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Centro Universitário de Brasília – UniCEUB

Faculdade de Tecnologia e Ciências Sociais Aplicadas – FATECS

BRUNA MAURY AMERICANO DO BRASIL

GUERRA FRIA: ELEMENTOS DA IDEOLOGIA NORTE-AMERICANA NO CINEMA

Brasília
2016
BRUNA MAURY AMERICANO DO BRASIL

GUERRA FRIA: ELEMENTOS DA IDEOLOGIA NORTE-AMERICANA NO CINEMA

Trabalho de Conclusão de Cursoapresentado


ao curso de Comunicação Social com
habilitação em Jornalismo do Centro
Universitário de Brasília -UniCEUB, como um
dos requisitos paraobtenção do grau de
Bacharel emJornalismo. Orientadora:
Professora Mestre em Comunicação Social
Ursula Diesel.

Brasília
2016
BRUNA MAURY AMERICANO DO BRASIL

GUERRA FRIA: ELEMENTOS DA IDEOLOGIA NORTE-AMERICANA NO CINEMA

Trabalho de Conclusão de Cursoapresentado


ao curso de Comunicação Social com
habilitação em Jornalismo do Centro
Universitário de Brasília -UniCEUB, como um
dos requisitos paraobtenção do grau de
Bacharel emJornalismo. Orientadora:
Professora Mestre em Comunicação Social
Ursula Diesel.

Brasília, 25 de novembro de 2016.

Prof. Me. Ursula Diesel

Prof. Dra. Carolina Assunção

Prof. Me. Guilherme Di Angellis

Brasília
2016
AGRADECIMENTOS

Por ter feito todos os esforços possíveis e impossíveis para que eu chegasse até
aqui, ter me apoiado e confortado nos momentos em que tudo parecia ruim e por
outros incontáveis momentos de gratidão, agradeço à minha melhor amiga: minha
mãe. Por ter me apresentado à paixão pelo cinema, agradeço à professora Carolina
Assunção. Por ter me orientado com paciência e atenção, agradeço à professora
Ursula Diesel. Por ter aceitado o convite para fazer parte da minha banca muito
antes dela acontecer, no quinto semestre de faculdade, agradeço ao professor
Guilherme Di Angellis. Por ter reacendido o meu interesse pelo jornalismo quando
eu estava desiludida, agradeço ao melhor professor do Centro-Oeste, Luiz Claudio
Ferreira.Por ter me dado forças quando eu estava sem energias para continuar,
agradeço ao meu melhor amigo e namorado. Por compartilharem das dores e
delícias de fazer um Trabalho de Conclusão de Curso, agradeço aos meus amigos e
colegas de faculdade, em especial a melhor pessoa que conheci nesses três anos e
meio, Carolina Sousa.
RESUMO

Guerra Fria é a denominação utilizada para caracterizar a luta entre as ideologias


capitalista e socialista e teve como maiores representantes os blocos Estados
Unidos e União Soviética. O conflito durou 46 anos e teve como característica
principal a propaganda ideológica, que ocorria, entre outras formas, por meio de
manifestações culturais, como o cinema. No cinema norte-americano, é possível
identificar elementos que faziam parte da retórica americana e que eram utilizados
como ferramentas de propagação de mensagens. Para a identificação e
categorização de tais elementos, o método aqui utilizado é a análise fílmica, levando
em conta o conceito da Indústria Cultural, típica da cultura norte-americana. Além
disso, são considerados os fatos históricos que permeiam as produções a serem
analisadas, Moscou Contra 007 (1963), Caçada ao Outubro Vermelho (1990) e
Ponte dos Espiões (2015). Ao contemplar os três filmes, é possível traçar uma linha
do tempo da Guerra Fria no cinema e verificar se os elementos utilizados como
ferramentas de ideologia são constantes em todas as produções.
Palavras-chave: Guerra Fria. Cinema. Ideologia. Estados Unidos. União Soviética.
ABSTRACT

Cold War is the denomination used to refer to the struggle between the capitalist and
socialist ideologies and had most prominent two blocks, United States and the Soviet
Union. The conflict lasted 46 years and its main feature of ideological propaganda,
which took place, among other ways, through cultural events, such as movies. In
American cinema, you can identify elements that were part of the American rhetoric
and were used as propagation messaging tools. For the identification and
categorization of such elements, the method used is the film analysis, taking into
account the concept of the Cultural Industry, typical of American culture. Additionally,
the historical facts are considered permeating the productions to be analyzed, which
are From Russia with Love (1963), The Hunt for Red October (1990) and Bridge of
Spies (2015). Contemplating the three films, it is possible to trace a timeline of the
Cold War in film and verify if the information used as an ideology tools are constant in
all productions.

Keywords: Cold War. Cinema.Ideology. United States. Soviet Union.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: poster do filme Moscou Contra 007. ............................................................................... 31


Figura 2: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 36
Figura 3: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 37
Figura 4: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 37
Figura 5: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 38
Figura 6: frame de Moscou Contra 007 .......................................................................................... 38
Figura 7: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 38
Figura 8: frame de Moscou Contra 007 .......................................................................................... 39
Figura 9: frame de Moscou Contra 007. ......................................................................................... 39
Figura 10: poster do filme Caçada ao Outubro Vermelho ........................................................... 40
Figura 11: frame de Caçada ao Outubro Vermelho. ..................................................................... 42
Figura 12: frame de Caçada ao Outubro Vermelho. ..................................................................... 42
Figura 13: frame de Caçada ao Outubro Vermelho. ..................................................................... 43
Figura 14: frame de Caçada ao Outubro Vermelho ...................................................................... 44
Figura 15: frame de Caçada ao Outubro Vermelho ...................................................................... 46
Figura 16:frame de Caçada ao Outubro Vermelho. ...................................................................... 46
Figura 17: frame de Caçada ao Outubro Vermelho ...................................................................... 47
Figura 18: frame de Caçada ao Outubro Vermelho. ..................................................................... 47
Figura 19: poster de Ponte dos Espiões ......................................................................................... 48
Figura 20: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 53
Figura 21: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 53
Figura 22: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 54
Figura 23: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 55
Figura 24: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 55
Figura 25:frame de Ponte dos Espiões........................................................................................... 55
Figura 26: frame de Ponte dos Espiões.......................................................................................... 55
Figura 27: frame de Ponte dos Espiões. ........................................................................................ 56
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.........................................................................................................................9
1 A GUERRA FRIA................................................................................................................12
2 INDÚSTRIA CULTURAL, IDEOLOGIA E CINEMA COMO LINGUAGEM.........................19
3 METODOLOGIA..................................................................................................................26
4 ANÁLISE DOS FILMES......................................................................................................29
4.1 MOSCOU CONTRA 007..................................................................................................30
4.1.1 Meios de persuasão no discurso...............................................................................32
4.1.2 A história como recurso de convencimento.............................................................35
4.1.3 Os artifícios técnicos como instrumentos de significação.....................................36
4.1.4 James Bond, 53 anos depois de “Moscou Contra 007”..........................................39
4.2 CAÇADA AO OUTUBRO VERMELHO............................................................................40
4.2.1 A relação entre realidade, história, representação da realidade e ficção..............41
4.2.2 A dicotomia herói/vilão...............................................................................................44
4.2.3 A relação entre os blocos capitalista e socialista....................................................45
4.3 PONTE DOS ESPIÕES....................................................................................................47
4.3.1 A história como recurso de convencimento.............................................................48
4.3.2 A desconstrução de um estereótipo..........................................................................49
4.3.3 O papel do herói e as fases da retórica capitalista..................................................50
4.3.4 Os artifícios técnicos como instrumento de significação.......................................52
4.3.5 O lado “quente” da Guerra Fria..................................................................................56
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................57
REFERÊNCIAS.....................................................................................................................60
9

INTRODUÇÃO

“Guerra sem batalhas. Sem monumentos. Só vítimas”. As palavras do capitão


soviético Marko Ramius (CAÇADA,1990) sintetizam, de forma precisa, os
acontecimentos entre o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, e a dissolução da
União Soviética (URSS), em 1991. O período destacou-se pela tensão existente
entre as duas potências dominantes no mundo na época: Estados Unidos e União
Soviética. Tensão esta que não teve explosões de fúria, com bombardeios e tropas
a invadir o território inimigo. Por isso, os 46 anos em que o conflito existiu ficaram
conhecidos como a Guerra Fria. Eric Hobsbawn (2003) define as décadas do conflito
como “era de ouro” e “desmoronamento”, e explica as peculiaridades do período.

À medida que o tempo passava, mais e mais coisas podiam dar errado
política e tecnologicamente, num confronto nuclear permanente baseado na
suposição de que só o medo da ‘destruição mútua inevitável’
(adequadamente expresso na sigla MAD, das iniciais da expressão em
inglês – mutually assured destruction) impediria um lado ou outro de dar o
sempre pronto sinal para o planejado suicídio da civilização. Não aconteceu,
mas por cerca de quarenta anos pareceu uma possibilidade diária. A
peculiaridade da Guerra Fria era a de que, em termos objetivos, não existia
perigo iminente de guerra mundial. (HOBSBAWN, 2003, p. 224)

A frieza do embate deu-se não só pela falta de ataques ofensivos, mas


também pelo antagonismo de ideias. Os Estados Unidos, capitalistas, e a União
Soviética, socialista, competiam e apostavam qual dos dois modelos econômicos iria
dominar o globo. A persuasão era a arma usada para reunir mais aliados e aumentar
os impérios, de ambos os lados. Os Estados Unidos, que já então possuíam uma
indústria cultural poderosa, utilizavam dos meios de mídia e comunicação, como
televisão e cinema, para difundir uma cultura de massa que estava de acordo com
os interesses da época. O conceito de “indústria cultural” foi inicialmente
apresentado por Theodor W. Adorno e Max Horkheimer na obra “Dialética do
Esclarecimento”, em 1944. Hobsbawn (2003) coloca como exemplo da retórica
capitalista o icônico personagem James Bond, de Ian Fleming.

A Guerra Fria que de fato tentou corresponder à sua retórica de luta pela
supremacia ou aniquilação não era aquela em que decisões fundamentais
eram tomadas pelos governos, mas a nebulosa disputa entre seus vários
serviços secretos reconhecidos e não reconhecidos, que no Ocidente
produziu esse tão característico subproduto da tensão internacional, a
ficção de espionagem e assassinato clandestino. Nesse gênero, os
britânicos, com o James Bond de Ian Fleming e os heróis agridoces de John
le Carré - ambos tinham trabalhado nos serviços secretos britânicos -,
10

mantiveram uma firme superioridade, compensando assim o declínio de seu


país no mundo do poder real. (HOBSBAWN, 2003, p. 226)

Por vezes, a ideologia transmitida a toda a população norte-americana e parte


da população mundial, em telas grandes ou pequenas, chegou a ser antissoviética.
Até hoje, 24 anos depois do fim da guerra, produções cinematográficas refletem os
pontos de vista difundidos durante toda a fase conflituosa. Althusser (1980) busca
em Marx o conceito e as implicações da ideologia enquanto ferramenta de controle
do Estado. De acordo com Althusser, o termo ideologia foi criado originalmente com
o significado de uma teoria das ideias, por Cabanis e Destutt de Tracy. Cinquenta
anos mais tarde, na Ideologia Alemã (MARX, 1998), há uma mudança no sentido da
expressão: “a ideologia passa então a ser o sistema das ideias, das representações,
que domina o espírito de um homem ou de um grupo social” (ALTHUSSER, 1970, p.
69). Ainda seguindo a filosofia de Marx, a ideologia é figurada como puramente
imaginária e ilusória. “Toda a sua realidade está fora de si própria”, como define
Althusser (1980). O conceito considerado por Marx (1998) e Althusser (1980) serve
como base para compreender o papel do cinema na construção da ideologia norte-
americana e capitalista durante e depois da Guerra Fria.

O presente trabalho pretende vislumbrar o poder de persuasão de produções


cinematográficas que abordam a Guerra Fria, de modo que seja realizada uma
análise de quais elementos e recursos cinematográficos e de linguagem foram e/ou
são utilizados para a propagação da ideologia norte-americana. O objetivo é
qualificar como a linguagem cinematográfica da indústria cultural norte-americana
pode perpetuar ideais por décadas. Manuela Penafria apresenta os tipos de análise
cinematográfica, levando em conta que “o objetivo da análise é, então, o de
explicar/esclarecer o funcionamento de um determinado filme e propor-lhe uma
interpretação” (PENAFRIA, 2009, p. 1). Segundo a classificação da autora, a análise
a ser apresentada no trabalho qualifica-se como análise de conteúdo, em que o
principal objeto estudado é o tema. Penafria destaca, além da classificação de
análises, a capacidade estratégica da linguagem cinematográfica.

Se considerarmos que um filme é composto por um conjunto de meios


(visuais e sonoros, por exemplo, a profundidade de campo e a banda
sonora/musical) há que identificar como é que esses meios foram
estrategicamente agenciados/organizados de modo a produzirem
determinado(s) efeito(s). Do ponto de vista da sua estratégia, um filme pode
ser entendido como uma composição estética se os seus efeitos forem da
11

ordem da sensação (em geral, filmes experimentais), ou como uma


composição comunicacional se os efeitos forem sobretudo de sentido (em
geral, filmes com um forte argumento que pretendem transmitir uma
determinada mensagem/ponto de vista sobre determinado tema).
(PENAFRIA, 2009, p. 6)

Para isso, foram escolhidos três filmes que representam o ponto de vista
norte-americano do conflito. Moscou Contra 007 (YOUNG, 1963) é o primeiro e,
apesar de não ser um longa-metragem de origem estadunidense, espelha as
inclinações e interesses da potência capitalista em plena Guerra Fria. O segundo
filme a ser analisado é Caçada ao Outubro Vermelho (MCTIERNAN, 1990) cuja
produção data do final do embate, logo após a queda do Muro de Berlim. O enredo,
no entanto, se passa no ano de 1984. E, por fim, o longa-metragem Ponte dos
Espiões (SPIELBERG, 2015), cuja história, baseada em fatos reais, ocorre no ano
de 1960. Apogeu. Desfecho. Pós-guerra. A escolha de três momentos históricos
distintos, em relação à produção dos filmes, tem por finalidade determinar a
existência de elementos discursivos que se repitam nas três produções, fazendo da
indústria cultural, conceito de Adorno e Horkheimer, instrumento para a
disseminação de princípios, valores e filosofias.

