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A cultura

da conciliação
Em menos de cinco anos, o Setor de Conciliação do Fórum João Mendes Júnior supera
preconceitos para se tornar alternativa eficaz aos custos e à morosidade do Judiciário

Por Helder Júnior e Ana Paula de Deus

C
om mais de duas décadas de ex- duração aproximada de 40 minutos. correto para isso, com base em suas ex-
periência na magistratura, a juí- Somados aos cerca de 40 dias de prazo periências”, recorda-se a magistrada.
za Maria Lúcia Pizzotti Mendes para agendar a reunião, é possível findar O procedimento surtiu efeito rapi-
ainda não se acostumou com em pouco mais de 960 horas um litígio damente. Em cerca um ano, Maria
uma cena comum às audiên- que levaria anos no Judiciário. Sem a Lúcia Pizzotti conseguiu aumentar o
cias de conciliação que acompanha no necessidade de advogados (embora número de conciliadores de cerca de
Fórum João Mendes Júnior. Os litigantes não estejam proibidos de acompanhar 20 para mais de 200, total de audiências
chegam ao 21º dos 23 andares do prédio si- o caso) e restando ao juiz somente a in- diárias que o Setor de Conciliação re-
tuado no centro da cidade de São Paulo e cumbência de homologar a resolução. alizava. Foram 13.168 processos recebi-
encontram sala, mesa e cadeira diferentes Em caso de fracasso na conciliação, dos nesse período, com índice de 27%
das habitualmente utilizadas no trâmite apela-se para a ação comum. de acordos. No campo pré-processual,
processual. Entreolham-se e apresentam- Segundo Maria Lúcia Pizzotti, quase 75% da demanda foi resolvida
se em seguida: “Boa tarde, muito prazer”. no entanto, advogados e magistrados sem a necessidade de ação. Tamanha
Maria Lúcia, então, pensa com indigna- sentiram-se desprestigiados quando ela eficiência rendeu à coordenadora o II
ção: “Como assim ‘muito prazer’? Vocês implantou a inovação em São Paulo. Prêmio Innovare: O Judiciário do Século
estão litigando há anos e nunca sequer se “Desconfiar do novo faz parte da natu- XXI, na categoria juiz individual. “Isso
sentaram para conversar?” reza humana”, constata. “A resistência nos deu uma satisfação muito grande.
A revolta da juíza com as deficiências começou na magistratura, no momento Estávamos falando de uma premia-
do método convencional de resolução em que juízes não queriam delegar au- ção desenvolvida pelo Supremo, pelo
de conflitos impulsionou a idealização toridade a outras pessoas. Consideravam Ministério da Justiça, pelo CNJ, pela
do Setor de Conciliação do Fórum João a conciliação uma subtração de poder, FGV, todos instituições respeitadíssi-
Mendes Júnior, em 2004. Um provi- o que é uma visão tacanha e obtusa. A mas que reconheceram algo extraordi-
mento avalizou o projeto, importado segunda forte barreira partiu da OAB e nário. O nosso trabalho virou realida-
dos Estados Unidos, no dia 30 de agosto de alguns advogados, também preocu- de”, lembra-se com satisfação.
daquele ano. Menos de uma semana pados em perder espaço”, acrescenta. Para quem era cético, estava provada
depois, Maria Lúcia Pizzotti coordenou Enquanto trabalhava para convencer a eficácia daquele método alternativo
o primeiro dia de trabalho dos concilia- a comunidade jurídica e transformava de resolução de conflitos. Em março de
dores paulistanos. “Começamos em ca- desconfiança em apoio, Maria Lúcia 2005, o provimento nº 953 do Conselho
ráter experimental, até porque se tratava estruturava o Setor de Conciliação do Superior da Magistratura autorizou e
de um novo modelo alternativo para a Fórum João Mendes Júnior. Os então disciplinou a criação, instalação e fun-
Justiça, com mediadores e conciliadores juízes das 20ª, 22ª, 29ª, 32ª e 37ª Varas cionamento de setores de conciliação
ocupando uma posição que teoricamen- locais se interessaram pelo projeto e e de mediação nas comarcas e foros
te seria de juízes”, comenta. aceitaram abastecê-lo com processos, de de São Paulo. O que era experimental
Na conciliação, profissionais das maneira experimental. “Quando a gente se transformou em definitivo, e não só
mais diversas áreas de atuação condu- muda um paradigma, não se pode impor no Fórum João Mendes Júnior. “Hoje
zem uma tentativa de acordo entre as nada. Esses juízes aceitaram nos ajudar, já são mais de uma centena de setores
partes, antes ou depois da existência do escolhendo os litígios que achavam mais de conciliação espalhados por todo o
processo judicial, em audiência com fáceis de fazer conciliação, no estágio Estado”, sorri a pioneira Maria Lúcia.

