarmos uma atitude introvertida ou extrovertida no transcorrer do nosso desenvolvimento, tendemos a fazer uso consciente rincipalmente de uma das quatro funcbes psicolégicas, que, com o tem. Po, vai se tornando a funcdo pring E aquela que aparece Com mais freqiiéncia no dia-a-dia, que usamos para resolver problemas € ara nos relacionarmos. Em geral, por meio dela atuamos melhor. O desenvolvimento e a diferenciacao tanto da atitude (extroverséio troversdo) quanto da fungao superior comecam a ocorrer muito cedo, 34 na infancia, Desde pequenos costumamos deixar para 0s outros fazerem as coisas de que n3o nos sentimos capazes e hos sentimos mais seguros. A familia eo mei Ou vocagées, mas, de qualquer forma, a disposigdo para desenvolver na determinada funedo esté presente em nds j4 no nascimento, sendo, Portanto, arquetfpica. Geralmente a fungao p é acompanhada por uma segunda, chamada auxiliar ou secundiria. Se uma delas é racional, a outra seré ir, racional. Se, por exemplo, afungdo principal for o sentimento — uma fun. i Sera uma das outras duas fungGes irracionais — ico — e nunea a correspondente oposta, ou seja, o pen- samento, que, nesse caso, permanecer no inconsciente, Do mesmo modo que as atitudes, as duas fungdes opostas a prin: bal e & auxiliar estardo presentes no inconsciente, podendo ser desenvol. vidas com o tempo. Combinando as duas atitudes ¢ as quatro fungdes, temos, segundo 2 classificacdo de hung, os cito tipos psicol6,gicos basicos: pensarnento ex. trovertido, sentimento ext overtido, sensagao extroverti tuigdo extro- vertida, pensamento introvertido, sentimento introvertido, sensacao introvertida e intuicao introvertida. ides? £ uma pessoa que ro Ou para fora? Considera-se mais ‘Voce se identificou com alguma das duas tende a se vol para de ido ou mais extrovertido’ E com relacao as quatro funcdes psicoldgicas de adaptaco? Jd iden- ficou qual delas & mais presente em seu comportamento? Indique dua, ao se esqueca: uma racional e outra itracional. ide psicologica predominante & extrovertida). © Minha funca a fungio aux °Mi neste mom 'A func&o principal é aquela na qual nos damos melhor e nos senti- mos mais confiantes. Sua correspondente oposta, por estar no inconscien- te, contém uma forte carga emocional e tem muita relagio com nossos pontos cegos, Por isso é denominada funcao inferior ou quarta fungio. Em uma familia, é muito comum observar que as fungdes esto mais ‘ou menos distribufdas, Nos casais também ha uma enorme tendencia de ‘0 parceiros serem Lipos opostos e complementares, o que dificulta o con- fronto com a funca Com 0 tempo, como a atitude correspondente ela aparece projetada na outra pessoa, la, diz ao companheiro: jpensando ein si mesmo. te o conhece, Vamos sair ‘e de ser tao fechado e dé um pouco de ". Ele, introvertido, responde: “Quem fa- icé, que ndo para de falar ¢ passa horas amigos? Pare e reflita um pouco! O ligado o dia Mostra-se to pot mais de casa, viaja descanso para os seus Jou que cu quero ser como vo telefone, conversando com silencio também faz parte da vida. Para que esse Fr todo?”. Muitos dos problemas de convivéncia devem-se as diferengas entre 9s tipos, Se as parceiros néo perceberem o quanto da prépria Sombra ¢ da atitude oposta esté envolvida nas questées cotidianas, as discussOes viram. uma verdadeira torre de Babel. O que ele poderia aprender com ela é exa- tamente o oposto daquilo que ela poderia aprender com el ‘A fungao inferior pode servir de ponte entre a consciéncia eo mundo do inconsciente, ajudando a restaurar 0 equilibrio psfquico, uma vez que, pelo fato de situar-se no inconsciente, tem o poder de trazer & tona aspec- tos da personalidade muito positivos necessarios ao desenvolvimento, Lembrat as situagdes em que freqtientemente nos damos mal, costuma ser tuma maneira eficiente para identificar nossa fungio inferior. Nos contos de fadas, a funcio inferior costuma ser personificada na figura do idiota, do cacula, do louco ou do garoto pobre e enjeitado aue tum dia se torna rei, A utilizacio do adjetivo inferior € pouco adequada, pois se trata de um termo carregado de preconceitos e que nao reflete o que na realidade se pretende expressar, que € 0 carater arcaico, primitivo e lento da quarta fungio em relagio as demais, principalmente a superior, como se pode observar no seguinte exemplo: ‘Un rei que possuia ts fthos,gostava mais dos dois primeiros, enquanto « tereeito ora considerado um idiota. O rei sempre mandava os dois mais faa missle. encontrar o elixir da longa vida, procurar @ nova dB ‘mais bela ou capturar um cassavay contrétio, diante do Geralmente el ap secrete que etna roband ‘0 idiota, montado em seu cave pameaes isos de todos, conquistava a. missio. ee (Won Fras & Hsu, A tipologia de Jung, p.18-9.) Ore: i i Pode ser comparado ao ego identificado com sua funco supe- rior, 0s dois fungi ior. lhos mais velhos com as funges aur wes eo cagula coma E muito import pee any aes econhecer o poder de influéncia da funcao in- Sempre que a superior estiver exageradamente Presente, a inferior, sua correspondente oposta, poderd, ciente, introdu: partir do incons- nse bara tenlar compensar a atitude unilateral da cons- ciéncia, Quando, ao tentar entrar em contato \¢40 inferior, ‘ntar entrar em cot ntato com a fun expe 'mentamos um choque emocional ou ansiedade, 0 procedimento do £80 ("o rei”) € logo procurar se defender e cortar a possibilidade da ponte, Por outro lado, nao é aconsell vel saltar diretamente para a funca0 inferior, 0 que ue seria o mesmo que mergulhar de cabega no inconsciente. Para chegar a ela é recomendavel estivéssemos, por exemplo, no interior de uma flores- ta: nessa ocasiao, muitas vezes ocorre troca de pre- sentes, de mulheres e até de sangue, como garantia de que nio haverd ago do mal. Devemos entao des- cer humildemente, como por meio de uma escada, de uma fundo para outra, fazendo estagios interme- didvios entre as fungdes da consciéncia e o inconsci- ente. Para isso, a terceira fungéo, em geral mais pro- xima da consciéncia que do inconsciente, exiremamente tt Para ertvarem contato com a fungi intro, ar algum tipo de ritual, |, como se Nos aproximando de uma aldeia desconhecida, a ac yerior & , entda a correspon- * Se minha fungao superior € ——_——! pinta laces aur € Ss coepacas ue a ae nsciente € ‘Assim, 0 tipo psicolé- oe r ler o capftulo X do ere ee a eed ge cosas von Franz e James Hillman, sobre a fungao inferior € 0 ser © DESCONHECIDO QUE NOS AFETA if ; . Muito: 4 experiencia do inconscente nascen com a bumaniade tuto 4 itigos hindus, IS ude de Jung, & desde os an sa aie thumanidade sabi a exstncia nas pessoas de aspects descnher tides estranhos que a consciéncia nao é capaz de oe Sea compreender, As culturas orientais, principalmente a hinc sat anuiieg desenvolveram, empregando técnicas de medio, ig carted sis soe para ter aceso as nels mals pounds dapigue. et Kant e Schelling apontaram a existéncia de um lac Send Papa lou a idéia - filésofos, quem melhor formul que. Mas, entre os , eho fr yon Leibniz (1646-17 - ee Rea aeies Carl Gustav Carus, herdeiro ee za, escreveu um ive, Psyche, no qual defend iia de que o- ranecene base da pique. Foia primeira tenttiva ea cis aim licaga vida psfquica. O autor explicagio global para a vi yche autem dour antes dc Freud, atengdo especial aos conhos. & ches sservar a relacdo compensatéria entr i son- 6ria entre a conscién siderando, antes de Jung, os sonhos como restauradores da vida cons- aser Sear wialiat es partir do século XIX que o inconsciente passou mann, baseando- estudado sistematicamente. Em 1869, Eduard von Hartmann, basead 7 na Filosofia da vontade, de Schopenhauer, publi ie eee inconsciente, relatando detalhadamente tudo 0 que havia si a o inconsciente. See cen a aque na obese ue, porano ro et acta do ao ego como centro do campo da consciéncia, € ae 2 ie “ je no € isso é . Como afirmou Jung, “o inconsciente 1 r a econnecida que nos afeta de imediato’ Uystert coninctoni $722) 7 i cido dois tipos f el classificar como desconhecit e ne de nés ou no mundo exterior e que podemos experimentar que esté fora de nés 80. por meio dos sentidos; e a que esti dentro de nés e que experienciamos imediatamente, o inconsciente ou mundo interno, 0 inconsciente comunica-se com a consciéncia de vévias maneiras: or meio dos sonhos, dos mitos, da linguagem poética, da fantasia ¢ das inspiragdes. Muitas pessoas costumam ter visdes e outras sensayaes sobre nafurais ¢ guiam-se na vida por seus sonhos, por intuigdes interiores out to com a natureza. E 0 caso, por exemplo, dos curandeiros, mis. ‘osos, cacadores ¢ pescadores. F de muita gente que vive mes. non, Cidades ¢ nao fala sobre esse tipo de experiéncia com receio, injustificado, de passar por louca. O incon: iente pessoal e 0 coletive Freud teve 0 mérito de ter sido o primeira médico a ver na aborda- em do inconsciente uma possibilidade de tratamento, Antes dele, porém, ainda na Grécia antiga, nos famosos templos de Esculgpio, os sont eang empregados no diagnéstico, e por meio deles se obtinha a cura para vi. "as doencas. Praticava-se o chamado sono de incubacdo: a pessoa pasca, va noite no tempo e tinha um sonho, que Ihe indicava se a doenga teria ou {ar nos sonhos dos pacientes elementos que Ihes permitem conhecer seu ™undo interno e indicagoes relativas ao que eles necessitam para se euran Até 0 inicio do século XX imaginava-se que a mente do individuo, ‘no seu nascimento, seria uma espécie de tabula rasa e seu inconseiente Conteria apenas os impulsos ¢ Pulsdes instin consciente simplesmente como um epifendmeno da consciéncia, um de- pésito de partes da personal lade que poderiam ter-se tornado conscientes Ins foram reprimidas, ou ainda nao tinham alcangado a consciéncia: Pe ra ele, em conseqiiéncia das influéncias do meio, das experiéncias ¢ do aprendizado, a personalidade iria gradualmente se formando ¢ a tons, Ciencia ¢ 0 ego se desenvolvendo. Aquilo que nao se compatibilizacee com os padres morais da sociedade seria excluido por meio da represezo im o inconsciente: [ade aauilo que conheco, mas sobre que ndo estou pensando no memento; * tudo aquilo que esqueci; * tudo o que meus sentidos captam, mas néo ¢ registrado por minha cons- cigncia (percepcdes subliminares); * situagdes menosprezadas durante o dia, conclusées que f lar, criticas ou comentétios pejorativos que nao fiz; * tudo o que involuntariamente sinto, percebo, penso, lembro, desejo ¢ 15 reprimidas e afetos nao permitidos e conteride 05, “maduros”, i em formu- Jung, porém, identificou, além desses aspectos que, segundo ele, formariam 0 nfvel pessoal do inconsciente, um outro nivel mais profun- do, que ele denominou inconsciente coletivo. Para ele, j& nascemos com : somos dotados, desde nascimento, de um repertorio de 30 um poter padroes de respostas e de comportamentos — os arquétipos — que depender de estimulos adequados do meio ambiente para se desenvolver. ente, toda a personalidade ja esté presente no nascimento, como um projeto. Além de conter desejos, memérias e in: ciente est sempre agrupando e reagrupando simbolos ¢ imagens, 1s ¢ fantasias, funcionando como uma matriz, ica normal, Também contém as semen- reprimidos, 0 incons- produ- ivo, sendo a prépria fonte da energia O inconsciente esta sempre psiquica de onde fluern os elementos psfquicos, e nao apenas seu reserva~ torio, Podemos diminuir sua influéncia sobre a consciéncia, por meio dos mecanismos de defesa, apenas de maneira parcial. Normalmente coorde- hada com a consciéncia, a atividade do inconsciente torna-se autonoma & independente quando eclodem as doencas mentais, como as psicoses. © que ocorre com um doente ‘mental que acha que é Napoledo, :mbolo de Napoledo, presente em seu inconsciente, exemplo, é que Napoledo. Ha ura possessao do ego pelo inconsciente. ‘Nosso inconsciente é povoado por varias figuras de santos, her¢ Césares, Napoleses, animais, criaturas sensacionais ¢ deménios terri Quem nunca sonhou com uma dessas figuras? MC. Escher, Popa (1952): simbelos @ imagens consciancia vadiu a consciéncia e tomou conta do ego. 0 ego passa a achar que € = pado ineonsciontes se inva COMPLEMENTAR Jar, passear no fim de semana ou chorar em algum velorio, pois ele io arredava o pé de casa, O motivo citagées cotidiana s. Para encurta suas desculpas, ele le. vantaya as maos para o céu e, como, se cumprisse os des 6 : teve morte scbit isso intrigou meus quinze ates 6 Problema tomou ares epidemic quando o av de um am gou a usar a mesma terminologi Seu caso foi tao grave que, intema, do, prestes a sofrer a cirurgia du. rantea qual faleceu, ele repetia para quem quer que o visitasse: “Prec Sar daqui: ‘a coisa hagunga”, Tomando folego, fazia a pergun- ta obstinada: “E como vai a papela, 422”. Debiltado, cardiaco ediabético, ‘nono” mostrava-se mais preocu, om se re vida eterna. eee Ao que parece ni ém Si damon iguém se safa to parou, 0 con- |, hoje nao fui a gi- istics oflie est saindode carta, olha que 0 banco fecha, e se o tem. Poral me pega? : Parece ébvio mas esquecemos id estas sol ces séo intermi- aveis e nos massacram sempre um Pouco mais. Tudo se passa como se logo ali. nar este imo probleminha A desgraca é que nunca se resol- ve este derradeiro empecilhozinho, Talvez por isso, fildsofos e religio. 80s vem martelando, ha séculos, 0 Berigo de se fear preso nas malas ilo de Jt da desse conformismo e afte ane vida sem sen éum dos sintomas da neurose. vendo longe de si mesmo, 0 sujeito culpa a cidade arande pela sua ansiedade, perme. nnece no trabalho insuportavel “pe. ‘ser 0 lesa", sem grandes reflexes, So, amigo, quando zg se co- mega a comer meio smo se move e por isso no pode ser pode ter comegado pois, de outra maneira, todo o universo, todas as geragdes parariam e jamais poderiam vol- tar a ser movidas a encontrar um ponto de partida para a existéncia. ‘Agora que foi demonstrada a imortalidade daquilo que se move por si mesmo, nao havera qualquer escrdpulo em afirmar que essa é exatamente a esséncia da alma, que ‘o seu carater precisamente este. Com efeito, todos 0s corpos mo vidos por um agente exterior so jnanimados, enquanto 0 corpo mo- vido de dentro € animado, pois que ele € 0 movimento e natureza da alma. O que se move a si mesmo nao pode ser outra coisa senso a alma, de onde se segue necessariamente que a alma é incriada e imortal. YViver por viver tem o seu charme, 4& foi tema de mtsica e cinema, mas pode ser uma experiéncia dolorosa. Principalmente quando a velhice chega e percebe-se que gastamos nosso tempo numa guerva sem cau sa, como um obsoleto vigia de ar- quivo morto. i Cader 2, [A earruagem da alma] A.almaé imortal, pois aquilo que se move a si mesmo é imortal, 20 lo que move algu- rma coisa mas, por sua vez, € tam- em movido por outra, 0 cessar do movimento corresponde ao final da existéncia. Somente aquilo que se move a si mesmo no deisaré de mover-se e, sendo assim, constitu também fonte de movimento pa- ra as outras Ora, um pr inato, pois & a partir de um princt- pio que necessari cexisténcia tudo aquilo que existe, 20 asso que o prinefpio nao provém de coisa algumma, pois, se comegasse aserpartindo de qualquer outra fon- te, no seria principio, Por outro Jado, como nao proveio de uma ge- ago, néo se encontra sujeito 8 cor rupgio, pois éevidente que, uma vez mais poderia gerar-se nele, pois ele € 0 p' e tudo provémnecessariamente dele, ‘Aalma pode se comparay a nao sei que forca ativa & natural que unisse um carro a uma paretha de cavalos alados conduzidos por um cocheiro, Os cavalos dos deuses s80 de boa raga, mas os dos outros seres fo. a nds, somos atrelagem pu- xada por dois cavalos, sendo um belo ¢ bom, de boa raga, ¢ sendo 0 outro precisamente o contri natureza oposta. De onde provém a dificuldade que hd em conduzirmos o nasso préprio carro. 3. [Imaginando i pe uma tipologia proposta ou a expectativa de um tex- to como este? Pra comecar, tem eu, que vim de ld eo estou escrevendo. E que mais? Ser que tem mais? Tem. sop flat das descrigtes dos ferréneos fee : Seer, de ica: A cidade de mais praia! Pram fa ndo tem ta gente, acredi- delicadeza de sentimentos com que se expressavam para nao me ofen- der ea sabia sutileza do Pai Joao de Pai Joao de Omulu me due Nand foi quem deu uma aj. dinha pra Rainha-do-Mar dar esse rOs. allies {homens ganan- jasos do que o para comer Olinda). E fo mesmo, eu estive I inda agorinha e vi. Ago- ra acham que Olinda esta segura e transformaram ela em Patriménio Natural e Cultural da ao encerrar os comé mas explicitava uma profunda captagio da complementaridade ti- oldgica na vida daquele casal Este finalzinho de frase “comple- égica na vida do casal” jé é um toque de um outro universo, 0 da di Fui conversar com Pai Jodo de Omulu, Adelson e Marinaldo. Eles conheceram dona Amara e set Ru Dona Amara —me contaram —, se- indo-a, assim como di . lar-lhe es- latuto de panacéia, desvirtuando-a, ‘nao faz jus 4 sua histéria natural nem ao potencial er rezivel de suas ap s pais da teoria tipolégica fo- Tam a obseraca eo toque de gt ne e C. G. Jung, naturalmente. omo costuma acontecer, o génio Gri. partir da bservagho tv ». Cumpre ca : So vas pre assinalar Jung apenas anotou e expandiu te aumesmo que aqules tr (cenif fundo ds noite da miséria ab bem obsenarat tee ae ae em e do mal, pode surgivalgu- funcionam diferentes uns cee nnhora muito “dada”, amiga de todo ‘mundo, espalhava ecolhia amizades em tomo de si. Seu Rui? Esse nin- ‘guém sabe direito como era: muito amigo de todos, muito generoso, pagando cachaca pra todo mundo, cheio de opinides a respeito de tudo, Ins nunca hand transparece 6 que seiapor dentro dle,nem quan imediato, direto, empfrico, ao alcan- ce da observagao de qualquer un ‘Como era mesmo que, 14 ro Branco, dona Amara se relacio- nnava coma realidade circunstante? ‘Na maior. Pra ela, “dar-se” com as pessoas era natural, flufa como agua e nio assustava, estava toda voltada para fora, para ar como o chafariz da “praca” princi- pal do Amaro Branco. Mais ainda: ajudada pelas leis da necessidade te para o outro, o que tinha para 0 outro, ¢ a isto se amoldava para adaptar-se. senvolvida’”, Isto é 0 mesmo que os ros dizem quando falam em “fun- ‘cao superior sentimento”. Fungéo & um jeito, uma t mente oposta: um olhando para dentro e outro olhando para fora. E seu Rui, com sua cachacinha de cara com essa esfinge tipolégica? Forgado por uma expectativa social de desempenho mas tido, pressi afetiva de sua companheira (e que i icava um desafio), teve de recor- ver & pitucilina para poder desen- tocar 0 que nele era desentocével: aguilo que os sociélogos charam juizos de realidade. Opinides certe ‘ras sobre var 86 sak abstragtio da opinido pessoal. Ou seja: pensamentos. $6 que af, com esse retorcimento todo imposto pela cultura e curtido na cachaca, 0 que ele nao conseguia extroverter era aquilo que Jung chamou de “fungao inferior pensa- mento”. Aquilo que a realidade é, ou parece ser Coisas do Amaro Branco. Brumacoes. |] Para o que pode servir? Nao ser ve pra muita coisa, ndo. S6 para ajudar a ver 0 0 Coisinha pouca. ‘Sedona Amarativesse podido ver que seu Rui nao estava de sacé gem sendo como era, e somente fun- cionava de um jeito diferente do dela, talvez as coisas tivessem sido diferentes. Talver. ndo tivesse ha do necessidade de tanta Pitu. Talvez algum amor brotasse (e dele sobras- se pra mim). E olha que naquele tempo e naquelas circunstan: exam ambos tipo sentimento: s6 que uma era extrovertida e 0 outro, in- trovertido (extrovertendo “a purso” logia se a gente mesmo ndo se dispuser a se abrir para o jei- to diferente do “outro” funcionar? Se a gente for prepotente e quiser que 0 outro funcione do mesmo jei- to que a gente, nem que seja a custa de drogas varias? Pouco serve, pou- co adianta, se a gente néo for pro fundo, Pro fundo profundo do bar- ro do bairro (Amaro Branco, pois ATIVIDADES 1 Pesquise, na histéria da filosofi Preocuparam com a questao do: ‘Inconsciente, Le > bém os pensadores citados no texto, ease e letras de miisica e fil es de alguns dos \cluir tam- \ itude mais extrov de trés mtisicas e trés introvertida, Faca uma li s extrovertida e introvertida ido 0s conceitos dk a le extroversao ¢ introversi interpretar 0 texto complementar “Papelada fatal’ erates 4 Bxercicio de imaginagao dit Sente-se confontavelmer nfortavelmente e relaxe.. Coloque as palmas das maos, em tapando.os, sem pressiona re alguns segundos, até modam. / ie ‘Agora imagine-se entrando nut da. tudo estd escuro, 7 Avs poucoy, surgit.. / Gradualmente ela s¢ toma mais com uma tonalidade vi encontra uma pessoa a E noite, Como a pessoa dar um passeio. / Preste at véem, ouver... ou sentem? ‘espire fundo... lentamente, / sob a desconhoci uma luz comeca a dando na casa, ida para passear | c8s sae da casa p. endo... O que voces 1G20 no que esté a a Ponto do exercicio deve ser feita uma pausa de dez a quinze mi. Tutos, para que o passeio pela imaginagao aconteca, eHieta lentamente, vé voltando. ond voltando, Abra os olhos... se espreguice. "10 proprio corpo... espreguice-se novamente, Procure fazer um desenho ou escrever uiser, troque impressées ou fale de suas acerca do que viu. Depois, se ss sensagdes com os colegas. is de contos de 6 Escolha um escritor brasileiro (Monteiro Lobato, Jorge Amado, Guimaraes Rosa, por exemplo) e analise personagens de suas obras, de acordo com a mesma proposta do exercicio ante ©) QUESTOES 1 Como € 0 modelo junguiano da psique? 