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Lições sumárias de

Direito Constitucional Moçambicano

Por: Dr. António Salomão Chipanga, Mestrado em Ciências Jurídicas.

TEMA: INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DE LACUNAS DAS


NORMAS CONSTITUCIONAIS

POPULAÇÃO ALVO: Estudantes do 1.º ano do Curso de Direito na


disciplina de Direito Constitucional

A interpretação das normas constitucionais não é uma


actividade ou exercício técnico-jurídico de uma natureza
diferente da que se opera noutras áreas de direito, não
obstante as regras e princípios consagrados na Constituição
de um Estado constituírem padrão de conduta juridicamente
vinculante e não meras directivas de um diploma legal.

As regras constantes do artigo 9.° do Código Civil, relativas


a interpretação da lei, podem considerar-se
substancialmente constitucionais, embora não tenham
formalmente valor e dignidade constitucional, pois nenhuma
outra norma da ordem jurídica as repugna.

A Constituição é uma Lei Fundamental do Estado que foi


emanada pelo poder constituinte com vista a tornar-se
modelo/padrão de conduta dos sujeitos da norma no
Estado.

A realização da Constituição significa tornar eficaz as


normas constitucionais que a consubstancia, cabendo, em
particular, aos órgãos do Estado e comunidade política, em
geral, aplicar e fazer aplicar as normas constitucionais.

Dr. António Salomão Chipanga, Assistente Universitário da Faculdade de Direito da 1


UEM e do Instituto Superior de Ciência e Tecnologias de Moçambique (ISCTEM) –
Disciplina de Ciência Política, Direito Constitucional e Direitos Fundamentais, 2010
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A aplicação de qualquer norma jurídica pressupõe
compreender, investigar a norma constitucional, realizando
desse modo um exercício de interpretação constitucional
que tem em vista determinar o sentido da norma
constitucional, de modo a obter a regra de direito que é o
seu espírito, que se deve aplicar no caso concreto, quer
dizer, com a interpretação o intérprete atribui um significado
a um ou vários símbolos linguísticos com objectivo de extrair
uma regra normativa de direito com a qual irá aplicar num
dado problema constitucional.

Interpretar a Constituição é ainda realizar a Constituição, no


sentido de que materializamos as suas disposições
normativas, um vez entendido o seu conteúdo intelectual, ou
seja, o seu espírito.

Toda a actividade interpretativa das normas constitucionais


implica um processo que parte do texto da norma
constitucional para uma norma concreta - norma jurídica, da
qual se obtém a norma de decisão, que visa aplicar a norma
constitucional num caso jurídico-constitucional concreto, isto
é, o Direito revelado pelas fontes jurídicas para resolver
aquele problema prático normativo-constitucional.

A interpretação não é uma mera actividade de juristas,


advogados ou de aplicador das normas constitucionais, -
legislador, administração e tribunais.

É uma tarefa que consiste num fenómeno de procura e


transmissão instantânea do sentido da norma ou do seu
conteúdo intelectual, por mais simples que seja, e constitui
condição “sine qua non” para extrair da norma, o espírito
que a disposição normativa encobre.

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Trata-se de um exercício técnico-jurídico por meio do qual o
intérprete faz a construção de uma norma jurídica, isto é,
atribuí ao enunciado da disposição constitucional –
formulação da norma, o seu sentido ou significado que
encerra.

A interpretação das normas constitucionais não é um dado


prévio, em que antes de culminar os procedimentos
técnicos-jurídicos, o intérprete apresenta a norma de
decisão para a solução do caso jurídico constitucional.

Na interpretação das normas jurídicas deve-se ter em conta


os seguintes postulados:

a) A norma de decisão, isto é, o sentido ou espírito da


norma constitucional deve ser justo e ter sido obtido
por via da adopção de um método (procedimento)
racional e controlável;
b) O sentido ou espírito da norma constitucional deve
ter um fundamento racional e controlável.

A interpretação destina-se à conformação da vida pela


norma.

Por se tratar de aplicação da norma jurídica e a finalidade


visar a consonância da vida a conduta permitida, importa
que a determinação do seu sentido seja feita mediante
métodos de interpretação e técnicas reconhecidas e
inequívocas, baseados em determinados critérios ou
medidas que se pretendem que sejam objectivos,
transparentes e científicos, desenvolvidos pela doutrina e
pela jurisprudência, com base em critérios ou premissas
(filosóficas, metodológicas, epistemológicas, embora
diferentes mas são complementares.
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Não é nossa intenção, nesta aula, discutirmos a
problemática dos métodos de interpretação das normas
constitucionais na perspectiva doutrinal.

