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ESCLEROSE MÚLTIPLA E
NEUROMIELITE ÓPTICA
ACADEMIA BRASILEIRA DE NEUROLOGIA
Elizabeth Regina Comini Frota
Maria Fernanda Mendes
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos
e colaboradores 2ª edição
2016
Recomendações
no Tratamento da
Esclerose Múltipla e
Neuromielite Óptica
Recomendações no tratamento da
Esclerose Múltipla e Neuromielite Óptica
Copyright © 2016, Produzido por Editora e Eventos Omnifarma Ltda.
Proibida a reprodução total ou parcial dessa obra, por qualquer
meio ou sistema, sem prévio consentimento do editor.
Todos os direitos reservados à Editora e Eventos Omnifarma Ltda.
Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 978-85-62477-47-8
CDD-616.8047
16-01187 NLM-WL 100
Impresso no Brasil
2016
Capítulo 1
Capítulo 2
Neuromielite óptica............................................................................................................ 31
Tarso Adoni (coordenador), Doralina Guimarães Brum Souza, Regina Papais-Alvarenga,
Suzana Costa Nunes Machado
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
A ABN e o DCNI têm tentado exercer com regularidade seu papel fundamental, que é
fomentar o conhecimento e a atualização dos neurologistas brasileiros a respeito das
importantes doenças do sistema nervoso, contribuindo indiretamente para as boas
práticas clínicas no Brasil. O DCNI, com a colaboração de muitos de seus membros,
tem atuado nesse sentido, e este livro faz parte desse papel.
Decidimos pelo formato de revisão sistemática para que todos os métodos, todas
as conclusões e as recomendações fossem transparentes e claros o suficiente para
serem reproduzidos e respaldados por publicações de evidência comprovada. A coor-
denação escolheu o sistema Grading of Recommendations Assessment, Development
and Evaluation (GRADE)1-3 para orientar a realização das revisões. Esse sistema con-
siste resumidamente nos seguintes passos:
Todos os autores que participaram do livro anterior foram convidados, alguns não
puderam aceitar e houve espaço para que outros membros aderissem ao trabalho,
trazendo novo impulso e uma nova visão.
Sabemos que as decisões clínicas dos médicos assistentes são baseadas em seu
conhecimento e sua experiência, e desejamos com este livro ter contribuído para
facilitar o processo de busca pelo conhecimento das evidências científicas que su-
portam sua prática.
Referências. [1] Balshem H, Helfand M, Schünemann HJ, et al. GRADE guidelines: 3. Rating the quality of evi-
dence. J Clin Epidemiol. 2011;64(4):401-6. [2] Guyatt G, Oxman AD, Akl EA, et al. GRADE guidelines: 1. Introduc-
tion-GRADE evidence profiles and summary of findings tables. J Clin Epidemiol. 2011;64(4):383-94. [3] Guyatt GH,
Oxman AD, Kunz R, et al. GRADE guidelines: 2. Framing the question and deciding on important outcomes. J Clin
Epidemiol. 2011;64(4):395-400.
autores
Alessandro Finkelsztejn
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Especialista em Doenças Desmielinizantes e
Especialista em Neuroftalmologia. Mestrado e Doutorado em Epidemiologia – Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Coordenador do Ambulatório de Esclerose Múltipla - Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Alfredo Damasceno
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Pós-doutorando pela Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Estadual de Campinas. Doutorado em Ciências/Neurologia pela Faculdade de Ciências Médicas
da Unicamp.
Jefferson Becker
Membro Titular e Vice-coordenador do Departamento Científico de Neuroepidemiologia da Academia Brasileira
de Neurologia. Mestre e Doutor em Neurociências pela PUCRS. Professor de Clínica Médica e Coordenador do
Programa de Neuroimunologia da PUCRS. Orientador do PPG em Neurociências da UFF. Presidente do BCTRIMS.
Marcos Moreira
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professor Adjunto de Neurologia da Faculdade de
Ciências Médicas e da Saúde de Juiz de Fora. Professor Adjunto de Farmacologia do Instituto de Ciências
Biológicas da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Marcus Vinícius Magno Gonçalves
Membro Efetivo da Academia Brasileira de Neurologia. Residência em Neurologia e Neurofisiologia Clínica
pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Médico Neurologista do CHU-Joinville e no HRHDS-Joinville. Doutorando do Programa de Neurociências da
Universidade Federal Fluminense - Niteroi.
Regina Papais-Alvarenga
Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia. Professora Associada de Neurologia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Chefe do Serviço de Neurologia do Hospital Federal da Lagoa do Ministério da
Saúde.
Tarso Adoni
Membro Titular e Coordenador do Departamento Científico de Neuroepidemiologia da Academia Brasileira de
Neurologia. Médico Assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo. Diretor Técnico do Centro de Esclerose Múltipla do Hospital Sírio-Libanês.
Epidemiologia,
fisiopatogenia e
formas clínicas da
esclerose múltipla
Damacio Ramón Kaimen Maciel (coordenador)
André Luiz Muniz Alves dos Santos
Mônica Koncke Fiuza Parolin
Taysa Alexandrino Gonçalves Jubé Ribeiro
C a pítu l o 1
Epidemiologia,
fisiopatogenia e formas
clínicas da esclerose múltipla
Damacio Ramón Kaimen Maciel (coordenador)
André Luiz Muniz Alves dos Santos
Mônica Koncke Fiuza Parolin
Taysa Alexandrino Gonçalves Jubé Ribeiro
Introdução
A
esclerose múltipla (EM) é uma doença autoimune, inflamató-
ria, desmielinizante e crônica do sistema nervoso central (SNC),
mais comum em adultos jovens, com uma evolução imprevisível,
complexa e heterogênea devido ao envolvimento de vários processos
fisiopatológicos.
As áreas de desmielinização levam a manifestações clínicas multi-
formes de déficits funcionais decorrentes de lesões de qualquer parte do
neuroeixo, frequentemente incapacitantes.
A evolução da doença é fator determinante para a classificação das
formas clínicas. Para uma definição diagnóstica da EM, são considerados
os achados clínicos e laboratoriais.
Neste capítulo, a EM será abordada quanto a sua terminologia, seus
significados, seus aspectos epidemiológicos de baixa prevalência, seus as-
pectos fisiopatológicos — nos quais a resposta imunomediada domina a
inflamação — e suas formas clínicas, observando as fases remitente-re-
corrente e progressiva, ativas e não ativas.
Epidemiologia
A EM apresenta uma grande variação étnica e geográfica no mundo1.
Acomete principalmente adultos jovens, tendo como pico de início a faixa
Forma surto-remissão ou
remitente-recorrente (EMRR)
Surto/incapacidade
Surto/incapacidade
Tempo Tempo
Com completa Com recuperação
recuperação parcial/sequelas
*Atividade determinada por surtos clínicos ou por atividade em imagem de ressonância magnética (lesões real-
çadas por contraste; lesões novas ou inequivocamente aumentadas em T2 avaliadas pelo menos anualmente); se
as avaliações não estão disponíveis, a atividade é indeterminada. **Síndrome clínica isolada; se subsequente à
atividade clínica, cumpre os critérios diagnósticos da EM atual, tornando a forma remitente-recorrente.
Surto/incapacidade
Tempo Tempo
- Não ativa, mas com
Primária progressiva (EMPP) Secundária progressiva (EMSP) progressão
Acúmulo progressivo de Acúmulo progressivo de incapacidade
incapacidade desde o início após curso inicial com surtos
- Não ativa e sem
Surto/incapacidade
progressão
Progressiva recidivante (EMPR)
(doença estável)
Acúmulo progressivo de incapacidade
Tempo desde o início com ou sem recuperação
*Atividade determinada por surtos clínicos avaliada, no mínimo, anualmente ou por imagem de ressonância mag-
nética (lesões realçadas por contraste; novo e inequívoco aumento de lesões em T2). **Progressão medida por
avaliação clínica, avaliação pelo menos anual. Se as avaliações não estão disponíveis, atividade e progressão
são indeterminadas.
Referências
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lele group and the DRB1*1501 and 384 DRB1*1503 alleles with multiple sclerosis in White and Mulatto samples
from Brazil. J Neuroimmunol. 2007;189:118-24.
Neuromielite óptica
Tarso Adoni (coordenador)
Doralina Guimarães Brum Souza
Regina Papais-Alvarenga
Suzana Costa Nunes Machado
C a pítu l o 2
Neuromielite óptica
Tarso Adoni (coordenador)
Doralina Guimarães Brum Souza
Regina Papais-Alvarenga
Suzana Costa Nunes Machado
Introdução
A
neuromielite óptica (NMO) é uma doença autoimune inflamatória
do sistema nervoso central (SNC) caracterizada primordialmen-
te pelo acometimento dos nervos ópticos e da medula espinhal.
A última década foi um período de grande mudança no entendimento
fisiopatológico da NMO com a descoberta da mediação humoral via au-
toanticorpos da classe imunoglobulina G (IgG) contra a aquaporina-4
(IgG-AQP4), o mais abundante canal de água presente no SNC1,2.
A descoberta do marcador biológico da NMO a distinguiu definiti-
vamente da esclerose múltipla (EM) e permitiu o diagnóstico da doença
mesmo na ausência do fenótipo clínico clássico — neurite óptica (NO)
e mielite transversa longitudinalmente extensa (MTLE). Dessa maneira,
conforme será descrito mais adiante, criou-se o conceito de “espectro de
NMO”. Estão incluídos nesse grupo os pacientes com anticorpos anti-
AQP4 que apresentam MTLE, NO bilateral ou recorrente, síndromes de
tronco encefálico, narcolepsia, vômitos recorrentes, soluços incoercíveis
ou síndromes endócrinas hipotalâmicas3.
Epidemiologia
A NMO possui prevalência menor que a EM e é mais frequente em po-
pulações asiáticas e em afrodescendentes. Considerada por muito tempo
uma doença monofásica, hoje se sabe, a partir de estudos conduzidos em
diferentes populações, que a forma recorrente é a mais comum, respon-
dendo por cerca de 80% dos casos4.
A NMO é mais comum em mulheres (até oito mulheres acometidas
Manifestações clínicas
As manifestações clínicas da NMO foram ampliadas, em 2007, para além
da NO e da MTLE a partir da identificação de pacientes soropositivos
para o anticorpo anti-AQP4 que apresentavam: quadro clínico restrito
ao nervo óptico ou à medula espinhal ou alterações clínicas atribuíveis a
lesões cerebrais, diencefálicas ou do tronco encefálico (particularmente
no assoalho do quarto ventrículo). Assim, criou-se o conceito de espectro
de manifestações de NMO (ENMO).
Um consenso internacional de especialistas em NMO publicado no
ano de 2015 definiu as manifestações clínicas que compõem o chamado
ENMO a partir da presença ou da ausência do marcador sorológico an-
ti-AQP4 (Quadro 1).
Fisiopatologia
A histopatologia da NMO é caracterizada pela presença de células, eo-
sinófilos, neutrófilos, mediadores solúveis, imunoglobulinas (Ig) e pro-
dutos finais do complemento (C) nas lesões com componentes axonais
e desmielinizantes presentes nas autópsias de pacientes com NMO. A
descoberta do anticorpo NMO-IgG associado a depósitos de Ig e C re-
Prognóstico
O prognóstico da NMO está associado à gravidade e à frequência de re-
corrência dos eventos, estimada em 60% no primeiro ano e em 90% nos
três anos subsequentes. Após cinco anos, cerca de 50% dos pacientes es-
tarão legalmente cegos uni- ou bilateralmente e incapazes de deambular
sem auxílio4.
A soropositividade da AQP4 não está relacionada com gravidade da
evolução clínica, frequência e intervalo dos surtos nem à gravidade e à
incapacidade a longo prazo. A presença da síndrome clínica e sorológica
anti-MOG parece estar correlacionada a uma evolução mais benigna da
doença9.
Em séries brasileiras, foram encontradas altas taxas de mortalidade.
Duas séries no estado de São Paulo encontraram taxas de mortalidade de
9% (4/36) e 14,3% (4/28)28,29. Nessa última série, os óbitos foram decorren-
tes de insuficiência respiratória (três por MTLE e um por tromboembo-
Referências
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litis optica. Neurology. 2013;81(14):1197-204.
Introdução
O
surto (recidiva, exacerbação, ataque, crise, agudização) devido à
esclerose múltipla (EM) refere-se a um evento desmielinizante in-
flamatório agudo no sistema nervoso central (SNC), objetivamente
observado ou relatado pelo paciente, com duração de pelo menos 24 ho-
ras, na ausência de febre ou infecção1. O surto da EM representa a ex-
pressão clínica de uma lesão focal inflamatória desmielinizante no SNC.
O advento da imagem por ressonância magnética (IRM) tem demonstra-
do inequivocamente que a EM é frequentemente ativa mesmo que não
ocorram novas manifestações clínicas. A sintomatologia clínica depende
da localização da lesão, sendo algumas áreas mais eloquentes que outras,
como o nervo óptico, a medula espinhal e o tronco encefálico2.