2 0 que voce entende por ego e por consciéncia? Quais as principais fun- Bes do ego e da conscigncia? 3 Qual a melhor maneira de detectar a fungao que em uma pessoa atwa como fungao inferior? 4 0 que é inconsciente e como ele se comunica com a consciéncia? 5 Com aajuda de seus colegas ¢ do professor, discuta a fung0 do incons- ciente apresentada no texto “A carruagem da alma” +» Adivinhagdo e sincronicidade, Marie-Louise von Franz. Sao Pau- Marie-Louise von Franz. Sao Paulo, Cultrix, 1996. © Aaalquimia e a imaginagdo ativa, Marie-Louise von Franz, Séo Paulo, Cultrix, 1992. © A tipologia de Jung, Marie-Louise von Franz e James Hillman. Sao Paulo, Cultrix, 1985. © hung, a gente se vé em Olinda, Pedo Ratis. Séo Paulo, Brasilien se, 1986. PARA SABER MAIS | ADANCA _ DAENERGIA lene A mente humana, em suas intermindveis mudancas, € como a dgua que flui de um rio ou a chama de uma lamparina; como um macaco, ela pula o tempo todo sem e Bupa 6 Escolha um escritor brasileiro (Monteiro Lobato, Jorge Amado, Guimaraes Rosa, por exempl personagens de suas obras, de acordo com a mesma proposta do exercicio anterior. QUESTOES 1 Como € 0 modelo junguiano da psique? 2 O que voce entende por ego e por consciéncia? Quais as principais fun- ‘goes lo ego e da consciéncia? 3 Qual a melhor maneira de detectar a fungao que em uma pessoa atua como fungao inferior? 4 0 que é inconsciente e como ele se comunica com a consci 5 Com aajuda de seus colegas e do professor, dis ciente apresentada no texto “A carruagem da alm: \cia? a fungao do incons- * Adivinhacao e sincronicidade, Marie-Louise von Franz. Sao Pau- lo, Paulinas, 1993. * Alquimia, Marie-Louise von Franz. Sao Paulo, Cultrix, 1996. * A alquimia e a imaginacdo ativa, Marie-Louise von Franz. S30 Paulo, Cultrix, 1992. © A tipologia de Jung, Marie-Louise von Franz e James Sao Paulo, Cultrix, 1985. * Jung, a gente se vé em Olinda, Pedro Ratis, So Paulo, Brasilien- se, 1986. = = = a ® a 4 é & ADANCA _ DAENERGIA A mente humana, em suas intermindveis mudancas, 6 como a dgua que flui de um rio ou a chama de uma lamparina; como um macaco, ela pula 0 tempo todo sem cessar. Bupa Tn Ee A NATUREZA DA ENERE PsiQuica (0 mundo dos instintos abrange tanto 0 aspecto fisico como o aspecto psiquico do homem. & precisamente nessa esfera critica da interacdo en- tre corpo e alma que se situa 0 c: ico do psicoterapeuta, A psicoterapia, em grande parte, vai lidar com aquilo que a pessoa faz ou deixa de fazer com seus instintos, 0 instinto diz respeito 8 impulsdo para determinadas atividades e agdes. Tudo 0 que nao passa pela nossa vontade, aquilo que nao € refreado por nenhuma autoridade moral ou de qualquer natureza, é instintivo. 0 instinto seria como um cavalo selvagem livre de freio. Trata-se do apetite em seu estado natural, ou seja, de nossas necessidades corporais, como fome, sede, sono, sexo, e dos estados emacionais, A pessoa impulsiva é aquela que age movida pelos instintos. 0 impulso podera surgir a partir de estimulos internos, como uma forte emo- fo, ou a partir de estimulos externos, como uma frustra- cao, uma situacao de perigo. Se a pessoa estiver sintoniza- da com seus instintos, agira de acordo com a necessidade do momento, Mas isso nem sempre é possi Imagine alguém dentro de um prédio em chamas. O individuo normal tentara manter a calma, buscando tuma safda para se salvar, Seu ego est ligado ao: de sobrevivencia e de fuga, que sua mente racional € ca- paz de canalizar adequada- ‘Aforeae, 20 mesmo tempo, abeleza dosinsitos, mente, permitindo-Ihe uma agao rapida e eficaz. Se se tratar de um individuo neurético, ele tera uma dificuldade maior para obedecer a seus instintos e poderd entrar em pani- co ou ficar paralisado, No caso de entrar em pfnico, podera até langar-se do prédio ou jogar-se sobre as chamas (caso do psicdtico), As simulacdes inamentos para lidar com situagoes de emergéncia visam dotar o in- dividuo de algum controle sobre os impulsos automaticos. De modo geral, todos os processos psiquicos cujas ener tao sob o controle da mente consciente sdo inst fungées de adaptacao da consciéncia, quando afetadas pela energia do in- consciente, adquirem a caracteristica impulsiva dos processos instintivos. Quando perdemos a cabeca ou quando estamos muito cansados, em algu- uagoes de doenca ou de ingestao de drogas, tendemos a reagir mais instintivamente. © conceite de ener; Freud chamou a energia vital de libido, termo originério de libere, do latim, que significa “ter vontade de”, “aquilo que da prazer, desejo, an- sia, saudades”, Para el, libido e energia do instinto sexual séo sindnimas. Seu ponto de vista é mecanico, A energia vital aparece de varias for- mas e em varias situagGes, mas a qualidade dos fendmenos é sempre a mesma: de natureza sexual, Considerando, de acordo com a visio mecanica, que um efeito esta sempre ligado a uma causa, Freud buscava a explicagao das manifestagbes das neuroses sempre nos conilitos sexuais reprimidos do pasado, na infancia. Para libertar a energia vital de uma definicao muito estreita, Jung baseou-se no conceilo de energia da fisica. De infcio, como Freud, ele em- regava 0 termo libido para designé-la, Posteriormente, passou a chamar a energia vital simplesmente de energia psiquica. Assim como calor, luz e eletricidade sio manifestagoes diferentes da energia fisica, fome, sexo e agressividade seriam expressbes variadas da energia psiquica. Jung no concordava em utilizar um tinico impulso es- pecifico — 0 sexual — para definir a energia psfquica. Para ele, a dini- ‘mica sexual € somente uma das instancias particulares na totalidade do campo da psique: Como todos os impulsos e automatismos apresentam o desejo ea compulsdo, ou seja, a impulsividade como caracteristica espcifica, vez que se conhece muita pouco a respeito da natureza dos in nos e de sua dinémica psiquica, |...) seria praticamente impc 0 fato de Jung nao associar a palavra libido especificamente a nenhu- ma definigo sexual nao significa que ele negasse a existéncia do dina mo sexual. Na realidade, conceituar energia pstquica como desejo sexual seria apresentar apenas urna interpretacio, um conceit reduzido, confun- dindo a parte com 0 todo, o fenémeno com sua manifestacio. Para tentar fazer a distingao entre o fendmeno da energia psfquica e as manifestagdes desse fendmeno, Jung baseou-se no conceito de von- tade do fildsofo Arthur Schopenhauer: “Algo inteiramente livre e muito diferente de todas as formas de manifestacao de sua fenomenalidade, que ela assume apenas quando se torna 10s da No dia-a-dia, percebemos suas ‘ique” ou na falta dele, nas explo- dio, vinganca, alegria, tristeza, amor. -as (querer, sentir, intos, desejos, afetos, aten nifestagdes nos sonhos, no nos X, a maioria dos cientistas procurava medir ou interes- sticamente os fendmenos da natureza. Jung, porés sava-se muito mais pela busca de significados da seou sua concepedo de energia em dois princfpios fundamentais: a equivaléncia e a compensagio. O PRINCIPIO DA EQUIVALENCIA pio da equivaléncia, Jung inspirou-se na pri- 1, de Heh Para uma determinada quan- xda com o fim de produzir uma condicao, uma outra de energia surge em algum outro ponto [do sistema)”. Se imaginarmos a psique como um sistema fechado, pode-se afirmar que a energia psfquica esté em fluxo constante de um si da perso- nalidade para outro, do consciente para o inconsciente, e vice-versa. En- tre os dois sistemas ha trocas relativas a valores, que sao a quantidade de ener gia psiquica investida em determinadas caracter{sticas da personal quantidade equival ‘e emocies pode ser estimada por intermédio de nossa funcio senti- mento, que age como um verdadeiro instinto de percepcao das mais sutis flutuacées emocionais. Valorizar uma idéia ou emogio significa que o con- 92 personalidade, O contrério tamhém é valido: se algo é banal, nos diz. pou- 0, the dedicamos pouca energia. ‘Nao valorizarmos conscientemente uma determinada idéia ou emo- ‘¢40 no significa que ela nao iré nos influenciar, Os aspectos da persona lidade que ainda nao esto integrados e, portanto, nio fazem parte da nnsciéncia, surgem no inconsciente e sdo representados por meio das imagens das fantasias e dos sonhos. Uma pessoa de indole agressiva e que consciéncia de sua prépria agressividade pode, por exemplo, so- nhar com um animal feroz, Além do sistema subjetivo de valores, temos objetivo de medidas. Trata-se dos valores morais e estéticos coletivos, generalizada e que s6 indiretamente levam em conta as con- vvezes a ponderacio consciente falha ou acaba se amoldando a \- cias. As vezes, embora odiando uma determinada situago, obrigamo-nos a imaginar casos assim. novas, 0 inconsciente pode espontaneamente at var certas quantidades de energia psiquica e forcar sua entrada na consciéncia, As vvezes, podemos sonhar com coisas completamente estra- has e diferentes. Outras, sonhar com a solugo de um determinado problema. 