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Para ser conciliador Maria Lúcia Pizzotti selecionou profis- vezes sem justificação acabam afastados conflitos. “Quanto antes um processo se fala. Em 15 anos, o envolvido pode ir procurar o Poder Judiciário. Ela é a ma-
Ao mesmo tempo que se empolga ao sionais com aptidão para a condução do sistema”, avisa o magistrado, menos terminar, menor será o prejuízo de uma à falência. A decisão judicial dá um fi- neira mais rápida e barata de resolver
contar o histórico do Setor de Concilia- desse procedimento. Inicialmente, seus falante em relação à sua antecessora. empresa. Por causa de uma execução, nal à história, mas não necessariamente uma questão. Fora isso, os juízes estão
ção do maior Fórum Cível da América voluntários adquiriam experiência como pode-se ficar com a imagem arranhada a resolve”, argumenta. muito sobrecarregados. Com o sucesso
Latina, com mais de 400.000 processos espectadores de audiências e aprendiam A aculturação do processo na praça, com os fornecedores, enfren- Por sua vez, Roberto Maia Filho pre- da conciliação, eles terão mais tempo
em andamento, Maria Lúcia Pizzotti se as diferenciações entre os métodos alter- Roberto Maia Filho era juiz do Fó- tar problemas trabalhistas, ver negada a ga o fim da cultura do processo para para analisar os casos em que manifes-
preocupa com as palestras que tem para nativos de resolução de conflitos. “Te- rum de Santo Amaro quando a con- participação em licitações. Dos proble- desafogar as pautas de seus colegas. “A tadamente não houve acordo”, conclui
proferir no mesmo dia. Coordenadora mos ações mais palpáveis para a conci- ciliação foi implementada no João mas para as pessoas físicas, então, nem conciliação é até obrigatória antes de se o magistrado.
dos cursos de formação de mediadores liação, como as de relações de consu- Mendes Júnior. “Sempre aplaudi essa
da Escola Paulista da Magistratura, a ju-
íza define a capacitação de atuais e fu-
turos conciliadores como fundamental
mo, danos morais, cobranças em geral e
questões de locação. Os condomínios, as
concessionárias de serviço elétrico e de
inovação. Tenho 20 anos de magistratu-
ra e trabalhei muito tempo nos Juizados
Especiais Cíveis, em que a conciliação
Caminho até a mediação
para o sucesso do sistema. telefonia e os bancos representam 65% é bastante exercitada. Isso desenvolve Que habilidades fizeram de um engenheiro eletrônico eadministrador de empresas um mediador de conflitos judiciais
“Os conciliadores são voluntários, dos processos na área cível. É razoável no juiz uma habilidade e um conheci- Por Ana Paula de Deus
mas você não pode selecioná-los sim- que se invista nesse campo, de litigantes mento para tentar fazer as partes chega-

