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EDUCAÇÃO DE SURDOS: A TRAJETÓRIA DE DUAS PROFESSORAS

Dalva Rosa* e Márcia Akiko N. Rosa**

Somos pedagogas habilitadas em EDAC (Educação para o Deficiente da Audio Comunicação) e


atuamos como professoras em uma escola pública para Surdos.
Quando iniciamos essa habilitação no curso de pedagogia, constatamos que o nome fazia juz ao que
nos era transmitido: que iríamos trabalhar com pessoas deficientes, que não ouviam e portanto não falavam, e
que caberia a nós, reabilitar esses indivíduos treinando-os para falarem e assim, inseri-los na sociedade de
ouvintes. Isto porque a idéia que sempre nos passaram era que, para fazer parte da sociedade, todas as pessoas
devem usar a voz para se comunicar.
Os anos foram passando e nos mostrando que as coisas não eram bem assim. Inicialmente, fomos
trabalhar em uma escola para ouvintes que mantinha algumas salas para Surdos. Esses Surdos não se
integravam com a comunidade escolar, porque não haviam desenvolvido a fala nem a língua escrita. Mesmo
entre eles a comunicação era muito precária, restringindo-se a um pequeno repertório de gestos criados pelo
próprio grupo.
Ao nos depararmos com esse quadro não sabíamos o que fazer. A faculdade não nos havia
instrumentalizado para enfrentar essa situação tão complexa, e ao mesmo tempo tão comum no Brasil, que é a
de Surdos iniciarem sua escolarização tardiamente e sem terem aprendido a língua oral e tão pouco qualquer
outra língua que propiciasse sua comunicação.
Junto com os alunos, por não termos outra alternativa, começamos a aprender e utilizar alguns gestos
inventados em classe. Ainda que rudimentares, esses foram suficientes para que depois de alguns meses de
convivência pudéssemos conversar a respeito de angústias e inquietações que até então não podiam ser
discutidas. Assim foram surgindo questões. Por que entre tantos alunos só eles eram Surdos? Existiriam
Surdos em outros lugares? Deus entendia os gestos que eles faziam? O que o cachorro estaria falando? (isto
porque, eles viam que o cachorro mexia a boca e alguns conseguiam perceber o som do latido).
Essa realidade foi se repetindo no nosso dia-a-dia em muitos locais. Por onde passamos encontramos
Surdos fazendo esse tipo de pergunta, deixando claro a falta de comunicação em suas experiências de vida.
Muitas vezes, a família desconhece a importância de estabelecer uma comunicação estruturada com o
seu filho Surdo, argumentando que “ele entende tudo”. Isso ocorre porque o Surdo se adapta à rotina da
família e aparentemente, participa do contexto familiar. Assim a família tem a ilusão de que está orientando
seu filho, mesmo em aspectos muito complicados, como por exemplo, quando se trata de drogas. Há muitos
Surdos de pais ouvintes, que mostram claramente o desconhecimento da família acerca da problemática da
surdez. Podemos citar alguns, ressaltando que isso acontece por falta de informação. Em sua maioria as
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* Professora de surdos da Escola Municipal de Eduacação Especial “Aparecida Ribeiro"
Interprete da Lingua Brasileira de Sinais (LIBRAS)
** Professora de surdos da Escola Especial "Vera Lúcia e da da Escola Municipal de Eduacação Especial
“Aparecida Ribeiro"
famílias que têm um membro Surdo não aprendem a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) Isso por dois
motivos: primeiro, a família insiste em investir somente na aprendizagem da língua oral (fala), e segundo,
aprender LIBRAS é demorado e exige dedicação e investimento, por tratar-se de outra língua.
Ao detectar a surdez, a família não é orientada pelos profissionais de saúde e educação e, quando
procuram por um serviço especializado, muitas vezes não encontram vagas.
Associado a esse problema, acresce-se o fato de que alguns profissionais sem conhecimento e
vivência específicos na área, justificam a não existência de recursos especializados, alegando que conhecem
um Surdo que apresenta um bom rendimento na escola comum.
A família não é orientada como também a sociedade em geral, porque as autoridades não dão
importância à implantação de serviços de informação e atendimento às deficiências em geral. Dessa forma, a
família acaba por procurar diversos recursos, gastando seu tempo com tentativas inúteis de cura, ou passam
anos em atendimentos inadequados, orientados por profissionais sem experiência na área.
Nos primeiros anos de escolaridade, a maioria dos surdos que freqüentam escolas comum, dão a
impressão de estarem integrados por compartilhar das mesmas brincadeiras ou atividades: pega-pega, pular
corda, pintar desenhos ou copiar os exercícios da lousa. Os cadernos ficam repletos de lições, e para muitas
famílias isso, por si só, significa que a criança está aprendendo.