0 quimico Kekulé, por exem- plo, tentava descobrir a for- mula do ane! de benzeno e, certa noite, sonhou com a imagem de uma serpente en- volada, 0 que o inspirou na descoberta da figura hexa- gonal do c tudava, ‘que surge noincenscient, Assim como a energia do inconsciente para a consci o contrario também ocorre: certas quantidades de energia psfquica podem desaparecer da consciéncia e surgir no inconsciente. £ 0 que acontece na repressao. Imagine que o peixe da ilustracao seja a representacio (imager) de uma determinada quantidade de energia psiquica relativa a um conteGdo: 1uico submerso no inconsciente (representado pelas diuas do lago). O pode ser tanto um contetdo psiquico que foi reprimido — isto 6, fa- parte da consciéncia mas foi, por alguma razio, dela afastado — como algo inteiramente novo surgido do inconsciente. Dependendo da atitude do ego, duas situagdes podem ocorrer. Je produz um sinfoma Pode-se imaginar o inconsciente como um velho bati onde € poss vel guardar coisas que esquecemos ou nao desejamos lembrar e que catdo bonitas e arrumadas, sem nos aborrecer. Mas nao € tio simples assi 0s contetidos reprimidos voltam & consciéneia por bem ou por mal, ma- nifestando-se nos sonhos ou em sintomas. Aquela quantidade de energtia consciente que foi parar no inconsciente, mais cedo ou mais tarde, vern bater & porta da consciéncia, Uma dessas visitas pode se dar pela porta dos fundos, por intermédio dos sintomas fisicos. Nos casos em que o contetido da consciéncia é completamente en- golido pelo inconsciente, como, por exemplo, quando o interesse por de- terminado objeto nao tem oportunidade para se expressar, podemos constatar que logo surgem indfcios de uma al gia que alimentaria o interesse consciente é desviada, tomando um cami- ‘nho que a faz surgir as vezes no corpo, na forma de palpitagao, diarréia, coceira ou intensificagao de sintomas jf existentes. ‘A investigagao de Freud em torno da sexualidade contribuiu muito para a demonstragio do principio da equivaléncia e sua importancia na formagio de : se a pessoa reprime um desejo, pode ter uma forte enxaqueca. A fantasia popular de que sexo reprimido sobe & cabega apare- ce nos estudos de Freud, particularmente quando ele descreve a repres- sio e a maneira como se formam os sintomas. Como a energia psiquica que foi reprimida € necessdria para o de- senvolvimento a ciéncia, A estiver numa atitude muito defensiva, é possfvel que o sonho se dé em for- rma de pesadelo, com a finalidade de tentar romper a atitude de defesa da consciéncia (veja o principio da compensagio mais adiante). 0 contetido nsciente mostra-se ent&o ao ego como algo ameacador. A psique produz um sonhe ou fantasia Antes de chegar a desenvolver sintomas, » @ pessoa costuma ter ou receber outras quando algum contetido desaparece da consciéncia, nao quer dizer que ele deixou de e mas, sim, que perdeu a sua energia consciente. A ener- iquica que desaparece gera um produto inconsciente que apresenta tragos em comum com o contetide desaparecido. Esse prod to i o peixe) por meio do sonho, A energia que estava reprimida no inconsciente passa para a consciéncia (0 peixe é retirado da agua), podendo colocar-se a servigo do ego para o desenvolvi mento ‘Vejamos um exemplo de como a energia psfqui fluir transforma-se em sintoma ou em imagem simbélica. Ni fureza da psique (§ 303-9), Jung relata 0 caso de um jovem oficial sufgo, de 27 anos, que sofria de violentas dores no coracao e no calcanhar esquer- itara outros médicos, tentando esclarecer a causa de seu so- frimento, mas nenhum dos exames clinicos que fizera até entao revelara a origem de tais sintomas. ‘Na entrevista com Jung, 0 oficial relatou um sonho que tivera e que Ihe causara uma sensagio de estranhe eu andava por um campo aberto quando, de repente, pisei numa serpente que me mordeu o calca- nhar. Senti-me como se estivesse envenenado”. ‘Algum tempo antes de surgirem aqueles sintomas, a namorada do rapaz 0 deixara, ficando logo noiva de outro. Ele reagira de maneira arro- gante: nao levou em conta 0 sentimento de ter sido traido, imaginou que nio tinha ficado abalado e pensou em arrumar logo outra namorada. Na verdade, ao perder a namorada e negar a importancia desse fato, 0 rapaz reprimiu a energia da dor e da mégoa, que ressurgiu, via inconsciente, nos sintomas corporais e no sonho. ‘Todos sabemos como a perda de um amor faz doer 0 coragio. No caso do rapaz, a energia psiquica, sem um canal para fluir, recuou mais profun- damente, produzindo uma imagem mitolégica que exprimia um determi- nado tipo de relagao entre homem e mulher, Ele havia se defrontado com a face perigosa do principio feminino, em seu aspecto se- dutor, representado pela ser- pente — o animal que a deusa {sis do antigo Egito colocara no caminho do deus Ra para Ihe morder 0 calcanhar; ou a serpente bi- ca, Lilith, que pode ser interpretada como o lado escuro e sombrio de Eva, Jacob Jordaens, ‘A tontacao (sécUlo XVI: ‘ofemnino em seu aspecto areagador. undo Tyseenameniz, Lui Catan O PRINCIPIO DA COMPENSAGAO ___Narraiz das transformacies que ocorrem nos fendmenos da psique ha um direcionamento da energia psiquica no sentido de se atingir um estado geral de equilibrio entre os sistemas consciente-inconsciente. A sistemas com maior contetido energético para ou- tros de menor contetido, com a quantidade total de energia permanecen- do constante. ique estd, assim, o tempo todo buscando estabelecer temas consciente ¢ inconsciente. A Jung denominou fngao compensatéria, e de auto-regulacao psiquica: a fungio compensatéria do inconsciente relativa a qualquer tendéncia da consciéncia & unilate- ralidade corresponde as funcoes fisiologicas responsive do organismo (homeastase). Amaneira como essa compensacio ocorre depende da atitude do ego em relagdo a um determinado simbolo (contetdo inconsciente). Quanto serd a icos ou psicéticos, ela pode- ¥-se como franca oposigao & atitude consciente. , 2 Salvador Dall, Sonho fe cq) Sasa pole v0 de uma OY aoetna 20 cedorde uma ee. possiblidade do ‘onscientzacio da agressividade om um oF Como exemplificado anteriormente, 0 peixe submerso nas aguas (pé- 93) representa uma determinada quantidade de energia p: foi deslocada da eonscincia para 0 inconsciente, Uma vez que - cia necessita dessa quantidade de energia para se desenvolver, o simbolo peixe retorna do inconsciente para a consciénecia, seja por meio de um so- ‘nho ou de um pesadelo, seja por meio de um sintoma, no caso de a atitu- de egéica ser defensiva (ver ilustragao a pagina 95). : ssa € uma das principais fungSes dos sonhos: a compensacio in consciente de uma atitude consciente ca. A compensagao comporta todos os elementos que podem efetiva e saudavelmente corrigir a unila- teralidade da consciéncia. Mas, para isso, 03 contetidos inconscientes isam ser conscientizados, isto é, integrados a cons idades, produzindo mudanga de comportamento e de A polaridade natureza—espitito Como foi mencionado, é préprio da energia psfquica 0 movimento er um equilibrio entre polaridades — como se hou- mnalidade por parte dela, ao fazer isso. O embate entre ds polaridades 6 vivenciado pelos seres humanos como conflito entre natu- 10, e € dele que surge a auto-regulagao do equilforio psiquico. ‘is se defrontam: de um lado, as gem tal impetuosidade instintiva” (19 - ca buscasse por si mesma sua propria diferenciagio e conhecesse aquilo que a personalidade necessita para se transformar. De acordo com Herdclito, para quem a guerra entre os opostos é 0 pai de todas as coisas, pode-se afirmar que também polaridade contém em si mesma a polaridade oposta, d so interna entre elas o seu dinamis A maior parte da energia psiquica é investida nos varios sistemas funcionais do corpo-mente, servindo para a manutengao do curso regu- lar da vida. Como uma forga espectfica que nao pode ser transformada, € uusada na realizado das atividades que nos mantém tintivas essenciais que operam de acordo com leis biolégicas, tuagdes de fome, sono, sede, sexo. A formacao da cultura Aenergia psiquica que nao é consumida na satisfagio dos instintos pode ser canalizada e empregada na realizago de outras atividades, como, por exemplo, as culturais e es Quanto mais eficazmente satisfa- zemos nossas necessidades biolégicas, mais energia nos sobra para a rea- lizagao cultural e espiritual. Para Freud, a cultura ¢ criada pela atuago de uma instancia de ca- rater nao instintivo, o superego, que canalizaria para as atividades intelec- tuais e espirituais a energia psiquica nao empregada nas fungées biologicas 0 superego € 0 que em cada um diz 0 que é certo e errado. Diferentemente de Freud, Jung no considerava que algo desvin- culado dos instintos biolégicos € que os refrearia, canalizando sua ener- gia para manifestagoes mais elevadas. Para ele, ja existe uma tendéncia de carater inst inerente a propria energia juica, para a espiri- tualizagdo e que a leva a expressar-se em outras formas de atividades nao biol6gicas. Essa tendéncia seria um instinto para a espirituatizacdo. Jung empregava a palavra espérifo nao em seu sentido mé ‘mas para designar uma forca natural fico, porém fo que cria os simbolos € as imagens dos sonhos e fanta- sias, assim como as mani como algo ces culturais. No indiv ntendido comoser_ uma manifestagio do es rior como pensamento intelecto, por exemplo, a imagem de um ontade, meméria, fantasia ov uma PO" Ane A tage ee certa, ide da consciéncia e, ainda, a como algo queespuma ou efervesce” a. um aspecto nao integrado de sua personalidade no incons- (Won Franz, 1992a: 72) ciente. oy Pode-se afirmar que a consciéncia, com raizes profundas no incons- ciente, desenvolve-se buscando a espiritualizagao da energia psiquica, cujo sua mudanga do es- abstrato. Mas atengao: nesse processo energia bioldgica e espiritual se complementam, uma nio excluindo a outra. ate tones Salvador Dall, Metamoriose de Nareso (1937): 08 simbolos sao continuamente ciados, ‘buscando-se um equilfrio de tensdes. PROGRESSAO E REGRESSAO Vimos até agora trés fundamentos para compreender a natureza da com o embate entre o pélo natural (instintivo) e o pélo idade natureza—es- No sistema conscienteinconsciente e na p <- pirito circulam correntes de energia psiquica que se cruzam, com tensdes, os de toda ordem, formando uma verdadeira coreografia. Podem-se imaginar 0s meios ou canais, os espacos de transito do fluxo energético, como avenidas