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O COLEGIO PEDRO II E A INSTITUCIONALIZAÇÃO

DA GEOGRAFIA ESCOLAR NO BRASIL IMPÉRIO

THE COLEGIO PEDRO II AND THE INSTITUCIONALIZATION OF SCHOOL GEOGRAPHY IN BRAZIL EMPIRE

P rof. D r. Gen y lto n Od i lon Rêgo da R ocha


Universidade Federal do Pará
Faculdade de Educação e Programa de Pós-Graduação em Educação
genylton@gmail.com

RESU M O: N e s t e t e x t o b u s c a r - s e - á d i s c u t i r a i nstitucio nalização da geografia n o currículo das escolas


brasi l e i r a , t o m an d o p o r b a s e o s c u r r í c u l o s q u e foram prescritos para o Imperial Colégio de P edro II, instituição
criad a e m 1 8 3 7 , n a c i d a d e d o R i o d e J a n e i r o . F riso que optei por discorrer sobre a história da geografia
escol a r , e m u m p e r í o d o q u e o c u r r í c u l o p r e scrito para o Imperial Colégio de P edro II deveria padro n izar
n acio na l m en t e ( p e l o m e n o s e r a e s ta a in t en ção), a seleção cultural considerada, segundo os legisladores
brasi l e i r o s , d i gn a d e s e r a s s i m i l a d a p e l a s n o vas gerações. Porta nto, o período por nós estudado se este nde
de 18 3 7 - d ata d e c r i a ç ã o d o c o l é g i o - at é a década de 80 do século XIX , quando se proclama a República
n o Br a s i l . Pa r a q u e p u d é s s e m o s i d e n t i f i c a r e a nalisar o currículo prescrito para a discipli n a geografia - e
a qui fa z e m o s u m a r e s s a lva d e q u e n o s s a an álise será restrita ao currículo prescrito ou explícito, o que
torn a a an á l i s e d o c u r r í c u l o q u e f o i e f e t i va do nas salas de a ula a pri ncipal lacu na que deixarem os nesta
pesqu i s a - , r e a l i z a m o s o l e van ta m en t o e s e leção de bibliografias que se reportam ao período estudado,
e, so b r e t u d o , d e t e x t o s e s c r i t o s d e c a r át e r oficial e técnico - as leis que normatizaram o ensin o na quele
colég i o e o s c on t e ú d o s p r o g r a m át i c o s f i x a d os pelo legislativo brasileiro ou pela co ngregação do referido
estab e l e c i m en t o d e en s i n o . E s t e m at e r i a l f o i objeto de uma descrição a nalítica, ou se ja, sobre o mesmo
reali z a m o s u m e s tu d o m a i s a p r o f u n d a d o à l u z do refere ncial teórico que tem norteado meus estudos. O que
se se g u e s ã o pa rt e s s i gn i f i c at i va s d e m e u s a c hados.
Palavras-chave: Cur r í c u l o ; H i s t o r i a d a s d i s c i p l in a s e s c o l a r e s ; G e o g r a f i a e s c o l a r ; C o l é g i o P e d r o II ; S é c u l o XIX.

ABST R A C T: t h i s t e xt w i l l d i s c u s s t h e i n s t i t u t i onalization of geography in the curriculum of Brazilian schools,


based o n c u r r i c u l a p r e s c r ib e d f o r t h e Im p e rial College of Pedro II, an institution created in 1837 in R io
de Ja n e i r o . I e m p h a s i z e t h e h i s t o ry o f t h e d evelopment of geographic education in a period during which
the c u r r i c u l u m at t h e I m p e r i a l C o l l e g e o f Pedro II was b eing promoted as a national standard b y Brazilian
lawm a k e r s . I e x a m i n e t h e p e r i o d e x t e n d i n g f r om 1837 – the date of the school´s foundation - until the late-
1880s , w h e n t h e B ra z i l i a n r e p ub l i c wa s p r o c l a imed. In order to identify and analyze the prescribed curriculum
for g e o g r a p h y – w i t h t h e c av e at t h at t h e a n alysis will be restricted to prescri b ed or explicit curriculum -
surve y a n d s e l e c t i o n o f b ib l i o g r a p h i e s r e p o rting to the period studied was conducted, with a concentration
on wr i t t e n t e x t s o f o f f i c i a l a n d t e c h n i c a l c h aracter, the laws that esta b lished the teaching norms and the
syllabu s s e t b y t h e B r a z i l i a n l e g i s l at u r e o r b y the educational institution. This material was subjected to an
analy t i c a l d e s c r i p t i o n c o n d u c t e d i n t h e l i g h t of the theoretical framework that has guided my research. The
follo w i n g a r e s i g n i f i c a n t pa rt s o f m y f i n d i n g s.
Keywords: Curricul u m ; H i s t o ry o f s c h o o l s ubje c t s ; S c h o o l G e o g r a p h y; C o l e g i o P e d r o II ; N i n e t e e n t h c e n t u ry.

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A criação do Imperial Colégio de Pedro II e Vasconcelos, afirmava que seria função do novo
a institucionalização da geografia no seu estabelecimento
currículo escolar
Manter e unicamente adotar os bons
Em 1834, a primeira constituição métodos; resistir a inovações que não
brasileira sofria uma reforma. Sua realização era tenham a sanção do tempo e o abono de
consequência direta das pressões feitas pelas felizes resultados; proscrever e fazer abortar
Províncias, no sentido de ampliarem seus direitos tôdas as espertezas de especuladores
e poderes. Exigiam-se do poder central medidas astutos que ilaqueiam a credulidade dos
descentralizadoras. No campo educacional, a pais de família com promessas fáceis e
principal medida de impacto foi o direito adquirido rápidos progressos na educação de seus
por aquelas unidades políticas de legislar sobre o filhos; e repelir os charlatães que aspiram
seu próprio sistema educacional. à celebridade, inculcando princípios que a
Coube aos governos das províncias à razão desconhece.
responsabilidade total pelo ensino elementar e (apud HAIDAR, 1972, p. 99).
médio, surgindo em consequência os primeiros
liceus provinciais, localizados nas suas respectivas O ideal de ensino acabou sendo trazido do
capitais: O Ateneu, do Rio Grande do Norte em estrangeiro. Foi da França que se “transplantou”
1835; os Liceus da Bahia e da Paraíba, ambos o modelo de organização escolar, bem como a
em 1836.1 Apenas no Município da Corte (Rio de forma, e não raramente os conteúdos, adotados
Janeiro) ficou o poder central responsável por pelas disciplinas. Se esta afirmativa é verdadeira
estes níveis de ensino. Por conta desta atribuição para o primeiro regulamento, não menos seria
constitucional, em 1837 era criado na Corte, a partir para todos os demais que foram estabelecidos
da transformação do então existente Seminário de ao longo do Império. Não é à toa que Chizzotti
São Joaquim, o Imperial Colégio Pedro II, primeiro afirma que “A história das disposições legais que
passo no sentido de dar certa unidade ao ensino tentaram construir a instrução pública no Brasil,
médio, até então mantido através do sistema de durante o Império, não pode ser entendida sem
aulas avulsas. a leitura paralela da legislação sobre o ensino
A intenção dos que foram responsáveis francês” (1975, p. 50).
pela criação do colégio não foi apenas a de No primeiro regulamento fixado para o
dotar a Corte de um estabelecimento de ensino Colégio Pedro II, datado de 1938, foi introduzido,
secundário mais organizado frente à desordem a exemplo dos colégios franceses, os estudos
que presidia as aulas régias. Mais do que isto, simultâneos e seriados, em substituição a mera
objetivavam eles criar uma instituição que servisse reunião de aulas régias em um só prédio. No curso
de modelo, verdadeiramente padrão de excelência regular com duração de seis e oito anos, seriam
do que as demais escolas públicas ou particulares ensinadas as línguas latina, grega, francesa
existentes ou a serem criadas pudessem seguir. e inglesa, a gramática nacional e a retórica, a
O Colégio Pedro II, que recebera desde a geografia, a história, as ciências naturais, as
sua fundação o “status” de escola-padrão, seria matemáticas, a música vocal e o desenho.
alvo da atenção especial do poder central. Criado No modelo curricular francês predominava
para ser o “templo do saber oficialmente aceito”, os estudos literários mas, apesar de não serem
o seu funcionamento seria em consequência, a parte mais importante daquele currículo, nele
desde o início perpassado por alguns preceitos também estavam presentes as ciências físicas
considerados fundamentais por seus fundadores. e naturais, a história , as línguas modernas e a
Já no discurso de inauguração, o Ministro dos geografia. O ensino desta última nas escolas
Negócios do Império, Bernardo Pereira de francesas, segundo Capel “[...] estuvo siempre