No primeiro capítulo, “A Guerra Fria”, serão abordados os eventos históricos


do período conhecido como Guerra Fria, com base em historiadores e estudiosos da
guerra. O objetivo, neste capítulo, é tratar dos motivos que levaram ao início do
conflito, de como ele se desenvolveu e os eventos que o levaram ao fim. No capítulo
dois, “Indústria Cultural, ideologia e cinema como linguagem”, serão vislumbrados os
embasamentos teóricos do conceito de Indústria Cultural, a relação com a ideologia
e como ambos podem ser observados no cinema. Além disso, será analisado o
potencial do cinema enquanto meio de transmissão de mensagens e linguagem. No
capítulo três, a metodologia do trabalho será explicada, ao contemplar a escolha dos
filmes a serem estudados e a forma como serão analisados. No capítulo quatro,
ocorre a análise dos três filmes, que leva em conta os conceitos previamente
apresentados para explorar características da retórica norte-americana.

1
Os termos “socialista” e “comunista”, apesar de não significarem exatamente a mesma coisa, são utilizados
indiscriminadamente por historiadores e estudiosos do período. O mesmo ocorre com as referências à Rússia e
a União Soviética. Portanto, tais termos serão utilizados como sinônimos no presente trabalho.
12

1 A GUERRA FRIA

A guerra é um dos assuntos prediletos da filosofia ao longo da história da


humanidade. Isso porque ela se mostrou, em todas as fases da memória humana,
quase inerente aos problemas enfrentados pelo homem. É essa a reflexão que
Bobbio (2003) propõe inicialmente sobre o conceito de guerra.

A guerra sempre foi um dos temas obrigatórios e prediletos de toda filosofia


da história, pelas características de terribilidade ou de fatalidade, que
parecem ou quase sempre parecem inerentes a ela. Se a filosofia da
história é a reflexão sobre o destino da humanidade no seu conjunto, a
presença da guerra em cada fase da história humana, pelo menos até hoje,
constitui para essa reflexão um dos problemas mais inquietantes e
fascinantes. (BOBBIO, 2003, p. 51)

O autor baseia a filosofia da história humana em três fases, intrinsecamente


ligadas a algum tipo de guerra. Para ele, o nascimento da filosofia da história se deu
com a Revolução Francesa e as guerras napoleônicas; um renascimento ocorreu
com a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa; e uma terceira fase estaria por
vir, causada pela possibilidade de uma guerra termonuclear. Para Bobbio, um
conflito termonuclear representa um divisor de águas. E o principal pilar que
sustenta a Guerra Fria, enquanto conflito, na verdade, é a constante ameaça de uma
bomba atômica que hesitava sobre as nações.

Nenhuma guerra do passado, por mais longa e cruel que tenha sido,
colocou em perigo toda a história da humanidade; não se diz que em
seguida ao desencadeamento de uma guerra termonuclear aquilo que até
agora não ocorreu possa ocorrer. (BOBBIO, 2003, p. 60)

O período conhecido como Guerra Fria foi assim chamado pelos historiadores
pela falta de embates entre exércitos e bombardeios a países inimigos - um conflito
em que “a paz era impossível, mas a guerra era improvável” (ARBEX JÚNIOR, 2004,
p. 7). O combate físico era improvável, pois boa parte dos países influentes no
mundo havia acabado de sair de uma temporada sangrenta, a Segunda Guerra
Mundial (1939-1945). Por isso, as potências inimigas evitariam a todo custo o
confronto, que poderia eliminar de uma vez por todas a humanidade. Ao mesmo
tempo, a paz era impossível. A tensão entre os blocos comunista e capitalista era
constante e crescente. A sombra da bomba atômica pairava sobre as populações
tanto da União Soviética quanto dos Estados Unidos. “Nem paz nem guerra, e sim
13

um equilíbrio de forças entre os dois blocos, baseado no poder de mútua destruição:


o equilíbrio do terror” (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 7).

Na verdade, o lançamento da bomba atômica marca o início do antagonismo


entre as potências e, portanto, o início da Guerra Fria (ARBEX JÚNIOR, 2004).
Apesar de não haver consenso entre todos os historiadores, Arbex Júnior (2004) e
Hobsbawn (2003) consideram que os ataques às cidades japonesas Hiroshima e
Nagasaki, em 1945, determinaram o fim de uma era ensanguentada - a Segunda
Guerra Mundial - e o começo de uma era apreensiva, mas não menos brutal. A
dissolução da União Soviética, a potência comunista, em 1991, caracteriza, para
Hobsbawn(2003), o fim da Guerra Fria, em que o bloco socialista deu origem à
Comunidade de Estados Independentes. Já para Arbex Júnior (2004), o símbolo do
término do conflito foi a Guerra do Golfo, também em 1991, na qual os Estados
Unidos surgiram como nova potência econômica mundial e soberana. No total, o
medo de uma nova guerra nuclear, que caracterizou a Guerra Fria, ameaçou o globo
durante 46 anos.

Ideologia é a palavra-chave para descrever a Guerra Fria. Durante décadas, a


população mundial foi bombardeada por propaganda política, inserida de forma sutil
ou explícita em meios como o cinema, a televisão ou o rádio. A persuasão pretendia,
nos Estados Unidos ou na União Soviética, denegrir a ideologia contrária, “com
imagens que tentavam provar como os indivíduos do ‘outro lado’ eram sofredores”
(ARBEX JÚNIOR, 2004, p.11).

Os capitalistas mostravam que em seu próprio setor a vida era brilhante. Os


cidadãos comuns possuíam carros e bens de consumo, gozavam de
liberdade de trânsito e de opinião. As donas de casa tinham a vida facilitada
pelos novos aparelhos ou produtos inventados pela ciência e pela
tecnologia, como o aspirador de pó, o liquidificador, as roupas de fibra
sintética. Problemas existiam, é claro, mas eles poderiam ser
democraticamente debatidos e resolvidos. Já a vida do lado socialista era
triste, sombria e obscura, controlada pela polícia política e pelo Partido
Comunista. Filmes e documentários políticos exibiam longas filas de
cidadãos amargurados que tentavam comprar pão, leite e artigos básicos de
consumo diário. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 11)

Para os Estados Unidos, endemonizar o comunismo apresentou-se como a


saída para impedir que o modelo econômico da União Soviética se alastrasse.
Assim, Hobsbawn (2003) classifica a ideologia anticomunista, explorada à exaustão
pela retórica capitalista, como perigosa.
14

Como a URSS, os EUA eram uma potência representando uma ideologia,


que a maioria dos americanos sinceramente acreditava ser o modelo para o
mundo. Ao contrário da URSS, os EUA eram uma democracia. É triste, mas
deve-se dizer que estes eram provavelmente mais perigosos. Pois o
governo soviético, embora também demonizasse o antagonista global, não
precisava preocupar-se com ganhar votos no Congresso, ou com eleições
presidenciais e parlamentares. O governo americano precisava. Para os
dois propósitos, um anticomunismo apocalíptico era útil. (HOBSBAWN,
2003, p. 232)

Apesar da forte propaganda política norte-americana, o mesmo recurso era


utilizado na União Soviética. A principal crítica ao sistema capitalista era a
desigualdade e a concentração de renda por poucos. Prostituição, fome e
desemprego eram mazelas características do mundo consumista. Segundo a lógica
soviética, tais problemas nunca atingiriam o socialismo.

No lado socialista, as imagens revelavam o contrário. A vida no socialismo


era alegre e brilhante. Os cidadãos não precisavam mais se preocupar com
emprego, educação e moradia. A terra, que havia sido coletivizada,
prometia colheitas fartas e abundantes. A cada dia, novas conquistas
tecnológicas, especialmente nas áreas militar e espacial, mostravam a
superioridade do socialismo. Se havia problemas, eles seriam resolvidos por
toda a coletividade. Segundo os socialistas, o lado capitalista garantia vida
boa para alguns, ao passo que a maioria vivia uma situação de miséria,
privações e desemprego. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 11)

Um dos ingredientes da guerra mais explorados pela mídia, como forma de


persuasão, foi a existência de serviços secretos americanos e soviéticos,
popularmente conhecidos como espionagem. Cada bloco possuía a respectiva
agência de espionagem, em que treinavam espreitadores para descobrir segredos
de Estado ou planos do bloco inimigo. A prática ocorria dos dois lados. Na União
Soviética, a agência KGB era responsável pelo trabalho. Nos Estados Unidos, a
tarefa ficava a cargo da conhecida Central Intelligence Agency, ou CIA (ARBEX
JÚNIOR, 2004).
O serviço de espionagem tornou-se tema popular no cinema, especialmente
na série de longas-metragens que conta a saga do personagem James Bond, o
agente 007 do serviço britânico. Não por acaso, os filmes refletem fielmente os
interesses capitalistas da época. Ian Fleming, cujos livros originaram as produções
cinematográficas, foi, durante a década de 1950, espião da Grã-Bretanha em
Moscou (ARBEX JÚNIOR, 2004). Ao fazer uso da Indústria Cultural (ADORNO;
HORKHEIMER, 1944) já estabelecida nos países de modelo capitalista, os Estados
15

Unidos e aliados, como a própria Grã-Bretanha, puderam transmitir e reforçar ideais


antissoviéticos.
James Bond é um filho direto da Guerra Fria. Não por acaso, seu criador,
Ian Fleming, foi agente do serviço secreto britânico em Moscou nos anos
50. O primeiro livro da série, intitulado Da Rússia com amor, foi escrito em
1957 e adaptado para o cinema em 1963. Depois disso, Fleming escreveu
mais 12 livros, colocando seu herói nas mais incríveis e perigosas
situações, em que a mais alta tecnologia se combinava com homens cruéis
e lindas mulheres, sedutoras e sem qualquer tipo de escrúpulo. Mas o
mundo real da espionagem não tem nada a ver com a fantasia de Fleming .
(ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 66)

O universo da espionagem representado nos filmes do agente 007, no


entanto, não era fiel à realidade. A prática era muito menos cordial e mais violenta.
“Seriam necessários muitos capítulos como este para descrever com detalhes os
horrores praticados pela KGB dentro da União Soviética e no Leste Europeu”
(ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 70). Prisões, torturas e execuções eram algumas das
atividades da agência soviética. A CIA, por sua vez, existia para reunir informações
sobre países estrangeiros, aliados ou hostis. No entanto, a guerra psicológica
praticada por agentes norte-americanos também fez vítimas. “O ‘trabalho sujo’ no
exterior incluía a deposição de presidentes nacionalistas ou simpáticos à União
Soviética e a imposição de sangrentas ditaduras militares na África, na Ásia e na
América Latina” (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 71).
A propaganda política norte-americana ocorria por meio de todo tipo de mídia:
televisão, cinema, rádio. Em dado momento, o rádio chegou a ser protagonista na
propagação da ideologia capitalista, por causa do fácil acesso à população.

A propaganda política também era fundamental. Um exemplo muito


poderoso disso pode ser medido pelo uso de emissoras de rádio que
transmitiam para outros países. (...) O rádio assumiu maior importância que
a televisão por ser quase impossível impedir que mesmo um aparelho
pequeno e de baixa potência recebesse sinais. Garantir o funcionamento
desse esquema, tanto no sentido de viabilizar a emissão quanto no sentido
de bloquear a recepção, era tarefa das comunidades de informações.
(ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 76)

A ideologia antissoviética nos Estados Unidos chegou a tal nível que


reverberou na produção de filmes em Hollywood, antes mesmo da Guerra Fria ter
oficialmente começado. Os comunistas, ou até mesmo “possíveis comunistas”, eram
perseguidos por toda a população, doutrinada pela mídia norte-americana. Na
década de 1940, “o Comitê Parlamentar de Investigação de Atividades
Antiamericanas forçou 50 executivos de Hollywood a demitirem dez dos melhores
16

escritores e produtores suspeitos de simpatizarem com o comunismo” (ARBEX


JÚNIOR, 2004, p. 73).
O anticomunismo era genuína e visceralmente popular num país construído
sobre o individualismo e a empresa privada, e onde a própria nação se
definia em termos exclusivamente ideológicos (‘americanismo’) que podiam
na prática conceituar-se como o pólo oposto ao comunismo. (HOBSBAWN,
2003, p. 232)

Em 1961, uma Alemanha já dividida em ideologias começou a concretizar sua


divergência. No mês de agosto desse ano, iniciou-se a construção do Muro de
Berlim. Com 45 quilômetros de extensão e três metros de altura, a barreira dividia a
capital alemã em oriental e ocidental, soviética e capitalista, respectivamente. A
Alemanha Oriental era também chamada de República Democrática Alemã ou
Alemanha Socialista. Alemanha Ocidental era também o nome da República Federal
da Alemanha, que adotava o capitalismo como modelo econômico. Ao longo de toda
a extensão do Muro de Berlim, postos de vigília garantiam que ninguém passasse
para o outro lado. A construção do Muro, na verdade, pretendia impedir a grande
evasão de pessoas do lado socialista para o capitalista. Jovens, professores,
intelectuais e trabalhadores qualificados buscavam melhores condições de vida em
Berlim Ocidental (ARBEX JÚNIOR, 2004).
É possível afirmar que o êxodo de grande parte da população do lado
socialista de Berlim ilustrava a crise pela qual passava o bloco soviético nos anos
1980. Fome, prostituição, desemprego e trabalho escravo, infortúnios que a
propaganda comunista sempre acusara como característicos da sociedade
capitalista, assolavam a população na União Soviética. Tais males, aliados à falta de
liberdade de expressão na ditadura comunista e à concentração de renda,
apontavam o início do fim do bloco.