ou pistas lermédio das quais a energia circula. Nessas pistas, a canalizagao da energia é feita em duas rogressio € regressio. Sdo esses os dois movimentos bésicos da iquica. A progressio é 0 movimento da energia psiquica para a frente, 6 0 avango do proceso de adaptacdo psicolégica r -dia ou a continua satisfagao das demandas e exigéncias do meio ambiente mediante uma ati- tude consciente adequadamente dirigida, O processo de adaplacio requer um funcionamento direcionado da conseiéncia, dotado de consisté interna e coeréncia légica. No capitulo 3, ao tratar dos tipos psicolégicos, afirmamos que hi uma fungao superior, a fungao consciente de adaptacio, habitualmente ‘mais desenvolvida, utilizada para progredir e buscar adequago no mun- do. 0 avango no sentido da adaptagdo vai aos poucos dando a nossa nocao de identidade. Mas, sendo essa fungdo direcionada, tudo 0 que nao puder ser expresso via consciéncia seré comunicado por meio da Sombra, com vistas a se manter a integridade da direcSo consciente. A regressio, por outro lado, € 0 recuo temporério da energia psiquica ue, assim procedendo, ativa 05 contetidos inconscientes e traz A tona va~ lores abandonados ou novos aspects da personalidade. Freqiientemente, entre a necessidade de adaptagio externa ¢ a de adaptacio ao mundo inte- rior da psique ocorre o conflito identidade individualidade. Nao se pode dizer, no entanto, que progressio seja melhor que re- Sressdo, Muitas vezes a regressio consiste em voltar atrés a fim de reunir energias para continuar avancando, como, por exemplo, quando uma pes- soa, para conseguir saltar, primeiro agacha-se um pouco a fim de tomar. i Do mesmo modo, nao se deve confundir progressao com desen- volvimento, pois 0 fluxo uo da vida nao significa exclusivamente ferenciagao, Assim, a vida psiquica pode ser tanto progressiva sem evoluco como regressiva sem involugao. A danca da energia psiquica Para explicar os movimentos da energia psf Jung usou uma metéfora: a progresséo pode ser comparada a uma queda d’agua que segue seu curso de uma montanba para o vale. Enquanto durar a progressio, a gua estaré fluindo: as polaridades estaro unidas e coordenadas com o flu- xo dos processos psi gua corres- 101 ponde ao represamento da energia psiquica, que, como a agua num dique, ve aumento de tensio, Acontece ento o conffito, que leva a uma ten- irgem questdes do tipo 07", ‘Presto vestibular ou comeco ‘Se uma das forgas for bem-sucedida em reprimir a outra, pode sur- gir a dissociagdo, que leva 4 uma divisao interna e, dependendo do confli- to, a uma neurose ou até a uma psicose. Felizmente nem sempre essa dissociagao ocorre, pois contamos com a criatividade, inerente & propria psique, para buscar solugées. Em resumo, quando a vida parece nao estar fluindo, a energia psf- ica acunnula-se e a tensio energética entre os opostos aumenta. Com 0 bloqueio, ou conflito, a energia psiquica busca uma safda pela regressio, refluindo para o inconsciente. Se isso nao ocorvesse, o combate entre os opostos persistiria de maneira estéril e a pessoa se sentiria paralisada. ‘Conforme a energia psiquica regride da consciéncia para 0 incons- de processos psiquicos inicialmente in- ia € ativada e comega a se enriquecer mais e mais com associagdes, fazendo aflorar as possibilidades adormecidas e surgir novos cont Desse modo, podem ‘emergir do inconsciente, ativadas pela regressdo, sementes valiosas con- tendo elementos das outras fungdes psicol6gicas da personalidade exclui- das da consciéncia, Iinagine a seguinte situagao: vocé se apaixona por alguém alguma razao, decide viajar para longe. Vocés se afastam. A energia inves- tida em seu objeto de amor de repente ¢ estancada. [sso produz em voce ‘um aumento de tensao: saudades, tristeza, frustraci frimento... Com o bloqueio do fluxo, sua energia psiquica € forcada a uma regressio. Vocé passa a ter sonhos com a pessoa e comeca a escrever poe mas apaixonados, falando do amor e de stua dor. Os amigos gostam dos poemas, vocé continua sonhando e escrevendo. Comega a se dedicar mais intensamente a escrever, transformando-se um dia, de fato, num poeta. Por tuma das coincidéncias da vida (sincronicidade), certo dia sua antiga ama- da depara com seus poemas publicados. A velha chama da paixdo se rea- cende ¢ ela resolve procuré-lo, Ela amadureceu, vocé também, ¢ ambos decidem ficar juntos novamente. Regressao e progressao fazem parte da vida, -correspondendo aos ca- minhos pelos quais a eneriia psiquica circula, Havendo possibilidade de 0s novos contetidas do inconsciente serem confrontados € integrados & consciéncia, os bloqueios sio removidos e a energia psfquica volta a fluir, \do a progressao e dando continuidade ao desenvolvimento. Na prética, observamos que, quando conflitos muito intensos sao resolvides, a pessoa passa a experimentar uma sensacdo de seguranga e de calma que ilmente € abalada, Psicologicamente estabelece-se uma atitude mais firme e duradoura, Portanto, nem sempre os conflitos tém resultados ne- mportam perigo, ansiedade, sofrimento e tristeza, mas tam- dade de transformacao, SIMBOLOS: UMA ENORME USINA Podemos afirmar que todos os fendmenos psiquicos so de nature- za energética e que a psique esté em constante atividade, produzindo sinn- bolos continuamente. Diferente do sinal, que tem um significado fixo, tratando-se de uma abreviagéo convencional de algo conhecido e comumente actito, 0 simbo- € uma expresso indefinida com varios significados, que apontam para algo nao muito conhecido. Imp! (0 ao mistério. Siglas, marcas con de futebol, insignias, brasbes, ‘ou nao transformar. uma imagem serio algo além de seu sig iasdotern umsinay PAYA LM aspecto desconhecido ligado ao nosso in- quepodetomarsoum, consciente, um aspecto mais amplo, que nunca € Sinton. precisa ou completamente explicado. Uma teoria que apresente uma hip6tese, por antecipar a descri¢ao de algo ainda desconheci- do, pode ser considerada um simbolo. E importante lembrar que ficado dos simbolos é proprio de cada pessoa e especifico do momento que ela esta vivendo. Se o significado Pense, por exem bolo da toda. Que # voc’ faz com'esse Imagine também associagoes sig que se podlein fazer com os sim- bbolos do sexo, do fogo, da da cruz ou da luz. gia, associando-se a algo conhecido, entao ele morre, passando a ser mero sinal. Por isso é inadequado inter- pretar de modo genérico os si aparecem nos sonhos, sem co A forga dos Na mitologia de muitos povos acham-se varios exemplos de objetos sagrados e de rit is capazes de atuar como transformadores de energia, isto é, como simbolos; estatuetas de deuses, amuletos, mascaras, fetiches, uum pouco a da figura do io, Que tipo de associacoes voce faz om esse simbolo? ‘Unicom: sinal ou simbolo? Ligar a consciéncia ao inconsciente A palavra simbolo significa, etimologicamente, “aquilo que une”, Ha muito tempo, na Grécia antiga, quando dois amigos se separavam, cada um levava a metade de uma moeda. Ao se reencontrarem, uniam as me- tades para formar outra vez. a moeda, que passava a funcionar como sim- bolo de reconhecimento, representando a amizade e a ligacao entre ambos. Na psicologia, da mesma maneira, 0 simbolo liga as partes do sistema consciente—inconsciente, sendo o elemento principal para com- preender a manefra como ambas se comunicam. Fle atua como um trans- formador da energia psiquica, a qual proporciona uma forma de expresso Os sfmbolos esto em toda parte, Relacionando os elementos da consciéncia e do inconsciente, eles permitem que aquela energia do in- consciente necesséria ao crescimento e desenvolvimento da consciéncia € do ego, que € 0 seu centro, possa desempenhar sua funcio. A atitude do ego que considera um determinado fenémeno como simbolo é denomi- nada atitude simbélica. Trata-se de um ego aberto e disposto a acolher ¢ elaborar os s{mbolos do inconsciente para se desenvolver. Hé pessoas, que valorizam seus sonhos e fantasias e muitas que procuram, inclusive, guiar-se por eles. Os simbolos que exercem esse papel de estruturar a consciéncia e Jigé-la ao inconsciente, nds os encontramos nio s6 nos sonhos, mas tam- bém em nossos relacionamentos, idéias, emogies, sentimentos, em nos 80 corpo, no contato com a natureza e nos rituals, PPetoris douredos da cultura Sinu (Colémbia),c. 1200 1600, representando ‘os cogumelos eagrados usados nas cera rituals, Jung, em Stmbolos da transformacdo (§ 213), descreve o ritual de lade praticado pelos indios wachandis, da Australia: esc am aac neo 20 er do unl eka alguns rb tos pra imitar os genta feinins, Durante uma note intra ee at ca 2 rel ee rca sma sss lange cognac Banas dent to busta: Pull ne: le eta ts {sim in al ford es ma Umea sem sentinoininn ic do tatin ae 1 Nap i gs fade ua aha de estas a transept aged iso gin for moo da Esse ritual representando uma unio sagrada (hierogamia) com a terra também se relaciona com o simbolismo do arado, cuja origem etimolégica vem de aroun, que em grego significa “impregnar”. Veja que interessante: sabendo instintivamente que esse ritual tem conexdo com a nualidade, durante a cerim« bidos de othar ma mesma forma, em algumas tribos americanas, antes de partir paraa guerra, os indios faziam uma roda em volta de uma mulher bor colocava no centro. Aquele que tivesse uma erecio era desqualificado e nao podia partir com os outros guerreiros. © ritual simbélico canaliza a energia psfquica para o ct frutificagdo da terra ou para a concentragio de forcas antes da batalha. Com 6 ritual simbélico, a energia psfquica é transformada em trabalho efetivo. Essa canalizacdo da energia p: para atividades exteriores ex- plica a intima conexao entre trabalho, musica, canto, danga e percussao nas sociedades nao letradas, A miisica e a danga so uma estratégia em- pregada para marcar e organizar firmemente certas idéias ou atividades, fixando-as na consciéncia. A energia psiquica é canalizada para determi- nado tipo de atividade por Como diz 0 fildsofo francés Roger Garaudy (1980: se, pela danga, com 0 movimento e as forgas da natureza para cap! ‘uma necessidade primordial da vida desde o nascimento da agricultura, quando a fixagio ao sol ‘tomaram o conhecimento dos ritm« LEITURA ‘Syd COMPLEMENTAR 1, [A