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presente con mayor o menor intensidad, aunque do modelo de Estrabão, ou seja, a de tradição
amenazada alguna vez por la fisiografía.” (1988, histórico-descritiva. Os avanços significativos que
p. 113). haviam ocorrido em consequência das reformas
Não podemos esquecer que, durante educativas e institucionais realizadas na época
muito tempo, o rótulo Geografia foi utilizado revolucionária e mesmo no período napoleônico,
para designar diferentes estudos ou produtos e que provocaram intenso desenvolvimento
destes estudos. Tinha ele uma conotação quase científico durante os três primeiros decênios do
que enciclopédica, e servia, por isso mesmo, século XIX, não alcançaram os conhecimentos
tanto para se referir ao objeto Terra quanto para geográficos.
também denominar os estudos de descrição A presença da geografia no ensino
e representação daquele mesmo objeto. Em ministrado pelas escolas francesas vinha,
conseqüência, saber geografia passou a significar portanto, atender aos interesses deste público
ter domínio do maior número de conhecimentos ávido em ampliar os conhecimentos acerca de
possível sobre os territórios e seus habitantes. um mundo que, em função do expansionismo
Nas primeiras décadas do Século XIX, imperialista europeu, começava a ser explorado
o rótulo geografia ainda não havia perdido suas (em todos os sentidos).2 Nem uma evidência nos
antigas conotações. Palácios, em sua análise nos faz pensar que ao ser inserido no Brasil, quando
mostra que, neste período, o termo geografia da “transplantação” do modelo curricular francês
realizada nas primeiras décadas do século XIX,
[...] podía aludir a una serie de conocimientos o ensino desta disciplina tenha inicialmente
útiles mundanos como al conjunto de las tido aqui outra finalidade que não fosse a de
grandes obras de ‘vulgarización geográfica’: fornecer informações genéricas, verdadeiramente
diccionarios, compendios, manuales y otros enciclopédicas, de um mundo em franco processo
textos de divulgación masiva. Estas obras de expansão. Lembremos que também o curso
encontraban a un público ávido de repuestas secundário no Brasil tinha um nítido caráter de
sobre un mundo en expansión, pero tenían formação geral.
escaso valor científico; sin intención de Uma das características marcantes da
rigurosidad en la mayoría de los casos, se geografia escolar que aqui foi introduzida a partir
confundían con otra literatura de divulgación do primeiro regulamento adotado para o Colégio
que rayaba muchas veces con la novela, la Pedro II, diz respeito à tradição metodológica
fabula y la leyenda: se trata de la profusa adotada por seus professores. Preconizava-
bibliografia de relaciones y descripciones se que se deveria começar os estudos a partir
de viajes, surgida hacia fines del siglo XII y do mais distante até atingir o mais próximo
desarrollada sobre todo durante el siglo de (geralmente os conteúdos programáticos desta
las Luces. (1992, p. 64-65). disciplina, organizados de forma enciclopédica,
iam desde a descrição da esfera celeste, passando
O interesse despertado pelos em seguida pela descrição das características
conhecimentos geográficos nos séculos XVIII naturais e humanas dos diferentes continentes,
e XIX foi bastante expressivo a tal ponto de na para somente no fim alcançar a descrição do
sociedade européia de então, “[...] saber y enseñar Brasil) e não raramente, por conta do volume de
‘Geografia’ formaba parte de las ‘novedades’ del informações a serem transmitidas nas poucas
siglo, como así se llamaba a las ideas modernas o horas semanais destinadas a esta disciplina,
ligadas a la Razón ilustrada.” (PALÁCIOS, 1992, os programas não conseguiam ser cumpridos
p. 63). integralmente.
Na França, das primeiras décadas do século Analisemos, então, a trajetória da
passado, praticava-se uma geografia bem ao estilo geografia no currículo escolar do Colégio Pedro II

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no período do Império brasileiro. com o ensino destas duas disciplinas, pois como
denuncia Segismundo:
As reformas sofridas pelo Estatuto do
Imperial Colégio de Pedro II durante o Nomeado em abril de 1838 para a cátedra
Império e o lugar da Geografia no Currículo de História, Justiniano [...] pouco depois,
Escolar Oficial se dirigia ao Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, criado nesse ano, pleiteando
Para que possamos melhor acompanhar a elaboração, pelo cenáculo, de um livro
as transformações que a geografia escolar escolar destinado ao ensino da matéria. Não
brasileira sofreu no período imperial, pretendemos foi atendido aí nem mais tarde, ao insistir no
utilizar como ponto de apoio as próprias reformas rogo. (1993, p. 12)
sofridas pelos estatutos do Imperial Colégio
de Pedro II, já que no mesmo era explicitado o A Primeira reforma sofrida no estatuto viria
desenho curricular vigente, bem como lá estavam à luz através do Decreto nº 62 de 1º de fevereiro
apontados os programas e compêndios prescritos de 1841. O curso passou a ter duração de sete
oficialmente. anos, bem como sofreu uma redistribuição das
Por ter assimilado, desde seu primeiro disciplinas pelas diferentes séries afim de melhor
regulamento datado de 31 de janeiro de 1838, o atender o desenvolvimento intelectual dos alunos.
modelo curricular francês, o Colégio Pedro II adotou Adaptando-se mais ainda ao modelo francês, foi
os estudos simultâneos e seriados, fato que já o acentuada a predominância dos estudos literários.
diferenciava dos primeiros Liceus Provinciais que O enciclopedismo foi exacerbado, alcançando no
apenas haviam posto sob um mesmo teto as aulas sétimo ano o número absurdo de 14 disciplinas. A
avulsas, típicas do ensino escolar pós-reforma geografia passava a ser ensinada em seis séries
pombalina. O currículo destinado a oferecer uma (a partir do segundo ano) e passava a denominar-
formação geral, era caracteristicamente clássico- se Geografia Descritiva (ver quadro 1).
humanístico e enciclopédico, nele, ressaltamos, Novo regulamento entrava em vigor
não se marginalizou os conhecimentos científicos, através do Decreto nº 1331-A de 17 de fevereiro
que mesmo não sendo o seu cerne, tiveram seus de 1854. A Reforma realizada por Luiz Pereira do
espaços garantidos.3 Couto Ferraz era decorrente do projeto proposto,
No desenho curricular, a geografia e a em 1851, por ele próprio e por Justiniano José
história apareciam como disciplinas autônomas, da Rocha (o mesmo que exercia anos antes, a
apesar de que eram ministradas pelo mesmo docência de geografia e história no Colégio Pedro
professor, o bacharel em Direito Justiniano José II). A mesma se baseou na Lei Falloux, que anos
da Rocha. Presente nos quatro primeiros anos, antes começara a vigorar na França.
a geografia era trabalhada tendo como base os
resumos escritos pelo seu primeiro professor, cujo A reforma de 1854 estabelecera algumas
título era “Compêndio de geografia elementar”. disposições no sentido de exigir melhor
Dois fatos nos parecem relevante acrescentar: o capacitação dos professores, retribuição
primeiro diz respeito à recomendação de Bernardo condigna, de organizar o recrutamento de
de Vasconcelos de que fosse utilizado nas aulas professores, de estabelecer uma inspeção
os manuais franceses de autoria de Poisson e escolar eficiente e de criar um Conselho
Cayz e os de Renoir e Dumont (obras que seriam Diretor. Estas disposições foram objeto da
mais tarde traduzidas por Justiniano); o segundo lei Guizot e principalmente da lei Falloux que
nos permite perceber o pouco caso do Instituto reorganizaram o ensino primário na França.
Histórico e Geográfico, considerado o principal É na legislação estabelecida por Falloux
bastião da construção do Estado-nação brasileiro, que Couto Ferraz se inspira para sua reforma

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Quadro 1
C u r riculo do Colégio Pedro II - Regulamento nº 62 de 1º de Fevereiro de 1841

Ano Escola r C omponentes curricula res Ano Escolar Componentes curricul ares

1º ano Gramática Geral e Gramática História (3 lições sema nais);