Pretendemos tão somente, apresentar o conhecimento que


se tem sobre a matéria relativa a interpretação das normas
constitucionais.

Métodos de Interpretação da Constituição

1. método jurídico ou hermenêutico

Este método consiste em considerar a Constituição


como sendo igual a todo e qualquer lei da ordem
jurídica. Assim, as técnicas-jurídicas de interpretação
das normas constitucionais são as mesmas que se
aplicam na interpretação das leis ordinárias, que ao
serem utilizados conjuntamente, permitem
desvendar o verdadeiro sentido e alcance da norma
constitucional, com recurso ao

i. elemento literal1, gramatical, (isto é, o texto,


a letra da norma constitucional);
ii. elemento racional2 ou teleológico (isto é,
espírito da lei);
1
Com este elemento busca-se o sentido da regra jurídico constitucional consoante ele resulta do próprio
enunciado linguístico da fonte, omitindo quaisquer outros factores. Na falta de outros elementos que
induzem à escolha de um outro sentido, menos imediato do texto, opta-se em princípio por aquele sentido
que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado técnico jurídico, natural das expressões
verbais utilizados pelo legislador constituinte.
2
Trata-sedo elemento pelo qual se obtém a razão de ser da norma constitucional (ratio legis), no fim visado
pelo legislador constituinte ao emanar referida norma. Neste fim visado importa conhecer as circunstâncias
que envolveram o momento em que a norma foi emanada (políticas, sociais, económicas, morais, etc.), isto
é, que factores conjunturais, político-económicos motivaram a decisão legislativa (occasio legis). Daqui
saber-se-á quais eram os interesses que se pretendiam protelar com a norma, o que irá permitir o
esclarecimento da ratio legis, que por sua vez revelar-nos-á a valoração ou ponderação dos interesses
visados pela norma.
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iii. elemento sistemático3;
iv. elemento histórico;
v. elemento genético.

2. método tópico-problemático

Neste método a interpretação parte das seguintes


premissas:

i. Carácter prático da interpretação


constitucional;
ii. Carácter aberto, fragmentário ou
indeterminado da lei constitucional;
iii. Preferência pela discussão do problema em
virtude de abertura das normas
constitucionais.

Este método toma o problema concreto como a questão ou


a razão de ser da interpretação e privilegia o processo
aberto de argumentação entre os vários participantes,
fazendo com que o sentido resultante da interpretação da
norma constitucional seja aquela que se adapta ou adequa
ao problema concreto, ou seja, adopta-se o sentido que se
mostra ser mais conveniente para o problema jurídico-
constitucional.

3. método hermenêutico-concretizador

É o método que toma o problema como ponto de


orientação e assenta no pressuposto do primado do texto
constitucional em face do problema e não como a razão
de ser da interpretação, isto é, a primazia do problema
3
Com este elemento o intérprete tem de considerar o conjunto de outras disposições normativas que forma
a constituição e sobretudo as disposições que regulam a mesma matéria.
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perante a norma, como consideram os defensores do
método tópico-problema.

Para os defensores deste método a interpretação da


norma constitucional inicia-se pela pré-compreensão do
seu sentido através do intérprete, que para o efeito deve:

i. efectuar uma pré-compreensão;


ii. considerar o contexto ou a situação em que se
aplica a norma;
iii. a relação entre o texto e o contexto.

4. método científico-espiritual ou método


valorativo, sociológico

Este método baseia-se no reconhecimento de que na


interpretação das normas constitucionais há que ter em
conta:

i. as bases de valoração, ou seja, a ordem de


valores, sistema de valores subjacentes ao
texto constitucional;
ii. o sentido e a realidade da constituição como
elemento do processo de integração.

Neste método entende-se que a interpretação visa


compreender o sentido e a realidade do quadro jurídico
constitucional, o que conduzirá o intérprete à articulação
da Lei constitucional com a integração espiritual real da
comunidade, tendo em conta os seus valores e a
realidade do Estado.