Os surtos podem ser classificados de acordo com a interferência nas
atividades da vida diária (AVD). O surto leve não interfere nas AVD; o
surto moderado interfere nas AVD; o surto grave requer hospitalização
e cuidados de enfermagem. Muitos surtos caracterizam-se por eventos
neurológicos graves — amaurose unilateral, hemiparesia ou parapare-
sia graves, síndromes de tronco encefálico, ataxia, diplopia, entre outros
— que requerem muitas vezes hospitalização com intervenção medica-
mentosa. Surtos leves caracterizados por sintomas sensitivos focais dis-
cretos geralmente não são tratados, a não ser que evoluam com dor ou
disestesia3.
Quando não havia tratamento específico, acreditava-se que a história
natural de um ataque agudo seria a recuperação espontânea e completa
Método
Os ensaios clínicos terapêuticos sobre o uso do ACTH, glicocorticoides,
plasmaférese, imunoglobulina intravenosa e anticorpos monoclonais no
tratamento do surto da EM foram pesquisados a partir de busca eletrô-
nica sistemática nos seguintes bancos de dados: The Cochrane Multiple
Sclerosis Group Trials Register e The Cochrane Central Register of Con-
trolled Trials (CENTRAL) “The Cochrane Library” desde os primeiros
registros até 30 de junho de 2015. Nesses bancos de dados são incluídas
revisões sistemáticas com metanálises envolvendo somente ensaios clíni-
cos controlados analisando a eficácia de intervenções terapêuticas versus
placebo.
A estratégia de busca utilizou as seguintes combinações: glucocorti-
coids OR corticosteroids OR steroids AND multiple sclerosis; intravenous
immunoglobulin AND multiple sclerosis; plasma exchange OR plasma-
pheresis AND multiple sclerosis; e monoclonal antibodies AND multiple
sclerosis. Somente os estudos que abordaram o tratamento dos surtos de
pacientes com EM foram elegíveis.
A qualidade das evidências foi avaliada pelo Grading of Recommen-
Resultados
Evidências para o uso de glicocorticoides ou hormônio adreno-
corticotrófico no tratamento do surto da esclerose múltipla. De
dez estudos identificados, um estudo foi elegível. O estudo de Citterio
et al. revisou as evidências para o uso de glicocorticoides ou ACTH no
tratamento do surto na EM6. Essa revisão incluiu seis estudos publicados,
perfazendo um total de 377 pacientes. Os objetivos primários da revi-
são foram: determinar a eficácia do glicocorticoide ou do ACTH versus
placebo na diminuição da incapacidade em pacientes com EM em surto,
na redução de risco de novas exacerbações durante o seguimento e na
prevenção da progressão da incapacidade no seguimento a longo prazo6.
51
(detecção) apresentou alto risco de viés e o número de participantes in-
cluídos foi baixo (13% dos participantes)12.
De modo geral, a evidência é limitada pela pequena amostra de par-
ticipantes. A técnica de randomização e alocação foi frequentemente in-
certa. O número de participantes excluídos e que tiveram perda de segui-
mento foi baixo. De modo geral, somente sete de 377 (2%) participantes
foram excluídos das análises. Nenhuma heterogeneidade estatisticamente
significante foi evidenciada para os desfechos primários de tratamento
relacionado ao surto6.
Tabela 3. Proporção de pacientes com melhora do escore da EDSS após tratamento com
glicocorticoides orais versus intravenosos.
Desfecho ou Estudos Participantes Método Tamanho do
subgrupo (n) (n) estatístico efeito
Proporção de
pacientes com
melhora no escore
Odds ratio 0,60
da EDSS após 4 200
(M-H, aleatório, IC 95%) (0,28, 1,26)
tratamento com
glicocorticoides na
4ª semana
Conclusões
Uso de glicocorticoides no tratamento dos surtos na esclerose
múltipla. O corticoide pode ser considerado o tratamento imunológico
mais antigo para EM, não sendo usado como terapia modificadora da
doença devido aos efeitos adversos graves associados a seu uso crônico e
pelo desenvolvimento dos atuais fármacos modificadores da doença. Por
outro lado, o glicocorticoide representa o melhor tratamento disponível
para induzir remissão mais rápida de um surto na EM.
De modo geral, a revisão de Citterio et al. mostrou que a administra-
ção de metilprednisolona ou ACTH favoreceu a recuperação da exacer-
bação aguda em pacientes com EM: o uso de um desses agentes diminuiu
em mais de 60% a probabilidade de o quadro clínico piorar ou permanecer
estável dentro das primeiras cinco semanas de tratamento. Os dados fo-
ram insuficientes para permitir uma estimativa confiável dos efeitos dos
corticoides na prevenção de novos surtos e na piora da incapacidade a
longo prazo6. Em resumo, a qualidade da evidência pode ser graduada
como moderada para uso de glicocorticoides e de ACTH (notadamente a
metilprednisolona) no tratamento dos surtos da EM.
Na maioria das vezes, a administração intravenosa de glicocorticoides,
mesmo se limitada a três dias, necessita de hospitalização do paciente
ou tratamento domiciliar com auxílio de profissionais com consequente
aumento do estresse individual do paciente e custos institucionais. Além
disso, terapia intravenosa está associada com custos indiretos, como
perda de produtividade e custos relacionados à força de trabalho. A me-
tanálise da Cochrane Library realizada por Burton et al., que analisou
a eficácia da administração oral versus intravenosa de glicocorticoides,
não evidenciou nenhuma significância estatística nos desfechos clínicos,
radiológicos ou farmacológicos13. Os principais problemas relacionados
com os estudos revisados foram o intervalo de tempo entre o início dos
sintomas e o início do tratamento (um mês), a ausência de métodos claros
de randomização ou ocultação de alocação, um cegamento inadequado
Referências
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ald Criteria. Ann Neurol. 2011;69(2):292-302.
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sman H, McDonald I, Miller D, et al. (Eds.). McAlpine’s Multiple Sclerosis. 4.ed. New York: Churchill Livingstone.
2006. pp.683-99.
3. Paty DW, Hartung HP, Ebers GC, Soelberg-Sorensen P, Abramsky O, Kesselring J. Management of relapsing-remit-
ting multiple sclerosis: diagnosis and treatment guidelines. Eur J Neurol. 1999;6:S1-35.
4. Moreira MA, Lana-Peixoto MA, Callegaro D, et al. Consenso Expandido do BCTRIMS para o tratamento da
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Lancet. 1961;2(7212):1120-2.
Imunomoduladores
injetáveis no tratamento
da esclerose múltipla
Elizabeth Regina Comini Frota (coordenadora)
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos
Marcos Moreira
C a pítu l o 4
Imunomoduladores
injetáveis no tratamento
da esclerose múltipla
Elizabeth Regina Comini Frota (coordenadora)
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos
Marcos Moreira
Introdução
H
á pouco mais de 20 anos, nenhum tratamento interferia na evolução
da esclerose múltipla (EM). Naquela época, os surtos clínicos da
doença eram os parâmetros para se entender a evolução e muito
pouco se sabia da degeneração, muito menos dos parâmetros de resso-
nância magnética (RM) que conhecemos hoje. Quatro medicamentos
foram introduzidos na década de 1990 para a prevenir os surtos e, com
isso, modificar a evolução. Esses medicamentos tornaram-se conhecidos
como fármacos modificadores da doença (FMDs). Os ensaios clínicos
iniciais foram randomizados, duplo-cegos e controlados com placebo e
utilizaram como desfecho a ocorrência de surtos1-5. Esses primeiros es-
tudos utilizaram como parâmetro de evolução da doença a manifestação
clínica. Dessa forma, foram selecionados pacientes com uma grande va-
riação de tempo de doença e com elevada média de surtos prévios. Pos-
teriormente, isso trouxe dificuldades de comparação com ensaios clínicos
mais recentes, nos quais os parâmetros utilizados permitiram a seleção de
pacientes com perfil de doença mais leve.
Após, se iniciar a utilização desses medicamentos, houve um grande
desenvolvimento do conhecimento da doença. O uso dos FMDs promo-
veu grande incremento nos estudos e grande avanço nos métodos e na in-
terpretação da RM, o que, por sua vez, proporcionou que se conhecessem
melhor a inflamação e a degeneração que ocorrem na EM desde o início.
Os conhecimentos da RM avançaram a tal ponto que em menos de uma
década os critérios diagnósticos de McDonald (2001) foram revistos duas
Objetivo
Esta revisão teve como objetivo principal estabelecer recomendações para
uso de IFN e AG com base na análise dos resultados de estudos que nos
últimos dez anos abordaram a eficácia dos FMDs quanto aos parâmetros
clínicos e de neuroimagem e à migração entre as diferentes formulações
de IFNs e entre estas e o AG.
Método
Para este capítulo, foi necessário controlar e especificar os descritores,
devido ao grande número de publicações com esses fármacos nos últimos
anos. Para responder aos objetivos, foram selecionados estudos pivotais,
revisões sistemáticas, estudos observacionais de longo tempo de uso, es-
tudos comparativos entre fármacos após 2005. As bases de dados utiliza-
das foram o Medline (PubMed) e a Cochrane Library, para cada uma das
intervenções propostas: betainterferona 1A intramuscular (IFN 1a IM),
betainterferona 1A subcutânea 22 e 44 mcg (IFN 1a SC 22 e 44 mcg),
betainterferona 1b (IFN 1b) e AG, utilizando os descritores “lesion”, “pro-
gression” e “MRI” no título ou no sumário, com data posterior a 1o de janei-
ro de 2005. Paralelamente foi realizada busca ativa dos estudos pivotais,
randomizados, duplo-cegos e controlados com placebo de cada fármaco.
Resultados
Foram encontrados no total 511 estudos de acordo com os descritores
mencionados e critérios estabelecidos: conter pelo menos dois FMDs, ser
estudo randomizado, duplo-cego ou observacional aberto de longa efeti-
vidade, comparativo entre fármacos ou entre formulações de fármacos,
metanálises e revisões sistemáticas.
Probabilidade
CHAMPS13 2000 Interferona 1a, IM 190 183 Monofocal 0,49 (0,33-0,43) 20 38
de EMRR
Proporção de Mono- ou
ETOMS14 2001 Interferona 1a, SC ld 155 154 0,61 (0,31-0,99) 34 45
EMRR polifocal
Proporção de Mono- ou
BENEFIT15 2006 Interferona 1b 176 192 0,50 (0,,36-0,70) 28 45
MD 2001 polifocal
Tempo p/
PRECISE16 2009 Acetato de glatirâmer 238 243 Monofocal 0,55 (0,40-0,77) 25 43
EMRR
71
McDonald (2001), serem formulados, e três, depois dessa data. A defini-
ção de síndrome clínica isolada mudou com a revisão de 2010, segundo
o Painel Internacional de Esclerose Múltipla, e cerca de metade dos pa-
cientes selecionados para esses estudos depois de um primeiro evento
desmielinizante preencheria os critérios atuais de EM definida, tornando
esses estudos praticamente obsoletos para síndrome clínica isolada20.
Análises post hoc desses estudos, principalmente no tocante à evolução
dos braços placebo, foram essenciais para se definirem os pacientes com
alto grau de conversão para EM. Observou-se que pacientes com lesões
assintomáticas têm alto grau de conversão para EM, e quanto maior o vo-
lume de lesão em T2, maior o risco e, além disso, lesões evidenciadas pelo
gadolínio (GAd+) no primeiro evento também são marcadores de risco
de conversão18. Acredita-se que o maior risco seja logo depois do primeiro
evento, e quanto mais tempo se passa assintomático, o risco vai diminuin-
do18. Pacientes que não apresentam outras lesões assintomáticas têm baixo
risco de conversão. Em relação aos sintomas, neurite óptica tem a maior
possibilidade de ocorrer sem outras lesões assintomáticas, e o menor ris-
co de conversão para EM, comparando-se com outras localizações, como
mielite e síndromes do tronco encefálico. À medida que pacientes com
neurite óptica foram envolvidos (52%) nos estudos, incluindo pacientes
sem lesões assintomáticas (30%), passou a não ser possível comparar os
resultados com pacientes que iniciaram a doença em outras localizações
e que tenham realmente risco de conversão para EM em até dois anos18.
