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Revista de informação

sobre desenvolvimento
agrícola e rural
nos países ACP
http://spore.cta.int

nÚmero ESPECIAL - JULHO 2012

Reforçar as ligações

O crescimento
das cadeias de
valor agrícolas
Sumário | nÚmero ESPECIAL - JULHO 2012 Reforçar as ligações
Após décadas de subinvestimento, existe
1 | UMA VISÃO actualmente um consenso geral em torno
da melhoria da produtividade agrícola e do
• Uma cadeia sem RUPTURAS 3 aumento dos rendimentos dos agricultores.
• Reportagem no Ruanda: café ao gosto dos clientes 6 Hoje, o crescimento da agricultura é
• A palavra aos especialistas: “Comunicação e coordenação”, reconhecido como essencial para a conquista
• com Andrew Shepherd 8 da segurança alimentar e nutricional, assim
• Reportagem no Senegal: da cabaça ao pacote industrial 9 como para o aumento da prosperidade.
• Entrevista: “A força do produto local”, com Aïssatou Diagne 10 Mas o aumento da produtividade constitui
apenas parte da solução. Os agricultores,
pastores e pescadores necessitam de ter
2 | UMA AVENTURA COLECTIVA mercado para aquilo que produzem. Além
disso, produzir e, em seguida, procurar mercado
• UNIÕES DE NEGÓCIOS 11
não é a melhor via para o crescimento. Os
• Reportagem em Trindade e Tobago: um corte superior a todos 13 produtores devem ajustar a sua produção, para
• Um concentrado organizado 14 fornecerem aquilo de que os consumidores
• A palavra aos especialistas: “O cliente tem sempre razão”, necessitam. As cadeias de valor, que ligam a
• com Stephen Mbithi 16 procura dos consumidores ao agricultor, são a
• Reportagem no Burquina Faso: caminhar lado a lado 17 melhor forma de integração dos agricultores
nos mercados modernos.
• Entrevista: “Valorizar os produtos locais”, com Bruno Gnidehoué 18
Seguindo esta linha, o CTA identificou a
melhoria das cadeias de valor na agricultura –
3 | ESCOLHAS ESTRATÉGICAS especialmente no caso dos produtores de
pequena escala – como uma das prioridades da
• APROVEITAR AS OPORTUNIDADES, MEDIR OS RISCOS 19
sua nova estratégia para 2011-2015.
• A noz-moscada sai reforçada 20 Esta Edição Especial da Esporo apresenta as
• Reportagem na Guiana: valorizar os produtos tradicionais 21 “cadeias de valor” aos nossos leitores dos
• Reportagem nas Fiji: as floristas mais fortes do que as inundações 22 Países ACP. O termo “cadeia de valor” é muitas
• A palavra aos especialistas:  “Do grão à chávena”, com Peter Batt 24 vezes utilizado com sentidos diferentes,
mesmo por especialistas no assunto. Tentamos
• Reportagem no Uganda: a qualidade compensa 25
esclarecer esta confusão e, sobretudo, fornecer
• Entrevista: “Avaliar as oportunidades”, com Don Seville 26 uma panorâmica geral das interessantes
inovações relativas às cadeias de valor nos

4 | UM CONTEXTO FAVORÁVEL países ACP.


Uma importante actividade em 2012 é a
• UMA VONTADE POLÍTICA 27 nossa conferência internacional “Reforçar
• Uma mão estendida 28 as ligações: cadeias de valor em benefício
• Reportagem na RD Congo: a formação, um elo indispensável 30 dos pequenos produtores agrícolas” a ter
lugar em Adis-Abeba, Etiópia, de 6 a 9 de
• A palavra aos especialistas:  “Empregos para o futuro”,
• com Josué Dioné 32 Novembro. Esperamos que a conferência
venha a oferecer uma excelente oportunidade
• Reportagem nas Fiji: aliança entre público e privado 33
para troca de experiências entre aqueles que
• Entrevista: “Normalização, a chave para novos mercados”, estão envolvidos em cadeias de valor. Entre
• com Patrick Ravoaraharison 34 os tópicos a discutir incluem-se as tendências
é uma revista bimestral do Centro Técnico de Cooperação Agrícola e Rural (CTA). O CTA rege-se mundiais do mercado; formas de inclusão dos
pelo Acordo de Cotonou entre o Grupo dos Países de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) pequenos agricultores nas cadeias de valor;
e a União Europeia, e é financiado pela UE. • EDITOR: CTA • Postbus 380 • 6700 AJ Wageningen, Países Baixos
• Tel.: +31 317 467 100 • Fax: +31 317 460 067 • E-mail: cta@cta.int • Site Web: www.cta.int • EDITOR‑CHEFE: agricultura contratual; agro-indústrias; finanças
Michael Hailu • CONSELHO EDITORIAL DO CTA: Thierry Doudet, Stéphane Gambier, Anne Legroscollard, Isolina Boto, das cadeias de valor; sustentabilidade; TIC;
Vincent Fautrel, José Filipe Fonseca, Krishan Bheenick, Andrew Shepherd • REDACÇÃO: Directora da redacção: organizações de agricultores e outros temas.
Marie‑Agnès  Leplaideur • Chefe de redacção da versão francesa e coordenadora: Anne Perrin • Syfia
International, 20 rue du Carré‑du‑Roi, 34000 Montpellier, França • Chefe de redacção da versão inglesa: Clare Para mais informações, visite o website da
Pedrick • Via dello Spagna 18, 06049 Spoleto (PG), Itália • Chefe de redacção da versão portuguesa: Conferência em
João de Azevedo, Sítio Alportel 20 A, 8150-014 S Brás de Alportel, Portugal • CORRESPONDENTES: M. Andriatiana
http://makingtheconnection.cta.int.
(Madagáscar), R. Gildharie (Guiana), G. Kamadi (Quénia), A. Nabwowe (Uganda), A. Nekwa Makwala (RD
Congo), V. Prasad (Fiji), J. Saizonou (Benim), N.-D. Salouka (Burquina Faso), M. Seck (Senegal), D. Tabureguci
(Fiji), A. Taitt (Barbados), A.-B. Twizeyimana (Ruanda) • COLABORADORES NESTE NÚMERO: J. Bodichon, J. Cessou,
Michael Hailu
L. Andahazy-Colo, L. de Araújo, Tradcatts, Trado Verso • DESIGN E EXECUÇÃO GRÁFICA: Intactile DESIGN, França • Director do CTA
IMPRESSÃO: Pure Impression, França • © CTA 2012 – ISSN 1011-0054 • FOTO DA CAPA: © Roland/ES-REPORTERS-Réa

2 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


1 | UMA VISÃO
Uma cadeia sem
rupturas
A maioria dos observadores concorda que as cadeias
de valor constituem uma estratégia útil, baseada no
© K. Robinson/Panos-réa

mercado. Todavia, o consenso é menor no que toca


ao seu significado e àquilo que elas visam atingir.

julho 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 3


1 | UMA VISÃO

N
os círculos agrícolas, o conceito de cadeia
Définir les de valor é cada vez
chaînes mais utilizado
Mariages para des-
d’affaires Opportunités Une volonté
de valeur crever estratégias que visam melhorar as et risques politique
perspectivas comerciais dos produtores e
aumentar as margens de lucro. Mas, o que é exac-
tamente uma cadeia de valor? Não é fácil definir um
termo originalmente cunhado para o sector indus-
trial. É mais simples começar por dizer o que uma
cadeia de valor não é. Uma cadeia de valor não é
constituída simplesmente por um agricultor que ven-
de a sua produção a um comprador, por mais sólida
que seja essa ligação comercial. Nem é a sequência
de produção e comercialização de um produto espe-
cífico como o café ou o cacau. Para muitos observa-
dores, a característica distintiva de uma cadeia de
valor reside em que todos os seus elos estão coor-
denados, ocorrendo um acréscimo de valor em cada
fase, tendo decisivamente na mira o mercado final.
Assim, se um comprador trabalha com um agricultor
na base de um acordo prévio sobre que tipo de pro-
duto é necessário fornecer a um certo tipo de con-
sumidor ou transformador, estamos na presença de
uma cadeia de valor. Nas Caraíbas, algumas iniciati-
vas puseram em contacto directo os agricultores com
os proprietários dos estabelecimentos turísticos, com
base numa definição prévia dos tipos de fruta e vege-
tais frescos necessários para os turistas,
incluindo em alguns casos a prestação Elos da cadeia
de apoio aos produtores. No âmbito de valor dos
pimentos de
desta Edição, a definição poderia ser Diffa (Níger)

GLOSSÁRIO a consumidores, por meio de um identificar quem são os actores-chave,


conjunto de actividades sequenciais como funciona a sequência e que
O significado de muitos termos
e coordenadas que acrescentam valor factores influenciam o desempenho
utilizados nesta edição,
em todas as suas fases (produção, da cadeia. Pode ser muito útil para
particularmente o termo cadeias de
transformação, distribuição). O identificar obstáculos em todas as
valor, é matéria de muita discussão.
conceito coloca a ênfase na inovação fases da cadeia, e apontar possíveis
Este glossário pretende ajudar os do produto e na satisfação das
leitores a entender as controvérsias. soluções.
necessidades do consumidor.
Note-se, porém, que muitas vezes Finanças da cadeia de valor
existem definições alternativas. Integração vertical
Serviços e produtos financeiros
Integração, na cadeia, de actividades
Cadeia de fornecimento que fluem para e/ou através dos
adicionais distintas daquelas que
Produção e entrega de um produto participantes da cadeia de valor.
caracterizam a operação central de
ou serviço final desde o fornecedor uma empresa. Por exemplo, um Agricultura contratual
dos fornecedores até ao cliente dos transformador de vegetais que começa Produção agrícola levada a cabo
clientes. A ênfase é posta no fluxo do a cultivá-los, ou que adquire uma segundo um acordo entre o
produto desde a fonte até ao destino. frota de camiões. comprador e os agricultores, que
Cadeia de valor Mapeamento da cadeia de estabelece as condições da produção
Actores ligados por uma cadeia para valor e comercialização dos produtos
produzir e fornecer bens e serviços Análise de uma cadeia de valor para agrícolas.

4 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


nomeadamente o fornecimento de insumos, servi-
ços financeiros, transporte, embalagem, pesquisa
Définir les chaînes
de mercado e publicidade. Os elosde da valeur
cadeia de
valor podem ser constituídos por fornecedores de
insumos, agricultores, transformadores, embala-
dores, distribuidores e retalhistas – afinal todos os
elos na sequência entre a génese de um produto e
o seu caminho até ao consumidor.