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5. A metódica jurídica normativo-estruturante

Para este método os postulados são os seguintes:


i. A metódica jurídica tem como tarefa
investigar as várias funções de realização do
direito constitucional;
ii. A metódica jurídica pretende-se ligada à
resolução de problemas práticos;
iii. A metódica deve preocupar-se com a
estrutura da norma e do texto normativo, com
sentido de normatividade e de processo de
concretização, com a conexão da concretização
normativa e com as funções jurídicos-práticas;
iv. Aplicação da teoria hermenêutica da norma
jurídica que arranca da não identidade entre a
norma e texto normativo;
v. O texto é apenas a ordem ou comando
jurídico na doutrina tradicional;
vi. A norma não abrange apenas o texto, mas
um domínio normativo;
vii. A concretização normativa deve considerar e
trabalhar com o elemento literal da doutrina e o
elemento de concretização resultante da
investigação do referente normativo.

A Constituição é uma lei e como tal requer do aplicador a


devida interpretação.

A interpretação do texto constitucional é uma actividade de


reconhecida importância na ordem jurídica, mas, ao mesmo
tempo, abraça-se com várias dificuldades.

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É sabido que o exercício de interpretação é que nos permite
transitar para a leitura política, ideológica ou da empírica
para uma leitura jurídica do texto constitucional.

É a partir da interpretação do texto constitucional que o


aplicador tem a regra ou o sentido da norma jurídica, a que
chamaremos de espírito da lei.

A interpretação do texto constitucional ganha maior ímpeto e


torna-se decisivo nos sistemas jurídicos onde a fiscalização
da constitucionalidade, sobretudo a fiscalização jurisdicional
é maior.

Porquanto,

O juízo que se faz sobre a norma depende do prévio


exercício de interpretação que culmina com a fixação do
sentido da regra constitucional que deve ser aplicado.

A interpretação das normas de Direito Constitucional sofre


vários factores de perturbação, desde logo:

 Variedade de normas constitucionais quanto ao


objecto sobre o qual incidem e quanto a eficácia, isto
é, a possibilidade ou não de aplicação a curto, médio e
longo prazo, matéria vista nas páginas 238 e seguintes
do Manual do Direito Constitucional, Tomo II, de Jorge
Miranda, relativas a classificação de disposições
constitucionais;

 A incompleição ou indeterminação de muitas delas ou


da sua linguagem;

 A proximidade dos factos políticos;


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 A influência ineliminável da pré compreensão de cada
intérprete;

 Os diferentes critérios por que se movem os órgãos


políticos, administrativos e os jurisdicionais e as
atitudes dos seus titulares;

 A origem compromissora de algumas Constituições.

Os intérpretes das normas jurídicas de nível constitucional


ao procederem a interpretação do texto constitucional
devem agir de tal forma que o sentido da norma esteja em
conformidade com os preceitos e princípios jurídicos que
lhes correspondem.

Assim, na sua interpretação,

 Têm de olhar para a realidade constitucional vigente,


ou seja, tomar a realidade jurídica como sujeita ao
influxo da norma e não como mera realidade de facto;

 Tem de racionalizar sem formalizar;

 Tem de estar atenta aos valores sem dissolver a lei


constitucional no subjectivismo ou na emoção política;

 Tem de se fazer mediante a circulação norma –


realidade constitucional – valor.

Partindo do pressuposto de que a Constituição exerce uma


função integradora na ordem jurídica, impõe-se que na
interpretação a função racionalizadora esteja presente na
actividade de procura do sentido da norma.
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Outro princípio que se deve ter em linha de conta na
interpretação é de que tem de ser objectivista e evolutiva,
por forma a assegurar a coerência e a subsistência do
ordenamento jurídico.

ALGUMAS REGRAS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO DAS


NORMAS CONSTITUCIONAIS

1. Critério cronológico Consiste em procurar o


sentido da norma constitucional tendo em conta a
ordem da sua emanação;
2. Critério hierárquico;
Consiste na prevalência do direito Estadual sobre o
regime do direito local.
3. Critério de competência.
Prevalece a norma da competência especializada
sobre a competência geral.
4. Prevalência da norma de enquadramento ou de
base sobre a norma de execução ou
complementaridade.

As directrizes que se reputam de maior importância na


interpretação podem ser consubstancia nos seguintes
princípios de interpretação da Constituição:

1. Unidade da Constituição

A constituição deve ser aprendida, como um todo, na busca


de uma unidade e harmonia de sentido.

