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Márcia CANÇADO2
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
RESUMO
Através de um vasto levantamento de verbos do português brasileiro, fizemos uma análise
detalhada do prefixo re- com ideia de repetição, a fim de delimitarmos o seu funcionamento.
Mostramos que a ocorrência desse prefixo não é restrita por classes verbais específicas, como
afirmam alguns autores, mas que ele ocorre preferencialmente com verbos que denotam o
aspecto lexical de accomplishment e achievement, podendo também ocorrer com alguns verbos
de atividade, desde que esses estejam ligados a VPs télicos e reversíveis. Ainda mostramos
que, contrariamente ao que foi proposto por alguns autores, o escopo do prefixo re- não é
sobre os subeventos de um verbo, uma vez que verbos monoeventivos também apresentam
ambiguidade com a adição do prefixo.
ABSTRACT
Through a vast survey of verbs in Brazilian Portuguese, we have completed a detailed
analysis of the “re-” prefix conveying the idea of repetition, with the intent of delimiting
how it works. We demonstrate that the occurrence of this prefix is not restricted to a specific
group of verbal classes, as some authors have noted; however, it occurs preferably with verbs
that describe the lexical aspect of accomplishment and achievement. But it can also occur with
verbs of activity connected to telic and reversible VP’s. We also demonstrate that the scope of
the “re-” prefix is not related to the subevents of a verb, as is proposed by some authors, as
the monoeventive verbs also present ambiguity through the prefix.
1
A autora agradece o suporte financeiro da FAPEMIG (Bolsa IC)
2
A autora agradece o suporte financeiro do CNPq (Bolsa PQ) e FAPEMIG (Bolsa PPM).
PALAVRAS- CHAVE
Aspecto Lexical. Classes Verbais. Prefixação. Telicidade.
KEYWORDS
Verbal Classes. Lexical Aspect. Prefixation. Telicity.
Introdução
Nas Gramáticas Tradicionais, a partícula re- é tratada como um
prefixo de origem latina que carrega o sentido de repetição, sendo o
conceito de prefixo definido como um elemento que toma um radical
como base para formar novas palavras. Porém, ao analisarmos mais
atentamente os verbos que se iniciam com esse prefixo, podemos
perceber que nem sempre o re- vem aglutinado a um radical verbal, ou
seja, nem sempre parece funcionar como um caso de prefixação, como
ocorre em recuar, rechear e redigir. Além disso, apesar de grande parte dos
verbos que começam com o prefixo re- apresentar a ideia de repetição,
como em reabastecer, reabrir, reafirmar, existem outros que não apresentam
tal sentido, como em reagir, reclamar, recorrer, etc.
Assim, o presente artigo pretende apresentar uma análise mais
detalhada sobre o funcionamento da partícula re- como prefixo
que se aglutina a verbos do português brasileiro, doravante PB, e
suas contribuições semânticas, mas focaremos nossa atenção mais
especificamente nos verbos em que o re- apresenta a ideia de repetição.
É importante ressaltar que aquilo que estamos chamando de “ideia
de repetição” diz respeito a verbos em que o re- possui o mesmo
significado que a locução adverbial de novo, não estando incluído nesse
grupo palavras como, por exemplo, recortar e remexer, uma vez que essas
dão ideia de iteratividade, movimento contínuo.
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Realçamos que estamos utilizando o verbo sem o prefixo re-, pois a afirmação a ser
testada é a de que o prefixo em questão ocorre com verbos que são de accomplishment
e achievement
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4 A telicidade e os dados do PB
Até este ponto da nossa análise, vimos que o prefixo re- não é sensível
às classes verbais, e mais especificamente aos verbos de mudança de
estado, mas sim ao aspecto lexical, de modo que este ocorre apenas
com verbos que denotem accomplishment e achievement. No entanto, Smith
(1997) aponta para o fato de o prefixo re- poder ocorrer com verbos
de atividade, desde que eles denotem um evento télico7. A autora dá o
seguinte exemplo:
7
Segundo Rothstein (2004), ser um evento télico é ser um evento que tem um ponto final ou
uma meta a ser alcançada.
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A nossa explicação para tal fato é que, como Amaral (2013) propõe,
nadar 3 km e correr 18 km não constituem propriamente um VP. As
expressões 3 km e 18 km, segundo a autora, não são objetos de nadar e
correr, mas sim adjuntos dos mesmos, ou seja, esses verbos não aceitam
uma leitura de accomplishment, como acontece com escrever, ler e pensar.
Notemos ainda, que nadar e correr não apresentam ambiguidade quando
combinados com o advérbio quase:
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Considerações finais
O trabalho aqui desenvolvido teve como objetivo fazer uma análise
detalhada acerca do funcionamento do prefixo re- com ideia de repetição
a fim de se tentar descobrir a que grupo de verbos esse pode se aderir
para formar palavras derivadas. Ao todo, foram 119 verbos analisados.
Mostramos, primeiramente, através da proposta de Cançado, Godoy
e Amaral (2013) para as classes verbais do PB, que o prefixo re- não é
sensível à classificação semântica dos verbos que denotam mudança de
estado, contrariamente as análises de Oliveira (2009) e Medeiros (2012).
Entretanto, concordamos com os autores no que diz respeito ao fato de,
em PB, o re- ter preferência por verbos de accomplishment e achievement.
Porém, diferentemente de Dowty (1979), Oliveira (2009) e
Medeiros (2012), mostramos que o prefixo re- não tem escopo sobre
os subeventos dos verbos de accomplishment, mas sim sobre algum outro
tipo de estrutura, uma vez que verbos de achievement transitivos também
apresentam ambiguidade quando combinados com o re-.
Ainda chamamos atenção para o fato de que uma análise que tente
explicar as ocorrências do prefixo re- através da telicidade (Smith, 1997)
não se sustenta, pois há verbos que, mesmo quando inseridos em
sentenças télicas, não aceitam o re, como *renadar, *recorrer e *redançar.
Também mostramos que a proposta de Lieber (2004) a cerca da
propriedade da reversibilidade pode ser útil na tentativa de se explicar
porque certos verbos de accomplishment e achievement não aceitam o prefixo,
como *reamadurecer, *rechegar, *reapodrecer, *recegar e *reexplodir.
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Referências
AMARAL, L. Os predicados primitivos ACT e DO na representação
lexical dos verbos. 2013. Dissertação (Mestrado em Estudos
Linguísticos) – Faculdade de Letras, UFMG, Belo Horizonte, 2013.
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O que Origina a Variação da Alternativa Causativa? Uma Comparação Entre o Dâw (Família
Nadahup) e o Português Brasileiro
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Janayna Carvalho e Jéssica C. Costa
Apêndice
Verbos em que o prefixo re- equivale ao advérbio de novo:
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