Com o passar do tempo, as brincadeiras são substituídas por grupinhos de bate-papo e, nessas horas,
o isolamento se faz mais evidente.
Sabemos que não é possível exigir de adolescentes ouvintes que tenham paciência, que falem
devagar e se apoiem no contexto, ou que avisem quando vão mudar de assunto. Nem tão pouco que fale um
de cada vez para que o colega Surdo possa acompanhar a conversa, fazendo leitura labial porque não é
possível fazer de várias pessoas ao mesmo tempo. Mesmo fazer leitura labial de uma só pessoa já é difícil
pois apenas 40% dos fonemas são visíveis. Também é utópico acreditar que os ouvintes irão aprender a
LIBRAS para conversar com o Surdo.
De forma geral, os Surdos (essa distinção de S maiúsculo é assinalada para distinguir surdez como
uma entidade lingüística e cultural da surdez auditiva, com “s” minúsculo) têm facilidade para aprender
LIBRAS, por serem sujeitos visuais (termo usado por Skliar, 1999), e estão natural e fisicamente predispostos
a aprender uma língua visual, desde que expostos a ela.
Muitas vezes, ouvimos pessoas dizerem eu conheço um Surdo que tem perda profunda, mas fala
português corretamente, tem bom rendimento escolar, até aprendeu uma língua estrangeira..., querendo com
isso justificar que é desnecessário a escola para Surdos ou o uso da LIBRAS.
Dentro desse exemplo, cabe ressaltar que existem Surdos com uma capacidade extraordinária para
aprender português, fala, leitura labial mas que isso se deve a um talento incomum, e assim se destacam;
como existem artistas que pintam quadros maravilhosos ou compõem músicas belíssimas, isto é, são pessoas
com um talento especial, que podem ser encontradas em qualquer cultura.
Muitos Surdos usam a língua oral, com maior ou menor eficiência, mas poucos de forma inteligível
para o leigo. A imposição do uso da fala aos Surdos, é baseada na justificativa de há que na perda leve ou
moderada (perdas auditivas em que é possível adquirir fala). No entanto tal argumentação deixa de lado uma
série de outras situações que precisam ser consideradas.
Freqüentemente mesmo apresentando uma fala distorcida, alguns alunos são encaminhados às
escolas para ouvintes, sem nenhum apoio pedagógico, fonoaudiológico ou psicológico.
Quando a criança ouvinte vai para a escola, ela já carrega uma grande bagagem (estruturas, fonemas,
palavras e conceitos). A partir daí ela passa a estabelecer relações entre as formas oral e escrita dessa língua,
que é a sua língua materna. Diferentemente, a criança Surda chega à escola sem ter, na maioria das vezes,
desenvolvido nenhuma língua, quer seja oral ou sinalizada. Isso é desconsiderado quando se exige da criança
Surda os mesmos resultados da criança ouvinte, aplicando-se os mesmos métodos e estratégias comuns no
trabalho de alfabetização que os utilizados com crianças ouvintes (família silábica, hipóteses auditivas,
músicas, parlendas, rimas).
Acredita-se que o Surdo “incluído” na escola comum, deva absorver conteúdo e relacionar-se com
Surdos e ouvintes, de forma oral. Cabe à professora da sala de recursos orientar professores, funcionários,
aluno e família para se comunicarem com o surdo de forma a promover a sua oralização. Tudo isso atendendo
uma ou duas vezes por semana durante 1 hora os surdos incluídos nas classes comuns. No entanto a
professora da sala de recursos não conta com intérprete português- LIBRAS e como agravante, ainda há o fato
de que essa professora fica isolada na escola, sem contato com outros profissionais que trabalham com surdos
para poder discutir, rever posturas, atualizar-se e trocar idéias. O reconhecimento da importância da
aprendizagem da LIBRAS ainda está ocorrendo, mesmo as escolas especiais para Surdos ainda estão
envolvidas com heranças do oralismo. Não possuem Surdos em seu quadro de funcionários e muitas
professoras, por comodismo ou dificuldade em alterar uma posição tomada desde o início da carreira, não
estão dispostas a aprender a usar a LIBRAS com seus alunos. Afinal exigiria esforço, reciclagem, gasto de
tempo e dinheiro e, principalmente reconhecer que em anos de trabalho não fizeram a coisa certa.
Há, ainda, professoras que, conforme elas mesmo dizem, usam os sinais como apoio, ou seja,
eventualmente usam um sinal ou outro, sem se questionarem sobre as implicações dessa forma de atuação, e
sem perceberem que assim, continuam no oralismo, pois não estão respeitando a estrutura da LIBRAS, não se
fazendo entender e passando uma mensagem distorcida.