É nisto que consiste o recurso ao elemento sistemático na


interpretação das leis. Com o elemento sistemático, o
intérprete procura as recíprocas implicações de preceitos e
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princípios em que aqueles fins se traduzem, situá-los, e
defini-los na sua inter-relacionação, com vista a chegar a
uma idónea síntese globalizante, que seja credível e dotada
de força jurídica necessária.

Na interpretação da Constituição deve se evitar


contradições entre as suas normas.

A Constituição é um todo e, por isso, deve ser considerado


na sua globalidade e a procurar-se sempre a sua harmonia
onde se acha haver espaços de tensão entre as suas
normas. As normas constitucionais não são isoladas ou
dispersas, mas sim integradas num sistema interno unitário
de normas e princípios.

Cada uma das disposições constitucionais está integrado


noutro e assenta no valor e dignidade constitucional, cujo
sentido exprime-se pela força normativa da norma
constitucional.

2. Concordância prática ou harmonização

Este princípio assente num critério de proporcionalidade e


está intimamente ligado aos princípios da unidade e do
efeito integrador.

É um princípio que impõe a coordenação e combinação dos


bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício de
uns a favor de outros.

Por conseguinte, neste critério está subjacente a conciliação


e a hierarquização dos valores inerentes aos princípios
constitucionais e o exercício visa sanar situações ou

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fenómenos de contradições de princípios muitas vezes
presentes nas Constituições compromissoras.

Esta directiva tem sido utilizado nos direitos fundamentais


dos cidadãos (colisão entre direitos fundamentais ou entre
direitos fundamentais e bens jurídicos constitucionalmente
protegidos).

É um princípio que exige sempre ponderação em vários


sentidos, nem sempre livre de carga politica.

Vejamos os artigos 15, n.º 1, 35, 36, 147, n.º


2, al. a) e c), e artigo 23 e seguintes e ainda
o preâmbulo, da C.R.M.

As contradições são muitas vezes superadas mediante:

 Redução adequada do respectivo alcance e


âmbito;

 Cedência de parte a parte;

 Preferência ou prioridade, na efectivação, de


certos princípios frente aos restantes;

 Coordenação ou subordinação.

3. Determinação ou densificação dos chamados


conceitos indeterminados.

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Os chamados conceitos indeterminados têm de ser
entendidos sempre na perspectiva dos princípios, valores e
interesses constitucionalmente relevantes.

O legislador não obstante possuir uma certa margem de


conformação, mas ele não pode transfigurar o conceito, de
modo a que cubra dimensões manifestamente diferentes
daquelas que caracterizam a sua intenção jurídico-
normativa, sucedendo o mesmo em relação ao intérprete.

4. Acolhimento de conceitos pré-constitucionais ou


exógenos

Trata-se de conceitos vindos de outros ramos ou sectores


de direito ou mesmo extra-jurídicos, como seja de outras
ciências sociais ou exactas.

Tais conceitos são por vezes acolhidos quando se pretende


normar uma situação cuja a regra deve incorporar o
conceito sob pena de a regra impor outra conduta e não a
que se pretende.
Vide artigo 66 e 87, da CRM

Os conceitos com valor e dignidade constitucional têm de


ser entendidos em conexão com os demais e analisados
tendo em conta o seu significado original e o sentido que
pode ter resultante da sua colocação sistemática, na
Constituição.

5. Efeito integrador

A Constituição deve produzir efeitos que permite a


integração da ordem jurídica: Na resolução dos
problemas jurídicos-constitucionais deve dar-se primazia
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aos critérios ou pontos de vista que favorecem a
integração política e social e o reforço da unidade política.

6. Máxima eficiência ou interpretação efectiva

A norma constitucional tem que ter uma função útil no


ordenamento.

Deste modo, ninguém pode dar a uma norma jurídica do


nível constitucional uma interpretação que lhe retire ou
diminua a razão de ser.

Uma norma constitucional tem de ser atribuído o sentido


que mais eficácia lhe corresponde, isto é, deve possuir o
máximo de capacidade de regulamentação.