As cadeias de valor eficazes geram lucro


O desenvolvimento das cadeias de valor está
a ser imposto activamente como resposta aos
problemas de baixo rendimento dos produtores,
difícil acesso ao mercado e, mesmo, segurança
alimentar. Mas é importante não esquecer que,
independentemente dos benefícios, o princípio
orientador de uma cadeia de valor é a realização
de lucro. As cadeias de valor coordenadas repre-
sentam ainda apenas uma parte do produto agrí-
cola total nos países ACP. O grosso da produção
ainda é produzida especulativamente, por agri-
cultores que não estão certos se serão capazes
de a vender por preços compensadores na altura
das colheitas. As cadeias de valor agrícolas não
se limitam às culturas alimentares. Uma cadeia
de valor de forragem desenvolvida na Etiópia
© Fotos: P. Delmas

permitiu aos agricultores mais do que a criação


de gado de melhor qualidade; permitiu também
uma fonte adicional de receitas, dado que os
agricultores venderam o excedente da forragem
a outros criadores.
mais ou menos esta: uma cadeia de valor é uma
As cadeias de valor podem ter diversas formas
sequência orientada pela procura do consumidor e
e dimensões. Ao nível mais básico, uma cadeia
caracterizada por um aumento de valor e coordena-
pode envolver um líder agricultor que coordena o
ção em cada fase da produção, transformação e dis-
fornecimento a um comprador, como por exemplo
tribuição. Ela integra uma gama de funções de apoio,
um supermercado, e que age como ponto focal de
outros elos do processo de produção e comercia-
lização. As grandes cadeias podem representar
Ciclo de projecto também um bom potencial para os pequenos pro-
de uma cadeia de valor
Escolha da cadeia de valor dutores. No Quénia, a Brookside Dairies fornece
750.000 litros de leite por dia com base numa rede
de 100.000 produtores de lacticínios. A maneira
como a cadeia está organizada, com cada elo so-
© Intactile Design. Fonte http://tinyurl.com/7muaczb

Monitorização Análise da
e avaliação cadeia de valor
lidamente ligado ao seguinte, permite-lhe oferecer
oportunidades interessantes aos pequenos produ-
tores na ponta mais remota da cadeia.
COMPETITIVIDADE

Mercados domésticos e regionais


Embora mais referido no contexto das cadeias
dos supermercados europeus, o desenvolvimento
de cadeias de valor não é exclusivamente orien-
Concepção e tado para a exportação. Os mercados domésticos
implementação Estratégia de
competitividade
e regionais, alimentados por uma rápida urba-
nização e uma classe média em crescimento,

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 5


1 | UMA VISÃO

são da máxima importância. O Banco Africano Na região de Kwazulu Natal, na África do Sul, esta
Définir les chaînes estima
de Desenvolvimento Mariages d’affaires
que, por volta de 2060, estratégia trouxe dividendosUne
Opportunités volonté
quando se concluiu que
de haverá
valeurum bilião de africanos de classe média. No ethavia uma forte procura de politique
risques tomate chucha por parte
Uganda, a urbanização teve um enorme impacto no
sector de lacticínios, triplicando o mercado dos pe-
quenos produtores. As classes médias dos países em
“Todos os elos da cadeia podem
desenvolvimento consomem mais carne e derivados beneficiar com a adição de valor”
do leite, assim como alimentos prontos para o con-
sumo, saladas preparadas e sumos de fruta frescos. da comunidade indiana de Durban. Foi elaborado um
As sofisticadas cadeias de valor de exportação têm plano e, quando a cadeia se estabeleceu, os produto-
frequentemente mais dificuldade em penetrar neste res beneficiaram de um aumento de receitas da ordem
mercado do que os produtores domésticos, mesmo dos 400%.
em termos de padronização. O valor pode ser atribuído, ou aumentado, por meio
As cadeias de valor bem-sucedidas são orientadas da melhoria da qualidade do produto, através de me-
por informações relativas às exigências dos consumi- lhores sementes, insumos ou gestão pós-colheita no
dores, muitas vezes por meio de pesquisas de mercado. caso das culturas alimentares, ou melhor qualidade

reportageM
Ruanda
Café ao gosto dos clientes
campanha agrícola”, conta-nos. Pouco tratada em estações de lavagem
tempo antes quase que arrancara todas construídas pelo Estado e por
as suas plantas de café, desanimado investidores privados. Hoje em dia a
com os baixos preços de compra! A partir despolpagem, triagem, fermentação,
de 2004, a Starbucks Coffee Company, secagem e ensacamento fazem-se
uma empresa americana especializada nestas estações e não nas plantações
na comercialização de café, com mais dos produtores. “Estas unidades de
de 20.000 cafés no mundo, fez acordos lavagem não só contribuíram para o
com o Governo ruandês e os produtores melhoramento da qualidade do café e
da cooperativa Dukunde Kawa. A o aumento do seu preço de venda no
© A.-B. Twizeyimana

Starbucks compra café de alta qualidade mercado mundial, mas também criaram
a um preço de “comércio justo” e cerca de 4000 empregos”, estima um
ajuda os agricultores a melhorarem e agrónomo do Ministério da Agricultura e
aumentarem a sua produção. Concede dos Recursos Animais.
empréstimos à cooperativa, que Todos os anos, provadores nacionais
O Ruanda apostou tudo na fornece fertilizantes e pesticidas aos e internacionais provam estes cafés,
qualidade do seu café, para cafeicultores, que eles reembolsam premiando os melhores. Este “prémio
agradar às empresas exigentes, após a venda das colheitas. Graças a de excelência” promove a qualidade
como a Starbucks e os seus uma angariação de fundos feita pelos do café ruandês à escala internacional.
clientes, e vender a um preço empregados da empresa, os produtores Em 2011, os cinco primeiros produtores
mais alto. E ganhou a aposta. receberam vacas que darão estrume receberam conselhos para melhor
para os seus cafezeiros. Aprenderam comercializar o seu café, além de ajuda
Este cafeicultor do Norte de Ruanda
também as técnicas adequadas para em material (enxadas, etc.). Pelo seu
passa os dias a mimar os seus 8000 pés
colher à mão as bagas de café, quando lado, a cada três meses, a Starbucks
de café, que lhe garantem um
bem maduras. apresenta nas suas lojas uma promoção
rendimento miraculoso: “Nos últimos
O Governo ruandês incitou os especial do melhor café ruandês. Junto
5 anos, com a ajuda da Starbucks,
produtores de café do país a dos seus clientes ingleses, a empresa
pude aumentar e tratar bem da minha
melhorarem a qualidade do seu publicitava recentemente “um néctar a
plantação. Agora ganho entre 600 a
café. Quase toda a produção dos redescobrir”…
800 mil RWF (entre 800 e 1000 €) por
500.000 cafeicultores do país é agora Albert-Baudouin Twizeyimana

6 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


de forragem para o gado. A qualidade superior ob- concebida de propósito para o destino final, o mesmo
tém preços mais elevados. A adição de valor pode tam- Définir
acontecendo com os padrões de qualidade les chaînes
a satisfazer.
bém ser conseguida por meio de maior eficiência, com
de valeur
O planeamento é a chave, com atenção extrema
uma logística melhorada, especialmente nos transpor- aos detalhes. É essencial a comunicação entre todos
tes. Pode simplesmente tratar-se da questão de levar o os elos da cadeia uma vez que, se um dos elos falha,
produto de um local para outro, talvez para um local toda a cadeia será afectada. Os gestores do projecto
onde esse produto não esteja facilmente disponível. da Organização Internacional do Trabalho sobre as ca-
Por exemplo, levar hortaliças tradicionais para o espa-
ço urbano ou frutas tropicais para os consumidores na
As três características principais de uma
Europa. Outras maneiras de acrescentar valor podem
cadeia de valor são:
ser uma melhor apresentação e a preparação, e a in-
▪ coordenação de todos os elos
trodução de sistemas de classificação.
da cadeia,
▪ valor acrescentado em cada fase, e
Planear o futuro
▪ estratégia orientada pelo mercado,
As cadeias de valor são uma estratégia de criação de
respondendo à procura do consumidor
receitas com importantes repercussões para ampliar
aos níveis local, nacional e
o alcance da agricultura, mas também para atrair os
internacional.
jovens ao sector rural – ou dissuadi-los de o abando-
nar. Esta estratégia também poderá desempenhar um
papel na melhoria das condições sociais e de traba- deias de valor em Madagáscar verificaram que alguns
lho, combatendo o desemprego, os salários baixos e a actores nunca se tinham encontrado, e portanto junta-
insegurança alimentar. As cadeias de valor regionais ram-nos para discutir problemas comuns e encontrar
podem ser essenciais no combate à necessidade de im- soluções.
portações maciças. Embora algumas cadeias de valor sejam estabele-
O facto de as cadeias de valor serem orientadas pelo cidas com ajuda externa, é importante que em últi-
mercado significa que a utilização final dita todas as ma instância elas sejam capazes de avançar por si
fases precedentes. Se se cultiva fruta para exportação, próprias. As companhias líderes podem constituir
é importante que seja uma variedade popular no seio a força motriz, como no caso da Maldeco Fisheries
dos consumidores do país onde essa fruta será ven- do Malawi, que desenvolveu um plano de negócios
dida. Tal poderá afectar o gosto, a cor e a suculência para produzir peixe chambo inteiro e em filetes, com
da variedade plantada. A fruta tem de ser colhida an- o envolvimento de pescadores de pequena escala.
tes daquela que se destina aos mercados domésticos, Além de estabelecer infra-estruturas de aquacultura
uma vez que os tempos de viagem serão maiores. As e de criar novo valor por meio da diferenciação do
técnicas de transformação tam- produto, a Maldeco investiu em formação técnica no
As principais etapas de bém poderão ser diferentes. A estrangeiro para promover a cultura sustentável do
uma cadeia de valor embalagem poderá ter de ser peixe.

© Intactile Design. Fonte ICRA (www.icra-edu.org)

$ $$ $$$ $$$$
JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 7
A palavra aos especialistas
1 | Les défis

Définir les chaînes Mariages d’affaires


Opportunités Une volonté
de valeur ANDREW SHEPHERD
et risques politique

Comunicação e coordenação
As cadeias de valor são empreendimentos comerciais e os
agricultores mais pobres podem encontrar dificuldades em participar
© CTA