Outra crença, também, comum entre alguns professores de surdos é a de que não é importante
dominar a LIBRAS, dependendo da faixa etária da classe em que atua. Um exemplo disso é a frase: “Eu não
preciso saber muitos sinais porque trabalho com pré-escola” ou “Os alunos é que me ensinam sinais, porque
são grandes”, o que traz implícita a crença de que cabe ao aluno expandir o vocabulário do professor e não o
contrário.
Apesar dessas lacunas, é fator altamente benéfico o contato dos Surdos com outros Surdos na escola
especial, pois possibilita trocas com seus pares e, conseqüentemente, a aprendizagem da LIBRAS .Essas
condições levam o Surdo a perceber-se como membro de um grupo, fazer amigos, confidentes, conhecer
Surdos realmente integrados à sociedade, que são independentes economicamente, constituem família e
participam de Associação de Surdos, construindo sua identidade Surda.
Na convivência com outros Surdos, esse indivíduo adquire a LIBRAS e, se a família não acompanha
essa evolução, cria-se um abismo entre pais e filhos, pois os pais continuam usando português oral, sem
perceber que o filho usa outra língua.
Em contato com as escolas para surdos, geralmente as famílias têm oportunidade de conhecer a
LIBRAS para se comunicarem com seus filhos. No entanto essa aprendizagem requer aprofundamento, pois é
freqüente que a família fique adaptada a uma comunicação precária, ou seja, à utilização de gestos indicativos
para necessidades básicas.
A ausência da comunicação gera conflitos indecifráveis, perguntas sem respostas, podendo levar a
comportamento agressivo ou ao isolamento.
Um exemplo disso é o caso de Paula, uma jovem surda, cuja família foi orientada a não permitir a
convivência com outros Surdos, para que assim não aprendesse sinais. Essa jovem tinha irmãs ouvintes e
queria saber porque suas irmãs tinham amigas e ela, não.
O que aconteceu é que Paula por ser somente exposta à língua oral, desenvolveu uma comunicação
funcional e telegráfica que somente permitia-lhe receber ordens simples, responder o clichês sociais como:
bom dia, obrigada, ... mas não tinha condições de conversação, algo exigido para poder participar do grupo de
amigas das irmãs ou outro grupo de ouvintes.
São inúmeros os exemplos que ilustram a gravidade da comunicação ineficiente entre os Surdos e
suas famílias. Como no caso de Marta, uma jovem de 17 anos, que engravidou. A mãe, percebendo a
gravidez, levou-a ao médico, porém, nem o médico, nem a mãe conheciam a LIBRAS. A jovem não permitiu
que fossem feitos os exames próprios do pré-natal, e a família não conseguiu orientá-la quanto a forma de se
portar nos exames, e os passos que se sucederiam durante o parto, como ficar imóvel durante a aplicação da
anestesia. Dessa forma, condições básicas que propiciam convívio e sentimentos de acolhida e
compartilhamento não existiram para Marta.
Outro caso é o de Lino, um jovem de 14 anos, que não conhecia a LIBRAS e só usava gestos
indicativos. Ao ingressar na escola especial foi interrogado pelos Surdos que já eram usuários da LIBRAS:
“Onde você mora?” Foi a pergunta feita em LIBRAS. Lino, flexionava o braço e, com o dedo indicador
estendido fazia uma expressão facial demonstrando intensidade. Os outros jovens Surdos não compreendiam
se o local seria na avenida próxima à escola, no outro bairro, ou no município vizinho e, assim, começaram a
sinalizar essas possibilidades, enquanto o jovem prosseguia insistentemente em seu gesto. Essa comunicação
imprecisa, aceita e utilizada pela família, não constituiu comunicação com os Surdos usuários de LIBRAS,
para os quais o gesto indicativo é insatisfatório, pois a LIBRAS é completa, estruturada e precisa.
Essa atitude revela uma crença de que a mímica, junto a dados do contexto podem substituir uma
língua. O seguinte exemplo ilustra com clareza essa crença: Pedro, uma criança surda, querendo comer bolo
de chocolate, foi até o armário, pegou os ingredientes pôs sobre a mesa, e, em seguida chamou a mãe e
apontou para todos os ingredientes. A mãe, evidentemente, concluiu que a criança queria comer bolo. Isso
pode ser muito criativo, porém nada eficiente, pois, se a criança teve que recorrer a todas essas pistas para se
fazer entender, imagine o que teria que fazer para perguntar à mãe algo menos concreto, como por exemplo:
“Por que eu não posso comer bolo no lugar de almoçar?” e como essa mãe que para entender seu filho,
precisou de tantas dicas, conseguiria responder a perguntas mais abstratas?