danga c6smical ‘Todas as coisas [...] sio agrega- dos de dtomos que dangam e que, da fisica moderna e, por meio de seus movimentos, pro- semethante Do mesmo modo, as particulas, oequivalente moderno dovelho con- ceito de atom igualmente on- proporcionais . De acordo com a teoria de campo, cada particula efe- tivamente “canta incessantemente sua cangio”, produzindo padrdes varias encarnacdes apa. rece como o rei dos dancarinos. Se- gundoa crenca hindu, todas as vidas so parte de um grande processo rit- mico de criago e destruigio [Eros eTanatos], de morte e renascimento, € a danga de Shiva simboliza esse desdobra em clos intermingves Nas palavras de Ananda Cooma- raswamy, “na noite de Brahman, a Natureza acha-se inerte e nao pode dancar até que Shiva o determine. Ble se ergue de Seu éxtase e, dan- sando, ria que o circunda, Dangando, Ele sustenta seus fenémenos mu formes. Na plenitude do tempo, dan- gando ainda, formas e no contudo, Para os icos modernos, a dan- a de Shiva 6, pois, a danca da ma- téria Assim como na mitologia hindu, trata-se de uma continua danca de criagio e destrui- Gao, envolvendo a totalidade do cos- mo ¢ constituindo a base de toda a existéncia e de todos os fen naturais. Hé centenas dangantes em belissimas esculturas de bronze. Em ‘nossos dias, 0s fisicos uti- conseqiientemente, nao & de se sur- preender que eles também tenham usado a imagem da danga para ex- wr sua intuigao da natureza. Um belo exemplo dessa imagem. de ritmo e danga aparece no li- wo Tibetan journey, de Alexandra la relata seu tre do som”, que seguinte descricio de sua visto da materia: duzem sons. Quando o ritmo da danga se modifica, 0 som que pro- juz também se mo Cada tomo canta incessantemente sua cangao e 0 som, a cada momento, cria formas densas e sutis. A seme- Ihanca entre essa concepcdo ¢ a da fisica moderna torna-se particular. mente notavel quando nos lembra- mos de que o som é uma determinada lizaram a tecnologia mais avangada para retratar os padres da danga césmi- ca. As fotografias das par- ticulas em interagio obti- das pelas cimaras de bo- pelos artistas indianos. A metéfora da danga césmica unifica, assim, a antiga mitologia, a arte religiosa ea fisica moder Na verdade [ também ‘poesia e, con- 2. [0s quatro quartetos] Aho e safiras na lama O eixo sepulto imobilizam. O trémulo fio do sangue canta sob envelhecidas cicatrizes, apaziguando guerras hé muito esquecidas, ‘A danga ao longo da arté a circulagao da linfa remontam no vero nas drvores. ‘Movemo-nos mais acima que se movern tha imaginada ATIVIDADES 1 Entreviste um cientista, por exemplo um fis do que estabelega comparacdes entre os dois métodas de raciocinio lifico: o causal e 0 energético. 2 Entreviste um. lea, um professor de educaga um acupunturista e uma bailarina, procurando entender com vivencia a conexao mente—corpo. e sobre o solo encharcado. Embaixo, ouvimos 0 sabujo sua forma como outrora mas entre os astros irmanados. imével ponto do mundo que gira, Nem s6 carne nem sem e. No imével ponto onde a danca € que se move, amas nem pausa nem movimento, E nao se chame a isso fixidez, pois passado e futuro af se enlagam. Nem ida nem vinda, nem ascens&o nem queda. Exceto por esse ponto, 0 imével pont no haveri apenas danga. 86 posso dizer que estivemos ali, mi ei onde, a, e tudo € 3 Pesquise simbolos que se repetem em livros de arte e mitologia, curar relacioné-lo com fatos e situagdes de sua vida. Escolha uma ima- 108. a o N gem marcante de um sonho e procure desenhé-la ou escrever um poe- bre ela. Mantenha em sua consciéncia, durante alguns dias, aquilo que vocé produziu. Para isso, pendure o papel num local em que possa Jer o poema ou enxergar a imagem. Va re; for fazendo a partir do seu contato com o simbolo, Depoi os colegas. Assista ao filme A guerra do fogo (Jean-Jacques Annaud, 1981) e, pro- cedendo como ao desenvolver a atividade anterior, faca um desenho ou um poema. Depois, troque impressdes com os colegas. Faca um levantamento de alguns ditos populares, dangas e géneros mu- icos de sua regido, além dos habitos e costumes a eles associa- ‘mbolos aparecem predominantement Procure analisar uma partida de futebol (ou de uma competigao d esporte qualquer) com base nos conceitos apresentados no capitulo, Bill Watterson, autor de Calvin e Haroldo, conta que freqientemente se ro. sente paralisado quando comegaa ver outros lados de uma questo. Sua saida para lidar com a tensao causada por seus questionamentos certeza € a idade. Aproveitando a nogao de Heréclito de que a guerra entre que tudo na psique constitui-se di como vocé se sente quando se vé imy todas as coisas, ou a nogao de ides, comente com os calegas lo a questionar determinada (Warenson, Bil. Os dez anos do Calvin @ Haraido, Sito Paulo, Boat Nows, 1996, p.7-24.) 109. vas: © QUESTOES TO que € instinto para voce? Como se dé a conexao entre os instintos ¢ a consciéncia? 2 0 que é energia psiquica? 3 O que sio o princfpio da equivaléncia e principio da compensagao? Exemplifique. 4. Quais sio os dois movimentos bisicos da energia psiquica? Para que ser- iferenga entre sinal e simbolo? Dé exemplos. 6 Vocé tem ligagao especial com algum simbolo? O que ele representa para voce? 7 Utilizando o trecho do poema de T. S. Eliot, discuta com seus colegas a questo do equilibrio na polaridade consciéncia—inconsciente. © As dimensées simbélicas da personalidade, Carlos Byington. Sao Paulo, Atica, 1988, © Mahabarata, S30 Paulo, Cultrix, 1988. PARA SABER MAIS. 110 SONHOS E COMPLEXOS Gémeas sto as portas do sonbo, das quais se diz que uma é de chifre e através dela se da saida fa as verdadeiras sombras; 4 outra, reluzente, primorosamente lavrada em branco marfim, é aquela pela qual as almas enviam & terra os falsos sonbos. ESTA NO!TE EU SONHEI Nos Vedas da India hd o seguinte didlogo entre o rei Janaka e um sabio: verdade, possuindo 0 sol como luz, a pessoa se senta, se movimenta, faz seu trabalho e retomna, Mas, € quando o sol se ple, que luz tetn a pessoa? —Alua 6 entéo, sua luz — disse o sibio—, porque na verdade, possuindo a Tua como luz, a pessoa se senta, se movimenta, faz seu trabalho ¢xe- toma. Ns, quando ool ea ua se eu tm pessoa a —0 fogo é, entio, sua luz — disse ele —, porque na verda © Fogo como luz, a pessoa se senta, se movimenta, faz seu trabalho & retoma. Z Mas, quando o sol se pée, sib ¢a lua se pBe e o fogo se apaga, que luz tema pessoa aqui? —Alfala 6, entdo, sua luz {0 7 a Mas, quando ool se pde,sibio, ea lua se pBe eo fogo se apaga ea fala silenciada, que luz tem pessoa aqui? ——Aalma é, entdo, sua luz [..] porque, na verdade, possuindo aalma como tu, a pessoa se senta, se movimenta, faz ses trabalho e retorna, 0 que éaalma? pessoa nau presente, icundada pelos sete, eta de cone cimento, que é luz do coraga = Quando vai dor prépria luz. tha com o proprio briho, com a (Won: Frawe, Carl Gustav Jung, p. 148.) Pela manha, quando despertamos, ao recordar os sonhos que tive- mos durante a noite, lembramos de nossa prépria luz, de nossa energia traduzida em imagens e emogies. No sonho nao ha tempo e espago como aqueles com que estamos acostumados, Nao existe a continuidade tipica dos contetidos conscientes. 0 passado mistura-se com o presente ¢ o futuro, € encontramos “restos de atividades que se desenvolveram durante o dia. As imagens podem ser contradit6rias, fragmentérias, estranhas. Ha uma combinagao essencial- mente fantastica de idéias. Quanto a forma, na maioria dos sonhos em que se percebe uma es- ‘rutura definida, ha uma espécie de narrativa dramatica— como nos dra- ‘mas classicos da Antiguidade — que pode ser dividida em quatro partes, segundo Marie-Louise von Franz (1992: 77): + fase 1: Hé uma exposicio, indicando a cena onde se passa a ag30, 0s pro- tagonistas e pessoas envolvidas e, freqiientemente, a situaciio inicial do sonhador, e fase 2: Desenvolve-se 0 enredo, apresentando a trama das complicagdes. « fase 3: Ocorre o climax, ou peripéteia, quando acontece algo decisivo ou que muda completamen- te oenredo. G, Jung de Zurique e especialista em latim oa medieval; trabalhou com Jung durante 28 o fase 4: Se existis, tran a ris ic eal ane Ces solucko, 0 resultado ou | Te io cohie a alqunnia a lysis, revelando a si- tuagao final, que é, a0 mesmo tempo, a solucao “visualizada” pelo sonhador. Marie-Louise von Franz Observe, por exempio, este sonho de uma mulher que estava viven- do uma situagio dificil de separagao conjugal: Estou numa casa de praia e vejo uma grande onda gigantesca se aproximar. (Chamo as eviangas para entrarem. Maria ve devagar mas chega a tempo eeu fecho as portas. Entéo, a onda cai sobre nds. Penetra por todas as rachaduras da casa ens cerca, 10 que est na praia e fica imaginando se ele conseguiu escapar. Sei que todos os banhisias esto ‘os, Nao hé como escapar e digo @ mim mesma: “Entao € assim”. Nio sinto ‘um panico real. Como é impossivel escapar, simplesmente € assim que acon- ‘tecem as coisas. Mas, enfio, a gua retro Corremos pela casa, procurando tapar as rachaduras. Hé um furo no sm de muitas rachaduras nas paredes.(..] Ver outra onda, Bla bate 1 de n6s © a0 nosso redor, mas desta ve2 a sala nio é inundada e a cabana néo € levantada e atirada 2o cho, Comegames a correr antes que vvenha a préxima onda. Abro a porta dos fundos fé um velho amigo, a {quer nao via hé anos. Abrago-o com alegria e alvio ..] 0 lugar esta som- brio e a lama forma uma grossa camada sobre a ateia. Vejo a sorte que tivernos ¢ estou muito contente por causa do homem que apareceu para nos rar dal. (Eoncer, Anatomia de psique, p. 87-8.) ‘Vamos identificar nesse sonho as quatro fases descritas anteriormente: muther esta com os filhos numa casa de praia € uma se aproxima, 113 wis vedes apresentam rachaduras, ha um furo no teto; a situia~ 05 bar «climax; Outra onda se aproxima; a mulher e filha tentam tapar os bu- tacos; dessa vez a onda passa por cima da casa; elas comecam a fugirs 0 momento € de muita tensao. ‘almente, ao sair pela porta dos fundos, elas sao salvas por um velho amigo ea situagao se acalma. somo nes- io € tio facil distinguir as fases de um sonho Estou sentado diante de um antigo entalhe que representa a crucifixao. & de metal, mas parcialmente recoberto por uma substancia semelhante 2 ‘a presenga de casticais acima dele, um de cada os e fazer a cera cair sobre o entaihe, bem "que isso tem a ver com o alimento ritual que estou prestes a comer. Acendo os castigais ea cera desce, penetrando na forma vaaia da crucifix Quando esta se acha chein, tro-2 da parede acimade mim e comego a ieia cabeca da imagem, formada pelo preenchimento do er # uma substéncia semelhante ao chumibo — bastante pesada —e comeco a imaginar se posso dige {no se os seres hua nos podern digerir chumbo. Percebo que comem« também comemos prata, Penso, portanto, que & uma coisa que se pode cO- mer sem problemas, mas tenho medo de comer demais. 