J
plesmente porque estão com vontade tão repetitivos”, ensina a juíza. rem a um denominador comum”, diz. osé Pio Tamassia Santos, apesar de conta. Como administrador provisório, Pio de “administrador com perfil de media-
de fazer algo diferente. É preciso exigir O investimento também foi acentu- Com essa filosofia, o magistrado não ser formado em direito – cursou intervém, sob ordem de um juiz, em partes dor”, ou seja, alguém que não só resolva
o mínimo deles, dando alguma base ado no Direito de Família. Como a me- conseguiu manter o Setor de Concilia- engenharia eletrônica e administração específicas de um processo judicial. o conflito propriamente, mas que o faça
de conceitos teóricos, treinamento, diação era amplamente indicada nesses ção, o qual assumiu em setembro do de empresas –, vive constantemente en- acalmando a situação. “É isso que está
workshops, dinâmicas de grupo”, men- casos e havia necessidade de maior pri- ano passado, em constante moderniza- volvido com assuntos jurídicos – litígio, pe- O caso do condomínio interessando aos juízes e que é uma pos-
tições e sentenças são palavras usuais do Em outubro de 2007, Pio Tamassia foi tura nova porque a figura do interventor
ciona. “Eles devem ser pessoas muito ção após a saída de Maria Lúcia Pizzotti
Não foi apenas
seu vocabulário. Isso porque Pio tem um designado administrador provisório da existe desde o começo do Código [do Pro-
interessadas, abnegadas e com vontade da coordenadoria. “Nosso sistema pré- escritório de perícia judicial nas áreas de cesso Civil], mas o interventor que tenha
diretoria de um condomínio residencial
de mudar esse paradigma. Recebemos processual é todo informatizado. Temos
no Fórum João
sistemas de informação e telecomunica- de alto padrão em Campinas, a 90 km habilidade para mediar acalma as partes
psicólogos, engenheiros, dentistas, pro- dois anexos cuidando disso. Quando há ções, é membro de câmaras de arbitragem de São Paulo. Sua tarefa era conferir com e cria confiança”, explica. Por razão da
fessores, operadores do direito, enfim, um acordo, posso homologá-lo à distân-
Mendes Júnior que
e recentemente passou a mediar proces- os 1.500 condôminos se era necessário intervenção no condomínio, o número de
gente de todas as áreas”, complementa. cia, através da internet ou da intranet do sos judiciais. destituir a diretoria do conjunto residencial ações posteriores diminuiu e a nova dire-
No material de apoio a conciliadores
a cultura da Tribunal. As partes já imprimem suas Em 1993, após 17 anos na Ericsson e, caso sim, convocar os moradores para ção eleita foi formada por membros isentos
oferecido pelo Tribunal de Justiça de cópias na hora”, comenta. Telecomunicações, Tamassia foi convida- uma nova eleição. Pio só deixaria o con- dos problemas anteriores, as partes que

conciliação ganhou
São Paulo, são listados alguns dos deve- As estatísticas comprovam o cresci- do a trabalhar como perito judicial. “Os domínio quando uma nova direção fosse brigavam ficaram fora do processo, o que
res e métodos que lhes cabem em au- mento do setor. De setembro de 2004 até tribunais de Justiça estavam começando instituída. “Eram catorze membros mais o acalmou a comunidade.