Nacional (5 lições sema nais); Aritmética e Álgebra
Latim (5 lições semanais); (5 lições semanais);
Francês (3 lições sema nais); Zoolo gia e Botânica
Inglês (5 lições sema nais); (3 lições seman ais);
Geografia descritiva Desenho figura do
(3 lições sem ana is); (1 lição semanal);
Desenho caligráfico M úsica vocal (1 lição seman al);
(2 lições semanais); Total: 25 lições sema nais
Desenho figurado
(3 lições sema nais); 6º ano Gre go (3 lições semanais);
Música Vocal Latim (3 lições sema nais);
(4 lições sema nais) Alemão (1 lição seman al);
Ing lês (1 lição semanal);
2º ano Latim (5 lições semanais); Fra ncês (1 lição semanal);
Francês (5 lições sema nais); G eografia descritiva
Desenho Cali gráfico (1 lição seman al);
(3 lições semanais); História (2 lições semanais);
Desen ho L inear Retórica e Poética
(3 lições sema nais); (5 lições semanais);
M úsica Vocal Filoso fia (5 lições semanais);
(4 lições sema nais) Geometria, Tri gonometria
Retilínea (3 lições semanais);
3º ano Latim (6 lições semanais); Física e Química (3 lições sema nais);
Francês (2 lições sema nais); Desenho fi gura do
Inglês (2 lições sema nais); (1 lição semanal);
Alemão (3 lições sema nais); Música vocal (1 lição seman al);
Grego (5 lições semanais); Total: 25 lições seman ais
Geogra fia descritiva
(1 lição semana l); 7º ano Greg o (3 lições semanais );
H istória (4 lições semanais); Latim (3 lições sema nais) ;
Dese nho figurado Alemão (1 lição semanal);
(1 lição sema nal); Ing lês (1 lição semanal);
Música vocal (1 lição sema nal) Fra ncês (1 lição semanal);
Geogr afi a descritiva
4º ano Latim (6 lições semanais); (1 lição sem anal);
Francês (2 lições sema nais); História (2 lições sema nais);
Inglês (2 lições sema nais); Retórica e Poética
Alemão (3 lições sema nais); (5 lições semanais);
Grego (5 lições semanais); Filoso fia (5 lições semanais);
Geografia descritiva Geogr afia, Matemátic a e
(1 lição semanal); Cronologi a (2 lições sem ana is);
História (4 lições sema nais); M ineralog ia e Geolo gia
Desenho figurado (2 lições semanais);
(1 lição semanal); Zoolo gia Filosó fica
Musica vocal (1 lição sema nal); (1 lição seman al);
Total: 25 lições sema nais Desen ho figura do
(1 lição sema nal);
5º ano Grego (4 lições sema nais); Música vocal (1 lição semanal);
Latim (3 lições sema nais); T otal: 29 lições semanais
A lemão (2 lições semanais);
Inglês ( I lição semanal);
Fran cês (1 lição sema nal);
Geografia descritiva
(1 lição sem anal);

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no ensino da Côrte, pondo-se ao lado dos Quanto aos manuais franceses indicados
países europeus quanto à organização para serem adotados nas aulas de geografia,
e regulamento. (CHIZZOTTI, 1975, p. 65) podemos dizer que na França os mesmos já eram
objeto de questionamento quanto à sua qualidade.
Dentre outras modificações estabelecidas Aliás, não apenas os livros adotados, mas sim,
pelo novo regulamento, estão: o deslocamento todo o ensino de geografia, como podemos
dos estudos científicos para os primeiros anos; verificar na análise feita por Broc:
mais projeção para a gramática nacional;
desdobramento dos estudos históricos e On a bien souvent évoqué la faiblesse, pour
geográficos que passaram a contar, além dos ne pas dire la nullité, de l’enseignement
ensinamentos acerca da história e da geografia géographique en France dans la première
moderna, com conteúdos mais explícitos sobre a moitié du XIXº siècle. Rappelons simplement
corografia brasileira e história do Brasil. quelques faits significatifs: en 1822, le jeune
Como consequência da legislação de Ferdinand de Lesseps faillit échouer au
1854, seria baixado em 24 de janeiro de 1856 um baccalauréat pour ne pas avoir su dire à M.
novo decreto, com a finalidade de fixar programas Barbié du Bocage, professeur à la Sorbonne,
e indicar os compêndios a serem adotados nos ce qu’étaient les points cardinaux. Quelques
dois cursos em que naquele momento estavam années plus tard, sous la monarchie de
divididos os estudos no Colégio Pedro II (estudos Juillet, on posait à des élèves de sixiè le
de primeira classe e estudos de segunda classe). sujet suivant: ‘La géographie et l’histoire
A influência francesa alcançava o extremo. posait à colonies grecques en Asie Mineure
Euzébio de Queiroz chegou mesmo a afirmar que depuis l’émigration des Éoliens jusqu’á
os programas adotados haviam sido adaptados la révolte d’Ionie’ A la mème époque,
dos últimos programas prescritos para os liceus l’inspecteur géneral Letronne, que régentait
nacionais da França, tendo sido realizadas apenas l’enseignement géographique en France,
as necessárias modificações e alterações. déclarait: ‘On n’enseigne pas la géographie;
No que diz respeito aos compêndios, on enseigne seulement la manière de
esclarece Haidar: l’apprendre. Composée uniquement de fait
ou isolés les uns des outres, ou qui moins, ne
Na falta de obras nacionais, adotaram- sont pas liés entre eux pas un enchainement
se para o estudo das ciências físicas e qui existe dans d’autres sciences, la
naturais, da história e geografia e da filosofia, géographie est en grande partie le domaine
compêndios francêses. Os programas exclusif de la mémoire: elle s’apprend par la
extensíssimos e pretensiosos reproduziam, lecture de l’histoire et des voyages’. Avec
praticamente na íntegra, o plano dos livros de tels préceptes on comprend que les
adotados. Assim, por exemplo, no 4º ano do professeurs d’histoire des lycées n’aient
curso especial, ao lado do curso de história guère été encouragés à sortir des voies
e geografia do Brasil baseado na História sùres de la géographie historique; formés
do Brasil de Abreu Lima e no Compêndio de exclusivement à la pratique des belles lettres
Geografia de Pompeo, deveriam os alunos et de l’histoire ancienne, ces maitres ne
cumprir a segunda parte de um vastíssimo pouvaient enseigner avec fruit ce à quoi leurs
programa de História Moderna, utilizando propres études ne les avaient point préparés.
o Manuel du Baccalaureat e o Atlas de (BROC, 1974, p. 546)
Delamarche adotados nos Liceus de Paris.
(1972, p. 116-117) Uma nova organização curricular para
o Imperial Colégio de Pedro II foi apresentada,

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quando da entrada em vigor do Regulamento por aulas, o systema das lições, o methodo dos
de 17 de fevereiro de 1855 (ver quadro 2). Este exames, o regimen interno do estabelecimento e
regulamento havia sido previsto no Decreto nº a distribuição de premios até o numero de tres no
1.331-A, de 17 de fevereiro de 1854, que aprovava fim de cada anno lectivo do curso, farão objecto de
a reforma do ensino primário e secundário no hum Regulamento especial que será organizado
município da Corte, cujo artigo 78 estabelecia pelo Conselho Director, e sujeito á aprovação do
que “As materias de cada anno, sua distribuição Governo.”

Quadro 2
Curriculo do Colégio Pedro II - Regulamento de 17 de Fevereiro de 1855

Ano Escola r C omponentes curricula res Ano Escolar Componentes curricul ares

E studos de P rimeira C lasse Ciê ncias naturais:
1ª Cadeira: Repetição de Mineralo gia
1º ano Leitura e recitação do portug uês; e Geolo gia;
Exercícios ortográficos; 2ª Cadeira: Repetição de Física
Gramática Nacio nal; e Química;
Gramática Latina; Continu ação da geogr afia e da
Francês; com preendendo históri a modern a;
simplesmente leitura, gram ática Corogr afi a brasileir a e
e versão fácil história nacional