0 sonho termina ‘quanda fago a releigo. Alinguagem onfrica nos parece, muitas vezes, obscura. Isso porque contrasta com a linguagem da consciéncia, que funciona analisando, se- parando, explicando, esclarecendo. F como se a luz da consciéncia ofuscas- se a mensagem do sonho, “da mesma maneira que ao acendermos uma lampada elétrica, mal enxergamos uma lamparina” (Vox Franz, 1992: Devido a esse contraste, ‘Voce se lembra de algum so- nho recente e emocionante? Procure identificar as quatro fa- ses em seu sonho, prestando atengdo aquela parte que tem * ou fs Bee ine que emeciona, Porque a encontrei ontem” ou eat mais, Essa parte costuma conter nhei com um led, pois ontem & noi- ‘climax do sonho. te assistia um programa sobre o mun- do animal na etc, Lid eee Sonhamos com o professor da éiltima aula do dia anterior, com outras pessoas conhecidas, com herbis da televisio, a pessoa amada, e também com coisas e pessoas completamente desconhecidas, que nunca vimos, Mas, entre tantas pessoas que encontramos e tantas imagens que vimos na rua e na televisio, por que 0 sonho escolhe determinadas figuras e nao outras? C ? Considerando que o sonho nao é meré ° acaso, para que sonhamos? eee Salvador Dall, O sono (1974): 0 sanha a a aqullira psiquico, Por ocasito da exposigao Salvador Dalf no Brasil realizada em 1986, jogo do Museu de Arte Contemporanea de Sio Paulo que a pois, quando dome, o-homem & ris Fr gi sono piel es sue reside no eli paguco Se uma de ise qb, mitment eben o desert, Dae de lado» a de nosso sonho desaparece na dist i A fungio dos sontos Sigmund Freud, o pione oracao do inconsci¢ de andlie dos sonhos, descobru empircamente qu atividade ones no € mero produto do acaso, mas liga-se a determinados problemas e idé nites. Com a publicagao de seu livro Interpretacdo dos sonhos, Fr 1m hovo paradigma na medicina e na Refletindo um p ta de que temos uma percep- ‘cao limitada da realidade. Muitas vezes necessitamos de instrumentos cien- tificos para conhecer melhor as coisas. Por exemplo, nfo somos capazes de enxergar algo muito pequeno ou situado a uma de, Além disso, por mais sofisticados que sejam os telescépios € mi- croscépios de que dispamos, nosso poder de conhecimento consciente é limitado, ,, quanto mais de perto examinamos as ocupagdes ou preocupagées do dia-a-dia, mais vago se torna o significado e a importancia emocional que elas tém para nés. Entretanto, percepgdes, pensamentos e sentimen- tos nao valorizados e nao registrados pela consciéncia, passando desper- cebidos quando estamos despertos, nos sao revelados pelas imagens dos sonhos. O sonho funciona como um regulador do equilibrio psiquico. Pode se afirmar que seu significado principal é estabelecer uma relagio entre a vida consciente e a inconsciente. A imagem onirica € um simbolo que © ego do sonhador aos aspectos nao perce! les com os guais ele ndo tomou contato quando desperto. Assim como nosso corpo reage a infecgses, manifestando, por exem: o, uma febre, as fungbes psiquicas também reagem a distirbios e peri- ‘g0s por meio dos sonhos. Sabe-se hoje que, se uma pessoa for impedida de sonhar, ela adoece. Podemos nao nos lembrar do sonho, mas todos nés sempre sonhamos. Num perfodo de mais ou menos oito horas de sono, ha até cinco fa- ses nas quais a pessoa sonha, Correspondem a fase de sono REM (rapid ent, “movimento répido dos olhos mor. Se for acordada nessa situacio, a pessoa poderd relatar um sonho. Contendo o complemento inconsciente da consciéncia, isto é, 0 material que a situagio consciente constelou no inconsciente, 0: podem exercer uma grande influéncia sobre a vida mental cons: dluzindo alteragies de humor. Quem jé no passou um dia inteiro do ou chateado, apés sonhar com algo desagradavel, ou, ao contrario, acordou com muita energia, depois de um sonho maravilhoso? E nio é horrivel quando somos acordados na methor parte do sonho? A volta do desejo reprimide De acordo com Freud, se 0 psicoterapeuta encorajar o sonhador a ymentar as imagens de seus sonhos sem a preocupacéo de julgar as as- sociagdes que faz, 0 motivo inconsciente de seus desejos reprimidos aca- 1 ba por “se entregar”, Esse motivo apareceria disfarcado no sonho. Por tris do contetido manifesto da imagem onirica exi Freud desenvolveu a em, da.a deixar sar tudo o que the viesse & m ‘ou vergonhoso que Ihe parecesse. C ia sexual significavam a mesma coisa, todos os contetidos onfricos apre- sentariam um matia sexual: se 0 sonho apresentasse a imagem de algum objeto pontiagud arcia-chuva, este seria inter entos como uma “porta batendo ritmicamen- 'Ss0a, deitada no diva, era inst por mais absurdo, esquisito © resultado de contetidos psiquicos antecedentes. dan co MO Alscordava de Freud e também via 0 sonho em relagao & vida consciente. Para ele, “nds sonhamos com nossas juesties - dades” (Junc, 1984: Q ita kes o sonho disfarea algo, Para ele, o s festagao natural, sendo 3 methor expressdo de si mesmo. Como simbolos da psique, 0s sonhos lariam por sie nao pretenderiam significar “outra” coisa. Se, por exem- plo, sonho com um leéo, o ledo é, antes de tudo, um leo, Nao um ledo Senérico, mas aquele lego. Interpreti-lo como forca, realeza animal, agres swvidade arrogancia, ambigao, inveja ou desejo sexual vai depender de va- ris fal ortante nos relacionarmos com o simbolo como ele 6, pois 0 jue produziu a seqiiéncia de imagens oniricas, mesmo que fragmentada, nao colocou determinadas imagens juntas aleatoriamente Existe uma intencionalidade. Nada na psique acontece por acaso, Ante. cipando o futuro desenvolvimento da personalidade, 0 sonho indica de maneira simbélica para onde esté se dirigindo a energia psiquica. Eo que Jung denominou fieneao rospectiva dos sonhos. A funcdo compensatéria ‘Segundo Jung, os sfmbolos que surgem no sonho contém o comple- € tém por objetivo a compensagao da consciente encarrega-se de registrar e fazer aflorar 0 que a consciéncia deixou passar despercebido. A esse procedimento Jung denominou funeao “balancear compensatéria, do latim compensare, que significa “iguala Um jovem estudante de teologia, envolvido numa crise de f, rela- tou a Jung 0 seguinte sonho: Vejo-me como o pupilo de um mago branco vestido de negro. Apés ins- leterminado ponto, o mago branco me indicou a neces: ‘meu aprendizado com 0 mago negro, Este, entdo, surge vestido de branco e me declara que havia encontrado as chaves do pa mas precisava da sabedoria do mago branco para poder utilizé-las. (usc, Os arquétipas ¢ 0 inconsciente coletivo, § 398). Jung interpretou esse sonho como contendo o problema dos opos- tos, que na filosofia taofsta encontrou uma soluggo muito diversa da a que se costuma dar no Ocidente. Em contraste com a visio c taofsmo relativizou o bem e 0 mal, considerando-os como forgas, yin € yang. As duas figuras do sonho representam imagens do inconsciente co- letivo que correspondem & natureza impessoal do problema religioso que ‘opbe o bem ao mal. Por meio do sonho o inconsciente estaria alertando: “Othe melhor! Um lado necessita do outro. O lado bom contém a semen- te do mal, ¢ 0 lado ruim contém a ‘A maneira como a compensagio funciona nfo € tinica: depende de cada situagao e de como o individuo encara e lida com seus problemas. Como disse Jung (Psicologia e alguimia, § 29), “a mascara do incons- ciente nao é rigida... reflete a face que the vol jade the fere um cardter ameacador, amal Existem trés maneiras de um sonho exercer a funcio compensatéria, estas tém a ver com a atitude consciente do individuo em relagao a sua si- tuagio de vida. Qt aatitude consciente é muito unilateral, ou seja, muito radi a compensagio costuma ser mais evidente. Nesse caso, ocorre uma franca oposicao a atitude consciente, surgindo os pesadelos ou sintomas. O inconsciente, entio, toma o partido do lado oposto —aquele que foi re- primido —, revestindo os personagens do sonho com caracteristicas gativas ¢ “repudiando” o sonhador de maneira dolorosa, (Como no caso de uma paciente de Jung, aristocratica e arrogante, que sonhou com mu- Iheres de pescadores, todas sujas, e prostitutas bebadas; ou de um rapaz extremamente mimado e ligado a mie, que tinha sonhos em que ela apa- recia como uma bruxa ou um deménio que o perseguia. © Sea consciéncia estiver tendo uma atitude mais moderada nas si lacdes da vida, ocorrem nos sonhos modificagdes sutis, Caso a conscincia no registre a mensagem do sonho, este pode repetir-se, alertando o sonha- dor. S80 os sonhos recorrentes, « Sea atitude consciente for adequada, a compensagio pode até coincidir com ela e enfatizar as tendéncias e contetidos da consciéncia, Nesse caso, 6s sonhos produziriam um reforco da atitude consciente. Quande o cia Todo simbolo que se transforma em memsria ou pensamento deixa de ser simbolo ¢ passa a fazer parte da consciéncia, Isto é, a carga afetiva ligada a imagem ¢ integrada & consciéncia, produzindo um efeito transfor- mador. Dizemos que o simbolo foi assimilado. Por outro lado, quando se reduz apressadamente 0 -ado de um sonho, interpretando-o de for- ma simplista, corre-se o risco de que ele nada acrescente a vida da pessoa. Eventualmente o sonho pode também alertar-nos sobre o perigo re- presentado por nossas atitudes na vida real. Uma senhora bastante auto- ritdria, que tinha um estilo de vida muito acima de suas possibilidades, Procurou Jung porque estava tendo sonhos muito desagradaveis. Como ela insistia em no admi ficado desses sonhos, as imagens foram se tornando cada vez mais ameacadoras. Caminhadas que ela costumava fa- zer