Os critérios do Painel Internacional de Esclerose Múltipla de 2010
amplificaram sobremaneira o diagnóstico precoce de EM8. Hoje, síndro-
me clínica isolada é definida como qualquer evento desmielinizante ini-
cial da doença e que no curso da investigação é possível que já seja uma
doença definida, EM ou neuromielite óptica, ou que seja um episódio de
alto risco para conversão em uma das duas, dependendo dos outros co-
memorativos. Um grande estudo multicêntrico envolvendo 1.047 pacien-
tes com síndrome clínica isolada com seguimento de 4,3 anos mostrou
uma taxa de conversão de 67% dos pacientes nesse período. Preditores de
conversão também foram analisados. Índice de imunoglobulina G, núme-
ro de lesões na RM (2-9) e idades mais baixas conferiram maior risco. Não
é possível extrapolar nem analisar os resultados dos estudos que envolve-
ram síndrome clínica isolada para uma síndrome clínica isolada sem risco
de conversão para EM19. Nesse caso seriam necessários novos estudos
REGARD25 Interferona 1a, 44 mcg, 3 x 386 RR Tempo p/ próximo surto 24 0,923 (0,77-1,14) 85
2008 Acetato de glatirâmer 378 54
Interferona 1a, 44 mcg 55 RR Lesões corticais 24 9
CALABRESE26
Interferona 1a, 30 mcg 55 8
2012
Acetato de glatirâmer 55 7
Acetato de glatirâmer 259 RR TAS 36 1,27 (0,92-1,76) 36
COMBIRX27
Interferona 1a, IM 250 56
2013
Acetato de glatirâmer + interferona 1a, IM 499 SD
Risk ratio: mede, entre outros, a diferença do resultado entre os grupos. Quanto mais próximo de um, mais similares são os resultados. SCI: síndrome clínica isolada.
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Anticorpos monoclonais
em esclerose múltipla
Maria Lucia Vellutini Pimentel (coordenadora)
Antonio Lucio Teixeira Junior
Soniza Vieira Alves-Leon
Thiago de Faria Junqueira
C a pítu l o 5
Anticorpos monoclonais
em esclerose múltipla
Maria Lucia Vellutini Pimentel (coordenadora)
Antonio Lucio Teixeira Junior
Soniza Vieira Alves-Leon
Thiago de Faria Junqueira
Introdução
A
esclerose múltipla (EM) foi a primeira enfermidade neurológica a
receber aprovação para tratamento com um anticorpo monoclonal.
O tratamento específico da EM ocorreu somente no final da década
de 1980, com a aprovação do primeiro fármaco imunomodulador, a betain-
terferona, seguida do acetato de glatirâmer. Apesar da eficácia na redução
da frequência dos surtos e no acúmulo da incapacidade, essas medicações
não conseguiram impedir a progressão da doença de forma completa ou
reverter a incapacidade e as lesões preexistentes no sistema nervoso cen-
tral (SNC). Em 2004, foi aprovado o primeiro anticorpo monoclonal para
o tratamento da EM, com um mecanismo de ação distinto dos fármacos
imunomoduladores. A eficácia dos anticorpos monoclonais foi comprova-
da pela redução da taxa anualizada de surtos, do número de novas lesões,
do risco de incapacidade e do grau de atrofia cerebral. Entre os anticorpos
monoclonais, há o natalizumabe e, mais recentemente, o alentuzumabe,
ambos aprovados para uso na EM. O rituximabe, indicado oficialmente
para tratamento de linfoma de células B, tem sido empregado de forma
off-label na EM. Outros anticorpos monoclonais com potencial terapêu-
tico para EM estão sendo testados em estudos clínicos de fases II e III.
Objetivo
O propósito deste capítulo é pesquisar na literatura indexada os estudos
clínicos com anticorpos monoclonais para pacientes com EM, analisar
Método
Foram pesquisados estudos clínicos sobre uso de anticorpos monoclonais
em pacientes com EM nas bases de dados PubMed/Medline. Para análise
de eficácia e segurança, foram selecionados os estudos de intervenção du-
plo-cegos, randomizados, comparados a placebo ou a imunomodulador,
com desfechos primários ou secundários relacionados a diminuição na
taxa anualizada de surtos, progressão de incapacidade, ganho de carga
lesional e grau de atrofia cerebral. Para análise da qualidade de evidência
dos estudos clínicos, foi utilizado o sistema de avaliação de qualidade de
evidência GRADE (Grading of Recommendations Assessment, Develop-
ment and Evaluation). Foram ainda consultados estudos observacionais
que abordassem questões sobre eficácia e segurança do uso de anticorpos
monoclonais na EM.
Resultados
Para o natalizumabe, foram selecionados 17 estudos, sendo dois clínicos
de intervenção, uma metanálise e o restante, estudos observacionais rela-
cionados à eficácia e à segurança do fármaco.
Para o alentuzumabe, foram selecionados 11 estudos, três de interven-
ção randomizados, um de intervenção open-label, um de revisão, quatro
observacionais, abordando segurança, e dois sobre mecanismo de ação.
Para o daclizumabe, foram selecionados sete estudos, três de interven-
ção, um observacional sobre segurança, um de revisão, um sobre meca-
nismo de ação e um sobre informações gerais da medicação.
Para o rituximabe, foram incluídos três estudos, sendo um de revisão e
os outros dois observacionais abordando eficácia e segurança.
Natalizumabe
O natalizumabe é um antagonista da integrina α4 (subunidades β1 e β7),
molécula esta expressa na superf ície dos leucócitos, tendo um papel es-
Negativo Positivo
Sem Com
imunossupressão imunossupressão
prévia prévia
Natalizumabe ≤ 0,1
0,53 em 1.000 1,5 em 1.000
0-24 meses em 1.000
Natalizumabe ≤ 0,1
3,9 em 1.000 10,6 em 1.000
> 24 meses em 1.000
Alentuzumabe
O alentuzumabe é um anticorpo monoclonal humanizado, contra a mo-
lécula CD52, expresso na superf ície de linfócitos T e B maduros e não em
seus precursores, cuja função ainda não está bem definida. O bloqueio
dessa molécula leva à eliminação rápida e prolongada de linfócitos ma-
duros. A medicação é administrada em cinco doses no primeiro ano e
em três doses no segundo ano, ocorrendo uma rápida recuperação dos
linfócitos B, e um período de até cinco anos para que os linfócitos T re-
tornem ao padrão anterior ao tratamento. Essa modificação prolongada
no padrão do sistema imune foi relacionada à sua eficácia17-19.
O alentuzumabe, em estudos randomizados abertos, mostrou eficácia
na redução da atividade da doença em pacientes com EMRR sem história
de tratamento prévio e naqueles com falha terapêutica à betainterferona
1a, 44 mcg, e ao acetato de glatirâmer20. Em estudos de fases II e III, mos-
trou eficácia na supressão de surtos em comparação à betainterferona
1a 44 mcg. Estudos de fase II randomizados compararam alentuzumabe
12 mg versus 24 mg, versus betainterferona 1a 44 mcg, tendo mostrado
maior eficácia do alentuzumabe21,22.
Estudos de fase III, randomizados e controlados, compararam alen-
tuzumabe 12 mg versus betainterferona 1a 44 mcg17,20-23 e encontraram
resultados semelhantes aos anteriores. No estudo CARE-MS II (Com-
parison of Alemtuzumab and Rebif® Efficacy in Multiple Sclerosis, Study
Daclizumabe
O daclizumabe é um anticorpo monoclonal IgG1 humanizado que se liga
à subunidade alfa do receptor de IL-2 (CD25) em linfócitos ativados e
inibe a ligação de IL-2. Como consequência, os receptores são satura-
dos, não ocorrendo ativação e nem expansão das células T. Foi aprovado
pela FDA para profilaxia da rejeição aguda de órgãos, em pacientes com
transplante renal, sendo considerado um imunossupressor28. Desfechos
clínicos e radiológicos favoráveis nos estudos com pacientes com EM as-
sociaram-se à expansão de células NK CD56+ regulatórias28.
Uma revisão sistemática publicada em 2013 incluiu dois estudos con-
trolados e randomizados que avaliaram 851 pacientes com EMRR sub-
metidos ao uso de daclizumabe por dois anos como terapia de adição ou
monoterapia29-31. Em relação aos desfechos principais de progressão de
doença e à proporção de pacientes que apresentaram novos surtos, não
houve diferenças significativas entre os grupos de estudo, demonstrando
que as evidências foram insuficientes para determinar se daclizumabe é
mais eficaz do que placebo em pacientes com EMRR, tanto em desfe-
chos clínicos quanto de imagem. Em ambos os estudos, o medicamento
se mostrou relativamente bem tolerado.
O daclizumabe foi avaliado em recente estudo randomizado, de fase
III, DECIDE (Efficacy and Safety of Daclizumab High Yield Process Versus
Interferon β 1a in Patients with Relapsing-Remitting Multiple Sclerosis),
que envolveu mais de 1.800 pacientes com EMRR para receberem da-
clizumabe HYP (high yieldprocess) 150 mg, SC, a cada quatro semanas, ou
betainterferona 1a 30 µg/semana, IM32. O grupo daclizumabe apresentou
redução significativa de 45% na taxa anualizada de surtos comparada à do
Rituximabe
O rituximabe é um anticorpo monoclonal quimérico IgG1 direciona-
do contra a molécula CD20 dos linfócitos B. Seu efeito se dá através de
apoptose, citotoxicidade mediada por células dependentes de anticorpos
(ADCC), ou seja, ligação ao CD20, permitindo a citólise dos linfócitos B
por células citolíticas34. Desenvolvido originalmente para tratamento de
linfoma de células B, possui liberação da FDA para tratamento também
de outras doenças, incluindo leucemia linfoide crônica, poliangeíte mi-
croscópica e artrite reumatoide. Apesar de não ser aprovado para EM, o
rituximabe tem sido empregado de forma off-label35.
Revisão da Cochrane Database recente36 avaliou estudos duplo-cegos,
controlados e randomizados, com duração maior do que um ano, que
empregaram rituximabe no tratamento da EMRR como monoterapia ou
terapia de adição (add-on), tendo um estudo preenchido esses critérios e
sido incluído na análise37. Nesse estudo, 104 pacientes com EMRR e EDSS
≤ 5,0, com ao menos um surto no último ano, foram submetidos ao trata-
mento com rituximabe 1.000 mg, IV, (nos 1o e 15o dias), ou placebo. Ao fi-
Conclusão final
O tratamento da EM deve ser individualizado e seguir parâmetros clí-
nicos, de neuroimagem e de fatores de risco associados a cada paciente.
Na maioria das diretrizes, os tratamentos de maior eficácia são indicados
quando houver falha terapêutica aos tratamentos denominados de “pri-
meira linha” (betainterferona e acetato de glatirâmer)38-40.
Os estudos revistos para este capítulo permitem-nos concluir que o
natalizumabe, até o momento, é o anticorpo monoclonal que mostrou
evidência elevada para uso na EMRR, quando se trata dos desfechos con-
trole de surtos, aparecimento de novas lesões e evidência moderada para
controle da incapacidade, necessitando de um acompanhamento estrito
devido ao risco de desenvolvimento de LEMP.
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Tratamento com
fármacos orais em
esclerose múltipla
Anderson Kuntz Grzesiuk (coordenador)
Elza Dias Tosta
Jefferson Becker
José Artur Costa D’Almeida
Maria Lúcia Brito Ferreira
C a pítu l o 6
introdução
O
tratamento farmacológico da esclerose múltipla (EM) passou por
uma revolução há cerca de 20 anos, após a introdução, em 1993, da
betainterferona 1-b (Betaseron®/Betaferon®), o primeiro fármaco de
uma categoria denominada terapia modificadora de doença. Seguiram-se
a betainterferona 1-a intramuscular (Avonex®) em 1996, o acetato de gla-
tirâmer (Copaxone®) em 1997 e a betainterferona 1-a subcutânea (Rebif®)
em 19981. Esses medicamentos de uso parenteral são considerados imuno-
moduladores e constituem a denominada primeira linha de tratamento em
todos os protocolos de tratamento da EM na forma remitente-recorrente
(EMRR) no mundo. A despeito de sua relativa eficácia na redução do nú-
mero de surtos anuais e de sua influência sobre a progressão da incapaci-
dade, esses fármacos injetáveis demonstram uma queda na adesão ao lon-
go do tratamento, seja por efeitos colaterais, por dificuldades no manuseio
da forma injetável, pela perda da eficácia, seja por fobia no uso de agulhas2.
Não obstante esses fatores negativos, esses fármacos têm demonstrado ao
longo destes anos um padrão de segurança bastante satisfatório, incutin-
do confiança ao prescritor. A investigação e o desenvolvimento de novos
tratamentos para a EM resultaram recentemente no lançamento de no-
vos fármacos, tanto de uso parenteral quanto por via oral. Esses novos
fármacos melhoraram a eficácia do tratamento e facilitaram a adesão por
sua praticidade de uso, porém impuseram maiores cuidados no tocante à
farmacovigilância, pois seu tempo de uso comercial ainda é reduzido na
Fingolimode
O fingolimode foi aprovado como primeira linha de tratamento pela
US Food and Drug Administration (FDA), em 2010, para pacientes com
EMRR4, com base nos resultados de dois estudos (FREEDOMS [Efficacy
and Safety of Fingolimod in Patients with Relapsing-remitting Multiple Scle-
rosis] e TRANSFORMS [Efficacy and Safety of Fingolimod in Patients with
Relapsing-remitting Multiple Sclerosis with Optional Extension Phase]).