nelas se não beneficiarem de ajuda externa. A confiança e a


Andrew Shepherd
passou a maior parte coordenação são elementos chave para todos os elos da cadeia,
da sua carreira na
comercialização agrícola
mas o estabelecimento de relações de negócio sólidas leva tempo
e no desenvolvimento de e requer muito trabalho.
cadeias de valor. Depois
de ter trabalhado na
Papuásia- Nova Guiné
insumos não quererão trabalhar em áreas os erros e procura novas alternativas. Por
Podem as
e em Tonga, juntou-se rurais onde existe corrupção ou demasia- exemplo, uma empresa de algodão que vi-
cadeias de valor
à FAO, reformando-se da burocracia. Algumas das vulnerabilida- sitei no Uganda mudou três vezes a sua
em 2011 para integrar
ser adaptadas
des dos agricultores pobres podem muitas ligação com os agricultores antes de en-
o CTA. Ao todo, visitou aos pobres?
vezes ser resolvidas por meio de soluções contrar a estratégia adequada.
38 países ACP. Na verdade, isso
de agricultura contratual.
depende da sua de- A certificação constitui um problema
finição de ‘pobre’. Claramente, as cadeias Relativamente a esse tema, você foi para os agricultores ACP?
de valor modernas não constituem respos- co-autor de um livro sobre agricultura A certificação de acordo com os padrões
ta para os problemas dos mais pobres. As contratual 1. Porque acha que este ocidentais pode ser muito cara. Em certa
pessoas que não estão previamente envol- modelo de negócios é válido? medida, esses custos têm sido ocultados
vidas na produção para venda têm poucas Ao estabelecerem acordos com as empre- pelo apoio de doadores que ajudam a
possibilidades de satisfazer as exigências sas, os agricultores podem evitar alguns acreditação dos agricultores, mas a cer-
das cadeias comerciais. Podem estar de- dos problemas que referi. As empresas tificação não é um acto isolado. De tem-
masiado afastadas das estradas principais, podem fornecer insumos ou apoio de pos a tempos é necessário re-certificar. Há
ter muito pouca terra, não ter uma educa- extensão, e mesmo levar a cabo a prepa- evidência de que o número de pequenos
ção suficiente para serem capazes de sope- ração da terra. Muitas vezes elas garan- agricultores que fornecem os mercados
sar as exigências dos compradores, e ter tem mesmo o transporte dos produtos. A governados pelo sistema de certificação
poucos ou nenhuns recursos financeiros vantagem das empresas é que elas conse- está a declinar. Mas nem todos os mer-
para melhorar a produção. guem assim um fornecimento mais fiável cados internacionais exigem certificação,
e podem especificar as variedades de que o mesmo acontecendo com os mercados
Então, de que maneira os pobres
necessitam. Mas a agricultura contratual domésticos.
podem ser incluídos?
não está ao alcance de qualquer um. Ela
As cadeias de valor não são empreendi- Quais são alguns dos pré-requisitos
exige vontade de honrar os compromis-
mentos de caridade. Para poderem ser do sucesso?
sos, entregar os produtos na altura ade-
sustentáveis elas têm de ser lucrativas: As cadeias de valor bem-sucedidas en-
quada, e resistir à tentação de vender a
a decisão sobre quais agricultores incluir volvem a colaboração entre todos os elos
outros compradores. É importante que a
deve basear-se em critérios comerciais. da cadeia. Os agricultores e os compra-
confiança se estabeleça entre agriculto-
Assim, a inclusão dos muito pobres nas dores do produto têm de trabalhar em
res e empresas, e isto leva tempo e exige
cadeias de valor requer apoio governa- conjunto para assegurar que os produtos
trabalho árduo. Muitas vezes critica-se a
mental. Isto não significa subsidiar os adequados são produzidos em quantida-
agricultura contratual alegando que faz
agricultores, mas sim melhorar a sua via- des suficientes e no tempo certo. Da mes-
dos agricultores assalariados na sua pró-
bilidade comercial. A melhoria da edu- ma maneira, aqueles que compram aos
pria terra. Mas o facto é que os que se
cação, o fornecimento de mais acessos agricultores têm de colaborar com os seus
envolvem nesse sistema conseguem me-
a serviços de extensão e melhores infra- clientes para satisfazerem as necessida-
lhores resultados do que a maioria dos
-estruturas, particularmente estradas, po- des de consumo e minimizarem os custos.
outros agricultores.
dem, com o tempo, tornar os agricultores Quanto mais todos os elementos da cadeia
mais pobres mais atractivos aos olhos das As cadeias de valor falarem uns com os outros, mais viável se
empresas comerciais. É também essen- também fracassam? torna a colaboração.
cial que fique garantido um ambiente no Muitas vezes! Mas o sector privado tem 1
Contract Farming: Partnerships for Growth
qual os negócios rurais possam ser bem- uma grande capacidade de resistência. Se De C. Eaton e A. W. Shepherd, FAO
-sucedidos. As empresas fornecedoras de alguma coisa não funciona, aprende com http://tinyurl.com/d8aotca

8 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


REPORTAGEM
1 | Les défis

Définir les chaînes


SENEGAL de valeur

Leite local: da cabaça


ao pacote industrial
Graças à parceria com a empresa Laiterie du berger (Leitaria
do Pastor), os criadores de gado de Richard Toll reencontram
a esperança com a certeza de venderem o seu leite. Em
Saint-Louis e Dakar, as populações deleitam-se com os
© M. Seck

produtos rotulados “Bom para mim, bom para o meu país”.


Neste início de Abril, a atmosfera é bastante satisfeitos, alguns criadores de higiene e de normas sanitárias. Em
poeirenta em Richard Toll (375 km a norte entrevistados na fábrica contestam o seguida, é fermentado e pasteurizado. É
do Dakar, Senegal), zona açucareira e preço. “Sinto-me contente com a fábrica colocado em pacotes de 90, 225 e 400 g,
agrossilvipastoril do vale do rio. É aqui, que alimenta as nossas vacas, que são a vendidos respectivamente por 100, 250 e
no bairro Thiabakh que a fábrica Laiterie nossa riqueza, mas o preço de compra do 400 francos CFA”, conta B. Lobry. Além
du berger (LDB) se encontra instalada leite é baixo e gostaríamos que passasse destes pacotes de leite muito apreciados
desde 2005. Para produzir o seu leite para 500 Francos CFA por litro durante pelas crianças, são comercializados outros
“Dolima” (“Dá-me mais” em wolof), todo o ano”, defende um jovem criador. produtos: o thiackry, uma mistura de leite
assina contratos de compra com os Um operário da LDB reconhece que este coalhado e de cuscuz apreciada pelos
criadores que lhe fornecem o leite saído preço de compra é baixo mas explica aos consumidores, e o iogurte natural ou de
directamente da vaca. Em contrapartida, criadores que a fábrica suporta o custo do baunilha. A LDB tem por objectivo chegar a
a LDB assegura o fornecimento de ração transporte que vai até às aldeias remotas um abastecimento adequado das aldeias
para o gado por meio de outra parceira, recolher o ouro branco. em grande crescimento. Para o director da
a Companhia Açucareira Senegalesa (CSS), No Senegal, a produção leiteira é de produção, Malick Cissé, a fábrica posiciona-
o gigante industrial de Richard Toll. 120 milhões de litros/ano, para cerca -se cada vez melhor nos mercados do
Nesta parceria em que todos lucram, os de 3,1 milhões de bovinos, segundo Dakar e de Saint-Louis onde os seus
criadores não escondem a sua satisfação. o Instituto Senegalês de Investigação produtos são vendidos a uma população
É o caso de Silèye Mbaye Bâ. Da aldeia Agrícola (ISRA). Mas a grande maioria urbana sensível à mensagem do “consumir
de Yéeyri, (a 25 km de Richard Toll), da população consome leite em pó local”: “Bom para mim, bom para o meu
Silèye possui 45 vacas seguidas pela LDB: importado da Europa (equivalente a país”. Esta é amplamente transmitida por
“Vim buscar as minhas três toneladas 240.000 t em leite) e transformado de um marketing eficaz – spots publicitários
de alimentos (bagaço de amendoim, modo artesanal em leite coalhado, animados por uma estrela da televisão
palha de cana-de-açúcar, farelo de vendido a granel. “Estes criadores senegalesa com uma música de Ismael
arroz, luzerna, etc.). É a quota que me fornecem-nos leite fresco produzido no Lo, produtos com as cores do Senegal –
reserva a fábrica no contrato assinado Senegal que nós transformamos para realizado com o apoio da especialista em
após negociação”. Durante todo o ano e oferecer uma resposta adaptada à procura social business, a Danone Communities.
até à estação seca, na qual os custos de dos consumidores”, explica Bruno Lobry, Existe ainda o projecto ‘’leite na escola”,
alimentação são mais elevados, o criador o director industrial que entrevistámos levado a cabo com certas escolas do Dakar
não paga nem o alimento do gado, nem no seu escritório sobriamente mobilado. para combater a subnutrição infantil.
o acompanhamento profiláctico para as Em seguida, acrescenta: “Organizamos À entrada da LDB, na loja da fábrica pintada
vacas. Em contrapartida, vende o seu leite jornadas de intercâmbios com os criadores de verde e decorada com um alegre pastor,
fresco à LDB a 200 francos CFA/litro durante para conhecer os problemas relacionados o novo vendedor, o jovem Pap’ Diao,
todo o ano, sendo o preço médio no com a cadeia de valor: saúde dos animais, regozija-se pelo seu contrato com um
mercado local informal de 700 Francos CFA. preço do leite, formação em estabulação, salário de cerca de 90.000 francos CFA/mês
“Todos os dias forneço à fábrica cinco alfabetização, etc.” (cerca de 150 €). “Desejo manter o meu
baldes de leite [de 18 litros: Nota do Editor] Todos os dias, as carrinhas isotérmicas emprego para sustentar a minha família”,
provenientes das minhas vacas”, indica ele. desta pequena fábrica de 40 pessoas afirma. A fábrica acaba também de recrutar
Como Silèye, há 200 criadores com percorrem as aldeias, num raio de 100 km, dois novos quadros: um veterinário
contrato com a LDB, que lhes garante a para recolher o leite. “O leite recolhido senegalês e um engenheiro expatriado.
compra do seu leite. Embora se sintam passa por controlos rigorosos em matéria Madieng Seck

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 9


UM CASO EXEMPLAR

ENTREVISTA
Définir les chaînes Mariages d’affaires Une volonté
A força do produto local
Opportunités
de valeur et risques politique disso beneficiou da introdução de
cereais locais no fabrico de pão, visando
A Associação de diminuir os custos com o trigo importado
1998) para mais de 100.000 actualmente.
Transformação (450.000 t/ano). Também ganhámos
de Cereais Locais Como está organizada a Associação e concursos com padarias que procuram
© M. Seck

(ATCL) no Senegal quais os seus principais parceiros? milho-miúdo e milho de qualidade.


fornece a maior A associação conta com 24 membros, O pão “doolée” (“a força” em wolof)
Discreta e parte de cereais profissionais de transformação de cereais contribuiu para colocar o milho-miúdo e
trabalhadora, locais transformados locais (milho-miúdo, milho, sorgo, o milho nos 2.º e 3.º lugares dos cereais
Aïssatou Diagne, no país, mais de arroz local, fónio) em farinha, sêmola mais consumidos no Senegal (estudo da
mais conhecida pelo
nome de Madame
100.000 toneladas e granulados embalados em caixas USAID/PCE em 2011).
Dème, é presidente por ano. Uma cadeia ou sacos, vendidos no mercado. Cada Com a abordagem cadeia de valor,
da Associação de de valor em plena membro possui a sua própria unidade apostamos nas sinergias entre os nossos
Transformação de expansão, após anos de transformação e trabalha por conta membros para levá-los a desenvolver a
Cereais Locais no de hesitações. Mas própria. Os nossos principais parceiros são qualidade e a competitividade das suas
Senegal, desde 1998.
soube adaptar-se às os produtores de cereais com quem a ATCL empresas. Os resultados estão à vista: em
novas necessidades assina contratos de compra de produção e Fevereiro de 2012 a Associação vendeu a
dos consumidores e avança para os distribuidores, entre os quais europeus um distribuidor italiano, para exportação,
os mercados internacionais. que fazem negócio em África. Os contratos um contentor de 30 toneladas de
com os produtores são estabelecidos no cereais locais transformados, por
Qual é a missão da Associação de
quadro do programa “Iniciativa Milho- 10 milhões de FCFA (mais de 15.000 €).
Transformação de Cereais Locais (ATCL)
-Miúdo e Sorgo” financiado pelo FIDA, Em 2011 foi organizada uma operação
em relação à cadeia de valor de
sendo atribuídos bónus pela qualidade semelhante com um comerciante
cereais locais no Senegal?
dos cereais e regularidade das entregas senegalês estabelecido em França, no
A ATCL tem o objectivo de resolver os
na sede da ATCL em Dakar. Também temos valor de 17,5 milhões de FCFA (cerca
problemas de transformação e de
parcerias com ONG e organismos de ajuda de 26.000 €). Os membros da ATCL
comercialização dos cereais locais, de
ao desenvolvimento, como a USAID. trabalharam em conjunto, a uma só voz.
modo a melhorar a segurança alimentar,
Esta solidariedade permitiu-nos alcançar
lutar contra a pobreza através da criação Qual é a contribuição da ATCL para
bons resultados, embora reconheçamos
de empregos, sobretudo para as mulheres, a segurança alimentar e para o
que tivemos dificuldades. Com efeito,
que predominam neste sector. A ATCL desenvolvimento económico do país?
apesar da nossa determinação em
responde a concursos e junta as forças Ao colocar à disposição dos consumidores
permanecer na cadeia de valor, pode
dos seus membros para a execução dos senegaleses farinhas de cereais locais
acontecer que seja necessário cancelar
contratos. Hoje em dia assegura a maior em quantidade e qualidade suficientes
uma operação caso se detecte que o
parte da transformação dos cereais locais para fabricar pratos locais cada vez mais
milho-miúdo não é de qualidade ou se
vendidos no Senegal e regista resultados procurados - cuscuz, papas, pastéis - a
os produtores não cumprirem o contrato.
impressionantes: de 10.000 toneladas ATCL contribuiu bastante para o aumento
processadas no início da associação (em do consumo de cereais locais. Para além Entrevista conduzida por: Madieng Seck

