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Fora do Ar

Fora do Ar

Com as mãos sobre o peito abri os olhos, vi a luz. Em um dia de nome


desconhecido. Braços furados, roxos e marcados, um corpo cansado sobre a
cama de metal e o colchão mole de um hospital.

Acordo.

A presença do médico exige minha atenção e a pergunta: está bem? exige


resposta: sim.

Meu estado já havia sido pior.A doença do egipcio tinha tomado de conta de
meus olhos, cabeça e pele. A terceira vez que o vírus se instalou, e desta vez a
morte quase veio junto. O Dr. deu data a minha alta, e prontamente aceitei a
continuidade dos litros e litros de soro que entravam por mais dos furos de
minhas veias já tão debilitadas. Não havia nada a ser feito.

Ele se foi. Com o meu tchau e meu obrigado que agora o pertenciam.
Acomodei-me no colchão que de tão macio afundava e por ali fiquei, olhando
prontamente pro tubo do soro, contanto as gotas que me hidratavam da forma
mais artificial que conheço, hora as gotas eram rápidas como lágrimas de
tristeza, hora lerdas como lágrimas de agonia. Nos últimos dias meus braços
tinham sido tão furados que estavam tristes, sem animo, e roxos, cada furo
tinha um significado: veia certa, veia errada, coleta de sangue, erros. Mas os
furos eram só um dos motivos da tristeza dos meus braços esqueléticos, sou
muito peludo e assim sempre foi, lembro que desde 8 anos tinha pelos onde
muitos adolescentes sonham em ter, meu braços não eram diferentes, e
enquanto os esparadrapos se distanciavam da superfície da minha pele com
sua face grudenta, a dor paralelamente substituía onde antes haviam pelos.

Na solidão daquela enfermaria as visitas rápidas dos enfermeiros eram ótimas,


claro que devemos desconsiderar a dor que algumas visitas me causavam,
eles vinham quase sempre felizes, sorrisos são dispensáveis para esta
conclusão, pois se não estivessem felizes facilmente eu perceberia, as visitas
dos enfermeiros traziam remédios consigo ou simplesmente a troca do soro, as
trocas de soro apesar de indolores não eram tão prazerosas quanto as visitas
que envolviam outros medicamentos, quando vinha o antialérgico, os papos
não eram muito produtivos, mas a Dipirona injetável que dava a mim as minhas
veias e artérias um ardor nada invejável, as conversas se estendiam por mais
algum tempo, e a dor se tornava uma fraude.

Quando eu não recebia visitas me restava a companhia do ócio, este sim


atormentava minha mente, mas naquela enfermaria até o ócio estava doente, a
solidão então exercia sua companhia sobre os internos, nós. E sinceramente
eu adorava! Nunca fui muito da companhia de meus pais, e o ócio e a solidão
não eram companheiros noviços, o ócio e a solidão atiçavam minha mente a
tentar procurar alimento.

Saquei meu celular e me pus a escutar as músicas que há tanto não ouvia, é
bem verdade que não por falta de tempo e sim por burrice, pois um homem
sem tempo pra música é um burro. Com meu celular em mãos e os ouvidos a
postos, ouvi violinos, violões, saxofones, xilofones e amor. Pois as canções de
amor que nos levam ao subsolo do poço, são excelentes. Graças ao bom
destino tenho a benção de não estar amando, pelo o menos não a ninguém. O
que digo pode ser considerada a maior das tolices, mas é fato de que o amor
quando é firmado sobre a tempestuosa paixão pode se transformar em ódio e
esse é o perigo. E para que sejamos realistas o amor é um remédio que nos
mesmos nos injetamos, o amor não vem de outros, vem de nós e nos viciamos
nessa droga se é que não estou fazendo um melaço de amor e paixão, mas
deixemos toda essa porcaria de lado, pois acaba de deixar ainda mais doente.

De soro, antialérgicos, Dipirona e sopa vivi. Não posso esquecer-me das idas
ao banheiro, estas sim eram cotidianas, mas do que meramente cotidianas,
necessárias a vida. O pipi a cada 5 min. Era necessário afinal todo aquele soro
tinha de ir pra algum lugar, devo admitir que o banheiro era um lugar agradável,
não por a toa ficava tanto tempo lá, incrivelmente lá o ar era puro. No restante
do meu habitat o ar era gélido e fechado, branco e pesado, o banheiro era um
lugar de mais cores.