Vide artigo 15, n.º 1 da CRM

7. Carácter aberto das normas programáticas

O carácter aberto das normas constitucionais


programáticas4 ou das normas não exequíveis por si
mesmas5, que desempenham o seu papel próprio, por um
lado, incorporando precisos objectivos e valores, e, por
outro lado, propiciando ao legislador ordinário uma
margem maior ou menor de concretização e de variação

consoante as conjunturas e as opções políticas, devem


ser tidas em conta na interpretação;

Vide artigo 142, da CRM


4
São aquelas que se dirigem para certos fins e a mudanças não só do ordenanemto jurídico mas também
das estruturas sociais ou da realidade constitucional, implicam a verificação pelo legislador ordinário, no
exercício de um verdadeiro poder descricionário, da possibilidade ou não de as concretizar.
5
São aquelas que carecem de normas legislativas que as tornem plenamente aplicáveis.
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8. Interpretação explícita ou implícita da norma
constitucional

Na interpretação das normas deve se ter em conta que


não só se deve aprender como sentido da norma o que
se mostra explícito como também o que implicitamente
resulta da norma.

Assim, a eficácia implícita da norma deve ser conjugada


com a eficácia, implícita, ou explícita de outros comandos
normativos, pois há casos em que em relação aos
órgãos, é frequente afirmar que o poder ora exercido está
implícito na sua competência.
A interpretação de normas gerais e de conceitos
indeterminados coloca questões complexas que exigem
do intérprete um exercício que o leva a encontrar nos
vários sentidos reais possíveis aquele que melhor se
adequa ao pensamento do legislador e ao caso concreto.

Neste exercício releva o facto de o intérprete, além de


apreender o sentido real da norma constitucional, pode
ainda a partir dessa norma e do seu conteúdo explícito
tentar descobrir ou inferir as regras que nela se
encontram implícitas, facto que se traduz numa actividade
denominada por “inferência lógica de regras implícitas”.

9. Actualidade das normas constitucionais

Na interpretação das normas da constituição deve se ter


em linha de conta que está se perante normas da
constituição actual e não como norma de uma
Constituição antiga ou futura, cuja execução não vincula o
poder, o legislador ou o cidadão.
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Vide artigo 20, 208, 210 da
CRM de 1990

10. O modo como são aplicadas na ordem


jurídica

Na interpretação das normas da constituição é legitimo


reflectir sobre como são aplicadas as normas. Se é por
via das leis ordinárias ou por via das decisões judiciais.

É importante notar que a lei ordinária deve ser


interpretada conforme a Constituição e não o inverso.

Vide artigo 169, da CRM

11. Justeza ou conformidade funcional

Significa que no processo de interpretação os intérpretes


devem chegar a um resultado nos termos do qual o
sentido da norma não é atentatório aos princípios e
organização dos órgãos do Estado, nem a sua
organização.

Quer dizer, o intérprete não pode de forma alguma alterar


a repartição de funções constitucionalmente consagradas.

12. Força normativa da constituição

A Constituição é uma norma jurídica com força normativa


superior as demais leis.

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Na solução dos problemas jurídicos constitucionais deve
dar-se prevalência aos pontos de vista que, contribuem
para a eficácia óptima da lei fundamental.
Vide artigo 2, n.º 4 da CRM

LIMITES DA INTERPRETAÇÃO

13. A interpretação autêntica da Constituição

Por interpretação autêntica entende-se, aquela


interpretação feita pelo mesmo órgão que emanou a
norma que se procede a sua interpretação. O sentido de
uma lei é fixado autenticamente por outra lei de igual
valor jurídico.

Em conformidade com esta noção a interpretação, das


normas Constitucionais apenas podem ser feitas através
de normas emanadas pelo legislador constituinte.

Por conseguinte, a interpretação autêntica de uma norma


da Constituição só poderá ser feita quando uma nova lei
constitucional, através de um processo de revisão
constitucional fixado, vier esclarecer o sentido e alcance
verdadeiro do preceito constitucional em causa.

Com esta regra fica afastada a possibilidade de uma norma


ordinária proceder a interpretação da Constituição, por
carecer de força jurídica Constitucional

Os procedimentos legislativos da
revisão constitucional constam dos
artigos 291 e segs. da CRM
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14. Interpretação conforme à Constituição

A interpretação de uma norma jurídica de valor e


dignidade Constitucional nunca deve ser contrária à
própria CONSTITUIÇÃO. É o corolário do princípio da
Unidade das normas constitucionais.