Regoverning Markets Value Chain Approach to Poverty


Para mais informações www.regoverningmarkets.org Reduction and Development of
Chain-Wide Learning for Inclusive Agrifood Livelihoods
FAO Market Development
Linking Farmers to Markets Um guia para os actores dos múltiplos Sítio Web dedicado às cadeias de valor
processos que ligam os produtores de agrícolas.
http://tinyurl.com/7j97z4a
pequena escala aos mercados modernos. http://goo.gl/3UVBv
ILO http://tinyurl.com/55dnfe
Banco Mundial
Organização Internacional do Trabalho – Building Competitiveness in Africa’s
Desenvolvimento de cadeias de valor Technoserve
Agriculture: A Guide to Value Chain Concepts
www.technoserve.org
http://tinyurl.com/7jnkkxh and Applications

Value Chain Development for UNIDO/3ADI http://tinyurl.com/7gu2hfj


Accelerated Agribusiness and Agro-Industry Using Value Chain Approaches in Agribusiness
Decent Work Development Initiative and Agriculture
http://tinyurl.com/7qr2cjd www.3adi.org http://tinyurl.com/868epxd

10 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


2 | UMA AVENTURA COLECTIVA

Uniões de negócios
Conhecer os gostos do cliente, adicionar valor…
É o que os produtores devem fazer para convencer
os consumidores a aceitarem os seus produtos.
Podem, por vezes, até dar um pequeno passo em
frente para se aproximarem deles, mas devem evitar
© IRD/O. Barrière

sempre, submeterem-se a todos os seus caprichos.

julho 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 11


2 | UMA AVENTURA COLECTIVA

T
êm um ar suculento estes abacates, gran-
Mariagesdes, brilhantes, bem
d’affaires maduros… No en-
Opportunités Une volonté
tanto, nenhum consumidor
et risqueseuropeu os politique
compraria. Isso é surpreendente para um
produtor de um país africano, habituado a levar os
seus frutos para o mercado mais próximo, onde são
muito apreciados. O facto é que ele não conhece as
necessidades e os gostos dos consumidores euro-
peus, que preferem abacates pequenos, para serem
comidos por uma só pessoa, com poucas gorduras
e que possam conservar-se durante alguns dias.
Uma série de critérios indispensáveis a levar em
conta para aceder aos mercados de exportação.
Um exemplo, entre tantos outros, que mostra que
os agricultores não podem contentar-se apenas em
oferecerem o que cultivam, mas devem adaptar-se
aos desejos de quem, no fim da cadeia, irá consu-
mir os seus produtos, frescos ou transformados,
tanto no seu próprio país, como no estrangeiro.

Nicho de mercado adequado


Para desenvolver uma cadeia de valor é impor-
tante conhecer bem os mercados a fim de oferecer
um produto adaptado e que seja suficientemente
valorizado. Por exemplo, é necessário saber que,
para um pequeno produtor poder entrar nos mer-
cados de exportação, é melhor visar um nicho de
mercado específico, onde os produtos serão nota-
dos e vendidos normalmente a um preço mais ele-
vado: comércio justo, frutos e legumes biológicos,
produtos de origem… Os compradores europeus
são também muito exigentes no que respeita a nor-
mas  – tamanho, qualidade, paladar, tratamentos,
rastreabilidade, regularidade do aprovisionamento.
Sem contar que, para atrair o consumidor que faz as Ruanda, os produtores de batatas Produção de
sementes de
suas compras numa loja ou num supermercado, o que de Koabiki tiveram a ideia de ven- pepino para
interessa mais é a apresentação. Um produto bem rotu- der os seus tubérculos, cuidadosa- os produtores
lado e com uma embalagem bonita vender-se-á sempre mente seleccionados, lavados e em- hortícolas europeus
(Tanzânia)
melhor. Os produtores de mangas da Tanzânia, que se balados, em bonitos cestos cobertos
esforçaram muito para melhorar a qualidade dos seus com folhas de bananeira, nos supermercados e restau-
frutos, estão frustrados por não poderem valorizá-los rantes de Kigali. O sucesso foi grande e, em 2010, já
melhor, porque as embalagens não são atractivas. Por vendiam as suas batatas um terço mais caras do que
esta razão pediram recentemente ao seu Governo para os outros produtores.
instalar uma fábrica de acondicionamento. Os agricultores isolados, ou mesmo agrupados, têm
Granada é um pequeno produtor de cacau e não dificuldade em conhecerem estas exigências e em ino-
pode concorrer com os gigantes deste mercado. Mas varem. São os actores no final da cadeia, as grandes ou
um empresário soube combinar a origem e a qualida- pequenas empresas de distribuição que, muitas vezes,
de do produto oferecido com uma embalagem atrac- fazem uma análise do mercado e o explicam aos pro-
tiva para vender por bom preço os seus chocolates a dutores e aos transformadores. É assim que no Uganda
lojas de renome na Europa. a Coca-Cola, com a ajuda da Fundação Melinda e Bill
A mesma lógica pode ser aplicada aos mercados lo- Gates, forma e organiza 50.000 produtores de mangas
cais, nacionais ou regionais, em particular aos merca- e de maracujás, que venderão os seus frutos a esta em-
dos urbanos onde surgem os supermercados e onde presa. A informação é o factor-chave para aproximar os
os consumidores têm menos tempo para cozinhar. No actores da cadeia, de modo a que as expectativas de

12 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


uns quanto à produção dos outros sejam satisfeitas. graças a uma parceria entre a bolsa queniana de pro-
Assiste-se a um progresso dos Sistemas de Informação dutos agrícolas
Définir(Kenyan Agricultural Mariages
les chaînes Commoditiesd’affaires
sobre os Mercados (SIM), que fornecem dados sobre Exchangede valeure a operadora móvel Safaricom.
– KACE)
os preços e as necessidades de certas regiões ou cida- Mas é uma iniciativa ainda isolada à qual, infelizmen-
des. Mas outras informações, mais qualitativas, sobre te, nem todos têm acesso.
as oportunidades regionais são pouco acessíveis, a me-
nos que se efectue um dispendioso estudo de mercado. Integração vertical ou horizontal
No Quénia, o SMS Sokini fornece informações, que são Várias soluções são oferecidas aos produtores, para
pagas por SMS, sobre os preços dos produtos agrícolas que tirem proveito das cadeias de valor. Podem ten-
aos agricultores, aos compradores e aos exportadores, tar valorizar a sua produção, reduzindo o número

reportageM 
Trindade e Tobago
Um corte superior a todos
Em Trindade e Tobago,
de carneiros e borregos. Um membro
uma associação de
da associação, mestre cortador, teve
criadores de ovinos
a ideia de transformar as carcaças
está a romper o ciclo
de carneiro em cortes de carne de
de mercados inseguros
qualidade superior. “O problema passou
e preços erráticos,
a ser termos demasiado sucesso”,
ajudando os criadores a
conta Boreley. “Não conseguíamos
comercializar melhores
satisfazer todos os compradores que
cortes de carne.
surgiam.” O problema resolveu-se
A Trinidad and Tobago Goat quando o supermercado Super Quality,
© S. Torfinn/Panos-réa

and Sheep Society (TTGSS) de Endeavour, concordou em adquirir


tem boas razões para se toda a carne, contratando o mestre para
orgulhar. Após algumas a transformar.

© A. Taitt
© Xxx

tentativas falhadas, esta O elo necessário seguinte era um


associação de produtores matadouro. O único matadouro moderno
de animais conseguiu regularmente inspeccionado pelas os produtores para inspeccionar
estabelecer uma cadeia de valor autoridades sanitárias públicas pertencia os rebanhos e aconselhar na sua
altamente eficiente, ligando os criadores ao Sugar Feeds Centre. E também aqui alimentação. Intervindo nas duas
de ovinos a fornecedores de produtos e surgiram dificuldades. Os criadores que pontas da cadeia, a associação doou
serviços, e a um lucrativo mercado de levavam os seus animais para abate carcaças aos hotéis mais importantes
carne. tinham de pagar antecipadamente na tentativa de recolher a impressão
A via para o sucesso nem sempre foi fácil. uma taxa e eram responsáveis pelo dos clientes. “A resposta, de que a
A primeira tentativa da associação para transporte do produto para o mercado. carne tendia a ser demasiado magra,
estabelecer uma cadeia de valor envolveu O pagamento tinha lugar apenas algum foi levada aos produtores e serviu de
produtores de lacticínios. Foi em 2009 tempo depois, o que causava problemas base ao melhoramento dos programas
e a ideia era pasteurizar, engarrafar e de liquidez a muitos. A resposta da de alimentação, de forma a podermos
comercializar o leite sob uma marca. TTGSS consistiu no estabelecimento igualar a qualidade das carnes
“Mas cada produtor produzia apenas de um fundo de maneio, facilitado importadas”, explica Borely.
uma pequena quantidade e, portanto, pela Trinidad and Tobago Agribusiness A TTGSS ajudou a assegurar que os
embora o projecto tenha sido bem Association, para assegurar o pagamento produtores obtivessem melhores preços
recebido, o trabalho de recolha do leite atempado aos criadores. durante todo o ano. Actualmente, a
exigia demasiado investimento”, lembra associação planeia restabelecer a cadeia
John Boreley, presidente da TTGSS. Selecção de qualidade de valor do leite de cabra, assim como
O apoio à satisfação dos padrões criar uma outra para a certificação de
Um mestre cortador de qualidade revelou-se essencial. gado.
O apoio passou a incidir nos produtores Os representantes da TTGSS visitam Andy Taitt

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 13


2 | UMA AVENTURA COLECTIVA

de intermediários e gerindo eles próprios outros de produtores, que organizam e gerem estas cadeias.
elos como
Mariages a transformaçãoOpportunités
d’affaires e a embalagem, visando Recolhem
Une os produtos, acondicionam-nos ou efectu-
volonté
a venda: farinha de mandioca em vez dos tubérculos am uma
politiqueprimeira transformação antes de os escoar.
et risques
secos, fónio lavado e pré-cozido… É o que se chama
integração vertical. Se bem que esta abordagem pare-
ça à primeira vista atraente, para colocar no mercado
“Os agricultores trabalham cada
produtos agro-alimentares é necessário possuir tecno- vez mais com as empresas que
logias adaptadas, meios financeiros e uma organiza-
ção esmerada…Quanto mais longa for a cadeia, tanto
comercializam as suas colheitas”
maiores são os riscos para aqueles que se lançam em
ofícios que não são os seus. Mas se as cadeias são pe- Na República Dominicana, o filho de um grande agri-
quenas, se é suficiente moer o milho e pô-lo num saco, cultor, regressado dos Estados Unidos, teve a boa ideia
esta solução é eficaz, permitindo, além disso, manter- de lançar-se, sozinho, no abastecimento de bananas
-se em contacto com os consumidores do produto e maduras no ponto certo, para os restaurantes, super-
adaptá-lo melhor aos seus desejos. Geralmente são as mercados e numerosos navios de cruzeiro que fazem
cooperativas, profissões integradas ou agrupamentos escala no país...