A falta dos produtos mais simples, como sabonetes, roupas, calçados e


objetos do dia-a-dia, além de pão, leite e alimentos em geral, provocava
filas imensas. Apesar desse quadro catastrófico, ninguém era livre para
reclamar, sob pena de ser acusado e preso como “anti-socialista”, “traidor”,
“espião” ou “agente provocador a serviço do capitalismo”. Os funcionários
do Estado e do Partido Comunista formavam uma camada de burocratas
privilegiados que tinha acesso a bens e regalias fora do alcance da
população comum. Assim, “socialismo” virou sinônimo de corrupção
desenfreada, garantida pela repressão da polícia política. (ARBEX JÚNIOR,
2004, p. 105)

A dissolução da União Soviética significou, para muitos, libertação de uma


ditadura. Ao mesmo tempo, a população criou uma idealização do que seria o
17

capitalismo e sonhava em ser livre para comprar o produto que desejassem. Não
levavam em conta, no entanto, as mazelas que o capitalismo desigual traz.

O grau de euforia era tão grande que Francis Fukuyama, um funcionário


público americano, chegou a afirmar que a humanidade havia encontrado o
regime ideal: o de mercado capitalista. Era o fim de uma história, no sentido
de uma busca que se encerrava. Em apenas dois ou três anos, as ilusões
foram despedaçadas. O antigo bloco socialista começara a sentir na pele os
problemas do desemprego, do desequilíbrio social, da frustração
profissional. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 108)

José Arbex Júnior (2004) chega à conclusão de que a humanidade está ainda
muito longe de desenvolver o sistema político-econômico ideal, que seja capaz de
suprir as necessidades de todos, sem corrupção ou desigualdade. Nem o
capitalismo dos Estados Unidos, nem o socialismo Soviético puderam cumprir essa
demanda. Hoje, a Guerra Fria, 24 anos depois, ainda produz consequências na
sociedade moderna, e, justamente por isso, é difícil medir a real proporção.

Basta lembrar que um dos fenômenos mais marcantes da cultura


contemporânea, o desenvolvimento da informática e a criação da rede
Internet de comunicação virtual, foi uma emanação direta das experiências
do Pentágono, iniciadas quando o mundo ainda era dividido entre as
superpotências. A transmissão de informações e de imagens por
computador, hoje tão comum na vida cotidiana, correspondeu,
originalmente, a uma necessidade estratégica, numa época em que a
tecnologia em informática controlada pela então União Soviética
encontrava-se num estágio bem inferior ao alcançado pelos Estados
Unidos. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 207)

Para Arbex Júnior (2004, p. 208), uma das decorrências da Guerra Fria é
certa. Uma vez que os 46 anos foram marcados pela disputa ideológica entre os
dois blocos, acentuou-se “a antiga e perigosa lógica da exclusão do Outro, do
diferente”. A crença de que o inimigo é inferior, por vezes até inumano, foi legitimada
pelo bombardeio ideológico promovido pela mídia, através do cinema, do rádio e da
televisão. Tais opiniões se refletem até hoje, principalmente em produções
cinematográficas que abordem o período da guerra. Bobbio (2003) destaca o caráter
autodestrutivo da Guerra Fria. Para ele, um conflito termonuclear seria uma
concepção tão distorcida, enquanto decisão de autoridades, que chegaria ao ponto
de perder o objetivo.
A guerra termonuclear não convém ao objetivo. O primeiro objetivo da
guerra é a vitória. (...) Mas à medida que a potência das armas aumenta, no
caso de a guerra explodir com toda a sua virulência, torna-se cada vez mais
difícil distinguir o vencedor do vencido. (BOBBIO, 2003, p. 61)
18

O caráter ideológico da Guerra Fria é endossado pelo poder persuasivo de


manifestações culturais, como o cinema. No segundo capítulo deste trabalho, será
abordada a capacidade linguística da sétima arte e sua relação estreita com o
conceito de Indústria Cultural e a própria ideologia .
19

2 INDÚSTRIA CULTURAL, IDEOLOGIA E CINEMA COMO LINGUAGEM

“Desde o começo é possível perceber como terminará um filme, quem será


recompensado, punido ou esquecido” (ADORNO, 2006, p. 14). Abordar o cinema
norte-americano, ou hollywoodiano, necessariamente implica vislumbrar o conceito
de indústria cultural. Concebida por Theodor Adorno e Max Horkheimer em 1944, a
definição de Indústria Cultural retira o manto de encantamento que cobre a cultura
americana e europeia, e prova, por lógica, que existem ideologias e interesses
comerciais e políticos por trás da música, do rádio, da televisão e, naturalmente, do
cinema. A cultura como mercadoria e meio de obtenção de lucro é elaboração
originalmente capitalista, o que torna a abordagem do conceito ainda mais
fundamental para o estudo da retórica norte-americana durante e depois da Guerra
Fria.
Adorno e Horkheimer (1944) foram visionários ao perceber padronizações,
semelhanças e doutrinas no que foi chamado, posteriormente, de “cultura de
massa”, antes mesmo de a guerra ideológica entre Estados Unidos e União
Soviética ter início. Conseguiram exprimir e organizar, no final da Segunda Guerra
Mundial, aquilo que se intensificaria durante os 46 anos de conflito. Na verdade, não
é exagero afirmar que indústria cultural e cultura de massa são concepções válidas
e perceptíveis ainda hoje, 72 anos depois de “Dialética do Esclarecimento” (1944).
Para Adorno (2006), a ideologia é indissociável da concepção de indústria
cultural. A dura crítica que o autor faz aos conteúdos, produzidos unicamente para a
venda, leva em conta que a persuasão é um elemento importante na equação
ideológica.
O cinema e o rádio não têm mais necessidade de serem empacotados
como arte. A verdade de que nada são além de negócios lhes serve de
ideologia. Esta deverá legitimar o lixo que produzem de propósito. O cinema
e o rádio se autodefinem como indústrias, e as cifras publicadas dos
rendimentos de seus diretores-gerais tiram qualquer dúvida sobre a
necessidade social de seus produtos. (ADORNO, 2006, p. 8)

Como abordado no primeiro capítulo deste trabalho, “persuasão” era uma das
palavras-chave na guerra de concepções entre capitalismo e socialismo, que, por
meio da exposição midiática e de elementos culturais, como o rádio, a televisão e o
cinema, transmitiam princípios e valores condizentes com os respectivos interesses.
Para Citelli (2002, p. 6), “o elemento persuasivo está colado ao discurso como a pele
ao corpo”.
20

Ele se dota de signos marcados pela superposição. São signos que,


colocados como expressões de “uma verdade”, querem fazer-se passar por
sinônimos de “toda a verdade”. Nessa medida, não é difícil depreender que
o discurso persuasivo se dota de recursos retóricos objetivando o fim último
de convencer ou alterar atitudes e comportamentos já estabelecidos. Isso
nos leva a deduzir que o discurso persuasivo é sempre expressão de um
discurso institucional. As instituições falam através dos signos fechados,
monossêmicos, dos discursos de convencimento. (CITELLI, 2002. p. 32)

Pode-se afirmar que Foucault (1996) reconhece a ligação entre discurso,


persuasão e poder. Afinal, o que as potências desejavam na Guerra Fria era nada
mais que isso: poder econômico e político.
Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as
interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o
desejo e com o poder. Nisto não há nada de espantoso, visto que o discurso
- como a psicanálise nos mostrou - não é simplesmente aquilo que
manifesta (ou oculta) o desejo; é, também,aquilo que é o objeto de desejo; e
visto que - isto a história não cessa de nos ensinar - o discurso não é
simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas
aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar.
(FOUCAULT, 1996, p. 10)

Os discursos dos Estados Unidos e da União Soviética buscavam o mesmo


objetivo: a soberania do respectivo modelo econômico no mundo. No entanto, cada
um à sua maneira. Os EUA conquistaram a população ao ostentar as maravilhas
tecnológicas proporcionadas pelo capitalismo e, ao mesmo tempo, denegrir a
imagem do modelo comunista. A URSS fazia o mesmo, com propagandas
dedicadas a expor as vantagens da “igualdade” garantida pelo socialismo e exibir a
prostituição, a fome e o desemprego como chagas do capitalismo. A União Soviética
vivia um regime ditatorial. Os Estados Unidos, a democracia (ARBEX JÚNIOR,
2003). Os discursos esforçados de ambos, no entanto, podem ser caracterizados
como discursos autoritários (CITELLI, 2002). A repetição de ideias, por exemplo,
ocorria nas tentativas de persuasão das duas potências mundiais.

O discurso autoritário lembra um circunlóquio: como se alguém falasse para


um auditório composto por ele mesmo. É na forma discursiva que o poder
mais escancara suas formas de dominação. Enquanto o discurso lúdico e o
polêmico tendem a um maior ou menor grau de polissemia, o autoritário
fixa-se num jogo parafrásico, ou seja, repete uma fala já sacramentada pela
instituição: o mundo do diálogo perdeu a guerra para o mundo do monólogo.
A sociedade moderna está fortemente impregnada desta marca autoritária
do discurso. A persuasão ganhou força de mito. Afinal, a propaganda é ou
não é a alma do negócio? (CITELLI, 2002, p. 38)

Althusser (1980) aponta a cultura como ferramenta de controle e persuasão


do Estado. O cinema, o rádio e a televisão são denominados pelo autor como
21

Aparelhos Ideológicos de Estado, cuja função principal é assegurar a harmonia nas


formações sociais capitalistas contemporâneas. Aliados aos Aparelhos Repressivos
de Estado, cuja forma de dominação ocorre pela violência, os AIE possuem relação
estreita com o conceito de discurso apresentado por Citelli (2002), uma vez que as
expressões culturais, como o cinema, são formas de discurso.

Cada um deles concorre para este resultado único da maneira que lhe é
própria. O aparelho político sujeitando os indivíduos à ideologia política de
Estado, a ideologia democrática, indirecta (parlamentar) ou directa
(plebiscitária ou fascista). O aparelho de informação embutindo, através da
imprensa, da rádio, da televisão, em todos os cidadãos, doses quotidianas
de nacionalismo, chauvinismo, liberalismo, moralismo, etc. O mesmo
acontece com o aparelho cultural. (ALTHUSSER, 1980, p. 63)

Se o cinema é uma forma de discurso, é possível apontá-lo também como


uma linguagem. Como coloca Martin (2003), o cinema tornou-se linguagem por ter
uma escrita própria, cabendo a cada realizador, ou seja, diretor, um estilo próprio. “O
cinema transformou-se, por esse motivo, num meio de comunicação, de informação,
de propaganda, o que não constitui, evidentemente, uma contradição da sua
qualidade de arte” (MARTIN, 2003, p. 22).
Na verdade, é por ser linguagem que a sétima arte possui poder notável de
convencimento, persuasão e difusão de pontos de vista (MARTIN, 2003). O cinema
é assim considerado por representar, mais fielmente que a fotografia, por exemplo, a
realidade. Metz (1972) concebe a simulação da realidade uma das características
mais problemáticas da cinematografia.

De todos estes problemas de teoria do filme, um dos mais importantes é o


da impressão de realidade vivida pelo espectador diante do filme. Mais do
que o romance, mais do que a peça de teatro, mais do que o quadro do
pintor figurativo, o filme nos dá o sentimento de estarmos assistindo
diretamente a um espetáculo quase real. (METZ, 1972, p. 16)

O que difere a produção cinematográfica do real é, justamente, a


manipulação. O que está na tela foi pensado, escrito, montado e editado por alguém.
Se “o elemento persuasivo está colado ao discurso como a pele ao corpo” (CITELLI,
2002, p. 6), o cinema não pode estar completamente livre de manipulação da
realidade.

Esta ambiguidade de relação entre o real objectivo e a sua imagem fílmica é


uma das características fundamentais da expressão cinematográfica e
22

determina em grande parte a relação do espectador com o filme, relação


que vai desde a crença ingênua na realidade do real representado à
percepção intuitiva ou intelectual dos signos implícitos como elementos de
uma linguagem. (MARTIN, 2003, p. 24)

Martin destaca três graus em que o cinema afeta o espectador. No primeiro


grau, ocorre a mera reprodução do real na tela. No segundo, a sensibilização de
quem assiste. No terceiro grau, a imagem “toma uma significação ideológica e
moral” (MARTIN, 2003, p. 35).
O fundamento psicológico, segundo Metz (1972), é no que se baseia a
impressão de realidade que permeia a sétima arte. Embora o espectador saiba, na
maioria das vezes, que as cenas a que está assistindo não são os acontecimentos
verdadeiros, acontece o que Metz denomina “transferência de realidade”. Para que
isso aconteça, o estímulo é um espetáculo parecido com o do mundo real. A
semelhança com a realidade é artifício utilizado, conscientemente ou não, para a
propagação de mensagens. A mensagem, aliás, é o triunfo da significação no
cinema (METZ, 1972).

Não é nunca o fluir do mundo que Eisenstein mostra, mas sempre, como ele
disse, o fluir do mundo refratado através de um “ponto de vista ideológico”,
inteiramente pensado, significante de fio a pavio. O sentido não basta,
precisa acrescentar a significação. (METZ, 1972, p. 52).

