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UM DOS poemas mais famosos do poeta romano Horácio é a ode 1.11. Nela, dirigindo-se a
uma personagem feminina, Leucônoe, o poeta lhe diz que não procure adivinhar o futuro:
A frase “carpe diem” tornou-se um aforismo epicurista e um tema poético a que inúmeros
poetas recorrem. No Brasil, por exemplo, Gregório de Matos, imitando um famoso poema de
Góngora, diz, em soneto dedicado a uma “discreta e formosíssima Maria“:
O poeta Mário Faustino escreveu o seguinte belíssimo soneto chamado “Carpe Diem“:
Mas Horácio, em outra ode igualmente famosa, a 3.30, afirma que suas Odes sobreviverão às
milenàrias pirâmides:
Se ambos forem bons, então, ao ler o primeiro, concordamos inteiramente com ele; ao ler o
segundo, é com este que concordamos inteiramente, sem deixar de continuar a concordar
com o primeiro. Ambos podem ser profundamente verdadeiros ou reveladores. Um poema é
capaz de contradizer a si próprio e ser uma obra-prima: ele pode até ter que se contradizer,
como o “Odeio e Amo” (“Odi et amo”), de Catulo, para vir a ser uma obra-prima.
De todo modo, o poeta Haroldo de Campos escreveu um magnífico poema, intitulado “Horácio
Contra Horácio”, que diz:
Não só, portanto, aos poetas é lícito contradizerem-se uns aos outros ou a si próprios, tanto
em diferentes poemas quanto no mesmo poema, como tais contradições podem constituir o
motivo de um poema.
Observo, porém, que a ode 1.11 pode também ser lida de modo que não necessariamente
contradiga a ode 3.30. Digamos que a concepção de poesia subjacente à ode 3.30 seja que,
dado que o grande poema vale por si, ele é, em princípio, indiferente às contingências do
tempo. Sendo assim, não se concebe um tempo em que tal poema venha a caducar.
E merecem existir agora, seja quando for agora: seja quando for que alguém diga ou pense:
“agora”. É desse modo que, precisamente ao celebrar “o instante a ruína a desmemória”, o
poema se faz eterno agora. Nesse sentido, apreciá-lo é colher o dia: “carpere diem”.
*Artigo do poeta Antônio Cicero foi originalmente publicado 6 de fevereiro de 2010, na coluna
do autora na “Ilustrada”, da Folha de São Paulo. Está disponível no blog Acontecimentos.
Quinto Horácio Flaco (latim: Quintus Horatius Flaccus – 65 a.C.-8 a.C.). Poeta lírico, satírico e
filósofo latino. Horácio nasceu em Venúsia, Itália, no ano 65 a. C. Filho de um escravo liberto
que exercia a função de cobrador de impostos, fez seus estudos em Roma onde foi aluno de
Lucio Orbílio Pupilo. Aperfeiçoou seus estudos literários em Atenas.
Estabeleceu-se em Roma como escriba de questores. Foi amigo do poeta Virgílio, que o
apresentou a Caio Mecenas que o levou para integrar os círculos literários, tornando-se o
primeiro literato profissional romano. Cultivou diversos gêneros literários principalmente a
ode, em que utilizou os moldes gregos. Procurou sempre imprimir um cunho nacional às suas
produções.
Seu primeiro livro conhecido foi “Sátiras” (35 a.C.). Sua obra prima, são os três livros de
poemas líricos, “Odes” (23 a.C.), complementados por um quarto volume escrito em 13 a.C.
Gozou de grande prestígio junto ao imperador Augusto e para ele compôs “Carmem
Saeculare” (20 a.C.), um hino epistolar de caráter litúrgico dedicado a Apolo e Diana. Sua
poesia escrita em forma de sentença teve muitas delas transformadas em provérbios. Faleceu
em Roma, Itália, no ano 8 a.C.