as 80.000 toneladas anuais e
rendimentos estimados em 5 mil sobre as importações.
milhões de FCFA (7,6 milhões de Contudo, as últimas campanhas foram
euros). Desde os anos 1970, o destabilizadas por vários factores. A
tomate fresco é transformado produção da SOCAS apenas cobria dois
num concentrado duplo, terços das necessidades do país e o
que entra na confecção de Senegal teve de importar concentrado de
numerosos pratos senegaleses. tomate triplo. Foi assim que, em 2005,
A organização integrada do se implantou a Agroline, uma unidade
tomate industrial (Comité industrial que colocou no mercado um
Nacional de Concertação da concentrado de tomate produzido à base
© M. Seck

Fileira do Tomate Industrial – de um concentrado triplo de tomate


CNCFTI), criada em 1999, importado, da marca “La Linguere”.
constitui um modelo no seu Em 2011, a SOCAS considerou que esta
Senegal género, reunindo representantes dos concorrência dificultava o escoamento

Um produtores, transformadores, instituições


financeiras e instituições públicas.
da sua produção, temendo assim não
poder firmar contratos com os produtores

concentrado O tomate industrial é produzido sob


contrato e, até muito recentemente, a
para a campanha 2011-2012. O Estado –
que tinha concedido a autorização para

organizado Empresa de Conservas Alimentares do


Senegal (SOCAS) era o único comprador. A
instalação da Agroline – foi questionado
pela CNCFTI sobre a coerência das
O concentrado de tomate senegalês, empresa produz o concentrado da marca políticas agrícolas e o apoio a uma fileira
produzido com tomate local e muito “Dieg Bou Dar” (“que faz sempre falta” local, tendo sido criada uma Comissão
consumido, é fruto de uma cadeia de em wolof). Os produtores têm acesso Ministerial para a Regulamentação do
valor bem organizada que beneficia a créditos de campanha agrícola e de Mercado do Tomate Industrial. Em finais
de uma colaboração institucional investimento junto da Caixa Nacional de 2011, a Agroline, que vai instalar
harmoniosa entre produtores, de Crédito Agrícola do Senegal (CNCAS) uma unidade fabril de transformação,
transformadores e financiadores. O com base nos contratos que os ligam e a SOCAS, comprometeram-se a
surgimento de uma nova unidade à empresa. Os reembolsos do crédito comprar, respectivamente 30.000 e
industrial suscita algumas preocupações. são retirados directamente, quando a 20.000 toneladas de tomate aos
No vale do rio Senegal há cerca de empresa paga aos produtores. O Estado produtores, que poderão beneficiar desta
12.000 produtores que vivem do senegalês apoia o tomate industrial, situação, tal como os consumidores, pois
tomate, com uma produção que ronda nomeadamente através de impostos a concorrência mantém os preços baixos.

14 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


Os agricultores podem também permanecer no de dinheiro para funcionarem e de empréstimos para
seu papel de produtores e participarem numa cadeia investirem em materiais
Définir de produçãoMariages
les chaînes ou de trans-
d’affaires
constituída por diferentes actores – produtores, trans- formação, deraramente
valeur concedidos pelos bancos. Na
formadores, comerciantes, distribuidores – da qual Etiópia, na região de Oromia, organizações de produ-
são o primeiro elo, mas que é normalmente organiza- tores, fornecedores de insumos, financiadores, trans-
da pelo último elo, o que vende o produto final. Para formadores e compradores, reagruparam-se em torno
se obter lucro, é necessário que os produtores ou as da cadeia de valor do leite de soja, uma cultura nova
suas associações disponham de boas aptidões de ges- desenvolvida com a ajuda de duas ONG, uma belga e
tão: saber calcular o preço de custo dos seus produ- outra etíope, para alimentar Jimma e Adis Abeba. A
tos, assegurar-se da sua qualidade e da regularidade iniciativa beneficia de um financiamento pioneiro pro-
dos aprovisionamentos – dois aspectos primordiais – e posto pela instituição de microfinanças local Harbu,
da sua rastreabilidade, conhecimento dos mercados e que oferece uma variedade de serviços aos vários ac-
dos preços praticados. Só desta forma podem negociar tores da cadeia.
favoravelmente os preços de venda com os compra- Quando estas necessidades se inserem numa ca-
dores e garantir que os frutos do seu trabalho sejam deia de valor bem estruturada, alguns bancos, como
bem valorizados. Senão arriscam-se a que lhes sejam o Banco Comercial de África/ Commercial Bank of
impostos preços pouco rentáveis. Cabe-lhes também Africa ou o Equity Bank no Quénia, estão dispostos
melhorar os seus processos de produção para redu- a investir.
zir os custos e melhorar a competitividade. É a estes O sucesso de uma cadeia de valor assenta, em gran-
aspectos que se dedicam numerosas ONG em África, de parte, nos agricultores que fornecem os produtos
tentando evitar que os agricultores fiquem à mercê de base. Mas estes dependem dos elos finais da cadeia
das empresas internacionais. para valorizar a sua produção. Trata-se de uma inter-
É cada vez mais frequente, sobretudo em relação dependência, que envolve um trabalho conjunto, que
aos produtos de exportação, que os agricultores ou traz benefícios a todos.
as suas organizações trabalhem sob contrato
com empresas que transformam ou comercia-
lizam os seus produtos. Estas asseguram-lhes
a venda dos produtos, na condição de que es-
tes respeitem um dado caderno de encargos,
fornecendo-lhes os insumos ou facilitando-
-lhes o aprovisionamento dos meios de pro-
dução.

Logística e financiamento
Para um bom funcionamento das cadeias
de valor, é indispensável a presença de ou-
tros actores não directamente envolvidos, tais
como serviços financeiros, empresas transpor-
tadoras, de acondicionamento e de logística.
O Mali multiplicou por doze as suas expor-
tações de manga entre 2005 e 2010 ao pôr
em funcionamento uma cadeia de transporte
rodoviário e ferroviário, com sistemas de refri-
geração até ao barco, para que a fruta chegue
© J.-B. Russel/Panos Pictures/Hollandse Hoogte

em quantidade e em bom estado à Europa,


e mais barata do que por avião. A manga do
Mali, muito saborosa, só chegava ao mercado
europeu em poucas quantidades por falta de
frete aéreo, enquanto o mercado estava em
forte expansão.
O acesso ao crédito conti-
Os elos são
nua a ser muito difícil para as interdependentes
pequenas organizações agrí- e o equilíbrio
pode ser frágil.
colas, que têm necessidade

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 15


A palavra aos especialistas

s Mariages d’affaires Opportunités Une volonté


STEPHEN MBITHI
et risques politique

O cliente tem sempre razão


A adaptação dos métodos de produção, colheita e embalagem
© G. Kamadi

aos gostos dos consumidores é a chave para que o próspero sector


hortícola do Quénia consiga preços mais elevados.
O Dr. Stephen Mbithi
é o Director Executivo
Em que medida agricultores a manter padrões elevados? actividades de capacitação para adição de
da Associação dos os agricultores de O secretariado da FPEAK é responsável por valor, padronização e agro-negócio, espe-
Exportadores de pequena escala do coordenar as actividades agrícolas e a capa- cialmente para pequenos agricultores. Os
Produtos Frescos Quénia entendem citação ao nível familiar, para que os agricul- agricultores são iniciados em tecnologias
do Quénia (FPEAK), a importância de tores possam produzir dentro dos padrões importantes para a agricultura, como siste-
uma associação que
reúne 150 empresas
acrescentar valor internacionais exigidos. Organizamo-los mas de irrigação gota a gota, boas práticas
exportadoras de fruta, aos seus produtos? de maneira a eles poderem participar na de controlo de pragas, assim como técnicas
flores e vegetais. Os agricultores de pe- cadeia de valor global. Fazemo-lo dando de transformação para adição de valor.
quena escala enten- formação aos agricultores sobre os padrões
Como é que os agricultores são ajudados
dem o significado da adição de valor. Mas, de qualidade necessários, tanto os sistemas
a aceder aos mercados internacionais?
muitas vezes a adição de valor é confundi- oficiais de controlo como os padrões gover-
Trabalhamos com uma rede de exportado-
da com transformação. Em muitos sectores, namentais, quer os produtos se destinem
res, que estão muito familiarizados com os
como na produção de frescos, não é neces- ao Quénia ou à União Europeia.
mercados internacionais da Europa, onde
sariamente verdade que se acrescente valor
Esta abordagem tem sido bem-sucedida? vendemos 82% da nossa produção. Os EUA
durante a transformação. Em alguns casos
A capacidade de satisfazer os padrões co- e o Médio Oriente compram, cada um, 5%
pode mesmo perder-se valor. Por exemplo,
merciais internacionais constitui o principal da nossa produção. Organizamos os agricul-
o feijão-verde consegue o melhor preço por
atractivo dos produtos frescos do Quénia. tores de pequena escala para, em grupos, ex-
quilo quando é fresco. O preço por quilo
Os produtos frescos podem ser produzidos portarem directamente para esses mercados.
pode cair mais de 50% quando enlatado,
em qualquer parte do mundo, mesmo em
porque os consumidores não consideram Será que os agricultores de pequena
muitos países africanos. Todavia, aqui exis-
que o feijão enlatado seja fresco. escala estão a receber apoio suficiente?
te a capacidade de os agricultores prova-
Podemos dizer com segurança que muito
De que outras maneiras podem os rem ao mercado ou aos consumidores da
está a ser feito pelo sector privado nos frutos
produtores de frescos de pequena Europa que obedecem escrupulosamente
e vegetais. O sector hortícola é fortemente
escala acrescentar valor? às normas e regulamentos exigidos – é por
orientado para o privado. Não acho que o
Formamos os agricultores de pequena esca- isso que a horticultura queniana triunfa.
Governo precise de fazer muito mais além
la para atribuírem maior importância à qua- Outra coisa que a FPEAK fez foi aglomerar
de garantir um ambiente favorável, o que
lidade, colherem na altura própria e assim os agricultores em unidades que são eco-
em alguma medida está a acontecer. Não
obterem preços mais altos. Obviamente que nomicamente viáveis. Não temos um único
acho que o Governo se deva envolver na
é fundamental colher e entregar a produ- agricultor possuidor de dois hectares de terra
adição de valor. A adição de valor muda tão
ção na melhor altura. Todavia, a adição de situado a 200 km de distância do seguinte.
rapidamente que mesmo o Governo teria di-
valor também ocorre quando o agricultor Isso nunca funcionaria, porque a logística do
ficuldade em acompanhar o ritmo.
faz aquilo a que chamamos mistura. Um transporte de produtos provenientes de ape-
Mas o Quénia tem uma logística muito má
agricultor pode misturar feijão-verde com nas dois hectares não faz sentido economica-
em comparação com outros países. Por
cenouras-bebé e milho-bebé, e colocar tudo mente. Ou seja, escolhemos aglomerar agri-
exemplo, o custo do material de empacota-
em pacotes de pronto a comer, aumentan- cultores que operam como indivíduos mas
mento no Quénia é 20-25% mais elevado do
do assim o preço por quilo. Ensinamos os no interior de um grupo. As actividades agrí-
que nos países asiáticos ou no continente eu-
agricultores a manusear correctamente os colas são assim conduzidas uniformemente
ropeu, onde tem lugar uma adição de valor
produtos e a preservá-los para o transporte, mesmo com explorações independentes.
semelhante. A energia é também um grande
de forma a poderem satisfazer a exigência
E acerca da formação prática? problema. No Quénia, a energia custa pelo
comercial de entrega do produto num pe-
Nos últimos dois anos estabelecemos o menos cinco vezes mais do que nos países
ríodo máximo de 24 horas entre a colheita
Centro de Formação Prática (PTC) na mais eficientes, e pelo menos três vezes mais
no Quénia e os supermercados da Europa.
cidade de Thika, a cerca de 50 km de do que na média dos países BRIC.
Como é que a FPEAK ajuda os Nairobi, com o objectivo de centralizar as Entrevista conduzida por Geoffrey Kamadi