Para Aumont (2009), o discurso no cinema vai além: está atrelado a qualquer
tipo de representação. Até mesmo a simples exibição de um objeto é “um ato de
ostentação que implica que se quer dizer algo a propósito desse objeto” (AUMONT,
2009, p. 90). Ainda mais profundamente, o autor cita o cinema como o veículo das
representações que uma sociedade tem de si mesma, comparável às narrativas
míticas. Na verdade, uma substituição ou versão moderna das mesmas. Ainda
assim, o elemento “realidade” na representação cinematográfica é dubitável. Para o
autor, qualquer filme, ainda que busque retratar fatos, não deixa de ser ficcional.
Essa consideração é importante ao levar em conta que diversas produções, ao
longo dos anos, pretendiam delinear a verdade histórica do que ocorreu durante a
Guerra Fria.

No cinema, representante e representado são ambos fictícios. Nesse


sentido, qualquer filme é um filme de ficção. O filme industrial, o filme
científico, assim como o documentário, caem sob essa lei que quer que, por
seus materiais de expressão (imagem em movimento, som), qualquer filme
23

irrealize o que ele representa e o transforme em espetáculo. O espectador


de um filme de documentação científica não se comporta, aliás, de maneira
diferente de um espectador de filme de ficção: ele suspende qualquer
atividade, pois o filme não é a realidade e, nessa qualidade, permite recuar
diante de qualquer ato, de qualquer conduta. Como seu nome indica, ele
também está no espetáculo. A partir do momento em que um fenômeno se
transforma em espetáculo, a porta está aberta para o devaneio (mesmo se
adquire a forma séria da reflexão), pois só se requer do espectador o ato de
receber imagens e sons. O espectador do filme está tanto mais inclinado a
isso quanto, pelo dispositivo cinematográfico e por seus próprios materiais,
o filme se aproxima do sonho sem, contudo, confundir-se com ele.
(AUMONT, 2009. p. 100)

Tal objetivo, de delinear a verdade histórica, é apontado por Aumont (2009),


como recurso nos filmes de ficção. A escolha de temas históricos serve para tornar o
discurso cinematográfico mais natural e oferece, também, uma plataforma na qual
se apoia a ideologia.
Para tornar seu trabalho e sua função naturais, o filme de ficção tende, com
freqüência, a escolher como tema as épocas históricas e os pontos de
atualidade a respeito dos quais já existe um "discurso comum". Assim, finge
submeter-se à realidade, enquanto só tende a tornar sua ficção verossímil.
Aliás, é por aí que ele se transforma em veículo para a ideologia.
(AUMONT, 2009, p. 106)

A significação no cinema, como abordado, comporta conceitos como discurso,


realidade, persuasão, manipulação e ideologia. Somente através da análise
cinematográfica é possível compreender como tais concepções se tornam armas
políticas culturais. Para Metz (1972, p. 15), “é através da reflexão sobre os filmes de
que gostamos (ou de que não gostamos...) que conseguimos alcançar numerosas
verdades referentes à arte do filme em geral”.
A Poética do Filme, inspirada na Poética do filósofo grego Aristóteles, propõe
a análise cinematográfica a partir do pressuposto de que o filme é um “conjunto de
dispositivos e estratégias destinadas a produzir determinados efeitos sobre o
espectador” (ESTEVES, 2011, p. 6). Cabe ao analista, através da Poética,
reconhecer, dissecar, classificar e associar os elementos e dispositivos presentes no
filme, considerando as três seguintes dimensões em que se manifestam: efeitos,
estratégias e recursos. A decomposição de cada uma das três dimensões é
essencial para o funcionamento da análise.

Os meios ou recursos expressivos dizem respeito aos materiais visuais


(escala de planos, fotografia, enquadramento, movimentos de câmera, luz,
profundidade de campo), sonoros (trilha sonora e música), cênicos (direção
de atores, cenários e figurinos, direção de arte) e narrativos (composição da
24

história, seu argumento e sua trama, peripécias e desenlaces) da obra


fílmica. (ESTEVES, 2011, p. 6)

A Poética destaca ainda que os recursos cinematográficos podem ser


direcionados para a produção três tipos de efeitos: sensoriais, cognitivos e
emocionais. Os efeitos sensoriais encontram-se no âmbito estético da produção
fílmica. Os cognitivos estão no campo comunicacional, no qual o objetivo é transmitir
sentido, mensagem ou ideia. Já os efeitos emocionais apontam para produzir, no
espectador, efeitos “de ânimo”. Naturalmente, os efeitos destacados na Poética não
ocorrem separada e isoladamente - podem ser confundidos ou percebidos juntos.
Para a presente análise, o efeito a ser privilegiadamente observado é o cognitivo,
uma vez que o objeto de estudo é a transmissão de mensagens e ideias na retórica
fílmica capitalista durante a Guerra Fria.
A decomposição é etapa imprescindível na análise fílmica também para
Penafria (2009), que define a análise de filmes como sinônimo de decompor este
filme. Somente por meio da decomposição é possível interpretar, ou seja,
compreender como se dá a relação entre os elementos que constituem a produção.
“Trata-se de fazer uma reconstrução para perceber de que modo esses elementos
foram associados num determinado filme” (PENAFRIA, 2009, p. 2).

Uma vez identificadas as recorrências estilísticas nessa obra - ou seja, sua


constante temática, o modo como usa a câmera, a trilha sonora, direção de
fotografia, entre outros inúmeros recursos - identificação esta facilitada
pelas premissas da politique, cabe ao analista aplicar a Poética do Filme
para tentar explicar de que modo essas marcas de autoria funcionam
internamente na obra. (PENAFRIA, 2009, p. 8)

Apesar de não existir uma só metodologia para a interpretação no cinema,


Penafria (2009) destaca a importância da competência do analista e da capacidade
de observação atenta aos planos da produção cinematográfica. Além disso, é
possível, para facilitar o processo, enquadrar a análise em determinada
classificação. Assim, a análise de um filme pode ser textual, de conteúdo, poética ou
da imagem e do som.
É comum que as tipologias se confundam entre si. No entanto, a análise a ser
feita no presente trabalho pode ser enquadrada como de conteúdo, ou seja, que
“considera o filme como um relato e tem apenas em conta o tema do filme”
(PENAFRIA, 2009, p. 6). Segundo Penafria, essa forma de análise implica identificar
o tema do filme, fazer um resumo sobre a história que conta e decompor a produção
25

levando em conta o que diz sobre determinado tema. No caso do presente trabalho,
o tema geral é Guerra Fria. Serão interpretadas três produções: Moscou Contra 007
(From Russia with Love, 1963, Terence Young), Caçada ao Outubro Vermelho (The
Hunt for Red October, 1990, John McTiernan) e Ponte dos Espiões (Bridge of Spies,
2015, Steven Spielberg). No capítulo a seguir, será abordada a metodologia do
trabalho, em que é possível entender como foi feita a escolha dos filmes e qual será
o trajeto de análise das produções.
26

3 METODOLOGIA

O objeto de estudo deste TCC é a retórica da ideologia capitalista que se


apresenta nas formas culturais, em que o cinema é a principal manifestação
abordada. Tal retórica será, a seguir, estudada em produções cinematográficas
apresentadas à sociedade durante a Guerra Fria, no final do conflito e anos depois
do término do embate. As considerações feitas no trabalho se inserem no paradigma
qualitativo, uma vez que levam em conta aspectos como discurso, ideologia,
linguagem cinematográfica e fatos históricos. O termo qualitativo contempla
características de natureza estrutural de um objeto – aqui, os objetos são as
produções cinematográficas. Seu significado é oposto ao de quantitativo, em que
são levados em conta valores, dados e quantidades numéricas.

A análise qualitativa é menos formal do que a análise quantitativa, pois


nesta última seus passos podem ser definidos de maneira relativamente
simples. A análise qualitativa depende de muitos fatores, tais como a
natureza dos dados, a extensão da amostra, os instrumentos de pesquisa e
os pressupostos teóricos que nortearam a investigação. Pode-se, no
entanto, definir esse processo como uma seqüência de atividades, que
envolve a redução dos dados, a categorização desses dados, sua
interpretação e a redação do relatório. (GIL, 2002, p. 133)

A pesquisa documental é a principal estratégia de verificação do objeto aqui


estudado e consiste na análise de documentos considerados autênticos, que podem
ser cartas, pareceres, fotografias, atas, relatórios, obras originais de qualquer
natureza – pintura, escultura, desenho -, notas, diários, etc. No caso, a categoria do
objeto escolhido cabe em obra cinematográfica. Para Bardin (1979, p. 45), “a análise
documental tem por objetivo dar forma conveniente e representar de outro modo
essa informação”. A autora define ainda a análise de conteúdo, categoria em que se
encaixa este trabalho, como “atitude de vigilância crítica”. “É ainda dizer não à leitura
simples do real, sempre sedutora, forjar conceitos operatórios, aceitar o caráter
provisório das hipóteses, definir planos experimentais ou de investigação” (BARDIN,
1979, p. 28).
As obras cinematográficas escolhidas para análise são Moscou Contra 007
(YOUNG, 1963), Caçada ao Outubro Vermelho (MCTIERNAN, 1990) e Ponte dos
Espiões (SPIELBERG, 2015). Os filmes foram selecionados para análise com base
em critérios, como: abordar o tema geral, a Guerra Fria, e ter sido veiculado em
circuito comercial, uma vez que o conceito de Indústria Cultural está presente na
27

realização da análise. Além disso, um dos filmes deve datar da primeira metade da
Guerra Fria (MOSCOU, 1963); um do período do fim da guerra (CAÇADA,1990); e
um que tenha sido lançado nos últimos dez anos (PONTE, 2015).
Ao analisar tais produções específicas, o objetivo é traçar uma linha do tempo
da manifestação cultural na Guerra Fria, uma vez que os filmes foram divulgados em
datas marcantes da disputa entre os blocos capitalista e socialista, e verificar quais
são os elementos da ideologia norte-americana nas produções, como eles se
apresentam como ferramentas e sua constância – ou não - nos períodos de
lançamento dos filmes.
O icônico personagem James Bond, o agente secreto da Grã-Bretanha, faz a
primeira aparição nos cinemas na segunda década da Guerra Fria, em 1962, no
filme 007 Contra o Satânico Dr. No. Mas é no ano seguinte, em Moscou Contra 007,
que o personagem marca a memória da população. Caçada ao Outubro Vermelho,
uma adaptação de fatos ocorridos na década de 1980, estreou nas telas de cinema
em 1990, época em que a União Soviética encontrava-se enfraquecida, pouco antes
de anunciar seu fim, no ano seguinte. Também uma leitura de acontecimentos da
Guerra Fria na década de 1960, Ponte dos Espiões propõe uma visão dos fatos sob
a ótica moderna, 24 anos depois do fim do conflito, em 2015. Além do tema geral, os
filmes também têm em comum o fato de representarem a ideologia e o discurso do
lado capitalista do embate, apesar de não serem necessariamente produções norte-
americanas. Moscou Contra 007, por exemplo, é de origem britânica, nacionalidade
que apoiava os princípios capitalistas da época.
Para que sejam identificados os elementos que compõem a retórica
capitalista no cinema, a análise cinematográfica é a metodologia mais adequada,
apesar de não haver uma só metodologia mais eficaz. Dentre os tipos de análise
cinematográfica propostos por Manuela Penafria (2009), a mais indicada para o
objetivo do trabalho é a de conteúdo, em que o principal fator considerado na
produção é o tema. No caso, o tema geral a ser analisado é a Guerra Fria. Dessa
forma, as análises dos três filmes ocorrerão separadamente e por ordem cronológica
de lançamento (1963, 1990 e 2015). Algumas etapas constituem-se importantes
para que a análise seja realizada: a identificação do tema do filme, a realização de
um breve resumo sobre a produção e a decomposição da mesma, tendo em mente
o tema do filme. Assim, a análise consiste em observar a obra, identificar os
componentes relevantes em relação à retórica capitalista na Guerra Fria e interpretá-
28

los sob a ótica da teoria da Indústria Cultural, além de levar em conta o poder do
cinema como discurso e linguagem.
Dentro das análises fílmicas, serão levados em conta os seguintes aspectos:
 de que forma são apresentadas as figuras do herói e do vilão e/ou do
Bem e do Mal;
 as representações físicas, psicológicas e de personalidade do
personagem capitalista e do personagem soviético;
 a relação entre capitalistas e socialistas;
 as noções técnicas, como ângulos e enquadramentos de câmera, que
são significativas para a transmissão de mensagens nas produções;
 os fatos apresentados nos filmes, sob a ótica de fontes da história da
Guerra Fria, de acordo com os períodos históricos correspondentes ao
ano de lançamento da produção e ao ano em que se passa o enredo
do filme.