Em 2011, seu uso para forma EMRR foi aprovado pela Agência Nacional de
O risco fetal e a neonatos tem sido referido como efeito adverso grave,
sendo o fingolimode considerado risco C na gravidez. No entanto, ainda
não existe consenso quanto a recomendações para pacientes do sexo mas-
culino22. A mulher em idade fértil, recomendam-se11,13:
• Uso de contraceptivos orais ou injetáveis durante todo o tratamento.
• Caso a mulher decida engravidar no curso do tratamento, deverá
suspender o uso do fármaco por, no mínimo, dois meses, intervalo de
tempo necessário à completa depuração do fingolimode, mantendo a
contracepção durante esse período.
• Recomendação para que evite aleitamento materno durante todo o
período de uso do fármaco13.
Os efeitos adversos mais frequentes, porém de menor gravidade, in-
cluem: infecção dos tratos respiratório e urinário, cefaleia, tontura, fadiga,
sintomas influenza-like, náusea, diarreia, dor lombar ou em membros,
artralgia, mialgia, tosse, dispneia, depressão, hipertensão arterial e linfo-
citopenia12,23. Recentemente foram relatados dois casos de leucoencefa-
lopatia multifocal progressiva em pacientes em uso de fingolimode, sem
uso prévio de natalizumabe ou imunosupressor24. Em um desses casos, o
Teriflunomida
Ao longo da década de 1980, a leflunomida foi descoberta como um po-
tente agente imunossupressor, sendo aprovada pela FDA em 1998 para
uso na artrite reumatoide. A leflunomida mostrou-se ainda eficiente em
modelos animais de doenças neuroimunológicas, como a neurite e a ence-
falite autoimune experimental. No entanto, essa medicação é, na verdade,
um pró-fármaco, sendo rápida e não enzimaticamente convertida em um
metabólito ativo, a teriflunomida28. Estudos posteriores foram feitos com
a teriflunomida que igualmente se mostrou eficaz em modelos animais de
Progressão da incapacidade
116 menos
Estudo 425/843 418/843 HR 0,70 por 1.000 (de
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (50,4%) (49,6%) (0,52 a 0,96) 14 menos a ELEVADA
⨁⨁⨁⨁
199 menos)
Carga lesional em T2
Estudo 370/709 339/709 Não
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (52,2%) (47,8%) estimável ELEVADA
⨁⨁⨁⨁
HR: hazard ratio. *Considerando apenas os pacientes em uso de fingolimode 0,5 mg/dia.
Progressão da incapacidade
Estudo 429/860 431/860 Não
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (49,9%) (50,1%) estimável ELEVADA
⨁⨁⨁⨁
Carga lesional em T2
111
Estudo 370/709 339/709 Não
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (52,2%) (47,8%) estimável ELEVADA
⨁⨁⨁⨁
HR: hazard ratio. *Considerando apenas os pacientes em uso de fingolimode 0,5 mg/dia.
neurite e encefalite autoimune experimental, estimulando seu estudo em
pacientes com EM29.
A teriflunomida é um inibidor não competitivo e reversível da enzima
mitocondrial desidrogenase di-hidro-orotada (DHODH). O pool celular
do nucleotídeo pirimidina é proveniente de uma via de salvamento inde-
pendente da DHODH, ou, em situações em que há necessidade de grande
proliferação celular, de uma via de síntese “de novo”, dependente dessa en-
zima. A teriflunomida, portanto, age apenas em células como os linfócitos
em grande proliferação, e não em células em repouso ou em expansão
homeostática. Desse modo, pode-se dizer que essa medicação age apenas
em situações em que a função celular esteja hiper-reativa, sem impedir o
metabolismo homeostático básico28-32. Além disso, a teriflunomida inibe a
atividade da proteína tirosina-quinase, reduzindo assim a proliferação de
células T, a ativação e a produção de citocinas (interlueucina-2 [IL-2], IL-4,
IL-7, IL-9, IL-15 e IL-21)28,30. Ademais, a medicação interfere na interação
entre os linfócitos T e as células apresentadoras de antígenos, cruciais na
resposta imune celular. Por fim, existem evidências de que a teriflunomida
possa bloquear o fator de necrose tumoral-alfa, induzir a ativação do fator
nuclear κB e inibir moléculas de adesão celular e metaloproteinases30,33.
Em resumo, na EM a ação da teriflunomida é importante por promover
um efeito citostático nos linfócitos T e B em proliferação, reduzindo desse
modo a quantidade de células T e B ativadas no SNC e, provavelmente,
também na periferia, diminuindo o número de linfócitos disponíveis para
migrar para o SNC28-32. Essa medicação apresenta assim um efeito anti-
proliferativo e anti-inflamatório, sem aparente citotoxicidade34.
A teriflunomida tem uma alta ligação proteica no plasma (99,3%) e um
baixo volume de distribuição. A biodisponibilidade oral da medicação é
de 100%. Apesar de a ingesta associada a alimentos retardar sua absorção,
isso não afeta a farmacocinética do fármaco no plasma. O nível plasmá-
tico de pico é atingido entre uma e duas horas. A meia-vida em humanos
é de cerca de 10 a 14 dias, atingindo níveis plasmáticos estáveis após 20
semanas. A teriflunomida é eliminada via excreção na bile na forma não
modificada do fármaco, e na urina, como um metabólito. Uma vez que a
recirculação êntero-hepática é significativa, a remoção plasmática total é
muito baixa. Contudo, essa medicação pode ser rápida e eficientemente
eliminada mediante o uso de colestiramina ou de carvão ativado, pois
estes reduzem a meia-vida da teriflunomida para um a dois dias. Esse fár-
Progressão da incapacidade
116 menos
Estudo 359/722 363/722 HR 0,70 por 1.000
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (49,7%) (50,3%) (0,51 a 0,97) (de 11 menos ELEVADA
a 203 menos)
⨁⨁⨁⨁
Volume de lesão em T2
Estudo 359/722 363/722 Não
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (49,7%) (50,3%) estimável ELEVADA
⨁⨁⨁⨁
Progressão da incapacidade
128 menos
Estudo 370/777 407/777 HR 0,68 por 1.000
1 Improvável Não Não Não Não
randomizado (47,6%) (52,4%) (0,47 a 1,00) (de 0 menos a ELEVADA
229 menos)
⨁⨁⨁⨁
115
*Apenas pacientes em uso de teriflunomida 14 mg/dia.
rato de dimetila é rapidamente convertido em seu metabólito ativo (fu-
marato de monometila) através das hidrolases do trato gastrointestinal,
atingindo sua concentração plasmática máxima entre 2 e 2,5 horas após
a ingestão do medicamento. Devido a sua farmacocinética linear, pode
ser ministrado em jejum ou combinado com alimentos, não ocorrendo
alteração em sua eficácia. O fumarato de monometila é metabolizado em
água e dióxido de carbono pelo ciclo do ácido cítrico, não havendo me-
tabolismo pela via do citocromo P450. Seu principal meio de excreção é
realizado pela via respiratória através da exalação do dióxido de carbono,
não existindo a necessidade de ajuste posológico em caso de disfunção
renal ou hepática42.
Assim como ocorrem com os imunomoduladores injetáveis, o BG-12
não apresenta um mecanismo de ação único, mas atua através de vários
mecanismos biológicos, muitos deles ainda não totalmente elucidados.
Sua atividade anti-inflamatória ocorre tanto por sua ação linfocitária
quanto pela ação sobre a migração celular. Observam-se redução nos leu-
cócitos circulantes e inversão de resposta de Th1 para Th2, através da
elevação das IL-4, IL-5 e IL-10, assim como redução na regulação das mo-
léculas-1 de adesão intracelular, vascular e selectina-E, dificultando, dessa
forma, a passagem de linfócitos T ativados através da barreira hematoen-
cefálica. A ação do fumarato de dimetila ativando a via de transcrição
Nrf2 sinaliza que esse medicamento tem ação sobre o estresse oxidativo,
exercendo assim um efeito neuroprotetor. A ação desse fármaco sobre a
PGE₂ nos queratinócitos via ciclooxigenase-2 (COX-2) é a responsável
pelo rubor facial, principal efeito colateral observado nos estudos. Não
existem evidências de efeito imunossupressor do BG-1240,42.
A eficácia desse fármaco e sua recente aprovação pela FDA (2013) e
pela EMA (2014) para o tratamento da EMRR basearam-se em três estu-
dos clínicos randomizados, sendo dois estudos de fase III (CONFIRM e
DEFINE [2012])43,44. Esses estudos de fase III demonstraram que na dose
-padrão houve, em relação ao placebo, redução de 48% (DEFINE) e 44%
(CONFIRM) na taxa anualizada de surtos. A progressão da incapacidade
em dois anos foi de 38% no estudo DEFINE, não sendo observada diferen-
ça significativa no estudo CONFIRM. A redução no número de novas le-
sões em T2 na ressonância magnética foi de 85% (DEFINE) e 71% (CON-
FIRM), assim como de 90% (DEFINE) e 74% (CONFIRM) no número de
lesões captantes de contraste depois de dois anos de acompanhamento. O
118
Análise da qualidade Nº de pacientes Efeitos
Nº de Desenho do Risco de Evidência Outras Fumarato de Relativo Absoluto Qualidade
Inconsistência Imprecisão Placebo
estudos estudo víés indireta considerações dimetila (IC de 95%) (IC de 95%)
Redução no número de surtos
Estudo 410/818 408/818 OR 0,42 204 menos por 1.000 (de
1 Improvável Não Não Não Não ELEVADA
randomizado (50,1%) (49,9%) (0,31 a 0,57) 137 menos a 263 menos)
⨁⨁⨁⨁
Progressão da incapacidade
Estudo 410/818 408/818 HR 0,62 150 menos por 1.000 (de
1 Improvável Não Não Não Não ELEVADA
randomizado (50,1%) (49,9%) (0,44 a 0,87) 47 menos a 237 menos)
⨁⨁⨁⨁
Carga lesional em T2
Estudo Pouco 152/317 165/317 Não
1 Não Não Não Não MODERADA
randomizado provável1 (47,9%) (52,1%) estimável
⨁⨁⨁
HR: Hazard ratio; OR: Odds ratio. *Considerando os pacientes em uso de BG-12 na dose de 240 mg, duas vezes ao dia. 1Apenas 37,07% dos pacientes em uso de BG-12 240 mg, duas vezes ao dia, foram avaliados no desfecho “carga lesional
em T2”.
Progressão da incapacidade
Estudo 359/722 363/722 HR 0,79 79 menos por 1.000 (de 51
1 Improvável Não Não Não Não ELEVADA
randomizado (49,7%) (50,3%) (0,51 a 0,86) menos a 203 menos)
⨁⨁⨁⨁
Carga lesional em T2
Estudo Pouco 140/279 139/279 Não
RR: Rate ratio; HR: Hazard ratio. *Considerando os pacientes em uso de BG-12 na dose de 240 mg, duas vezes ao dia. 1Apenas 40.9% dos pacientes em uso de BG-12 240 mg, duas vezes ao dia, foram avaliados no desfecho “carga lesional
em T2”.
e a progressão da incapacidade, e qualidade de evidência moderada na
análise da carga lesional em T2. Esses estudos apresentam forte recomen-
dação para o uso do BG-12 em EMRR nos quesitos redução de número de
surtos e carga lesional, porém fraca recomendação no quesito progressão
da incapacidade.
Azatioprina
Medicamentos imunossupressores orais como a azatioprina, o meto-
trexato e a ciclofosfamida, vêm sendo utilizados no tratamento da EM há
mais de 30 anos. A racionalidade desse uso é ser a EM uma enfermidade
autoimune, com a fase inflamatória inicial predominando sobre a fase de-
generativa51. A azatioprina é um agente imunossupressor citotóxico não
específico, que atua na síntese do DNA e inibe a função de linfócitos T.
Esse fármaco é muito utilizado em doenças como a miastenia grave, a
neuromielite óptica e a artrite reumatoide. Seu uso por tempo prolongado
na dosagem preconizada (2-3 mg/kg/dia) deve ser monitorado através de
hemograma (valores de alerta: leucócitos < 3.000/mm3 e linfócitos < 800/
mm3) e provas de função hepática. Nas fases iniciais, deve-se ter aten-
ção quanto à possibilidade de mielossupressão, devido à deficiência da
enzima tiopurina metiltransferase (TPMT) que pode existir em alguns
pacientes. Após a suspensão do fármaco, a recuperação hematológica
costuma ser rápida52. No decorrer do tratamento, recomenda-se também
vigilância em relação ao aparecimento de neoplasias do sistema hemato-
poiético, neoplasias ginecológicas e neoplasias da pele53.