16 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


ReportageM

Définir les chaînes Mariages d’affaires


BURQUINA FASO de valeur

Caminhar lado a lado


A União de Produtores de Milho de Koubri, no Burquina
Faso, criou um pólo de empresas agrícolas que agrupa
© N.-D. Salouka diferentes actores da cadeia de valor, o que permite
organizar a produção e garantir mercados para o produto.
Desde que todos cumpram os seus compromissos.
Estamos em inícios de Abril, na aldeia de organização das fileiras agrícolas no União encarrega-se disso”, corrobora o
de Sensenguené, 50 km ao Sul de Burquina Faso. Existem actualmente produtor Lassané Zagré. Também Madi
Ouagadougou. Sentado debaixo de um cerca de trinta pólos, integrando mais de Sini, presidente do agrupamento de
telheiro, Soumaïla Ouédraogo, presidente uma dezena de produtos. compradores de cereais, não esconde a
da União de Produtores de Milho, está sua satisfação. Já lá vai a época em que
rodeado por alguns membros do comité Organização oleada era preciso dar a volta pelas aldeias para
executivo e prepara o plano de acção “Os PEA não são instituições formais comprar milho. “Agora basta-nos alugar
para a próxima campanha agrícola. As como as organizações camponesas”, um camião para recolher os cereais, pois
primeiras chuvas não cairão antes de dois reconhece Kouka Kaboré, responsável isto é trabalho da União, o que reduz as
meses e os campos, queimados por um dos PEA no IFDC. “Mas é importante que nossas despesas. E, além disso, estamos
sol abrasador e varridos por um vento haja um líder, que é o titular do negócio, seguros de obter a quantidade de cereal
escaldante, ainda não foram preparados. gravitando os outros actores em torno pretendida”, acrescenta entusiástico.
No entanto, é já necessário organizarem- dele”, prossegue. Em Koubri, Soumaïla Mas nem tudo é perfeito nesta bela
se. “O plano de acção contém as previsões Ouédraogo é o “líder”. Ele conseguiu dinâmica. Os créditos concedidos
para a produção futura, nomeadamente reunir 12 agrupamentos provenientes não cobrem todas as necessidades.
as superfícies a semear, os insumos e os de quatro aldeias da comunidade, para Como a União não dispõe de garantias
produtos fitossanitários necessários”, criar a União de Produtores de Milho, suficientes, tem de se desenvencilhar
afirma Ouédraogo. Explica ainda que o que incita os comerciantes a agruparem- com pequenos empréstimos. “Na última
plano “será submetido à aprovação dos se numa associação. Os produtores campanha agrícola só tivemos direito a
produtores-membros no decorrer de comprometem-se a fornecer-lhes a 500.000 FCFA (763 €). Isso obrigou-nos
uma assembleia-geral”. Antecipar para quantidade de cereais disponível. Assina, a reduzir as nossas ambições”, lamenta
organizar a produção e poder fornecer os também, contratos com os fornecedores Abdoul Karim Sawadogo, tesoureiro
clientes, esta é a chave do sucesso. de fertilizantes que lhe cedem insumos a da União. Mas o maior risco no PEA é
A União dos Produtores de Milho faz crédito e, sobretudo, com a Caixa Popular o não respeito dos compromissos, o
parte do PEA – Pôle d’entreprises de Koubri que financia a crédito a compra que desacredita a organização e afasta
agricoles (Pólo de Empresas Agrícolas), de produtos fitossanitários. O dinheiro e os clientes. “Uma importante empresa
criado com o apoio do IFDC. O os insumos são divididos entre os vários de transformação de milho rescindiu
PEA-milho reúne vários actores da agrupamentos membros, em função das o contrato que nos ligava devido a um
cadeia de valor: agrupamentos de necessidades constantes do plano de atraso na entrega. As pessoas que faziam
produtores, compradores de cereais, acção. Cada agrupamento tem de cumprir a recolha do cereal levaram demasiado
grossistas, fornecedores de insumos, os seus compromissos, fornecendo a tempo a executar o seu trabalho. E assim
transformadoras e uma instituição quantidade de milho acordada. Depois perdemos um grande cliente”, confia-
de microfinanças, a Caixa Popular de da venda, a União salda as dívidas e -nos, consternado, o tesoureiro.
Koubri. O PEA faz com que os vários distribui os ganhos entre os grupos, de Para Soumaïla Ouédraogo, há que
actores se relacionem entre si de modo a acordo com as suas contribuições. relativizar o fraco espírito cooperativo.
assegurar o desenvolvimento da cadeia. “O PEA existe ainda há pouco tempo.
Dá ainda formação aos produtores sobre Consolidar a estrutura É preciso tempo para que os actores
o itinerário técnico do milho, inicia-os Com esta organização, todos os compreendam bem os seus papéis.
na manutenção e gestão de contas de actores têm algo a ganhar. “Com o Tenho a certeza que no futuro
exploração e técnicas de marketing. PEA, acabaram-se os problemas de poderemos ser mais eficientes”, afirma.
A criação destes PEA insere-se na política acesso aos insumos e aos créditos. A Nourou-Dhine Salouka

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 17


UM CASO EXEMPLAR

s ENTREVISTA
Mariages d’affaires Opportunités
Centro Une volonté
et risques de Rotulagem
politique do Benim de venda, que é o puré do fruto do

Conferir valor comercial


embondeiro. O puré é apresentado
como o iogurte, num boião. Ao contrário

aos produtos locais…


do iogurte feito de leite de vaca, é
consumido por todas as idades. O nosso
grupo-alvo é composto, em primeiro
Para além de associações e cooperativas e até mesmo lugar, pelos beninenses das zonas
© J. Saizonou

comercializar empresas. urbanas e pelos compatriotas residentes


os produtos no estrangeiro que, quando viajam ao
Qual é o aspecto inovador
locais, o Centro Benim, se reabastecem no Centro, que é
deste Centro?
Economista de de Rotulagem muito frequentado.
formação e promotor, do Benim dá
O Centro é um concentrado de inovações
entre 1998 e 2006, da formação aos porque não é um supermercado Que dificuldades encontram?
Semana de Rotulagem convencional. Não se resume apenas Somos nós que definimos as normas
no Benim. Em 2009
produtores para o
à venda dos produtos transformados de qualidade que impomos aos nossos
criou o Centre Label melhoramento dos
no Benim, fornece também parceiros. Mas gostaríamos que o
Bénin, que apoia seus processos de
acompanhamento também os detentores País contasse com um laboratório de
as associações e fabrico, a garantia
cooperativas de locais dos saber-fazer durante o fabrico, referência que pudesse certificar os
da qualidade
transformação de o processo de qualidade (higiene, nossos produtos. A segunda dificuldade é
produtos locais.
dos produtos e
respeito das normas) e a colocação dos o aprovisionamento das matérias-primas.
a promoção dos
produtos no mercado (embalamento, Os nossos parceiros nem sempre dispõem
mesmos no mercado. Objectivo:
promoção, venda). O principal valor dos recursos para se abastecerem e
vender melhor os produtos –
acrescentado do Centro é fazer sair o responderem eficazmente à procura.
legumes pré-cozidos, farinhas
produto do seu anonimato e conferir-lhe E o fraco nível do seu equipamento
instantâneas, sumos de fruta,
um valor comercial. também não lhes permite responder
etc. – a uma clientela urbana
Os três critérios que guiam a escolha com prontidão a pedidos urgentes. O
cada vez mais exigente.
de um produto são: a originalidade, Centro também carece de estruturas de
Qual é o princípio que norteia a valorização dos recursos locais fabrico de embalagens. Para suplantar
o Centro de Rotulagem? e a qualidade. O terceiro critério, estas dificuldades, estamos a criar, em
O objectivo é valorizar os saberes que requer a nossa especialização, conjunto com os nossos parceiros, a
ancestrais e as práticas antigas de não é eliminatório. Somos nós Caixa Mútua de Rotulagem para a marca
transformação dos produtos locais, que controlamos os produtos que Benim. Trata-se de criar, num banco
como já tínhamos começado a fazer na valorizamos para o mercado. As nossas local, um fundo de garantia que irá
Semana de Rotulagem. Damos formação escolhas nem sempre recebem a facilitar o acesso ao crédito a uma taxa de
sobre boas práticas para modernizar os aceitação imediata dos consumidores. A juro relativamente baixa. Estes créditos
produtos cujo valor comercial pareça nossa abordagem consiste em suscitar o servirão para o equipamento e para a
evidente e ir ao encontro do gosto interesse do consumidor por um produto constituição de fundos de maneio para
dos habitantes das cidades que têm que julgamos ser de qualidade. O que os membros, para que estes possam
mais poder de compra. Actualmente, nos dá confiança é que os produtos são aumentar a sua capacidade de resposta
o Centro de Rotulagem trabalha bem aceites e vendem-se bem, durante aos nossos pedidos.
com mais de 150 parceiros, entre os um longo período. Actualmente há um Entrevista conduzida por:
quais transformadores individuais, produto que bateu todos os recordes Joachim Saizonou

chain performance in developing countries Valuechains4poor


Para mais informações http://tinyurl.com/73clfft Making Value Chains Work Better for the Poor
CTA Assessment and Finance in the Fruit and
http://www.valuechains4poor.org/
Briefing sobre desenvolvimento rural nas Vegetable Value Chain. Evidence from Small
Caraíbas: “Renforcer le secteur agroalimentaire Island Developing States in the Caribbean and KIT-IRDC-Agriterra
privé des Caraïbes : Compétitivité pour le the Pacific
Les organisations paysannes innovent pour se
développement rural dans un contexte de http://tinyurl.com/6t7trme
mondialisation (octobre 2010)” positionner dans les chaînes de valeur
http://tinyurl.com.7ch57f7 KIT http://www.cdi.wur.nl/UK/
Chain empowerment – Supporting African
FAO farmers to develop markets Réussir – Le magazine du business
Guidelines for rapid appraisals of agrifood http://tinyurl.com/7jovgrz www.reussirbusiness.com/

18 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


3 | ESCOLHAS ESTRATÉGICAS

Oportunidades
e riscos
No altamente competitivo mercado agro-alimentar
dos dias de hoje, existe uma crescente pressão
para elevar a qualidade e baixar os custos. Esta
situação pode abrir novas janelas de oportunidade,
© G. Williams/SOUTH/Réa

mas representa igualmente um desafio para


produtores e transformadores nos países ACP.

julho 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 19


3 | ESCOLHAS ESTRATÉGICAS

Q
uando corre bem, o sistema da cadeia de
Opportunités Une volonté
valor pode ser vantajoso para todas as par-
politique
et risquestes, proporcionando aos compradores um
fornecimento fiável e aos agricultores um
mercado seguro. Na perspectiva do agricul-
tor, fazer parte de uma cadeia de valor pode repre-
sentar mais dinheiro. Mesmo os preços sendo por
vezes mais baixos do que os do mercado local, essa
solução representa geralmente uma receita mais
estável. A participação em cadeias de valor pode
levar à aquisição de novas habilidades e melhores
práticas. Mesmo a simples limpeza e classifica-
ção do produto pode fazer a diferença. Em vez de
empilhar vegetais numa grade e transportá-los de
camião para um comerciante ou mercado, os pro-
dutores podem ter mais lucro se realizarem uma
transformação básica no local. Fornecer alfaces ou
tomates já lavados e embalados a uma loja local
ou supermercado pode permitir
preços mais elevados. Descascar e Um produtor
cortar a fruta pode ser uma manei- transporta palmito
para a fábrica de
ra eficaz de aproveitar o mercado