Tais características são comuns nas explorações das três obras


cinematográficas. No entanto, cada produção possui peculiaridades e
particularidades que serão também contempladas, separadamente, no capítulo a
seguir. Dessa forma, é possível vislumbrar de que maneira a ideologia norte-
americana se apresentou como ferramenta cultural da Guerra Fria e se tal
instrumento ainda existe e é utilizado com o mesmo objetivo.
29

4 ANÁLISE DOS FILMES

O percurso de análise definido por Penafria (2009), dentro da categoria de


análise de conteúdo, considera o tema geral como o ponto de partida. A
decomposição do filme é a etapa mais importante antes de começar a considerar os
pontos a serem contemplados na análise. Na interpretação em si, ou seja, a análise
em texto, o primeiro passo é fazer um breve resumo da produção, ou sinopse.
Depois disso, podem ser explorados os aspectos que o analisador considera mais
relevantes no filme. Neste trabalho, tais aspectos correspondem a: de que forma são
apresentadas as figuras do herói e do vilão e/ou do Bem e do Mal; as
representações físicas, psicológicas e de personalidade do personagem capitalista e
do personagem soviético; a relação entre capitalistas e socialistas; as noções
técnicas, como ângulos e enquadramentos de câmera, que são significativas para a
transmissão de mensagens nas produções; os fatos apresentados nos filmes, sob a
ótica de fontes da história da Guerra Fria, de acordo com os períodos históricos
correspondentes ao ano de lançamento da produção e ao ano em que se passa o
enredo do filme. Além das orientações indicadas por Penafria (2009), o trabalho
levará em conta mais um elemento na visão a ser abordada: o contexto histórico da
Guerra Fria.
A rivalidade entre as potências Estados Unidos e União Soviética, capitalista
e socialista, durou mais de quatro décadas, em clima constante de tensão. O mundo
beirava a destruição por ataques nucleares. O arrasamento da humanidade não
aconteceu, mas o combate foi verdadeiro no campo intelectual. Estados Unidos e
União Soviética desejavam a soberania mundial do respectivo modelo econômico,
que não poderia ser coexistente. Espionagem, tortura e propaganda ideológica
foram artifícios utilizados de ambos os lados, em busca do ponto fraco do inimigo. À
União Soviética, no entanto, faltava uma ferramenta que os Estados Unidos
possuíam: uma cultura fortalecida e marcante, inconfundivelmente atrelada ao
entretenimento. E que, de forma engenhosa, servia como disseminação ideológica.
Eis a definição de Indústria Cultural.
A indústria cultural (ADORNO; HORKHEIMER, 1944) é um dos meios
utilizados pelo sistema capitalista para propagar ideologias e visões de mundo.
Fazem parte dela, como indica o nome, qualquer manifestação cultural, como o
rádio, a música, a televisão e o cinema. As manifestações culturais são
30

denominadas por Althusser (1980) como um dos “Aparelhos Ideológicos de Estado”,


cuja função principal é assegurar a harmonia na formação capitalista. Assim,
Indústria Cultural e Aparelhos Ideológicos de Estado são concepções que se
complementam, ao descortinar o poder de sedução e persuasão que a cultura pode
adquirir. O cinema, enquanto linguagem que une som e imagem, no propósito de
reproduzir a realidade, talvez seja a arma mais poderosa da Indústria Cultural - ou o
Aparelho Ideológico de Estado mais significativo. Seja o mais potente ou não, o
cinema foi um dos recursos utilizados no momento em que a ideologia capitalista
mais buscava reafirmação e convencimento: a Guerra Fria. E James Bond, o agente
007, foi o personagem cinematográfico mais significativo da época, ao representar,
em forma humana, todos os propósitos capitalistas. A influência do herói é
perceptível até hoje: basta contar quantos filmes foram produzidos desde o início,
em 1962. A conta já totaliza 27 produções.
A análise seguirá a ordem cronológica de produção dos filmes e serão
comentados os aspectos anteriormente referidos. A observação das produções está
organizada em subtítulos que contemplam as características mais importantes e
particulares de cada uma.

4.1 Moscou Contra 007 (From Russia With Love, Terence Young, 1963)

● Ficha Técnica:
○ Direção: Terence Young
○ Elenco: Sean Connery, Lotte Lenya, Daniela Bianchi, Pedro
Armendariz, Robert Shaw, Bernard Lee
○ Adaptação: JohannaHardwood
○ Roteiro: Richard Maibaum
○ Trilha sonora: John Barry, Lionel Bart
○ Produção: Albert R. Broccoli, Harry Saltzman
31

Figura 1: poster do filme Moscou Contra 007.

“James Bond é um filho direto da Guerra Fria” (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 66).
Mais do que direto, é herdeiro legítimo dos valores capitalistas presentes no embate.
Não por acaso, mencionar espionagem implica, na maioria das vezes, citar o famoso
agente 007 do serviço secreto britânico. O personagem consagrou-se no cinema,
mas é do universo literário a sua origem. Ian Fleming (1908-1964) apresentou ao
mundo o personagem em doze romances, mas não viveu para presenciar o impacto
que o herói da Guerra Fria exerceu quando adaptado para o cinema. O personagem
James Bond talvez tenha sido baseado no próprio criador: Fleming foi, também,
agente do serviço secreto britânico em Moscou, durante os anos 1950 (ARBEX
JÚNIOR, 2004). Por isso, James Bond não é apenas filho direto da Guerra Fria, mas
serviu também para representar, endossar e reforçar os ideais do país de origem, a
Grã-Bretanha. Apesar de o país líder do bloco capitalista ser os Estados Unidos, e
não a Grã-Bretanha, ambos compartilhavam da mesma ideologia, unidos contra o
pretendido comunismo na União Soviética. E a espionagem funcionou como
conceito-chave na divulgação dos ideais capitalistas por meio dos filmes de James
Bond.
Ligada ao mistério, a espionagem é tema que atrai, até hoje, o interesse da
população. Não por acaso, é o assunto mais explorado nas produções que ilustram
as aventuras do agente 007, permeadas por instrumentos mortais e altamente
tecnológicos, além de belas e indefesas mulheres, perfeitas reféns.

O mundo de James Bond, ou seja, o mundo da espionagem em locais


situados no coração do bloco inimigo, ocupava um lugar relativamente
pequeno nas atividades das “comunidades de informações”. Seu principal
foco de atuação eram os países do Leste Europeu, em particular a
Alemanha dividida. Os agentes, porém, não tinham, nem de longe, o
32

charme de Sean Connery nem a astúcia dos espiões do cinema. Eram, em


geral, burocratas, funcionários públicos, cientistas simpáticos à causa do
bloco inimigo ou simplesmente mercenários em busca de dinheiro em troca
de informações. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 77)

Na Guerra Fria, a prática era bem menos glamorosa do que deixam


transparecer os filmes. As agências de informação, tanto norte-americanas como
soviéticas, foram responsáveis por milhares de mortos e torturados (ARBEX
JÚNIOR, 2004). A CIA, do lado capitalista, tinha como função principal reunir
informações sobre países estrangeiros, aliados ou inimigos. Foi também autora de
guerras psicológicas e implantações de ditaduras militares em países mais fracos,
como os da África. Já a KGB, do lado socialista, era incumbida de prisões, torturas e
mortes dentro de falsos hospitais psiquiátricos ou campos de concentração (ARBEX
JÚNIOR, 2004). A Guerra Fria, afinal, não se mostrou tão fria assim para alguns.
Da Rússia, com Amor (1957) é uma das obras de Ian Fleming que foi
adaptada ao cinema, sob o título de Moscou Contra 007, em 1963. Dirigida por
Terence Young e estrelada pelo ator britânico Sean Connery como o herói, a
produção é, dentre as da série, a que mais abertamente aborda a Guerra Fria. Na
obra, James Bond (Sean Connery) é enviado para Istambul, na missão de capturar a
máquina Lektor, capaz de interceptar e enviar mensagens despercebidas pelo
inimigo. O aparelho, no entanto, se encontra no consulado da Rússia na capital da
Turquia. O agente conta com a ajuda de uma bela espiã russa, e funcionária do
consulado, Tatiana Romanova (Daniela Bianchi). Sob ordens da ríspida
comandante, também russa, Rosa Klebb (Lotte Lenya), Tatiana finge ser desertora
para atrair Bond ao encontro da organização criminosa SPECTRE. O encontro de
Bond e Romanova, no entanto, resulta em uma relação amorosa. Assim, os dois se
unem para roubar a máquina e destruir o inimigo soviético.

4.1.1 Meios de persuasão no discurso

Moscou Contra 007 deixa clara a oposição entre Grã-Bretanha e União


Soviética, capitalismo e socialismo. Não há intenção, por parte do diretor, de velar a
representação do conflito. Há, inclusive, menção direta à Guerra Fria, em uma frase
da personagem Rosa Klebb: “A Guerra Fria em Istambul deixará de ser fria em
33

breve”. A declaração da comandante russa, em tom de ameaça, sugere que a


potência socialista pretende acabar com a paz estática e tensa que pairava sobre o
mundo. De fato, James Bond e o aliado, Kerim Bey, sofrem atentado na cena
seguinte. Na verdade, o comportamento intimidador por parte da figura comunista é
recorrente na produção, a começar pelo título. Em português, “Moscou Contra 007”
sugere uma ação violenta que parte primeiro da capital russa e berço da potência
comunista em direção ao agente 007, que representa o serviço secreto britânico e,
portanto, o lado capitalista. O título original, From Russia With Love, ou seja, “da
Rússia com amor”, não só reforça o conceito de hostilidade da Rússia para com a
Grã-Bretanha, como também o faz de forma irônica. Dessa maneira, começa a
indução de que, de fato, o comportamento hostil é característico dos russos e
comunistas, não dos britânicos. Esse conceito é reforçado ao longo do filme. Por
exemplo, em cenas de embate físico entre James Bond e um agente inimigo, o
primeiro a investir de forma truculenta é o comunista, cabendo ao agente 007 se
defender. Além disso, todas as investidas que possuem algum grau de violência,
pelo menos na primeira metade do filme, são representadas como iniciativas dos
soviéticos. A impressão, para o espectador, é de que James Bond estava lá apenas
para obter a Lektor e cumprir a missão. Mas, diante da truculência do oponente, viu-
se obrigado a usar da força.
Citelli (2002) identifica meios de que o discurso dispõe para que a persuasão
seja eficaz. O uso de estereótipos, a criação de inimigos, a afirmação e a repetição
são recursos utilizados principalmente pela retórica capitalista no cinema voltado
para a Guerra Fria. Não por acaso, são instrumentos utilizados à exaustão na
produção de Terence Young em relação à imagem do cidadão ou espião soviético.
O estereótipo do russo comunista, por exemplo, aparece como ferramenta para
denegrir a imagem da URSS. Segundo Citelli, “a grande característica do estereótipo
é que ele impede qualquer questionamento acerca do que está sendo enunciado,
visto ser algo de domínio público, uma ‘verdade’ consagrada” (CITELLI, 2002, p. 47).
Os recursos do discurso norte-americano são utilizados simultaneamente: ao passo
que o estereótipo comunista é apresentado, ocorre a criação do inimigo, o próprio
comunista. A afirmação e repetição dos recursos anteriores, no cinema e na
televisão, garantem a absorção da ideologia pela massa.

Afirmação e repetição. São dois importantes esquemas usados pelo


discurso persuasivo. No primeiro caso, a certeza, o imperativo: a dúvida e a
34

vacilação são inimigas da persuasão. No segundo caso, repetir significa a


possibilidade de aceitação pela constância reiterativa. Goebbels, o teórico
da propaganda nazista, apregoava que uma mentira repetida muitas vezes
era mais eficaz do que a verdade dita uma única vez. (CITELLI, 2002, p. 47)

Bardin (1979, p. 51) define o conceito de estereótipo como a representação


de um objeto mais ou menos desligada da realidade, partilhada pela sociedade com
certa frequência e estabilidade. “Corresponde a uma medida de economia na
percepção da realidade”. A autora destaca ainda a ligação entre estereótipo e
preconceito, que está “racionalizado, justificado ou engendrado” (BARDIN, 1979, p.
51).
Desde os primeiros minutos do filme, em que o líder da organização
SPECTRE, sem mostrar o rosto e a verdadeira identidade, faz a aparição inicial, é
possível perceber a representação da figura russa como fria, calculista e impiedosa.
Apesar do temível inimigo não revelar a face, ele é representado, de forma
cuidadosamente pensada, pelo animal que segura no colo: um gato, espécie tida
como fria, altiva e impassível. A falta de um retrato da face do líder em nada
atrapalha a construção da imagem: as linguagens verbal e corporal utilizadas pelo
personagem, por exemplo, bastam para passar a impressão de uma personalidade
racional, calculista e ameaçadora. Em alguns momentos, até mesmo psicopata. O
dirigente da organização, na verdade, não representa um indivíduo, e, sim, uma
figura: a do mal, ou do comunista.
Os mesmos recursos são aplicados à comandante Rosa Klebb, mulher dura,
ríspida e tirana. A expressão facial, no caso da personagem, é essencial: seu rosto
demonstra, em todas as cenas, sentimentos como raiva e insatisfação. O mesmo
ocorre com os demais representantes da potência socialista. A significação está
também nos detalhes: nos primeiro minutos do filme, o agente número três da
SPECTRE aparece entretido em um jogo de xadrez. O xadrez é um esporte para
intelectuais, que envolve dose considerável de raciocínio, paciência e frieza.
Dentre os traços que diferenciam o agente britânico do russo, um se destaca.
James Bond, embora esteja em Istambul em missão, e sofra diversas tentativas de
homicídio, não deixa de se divertir. Além de se envolver com a deslumbrante
Tatiana, Bond encara a situação com leveza e naturalidade. James Bond,
obviamente, um agente bonito, sedutor, elegante e de expressão pacífica, embora
firme. Na presença de mulheres, suas falas estão permeadas de ironias sedutoras.
35

Todos os movimentos têm estilo: o sorriso, o andar, até o modo como joga o chapéu
no cabide. No caso dos oponentes, a rigidez tem presença constante.
No entanto, há uma exceção: o agente Grant, designado especialmente para
matar Bond. Loiro, de olhos claros e sotaque russo, Grant é um homem de
semblante sério e poucas palavras. O personagem mantém o padrão até ter o
encontro com o agente 007, no final do filme. A partir daí, Grant revela-se irônico,
sarcástico e ofensivo, em comportamento que beira a psicopatia. Parece uma
verdadeira máquina de matar, até ser derrotado pelo britânico. O comportamento
doentio dos agentes da SPECTRE é reforçado até mesmo pela fala de Bond, aos 90
minutos de filme: “é uma coleção de mentes doentias para bolar um plano assim”.