Foram publicadas duas revisões sistemáticas pela Cochrane referentes
ao uso da azatioprina em EM. Na revisão de 2007, na qual foram avalia-
dos cinco estudos randomizados, demonstrou-se que esse fármaco levou
a uma redução na taxa anualizada de surtos de 20% em três anos54. Na
revisão de 2013 foram avaliados 44 estudos randomizados, com 17.401
participantes. Destes, 23 estudos com pacientes na forma clínica EMRR,
abrangendo 9.096 participantes (52%); 18 estudos com pacientes na forma
EMPP, no total de 7.726 participantes (44%); e três estudos com ambas
as formas, sendo a duração dessas avaliações de apenas 24 meses51 . Essa
revisão analisou o papel dos imunomoduladores e imunossupressores na
EM, fazendo uma comparação entre os principais agentes modificadores
da doença, incluindo a azatioprina. Nessa revisão, dois estudos em par-
ticular55,56, ao analisarem o percentual de surtos clínicos em 12, 24 e 36
Qualidade
⨁⨁
⨁⨁
incapacidade em 24 e 36 meses, demons-
BAIXA
BAIXA
traram resultados que favorecem o uso
da azatioprina ao analisar a progressão
(IC de 95%)
Absoluto
da incapacidade, em comparação ao uso
da ciclofosfamida, da betainterferona
Tabela 8. Análise da qualidade da evidência no estudo comparativo entre o uso de azatioprina e betainterferona em esclerose múltipla.
Efeitos
1-b e da betainterferona 1-a em compa-
(IC de 95%)
(0,61 a 0,95)
(0,19 a 0,37)
ração ao placebo. Embora sejam estudos
ARR 0,26
Relativo
AR 0,76
com amostragem reduzida, respaldam a
necessidade de novos estudos com uso
terferona
Betain-
(50,0%)
(51,3%)
da azatioprina nas formas progressivas
61/122
77/150
Nº de pacientes
da EM. Em relação ao uso da azatiopri-
na, esses estudos também apontam que
Azatioprina
(50,0%)
(48,7%)
61/122
73/150
esse fármaco pode ser eficaz para dimi-
nuir a possibilidade de os pacientes com
EMRR terem surtos. Dessa forma, con-
considerações
cluem que: Taxa anualizada de surtos
Carga lesional em T2
Outras
Não
Não
• É prioritário que se façam estudos
de comparação direta entre a azatiopri-
na e a betainterferona 1-a (considerada
Imprecisão
Sério 1
Sério 1
Sério 1
Sério 1
randomizado
randomizado
Estudo
Estudo
incapacidade em 24 e 36 meses.
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Tratamento no
espectro da
neuromielite óptica
Doralina Guimarães Brum (coordenadora)
Alessandro Finkelsztejn
Hideraldo Luis Souza Cabeça
Renata Brant de Souza Melo
C a pítu l o 7
Tratamento no espectro da
neuromielite óptica
Doralina Guimarães Brum (coordenadora)
Alessandro Finkelsztejn
Hideraldo Luis Souza Cabeça
Renata Brant de Souza Melo
Introdução
A
neuromielite óptica (NMO) é uma doença inflamatória do sistema
nervoso central, incapacitante, com taxa de mortalidade anual va-
riando de 9% a 15%. Cegueira e paraparesia grave são sequelas fre-
quentes da doença e podem ocorrer desde o primeiro episódio1. Neurite
óptica (NO), mielite transversa aguda ou síndrome de tronco cerebral são
as manifestações inaugurais mais frequentes da doença. A investigação de
diagnóstico diferencial amplo é essencial. A detecção do anticorpo antia-
quaporina (anti-AQP4) associada a essas manifestações constitui um dos
grupos que compõem o espectro da NMO. Porém, pesquisa negativa para
o anti-AQP4 não afasta o diagnóstico nem a indicação de tratamento, se cli-
nicamente os critérios diagnósticos forem preenchidos2. A presença da po-
sitividade do anti-AQP4 é fator preditivo para recorrência de novo surto3.
Portanto, a presença do biomarcador possibilita diagnóstico precoce e iní-
cio do tratamento para prevenção de novos surtos com respaldo laborato-
rial. Na ausência de cura para as condições do espectro da NMO, o racional
do tratamento é minimizar a sequela neurológica relacionada ao surto, pre-
venir novas exacerbações da doença e reduzir a mortalidade4. Considera-se
que o tratamento dos pacientes com formas clínicas limitadas com anti-
corpo anti-AQP4 positivo e doença de Devic é semelhante e não há estudo
definitivo sobre diferença de resposta entre esses grupos. Ao longo do capí-
tulo será feita referência ao espectro da NMO. Neste capítulo, dois aspec-
tos serão analisados no tratamento do espectro da NMO: (1) eficácia das
medicações no tratamento dos surtos; (2) eficácia na prevenção dos surtos.
Tratamento no surto
A metilprednisolona é o tratamento que mais tem sido realizado no surto
das doenças desmielinizantes do sistema nervoso central com boa respos-
ta na esclerose múltipla5,11. Porém, no espectro da NMO, a taxa de eficácia
é baixa, variando entre 16,6%5 e 17,3%12. Foi observado que o tratamento
precoce com metilpredinisolona em pacientes com NO contribuiu para
menor redução da camada espessa da retina, observada pela tomografia
óptica computadorizada13. A despeito do uso precoce da metilprednisolo-
na, ausência de recuperação dos sintomas pode ocorrer.
Estudos retrospectivos e observacionais conduzidos com plasmafére-
se na NMO evidenciaram que a redução da EDSS pós-tratamento em
pacientes não responsivos à metilprednisolona variou de 33% a 51%5-7. As
principais características desses estudos estão apresentadas na Tabela 1.
Imunossupressores
Azatioprina. A azatioprina é um inibidor da síntese do DNA que impede
a proliferação celular, especialmente dos linfócitos. Em 1998, Mandler et
al. conduziram o primeiro estudo clínico com azatioprina e prednisona
no espectro da NMO16. Redução da taxa anual de surto foi demonstrada.
Adicionalmente, três outros estudos demonstraram resultados semelhan-
tes que podem ser observados na Tabela 217-19.
Anticorpos monoclonais
Rituximabe. O rituximabe é um anticorpo monoclonal quimérico capaz
de bloquear o receptor de superf ície CD20, presente nas células pre-
cursoras do linfócito B23. Além desse receptor, os linfócitos B, em dife-
rentes fases de maturação, também expressam o CD19 e o CD27, entre
outros30. O racional para seu uso baseia-se no fato de a célula B ser pro-
dutora de anticorpos e a descoberta do papel patogênico do anticorpo na
NMO31,32.
O estudo inicial de rituximabe na NMO foi realizado por Cree et al.33
usando 375 mg/m2 de superf ície corporal, uma vez por semana, por qua-
tro semanas como indução e novas aplicações conforme monitoramento
da porcentagem de células CD20, bimensalmente (“protocolo Cree”). Adi-
cionalmente, três outros estudos foram realizados34-37 e suas característi-
cas principais, particularmente a taxa anual de surto pré- e pós-tratamen-
to e a EDSS pré- e pós-tratamento, podem ser observadas na Tabela 2.
Outros anticorpos monoclonais visando a diferentes alvos envolvidos
na patogenia do espectro da NMO como o receptor de interleucina 6
Recomendações
Tratamento no surto. Apesar de não haver estudos controlados de
NMO, considerando a gravidade da doença e os resultados de estudo ob-
servacionais retrospectivos e prospectivos sugerindo efetividade, há forte
recomendação para o uso de plasmaférese em surtos não responsivos à
metilprednisolona (GRADE 1C).
Considerando que: (1) a ausência de resposta à metilprednisolona
pode ocorrer próximo de 20% dos surtos; (2) a remissão parcial é pre-
dominante (65%)12; (3) os pacientes não responsivos à metilprednisolo-
na podem responder à plasmaférese; (4) menor intervalo de tempo entre
os dois tratamentos está relacionado com melhor resposta terapêutica,
sugere-se seguimento criterioso pós-tratamento com metilprednisolona.
Adicionalmente, recomenda-se início da plasmaférese quando identifica-
da resposta insatisfatória com metilprednisolona depois de sete dias do
início do tratamento, particularmente na mielite. Nessa situação clínica,
plasmaférese/imunoadsorção mostrou superioridade em relação à metil-
prednisolona. A seguir, indicam-se a dose e a duração do tratamento:
• Metilprednisolona: 1 g/dia, aplicação endovenosa, por três a cinco dias.
• Plasmaférese: um ciclo de cinco a sete sessões de plasmaférese está
indicado no surto. Estas são realizadas em dias alternados. O uso da me-
tilprednisolona concomitantemente com a plasmaférese não é contrain-
dicado, particularmente em casos graves.
A Ig, IV, é fracamente recomendada (GRADE 2C) no tratamento do
surto da NMO, podendo ser indicada em casos de não resposta a metil-
prednisolona e plasmaférese ou na impossibilidade de esse tratamento ser
oferecido devido a infecção refratária ou inexistência do procedimento no
local de origem. Portanto, há situações dramáticas em que seu uso pode
ser considerado.
Recomendação
• Primeira linha – Primeira opção
Azatioprina combinada com corticoide. Iniciar prednisona na dose de
1 mg/kg/dia nos primeiros seis meses em associação à azatioprina na dose
de 2 a 3 mg/kg/dia é preconizado. A azatioprina deve ser iniciada em do-
ses baixas com aumento gradativo de 25 a 50 mg até alcançar 2 a 3 mg/
kg/dia. Hemograma, amilase e enzimas hepáticas devem ser realizados
para identificar o efeito da azatioprina sobre as hemácias — produzin-
do macrocitose —, sobre os leucócitos — linfopenia e neutropenia — e
sobre o pâncreas — aumento de amilase acima da referência. Em con-
traste, a prednisona pode ser iniciada em dose elevada de 1 mg/kg/dia e,
após o segundo mês, ter redução escalonada e lenta até alcançar 10 mg/
dia. Doses menores que 10 mg/dia evidenciaram maior risco de surto no
espectro da NMO. O uso de prednisona com dose mais elevada na fase
inicial pode proteger até que o efeito da azatioprina se estabeleça, o que
Referências
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Transplante autólogo
de células-tronco
hematopoiéticas
Marcus Vinícius Magno Gonçalves (coordenador)
Elizabeth Regina Comini Frota
Maria Fernanda Mendes
C a pítu l o 8
Transplante autólogo
de células-tronco
hematopoiéticas
Marcus Vinícius Magno Gonçalves (coordenador)
Elizabeth Regina Comini Frota
Maria Fernanda Mendes
Introdução
O
transplante autólogo de células-tronco hematopoiéticas (TACTH)
foi originalmente concebido como um método terapêutico de res-
gate para os pacientes com aplasia de medula óssea secundária ao
uso crônico de quimioterapia mieloablativa ou que foram submetidos a
altas doses de irradiação corpórea total1. No contexto da esclerose múlti-
pla (EM), o TACTH surgiu como uma possibilidade terapêutica baseada
na observação de estudos pré-clínicos e clínicos observacionais1-4. Es-
tudos pré-clínicos há 20 anos já demonstravam que a administração de
irradiação corpórea total ou altas doses de ciclofosfamida, seguidas do
TACTH, reduziam novos eventos clínicos em cobaias submetidas à ence-
falite autoimune experimental2. Esses resultados em estudos preliminares
pré-clínicos foram reproduzidos, de certa forma, em alguns estudos clí-
nicos na década de 19904-6. Hoje, depois de mais de 20 anos do início da
utilização clínica do TACTH, o European Group for Blood and Marrow
Transplantation (EBMT)3 possui um banco de dados de 469 pacientes
com EM submetidos ao TACTH ao longo desse período e o Consortium
for International Bone Marrow Transplant Research (CIBMTR)1, incluin-
do dados de pacientes brasileiros, possuei informações clínicas, de ima-
gem e laboratoriais de 143 pacientes transplantados.
Revisão da literatura
Atualmente, apesar de novas e múltiplas possibilidades terapêuticas dis-
Intervenção
O TACTH é uma imunointervenção que visa obter redução da atividade
do sistema imunológico através de imunossupressão e resgate do sistema
com repopulação da medula através da infusão das células-tronco. O pro-
cesso é dividido em cinco etapas3,10-13:
1. Mobilização das células-tronco da medula óssea para o sangue
periférico.
2. Coleta das células-tronco em sangue periférico.
3. Condicionamento, que significa imunossupressão, através do uso
de protocolos mieloablativos ou não mieloablativos.
4. Fase de aplasia com infusão das células-tronco e suporte clínico
nesta fase pelos riscos de infecção oportunista.
5. Fase de recuperação ou de reconstituição imune.
A reconstituição imune e a total recuperação da quimioterapia do
período de condicionamento ocorrem em um período médio de três a
seis meses13. Os regimes de condicionamento usados no TACTH podem
ser mieloablativos quando letais para as células-tronco hematopoiéticas.