2º ano Latim: versão fácil e co nstrução de E studos de segunda C lasse


p eríodos curtos com o fim especial
de a p licar e recordar as regras 5º ano Latim; versão para a língua nacional
gramaticais; de clássicos mais difíceis, e temas;
Francês; versão, temas e co nversa; Alemão: L eitura, gramáti ca,
Inglês; leitura, gramática, versão fácil;
versão fácil; Greg o: Leitura gramatical,
Continuação da aritmética e versão fácil;
ál gebra até e quações do 2º grau; Filoso fia racio nal e moral;
Ciências naturais: Geogr afi a e Históri a Antiga
1ª C adeira: Zoologia e Botânica;
2ª C adeira: Física 6º ano Latim: co ntinuação das matérias
do ano anterior;
3º ano Latim: versão gra dualmente mais Filoso fia: sistemas comparados;
di fícil, exercícios gramaticais, Alemão: versão mais di fícil,
e temas; temas fáceis;
Inglês: versão mais difícil, e temas; Grego: versão mais di fícil,
Francês: a perfeiçoamento do estudo temas fáceis;
da língua; Retórica: re gras da elo quência e
C iências Naturais: de composição;
1ª Cad eira: Mineralogia e Geologia; Geogr afi a e históri a d a ida de média
2ª Ca deira: Química;
Explic ação dos termos técnicos 7º ano Alemão: aper feiçoamento;
necessários pa ra o estudo Greg o: aperfeiçoame nto;
da geografia; Elo quência prática: com posição de
Geografia e história moderna discursos e de narrações em
português, e quadros da literatura
4º ano Latim; versão e temas; nacio nal;
Inglês: a perfeiçoamento no estu do História da Filoso fia;
da língua e conversa; Latim: com posição de d iscursos e
Trigonometria retilínea; de narrações;
I taliano

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Em ambos os documentos, o controle didáticas ou mesmo traduzissem as publicadas


rígido do governo no que diz respeito ao que em língua estrangeira.
era ensinado no Imperial Colégio de Pedro II foi Em 1857 entrava em vigor o decreto
mantido. Conteúdos, metodologias, exames, nº 2006 de 24 de outubro (ver quadro 3). A
passavam antes pelo crivo estatal, fosse pelas grande alteração, no que diz respeito ao ensino
mãos do Inspetor de Ensino, fosse pelas do próprio de geografia, foi a separação da cadeira de
Ministro dos Negócios do Império. Em relação corografia e história do Brasil da de história e
aos livros permanecia também o mesmo rigor na geografia moderna. Segundo Haidar (1972), foi
sua adoção. Somente aqueles que recebessem a criada também uma cadeira de geografia geral
competente autorização governamental poderiam que passou a trabalhar com conteúdos antes
ser admitidos nas salas de aulas. Por outro lado, distribuídos pelas cadeiras de história antiga,
a ausência de compêndios na língua nacional média e moderna.
obrigou o governo a estabelecer um prêmio para Em 1862, nova reforma é efetuada através
professores ou não que compusessem obras do Decreto nº 2883, de 1º de fevereiro (ver

Quadro 3
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto 2006 de 24 de Outubro de 1857

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano Doutrina cristã; história sa grada; leitura e recitação do portu guês, exercícios ortog ráficos,
gramática nacional; gramát ica latina; francês, compreend endo sim plesmente gramática,
leitura e versão fácil; aritmética abrangend o tão some nte os princípios elementares,
definições e as quatro operações sobre números i nteiros; geogr afia, compreendendo
unica mente a explic ação dos principais termos técnicos e as divisões ger ais do globo.

2º ano Latim, versão fácil e co nstrução de perío dos curtos, com o fim de aplicar e recordar as
regras gramaticais; francês, versão, temas e conversa; inglês, com pree ndend o simplesmente
gramática, leitura e versão fácil; aritmética, co ntinuação até proporções;
geogra fia, continuação ( Ásia e Áfric a)

3º ano Latim, versão gra dualmente mais d ifícil, exercícios gramaticais e temas; francês, composição,
a p erfeiçoame nto do estudo da língua; i nglês, versão mais di fícil, temas; aritmética,
continuação até o fim; álgebra, até equações do 2º grau; geogr afi a, continu ação (Europa ,
América, Oceania ); história d a id ade médi a

4º ano Latim, versão, temas; i nglês, versão, temas; geometria eleme ntar; história mo d erna e
contemporânea; corogra fia e históri a do Brasil; botânica e zoologia.

5º ano especia l trigo nometria retilínea, física e química, mi n eralogia e re petição d e botânica, continu ação e
repetição de corografia e históri a do Brasil

segunda C lasse

6º ano Latim, continuação das matérias d o ano anterior; grego, temas fáceis; alemão, temas
fáceis, co nversa; italia no; filoso fia, compreend endo a lóg ica e a metafísica; retórica, reg ras
da eloquência e da comp osição; história a ntiga; química e re petição d e física

7º ano Latim, composição, a perfeiçoamento do estudo d a língua; gre go, versão mais difícil, temas;
alemão, versão, temas, co nversa; filosofia moral e história resumi da dos sistemas comparados
de filosofia; retórica e p oética, análise e crítica dos clássicos portu gueses, composição de
discursos, narrações.

22
Genylt on od il o n r êgo da roc h a

quadro 4). Veio para modificar a medida adotada passagem, não tiveram origem no Brasil. Elas
pelo Ministro Couto Ferraz que bifurcou o curso emergiram a partir de uma discussão que se dava
secundário, no Imperial Colégio de Pedro II. Neste na Europa em torno dos chamados “estudos reais”
sentido, extinguiu o 5º ano especial e reorganizou e que provocara a defesa do ensino secundário
as matérias em um curso único. A reforma reduziu diversificado em suas finalidades, para atender os
os estudos de Física, Química e Ciências Naturais, defensores dos estudos científicos e dos estudos
enquanto que o Latim, o Português, o Francês e humanísticos. Em consequência desses embates,
o Grego tiveram o número de aulas ampliadas. surgiram na Alemanha as Realschule, cujo caráter
A História também sofreu modificações sendo era o de ministrar um ensino desinteressado,
desdobrados os seus conteúdos ao longo de enquanto que na França foram criados os Liceus
cinco anos. Alemão, Italiano, Desenho, Música, de Ensino Secundário Especial, marcado pela
Dança e Ginástica foram tornadas facultativas. ambiguidade entre a tarefa de ministrar um ensino
A década de 70 do século XIX foi marcada, clássico ao mesmo tempo em que preparava para
no campo educacional, pela discussão em torno as carreiras e profissões determinadas, adquirindo
do ensino científico. Nossas elites buscando aí o seu caráter especial. A nova legislação
“elevar o país ao nível do século” passaram a educacional brasileira sofreria a influência dessas
defender uma educação secundária assentada no discussões.
ensino científico. A importância que estes estudos Através do Decreto nº 4468 editado
adquiriram estava relacionada ao desejo de formar em 1870 (ver quadro 5), entrava em vigor uma
integralmente o cidadão, em oposição às velhas nova reforma do ensino que atingia os estudos
finalidades da nossa escola secundária que nada ministrados no Colégio Pedro II. Acreditamos
mais era do que preparar para o ingresso no valer a pena reproduzir um trecho da justificativa
ensino superior. A escola secundária, defendiam apresentada pelo Ministro Paulino de Souza
eles, deveria agora dar a preparação básica para quando da apresentação da nova lei:
as necessidades complexas e variadas da vida
social. A instrução secundária é dos três [ramos
Estas preocupações, diga-se de da instrução pública] o que mais influi na

Quadro 4
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto nº 2883 de 1º de Fevereiro de 1862

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano Português, Latim, Francês, Aritmética, Geogr afi a, História Antig a

2º ano Latim, Francês, Aritmética, G eografia, H istória Antiga

3º ano Latim, Francês, Inglês, Aritmética e Álgebra, Geografia, História Antiga

4º ano Latim, Francês, Inglês, Geometria Plan a, História M édia, G eografia e Cosmogr afia

5º ano Latim, Grego, Inglês, Geometria Sóli da e Trig onometria Retilínea, História M édia, Física
e Química

6º ano Latim, Grego, Lógica e Metafísica, Gramática Filosó fica, Retórica, História Mod erna

7º ano Latim, Grego, Ética e História da Filoso fia, Poética, Literatura Nacio nal, Zoolo gia e Botânica,
Min eralogia e Geologia, C orogr afi a e História do Brasil

23
O co l ég i o pedro II e a in stitu ci onali z ação da geogr afia escola r n o br asil i mpério

educação, formando a inteligência e em obtenha um vocabulário mais ou menos


grande parte o caráter dos que a recebem. completo, que nas ciências fique com mais ou
Nela não enxergo tamanho alcance pelos menos algumas noções, como que consiga
conhecimentos que adquire o aluno, como o resultado de exercitar, adestrar e alargar o
pelo desenvolvimento intelectual e qualidades espírito, dispondo-o pela aquisição dos dotes
de espírito que obtém por meio do estudo das necessários para estudos de aplicação e
matérias que o constituem [...]. Não importa interesse prático. Eis porque, na reforma do
tanto que nas línguas estrangeiras o aluno plano de ensino do Imperial Colégio de Pedro