Trata-se e um princípio de controlo que visa assegurar a


constitucionalidade da interpretação.

É uma técnica que segundo ensinamentos do Prof. Jorge


Miranda, não consiste então tanto em escolher entre
vários sentidos possíveis e normas de qualquer preceito o
que seja mais conforme com a Constituição quanto em
discernir no limite – na fronteira da inconstitucionalidade –
um sentido que, embora não aparente ou não decorrente
de outros elementos de interpretação, é o sentido
necessário e o que se torna possível por virtude da força
conformadora da Lei Fundamental. Um sentido que esteja
em conformidade com a Constituição, ou seja, a que se
considera como a melhor orientada para a Constituição.
Para este efeito, recorre-se a várias vias, desde a
interpretação extensiva6 ou restritiva7 à redução do que
se mostra inconstitucional no preceito ou no acto.

Ainda sobre as lições do Prof. Jorge Miranda, a


interpretação conforme a Constituição implica, uma
posição activa e quase criadora do controlo constitucional
6
Ocorre quando o intérprete chega à conclusão de que a letra da lei fica aquém do espírito da norma,
portanto, a formulação peca por defeito, isto é, diz menos do que devia. Assim, alarga-se o texto dando-
lhe um alcance que seja conforme ao pensamento do legislador, fazendo corresponder a letra da lei ao
espírito da norma.
7
Ocorre quando o intérprete chega à conclusão de que o legislador adoptou uma formulação que atraiçou o
seu pensamento, pois a letra da lei diz mais do que devia. Neste caso, o intérprete restinge o textoem
termos de o tornar conforme ao pensamento do legislador.
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e de relativa autonomia das entidades que a promovem
em face dos órgãos legislativos.

15. As lacunas da Constituição e a sua integração

Não é possível que o legislador constituinte possa prever


e regular tudo que deva ser matéria da Lei Fundamental e
até podemos afirmar que nunca foi essa a intenção do
legislador constituinte.

Há vários exemplos que podemos citar para mostrar que


não é possível prever ou regular tudo:
 Costume constitucional praeter legem;
 Declaração Universal dos Direitos humanos;
 Direito Internacional;
 Outras regras de direito interno.

Não existe uma plenitude da ordem constitucional, como


não há uma plenitude da ordem jurídica em geral.

Daí, que nas normas constitucionais conhece-se lacunas


– intencionais e não intencionais, técnicas e teleológicas,
originárias ou supervenientes e omissões. Por vezes as
lacunas são deixadas à decisão política ou à
discricionariedade do legislador ordinário.

As lacunas poderão reduzir-se ou ser transitórias e


depender de circunstâncias em evolução, mas parecem
inevitáveis.

As lacunas são situações jurídicas relevantes verificadas


pelo intérprete e pelos órgãos que se ocupam da
aplicação do Direito, mas não previstas, vide artigo 8.º e
10.º do Código Civil, enquanto que as omissões são
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situações também verificadas pelo intérprete e aplicador
do Direito, previstas mas não reguladas e que só podem
ser declaradas especificamente pelos órgãos de
fiscalização da constitucionalidade, que determinam a
inconstitucionalidade por omissão.

As lacunas são diferentes das omissões.

As omissões legislativas reportam-se a situações


previstas, mas que falta, no programa ordenador global
da Constituição, as estatuíções adequadas a um imediata
exequibilidade.
A integração de lacunas constitucionais consiste na
determinação da regra constitucional correspondente
para aplicação ao caso concreto e é tarefa do intérprete e
dos órgãos da aplicação do Direito, enquanto que a
integração de omissões legislativas traduz-se na
emanação de uma norma constitucional pelo legislador
constituinte.

A matéria que se segue é sobre o horizonte temporal e


espacial das normas constitucionais.

16. Aplicação das normas constitucionais no


tempo

Em regra as normas constitucionais aplicam-se em


todo o território do Estado, abrangendo toda a
superfície terrestre, a zona marítima e o espaço aéreo
delimitado pelas fronteiras nacionais, incide sobre todo
o sistema jurídico, sobre as normas, actos, poder e
comunidade política.

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Os valores e critérios subjacentes nas normas
constitucionais actuam sobre o Estado em toda a sua
plenitude, no plano interno e externo.