Dessa maneira passei alguns dias, até a notícia da minha alta, que havia sido
retardada ai então o tempo resolveu ser cruel. A manhã do dia seguinte tornou-
se mais um fardo de natureza temporal, acordei, comi alguns pães com café e
leite e dormi, acordei, dormi e assim se sucedeu até o almoço. Ao pleno meio
dia o médico já deveria ter chegado e há muito tempo, mas nenhum sinal de
vida, ou alguém pra dizer que tinha morrido em um acidente quando vinha para
o hospital, bem isso algum sinal de vida afinal, entretanto - ah o dia perdurou
insistentemente - as visitas dos enfermeiros não passavam de torturas
cronológicas e me davam a oportunidade de perguntar sobre o Dr. e não obter
nenhuma resposta satisfatória.

Á mercê do tempo resolvi fazer o que normalmente faço com as pessoas.


Analisá-las. Claro que pra tal atividade havia a necessidade do combustível:
pessoas, estas por sua vez faziam-se distantes de meus olhos. Esperei então a
troca de soro. E me veio uma baiana com sotaque maranhense, de pele
morena viva, dizia ela que veio para a Bolívia cursar medicina, mas que devido
ao assassinato de um filho de um amigo teve medo e que não se habituou ao
país e principalmente as pessoas, sua família lhe pediu que voltasse, mas ela
não quis desistir da área de saúde e resolveu por aqui mesmo cursar
enfermagem, tinha uma simpatia simples e falou sobre uma velha que estava
internada em um dos apartamentos, a velha tinha feito uma cirurgia plástica.
- Esticou a cara toda, tá toda pregada, se você ver morre de rir. Disse a baiana
com seu sotaque maranhense.

Eu simplesmente ri. Até pensei que a velha estava no seu direito em fazer uma
reforma na carcaça, desde eu não tenha q vê-la e tão pouco encostar em nada.
Cirurgias plásticas não são minhas praticas medicinais favoritas, há casos em
que se faz extremamente necessário, afinal o mundo vive disso. Beleza. Esta
sim é essencial, não que eu queira, mas um rostinho bonito, coisa que a
natureza não deu, faz milagres. As pessoas são capazes de julgar toda a vida
de alguém em alguns olhares pelo rostinho, os padrões levados em questão
são basicamente os mesmos: cor de pele, cabelo e traços faciais, se é negro é
quase sempre burro, pobre e feio, dificilmente vejo modelos e galãs negros e
olha que há muitos homens negros bonitos, se os cabelos de uma mulher são
lisos, os são pranchados e isso fica claro, ou ela realmente se cuida e os traços
mesmo sem querer são levados em questão principalmente pelas mulheres
que buscam homens de rostos quadrados, algo bem másculo que supra suas
necessidades puramente femininas e de seu ego por algum tempo ou alguma
noite.Quando a enfermeira saiu com uma bandeja de metal e o saco do soro
vazio voltei a esperar o próximo cliente dos meus olhos. Instantes se passaram
e nada veio. Dormi. Acordei com outra enfermeira, mas estava acompanhando
um paciente que estava na maca, o homem deitado tinha um dos olhos
tampados e estava meio dopado. Mas em meia hora ele estava bem e foi
liberado, era só uma cirurgia de catarata, eu sabia que era simples, mas não
tão simples e ele obteve alta. Outro homem mais tarde, só alguns minutos
depois apareceu do mesmo jeito veio e do mesmo jeito se foi. Dormi.

Ondas do lençol de algodão sobre o ar, o enfermeiro estava arrumando a cama


ao lado parece que eu ia ter um companheiro.

- Vai ter um vizinho pra lhe fazer companhia agora.

- Hum...

Respondi escondendo minha animação. Bem feito, pois a possibilidade de


alguém da minha idade e com a minha cabeça ser internado eram pequenas,
mais provável que um velho fosse pra aquela cama vazia e ainda fria do que
um sopro de juventude pra me fazer companhia. Errei feio em qualquer
suposição, meu vizinho era um desbocado beirando os 30 anos, baixinho, forte,
enfim entroncado usava óculos e provavelmente era míope. Vinha andando
torto, com umas das mãos nas costas, como uma velha com reumatismo.
Deitou-se. E me perguntou:

- O quê que cê tem?

Prontamente respondi.

- Dengue.
Não perdi a oportunidade e perguntei: e você?

Pergunta infeliz.

- Ah cara...

E desbocou-se a contar sua história. Concluindo ele estava com um problema


na coluna. E seus comentários não tinham termino e repetiam-se. Era um tanto
de tortura pra minha mente, aquela forma veementemente chata de ser, e claro
o meu sorriso falso que mantera. Irritante. O Policial Militar não largava do
celular, se não falava comigo, falava com alguém do outro lado da linha. Falava
para que sua família lhe levasse roupas, cobertor, fronha, almofadas e gibis, a
possibilidade de uma noite de sua companhia me angustiava e aumenta a
expectativa da vinda do médico. Alguns minutos depois sua família chegou.
Seu pai, namorada, amigo e sua irmã que tinha uma beleza impactante. Alta,
característica que muito admiro numa mulher, morena, cabelos castanhos,
sorriso encantador, pés bem cuidados e pele macia. Um feitiço em formas
femininas. Os 4 fizeram companhia duradoura ao meu vizinho. E durante a
visita chegou mais um vizinho, aparentemente muito abatido. Deitou-se e
tomou seu soro com vitaminas.Tinha cara de 32 anos, mas tarde descobri que
tinha 26, e por lá sobre o leito masculino de número três, este era o ultimo,
ficou.

