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Cursos de Formação Inicial de Professores do Ensino Básico modelo variante, algo que
ESTRUTURA
Do mesmo modo que no capítulo anterior estruturámos a história do ensino das Artes
relevantes neste domínio, nomeadamente por Kenneth Zeichner, que, em 1983, publicou
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um artigo que marcaria para sempre a investigação em torno da formação de professores,
e por Carlos Marcelo García, que, em 1995, escreveu uma obra na qual reuniu as
docente e os perfis de professor a estes inerentes, apresentados por José Carlos Morgado,
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no livro onde relaciona Currículo e Profissionalidade Docente , que servem de
25
Kenneth Zeichner, “Alternative paradigms of teacher education”, in Journal of Teacher Education, vol. 34, n.º 3,
Maio/Junho de 1983, pp. 3-9.
26
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, Porto: Porto Editora, 1999. Original:
Carlos Marcelo García, Formación del profesorado para el cambio educativo, Barcelona: EUB, 1995.
27
José Carlos Morgado, Currículo e Profissionalidade Docente, Porto: Porto Editora, 2005.
28
sua formação, que dão características específicas à formação de professores» . Segundo
professor como um artífice, consistindo a formação dos futuros professores, vistos como
facilitado com a ajuda dos professores mais experientes, considerados como mestres.
para formar melhores professores, e de que quanto mais tempo o futuro professor dedicar a
estas práticas melhor será, é um mito, uma vez que depende muito do contexto em que
professor como um técnico que executa leis e princípios de ensino eficazes, previamente
concebidos e validados por especialistas, e regulados pelo Estado. A sua formação, assente
técnicas que o professor deve adquirir e aplicar de forma a garantir o sucesso do ensino.
28
Kenneth Zeichner, “Alternative paradigms of teacher education” In Journal of Teacher Education, vol. 34, n.º 3, p. 3
(tradução livre da autora).
válidas para qualquer situação. Cada professor e contexto educativo é único e irrepetível. A
consequências da sua acção educativa junto dos alunos, das escolas e da sociedade. O
pressuposto desta teoria é que, quanto maior for a consciência de um professor acerca das
origens e dos efeitos das suas acções, assim como das realidades que as constrangem,
espírito crítico sobre a sua prática e o contexto social e educativo em que ocorre.
paradigmas podem organizar-se segundo dois eixos: o eixo “apriorístico versus reflexivo”,
que se relaciona com o modo como o currículo da formação é concebido, e o eixo “certo
behaviorista apresentam um currículo previamente definido, que não sofre oscilações, isto
é, aquilo que o professor aprende é estável, enquanto que formações baseadas nos
àquilo que cada professor necessita de aprender de forma a alcançar um modo pessoal de
ensino (reflexivo).
Por outro lado, formações de professores que tomam como referência os paradigmas
Política e da Ética, que possibilite ao professor não só adaptar o seu ensino aos diferentes
contextos, mas também questioná-lo, agir e levar os seus alunos à acção, assim como
CERTO
TRADICIONAL-ARTESANAL PERSONALISTA
APRIORÍSTICO REFLEXIVO
PROBLEMÁTICO
Resta ressalvar que o paradigma académico é considerado por Zeichner como aparte
destes quatro paradigmas por si definidos, uma vez que numa perspectiva académica o
paradigma. Por fim, de acordo com Zeichner, e como veremos no caso português, os
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Kenneth Zeichner, “Alternative paradigms of teacher education”, in Journal of Teacher Education, vol. 34, n.º 3, p. 5.
30
crítica/social, a pessoal, a tecnológica, a prática e a académica , que Carlos Marcelo
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García , por sua vez, cinco anos mais tarde, completou , incluindo na tabela elaborada por
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aquele investigador, a perspectiva apresentada, em 1992, por Pérez Gómez .
30
Feiman-Nemser, “Teacher preparation: structural and conceptual alternatives”, in W. R. Houston (org.), Handbook of
Research on Teacher Education, Nova Iorque: Macmillan, 1990, p. 220.
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Carlos Marcelo Garcia é doutor em Ciências da Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Educação da
Universidade de Sevilha, onde desde 1988 é responsável pelas disciplinas da área da “Formação de Professores”, sendo
catedrático de “Didáctica e Organização Escolar. A sua investigação centra-se na formação de professores,
nomeadamente no período de iniciação ao ensino, e na avaliação de actividades realizadas nesse mesmo período.
32
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 33.
33
Pérez Gómez, “La función y formación del professor/a en la enseñanza”, in Gimeno Sacristán, Comprender y
transformar la enseñanza, pp. 398-429.
34
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 33.
35
Gómez , distingue duas abordagens: a enciclopédica, na qual o conhecimento do conteúdo
é valorizado face aos demais; e a compreensiva, na qual o professor não é visto como uma
matéria que ensina, como a sua história e epistemologia, e ainda os modos de ensinar essa
caracteriza, em geral, por «uma forte formação científica, claramente diferenciada de uma
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escassa, incompleta e breve formação pedagógica» , algo que também reconhecemos
como uma realidade no nosso país. Aliás, como salienta Bártolo Paiva Campos, em 2002, o
35
Pérez Gómez, “La función y formación del professor/a en la enseñanza”, in Gimeno Sacristán, Comprender y
transformar la enseñanza, p. 398.