Outra característica que Lino desenvolveu foi de um comportamento serviçal como uma forma de ser
aceito pelos ouvintes. Na escola especial usava os mesmos artifícios na tentativa de ser aceito, como apagar a
lousa, guardar os objetos no armário, carregar as pastas da professora, manter uma expressão sorridente e
concordante independente do contexto. Esse é um comportamento comum desenvolvido pelos Surdos que
cresceram na escola comum e se tornaram copistas, sem entender o conteúdo do Português escrito. A tentativa
de adaptação levou-o a uma aprendizagem repetitiva, sem uso do potencial cognitivo de elaborar e
compreender.
O desconhecimento sobre o desenvolvimento do pensamento quando a língua é a de sinais e não a
língua falada, no senso comum, leva a acreditar que o Surdo deva adaptar-se ao mundo dos ouvintes, por
ignorar que ele dispõe de uma língua estruturada e tem também seu jeito próprio de agir e de pensar.
Os Surdos que não tem acesso a LIBRAS não conseguem elaborar e expressar seus pensamentos e
sentimentos e sofrem vários prejuízos sociais, emocionais, e cognitivos.
Mesmo frente a toda essa problemática, ainda encontramos profissionais que orientam a família a
impedir o uso dos sinais, incutindo a idéia de que os seres humanos só devem se comunicar através da fala.
Isso torna-se mais um obstáculo à divulgação da LIBRAS e ao direito do surdo de ter intérprete em escolas,
faculdades, hospitais, delegacias, e outros órgãos; de ter legenda em todos os meios de comunicação como
TV, cinema, teatro e outros locais de lazer.
Conhecemos relatos exorcistas promovidos por grupos religiosos para curar a surdez, expulsar os
demônios, como no caso de Jorge, um aluno que faltou a aula e, no dia seguinte, relatou o motivo da falta:
“Acordamos de madrugada, estava tudo escuro e viajamos para um lugar longe, uma igreja. Um homem
gritou e mandou o diabo sair da minha orelha para que eu ouvisse”. Perguntado quando ele iria ouvir,
respondeu que era para esperar. Felizmente essa família não tirou seu filho da escola, apesar da promessa de
cura. Como ocorre freqüentemente quando voltam dessas cerimônias. Geralmente, a família cheia de fé
cancela a matrícula ou qualquer atendimento em que a criança esteja inserida.
Essas crianças sofrem prejuízos, às vezes por anos, no seu desenvolvimento intelectual e emocional e
por acreditarem que possuem o diabo dentro de seu corpo.
Parece-nos importante lembrar o que diz o artigo 21 da Declaração de Salamanca “As políticas
educativas deverão levar em conta as diferenças individuais e as diversas situações. Deve ser levada em
consideração, por exemplo, a importância da linguagem de sinais como meio de comunicação para os
surdos, e ser assegurado a todos os surdos acesso ao ensino da linguagem de sinais de seu país. Face às
necessidades específicas de comunicação de surdos e de surdos-cegos, seria mais conveniente que a
educação lhes fosse ministrada em escolas especiais ou em classes ou unidades especiais nas escolas
comuns.” Apesar da Declaração de Salamanca estar sempre sendo citada nos cursos universitários ligados à
Educação Especial, em eventos e no movimento de inclusão social a favor da pessoa com deficiência esse
direito, porém, não está sendo respeitado na sua totalidade. Faz-se urgente uma mudança de consciência das
autoridades, para que a educação e os direitos da comunidade Surda sejam foco de atenção.
Conforme o que foi exposto, faz-se necessário uma mudança de representação do sujeito Surdo como
diferente, com especificidades que precisam ser compreendidas para que possam sentir-se integrados pessoal
e socialmente.

BIBLIOGRAFIA

MOURA, M. C. de. O Surdo – caminhos para uma nova identidade. Rio de Janeiro: Revinter/FAPESP,
2.000.
QUADROS, R. M. de. Educação de surdos, a aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
SACKS, O. Vendo vozes. tradução Alfredo Barcellos Pinheiro Lemos . Rio de Janeiro: Imago, 1990.
SKLIAR, C. (org.) Atualidade da educação bilíngüe para surdos. Vol. 1, Porto Alegre: Mediação, 1999.
_______________. Atualidade da educação bilíngüe para surdos. Vol. 2, Porto Alegre: Mediação, 1999.
_______________. A surdez, um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 1998.
CORDE. Declaração de Salamanca, e linha de ação sobre as necessidades especiais. Tradução: Edilson
Alkmim da Cunha, 2ª ed., Brasília, 1997
REVISTA DA FENEIS. Rio de Janeiro, 1999 - trimestral.
REVISTA ESPAÇO. Rio de Janeiro: INES, 1990 – semestral. ISSN 0103-7668.
JORNAL DA FENEIS. Rio de Janeiro: FENEIS, 1995 – trimestral.

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