Como exemplo destes, há os protocolos que utilizam a irradiação corporal
total ou o esquema BEAM de imunossupressão (carmustina 300 mg/m2
no D-7; etoposídeo 200 mg/m2; aractina 200 mg/m2 em D-6 a D-3; melfa-
lana 140 mg/m2 no D-2). Podem ser não mieloblativos quando é possível
a reversão de células-tronco hematopoiéticas, como os protocolos que
utilizam ciclofosfamida em determinadas doses associadas à imunoglo-
bulina antitimocítica de coelho (IAC)1,10,13. Na fase de condicionamen-
to na qual se utilizam os protocolos de imunossupressão, ainda não há
consenso em relação a qual regime é mais efetivo e duradouro na remo-
ção dos clones de células T autorreativas e na redução de interleucina-17
Centros de referências
Recomenda-se que o TACTH seja realizado em centros hospitalares cre-
Perspectivas futuras
Um estudo de fase III, prospectivo, multicêntrico, randomizado e con-
trolado do EBMT em associação com o CIBMTR encontra-se em anda-
mento e tem por objetivo avaliar os resultados clínicos e de imagem de
um seguimento maior dos pacientes com EM submetidos ao TACTH e
que falharam com imunomoduladores. Os resultados desse trabalho nos
capacitarão a avaliar com maior grau de evidência as indicações dessa
terapia na EM34.
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Tratamento sintomático
da esclerose múltipla e
da neuromielite óptica
Maria Fernanda Mendes (coordenadora)
Rogério de Rizo Morales
Thereza Cristina d’Ávila Winckler
C a pítu l o 9
Tratamento sintomático
da esclerose múltipla e da
neuromielite óptica
Maria Fernanda Mendes (coordenadora)
Rogério de Rizo Morales
Thereza Cristina d’Ávila Winckler
Introdução
A
abordagem inicial para o tratamento dos sintomas da esclerose
múltipla (EM) ou da neuromielite óptica (NMO) inclui a avaliação
clínica, a determinação de fatores contributivos para a ocorrência
dos sintomas e a abordagem das necessidades, percepções e expectativas
dos pacientes. O tratamento ideal requer educação do indivíduo, permi-
tindo-lhe conhecer o significado de seu sintoma, ajudar na escolha do me-
lhor tratamento, melhorar a adesão e criar expectativas realísticas em rela-
ção à terapia adotada, envolvendo os familiares nas decisões terapêuticas.
A maioria dos tratamentos sintomáticos é recomendada com base em
estudos clínicos não controlados. A escolha do medicamento é frequen-
temente determinada pela preferência e pela experiência do médico, pelos
efeitos colaterais, custo, acesso do tratamento e possibilidade de tratar ou-
tros sintomas com o mesmo fármaco, portanto a maioria dos tratamentos
descritos deve ser considerada de baixo nível de evidência. Em algumas
situações, a busca foi restrita para “clinical trial”, “review” e “systematic
review”. Foram incluídos os sintomas mais frequentemente relatados. A
tabela 1 mostra como foi realizada a busca com base na metodologia de
pesquisa utilizada para este livro.
Uma equipe de tratamento multidisciplinar é requerida para forne-
cer a extensa variedade de serviços necessários para tratar otimamente
os sintomas de EM. Apesar de permanecer um desafio, o tratamento
sintomático pode melhorar significativamente a qualidade de vida dos
pacientes.
Disfagia
Recomendação
• A disfagia deve ser abordada precocemente devido ao risco de
complicações graves (recomendação de ordem prática sem nível
de evidência conhecido).
Disfunções sexuais
Recomendações
• Inibidores da fosfodiesterase-5 são recomendados como primeira
escolha para o tratamento da disfunção erétil (nível de evidência
elevada e recomendação forte).
• Planejamento do ato sexual deve ser estimulado (nível de evidência
muito baixo e recomendação fraca).
• Medidas não medicamentosas, como estimulação da lubrificação
reflexa e psicogênica, exploração de posições confortáveis para o
intercurso e técnicas de conservação de energia, podem ser utili-
zadas (nível de evidência muito baixo e recomendação fraca).
Disfunções vesicais
Recomendações
• Avaliação do volume residual pós-miccional por ultrassonografia
deve ser realizada em todos os pacientes com suspeita de bexiga
neurogênica (nível de evidência baixo e recomendação fraca).
• Estudo urodinâmico deve ser indicado apenas em situações espe-
cíficas (nível de evidência baixo e recomendação fraca).
• O tratamento de escolha para a bexiga hiperativa são os anticoli-
nesterásicos; no caso de falha terapêutica ou intolerância à medi-
cação, aplicação de toxina botulínica no músculo detrusor é eficaz
(nível de evidência elevado e recomendação forte).
• O tratamento de escolha para a bexiga obstrutiva é a cateterização
intermitente com sonda limpa (nível de evidência baixo e reco-
mendação fraca).
• Medidas não medicamentosas são úteis nos casos mais leves (nível
de evidência moderado e recomendação fraca).
Disfunção intestinal
Recomendações
• O melhor tratamento da constipação é sua prevenção, que deve in-
cluir uma dieta rica em fibras, ingesta adequada de líquidos, man-
ter-se tão ativo como possível e a instituição de um programa de
reeducação intestinal (recomendação de ordem prática sem nível
de evidência conhecido).
• Uso de laxantes deve ser o mais moderado possível, evitando o uso
de laxantes irritativos. É recomendado o uso de lactulose ou citrato
de magnésio e, em casos refratários, o uso de supositórios estimu-
lantes e enemas deve ser considerado (recomendação de ordem
prática sem nível de evidência conhecido).
• Técnicas de estimulação perianal ou massagem abdominal podem
ser utilizadas na obstipação intestinal (recomendação de ordem
prática sem nível de evidência conhecido).
• Tratamento da incontinência fecal baseia-se em uma dieta rica em
fibras com o objetivo de produzir fezes mais consistentes, porém
fármacos obstipantes podem ser indicados (recomendação de or-
dem prática sem nível de evidência conhecido).
Recomendações
• As medidas não medicamentosas são fundamentais para o manejo
da fadiga, embora não existam estudos com fortes níveis de evi-
dência. Medidas de economia de energia, resfriamento corporal
e exercícios f ísicos individualizados são indicadas (recomendação
muito baixa).
• Exercícios f ísicos de moderada intensidade são indicados para o tra-
tamento da fadiga (nível de evidência baixo e recomendação fraca).
• A amantadina pode ser utilizada para o tratamento da fadiga, com
resultados variáveis (nível de evidência baixo e recomendação
fraca).
• A modafinila pode ser recomendada quando há distúrbios do sono
associados (nível de evidência baixo e recomendação fraca).
• A 4-aminopiridina e a 3,4-diaminopiridina podem ser utilizadas
na fadiga relacionada ao aumento da temperatura corporal (nível
de evidência baixo e recomendação fraca).
• O alfacalcidol demonstra alguma atividade sobre a fadiga subjetiva
(nível de evidência baixo e recomendação fraca).
Distúrbios cognitivos
Diversos estudos estimam que de 40% a 65% dos indivíduos com EM apre-
sentam alguma alteração cognitiva, especialmente em memória recente,
velocidade de processamento das informações, atenção sustentada e fun-
ções executivas68, podendo manifestar-se de forma isolada, heterogênea e
em todas as formas da doença, o que dificulta seu diagnóstico69. Pode ser
identificada precocemente, independentemente do grau de incapacidade
f ísica68. Esses déficits podem ser atribuídos à carga de lesão, ao dano axo-
nal ou à presença de lesões desmielinizantes no córtex cerebral, o que faz
com que o tratamento desse sintoma específico confunda-se com o tra-
tamento da EM. Causa grande impacto na qualidade de vida do paciente
com EM, acarretando problemas familiares, sociais e profissionais.
Recomendações
• Não há evidências científicas para a utilização de anticolinesterási-
cos ou de memantina nas alterações cognitivas da EM.
• Amantadina, modafinila, pemolina, fampridina e Ginkgo biloba
não têm eficácia demonstrada nas alterações cognitivas da EM.
Depressão
A depressão é um sintoma frequentemente associado à EM102. Seu diag-
nóstico pode ser confundido com outros sintomas, como fadiga e déficit
cognitivo, e requer um cuidadoso diagnóstico diferencial. Humor depres-
sivo e flutuações episódicas do humor devem ser distinguidos de esta-
dos depressivos persistentes e depressão maior. O reconhecimento desse
sintoma e seu tratamento melhoram significativamente a qualidade de
vida dos pacientes. A falta de estudos com elevado nível de evidência para
o tratamento da depressão na EM faz com que a principal recomenda-
ção seja a abordagem integral psicoterapêutica e farmacológica nesses
pacientes103.
Recomendações
• Embora os resultados sejam inconclusivos para refutar ou reco-
mendar o tratamento medicamentoso na depressão da EM, sua
utilização pode trazer benef ícios, sendo os inibidores da recapta-
ção da serotonina os mais indicados (sem nível de evidência co-
nhecido recomendação de ordem prática).
• A terapia cognitivo-comportamental é indicada para o tratamento
da depressão na EM, embora com resultados modestos (nível de
evidência baixo e recomendação fraca).
• Embora os estudos realizados sejam inconclusivos, a psicoterapia
com uso de técnicas comprovadas pode trazer benef ícios para o
tratamento da depressão na EM (sem nível de evidência conhecido
recomendação de ordem prática).
Espasticidade
A espasticidade é um dos sintomas mais comuns da EM e permanece um
sintoma incapacitante, frequentemente mal administrado. Pode causar
problemas posturais, úlceras de pressão, contraturas fibrosas, gerar dor
e dificultar a higiene perineal, entre outros. É agravada por qualquer afe-
rência adversa na medula espinhal, como distensão de bexiga ou intesti-
no, infecção de vias urinárias, irritação de pele, temperatura fria, postura
supina.
Recomendações
• A abordagem da espasticidade deve ser multidisciplinar. A deci-
são de instituir tratamento medicamentoso para a espasticidade
requer avaliação cuidadosa e individualizada, não sendo sempre
recomendado seu uso (nível de evidência baixo e recomendação
fraca).
• Há dados limitados quanto à efetividade do baclofeno, da tizanidi-
na, do dantroleno e do diazepam. Embora todos sejam semelhan-
tes em seus efeitos sobre a espasticidade, nenhum mostrou grande
benef ício funcional (nível de evidência muito baixo e recomenda-
ção fraca).
• O baclofeno, devido à melhor tolerabilidade, é o fármaco de pri-
meira escolha na espasticidade (sem nível de evidência conhecido,
recomendação de ordem prática).
• A gabapentina pode ser uma opção em casos em que a dor for
um sintoma associado (nível de evidência baixo e recomendação
fraca).
• A toxina botulínica deve ser indicada quando a espasticidade for
confinada a poucos grupos musculares e quando há evidente inter-
Dor
As síndromes dolorosas não são incomuns na EM, apesar de durante
muitos anos a EM ter sido considerada uma condição indolor158-163. Em
um estudo, 55% das pessoas avaliadas apresentaram o que é chamado de
“dor clinicamente significante” durante o curso da EM e metade dos pa-
cientes estava preocupada com a dor crônica158. Esse estudo sugeriu que
fatores como idade de início, duração da EM ou grau de inaptidão não in-
terferiam na presença da dor, sendo as mulheres portadoras de EM duas
vezes mais afetadas que os homens158.
Recomendações
• As dores neuropáticas podem ser tratadas com agentes anticon-
vulsivantes, antidepressivos tricíclicos, inibidores de recaptação de
serotonina, isoladamente ou em combinação (sem nível de evidên-
cia conhecido, recomendação de ordem prática).
• Outros antidepressivos, como venlafaxina, duloxetina e mirtazapi-
na, têm sido utilizados em casos refratários (sem nível de evidência
conhecido, recomendação de ordem prática).
• Os opioides são utilizados no tratamento da dor central em casos
refratários (recomendação muito baixa). A rizotomia percutânea é
considerada quando terapia medicamentosa é ineficaz ou mal tole-
rada (nível de evidência muito baixo, recomendação muito fraca).
• Nas dores relacionadas ao tratamento da EM, o uso de resfriamen-
to local com bolsas de gelo antes e depois da aplicação do imuno-
modulador reduz de maneira significativa a duração da dor (nível
de evidência muito baixo, recomendação muito fraca).
• Os sintomas flu-like são controlados com anti-inflamatórios não
hormonais, paracetamol, ou acetaminofeno, ou mesmo com bai-
xas doses de corticoide (sem nível de evidência conhecido, reco-
mendação de ordem prática).
• Extrato oral de Cannabis é eficaz para a redução de dor central
(nível de evidência baixo, recomendação fraca).
Ataxia e tremor
Muitos portadores de EM desenvolvem algum grau de tremor nos mem-
bros, na cabeça, no corpo ou nos músculos necessários à fala. Alguns
tremores são leves e não interferem nas atividades da vida diária, en-
quanto outros podem afetar significativamente as atividades básicas173-175,
com impacto emocional e social significante, levando ao isolamento e à
depressão.