As visitas se foram.

O silêncio pairou momentaneamente, mas eu sabia que não duraria muito com
aquele PM. Os 2 começaram a conversar e eu a escutar e analisar. A conversa
era descompromissada, afinal o que poderia se esperar de 2 enfermos?! Fui ao
banheiro, umas de minhas visitas ao banheiro, respirei, fiz o básico pipi e voltei,
me sentei desta vez em umas das 3 cadeiras encostadas à parede da
enfermaria ao lado de uma mesinha de metal em que deixara meus pertences.
Coloquei meu queixo sobre a mesa e sem mais nem menos fiquei observando
a conversa dos dois, não havia programa melhor. O enfermo de número 3 era
publicitário e provavelmente estava com uma bela colônia de bactérias em sua
garganta o tom com que se expressava não me era muito agradável,
diferentemente da enfermeira baiana, detalhe que me esqueci de comentar, ele
era baiano, estava há 6 meses no Acre, adaptando-se. Ouvi suas conversar até
surgir a vontade de me meter, e fiquei meticulosamente esperando o momento
para dar inicio à uma amizade, a chance surgiu quando o enfermeiro veio,
trouxe nossos remédios e me deu a chance de entrar na conversa de cabeça.
Estavam falando sobre a adaptação dele aqui, ele comentou que algo que
adorou foi a preservação do meio ambiente no Acre.

Minha chance! Perguntei pra ele se ele já havia ido até o interior do Acre,
conversado com acrianos destas regiões, passivamente ele me respondeu que
não.
-É por isso que você acha que as pessoas preservam a mata. Apesar do Acre
ter 70% de sua mata nativa preservada, as pessoas pouco se importam, e
pouco sabem sobre sua importância.

O enfermeiro me interrompeu e falou que a madeira no interior é vendida por


um preço absurdamente barato, madeira de primeira e concordei.

-Se você chegar numa área de mata fechada pedir pra lhe venderem a madeira
de uma arvore, por 250m² você consegue fácil, fácil. No dia seguinte a arvore
tá na frente da sua casa, cortada e pronta pra uso.

-Verdade. Disse eu, é claro que o enfermeiro havia exagerado um pouco, mas
é pra dar ênfase a situação.

-Visitei uma chácara na qual faziam o daimê, fui pra conhecer lá eles tinham
uma arvore que pode ser abraçada por mais de 16 pessoas.

-É provavelmente deve ser a siri, sama alguma coisa.

Na hora não me lembrei o nome da espécie, era a samaúma. Em nossa


conversa que pra mim estava sendo super divertida e interessante o perguntei
se ele conhecia os geoglifos, com os olhos retorcidos ele respondeu que não.

-São desenhos no solo bem interessantes, quando começaram a desmatar o


Acre depois da 2° Guerra os descobriram, hoje se acredita que foram feitos por
povos que viviam aqui há mais de 500 anos, antes da descoberta do Brasil.

-Esse lance de descoberta do Brasil não existe.

Concordei afinal é a pura verdade. A conversa durou muito e do jeito que eu


gosto, até que o silencio veio agora visitar aos 3 enfermos em suas camas
incomodas. E nestes instantes de conversa a noite tinha se estabelecido, e
enfim escutei os barulhos de charmosos saltos femininos no corredor. Ai que
felicidade, não era o Médico, mas sim sua maravilhosa esposa, quando abriu a
porta meu coração disparou tamanha a felicidade em vê-la, trazia em seus
lábios a noticia de minha alta. Aproximou-se e me deu a maravilhosa noticia,
me despedi dela com um obrigado, direcionado aquele olhos negros um pouco
escondidos por aqueles cabelos lisos e negros que se contrastavam com
aquela pele tão branca e sedosa. A notícia da alta deixou minha mente e meu
corpo prontamente felizes e peguei minhas coisas e fui, sai do quarto naquela
noite, deu um tchau aos meus companheiros os quais provavelmente jamais
vou ver e talvez isso seja muito bom, afinal há momentos que não devem ser
repetidos em nenhum aspecto para não estragar a doçura da vida, no corredor
contei meus passos até a saída e em meu 1° passo fora das redondezas do
hospital morri. Nasci de novo para a vida de sempre, a vida que não me dá
motivos para reclamar, mas nem por isso motivos para saltar de alegria.

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