4.1.2 A história como recurso de convencimento

Os elementos históricos da Guerra Fria são óbvios na produção. Além da


menção clara ao embate, há também referência precisa à agência de espionagem
americana, a CIA. Bond, em reunião com o líder do serviço britânico, M, afirma que
“a CIA é doida para ter uma Lektor”, no início do filme, antes mesmo de viajar a
Istambul. A frase demonstra não só que as agências de espionagem capitalistas se
comunicam, mas também reforça a importância da máquina, que está em poder
russo. Além disso, algumas das técnicas de espionagem são retratadas no filme.
Kerim Bey, homem poderoso, aliado de Bond em Istambul, tem acesso à parte
subterrânea do consulado russo na capital, onde pode livremente espreitar as ações
comunistas de perto.

É nessa situação que Bey e Bond presenciam uma discussão entre o diretor
da Inteligência Militar comunista, o chefe da segurança, um agente secreto e um
assassino profissional. O clima no consulado, entre os comunistas, é de desacordo.
A presença de um assassino profissional entre os líderes de Estado cria esfera
sobrecarregada e negativa sobre a imagem do governo russo. O mercenário é a
primeira vítima fatal de 007 no filme. A morte do assassino marca também a primeira
ação hostil do lado capitalista paracom o lado comunista, avançados 50 minutos no
longa-metragem. A partir daí, uma série de eventos hostis partem do agente 007:
36

uma bomba no consulado britânico, um refém russo. Mas apesar do tom de ameaça,
os britânicos não são violentos nem sangrentos. O comportamento passa longe da
hostilidade dos russos contra os britânicos, explícita em diversos outros momentos
do filme.

4.1.3 Os artifícios técnicos como instrumentos de significação

A segunda metade da produção se passa quase que inteiramente dentro de


um trem. As cenas que seguem estabelecem uma relação interessante entre a
tensão crescente, ao se aproximar do clímax, o movimento do trem e a trilha sonora.
À medida que a apreensão aumenta, indo ao encontro do embate entre 007 e o
agente russo Grant, o movimento das rodas do trem, enquadradas do ângulo
exterior, acelera. A trilha sonora acompanha, mais rápida. A esfera de suspense é
inconfundível. Os ângulos de câmera são, aliados à trilha sonora, essenciais para o
efeito pretendido no filme.

Figura 2: o movimento do trem, aliado à trilha sonora, confere ar de suspense à cena. Enquadramento
aparece aos 72 minutos de filme.

Fonte: Moscou Contra 007

A produção faz uso constante das técnicas de plano americano e primeiro


plano, especialmente no final do filme. Tais tipos de plano, em geral, reforçam
37

aspectos psicológicos e dramáticos da produção e podem significar um sentimento


específico de um personagem (RODRIGUES, 2007, p. 29). Ao passo que a narrativa
de Moscou Contra 007 fica mais tensa para o protagonista, o uso do plano
americano e do primeiro plano são mais frequentes. As técnicas angulares plongée
e contra-plongée também são exploradas no filme. O ângulo plongée consiste no
posicionamento da câmera de cima para baixo, acima do nível dos olhos. Esse tipo
de enquadramento dá a impressão de inferioridade (RODRIGUES, 2007, p. 33).

Figura 3: ângulo plongée no personagem James Bond, em momento em que está dominado pelo inimigo.
A cena ocorre aos 88 minutos de filme.

Fonte: Moscou Contra 007

Figura 4: ângulo plongée do personagem Grant, em momento em que se encontra em posição de


inferioridade em relação a Bond, ao ser interrogado. Cena ocorre aos 83 minutos de filme.

Fonte: Moscou Contra 007


38

Já o ângulo contra-plongée é exatamente o contrário: ao enquadrar o ator de


baixo para cima, fica a impressão de superioridade (RODRIGUES, 2007, p. 33).
Ambas as técnicas são utilizadas na produção como convém. Quando o agente 007
está no controle e superior ao inimigo, é utilizado o contra-plongée. Ao passo que o
plongée é explorado no personagem inferior - a comandante Rosa Klebb, o agente
Grant e outros são enquadrados de cima para baixo.
Figura 5: ângulo contra-plongée de Bond, em momento que mostra superioridade, aos 75 minutos.

Fonte: Moscou Contra 007


Figura 6: ângulo contra-plongée do agente 007, no momento em que interroga Grant, mostrando
superioridade. Enquadramento aparece aos 83 minutos de filme.

Fonte: Moscou Contra 007

Figura 7: ângulo contra-plongée do vilão Grant, ao dominar fisicamente o agente Bond, aos 88 minutos.

Fonte: Moscou Contra 007


39

Figura 8: ângulo contra-plongée do agente Grant, enquanto ameaça James Bond, aos 88 minutos.

Fonte: Moscou Contra 007

Figura 9: o posicionamento dos personagens (Bond em pé, olhando para baixo. E grant, sentado,
olhando para cima) indica qual dos dois domina a situação. No caso, é o agente Bond. Essa cena é
seguida de ângulos plongée e contra-plongée de ambos, aos 83 minutos.

Fonte: Moscou Contra 007

Apesar do uso dos ângulos plongée e contra-plongée não ser tão significativo
para a transmissão dos ideais capitalistas, ajuda a entender em que posição o
agente 007 estava colocado dentro da narrativa da produção: de superior ao inimigo,
o herói que salva o planeta de uma guerra nuclear mortal.

4.1.4 James Bond, 53 anos depois de “Moscou Contra 007”

Moscou Contra 007 foi o primeiro filme da sequência a reforçar, por meio dos
recursos cinematográficos - trilha sonora, diálogos e ângulos de câmera -, a
ideologia capitalista e anticomunista. Mas não foi o último. As produções mantêm
40

frequência de quase um lançamento por ano, e características constantes do


personagem são exploradas até hoje. Além disso, os estereótipos de “mocinho-
britânico” e “vilão-russo” continuam a ter aparições pontuais. Em 2015, no mais
recente filme da série, 007 Contra Spectre (MENDES, 2015), estrelado por Daniel
Craig, a organização criminosa russa ressurge como o extremo da maldade a ser
derrotado pelo herói. 54 anos após o nascimento, o personagem continua a arrastar
milhões aos cinemas. 25 anos após o fim da Guerra Fria, continua a reafirmar pré-
conceitos e ideologias.

4.2 Caçada ao Outubro Vermelho (Thehunt for RedOctober, John McTiernan,


1990)

● Ficha Técnica:
○ Direção: John McTiernan
○ Elenco: Sean Connery, Alec Baldwin, Scott Glenn, Sam Neill
○ Roteiro: Larry Ferguson
○ Trilha sonora: Cecelia Hall, George Waters II
○ Produção: James Turner, DanaLynne Taylor

Figura 10:Poster do filme Caçada ao Outubro Vermelho

Ganhador de um Oscar na categoria de Melhores Efeitos Sonoros, em 1991,


Caçada ao Outubro Vermelho foi dirigido por John McTiernan. Assim como Moscou
Contra 007, buscou inspiração na literatura. A produção foi baseada no livro de
mesmo nome do autor Tom Clancy, lançado em 1984. Além da vitória no Oscar, o
41

filme levou mais dois prêmios e foi indicado a seis, em três festivais. O enredo tem
data em 1984. Pouco antes de Mikhail Gorbachev subir ao poder na União Soviética,
o submarino Outubro Vermelho parte em direção aos Estados Unidos, sob o
comando do Capitão Marko Ramius (Sean Connery). A ordem, no entanto, não
partiu do governo soviético. Na verdade, o Capitão Ramius e parte da tripulação são
desertores, que se arriscam em um plano perigoso para viver na América. Mas há
um detalhe que dificulta mais ainda a execução do objetivo: o Outubro Vermelho,
altamente tecnológico, é indetectável aos sonares de outros submarinos. Ramius
conta com o auxílio de Jack Ryan (Alec Baldwin), um agente da CIA, para que os
russos consigam chegar ao destino pretendido.

4.2.1 A relação entre realidade, história, representação da realidade e ficção

Caçada ao Outubro Vermelho faz importante conexão com momentos


históricos da Guerra Fria. O enredo se passa exatamente no ano anterior a Mikhail
Gorbachev tomar a liderança da União Soviética, em 1985. Antes do governo
Gorbachev, no início da década de 1980, a União Soviética e os demais países
socialistas definhavam sob a corrupção de líderes de Estado. Problemas como
desemprego, miséria, prostituição e consumo de drogas atingiam grande parte da
população, apesar dos esforços da propaganda política soviética de apontá-los
como mazelas exclusivamente capitalistas (ARBEX JÚNIOR, 2004).
As condições de vida na União Soviética em 1984 ajudam a entender o que
levou o Capitão Marko Ramius e parte da tripulação do Outubro Vermelho ao desejo
de desertar. A data, o momento político e o líder Mikhail Gorbachev são
mencionados nos primeiros segundos do filme. De forma sutil, a produção faz
referência às dificuldades enfrentadas pela população socialista, sem mencioná-las
abertamente: “Em novembro de 1984, pouco antes de Gorbachev subir ao poder,
um submarino soviético emergiu ao sul dos Grand Banks”. A representação da vida
nos países socialistas e nos Estados Unidos constitui ponto marcante da produção.
A imagem ruim da situação na União Soviética é reforçada por diálogos entre
desertores, em que compartilham memórias e expressam o sonho de serem livres
para viver como bem quiserem. Um desses diálogos ocorre entre o Capitão Ramius
42

e o oficial Vassily e constitui um dos pontos altos do filme. “Acha que vão me deixar
viver em Montana?”, pergunta Vassily. “Eu diria que eles o deixariam viver onde
quisesse”, responde Ramius. “Ótimo. então vou viver em Montana. Vou casar com
uma americana gorda e criar coelhos. E ela os cozinhará para mim. E eu vou ter
uma pick-up. E talvez mesmo um carro de passeio para viajar de um estado a outro.
Será que é permitido? Sem documentos? No inverno viverei no Arizona”.As
aspirações do oficial Vassily são o perfeito “sonho americano”. O enquadramento em
primeiro plano, focado no personagem, e a trilha sonora conferem apelo sentimental
à cena. O diálogo ocorre aos 78 minutos.

Figura 11: diálogo entre Vassily e o capitão Ramius. Cena ocorre aos 78 minutos.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

Figura 12: diálogo entre Vassily e o capitão Ramius. Cena ocorre aos 78 minutos.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho


43

Figura 13: diálogo entre Vassily e o capitão Ramius. Cena ocorre aos 78 minutos.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

O oficial Vassily é, mais tarde, morto na tentativa de chegar à América e suas


últimas palavras, para o Capitão Ramius, são: “Gostaria de ter visto Montana”. A
dicotomia entre a representação ruim da vida na União Soviética e o sonho da vida
perfeita nos Estados Unidos, como apresentado nessa cena, era também um dos
principais recursos da propaganda política na Guerra Fria (ARBEX JÚNIOR, 2004).
A técnica era utilizada principalmente nas décadas de 1940 e 1950 por ambos os
lados e consistia em denegrir a imagem da potência inimiga, por meio da
demonstração das desvantagens e males do capitalismo ou do socialismo. Na
produção de 1990, o mesmo recurso aparece, repaginado.
A relação entre história e ficção acontece de forma notável na produção
cinematográfica de McTiernan. O filme é baseado em romance homônimo de Tom
Clancy, lançado em 1984. Tanto o livro quanto o filme são baseados em fatos reais.
Na verdade, a produção deixa o aspecto claro nos primeiros minutos. E sugere que
a história a ser contada é não-oficial, uma vez que os governos americano e
soviético tentaram abafar o caso. A afirmação tem o efeito de despertar o interesse
do espectador nos primeiros momentos, mas é, ao mesmo tempo, uma brincadeira
perigosa com os conceitos de realidade e ficção. Como coloca Aumont (2009),
qualquer filme, ainda que busque retratar fatos, não deixa de ser ficcional. Ou seja,
por mais que aquilo que está na tela do cinema seja muito parecido com o real, não
o é. O conceito vale para qualquer gênero cinematográfico, até mesmo os
documentários, já que o resultado de uma produção cinematográfica foi pensada,
editada e montada por pessoas. Nenhum filme está livre de manipulação, nem da
transmissão de mensagens (METZ, 1972).
44

Figura 14: Nos primeiros segundos do filme, lê-se: "de acordo com os governos soviético e americano,
nada do que você verá aconteceu".