O manuseio do tremor em pacientes com EM é dif ícil, uma vez que a
maior parte dos dados publicados consiste em relatos de casos e estudos
abertos não controlados com pequeno número de pacientes e pequena e
curta duração de uso do medicamento. O tratamento é muitas vezes frus-
trante porque os medicamentos disponíveis atualmente são ineficazes na
maioria dos casos. Algum alívio clínico tem sido relatado para uma gama
de medicamentos, incluindo primidona176, glutetimida177, baclofeno intra-
tecal178, isoniazida179,180, benzodiazepínicos (clonazepam ou lorazepam),
propranolol181, hidroxizina, triexifenidil, carbamazepina, gabapentina,
primidona, topiramato182,183 e ondansetrona.
Apesar do crescente interesse em Cannabis como possível agente te-
rapêutico para pacientes com EM, nenhum efeito positivo foi encontrado
em vários ensaios clínicos randomizados com administração de extrato
de Cannabis por via oral151,152,184 ou delta-9-tetra-hidrocanabinol oral151 e
em estudos com nabiximols nos quais tremor foi incluído como desfecho.
Medidas fisioterápicas também podem prover benef ício secundário no
controle de ataxia de membros e treino de marcha185,186, assim como o
acompanhamento da equipe multiprofissional.
Recomendações
• Poucos fármacos foram avaliados, e nenhum adequadamente, para
o tratamento do tremor em portadores de EM.
• Os benzodiazepínicos (clonazepam ou lorazepam), propranolol,
hidroxizina, triexifenidil, carbamazepina, gabapentina, primidona,
isoniazida e ondansetrona poderão ser utilizados para o tremor da
EM (nível de evidência baixo, recomendação muito fraca).
• Nas manifestações mais graves do tremor, procedimentos cirúr-
gicos poderão ser indicados, incluindo estimulação talâmica e
talamotomia, com benef ícios limitados (nível de evidência baixo,
recomendação muito fraca).
• Extrato oral de Cannabis, THC e naxibimols são provavelmente
ineficazes para reduzir o tremor relacionado à EM.
• Não há evidências de que a maconha fumada atue sobre o tremor
da EM.
Marcha
Problemas de mobilidade ocorrem em 69% dos pacientes com EM e são
multifatoriais. Até recentemente, não havia tratamento médico compro-
vadamente eficaz. A fampridina de liberação lenta (também conhecida
como dalfampridina ou 4-aminopiridina), na dosagem de 10 mg a cada
12 horas, mostrou em um estudo clínico multilcêntrico de fase 3, ran-
domizado e controlado com placebo, que pode melhorar a velocidade de
caminhada em 25%; no entanto, o benef ício só foi visto em 35% dos pa-
cientes. Respondedores mostraram uma melhora de 20% ou mais no teste
Recomendação
• A fampiridina pode ser usada para o tratamento dos distúrbios de
marcha na EM (nível de evidência baixo, recomendação fraca).
Referências
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Critérios de progressão
e falência terapêutica na
esclerose múltipla
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos (coordenadora)
Alfredo Damasceno
Denise Sisterolli Diniz
Fernando Faria Andrade Figueira
C a pítu l o 10
Critérios de progressão
e falência terapêutica na
esclerose múltipla
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos (coordenadora)
Alfredo Damasceno
Denise Sisterolli Diniz
Fernando Faria Andrade Figueira
Introdução
A
partir dos anos 1990 foram disponibilizados os primeiros medica-
mentos para tratamento da esclerose múltipla (EM), denominados
fármacos modificadoras de doença (FMDs), ou imunomodulado-
res (as betainterferonas e o acetato de glatirâmer), que demonstraram, em
pesquisas clínicas, eficácia terapêutica com redução da inflamação, po-
rém com questionável impacto na progressão da doença a longo prazo1-11.
O surgimento de novas terapias para o tratamento da EM estimulou
a elaboração de protocolos que orientassem um escalonamento do tra-
tamento diante da falência terapêutica aos FMDs. Alguns conceitos são
necessários para que possamos falar em critérios de progressão e falência
terapêutica.
Falência terapêutica, ou resposta subótima, se refere à perda de res-
posta ao tratamento estabelecido anteriormente12.
Uma recente revisão das formas clínicas da EM13 propõe uma defini-
ção de progressão como um “aumento objetivamente documentado da
incapacidade neurológica sem recuperação em que flutuações e fases de
estabilidade podem ocorrer”. Nessa revisão, Lublin et al.13 consideraram
que tanto a forma primária progressiva quanto a secundária progressiva
podem ocorrer com ou sem sinais de atividade.
Considera-se “atividade” a ocorrência clínica de surtos ou a presença
de lesão captante de gadolínio ou aumento da carga ponderada em T2.
Em contrapartida, o agravamento da incapacidade em função de surtos
Progressão
O objetivo foi analisar as evidências da literatura por meio de uma revisão
sistemática de dados publicados entre janeiro de 2005 e maio de 2015
relacionada à progressão da EM e os fatores de risco para tal ocorrência.
Artigos originais em português, espanhol e inglês foram pesquisados, e
foram incluídos estudos observacionais descritivos e analíticos do tipo
transversal e de coorte, prospectivos e retrospectivos, e estudos caso-
controle que avaliaram aspectos demográficos e clínicos relacionados à
progressão da EM.
Artigos de revisão, metanálises, editoriais e relatos de caso foram
excluídos.
As seguintes bases de dados foram utlizadas: Medline, Latin-American
and Caribbean Literature in Health Sciences (Lilacs), Scientific Electronic
Library Online (SciELO) e PubMed. Foi realizada, por um dos autores
(CCFV), uma busca manual nas referências selecionadas para pesquisa
de mais artigos que preenchessem os critérios de inclusão. Como des-
critores foram utilizadas as seguintes combinações: “esclerose múltipla”,
ou “multiple sclerosis”, ou “esclerosis multiple”, ou “progressão secundária”,
ou “secondary progression”, ou “progresión secundaria”, ou “progression”,
ou “progressão”, ou “progresíon”, ou “fatores de risco”, ou “risk factors”, ou
“factores de riesgo”, ou “fatores prognósticos”, ou “prognostic factors”, ou
“factores pronósticos”. Os resumos dos artigos selecionados foram lidos
pelos autores e os artigos que avaliaram progressão da EM e fatores asso-
ciados foram lidos na íntegra.
Resultados
Nas bases de dados PubMed e Medline foram identificados 53 artigos
publicados que continham os descritores e suas combinações no título,
enquanto nas bases de dados ScIELO e Lilacs não foram identificados
artigos. Inicialmente, 32 artigos foram excluídos porque foram publicados
antes de 2005 e 21 foram selecionados. Entre esses 21 artigos, cinco foram
excluídos: três eram de revisão e dois eram editoriais. Pela busca manual
Bergamaschi et al., 2007 Coorte Progressão secundária foi definida como progressiva
piora, grave o suficiente para aumentar, no mínimo, 1
ponto na EDSS, por, no mínimo, 12 meses.
Vasconcelos et al., 2012 Coorte para A progressão secundária foi definida como mantido
prognóstico aumento na EDSS não atribuído a surtos, que se
manteve por 6 meses ou mais, sem melhora ou com
progressiva piora a cada avaliação.
Damasceno et al., 2013 Coorte Uma sustentada e irreversível piora da EDSS foi con-
sideradaquando o escore persistiu por ≥ 6 meses,
excluindo qualquer piora transitória da incapacidade
relacionada ao surto.
Soldán et al., 2014 Coorte Curso com insidiosa e irreversível piora cerebral, de
troco encefálico, cerebelo e síndromes medulares
mais frequentemente caracterizado por fraqueza,
ataxia ou disfunção esfincteriana por 12 meses.
Falência terapêutica
Não existe um protocolo universal para falência ou falha terapêutica,
portanto é necessário criar critérios preestabelecidos para cada doença.
Parâmetros clínicos e de exames são úteis para nortear a troca do medi-
camento. Muitos protocolos têm sido elaborados tomando como base a
ocorrência de surtos, a piora da incapacidade clínica ou dos achados de
imagem por ressonância magnética. Má adesão ao tratamento, eventos
adversos intoleráveis e situações clínicas associadas (por exemplo, febre,
depressão) devem ser afastados na avaliação de falência terapêutica.
Surto é definido como12 um sintoma referido pelo paciente ou sinal
objetivamente observado típico de um evento desmielinizante do sistema
nervoso central (SNC) com duração de pelo menos 24 horas, na ausên-
cia de outro quadro que justifique tal sintoma, como febre ou infecção.
Embora um novo surto deva ser documentado por exame neurológico
atual, em contexto apropriado eventos referidos que tenham sintomas e
evolução característicos de EM, mesmo sem alteração objetiva ao exame
neurológico, podem oferecer evidências de um evento desmielinizante
prévio.
Piora da incapacidade é caracterizada como um acúmulo de déficits
clínicos. A curto e médio prazos pode ser decorrente de atividade infla-
201
Quadro 5. Continuação.
202
Qualidade da
Autores Fatores preditivos Desfechos Métodos Resultados
evidência (GRADE)
Bosca Variáveis clínicas e Piora sustentada da EDSS N = 162 A análise univariada de Cox mostrou signifi- Baixa
et al.92 demográficas do início e após dois anos (1,5 ponto IFNβ cância apenas para o número de surtos nos
número de surtos durante para EDSS basal de 0 a 2,0, Dois anos primeiros dois anos de tratamento (HR 1 surto:
dois anos de tratamento. 1 ponto para escore de 2,5 3,4, p = 0,005; HR ≥ 2 surtos: 4,3, p < 0,001).
a 4,0, e de 0,5 ponto para A análise de Kaplan-Meier mostrou probabi-
escores ≥ 4,5, confirmados lidade maior de piora na EDSS em pacientes
três meses depois). com um surto (log rank 10,9, p = 0,002) e com
≥ 2 surtos (log rank 17,7, p < 0,001).
Río Variáveis clínicas e de Piora na EDSS ≥ 1 ponto. N=152 Apenas a presença de ≥ 2 lesões ativas (nova Baixa
et al.93 RM na baseline e suas IFNβ lesão em T2 e/ou Gd+) na RM realizada em um
mudanças após um ano de Dois anos ano foi relacionada com aumento da incapaci-
tratamento. dade após dois anos de tratamento (OR 8,3; p
< 0,0001; sensibilidade: 71%; especificidade:
77%; acurácia: 76%).
Malucchi Anticorpos anti-IFNβ: Análise de sobrevivência N = 137 O grupo MxA negativo mostrou pior taxa de Baixa
et al.94 ligadores (BAbs) e livre de surto (RFS). IFNβ RFS versus grupo MxA positivo [p < 0,0001;
neutralizantes (NABs). Três anos hazard ratio (HR) = 2,87].
Mixovírus- proteína Grupo NAbs positivo também mostrou pior
resistente A (MxA). taxa RFS versus grupo NAbs negativo (p =
0,0013; HR = 2,49).
BAb – sem significância clínica.
Quadro 5. Continuação.
203
Quadro 5. Continuação.
204
Qualidade da
Autores Fatores preditivos Desfechos Métodos Resultados
evidência (GRADE)
Sormani (1) Número de surtos Aumento de ≥ 1 ponto da N = 560 O risco de piora da EDSS estava associado Moderada
et al.99 durante o primeiro ano. EDSS. IFNβ com o número de lesões ativas na RM reali-
(2) Número de lesões Dois anos zada no primeiro ano (OR = 1,06, p < 0,0001).
ativas na RM durante o O número de surtos durante o primeiro ano
primeiro ano. também foi forte preditivo do risco de piora da
incapacidade no acompanhamento (OR = 1,58,
p < 0,0001).
Quando ambos foram incluídos na análise
multivariada, ambos foram fatores preditivos
independentes.
Horakova Piora da incapacidade, Aumento da EDSS em 1 N=172 Pacientes com ≥ 1 nova lesão T2 e escore de Baixa
et al.100 surtos (frequência e ponto (se inicial ≥ 1) ou 1,5 IFNβ-1a IM surto ≥ 2 (OR = 5,7) ou aqueles com ≥ 3 novas
gravidade), volume (EDSS inicial = 0) e escores Dois a seis anos de lesões T2 independentemente do escore do
cerebral, novas lesões T2 de surto anuais > 1 na acompanhamento surto (OR = 3) tiveram um aumento do risco
durante o primeiro ano do fase de acompanhamento para falha terapêutica futura.
tratamento. (escore de surto baseado
na gravidade deste e no
impacto nas atividades
diárias (1 = leve, 2 =
moderado e 3 = severo).