36
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 34.
37
Idem, p. 33.
38
Bártolo Paiva Campos, Políticas de Formação de Profissionais de Ensino em Escolas Autónomas, p. 74.
que, assente num discurso pragmático, idealizava, através da aplicação dos conhecimentos
pedagogia por objectivos ou por competências, que emergiram, a nível internacional, nos
modelo que foi aplicado não só na formação de professores, mas também na dos mais
nesta perspectiva, os formandos são vistos como receptores passivos de princípios e leis
Logo, como refere José Carlos Morgado, em 2005, no que concerne à autonomia
falaciosa», uma vez que se trata de «uma visão tradicionalista de ensino, onde a
39
Donald Schön, El profesional reflexivo. Cómo piensam los profesionales cuando actúan, p. 31.
40
José Carlos Morgado, Currículo e Profissionalidade Docente, pp. 36-38.
(n. 1933) revela uma definição mais ampla do termo, uma vez que competência, para este
Segundo esta perspectiva, ensinar, mais do que uma técnica adquirida de fora para dentro,
formação de professores que seguem esta orientação, uma vez que se acredita que «o
próprio, melhor poderá recorrer às suas potencialidades, é a ideia que subjaz a esta
orientação que toma como único cada ser humano, e, logo, considera inconcebível a
por todos os professores, quando a sua formação assenta num modelo tecnológico. «O
pessoais de ensinar. Aliás, é esse mesmo o objectivo desta orientação, «já que não se trata
de ensinar o método mais eficaz a todos os professores em formação, mas o método mais
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eficaz em função das características pessoais de cada professor em formação» . Esta
41
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, pp. 35-36.
42
Idem, p. 37.
43
Idem, ibidem.
44
Idem, p. 38.
45
Idem, ibidem.
uma pessoa única, que se compreende a si própria e às relações que estabelece com o
mundo de modo positivo, e que funciona como um facilitador, demonstrando, por sua vez,
aptidão para identificar as características especiais dos seus próprios alunos, criando
professores orientados para o desenvolvimento pessoal, pelo que o autor apenas refere o
Professores esta orientação também nunca foi plenamente implementada, algo que poderá
normalização, tanto da formação como do ensino, algo que tem sido uma constante no
nosso país, e tem contribuído para uma abordagem racionalista e positivista do currículo,
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como refere José Carlos Morgado , em 2005. No entanto, e apesar deste não ter sido
cognitiva narrativa desenvolvida pelo último, do qual resultou a obra Educação Narrativa do
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Professor (2001), por nós já mencionada na introdução , uma vez que as “Teorias da
mestres ou na reflexão sobre a sua própria prática, consoante se trate de uma orientação
46
José Carlos Morgado, Currículo e Profissionalidade Docente, p. 111.
47
Vide pp. 13-14.
48
Pérez Gómez, “La función y formación del professor/a en la enseñanza”, in Gimeno Sacristán, Comprender y
transformar la enseñanza, pp. 398-429.
Na orientação prática de abordagem tradicional existe uma clara divisão entre teoria e
prática, uma vez que se entende que aprender a ser professor reside apenas na capacidade
de exercer uma prática, frequentemente desligada do que se aprendeu (ou não) em teoria.
Ao considerar-se que ensinar é o mesmo que exercer um ofício, acredita-se que aprender a
-se existir uma relação intrínseca, directamente proporcional, entre o período de observação
eficácia de ensino dos “novatos”, advoga-se que esta se prolongue o maior tempo possível.
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No entanto, como esclarece García, já em 1938, John Dewey se mostrava crítico
quanto a esta questão, ao frisar que experiência não significa necessariamente qualidade
de experiência, sendo que esta depende não só do grau de satisfação imediata do sujeito
que a vive, mas sobretudo das repercussões que tem em aprendizagens futuras. Nós
recordamos que foi Dewey que, pela primeira vez, defendeu que um ano ou trinta anos de
experiência de ensino podem significar o mesmo, uma vez que durante esses trinta anos o
professor pode manter as mesmas práticas, estagnar, isto é, não promover a mudança.
Para além disso, Marcelo García lembra que, implícita a esta abordagem tradicional
funções de formador ou orientador de estágio sem que para isso tenha desenvolvido
é bastante para “saber ensinar”, algo que considera extremamente grave, pois tem
Marcelo Garcia, esta abordagem é tão popular, hoje em dia, que «é difícil não encontrar
referências escritas sobre propostas de formação de professores que não [a] incluam, de
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John Dewey, Logic, the Theory of Inquiry, p. 27, cit. por Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma
mudança educativa, p. 40.