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

4.2.2 A dicotomia herói/vilão

Como em “Moscou Contra 007” (1963), “Caçada ao Outubro Vermelho” traz


também a figura do herói, cujas ações decidirão o futuro do capitalismo mundial. Em
Moscou Contra 007, como visto anteriormente, o herói é o agente do serviço
britânico James Bond - homem elegante, viril, que gosta de vangloriar-se das
conquistas. Na produção de 1990, o herói é uma pessoa bem mais simples: tem
esposa e filha, cuida de sua família e considera-se “apenas um analista”, apesar de
trabalhar para a CIA. Trata-se do personagem Jack Ryan. Assim como a forma de
transmitir a ideologia, dessa vez mais rarefeita, a construção do herói em Caçada ao
Outubro Vermelho é menos exagerada e permite entrever aspectos mais humanos
do personagem. Jack Ryan é um agente da CIA que mora em Londres, com a
família, à qual é profundamente ligado, como mostram algumas das primeiras cenas
do filme. Ele viaja até os Estados Unidos para contatar e alertar autoridades sobre o
submarino soviético Outubro Vermelho, altamente tecnológico e indetectável por
sonares. O submarino, equipado com bombas atômicas, encontra-se no caminho
para os Estados Unidos. Enquanto as demais autoridades norte-americanas
encaram o ato como de guerra, Jack Ryan acredita que parte da tripulação queira
desertar, para viver nos EUA. Ele é, então, designado para descobrir as reais
intenções do Capitão Ramius e certificar-se de que os desertores sejam recebidos
em território americano, caso sua hipótese esteja correta.
45

As diferenças entre Jack Ryan e James Bond começam a ficar visíveis a partir
daí. Ryan é um homem correto e honesto que, apesar de considerar-se pouco
qualificado, abraça a missão e faz de tudo para que seja cumprida, inclusive arriscar
a própria vida ao pular de um avião para chegar a um submarino. E, embora
autoridades e demais personagens acreditem no contrário, Ryan persiste em crer na
boa-fé do Capitão Ramius e se esforça para proteger sua vida e do resto da
tripulação. No fim das contas, é Ryan o grande responsável pela resolução do
conflito e a prevenção de uma guerra nuclear entre Estados Unidos e União
Soviética.
Em outras produções que abordam o tema, a oposição herói/vilão e Bem/Mal
era bem delineada, nos padrões capitalista/comunista e Estados Unidos/União
Soviética. Em Caçada ao Outubro Vermelho, a contraposição ocorre de forma
diferente. O herói permanece na pele do norte-americano capitalista e o Bem ainda
é representado pela nação estadunidense, enquanto o Mal, pelo bloco soviético. A
diferença reside, dessa vez, na figura do russo comunista. Em Moscou Contra 007, o
russo é retratado como frio, calculista e racional, às vezes psicopata. Para o
espectador, a representação não é de uma pessoa real e palpável. Já no filme de
McTiernan, o aspecto humano é explorado na figura russa. A começar pelo desejo
de Marko Ramius e outros oficiais de traírem a própria nação em prol da felicidade
pessoal. Um russo pertencente ao universo de 007 jamais faria tal coisa. O retrato
da personalidade russa ainda é de homens sérios, mas com um pouco mais de
humanidade. Agora, eles deixam transparecer inseguranças, preocupações, sonhos.
Esse tipo de representação pode estar atrelado ao fato de que, em primeiro lugar,
tais pessoas pretendem desertar. Para a ideologia norte-americana, pode ser esse o
motivo pelo qual elas são mais sensíveis e humanas, e por isso mesmo são
recebidas “de braços abertos” pela nação.

4.2.3 A relação entre os blocos capitalista e socialista

Há um momento em que a ligação entre Estados Unidos e União Soviética


toma proporções interessantes. Na segunda metade do filme, Ryan consegue se
comunicar com Ramius, ainda que precariamente, por sinais, para ter certeza de
46

suas intenções. Neste instante, o submarino norte-americano, em que Ryan se


encontra, é tomado por uma coloração vermelha, causada por luzes de emergência.
O vermelho é a cor da bandeira da União Soviética e associada ao comunismo até
hoje. Ao mesmo tempo, o Outubro Vermelho, onde está o Capitão Ramius, reflete
uma coloração azul, que é uma das cores da bandeira americana. Não por acaso, as
cores aparecem no momento em que norte-americano e russo fazem contato pela
primeira vez.

Figura 15: o submarino americano é tomado pela coloração vermelha, que representa acor do governo
soviético. O quadro ocorre aos 98 minutos.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

Figura 16: o submarino soviético, por outro lado, apresenta a coloração azul, que é uma das cores da
bandeira norte-americana. O quadro ocorre aos 98 minutos.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

Aliado à representação positiva da personalidade russa, há certa exaltação da


cultura da nação na produção de McTiernan. O título, a princípio, aparece em idioma
russo, para depois ser transformado em inglês. Além disso, a primeira música que
embala as cenas iniciais parece ser uma espécie de ópera cantada em russo. Essa
é a mesma trilha sonora que conduz ao fechamento do filme.
47

Figura 17: o título em russo aparece antes do título em inglês, apesar de ser uma produção norte-
americana. Os títulos aparecem aos 3 minutos de filme.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

Figura 18: o título em russo aparece antes do título em inglês, apesar de ser uma produção norte-
americana. Os títulos aparecem aos 3 minutos de filme.

Fonte: Caçada ao Outubro Vermelho

Além do momento delicado em que o enredo se desenvolve, em 1984, é


importante lembrar do período em que o filme foi produzido e lançado. Caçada ao
Outubro Vermelho foi aos cinemas em 1990, ano que se seguiu após a queda do
Muro de Berlim (1989) e anterior à dissolução da União Soviética (1991). Naquele
momento, o bloco socialista já estava perto do fim, o que conferia aos Estados
Unidos uma sensação de vitória. É essa sensação que permeia a produção de
McTiernan. As referências e a ideologia são apresentadas, em Caçada ao Outubro
Vermelho, de forma menos agressiva que em produções anteriores que abordem o
tema, como Moscou Contra 007. É como se, à aquela altura, não houvesse mais
necessidade de gritar tão alto que o capitalismo deveria conquistar o mundo, e o
socialismo, ser extinto. Afinal, isto estava prestes a, de fato, acontecer. Não à toa, a
última cena do filme consiste na fala de Ryan, direcionada ao Capitão Ramius:
“Bem-vindo ao Novo Mundo, senhor”.
48

4.3 Ponte dos Espiões (Bridge of Spies, Steven Spielberg, 2015)

● Ficha Técnica:
○ Direção: Steven Spielberg
○ Elenco: Tom Hanks, Mark Rylance, Amy Ryan, Austin Stowell
○ Roteiro: Matt Charman, Joel Coen, Ethan Coen
○ Trilha sonora: Thomas Newman
○ Produção: Marc Platt, Steven Spielberg, KristieMarcoskoKrieger

Figura 19: Poster de Ponte dos Espiões

Inspiradoem fatos reais, Ponte dos Espiões recorre à memória coletiva e


histórica para retratar, 24 anos depois do fim da Guerra Fria, situações que
aconteceram nos primeiros anos do conflito. Ambientado em 1957, o enredo se
desenrola ao redor da temática da espionagem, assim como o clássico Moscou
Contra 007. Mas apesar da coincidência de temas, as produções reservam poucas
características em comum. Em Ponte dos Espiões, Rudolf Abel (Mark Rylance), um
espião soviético, é capturado pelo FBI nos Estados Unidos e preso. As autoridades
norte-americanas oferecem ao prisioneiro o direito de ser defendido em tribunal,
ainda que apenas em prol da imagem dos Estados Unidos no cenário internacional,
e designam o advogado de seguros Jim Donovan (Tom Hanks) para a tarefa. Mas,
apesar de encarregarem Jim da defesa de Abel, as autoridades norte-americanas já
sabem o destino do espião: a cadeira elétrica. Jim, no entanto, decide ir contra a
opinião pública e lutar pelos direitos humanitários do soviético. A situação toma
proporções políticas quando um espião, Francis Gary Powers, e um estudante,
49

Frederic Pryor, ambos norte-americanos, são capturados em território soviético.


Agora, Jim Donovan é responsável pelo diálogo entre as potências para buscar uma
solução.

4.3.1 A história como recurso de convencimento

Assim como Caçada ao Outubro Vermelho (1990), Ponte dos Espiões


emprega o apelo à realidade como recurso de convencimento, por meio de termos
como “baseado em fatos reais” ou “inspirado em fatos reais”. Na produção de 1990,
como visto anteriormente, o recurso à representação da realidade é apresentado no
início, de forma nada discreta. Ocorre, ainda, a sugestão de que os governos
soviético e norte-americano tentaram censurar, de alguma forma, a divulgação da
história. Em Ponte dos Espiões, o apelo a “fatos reais” está presente, mas de
maneira menos significante e chamativa, a começar pelo uso do termo “inspirado”,
ao invés de “baseado”. O verbo “inspirar-se” implica menos peso e responsabilidade
aos encarregados da produção. Além do aspecto semântico dos termos utilizados
para descrição do filme, há um elemento que confere à produção mais confiabilidade
e veracidade: a história da troca de espiões entre os governos dos Estados Unidos e
da União Soviética está nos livros de história.
De fato, existiu um piloto de aviões-espiões de alta tecnologia chamado Gary
Powers. Ele pilotava o U2, que podia sobrevoar um local a grandes altitudes e
registrar, ao mesmo tempo, a presença de objetos e pessoas no solo. Em uma
missão de Powers, o U2 foi abatido, e o espião, capturado. O fato acarretou em
“uma das mais sérias crises causadas pela espionagem entre a União Soviética e os
Estados Unidos” (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 78).

Em 10 de fevereiro de 1962, Powers foi libertado, como parte de uma troca


de prisioneiros. Esse detalhe é importante, pois revela uma prática muito
comum na época da Guerra Fria: a troca de espiões prisioneiros. Esse é um
dos capítulos mais obscuros da história da espionagem na Guerra Fria.
Muitas vezes, a troca de espiões envolvia transações políticas nada éticas,
além de chantagens emocionais, pressões psicológicas e o uso de agentes
duplos. Além disso, ela também era interessante sob o ponto de vista
econômico. Custava muito dinheiro e tempo treinar um bom agente. Assim,
todos os serviços secretos ganhavam com a troca. Provavelmente, o mundo
nunca conhecerá os detalhes desse capítulo, porque não interessa a
ninguém revelar o que de fato aconteceu naqueles anos. (ARBEX JÚNIOR,
2004, p. 78)
50

Mais uma vez, o recurso a fatos históricos do período aparece como uma
ferramenta para garantir à produção confiabilidade e veracidade. Dessa forma, é
ainda mais fácil conquistar o público consumidor.

4.3.2 A desconstrução de um estereótipo

José Arbex Júnior. (2004) coloca que o mundo nunca conhecerá o que de
fato ocorreu nessa lacuna da história da Guerra Fria. Mas, é exatamente isso que
Ponte dos Espiões se propõe a fazer. A produção, ainda que reafirme alguns
preconceitos e estereótipos, surpreende ao desconstruir padrões impostos em
outros filmes com a mesma temática. Nesse sentido, é comparável a Caçada ao
Outubro Vermelho, que, ao adicionar elementos como humanidade, fraqueza,
preocupações e sonhos à equação da figura russa, desconstrói um estereótipo.
Ponte dos Espiões repete a fórmula da obra de 1990, ao retratar Rudolf Abel, um
espião russo que agia ilegalmente em território norte-americano, como um
personagem de quem os espectadores podem gostar.
Ao contrário do que é mostrado em Moscou Contra 007, dessa vez são os
norte-americanos os primeiros a serem hostis, ao invadir de forma brusca o
apartamento do russo, nos primeiros minutos do filme. O espião russo é, sim, um
homem peculiar, frio e rígido, como foi reafirmado em Moscou Contra 007. Mas não
se mostra violento em momento algum, até mesmo quando tem a privacidade da
sua casa invadida pela polícia norte-americana - o que é curioso para quem assiste,
que, acostumado aos estereótipos, fica na expectativa de o espião mostrar sinais de
maldade a qualquer momento. Apesar da expressão dura estampada no rosto,
Rudolf Abel é um homem de fala tranquila, boas maneiras e disposto a cooperar
com o governo norte-americano.
Aqui, “cooperar” não significa ser um agente-duplo, prática comum na Guerra
Fria, como colocou Arbex Júnior. (2004), e servir às duas potências ao mesmo
tempo. No caso, Abel continua leal ao país de origem, sem ceder às ofertas das
autoridades norte-americanas nem vazar os segredos de Estado de que
provavelmente tinha conhecimento. Mas, conformado, não mostra resistência às
orientações que recebe na prisão. Também não tenta lutar contra a possibilidade de
pena de morte. Por meio do personagem, Ponte dos Espiões, em vários momentos,
51

faz um convite ao espectador: o de praticar a empatia e se colocar no lugar da


população de países soviéticos e até mesmo de espiões. Como questiona Donovan
em dado momento, “é justo morrer por fazer seu trabalho?”. Em pouco tempo de
convívio, Abel e Donovan acabam criando laços, ao compartilhar memórias e
anseios. Sob esta ótica, a produção desperta, mais uma vez, o lado humanitário e
pacifista do espectador. “Toda pessoa é importante”, repete Jim em mais de uma
cena.

4.3.3 O papel do herói e as fases da retórica capitalista

Assim como em “Caçada ao Outubro Vermelho” e “Moscou Contra 007”, a


obra de Steven Spielberg traz para as telas de cinema o papel do herói, que
habilmente contorna os problemas que enfrenta e consegue impedir que a ameaça
de uma nova guerra nuclear se concretize. Em 1962, o herói era o agente James
Bond. Em 1990, o agente da CIA Jack Ryan. Em 2015, o encarregado do papel é o
advogado Jim Donovan. Além de terem a mesma inicial - James, Jack e Jim -, os
três personagens estão conectados pelo que representam para a ideologia
capitalista e são como fases da guerra e seu impacto na cultura. Nos primeiros 20
anos da Guerra Fria, James Bond representava uma constante necessidade
ideológica de reafirmar o que, ou quem, era o Bem e o Mal, o mocinho e o vilão.
Para tal, os recursos cinematográficos a que a produção recorreu eram exagerados,
previsíveis e nada sutis ou discretos. Os Estados Unidos queriam gritar: “viva o
capitalismo, morte ao socialismo”.
Jack Ryan, em 1990, traduz uma segunda fase da Guerra Fria, em que já não
havia a urgência de reiteração dos princípios capitalistas. Afinal, àquela altura, o
conflito estava no fim e os Estados Unidos estavam perto de atingir o objetivo maior:
o desaparecimento da União Soviética e do socialismo no globo. Assim, ocorre uma
aproximação entre as figuras norte-americana e russa, por meio da humanização do
estereótipo russo e da representação do agente da CIA como um homem simples,
sem grandes ambições ou posses, intensamente ligado à família. Ainda assim,
permanece a ideia de que a União Soviética é um país miserável, do qual as
pessoas preferem fugir.
52

Já em 2015, Jim Donovan, apesar de ser um personagem cuja história se


passa no início do embate entre as potências, em 1957, mostra-se bem mais
parecido com Jack Ryan e distante de James Bond. Jim compartilha da
representação simplista e familiar caracterizada em Jack. Ambos se consideram
pouco habilitados para a missão que são obrigados a cumprir, mas isso não os
impede de completar a tarefa com maestria e honra. Além disso, ambos possuem
como base sólida a própria índole, à qual se apegam nos momentos em que são
desafiados pela opinião alheia. O desafio, nos filmes, é o mesmo para os dois:
provar que estão certos e fazer aquilo que consideram justo, ainda que todos lhe
digam o contrário. Jim Donovan representa uma terceira fase da Guerra Fria, mesmo
passados mais de 20 anos do fim oficial. Ponte dos Espiões chega para lembrar o
que aconteceu e qual foi a nação vitoriosa no conflito, bem como os motivos e
consequências. A produção serve quase como um recado para a memória coletiva.