corpo. O Poder
as primeiras ações na área de informática presidente na diretoria e eu fiquei sozinho
diências: estabelecer confiança; escutar março de 2009, segundo dados forneci-
e telecomunicações”, lembra-se, “ainda para administrar”, lembra-se. Transportadora
ativamente – deve-se deixar as pessoas dos pela diretora Helena Batista Segalla,
Judiciário passou
não existiam peritos para esses temas.” Dois pontos precisavam de solução: o A característica de “administrador com
falarem, sem interrompê-las antes de as Varas Cíveis já haviam remetido 65.129 Tempos depois, em 1995, ele passou a se perfil de mediador” de Tamassia foi posta
primeiro era que uma pequena parte dos
ouvir o que efetivamente pretendem processos ao 21º andar do João Mendes
a incentivar mutirões
interessar por arbitragem, movimento que moradores se interessava pelo que acon- à prova em outro caso, o de uma trans-
dizer; reconhecer sentimentos; fazer Júnior, com 36.693 audiências realizadas ainda engatinhava no Brasil, o que o fez tecia na administração do condomínio; o portadora em que havia um litígio entre
perguntas abertas (que não contenham e 7.172 acordos homologados (19,40%).
de acordos
buscar na Organização Mundial de Pro- segundo era o envolvimento emocional os sócios. Pio foi o segundo interventor no
atribuição de culpa); ser isento de julga- Os expedientes extraprocessuais foram priedade Intelectual-WIPO (World Intellec- dos condôminos mais ativos que tinham caso, o primeiro fora destituído pelo juiz
mentos e avaliações; separar as pessoas 21.476, sendo 7.020 audiências e 4.994 tual Property Organization) workshops de mais de 100 ações judiciais entre eles. Em pois tomara partido de uma das partes,
dos problemas; criar padrões objetivos; vacidade, Maria Lúcia desmembrou o acordos (71,14%). “Os índices de acordo treinamento para árbitros. A organização relação ao primeiro fato, a entrada de um causando ainda mais conflito. “Uma das
buscar nas partes a autonomia de vonta- Setor de Conciliação. “Assim que aca- são mais altos nos casos pré-processuais havia criado uma câmara para decidir interventor na diretoria já despertou o inte- definições básicas do mediador é ser equi-
controvérsias a respeito de nomes de do- resse dos moradores: Pio Tamassia lembra distante das partes, não tomar partido e ter
de; intervir com parcimônia; confiden- bou aquela coisa experimental, levamos porque o comparecimento na audiência
mínio .com e .org, registrados nos Estados que muitos procuraram por ele para saber a habilidade de entender os dois lados”.
cialidade; educar as partes para que re- esses processos para o 4° e 5° andar do não é obrigatório, embora recomen- Unidos e, em 2000, Tamassia tornou-se o que havia acontecido. Junto a isso, ele A intervenção judicial na transportadora
solvam conflitos; quebrar a polarização Fórum, onde estão as Varas de Família. dável. Isso não impede que o processo um dos cinco primeiros membros brasilei- aconteceu depois de 38 anos de existência
usou a revista interna do condomínio para
e humanizar o relacionamento. Esse campo é muito fértil e foi impor- continue a tramitar”, explica Maia Filho. ros da WIPO Atualmente são oito árbitros se comunicar com as pessoas e tratar das da empresa e foi desse ponto que Tamas-
Em geral, um conciliador inicia tante que se tornasse paralelo”, afirma. Não foi apenas no Fórum João Men- do país – sete advogados, apenas Pio é novas eleições. “Na revista eu dizia qual sia começou a mediar a situação. “Eles in-
uma audiência com uma apresentação Hoje o Setor de Conciliação Cível do des Júnior que a cultura da conciliação engenheiro. Hoje, além da WIPO, Pio Ta- era o meu papel ali, o que imaginava do ciaram do nada, com um caminhãozinho,
pessoal, explica as suas funções e as do João Mendes Júnior é coordenado por ganhou corpo. O Judiciário passou a massia é árbitro da Câmera de Mediação perfil dos novos candidatos e novas cha- era uma história de família da qual tentei
advogado e dá abertura para as partes se Roberto Maia Filho, juiz da 35ª Vara do incentivar com frequência mutirões de e Arbitragem de São Paulo (Fiesp) e da pas”, conta. “Achei que tinha de falar com resgatar os pontos positivos”, lembra-se.
pronunciarem passados cerca de cinco Fórum. Ele substitui interinamente Ri- acordos. Na última Semana Nacional Câmara de Arbitragem de São Paulo. todo mundo para ter uma eleição mais re- Na primeira rodada de conversas havia
minutos. Em seguida, investiga o con- cardo Cunha Chimenti, convocado para da Conciliação, de 1º a 5 de dezembro As atividades como perito judicial e presentativa. O resultado foi a participação mais de 30 pontos de conflitos entre os
árbitro não restringiram a trajetória de Ta- dos condôminos: por volta de 500 pessoas sócios; depois de certo tempo, apenas
flito em questão e orienta a discussão de atuar no Conselho Nacional de Justiça do ano passado, o Tribunal de Justiça de
massia; haveria mais, porém no terreno da votaram, o que nunca havia acontecido. quatro e, ao final da mediação, as partes
todas as possibilidades para solucioná- em Brasília, e está encarregado de mais São Paulo registrou um total de 41.797 mediação. “Com quinze anos de trabalho As eleições anteriores tinham contado pediram ao juiz que encerrasse o proces-
lo. Agiliza, por fim, a negociação de um de 250 conciliadores. “Temos toda uma pessoas atendidas, 21.562 audiências re- como perito judicial e todo esse processo de so, não havia mais litígio. “O interessante
com 80 votantes, no máximo.”
acordo, confeccionado para posterior escala de trabalho elaborada pelo cartó- alizadas e 9.001 acordos obtidos. 1995 para cá, em que venho me treinando O outro fato que requeria atenção era o é que os aspectos são jurídicos, técnicos,
homologação quando bem-sucedido. rio no 21º andar. Não há nenhum tipo de Feliz com os resultados atuais, Ma- como árbitro e mediador, adquiri conceitos nível de estresse dos que eram da antiga as decisões são de administração, mas o
De 2004 a 19 de março de 2008, data sanção caso o conciliador não possa cum- ria Lúcia Pizzotti lembra que o Judici- de Justiça, do direito, e os juízes acabaram administração ou questionavam a autori- maior mote do administrador com perfil de
em que deixou a coordenadoria do Setor pri-la algum dia, até porque ele é volun- ário não foi o único beneficiado pelos me dando uma atribuição nova nos últimos dade destes. Foi então que Tamassia tirou mediação é ‘o que consegue acalmar ou
de Conciliação do João Mendes Júnior, tário. Mas aqueles que faltam reiteradas métodos alternativos de resolução de quatro anos, a de administrador provisório”, da manga as técnicas do que ele chama redimensionar as emoções’”, conclui.

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