Quadro 5
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto 4468 de 1870

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano R eligião e História Sagrada; Português (gramática, análise lógica e gramatical,


exercícios de leitura, recitação e ortografia); Geogr afi a elementar e descritiva em gera l;
Aritmética elementar

2º ano Português (gramática, a nálise ló gica e gramatical, leitura de autores clássicos, recitação,
exercícios de redação); L atim ( gramática, tradução para o português de autores lati n os fáceis,
an álise e temas fáceis); Francês (gramática, tradução para o portu guês d e temas fáceis,
análise e temas fáceis); C onti nuação de Aritmética; Continu ação de Geografi a, especialmente a
da Europa e da América

3º ano Português (preleções sobre a índ ole da lí ngua, notícia histórica sobre sua formação e
p rogresso, leitura dos clássicos, recitação, exercícios de red ação, composições); Latim
(tradução, a nálise e temas); Fra ncês (tradução, análise e temas); Continu ação da geografia,
incluída a antiga; Ap erfeiçoame nto de aritmética (álg ebra até operações do primeiro grau
incluídas)

4º ano Latim (tradução, a nálise e temas mais di fíceis); Fran cês (tradução, análise e temas mais
difíceis, com posição e recitação, n ão se falando na aula senão nesta língua); Ing lês (gramática,
leitura e tra dução para o português de autores i ngleses fáceis, análise e temas fáceis);
Co ntinuação de álgebra (e quações de 2º grau, Geometria plana); História Anti ga;
Zoologia e Botânica

5º ano Latim (tradução e análise de autores mais di fíceis, com posição de d iscursos e versos latinos);
Inglês (leitura, tradução a nálise e temas); Grego (gramática, tradução, análise e temas fáceis);
Leitura e apreciação de clássicos franceses e composições, não se falando em aula senão
esta lí ngua

6º ano Inglês (leitura, análise e trad ução de autores mais difíceis, com posição e recitação, não se
fala ndo em aula senão esta lí ngua); Gre go (tradução, análise e temas); Conti nuação da química,
incluídas noções de química orgânica; História Mod erna; Retórica e Poética (leitura e
ap reciação literária dos melhores clássicos da língua portu guesa exercícios de estilo);
Filosofia (psicologia e lógica); Aperfeiçoame nto nas línguas lati na e francesa por meio d e
tradução e a preciação literária de autores clássicos e com posições

7º ano Grego (tradução e análise de autores mais d ifíceis, composições); Históri a e Corogr afia do
B ra sil; Mineralogia e Geologia; Filoso fia (meta física e ética; exposição dos sistemas
comparados de filosofia); Cosmo graf ia; História d a literatura em geral e especialme nte da
p ortuguesa e nacional, com posição de discursos e narrações e d eclamações; Aperfeiçoamento
nas lí nguas lati na, fra ncesa e i nglesa (preleções eleme ntares sobre a índole, formação e
p rogresso de ca da uma das ref eri das línguas, alternadas com a leitura, tradução e apreciação
literária de autores clássicos)

24
Genylt on od il o n r êgo da roc h a

II, procurei tornar mais rigoroso o estudo de todas as disciplinas que se constituíam em
daquelas matérias que tendem a desenvolver objeto dos exames de preparatórios. Já para os
o espírito do aluno na idade em que mais dois últimos anos foram todas as disciplinas que
facilmente se pode dirigir, e não exigir provas não interessavam para aqueles exames. Afirma
tão severas nas matérias que tendem mais a Haidar que:
enriquecer a inteligência do aluno do que a Tais disposições combinadas com o sistema
robustecê-la. (apud HAIDAR, 1972, p. 125) de exames finais por disciplina, praticamente,
reduziam o Colégio de Pedro II a cursos de
Dentre as novidades trazidas pela nova preparatórios. O título de bacharel em letras
reforma, podemos destacar a ênfase dada ao e conseqüentemente os dois últimos anos de
ensino das ciências físicas e naturais, a criação do estudos tornavam-se desnecessários aos que
exame de admissão (artigo 7º), a transformação do buscavam os cursos superiores: após 5 anos
primeiro ano em etapa de supressão das lacunas de estudos estariam os jovens alunos do
que os alunos traziam do ensino elementar e a colégio da Côrte em condições de matricular-
criação do sistema de exames finais por disciplina se em qualquer das Academias do Império,
(que seriam realizados em diferentes momentos independemente de novas provas. (1972,
do curso), modalidade que permitia aos aprovados p.127)
o ingresso no ensino superior. Desenho, música
vocal e ginástica passam a constituir em práticas A geografia escolar, com esse decreto,
obrigatórias. seria objeto de novas mudanças no que diz
Em 1876, (ver quadro 6) uma nova respeito à sua presença no currículo. Seu ensino
legislação passa a vigorar. A reforma de José ficou restrito a duas séries (1º e 3º), além disso,
Bento da Cunha Figueiredo pôs fim às matrículas a corografia, agora ensinada pela disciplina
avulsas que serviam apenas para aligeirar os Cosmografia e Corografia do Brasil, passou a ser
estudos dos “ávidos” e alcançar o ensino superior, ministrada em um único ano (7º ano).
porém, para não entrar em choque com estes, Durante todo o período imperial, o ensino
o Ministro criou novo mecanismo, qual seja, de geografia manteve-se quase inalterado em
a transferência para as cinco primeiras séries suas características principais, tendo sofrido

Quadro 6
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto nº 6130 de 1º de Março de 1876

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano R eligião e História Sagrada; Português; elementos de Geogr afi a e de Aritmética

2º ano Português; L atim; Francês

3º ano Latim; Francês; Geografia

4º ano Latim; Filosofia; História Anti ga e Méd ia; Aritmética e Álgebra

5º ano História Moderna e C ontemporân ea; Geometria e Trig onometria; Ing lês; Retórica e Poética

6º ano Física e Química; Cosmografi a e Corogr afia do Brasil; Gre go; Alemão

7º ano História do Brasil; Grego; A lemão; História Natural; Literatura Nacio nal

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O co l ég i o pedro II e a in stitu ci onali z ação da geogr afia escola r n o br asil i mpério

poucas mudanças no que diz respeito ao aproximasse.


conteúdo ensinado ou mesmo na forma de se Nas últimas décadas do século XIX, porém,
ensinar. Praticou-se durante todo o período a este estado de coisa começa a ser abalado. A
geografia escolar de nítida orientação clássica, geografia escolar até então praticada torna-se
ou seja, a geografia descritiva, mnemônica, objeto de questionamentos não só no que diz
enciclopédica, distante da realidade do aluno. respeito aos seus conteúdos, mas também (e
Tais características, entretanto, começariam a sobretudo) em relação aos métodos de ensino
sofrer profundos questionamentos a partir do fim adotados por seus professores.
do século XIX. Na esfera oficial, tal realidade torna-se
Novas propostas lentamente começam a mais explícita quando da concepção dos famosos
emergir. Não propostas endógenas de geografia pareceres legislativos sobre a reforma educacional
escolar, mas ainda modeladas conforme as decretada por Leôncio de Carvalho, elaborados
transformações sofridas pelo ensino desta que foram por Ruy Barbosa, em 1882, (ele era
disciplina no exterior. Marco dos questionamentos então Deputado pela Bahia na Assembleia Geral)
acerca do ensino de geografia que vinha sendo quando de sua função de relator da Comissão de
praticado nas escolas brasileiras, a reforma Instrução da Câmara.
educacional implementada por Leôncio de Em 1878, assumia o governo brasileiro
Carvalho em 1878 desencadeou profundas o Gabinete Liberal presidido por Cansanção de
críticas acerca da organização, funcionamento Sinimbu. Para a pasta de Negócios do Império,
e prática do ensino existente no Brasil, críticas ministério que na época era responsável também
estas muito bem sintetizadas nos pareceres de pelos assuntos ligados à educação, foi nomeado o
Ruy Barbosa. professor Carlos Leôncio de Carvalho, conhecido
que era pela defesa do ensino livre, ideia que
Quando o ensino de geografia passa ser norteou suas ações no campo educacional. A
objeto de questionamento: as críticas feitas principal característica das orientações dadas
nos Pareceres de Ruy Barbosa à educação, por este ministro, foi a tentativa
de implantação dos princípios liberais que
Novas propostas lentamente começam a perpassaram as leis educacionais por ele
emergir. Não propostas endógenas de geografia implantadas.
escolar, mas ainda modeladas conforme as Em 20 de abril de 1878, entrava em vigor
transformações sofridas pelo ensino desta o Decreto nº 6884 que reformava o currículo do
disciplina no exterior. Marco dos questionamentos Imperial Colégio de Pedro II. As características
acerca do ensino de geografia que vinha sendo mais marcantes neste decreto foram: ampliação
praticado nas escolas brasileiras, a reforma dos estudos literários (acrescentou o italiano entre
educacional implementada por Leôncio de as línguas a serem aprendidas pelos alunos);
Carvalho em 1878 desencadeou profundas supervalorização do preparo científico dos alunos
críticas acerca da organização, funcionamento (inclusive dotando o colégio de materiais didáticos
e prática do ensino existente no Brasil, críticas que contribuíssem para uma maior praticidade e
estas muito bem sintetizadas nos pareceres de objetividade no ensino das ciências); restauração
Ruy Barbosa. das matriculas avulsas no Colégio (estabelecidas
Durante um largo período de existência da em 1855, estimuladas na reforma de 1870, tais
geografia escolar brasileira, foi bastante comum matriculas permitiam que os alunos deixassem
entre os professores desta disciplina, a prática o curso secundário sistemático, e de forma mais
da legitimação de saberes assentados numa rápida concluíssem este grau de ensino, podendo
concepção clássica de geografia, ou que dela se ingressar normalmente nos cursos superiores);
e, a de maior impacto, a liberdade de frequência,