4.3.4 Os artifícios técnicos como instrumentos de significação

Alguns elementos técnicos no filme de Spielberg servem como apoio para a


impressão de realidade em Ponte dos Espiões ser mais verossímil do que em
Moscou Contra 007, por exemplo. A falta de trilha sonora em momentos específicos
é um dos métodos. A trilha sonora está atrelada ao cinema desde o início e
configura recurso indispensável para que o espectador seja atingido, em algum
nível, pelo filme. No entanto, há cenas em que, para causar mais impacto ou
aproximar o espectador do enredo, a ausência de música é mais adequada. Isso
acontece porque a vida real e palpável não é acompanhada de trilha sonora. Steven
Spielberg usa da técnica em momentos que demandam mais atenção e transmitem
seriedade. Por exemplo, quando Gary Powers é escolhido para pilotar o U2, uma
autoridade do serviço de espionagem explica, com expressão impassível, quão
importante é a função dos aviões-espiões. A cena conta com o foco em primeiro
plano na expressão dura do ator, além da ausência de trilha sonora. Assim, a
atenção é voltada apenas para a fala do personagem: “Estamos engajados numa
guerra. A guerra, por enquanto, não envolve tropas de combate. Envolve
informações. Vocês vão colher informações. Informações secretas sobre o inimigo.
53

As informações que colherem podem nos dar o controle num confronto termonuclear
com a União Soviética. Ou poderiam evitar um”.

Figura 20: A ausência de trilha sonora e o uso do primeiro plano conferem peso e significação à cena,
que ocorre aos 24 minutos de filme.

Fonte: Ponte dos Espiões

Figura 21: frame de Ponte dos Espiões, aos 24 minutos de filme.

Fonte: Ponte dos Espiões

A simulação da realidade em Ponte dos Espiões ganha mais força ainda sob
o ponto de vista da retratação do Muro de Berlim. A produção busca, em detalhes,
fazer referência ao início da construção do muro, que foi definitivamente erguido em
1961, durante a “era Khrushev” no governo alemão. “Ao longo do Muro foram
construídos vários postos de vigília policial. Além disso, em suas imediações foram
colocadas minas explosivas e barricadas de arame farpado” (ARBEX JÚNIOR, 2004,
p. 100). Nesse aspecto, o filme toma um rumo peculiar, diferente das outras
produções analisadas, em que expõe o lado mais quente da Guerra Fria, em que há
violência, tortura e morte. O Muro de Berlim foi construído no intuito de impedir o
êxodo de milhares de pessoas do lado socialista para o capitalista. Após o término
54

de sua construção, qualquer um que tentasse atravessar seria morto, a tiros, por
seguranças do local. É exatamente essa imagem que Ponte dos Espiões traz na
segunda metade do filme. Aos 105 minutos, Jim Donovan presencia, da janela de
um trem, três pessoas serem mortas ao tentarem cruzar o muro.

Figura 22: Aos 105 minutos de filme, pessoas são mortas ao tentarem atravessar o Muro de Berlim.

Fonte: Ponte dos Espiões

A tortura é o terceiro ponto em que a violência é abordada no filme. O piloto


Gary Powers, ao ser capturado pelas autoridades soviéticas com o avião-espião U2,
é enviado para a prisão, onde sofre tortura e terror psicológico. Em busca de
informações sobre os Estados Unidos e a capacidade dos aviões U2, soviéticos o
impedem de dormir e o obrigam a manter a consciência com baldes de água fria. A
tortura era, de fato, uma prática comum nas prisões das duas potências (ARBEX
JÚNIOR, 2004). Mas há ressalvas quanto à verossimilhança da representação da
tortura na Guerra Fria. A prática ocorre apenas na prisão soviética, e não na norte-
americana. Enquanto o espião norte-americano é recebido com truculência, privado
de sono e conforto, o espião russo é tratado como um convidado nos Estados
Unidos. A diferença entre os ambientes carcerários das potências também é
chamativa. Na prisão soviética, a iluminação é ruim, o lugar é mal-conservado e
sujo. Na norte-americana, a cama parece confortável, as paredes são brancas e o
prisioneiro tem direito até a cigarros e material para desenho - passatempo e paixão
de Rudolf Abel.
55

Figura 23: a prisão soviética, onde Powers é torturado, é suja, desconfortável e mal-iluminada. Cenas
ocorrem aos 94 minutos.

Fonte: Ponte dos Espiões

Figura 24: prisão soviética. Cenas ocorrem aos 94 minutos.

Fonte: Ponte dos Espiões

Figura 25: prisão soviética. Cenas ocorrem aos 94 minutos.

Fonte: Ponte dos Espiões

Figura 26: a prisão americanatem paredes brancas e é bem-iluminada. Abel é bem tratado. Cena ocorre
aos 95 minutos

.
56

Fonte: Ponte dos Espiões

Figura 27: prisão americana. Cena ocorre aos 95 minutos.

Fonte: Ponte dos Espiões

4.3.5 O lado “quente” da Guerra Fria

O termo Guerra Fria foi criado com base no aspecto ideológico que permeava
o conflito. Ao contrário das Guerras Mundiais, a competição entre Estados Unidos e
União Soviética, que representavam estilos de vida completamente diferentes, não
resultou em batalhas físicas ou milhões de mortes. Por isso, existe uma tendência
perigosa e errônea à crença de que a Guerra Fria não teve vítimas, nem violência ou
sangue. Ponte dos Espiões consegue, para olhos treinados, desconstruir este grave
preconceito. Mais do que isso, o filme convida o espectador a perceber que uma
guerra, fria ou não, é uma guerra. É um conflito que envolve seres humanos, em que
não há linhas tão definidas para mocinhos e vilões, Bem ou Mal. Muitas vezes, os
papéis se confundem. O filme traz para a contemporaneidade fatos antigos, mas que
possuem, de alguma forma, ligação com a formação geopolítica mundial de hoje.
Afinal, “a Guerra Fria não deve ser vista apenas como um dado que a história
relegou ao esquecimento. Ao contrário, é impossível entender o mundo hoje sem
refletir sobre esse período tão complexo”. (ARBEX JÚNIOR, 2004, p. 108)
57

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Guerra Fria foi um conflito longo, árduo e cansativo. Durante as quase cinco
décadas que durou, a população mundial foi bombardeada por propaganda política
diária, que estava presente em muitas horas e lugares, para todos verem. A eficácia
da propagação de mensagens e ideologias foi garantida através do meio pelo qual
ocorreu: a cultura. É na cultura onde mora a receita para dominação mundial por
uma ideologia. E foi a cultura, especificamente a Indústria Cultural, que diferenciou
as estratégias políticas dos Estados Unidos e da União Soviética. Apesar dos
esforços do governo comunista de fazer uma propaganda anticapitalista, os Estados
Unidos possuíam armas mais fortes: os seriados de televisão, os vídeos educativos
que eram transmitidos nas escolas, os programas e novelas de rádio, os filmes nos
cinemas.
O embate encerrou-se à custa da dissolução de uma decadente União
Soviética e da ilusão de milhares de pessoas, que depositavam no capitalismo
esperanças de um mundo livre e igualitário. Não demorou muito para que a fantasia
sucumbisse sob o peso do desemprego, da fome e da desigualdade social. Mais de
duas décadas depois do fim da Guerra Fria, é impossível medir as decorrências: não
há número oficial de mortos ou torturados. Diferentemente das outras guerras, não
foi o aspecto quantitativo que definiu o conflito. As consequências são outras: basta
observar o atual cenário geopolítico mundial. Os Estados Unidos seguem como
soberanos em mercado, economia, política e cultura. Mas agora, o discurso
capitalista tem outros inimigos, dessa vez do Oriente Médio. Atualmente, a
multiplicação de imagens que “endemonizam” os chamados “terroristas”,
responsáveis pelo ataque de 11 de setembro de 2001, é massiva e cada vez maior.
As características de discurso autoritário (CITELLI, 2002) são claras, mas estão
disfarçadas de “democracia da informação” (ARBEX JÚNIOR, 2004), em que o
consumo diário de informação sob a forma de imagens e vídeos é alimentado e
incentivado o tempo todo.
O incentivo ao consumo de imagens, seja na televisão ou no cinema, cresce
proporcionalmente ao avanço da tecnologia, que é uma consequência direta da
Guerra Fria. A maior invenção do século XX, conhecida como Internet, foi
decorrência da tentativa do governo norte-americano de espionar a União Soviética
58

e países estrangeiros. Ou seja, o conflito influenciou e continua a influenciar o


cotidiano mundial muito mais do que se imagina. Ideologicamente, a influência da
retórica capitalista ainda reflete no coletivo, através da lógica da exclusão do “outro”,
do diferente e do desconhecido. União Soviética, Vietnã, Iraque. Todos representam
para os Estados Unidos, e, consequentemente, para o mundo, o inimigo, que deve
ser combatido por meio de qualquer ação necessária e justificada, mesmo que isso
signifique afrontar e restringir direitos individuais ou coletivos.
A análise de produções cinematográficas que abordam a Guerra Fria do
ponto de vista da ideologia norte-americana comprovou quão poderosa é a cultura
enquanto ferramenta de manipulação e persuasão. A Indústria Cultural capitalista
mostrou-se tão convincente e poderosa na década de 1960, em Moscou Contra 007,
quanto em 1990, em Caçada ao Outubro Vermelho, e em 2015, em Ponte dos
Espiões. A diferença entre os períodos reside nas sutilezas e entrelinhas das
representações dos blocos e personagens. Nos primeiros vinte anos do conflito, o
agente 007 se tornou símbolo explícito da luta contra a expansão da União
Soviética. Mais tarde, onde antes ocorria o combate a russos e comunistas, os
personagens Jack Ryan e Jim Donovan foram capazes de criar laços de amizade.
Arrisco afirmar que a transferência da ótica de inimigo para possível amigo e aliado
seja decorrente de uma demanda do próprio público consumidor da Indústria
Cultural. Afinal, após 71 anos do início da Guerra Fria, é duvidoso que todos
continuem a acreditar que a União Soviética é o grande Mal. Ou que o capitalismo é
o salvador da humanidade. Ou que qualquer uma das ideologias está isenta de
defeitos e falhas.
Estudar Indústria Cultural, Guerra Fria e cinema é atividade que faz abrir os
olhos para um pequeno recorte da história humana. Ajuda a compreender que a
guerra não precisa ter batalhas para ter vítimas; que embora a mídia diga o
contrário, os “inimigos” são também seres humanos; que a humanidade ainda está
longe de alcançar paz e harmonia entre todos os povos, raças, religiões e
ideologias. Tais reflexões foram algumas das surpresas com as quais me deparei ao
estudar o tema, que apenas endossam e reafirmam o objetivo do trabalho. Sim, o
objetivo foi alcançado, sem maiores imprevistos ou choques. Mas em relação a
dificuldades, vale a pena citar apenas uma: a de me desprender de preconceitos,
discriminações e julgamentos, adquiridos em anos de consumo pessoal da Indústria
Cultural, para conseguir enxergar e analisar os objetos de estudo. Talvez as minhas
59

predisposições tenham deixado passar algo. Afinal, desconstruir noções requer


prática, treinamento e, principalmente, estudo. No campo acadêmico, pesquisas
podem ser realizadas em torno do mesmo tema central, como: o estudo da retórica
da União Soviética durante a Guerra Fria; a relação entre a Segunda Guerra Mundial
e a Guerra Fria, uma vez que os conflitos ocorreram seguidamente, sem interrupção;
a evolução da ideologia capitalista nos filmes do Agente 007, cuja série já possui
quase 30 produções. Para os interessados em cinema, história, ou em fazer do
mundo um lugar melhor, deixo a sugestão de estudar a Guerra Fria, enquanto
ferramenta de crescimento pessoal. Junto à sugestão, fica aqui uma pequena
contribuição à construção de uma sociedade um pouco menos ignorante, um pouco
menos egocêntrica e um pouco mais tolerante.
60

REFERÊNCIAS

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Craig, CallumMcDougall. Inglaterra: Metro Goldwyn Mayer, 2015.

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Janeiro: Jorge Zahar, 1985.

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MOSCOU contra 007. Direção de Terence Young. Produção de Albert R. Broccoli,


Harry Saltzman. Reino Unido: DanjaqProductions; EonProductions, 1963. 1 DVD.
61

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PONTE dos Espiões. Direção de Steven Spielberg. Produção de Marc Platt, Steven
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