Romeo Redução da ARR < 50% da Redução da ARR < 50% da N = 787 Setenta e três por cento dos respondedores Moderada
et al.101 pré-tratamento (dois anos). pré-tratamento (dois anos). AG em um ano de tratamento não tiveram evi-
≥ 2 lesões ativas na RM de ≥ 4 lesões ativas na RM de Dois anos dência de atividade clínica e de RM no ano
um ano. dois anos. seguinte.
Quadro 5. Continuação.
205
206
Qualidade da
Autores Fatores preditivos Desfechos Métodos Resultados
evidência (GRADE)
Río Escore de Río (RS) Ocorrência, em dois anos, N = 84 Pacientes com escore ≥ 2 e aqueles com ati- Baixa
et al.107 no primeiro ano do de atividade clínica da AG vidade clínica (com ou sem atividade de RM)
tratamento. doença definida pela Três anos durante o primeiro ano do tratamento apre-
presença de surtos ou piora sentaram um risco maior de manifestar mais
sustentada de 1 ponto na surtos e/ou piora da incapacidade nos dois
EDSS. anos seguintes.
Romeo Escore de Río (RS) e escore Resposta subótima: N = 368 para o RS e Probabilidade para resposta subótima: Moderada
et al.108 de Río modificado (MRS). (1) progressão da N = 390 com o MRS 23% de RS=0; 40%-RS> 2; 43% de MRS>2
incapacidade (aumento IFNβ Probabilidade de piora da incapacidade:
sustentado da EDSS ≥ 1 Acompanhamento de 22% de RS = 0, sem lesão ativa; 31% de
por, no mínimo, seis meses, cinco anos RS = 0, com uma a duas lesões ativas; 23% de
aumento ≥ 1,5 para EDSS MRS = 0, sem lesão ativa; 29% de MRS = 0,
basal < 2,5 e 1 para EDSS com uma a quatro novas lesões em T2.
basal de 2,5-5,5).
MRS com maior especificidade e acurácia,
(2) Ou troca de terapia por mas RS com maior sensibilidade.
segunda linha.
Hyun et al.109 Escore de Río (RS) e Resposta subótima em N = 70 92% de alto risco do RS e 86% do MRS tive- Baixa
escore de Río modificado três anos: IFNβ ram resposta subótima.
(MRS). Os pacientes foram Surto clínico e/ou piora Três anos 93% de baixo risco do RS e 93% MRS foram
divididos em grupo de sustentada (seis meses) da respondedores.
baixo risco (escore de 0 EDSS (1 ponto para EDSS RS e MRS de alto risco mostraram 75% (am-
e 1) e alto risco (2 e 3) < 6 e 0,5 para EDSS ≥ 6) bos) de sensibilidade e 98% e 96% de espe-
(conforme a escala de RS cificidade, respectivamente, para predizer
e MRS). resposta subótima.
AG: acetato de glatirâmer; ARR: taxa anualizada de surtos; BAb: anticorpo ligador de betainterferona; EDSS: escala expandida de incapacidade; GRADE: Grading of Recommendations, Assessment, Development and Evaluation; IFNβ:
betainterferona; IM: intramuscular; MRS: escore de Río modificado (ver texto); NAb: anticorpo neutralizante de betainterferona; OR: odds ratio; RM: ressonância magnética; RS: escore de Río (ver texto); SC: subcutâneo.
Teste dos ≤ 20%, confirmado > 20% e < 100% de ≥100% de aumento
25 passos em seis meses. aumento, confirmado em confirmado em
seis meses. seis meses.
Se somente EDSS é levada em consideração para avaliar o tratamento, deve ser confirmada em seis meses; T25 deve ser feito com ajuda
se necessário. Fonte: Freedman MS, Selchen D, Arnold DL, et al. Treatment Optimization in MS: Canadian MS Working Group Updated
Recommendations. Can J Neurol Sci. 2013;40(3):307-23.
Quadro 7. Recomendações para determinar o nível de importância quando se considera
modificar o tratamento com base na progressão de incapacidade12.
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Clinical results of a multicenter, randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Neurology. 1993;43(4):655-61.
5. Jacobs LD, Cookfair DL, Rudick RA, et al. Intramuscular interferon β-1a for disease progression in relapsing
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6. PRISMS Study Group. Randomised double-blind placebocontrolled study of interferon β-1a in relapsing-remitting
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Study Group. Interferon beta-1b is effective in relapsingremitting multiple sclerosis. II. MRI analysis results of a
multicenter, randomized, double-blind, placebo controlled trial. Neurology. 1993;43(4):662-67.
8. Johnson KP, Brooks BR, Cohen JA, et al. Copolymer 1 reduces relapse rate and improves disability in relapsingre-
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1 Multiple Sclerosis Study Group. Neurology Neurology. 1995;45(7):1268-76.
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nance studies of intramuscular interferon β-1a for the relapsing multiple sclerosis. Ann Neurol. 1998;43(1):79-87.
10. Li DK, Paty DW. Magnetic resonance imaging results of the PRISMS trial: a randomized, double-blind, placebo
controlled study of interferon-β1a in relapsing-remitting multiple sclerosis. Ann Neurol. 1999;46(2):197-206.
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trolled trial. Lancet. 2009;374(9700):1503-11.
Fluxograma de
tratamento da
esclerose múltipla
Elizabeth Regina Comini Frota (coordenadora)
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos
Maria Fernanda Mendes
C a pítu l o 11
Fluxograma de tratamento
da esclerose múltipla
Elizabeth Regina Comini Frota (coordenadora)
Claudia Cristina Ferreira Vasconcelos
Maria Fernanda Mendes
Introdução
A
esclerose múltipla (EM) é uma doença polimórfica quanto ao perfil
imunopatológico, genético, demográfico, clínico-evolutivo e tera-
pêutico, e provavelmente por isso se torna tão intrigante para o
neurologista. Até o momento, a interação de diferentes genes com vários
fatores ambientais ainda não bem definidos parece ser a principal razão
de sua variabilidade fenotípica e principalmente da variabilidade da res-
posta terapêutica. Diante de sua complexidade de sintomas e curso clíni-
co, o médico neurologista tem um grande desafio: in primum non nocere,
ou seja, primeiro não lesar. Na prática clínica, tratar EM e não lesar pode
ter vários significados:
• Iniciar, modificar e interromper o tratamento no momento certo
para evitar o agravamento da doença e prejuízos à qualidade de
vida do paciente.
• Escolher o melhor tipo de tratamento para o momento, individua-
lizando o tratamento entre pacientes e entre diferentes momentos
da evolução num mesmo paciente.
• Pesar os riscos e benef ícios de cada terapia, e não tratar além ou
aquém do necessário.
• Seguir rigorosamente as recomendações dos medicamentos, mini-
mizando o aparecimento de eventos adversos.
• Respeitar a tolerância do paciente aos eventos adversos e trata-
mentos propostos.
Para vencer esse desafio, o médico neurologista deve se amparar nas
evidências da literatura, em sua experiência e na boa relação entre médico
Método
Uma revisão sistemática visando à construção de um escalonamento de
terapias foi realizada para obter estudos que apresentavam os seguintes
desfechos: (a) quando iniciar o tratamento e qual medicação mais ade-
222
Data do Tempo de Surtos RRR de RRR de RRR de Completaram
primeiro Pacientes Controles doença até em ano TAS - TAS - surtos lesões lesões estudo em
Fármaco estudo (N) (N) medicação anterior EDSS placebo tratado (%) GAD (%) T2 (%) dois anos (%) Segurança
Resultados
Duzentas e quarenta e quatro publicações continham os descritores na
base de dados PubMed e quatro na base de dados Cochrane Library. Fo-
ram selecionadas 21 publicações que preencheram os critérios: conter
todas ou a maior parte das medicações atualmente em uso, não ser pa-
trocinado diretamente ou somente por uma das indústrias, terem sido
publicadas em diferentes regiões. Sete publicações foram descartadas por
terem participação direta de pessoas relacionadas à indústria ou financia-
mento direto. Além destes, foram incorporados por busca ativa os estu-
dos iniciais de todos os fármacos aqui citados para execução da tabela 1.
Os estudos escolhidos estão listados na tabela 2.
Concluindo
• As interferonas e o acetato de glatirâmer continuam sendo boa op-
ção para uso na primeira linha de tratamento, considerando seu elevado
perfil de segurança em 20 anos de uso. Em situações especiais nas quais
há elevada carga de lesão ou risco de mau prognóstico por surtos frequen-
tes, sem recuperação dos déficits ou sintomas de tronco encefálico, outras
opções devem ser avaliadas o mais rápido possível.
• A teriflunomida tem eficácia semelhante àquela dos demais imuno-
moduladores e pode ser utilizada como primeira linha, devendo sempre
ser considerado o risco nos pacientes de ambos os sexos em idade repro-
dutiva, com vigilância quanto às enzimas hepáticas e linfopenia.
• O fumarato de dimetila mostrou ter eficácia maior que o placebo
em surtos e lesões à RM, e eficácia semelhante em progressão18, e pode
ser utilizado como medicação de primeira linha, com cuidados adicionais
devem ser tomados quanto ao risco de linfopenia persistente.
Concluindo:
• A migração entre os fármacos com perfil de eficácia semelhante é
recomendada apenas apenas na presença de efeitos adversos ou má ade-
são ao tratamento. Os efeitos colaterais dos novos fármacos orais devem
ser considerados no momento da troca.
Concluindo
• A migração dos fármacos aqui considerados de primeira linha para
aqueles de segunda linha é recomendável sempre que houver falha tera-
pêutica com a medicação inicialmente preconizada.
• A opção pelo uso de natalizumabe ou fingolimode deverá ser reali-
zada, considerando a atividade da doença, os riscos do desenvolvimento
de LEMP e de linfopenia.
Interferons ou Falência
acetato de glatiramer Falência terapêutica Fumarato de dimetila
terapêutica
A escolha da terapia deverá
obedecer aos critérios de Natalizumabe
gravidade e segurança,
Migração Manter: conforme explicado no texto Esgotadas as
entre possibilidades
EM com sinais de
drogas de migração
por efeitos bom prognóstico entre as drogas
colaterais Boa resposta anteriores
Alentuzumabe
Teriflunomida
TACTH
Mitoxantrone
Conclusão
Infelizmente, independentemente do caminho seguido e dos fármacos
escolhidos, aproximadamente 10% dos pacientes progredirão na doen-
ça, com o acúmulo de degeneração, sequelas progressivas e irreversíveis.
Também será encontrada uma pequena porcentagem de pacientes, cer-
ca de 10%, que responderá bem ao primeiro fármaco usado, com ótimo
controle de surtos e de lesões à RM, o que aparentemente pode ocorrer
independentemente do uso de medicações. Entre esses dois extremos
existem muitos pacientes que podem se beneficiar da escolha de fármacos
adequados ao seu perfil de resposta no início do tratamento e da rápida
mudança da estratégia quando ocorre falha terapêutica, o que depende
principalmente da perspicácia, da atenção, da atualização e do bom sen-
so do médico neurologista. Espera-se que essas recomendações sejam de
boa ajuda aos médicos e a seus pacientes.
Referências
1. Interferon beta-1b is effective in relapsing-remitting multiple sclerosis. I. Clinical results of a multicenter, ran-
domized, double-blind, placebo- controlled trial. The IFNB Multiple Sclerosis Study Group. Neurology. 1993;
43(4):655-61.
2. Paty DW, Li DK. Interferon beta-1b is effective in relapsing- remitting multiple sclerosis. II. MRI analysis results
of a multicenter, randomized, double-blind, placebo-controlled trial. UBC MS/MRI Study Group and the IFNB
Multiple Sclerosis Study Group. Neurology. 1993;43(4):662-7.
3. Jacobs LD, Cookfair DL, Rudick RA, et al. Intramuscular interferon beta-1a for disease progression in relapsing
multiple sclerosis. The Multiple Sclerosis Collaborative Research Group (MSCRG). Ann Neurol. 1996;39(3):285-94.
4. Randomised double-blind placebo-controlled study of interferon beta-1a in relapsing/remitting multiple sclerosis.
PRISMS (Prevention of Relapses and Disability by Interferon beta-1a Subcutaneously in Multiple Sclerosis) Study
Group. Lancet. 1998;352(9139):1498-504.
5. Johnson KP, Brooks BR, Cohen JA, et al. Copolymer 1 reduces relapse rate and improves disability in relapsing-re-
mitting multiple sclerosis: results of a phase III multicenter, double-blind placebo-controlled trial. The Copolymer
1 Multiple Sclerosis Study Group. Neurology. 1995;45(7):1268-76.
6. Hartung HP, Gonsette R, König N, et al.; Mitoxantrone in Multiple Sclerosis Study Group (MIMS). Mitoxantro-
ne in progressive multiple sclerosis: a placebo-controlled, double-blind, randomised, multicentre trial. Lancet.
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9. Gold R, Kappos L, Arnold DL, et al.; DEFINE Study Investigators. Placebo-controlled phase 3 study of oral BG-12
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