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Genylt on od il o n r êgo da roc h a

isto é, permitia que qualquer pessoa, mesmo sem sendo, qualquer aluno poderia se submeter à
ter cursado as aulas, se submetesse aos exames realização de exames vagos em qualquer disciplina
vagos de qualquer ou de todas as disciplinas, e, caso obtivesse aprovação plena em todas as
quantas vezes fosse necessário, já que a matérias, receberia o grau de bacharel em letras.
frequência não seria mais exigida. Para se tornar Para Haidar, este foi o “tiro de misericórdia” dado
mais atrativo ainda, a legislação permitia que, no ensino secundário seriado existente no período
mesmo sem frequentar as aulas, somente com a imperial.
aprovação nos testes, os “alunos” recebessem o
grau de “bacharel em letras”. A torrente avassaladora dos estudos
Nos novos estatutos prescritos por este avulsos, incessantemente alimentada
decreto, o ensino de geografia foi deslocado para pelos exames parcelados de preparatórios,
o primeiro e segundo anos do curso, voltando a conseguira abalar o mais forte reduto
corografia a ser ensinada pela disciplina história e dos estudos secundários organizados e
corografia do Brasil. regulares. O Colégio de Pedro II rendia-se à
Em 1878 Carlos Leôncio de Carvalho desorganização geral. (HAIDAR,1972, p. 129)
promovia nova reforma no ensino ministrado no
Colégio Pedro II, através do Decreto nº 6884, de Em 19 de abril de 1879, novo Decreto
20 de abril (ver quadro 7). Esta reforma acabou (nº 7247) foi baixado por Leôncio de Carvalho,
com o caráter suplementar imposto ao primeiro agora com o fim de normalizar o ensino primário e
ano do curso secundário pela reforma de 1862 e secundário no Município da Corte, os exames de
mantida pela de 1876, redistribuiu as disciplinas preparatórios, além de reformar o ensino superior
pelas sete séries, ampliou os estudos literários, em todo o país.
incluindo o italiano como mais uma língua a ser Gonçalves (1994) nos esclarece que
obrigatória no currículo daquele colégio, bem o ministro optou por baixar um Decreto em
como deu maior atenção ao preparo científico dos detrimento da tramitação usual, que exigiria o
alunos. encaminhamento de projeto ao legislativo para as
A questão mais polêmica desta reforma, necessárias discussões e deliberações. Leôncio de
porém, estava nos seus artigos 17º e 18º que Carvalho tinha pressa e quis evitar as prolongadas
autorizavam a liberdade de frequência, assim discussões e o surgimento de impasses. Em

Quadro 7
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto nº 6884 de 20 de Abril de 1878

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano R eligião e História Sagrada; Português; elementos de Geogr afi a e de Aritmética

2º ano Português; L atim; Francês

3º ano Latim; Francês; Geografia

4º ano Latim; Filosofia; História Anti ga e Méd ia; Aritmética e Álgebra

5º ano História Moderna e C ontemporân ea; Geometria e Trig onometria; Ing lês; Retórica e Poética

6º ano Física e Química; Cosmografi a e Corogr afia do Brasil; Gre go; Alemão

7º ano História do Brasil; Grego; A lemão; História Natural; Literatura Nacio nal

27
O co l ég i o pedro II e a in stitu ci onali z ação da geogr afia escola r n o br asil i mpério

consequência do procedimento legal adotado, só ficasse amando acima de todas as outras ciências,
pôde entrar em vigor, imediatamente, os itens que desde que lha mostrassem sob a forma que lhe é
não provocassem aumento de despesas (assunto própria.” (BARBOSA, 1946, p. 293).
de competência do legislativo). Em consequência Propôs também em seu parecer, o ensino
das discordâncias que eles suscitaram, efêmeras da geografia escolar assentado na geografia
foram suas vigências. científica e nos métodos modernos de ensino.
Como estava determinado pela lei, o Em sua opinião, esta disciplina sob tais bases,
Decreto foi levado à apreciação do Legislativo, e, se constituía, “[...] hoje mais do que nunca, um
em consequência, encaminhado à comissão de elemento essencial da educação comum. Em
Instrução Pública da Câmara dos Deputados, para importância só se lhe avantaja a leitura, a escrita
que lá fosse elaborado um parecer que servisse e a aritmética rudimentar” (BARBOSA, 1946, p.
de subsídio para as discussões que seriam 293).
realizadas naquela casa. O parecer elaborado Propõe ele a adoção dos métodos
pelos membros da comissão, cujo relator era o modernos no ensino da geografia escolar.
Deputado Ruy Barbosa, se fez acompanhar de Defendeu a aplicação dos processos intuitivos,
um Projeto Substitutivo ao Decreto analisado. apontando a pedagogia de Pestalozzi como
Gonçalves (1994) afirma que a singularidade grande responsável pelas melhoras qualitativas
destes pareceres frente aos demais realizados vividas por esta disciplina em outros países. A
anteriormente, estava no olhar enciclopédico, exemplo das geografias escolares dos demais
ilustrado de Ruy, que sempre investigou os países por ele citado, opina o parecerista que
problemas brasileiros com referencial europeu e a geografia escolar brasileira deveria partir da
norte-americano. realidade próxima.
Na parte do parecer dedicada à disciplina Para este autor, defensor dos princípios
geografia, Ruy Barbosa deixa bem clara a sua da ciência moderna então emergente, o ensino
opinião sobre a importância da presença desta de geografia deveria seguir o método racional
disciplina nos currículos escolares. Concorda ele preconizado pelo positivismo. Por conta disso,
com o representante da Bélgica na exposição deveriam ser banidas de forma absoluta as
universal realizada na Filadélfia, em 1876, quando definições abstratas e, a priori, a realidade, ou
aquele afirma que a geografia deve fazer parte do a sua imagem concreta, sensível, nítida, exata,
programa obrigatório das escolas em todos os deveria ser, de forma inconteste, a fonte exclusiva
países civilizados. Dessa forma, evidentemente, de toda a cultura geográfica.
não poderia ela ser excluída de nossas escolas, Concluindo sua análise acerca da
pois uma das grandes preocupações de Ruy geografia escolar, apresentou aquele autor as
Barbosa era colocar o Brasil em pé de igualdade seguintes sugestões que poderiam subsidiar as
com os países mais desenvolvidos. reformas que se faziam necessárias no ensino
Lembra Barbosa que tanto Kant quanto desta disciplina:
Locke eram da opinião que a instrução das
crianças deveria iniciar pela aprendizagem da 1. O curso de geografia há de partir da lição de
geografia. Por conta disso, defende que seja coisas, e cingir-se, quanto se possa, estritamente
dado largo espaço para esta disciplina numa aos processos do ensino pelo aspecto;
reorganização dos programas escolares sob base
científica, como a que estava sendo proposta nos 2. a descrição da terra começará pelo estudo
pareceres. Citando Herder, afirma que “Acusar topográfico da escola, seguindo pela topografia
de aridez o estudo da geografia, o mesmo é que da cidade; tudo mediante exercícios na pedra e
argüir de secura o oceano. Grande assombro cartas apropriadas;
seria o meu, se um menino bem dotado não a