50
Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 41.
ensino reflexivo, no qual fosse comum a análise activa, constante e meticulosa das crenças
formar professores que fossem capazes de reflectir sobre as suas próprias práticas, algo
que viria a ser aprofundado e amplamente difundido por Donald Shön, que, a partir do início
base, em segundo a ciência aplicada e, por último, o estágio (o que revela uma hierarquia
Alarcão (1996), Shön colocou em causa a forma como, até então, se realizara a formação
objectiva, única, reside nos factos e dispensa a interpretação pessoal que destes fazem os
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sujeitos envolvidos em situações reais que, acentua, são questões problemáticas» , pelo
Artes Plásticas, da Música e da Dança, Shön reparou que, nestes casos, os alunos,
vendo-os sob diferentes pontos de vista, construindo soluções para cada caso, verificando a
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validade das soluções construídas» .
51
John Dewey, Logic, the Theory of Inquiry, p. 25, cit. por Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma
mudança educativa, p. 41.
52
Donald Shön, The Reflective Practitioner: How Professionals Think in Action, New York: Basic Books, 1983; Donald
Shön, Educating the Reflective Practitioner. Toward a Design for Teaching and Learning in the Professions, San
Francisco: Jossey Bass, 1987.
53
Isabel Alarcão, “Reflexão Crítica sobre o Pensamento de D. Shön e os Programas de Formação dos Professores”, in
Isabel Alarcão (org.), Formação Reflexiva de Professores: Estratégias de Supervisão, p. 22.
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Idem, ibidem.
substancial componente prática nos cursos de formação de professores, e salienta que esta
deverá ocorrer numa situação de reflective practicum, isto é, deve possibilitar o “aprender
«Num estágio deste tipo os alunos aprenderão a reflectir na acção e verão que a simples
aplicação da regra é insuficiente, desenvolverão novos raciocínios, novas maneiras de pensar,
de compreender, de agir e de equacionar os problemas. Os formadores chamarão a atenção
para zonas de indefinição e para a necessidade de se proceder à caracterização da situação.
Os formandos desenvolverão os seus esquemas de conhecimento e de acção de uma forma
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pessoalizada. Será uma estratégia formativa, construtiva, flexível, pessoal.»
tendência personalista, por ignorar que o acto educativo se enquadra num contexto social
mais abrangente, e por secundarizar a ciência aplicada. Contudo, como explica Isabel
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Alarcão , Shön não rejeita o valor desta forma de conhecimento, mas antes salienta que a
sua validade depende da articulação com a prática profissional, realizada em situações que
integrem a acção e a reflexão na acção, uma vez que estas constituem verdadeiras fontes
Esta centralidade na acção também foi alvo de crítica por autores como Weis e
Louden (1989), que defenderam que o pensamento reflexivo e a acção podem acontecer
biográficas assim como nos diários. Esta introspecção acontece, não só durante, mas
55
Isabel Alarcão, “Reflexão Crítica sobre o Pensamento de D. Shön e os Programas de Formação dos Professores”, in
Isabel Alarcão (org.), Formação Reflexiva de Professores: Estratégias de Supervisão, p. 25.
56
Idem, pp. 22-23.
57
Weis e Louden, “Images of Reflection”, Texto apresentado na Conferência Anual da American Educational Research
Association, 1989, cit. por Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 42.
pode ser realizado através de entrevistas, notas de campo, diários, cartas, escritos auto-
modo, uma possibilidade de mudança, algo para o qual os anteriores não concorrem tão
os pensamentos que acompanham os professores durante a sua acção educativa, que lhes
correspondendo mesmo à orientação para a indagação, defendida por Zeichner. «Do ponto
de vista social-reconstruccionista, a reflexão não pode ser concebida como uma mera
pelas suas acções. Deste modo, os conteúdos dos programas de formação orientados para
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Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 44.
práticas que as revelam, o professor que segue esta orientação irá modificar a sua acção
vale uma teoria, mesmo que crítica sobre a prática, se não coexistir uma acção educativa
que a materialize, apresentando novas soluções para aquela prática, assim como de nada
vale uma prática que não seja constantemente posta em causa por uma teoria crítica que
reconhecimento do valor da teoria crítica, por um lado, e do conhecimento tácito que advém
da prática, por outro, assim como da indispensabilidade de ambos, que advém o poder
vezes, à teoria crítica, o que pode justificar-se por ser «mais fácil visualizar o tipo de ensino
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que se recusa do que aquele que se procura» , pelo que o autor sugere uma articulação
teoria-prática que possibilite alcançar objectivos reais, opinião partilhada por Liston e
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Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 44.
60
Idem, p. 46.
61
Feiman-Nemser, “Teacher preparation: structural and conceptual alternatives”, in W. R. Houston (org.), Handbook of
Research on Teacher Education, Nova Iorque: Macmillan, 1990, p. 226, cit. por Carlos Marcelo García, Formação de
Professores: para uma mudança educativa, p. 46.
62
Liston e Zeichner, Formación del Profesorado y Condiciones Sociales de la Escolarización, Madrid, Morata, 1993, p.
189, cit. por Carlos Marcelo García, Formação de Professores: para uma mudança educativa, p. 46.