Na aplicação das normas constitucionais como em


qualquer outra norma de direito, ocorre o fenómeno de
superveniência das normas constitucionais, que se
traduzem no princípio segundo o qual a “lei nova
revoga a lei antiga” – ou seja, a fonte nova revoga a
antiga, requer os devidos cuidados, pois há muitas
dificuldades para a aplicação deste princípio, sobretudo
quando se trata de normas constitucionais novas ou de
modificação constitucional.

Uma nova Constituição, traz consigo um conjunto de


situações que se devem considerar para a aplicação
imediata deste princípio que acabamos de enunciar,
que se podem resumir da seguinte maneira:

a) A acção da nova constituição sobre a antiga pode


ser de revogação global ou em certos casos de
caducidade;

b) A acção das normas constitucionais novas


(provenientes de modificação constitucional)
sobre as normas anteriores implicam a
revogação;

c) A acção de normas constitucionais novas sobre


as normas ordinárias anteriores desconformes,
implicam a caducidade por
inconstitucionalidade superveniente.

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d) A acção de Constituição nova sobre normas
ordinárias anteriores não desconformes com ela,
origina a Novação.

Além de se verificar a inconstitucionalidade


superveniente, novação, revogação ou caducidade,
conforme acabamos de apreciar, podem ainda ocorrer:

1. Subsistência de normas constitucionais


anteriores, aí teremos recepção material
2. Subsistência de normas ordinárias contrárias às
normas da nova lei constitucional, teremos o
fenómeno de constitucionalização e recepção
material;

Subsistência de normas constitucionais anteriores,


com a força de normas de direito ordinário –
desconstitucionalização.
Em cada momento e em cada Estado só pode
prevalecer uma única Constituição formal e material,
daí que uma Constituição nova revoga a Constituição
anterior.

O legislador constituinte quando delibera pelo acto


constituinte substitui uma Constituição por outra, a
partir da anterior. Em geral a nova Constituição faz
uma revogação global e não uma revogação norma por
norma, de uma forma individualizada.

Nos caso de revolução a Constituição é revogada pelo


Direito revolucionário decorrentes dos acontecimentos
revolucionários que devem ser entendidos como tendo
produzido uma revogação global.

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Só em algumas circunstâncias que normas
constitucionais anteriores perduram na constância da
nova Constituição, a título secundário, quando não
ofendem os princípios políticos, jurídicos e filosóficos
da nova Constituição – trata-se do fenómeno da
recepção material, cujos normas a que se referem

cessarão de vigorar com o decurso do tempo por


caducidade ou revogação consequente.

Em outros casos certas normas da Constituição


anterior permanecem na vigência da nova Constituição
assumindo uma nova categoria a de norma de direito
ordinário. Assim, temos o fenómeno de
desconstitucionalização.

A nova Constituição resulta da novação do direito


ordinário interno anterior e traduz uma mudança de
fundamento de validade de todas as normas quanto ao
título e sua força jurídica.
A novação do direito a que vimos falando apresenta-
nos três corolários principiais:

a) os princípios gerais de todos os ramos do Direito


passam a ser os que constem da nova
Constituição;

b) as normas legais e regulamentares vigentes à


data da entrada em vigor da nova Constituição
têm de ser reinterpretadas em face desta e
apenas subsistem se conformes com as suas
normas e os seus princípios;

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c) as normas anteriores contrárias à Constituição
não podem subsistir

17. Aplicação das normas constitucionais no


espaço.

A constituição material e formal aplica-se em todo o


território do Estado, independentemente da forma
adoptada pelo Estado.

A Constituição aplica-se no espaço territorial da jurisdição


do Estado no plano interno e externo, para os Estados
que tenham territórios a si vinculados juridicamente fora
do espaço físico delimitado pelas fronteiras, sem prejuízo
da existência de algum instrumento legal de força jurídica
constitucional permitida pela Constituição federal.

Texto de apoio preparado e compilado por

Dr. António Chipanga, professor Assistente na disciplina


de Ciência Política e Direito Constitucional.

Fontes:

a) Jorge Miranda, Manual de Direito


Constitucional, Tomo II, 3.ª edição, Coimbra
Editora, 1996, página 253 e seguintes;
b) J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e
Teoria da Constituição, 3.ª edição,
Reimpressão, Almedina, Coimbra, 1999, página
1121 e seguintes.

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