sozinha num bosque, onde se entregava as suas fantasias, apareciam nos sonhos como uma situago ameagadora, alertando-a para 0 perigo. Mas, indiferente aos “avisos" de seus sonhos, ela continuou a passear so- zzinha por esse bosque. Certa vez, ocorreu uma sincronicidade; durante um de seus passeios, foi atacada por um manfaco sexual. Por sorte, ela pide ser socorrida por algumas pessoas que por ali passavam € ouviram seus Britos (Juwc, 1992: 50). Tanto ha quem subestima o valor de um sonho, como quem su- pervaloriza sua anélise em detrimento da vida real. Uma pessoa pode ficar fascinada pelas imagens de seus sonhos e achar que elas € que irao dar con- tade sua s ta ou prediz o futuro. Isso nao pode ser tomado como regra. A interp) ‘¢a0 corveta de um sonho depende sempre de deve ser vista e analisada considerando-se especificamente o sonhador e seu contexto de vida. Acreditando que o inconsciente sempre sabe mais que 0 consciente, podemos nos enganar. E se deixarmos que os sonhos nos in- diquem as decisdes a tomar, podemos nos desapontar, pois as vezes eles sao triviais e desprovidos de sentido para o ego. As decisdes cabem ao ego, que, para tomé-las, pode recorrer as imagens ontricas, mas como um elemen- mnhos, em geral, nfo exercem influén- bterraneamente no inconsciente e nao tem efeito imediato. Entretanto, podemos aumentar seu feito se os compreendermos. Durante um trabalho de psicoterapia profun- da € realizada a elaboracao simbélica dos contetidos e das emogGes desper- tadas pelo sonho, Como diz o dictum alquimico, “o que a natureza deixa imperfeito é aperfeigoado pela arte’ Os grandes sonhos ‘Como vimos, a compensacao visa geralmente ao estabelecimento de um balango psicolégico normal, funcionando como uma espécie de auto- regulador do sistema psfquiico, Mas seu papel nao € somente promover uma correcio na consciéncia. As vezes, ocorrem sonhos extremamente mar- cantes, que acabam tendo um profundo efeito transformador na persona- de. Para Jung, so momentos nos quais as leis universais do destino humano irrompem sobre os propésitos, expectativas e opinides da consci- éncia pessoal. Tais sonhos costumam ocorrer durante as fases criticas: an- tes da puberdade e na adolescéncia, na metade da vida e perto da morte. Santa Perpétua, no ano de 203, antes de ser martirizada na arena de Cartago, teve o seguinte sonho: Vi uma escada de bronze, de tamanho miraculoso, que alcancava o céu & era tBo estreita que s6 uma pessoa de cada vez podia subir por ela. Em ambos 0s lados da escada, havia todo tipo de implementos de ferro — espa- das, langas idados ou aqueles que ndo se mantivessem eretos enquanto subiam eram feitos em pedagos ali ficavam, dependurados. Abaixo da escada, um gigantesco dra- iio, & espera daqueles que subiam, os assustava, pondo-os em Situro subiu antes de mim |] e, a0 atingir 0 topo da escada, voltou-se para ‘mim ¢ disse: "Perpétua, estou te segurando, mas nao deixe que o dragio te rmorda”. E eu respo fo retitou lentamente sua cabeca da parte inferior da escada, esse medo de mim e eu pisei nele, como se estivesse pisando 0 «, sentado. rdenhava primeiro degrau da escada, e ating topo. Vi um vas fem seu centro, um alto homem grisalho, em roupas de € diss a im’. Ao som dessa invocagio acordei tive consciéncia de ainda estar comendo algo doce que nfo seio que era, imediatamente essa visio ao meu irmio e compreendemos que «la significava a paixdo vindoura. A partir daquele momento, passamos a nd0 ‘mais depositar esperangas neste mundo, #8, op. cit, p. 155-6.) Jung fazia uma distingdo entre esse 8 € 08 do dia-a-dia, comparando-os a diferenca que os elgonis da Africa central véem entre os equenos sonhos, do homem comum, e os grandes sonhos, ou grandes Vis6es, do pajé ou do curandeiro, aqueles de importincia coletiva, conta~ dos para toda a tribo. Pequenos sonhos so aqueles fragmentos noturnos de fantasia provenientes do campo da experincia pessoal ou subjetiva ¢ cujo significad se As ocorréncias do dia-a-dia e as fluluagdes do ba- ino. Os chamados grandes sonhos provém das carma- nconsciente, o inconsciente coletivo, que contém imagens mitol encontradas mental da humanidade. Segundo Jung, eles seriam estagdes na rota do processo de indi iduacao. Ciente de sua importancia coletiva, 0 sonhador, em geral, sente-se impe- lido a conta-los aos outros. ___ Antigamente os sonhos tinham um papel social. Em Atenas, na Grécia antiga, o poeta Séfocles sonhou com um homem que roubara um vaso de ouro do templo de Héracles e o escondera num determinado gar. A prine{pio, ele no deu muita atengao ao sonho; mas, com sua repe- ticdo por mais duas vezes, achou que talvez os deuses estivessem querendo the comunicar algo importante. Entdo, foi ao aerépago (senado) e contou seu sonho recorrente, Uma busca foi realizada, 0 ladrao foi achado e 0 vaso recuperado (Junc, 1984: 5), das mais profund: © ESTADO ORIGINAL E A CRENCA EM ESPIRITOS Se a consciéncia estiver muito préxima do inconseiente, seu fun- mento estard sujeito a uma influéncia maior deste, pois o ego —cen- tro da consciéncia — tera dificuldade para estabelecer a diferenca entre sujeito e ol funcionar da mente da crianga pequena, podendo ocorrer também com os artistas quando estao criando. Em algumas pessoas, essa identidade en- tre sujeito e objeto pode tornar-se um obstaculo & adaptagao, como € 0 caso dos psicéticos e dos adultos em fuséo com 0 ambiente. Jung entendia que nas mentes de funcionamento arcaico (ver ex- plicagao a p. 135), a imagem dos parentes ¢ inconscientemente projeta- da, Quando eles morrem, a projecdo continua a exercer influéncia, comportando-se como um espirito independente que retorna nos sonhos durante a noite. Quanto mais inconscientes de nossas projegdes estiver- mos, maior serd o nGimero de “espiritos” ou émagos (ver glossario) que nos visitarao, pois trata-se de uma composigao de elementos psiquicos deri- vados de nés mesmos. Daf nascem as superstigGes e os preconceitos. UMA PARTE MINHA NO OUTRO Dizemos que ocorreu uma projegdo quando um contetido incons- ciente surge no exterior, num objeto ou numa pessoa qualquer. Segundo Freud, projetamos somente os desejos e os impulsos reprimidos; jé para Jung, qualquer contetido inconsciente pode ser projetado involuntaria- mente sobre um objeto externo. Devido & projecio, quase sempre acreditamos que 0 outro € como © vemos, inconscientes de que nas relagdes pessoais cria-se uma imagem que apenas em parte corresponde aquilo que ele € de fato. Vemos nos ou- tros caracterfsticas de comportamento que so nossas, boas e mas, € que nao percebemos em nés mesmos. Tendemos a considerar que o mundo é aquilo que vemos, do mesmo modo que, ingenuamente, supomos serem a pessoas 0 que imaginamos que elas sao. Assim, a projecao transforma mundo numa réplica da face desconhecida de cada um, 0 que gera de- sentendimentos continuos entre pessoas e grupos. Quantas daquelas eriticas que costumamos fazer ndo dizem res- peito, na verdade, muito mais a nossos prdprios defeitos do que as ue criticamos? PMpode ser desconfortante, mas tente fazer uma lista de algumas das caracteristicas que vocé detesia em. uma pessoa préxima (pai, mae, irmao, irma, namorado, namorada). Escolha meia duzia de caracteris- ticas, Depo, relia um pouco eresponda sinceramente: voce nunca se flagrou nessas atitudes que abomina Mas lembre:se de que nao projetamos apenas nossos defeitos. Mui- tas vezes projetamos também nossas qualidades. Faca o mesmo exer- Cicio de reflexdo com relacdo a alguém que voce idolatra. Seré que voc’ nao possui as qualidades que costuma observar e invejar nos outros? 6 & possivel evitar confusdo se reconhecermos como projecdes de nossas proprias caracteristicas de personalidade os defeitos ou as quali- dades que tio facilmente enxergamos nos outros. {Um bom exemplo de Projecao é a paixio. Ela quase sempre ¢ 0 resultado de uma projecao gi- gantesca feita sobre uma ideologia ou uma pessoa, a quem se endeusa ou se idolatra. Quando acaba, aparece uma grande discrepancia entre a visio que se tinha do outro e aquilo que ele realmente 6, COMPLEXOS: A PEDRA NO NOSSO SAPATO Vocé ja deve ter ouvido alguém dizer “fulano € complexado” ou “aquele sujeito tem complexo de inferioridade (ou de superioridade)”. Ul- timamente as livrarias propagaram alguns novos complexos: de Peter Pan, ‘o menino que nao queria crescer; de Cassandra, a mulher intuitiva mas in- capaz de se fazer acreditar, etc, Essa palavrinha complexo, que passou para nossa linguagem do dia-a-dia, foi introduzida por Jung para definir deter- minados temas emocionais que, nao conscientizados, nos atrapalham, e muito, 0 interesse de Jung pelo estudo dos complexos nasceu de um acon- tecimento curioso. Certa vez, um colega contou-the sobre uma experién- cia que tivera durante uma longa viagem de trem pela Russia, Embora desconhecesse o alfabeto cirflico (russo), ele comecou a divagar em torno dos antincios que avistava nas estagdes por onde passava. Praticando, voluntariamente, uma livre associacao, entrou num estado de devaneio intermediério entre o sono e a vigilia, no qual imaginava toda espécie de significados para aquelas palavras. Uma idéia foi levando a outra e, co- mo se estivesse tendo um sonho, embora acordado, muitas lembrancas antigas comecaram a emergir. Algumas situagées desconfor- tantes, havia tempo esquecidas, voltaram atona. Contetidos que ele conseguira apagar tinham, Para sua surpresa, retornado, Tal relato inspirou Jung, que, nessa época, trabathando como assistente de Bleuler na ica psiquidtrica de Burghdlli, se tornado um perito na realizagao de testes de associa- ‘Gao com palaveas. Testes de associacao com palavras. Jung realizava os testes de associa- ao com palavras (publicados no vo- fume 2 de suas Obras completas, sob a titulo Estudos experimentais) com 0 ito de pesquisar a estrutura psico- logica da esquizofrenia. Nesses testes, opaciente devia associar a primeira pa- lavra que Ihe ocorresse a algumas pa- lavras-estimulo que o pesquisador ia apresentando. Registrava-se o tempo que a pessoa demorava para. respon- der € observanrse as repeticoes ¢ fa- as nas respostas. 123

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