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Genylt on od il o n r êgo da roc h a

3. desde o primeiro grau da aula de primeiras letras de ensino presentes nas escolas primárias e
se dará princípios aos trabalhos de cartografia, secundárias brasileiras. Januário dos Santos
que receberão, na escola, em todo o seu curso, Sabino, um dos relatores da 6º questão se referiu
o mais amplo desenvolvimento, habilitando os ao ensino de geografia, apresentando a seguinte
meninos a desenharem de memória o mapa das proposta:
várias partes da terra; Geographia do Brasil - Estudo da localidade
em que estiver a escola: rua, quarteirão,
4. os livros clássicos, nesta secção do programa, freguesia, município. Orientação: valles,
tomarão por tipo as obras americanas deste montes, rios, lagôas, que existirem nos
gênero; arredores da escola. Com o fim de preparar
o alumno para o estudo da geographia,
5. cada escola será provida do indispensável o professor, procedendo sempre da
material técnico: cartas mudas e expressivas, observação, traçará no quadro preto em
relevos (não em globos), esferas hipsométricas, primeiro logar o plano da escola, depois o da
esferas ardosiadas e, quando se possa, um rua até o do município, e praticará com elle
planetário; acerca dos principaes habitantes, edificios,
lavoura, commercio e industria da localidade.
6. as noções de cosmografia serão dadas, Na explicação dos termos geographicos,
igualmente mediante observações e montes, valles, rios, lagos, etc., o professor
exemplificações concretas. baseará as lições na observação, já
mostrando os montes, rios, etc., que existirem
Os pareceres, apesar de todo o esforço nas proximidades da escola, já referindo-se
despendido em suas elaborações, não chegaram áquelles que o alumno tiver visto. (SABINO
a ser apreciados pela Câmara, porque muito apud ISSLER, 1973, p. 72)
demorou suas impressões na Tipografia Nacional.
No período final do Império brasileiro, o ensino Posto em comparação com a geografia
de geografia manteve-se com as mesmas escolar então praticada, percebemos uma
características que foram objeto das críticas preocupação por parte do autor com uma
presentes nos pareceres. Devemos salientar, aprendizagem ativa, bastante semelhante ao
porém, que a hegemonia da velha geografia modelo proposto por Pestalozzi. Subjacente na
escolar, que no Brasil ainda era ensinada, iniciara, proposta está a implementação, nas escolas
a partir daquele momento, seu ocaso. brasileiras, de uma geografia de cunho positivista,
da geografia moderna de caráter cientificista, em
O ensino de geografia no fim do Império detrimento, da geografia meramente descritiva e
mnemônica tão usual naqueles tempos.
As mudanças que se dão no interior Vindo ao encontro de nossa opinião acerca
de uma disciplina escolar não raramente são dos conflitos teórico-metodológicos que estavam
gestadas em meio aos conflitos de ordem se dando em torno do ensino de geografia no
teóricos e metodológicos. Tal afirmativa pode Brasil nos fins do século XIX, Bernardo Issler
ser nitidamente verificada no caso da geografia assim se manifesta em relação à proposta de
escolar brasileira a partir das últimas décadas do Januário Sabino e a realidade preponderante
século XIX. A título de exemplo, podemos recorrer entre a maioria dos demais professores desta
aos debates verificados quando do Congresso da disciplina:
Instrução, realizado no Rio de Janeiro em 1883.
Dentre os vários assuntos postos em Eis aí outro documento a acentuar a grande
pauta, discutiu-se sobre os métodos e programas distância entre a precariedade da situação

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O co l ég i o pedro II e a in stitu ci onali z ação da geogr afia escola r n o br asil i mpério

escolar e a posição de vanguarda, quase do Colégio, ainda no império, a única alteração


utópica, pretendida pelo relator. [...] É verificada, no que tange à geografia escolar, foi
o exemplo de uma posição renovadora a nova distribuição desta disciplina pelas séries
em educação, pretendia, acreditamos do ensino secundário, conforme o constante no
honestamente, pelo relator. Porém se corpo do decreto de nº 8051 de 25 de março de
fosse aplicada, não teria condições de 1881(Reforma do curso de estudos do Colégio
obter sucesso pois, a um programa assim Pedro II), de autoria do Barão Homem de Mello
concebido, são imprescindíveis professores (ver quadro 8). Esta reforma manteve os exames
com boa formação normalista, entre outras. vagos, as matrículas avulsas e os exames finais
[...] O parecer de Januário dos Santos por disciplina além de restaurar o primeiro ano
Sabino, conquanto atualizado e lúcido do suplementar extinto por Leôncio de Carvalho. A
papel fundamental reservado à Geografia única novidade trazida pela nova legislação foi
na escola primária, foi precoce face as o fato da língua portuguesa ter passado a ser
contingências gerais. (1973, p. 72-73) ensinada em todas as séries do ensino secundário.
Podemos afirmar que ela manteve inalterado o
Em nível de legislação, propriamente estado de desorganização que caracterizava nos
dita, durante todo o período imperial, o ensino fins do século XIX o Imperial Colégio de Pedro
de geografia manteve-se quase que totalmente II, referência para todo o ensino secundário
inalterado. Tanto metodologias quanto conteúdos brasileiro.
programáticos permaneceram imutáveis no Neste decreto, podemos observar que, a
currículo prescrito oficialmente por décadas fim de tornar mais explícito os conteúdos a ser
seguidas. No máximo, as diferentes legislações trabalhados nas séries em que se fazia presente
voltadas para dar organização ao ensino do a disciplina geografia, ficou estabelecido que
Imperial Colégio de Pedro II promoveram algumas no primeiro ano fossem ensinadas noções de
mudanças superficiais a fim de melhor reordenar geografia, no terceiro ano geografia física e no
o programa de ensino dando-lhe uma feição mais quarto ano geografia e cosmografia. Corografia e
coerente. História do Brasil mantinham-se no sétimo ano.
Na última reforma sofrida pelos estatutos Findo o período imperial, a triste constatação

Quadro 8
Curriculo do Colégio Pedro II - Decreto nº8051 de 25 de Março de 1881

Ano Escola r C omponentes curricula res

1º ano H istória Sagra da; Português; Noções de Geogr afi a; Aritmética e nome nclatura geométrica

2º ano POrtuguês; Francês; Latim; M atemáticas elementares

3º ano Português; Francês; Latim; Geografi a Física; Matemáticas elementares; Aritmética e Álgebra

4º ano Português; Inglês; L atim; Geogr afia e Cosmogr afi a; Matemáticas eleme ntares (geometria p lana e
do espaço e T rigonometria retilí nea)

5º ano Português; Inglês; L atim; História Geral; Física e Química

6º ano Alemão; Grego; História Natural e Hi gien e; Retórica, Poética e Literatura Nacio nal; Filoso fia

7º ano Italian o; A lemão; Grego; Português e História Literária; Filoso fia; Corogr afi a e
História do Bra sil

30
Genylt on od il o n r êgo da roc h a

é a de que as propostas inovadoras de Ruy ainda pelas primeiras décadas do novo regime
Barbosa e Januário Sabino ficaram ao largo das (republicano) que se implantara no país.
salas de aulas, o que bem demonstra a vitória No último programa prescrito (ver quadro
do conservadorismo, fato que iria se estender 9), ainda no antigo regime político, para o ensino

Quadro 9

orientação
componente CoNteúdo
metodológic a
curricul ar programático

Dar-se-ha mais desenvolvime nto ao


geogr aphi a 1- Terra, sua su perficie, seus movime ntos,
que disser respeito a América e
p rincipais circulos que nella se traçam para
pri ncipalmente a Meri dion al. Exame
localiz ar as terras e determinar as zonas thermaes.
intuitivo d e mappas muraes; desenho
2- Divisão das terras e do ocean o.
no quadro preto dos pormenores
3- C lima e sua influência sobre a distribuição dos
geog raphicos que abranger ca da
ve getaes e a nimaes pela su p erficie da terra.
ponto; viagen s simuladas para
Das ci nco grandes divisões das terras:
di ferentes partes, em que os
4- Mares, golfos, estreitos, seus accid entes physicos.
examinandos i ndiquem os acid entes
5- I lhas, seus acci dentes physicos.
physicos que pod em en contrar e as
6- Lagos, rios, lagunas, seus limites, suas dime nsões
curiosi dad es naturaes ou
e p osições.
artisticas notáveis.
7- Pop ulação absoluta e rel ativa. Governo e suas
p rincipaes formas. Confederação. E stados soberanos
e meio soberanos.
8- Divisão dos p ovos segundo seu d esenvolvime nto
moral e suas raças.
Dos principaes paízes do globo:
9- Posição, limites, superfície.
10- População, governo, religião.
11- Divisão, as pecto e clima.
12- Producção, commercio e ind ustria;
importancia politica.
13- Ci dades principaes.