© AMCAR
transformação
crescente de produtos alimentares (Guiana).

prontos a comer. No Quénia, os


agricultores organizam-se em grupos de produtores nas cadeias de valor. Os novos sistemas de produ-
que classificam e embalam fruta e vegetais em centros ção podem representar janelas de oportunidade para
concebidos para tal. Na província de East New Britain, elas, embora a participação em cadeias de valor pos-
da Papuásia-Nova Guiné, os agricultores aprendem a sa representar igualmente um trabalho suplementar.
tornar-se transformadores, adquirindo habilidades Algumas iniciativas estão a fazer da participação fe-
para satisfazer as exigências do mercado e os procedi- minina uma propaganda comercial. Na América do
mentos de quarentena. Sul, a marca Café Femenino divulga café especial
As mulheres, com as suas aptidões organizativas e produzido por mulheres. A inclusão das mulheres
conhecimento intrínseco do mercado, estão particu- no desenvolvimento e comercialização de produtos
larmente bem colocadas para realizar serviços úteis pode trazer dividendos. As rainhas comerciais do

Granada Segundo maior exportador mundial de o acesso ao financiamento. A pedra

A noz- noz-moscada em 2001, Granada caiu


desde então para o nono lugar.
angular do plano é a adição de valor,
nomeadamente na produção de óleos

-moscada sai Presentemente o sector está a ser essenciais, noz-moscada em pó para


© O. Kempadoo

reavaliado, com atenção especial à utilização culinária, utilização da casca

reforçada melhoria do financiamento da cadeia


de valor. A estratégia é conduzida
para produtos de beleza e para a pele,
e desenvolvimento das propriedades
Estão a ser feitos esforços para pelo International Trade Centre e medicinais da noz-moscada. Uma visita
restaurar o sector de noz-moscada envolve os principais actores da recente à Índia, onde a cadeia de valor
em Granada, e para desenvolver uma cadeia de valor, incluindo agricultores, da noz-moscada está bem desenvolvida,
cadeia de valor que o torne mais agrotransformadores, a Associação ajudou os actores de Granada a observar
competitivo. A noz-moscada, que de Cooperativas de Noz-Moscada directamente o fabrico de óleos e
já foi uma cultura muito importante de Granada, instituições financeiras resinas de noz-moscada, a conhecer
em Granada, sofreu um rude golpe e retalhistas. O objectivo consiste o equipamento de transformação e a
devido aos furacões Ivan e Emily, que em inovar na comercialização e no estudar as técnicas para testar e garantir
devastaram a ilha em 2004 e 2005. desenvolvimento do produto, e melhorar a qualidade.

20 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


Gana, que controlam muitos mercados de frescos precisam de pesar a despesa adicional que cumprir
do país, estão em contacto com os agricultores e or- com essasMariages
Définir les chaînes exigências d’affaires
acarreta, contra as recompensas
Opportunités
ganizações comerciais para garantir que os produtos
de valeur que daí advêm. Alguns dos melhores esquemas en-
et risques
satisfaçam as exigências de preço, quantidade e qua- volvem o apoio de empresas. A empresa Blue Skies,
lidade. no Gana, que transforma fruta tropical fresca para
supermercados europeus, assumiu junto dos seus for-
Custos e recompensas necedores a responsabilidade técnica e financeira das
Cada vez mais os consumidores exigem saber como certificações orgânica, GLOBALGAP e de Comércio
os alimentos são produzidos e por quem; este inte- Justo.
resse representa novas oportunidades para a partici- As cadeias de valor não estão ao alcance de todos, e
pação dos agricultores de pequena escala nas cadeias os produtores mais pequenos são, com toda a probabi-
de valor, por meio de esquemas de certificação orgâ- lidade, excluídos em razão da localização física, difícil
nica, de comércio justo e outras. Mas os produtores acesso a tecnologias de irrigação ou mecanização, e

REPORTAGEM
Guiana produtos frescos e as mulheres

Mais valor são ensinadas a transformá-los e


embalá-los para exportação. Outros

para os
transportam e rotulam os produtos,
integrando uma cadeia de actores

produtos
comunitários por toda a Guiana.

Mulheres transformadoras
tradicionais A cultivadora de ananás Yvonne Pearson
está ligada ao projecto desde 2003.
© AMCAR

Dois empreendimentos na Guiana A sua aldeia, Mainstay, tem mais de


rural estão a permitir que a 40 agricultores de ananás, e 30 pessoas e frascos de vidro. A cadeia de palmito
população indígena adicione da mesma localidade, sobretudo abrange mais de 30 comunidades.
valor aos produtos locais. Mas, mulheres, levam a cabo a transformação
embora as empresas sejam e embalagem. Joel Fredericks gere a Dura competição
lucrativas, enfrentam agora fábrica de transformação. “Com este Os dois projectos não estão livres de
uma dura competição por parte projecto de ananás vejo um futuro desafios. A logística e a competição
de fornecedores mais baratos. brilhante para as pessoas de Mainstay”, comercial constituem dois deles. Dado
disse-nos. Enquanto fala, ouve-se na que as fábricas estão localizadas em
Cerca de 600 habitantes rurais de
fábrica a azáfama das mulheres a lavar o zonas remotas, o transporte do produto
concentrações remotas na Guiana, na
produto fresco, a descascá-lo e cortá- para a cidade, para rotulagem e
sua maioria mulheres, estão a trabalhar
-lo em bocados, e a extrair o sumo das exportação, é oneroso.
para uma empresa privada guianesa,
cascas para preservar a fruta enlatada. Ao nível da exportação, ambos
a Amazon Caribbean Ltd. (AMCAR),
O projecto do palmito começou em os produtos enfrentam uma dura
que colhe, transforma e exporta
1987, com uma fábrica em Drum Hill, competição por parte da Costa Rica
ananases orgânicos e palmito (Euterpe
a montante do rio, na remota região e do Sri Lanka. No ano passado, o
oleracea) enlatados. Estes produtos,
noroeste da Guiana. “Construímos ali a comprador exigiu que a empresa
cada vez mais populares entre os
fábrica porque é ali que estão as florestas baixasse o preço do ananás ou perderia
consumidores europeus, são enviados
onde crescem as palmeiras manicole”, o mercado. “Durante muito tempo
por barco para os supermercados
explica o director executivo da AMCAR, não chegámos a acordo. Discutimos o
gigantes Carrefour e Auchan, em
Jean-François Gerin. Criaram-se assim assunto duramente, até que houve por
França, e outros países da UE.
oportunidades para 300 indígenas fim um entendimento”, lembra Gerin.
Completamente auto-suficiente,
colectores, que fornecem diariamente “Somos grandes em certo sentido,
o empreendimento introduziu nas
a fábrica, e para 30 trabalhadores de mas pequenos em termos de operação
comunidades a ideia de acrescentar
transformação, sobretudo mulheres, que comercial, e é difícil para nós competir
valor aos produtos tradicionais.
descascam, lavam, cortam e preservam com fornecedores mais baratos”.
Os agricultores locais fornecem os
o produto antes de o colocar em latas Ravena Gildharie

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 21


3 | ESCOLHAS ESTRATÉGICAS

falta de organização. O acesso inadequado à terra, também beneficiam uma vez que estão geografica-
água e insumos de qualidade Unesãovolonté
outros tantos facto- mente distantes dos mercados grossistas.
Opportunités
res limitativos. politique
et risques
Algumas empresas multinacionais, como a Unilever Transparência e comunicação
e a Walmart, estão a optar por uma política de in- A agricultura contratual é um dos modelos mais
clusão de produtores de pequena escala enquanto frequentes de integração dos pequenos agricultores
fornecedores, afastando-se de uma Responsabilidade nas cadeias de valor. Embora o sistema tenha os seus
Social Corporativa directa em favor de uma perspecti- críticos, esta estratégia pode ser eficaz, oferecendo
va baseada em parcerias sustentáveis que assegurem apoio aos agricultores sob a forma de insumos, pa-
fornecimentos fiáveis às empresas e receitas mais es- dronização e, mesmo, gestão de risco. Em grande
táveis para os produtores. Na província do Limpopo, medida, o seu sucesso baseia-se no desenvolvimento,
na África do Sul, dois supermercados rurais fazem pelas empresas, de contratos após consultas com os
questão de ser abastecidos com vegetais de produto- agricultores e discussão das dificuldades enfrentadas
res locais. As lojas, abertas sob licença do grupo SPAR, pelos fornecedores. Os contratos devem estipular

reportageM 
(SSO) é um risco que ninguém pode extensão faz parte do pacote da SSO,
controlar. Este ano a empresa das Fiji foi e em 2004 o CTA financiou um manual
atingida de forma particularmente dura, de formação para as produtoras, tendo
com grandes cheias a destruir parte desde então ajudado a organizar
das suas reservas e material de plantio. diversas sessões práticas de formação.
Resistindo aos colossais estragos, a As floricultoras associadas à SSO trazem
proprietária Aileen Burness procura as suas flores para as instalações da
reagir, determinada a salvar o muito empresa em dias marcados e, no
bem-sucedido programa de floricultura final do mês, recebem os pagamentos
por ela lançado em 1996. relativos ao mês anterior, a preços
Para além dos seus próprios pré-determinados. “A classificação
rendimentos, ela sente-se devedora às e embalagem das flores são feitas
muitas pequenas floricultoras e negócios por nós, sendo depois efectuado o
© V. Prassad

de floricultura que fazem parte da cadeia fornecimento às floristas,” diz Burness.


de valor por ela edificada. O sistema
criou a oportunidade de as mulheres O risco das vendas paralelas
rurais e periurbanas se envolverem no Tal como em todos os negócios, aqui
Fiji esquema de desenvolvimento da SSO, também há problemas. “O risco principal

Cheias não que lhes fornece material de qualidade


para plantar e aconselhamento de
é, claro, o do clima e dos desastres
naturais,” conta Burness, tendo em

conseguem extensão, além de lhes assegurar um


mercado. A cadeia inclui actualmente
mente as dramáticas cheias de Abril.
“Mas um grande problema é também

derrotar um total de 40 mulheres por todas as


Fiji.
o das vendas paralelas.” Estas ocorrem
quando as agricultoras rompem o

florista Empréstimos para as agricultoras


contrato de exclusividade com a SSO e
vendem a outros clientes por preços mais
A SSO tem conseguido garantir elevados.
O desenvolvimento de um
empréstimos para que as fornecedoras Longe de se sentir desencorajada,
altamente bem-sucedido esquema
rurais possam financiar os seus próprios Burness vira-se para o futuro. Ela planeia
de produção de flores não é
viveiros. O sucesso deste programa de alargar os mercados a outros Estados-
desprovido de riscos. Mas uma
cultivo tem sido tal que a SSO fornece ilha do Pacífico, e olha também para o
empresa das Fiji está determinada
actualmente orquídeas e antúrios a sector do turismo, de elevado potencial.
a impedir que o catastrófico
todas as floristas de Viti Levu, a principal A empresa realiza as suas próprias
clima seja um obstáculo aos
ilha das Fiji.A cadeia é altamente pesquisas de mercado. “Felizmente
seus planos de expansão.
organizada. A SSO fornece às agricultoras que a procura é tanta que vendemos
O maior risco enfrentado pela empresa material de plantio de alta qualidade facilmente tudo o que temos,” afirma.
de flores de corte South Seas Orchards e outros apoios. O aconselhamento de Vinesh Prasad