Uso de espheras, problemas.


cosmogr afia 1- Universo. A stros, sua divisão e aglomeração em
grandes grupos ou nebulosas.
2- Estrellas, planetas, cometas, estrellas caden tes,
bolidos e aerolithos.
3- Systema de Ptolomeu e de Copernico.
4- Leis de Kepler.
5- Attração e repulsão.
6- Fig ura, rotação e revolução d a terra.
7- Círculos da es p hera.
8- Estações.
9- Posições da es phera e dias.
10- Lua.
11- Ecli pses.

CHOROGR APHI A DO BR AZIL


1- Limites do Brazil e sua posição astronomica.
2- Ethnographia e clima do Brazil.
3- Ilhas, estreitos e cabos principaes do Brazil.
4- B ahias e p ortos do Brazil.
5- S ystema orograp hico brazileiro.
- Systema hi drographico braz ileiro.
7- Produções naturaes do Brazil.

31
8- Industria, a gricultura, commercio e progresso
material do paiz .
9- S ystema de governo e a dmin istração do Estado
(militar, judiciario e eclesiastico).
10- Instituições e estatistica.
11- S y nopse da Constituição Política do Imperio
e C ód igo Criminal.
12- Colonização e catechese.
13- Provincia do Amazonas.
14- Provincia do Grão Pará.
15- Provi ncia do Maranhão.
16- Provincia do Piauhy.
17- Provincia do Ceará.
18- Provincia do Rio Grande do Norte.
19- Provincia da Parahyba.
20- Provincia de Pernambuco.
21- Provincia das Alagoas.
22- Provincia de Sergipe.
23- Provi ncia da Bahia.
24- Provi ncia do Es pirito Santo.
25- Municipio Neutro.
26- Provincia de S ão Paulo.
27- Provincia do Parana.
28- Provincia de Santa Catharina.
29- Provincia de São Pedro d o Rio Gra nde do Sul.
30- Provincia de Minas Geraes.
31- Provincia de Goya z.
32- Provincia de Mato Grosso.

secundário ministrado pelo Imperial Colégio de Através das prescrições legais


Pedro II, e que também seria utilizado para a implementadas durante o período imperial para o
realização dos exames gerais de preparatórios Colégio Pedro II, foi sendo moldado o ensino de
(datado de 1887), fica bastante clara a veracidade geografia, tornado gradativamente “tradição”, na
de nossa afirmação anterior, como podemos acepção de Hobsbawm. Durante todo o período
perceber: Permaneceu oficializado, como imperial, o ensino de geografia manteve-se quase
pudemos verificar, a visão enciclopédica, que totalmente inalterado. Tanto metodologias
mnemônica, a-científica e descritiva, reflexo do quanto conteúdos programáticos permaneceram
ensino assentado na nomenclatura geográfica. imutáveis no currículo prescrito oficialmente por
Seria somente na segunda década do século XX, décadas seguidas. No máximo, as diferentes
que substanciais mudanças ocorreriam com a legislações voltadas para dar organização ao
geografia escolar brasileira. ensino do Imperial Colégio de Pedro II promoveram
algumas mudanças superficiais a fim de melhor
conclusão reordenar o programa de ensino dando-lhe uma
feição mais coerente.
O ensino da geografia escolar no Brasil Durante o Século XIX, no Colégio Pedro
não teve no Colégio Pedro II o seu berço, II, legitimou-se uma geografia nomenclatura,
porém foi neste estabelecimento de ensino, por puramente mnemônica, abstrata posto distante da
intermédio de seus regulamentos, que ocorreu a realidade dos alunos, em si rotineira e mecânica,
sua institucionalização e consolidação enquanto verdadeiramente inútil e embrutecedora. Tornado
componente curricular obrigatório no Brasil. paradigma do ensino nacional, as prescrições

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para o Colégio foram seguidas nos Liceus das instrumento da liberdade, igualdade e fonte de moralidade pública, da
prosperidade do Estado e do progresso da humanidade. Os estudos
Províncias. Os livros nele adotados também o
científicos eram muito mais valorizados do que os literários; a direção
eram tornados oficiais em todo o país. geral do ensino era unificada. Como afirma Chizzotti “O plano de
A negação ao modelo de geografia Condorcet atendia aos ideais revolucionários que procurava dar à
França um vasto sistema de ensino popular que servisse a todos os
implementado e mantido no Brasil durante todo o
cidadãos” (1975, p. 58).
período imperial, só passou a sofrer críticas oficiais
quando as ideias cientificistas, fundamentadas no
positivismo, ganharam adeptos em uma nação que
se quis moderna. Somente em fins do XIX é que
debates oficiais se deram em torno da proposta
de se implantar nas salas de aulas brasileiras a
chamada geografia moderna, paradigma então
emergente no seio da ciência geografia e que,
segundo a historiografia hoje existente, só viria
se manifestar no Brasil nos anos 20 do século
passado.

Notas

¹ Na verdade estes Liceus provinciais nada mais eram do que aulas


avulsas que foram postas para funcionar em um mesmo prédio, sem
um mínimo de organicidade.

² Capel nos mostra que por conta do imenso fascínio despertado pelos
conhecimentos geográficos “Revistas como el ‘Journal de Voyages’
creada por Malte Brun en 1808, ‘La Tour du Monde’ o ‘lectures
Geographiques’ facilitaban al gran público ilustrado información sobre
países exóticos, y sobre los progresos de la colonización europea.
Obras monumentales de geografía universal, como la del danés
afincado en Francia, Malte-Brun, Précis de Géographie Universelle
(1810-1829), o la del italiano Adriano Balbi significaban importantes
esfuerzos de sistematización de los conocimientos geográficos de
los países de la Tierra” (1988, p. 111).

3
Quando da criação do Colégio Pedro II, vivia a França um processo
reacionário instaurado pelo Consulado e pelo Império (Governo de
Napoleão Bonaparte). No campo educacional, a lei de 1º de maio
de 1802 reduziu o ensino primário a mera escola de “ler, escrever
e contar”, além de que este nível de ensino passará a ser de total
responsabilidade das comunas. No que diz respeito ao ensino
secundário, foi restaurado o ensino das letras clássicas, passando
as ciências a terem apenas papel secundário. Somente para que
possamos comparar com o período anterior vivido pela educação
daquele país, as tendências realistas da educação revolucionária,
propunham, sobretudo no plano do Marques de Condorcet, a
educação como dever do Estado, sendo ela apontada como um

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O co l ég i o pedro II e a in stitu ci onali z ação da geogr afia escola r n o br asil i mpério

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CAPEL, Horácio. Filosofia y ciencia en la geografía contemporánea. 3ª ed. Barcelona: Barcanova, 1988.

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de Colégio de Pedro II, e outras disposições.

______. Regulamento nº 8 de 31 de janeiro de 1838. Contém os Estatutos para o Colégio de Pedro II.

______. Regulamento nº 62 de 1º de fevereiro de 1841. Altera algumas das disposições do Regulamento nº 8 de 31 de janeiro de 1838, que
contém os Estatutos do Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 1.331-A de 17 de fevereiro de 1854. Aprova regulamento para reforma do ensino primário e secundário no Município da
Côrte.

______. Decreto nº 1.556 de 17 de fevereiro de 1855. Aprova o regulamento do Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 2.006 de 24 de outubro de 1857. Aprova o regulamento para os colégios públicos de instrução secundária do Município da
Côrte.

______. Decreto nº 2.883 de 1º de fevereiro de 1862. Altera os regulamentos relativos ao curso de estudos do Imperial Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 4.468 de 1º de fevereiro de 1870. Altera os regulamentos relativos ao Imperial Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 6.130 de 1 de março de 1876. Altera os regulamentos do Imperial Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 8.051 de 25 de março de 1881. Altera os regulamentos do Imperial Colégio de Pedro II.

______. Decreto nº 981 de 8 de novembro de 1890. Aprova o regulamento da instrução primária e secundária do Distrito Federal.

______. Decreto nº 1.075 de 22 de novembro de 1890. Aprova o regulamento para o Ginásio Nacional.

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