22 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


com clareza as responsabilidades e prazos de pre- cadeias de valor e alargados a todos os elos da ca-
paração da terra, práticas agrícolas, fornecimento e deia.
Définir les chaînes Mariages d’affaires Opportunités
qualidade dos insumos, crédito e serviços de exten-
de valeur et risques
são, assim como as questões-chave da qualidade dos Fornecimentos fiáveis
produtos, preços e modalidades de pagamento. A Não são só os agricultores que enfrentam dificulda-
Lecofruit, em Madagáscar, é rigorosa nas exigências des. Operar uma transformação com sucesso requer
aos fornecedores, mas também oferece uma gama de um fornecimento constante de matéria-prima, e o
benefícios, todos eles claramente estipulados em mi- tempo de transformação precisa de ser maximizado
crocontratos assinados com os seus 9000 produtores para se poder retirar o máximo efeito do oneroso
de pequena escala. equipamento. Os agricultores podem ser tentados a
Para que a agricultura contratual seja sustentável e vender o seu produto a mercados que ofereçam me-
possa crescer, é fundamental que todos os elementos lhores preços, causando problemas de fornecimento.
da cadeia possam lucrar, embora os pequenos produ- Uma fábrica de transformação de tomate da Costa do
tores sejam provavelmente os que têm menos poder Marfim resolveu o problema dos fornecimentos irre-
de negociação no interior da cadeia. Se os agricultores gulares prestando formação, apoio técnico, sementes
suspeitarem que não estão a conseguir um preço justo, híbridas e crédito a 12 agricultores. As colheitas quase
a cadeia corre o risco de se romper. Os agricultores duplicaram, ficando os agricultores livres para vender
que não acompanhem o percurso do seu produto até o excedente onde quisessem.
ao comprador precisam de ser adequadamente infor- A confiança é essencial de parte a parte. A Guinness,
mados das quantidades que forneceram e das razões na Nigéria, lançou um esquema de cultivo de 4 anos,
de quaisquer deduções. O pagamento atempado é mas este falhou, em parte porque os agricultores des-
também outra questão importante. viaram o fertilizante fornecido para o sorgo, para o
A participação em cadeias de valor formais pode aplicarem em outras culturas. Pelo contrário, na
fazer aumentar o risco e a vulnerabilidade. Padrões Guiné, a Macenta Banana Producers Union estabele-
mais elevados de produção significam frequentemen- ceu uma parceria com a associação de comerciantes
te mais desperdício, e os produtos de nicho de valor de banana para promover a confiança e a transparên-
acrescentado tendem a representar um risco maior cia. Ambas as partes encontraram-se para acordar os
uma vez que as exigências do consumidor podem preços, e realizam uma reunião semanal para discutir
mudar rapidamente, deixando os produtores sem as quantidades. Uma vez pago o adiantamento, e as
saída. Uma vez que cada elo da cadeia é interdepen- bananas prontas, os produtores pesam-nas em frente
dente, as repercussões a jusante podem desencade- aos comerciantes e recebem o que falta dos compra-
ar um efeito de dominó. Assim, cada elo precisa de dores.
estar precavido
se as coisas cor- A grande
rerem mal. O re- distribuição
revela-se uma
curso ao seguro oportunidade
é uma possibili- para algumas
dade, para pro- cadeias de valor

tecção contra o
risco de perda da cultura devido
a condições climatéricas, ou con-
tra a perda de gado devido à seca
ou doenças, embora nem sempre
tal seja possível no caso dos pe-
quenos agricultores. É importante
que os riscos, assim como os be-
nefícios, sejam partilhados por to-
dos ao longo da cadeia, e alguns
dos melhores sistemas conseguem
estabelecer um seguro para todos
os agentes. Têm também sido de-
senvolvidas outras estratégias, in-
cluindo fundos de gestão de risco
© DR

concebidos especificamente para

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 23


A palavra aos especialistas

es Opportunités Une volonté


et risques Peter Batt
politique

Do grão à chávena
Preços baixos, má qualidade e técnicas locais de transformação
rudimentares são alguns dos problemas dos agricultores de café na
PNG. A organização em cadeias de valor tem ajudado os produtores
© V. Batt

a aceder a mercados mais lucrativos.


Peter Batt é professor
de comercialização de
Como é que a crianças frequentem a escola. Além disso, a de Café de Nova Iorque, assim como os
alimentos e agro-negócios cadeia de valor ligação directa a comerciantes e transforma- mercados internacionais de câmbios. Dado
na Universidade de Curtin, de café na PNG dores significa um melhor acesso a insumos, que poucos agricultores bebem café, não
na Austrália. Concluiu está a gerar tecnologia e informação comercial. Ao nível entendem o impacto que a sua maneira de
recentemente um projecto benefícios? da comunidade, o trabalho em conjunto, manusear o café tem sobre o sabor. Os co-
de 3 anos destinado a
melhorar o rendimento
Em primeiro lugar, como grupo comercial cooperativo, tem merciantes organizaram sessões de prova,
dos pequenos agricultores se os pequenos facilitado enormemente o acesso a apoios para demonstrar como as deficiências de
de café na Papuásia- produtores estive- do Governo e a infra-estruturas essenciais manuseamento mais prevalentes têm im-
Nova Guiné (PNG). rem suficientemen- como água corrente e electricidade. pacto no sabor, no aroma e na textura.
te perto de uma
É importante que todos os elos da
fábrica de separação da polpa, em vez de Qual a importância da confiança e
cadeia vejam um impacto positivo?
produzir o café pergaminho (nota do edi- da comunicação numa relação de
Para que a cadeia de valor tenha sucesso,
tor: café processado por separação da pol- negócios?
todos os elos da cadeia devem beneficiar.
pa, ainda com a “camisa” seca envolven- A comunicação e a confiança são funda-
Mais importante ainda, todos devem sentir
do o grão), podem vender a cereja (nota mentais na edificação de relações dura-
que são tratados com justiça e equidade.
do editor: o fruto cru da árvore do café) douras. Quando são trocadas informações
Tal implica que os comerciantes revelem
directamente a essa fábrica. Se apenas as entre os parceiros da cadeia, os agricul-
informações sobre os preços, e que sejam
cerejas vermelhas maduras forem colhidas, tores percebem o trabalho realizado por
transparentes em termos dos seus custos.
as fábricas transformam-nas para produzir transformadores, comerciantes e expor-
café de plantação de elevada qualidade, Quais têm sido os principais obstáculos? tadores. Só quando a confiança está ins-
pelo qual são pagos os melhores preços. Ultrapassar décadas de desconfiança entre talada é que os agricultores se mostram
Para os pequenos produtores, a venda da os pequenos agricultores e os intermedi- inclinados a alterar as suas práticas de
cereja resulta num aumento de 35-38% ários comerciais. Uma vez que não enten- produção, e só quando há confiança é que
do lucro líquido em relação ao preço do dem a dinâmica do mercado internacional os comerciantes e exportadores se mos-
café pergaminho. Ensinando os pequenos do café, os pequenos agricultores têm difi- tram inclinados a investir na transferência
produtores a colher e transformar correc- culdade em perceber por que razão os pre- de tecnologia e na facilitação da adopção
tamente o café, é possível reduzir imenso a ços são tão voláteis. As diferenças culturais de sistemas de garantia de qualidade.
variação da qualidade. O terceiro e último também têm sido um factor, dado que na
E os mecanismos de financiamento das
mecanismo para obter o melhor preço con- sua maioria os comerciantes são forasteiros.
cadeias de valor?
siste em levar a cabo a acreditação do pro-
Como têm tentado ultrapassar esses Tradicionalmente, a penetração financeira
duto, como orgânico ou Comércio Justo.
obstáculos? na indústria de café tem sido caracteriza-
Será que todos os integrantes da A educação e formação – a capacitação – da por muitas dificuldades. Dado que os
cadeia de valor beneficiam? têm tido grande impacto no ultrapassar da preços do café são tão voláteis, os bancos
Sim. Os consumidores beneficiam de uma maioria dos obstáculos. Os comerciantes não têm garantias de reaver o seu dinhei-
experiência superior – melhor sabor nas têm procurado convidar grupos de pro- ro, e os pequenos agricultores, desprovi-
suas chávenas. Os comerciantes beneficiam dutores a visitar a fábrica para verem com dos de bens de garantia, não conseguem
porque conseguem vender café de qualida- os seus próprios olhos o processo de pre- empréstimos. Na PNG, a situação é ainda
de superior a preços mais elevados, obtendo paração do café para exportação. Talvez dificultada por conflitos tribais e disputas
assim uma margem maior. Os agricultores o factor mais influente tenha sido o curso de terras. No mercado informal, a maio-
beneficiam de preços mais elevados, o que de iniciação à comercialização, que explica ria dos comerciantes e exportadores mos-
lhes permite não só melhorar o seu padrão aos pequenos agricultores o mercado in- tram-se relutantes em estender o crédito
de vida mas, também, assegurar que mais ternacional do café e a dinâmica da Bolsa aos agricultores.

24 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


REPORTAGEM

Définir les chaînes Mariages d’affaires Opportunités


uganda de valeur et risques

A qualidade compensa
Apoiados por uma empresa privada local, os agricultores
© A. Nabwowe ugandeses estão a melhorar a qualidade do seu café, o
que lhes permite colher os benefícios de integrar uma
eficiente cadeia de valor ligada a mercados de exportação.
Mais de 5000 agricultores de café dos qualidade e os seus contactos com registo meticuloso de todas as operações.
distritos de Mbale e Masaka, no Uganda, comerciantes europeus conferiam-lhe “Insisto numa boa documentação para
associaram-se a uma empresa privada uma óptima posição. Apoiado por quatro garantir que os agentes de recolha
local para aceder ao lucrativo mercado da familiares, estabeleceu uma rede de paguem aos agricultores,” conta.
exportação. Estimulados por um mercado fornecedores e ensinou-lhes como obter
garantido, e apoiados em insumos e um produto melhor. “Não se trata de Apoio aos agricultores
produção de qualidade, juntaram-se a volumes ou equipamento, mas de melhor O agricultor Daniel Wogogo viu o preço
outros agricultores para desmatar extensas qualidade. Neste negócio, ponho-me do seu café em grão mais do que
áreas de terra anteriormente improdutiva sempre na pele do consumidor final,” duplicar desde que aderiu à cadeia de
para aí cultivarem café. Steven Wokou, afirmou Kizito. No princípio do corrente valor. “Dantes vendia os meus grãos de
produtor de Buteza, no distrito de Mbale, ano, e em resultado dos seus elevados café a quem aparecesse e o preço era
possui actualmente 30.000 pés de café padrões de qualidade, a empresa de muito baixo,” disse. “Agora, aumentei
numa extensão de 17 hectares. Está Kizito recebeu o prémio 2012 Century para 25.000 o número dos meus pés de
entusiasmado com a adesão à cadeia de International Gold Quality Era Award, café, numa extensão de 35 acres (14 ha)
valor. “Acabaram-se as preocupações sobre conferido pela organização local de de terra.”
como achar bons compradores”, disse. negócios Business Initiative Directions. A Anderson Investments fornece aos
A orientação da cadeia de valor cabe ao Num contexto de procura crescente de pequenos produtores serviços gratuitos de
empresário local Daniel Kizito. Ele fundou grãos de qualidade, Kizito estabeleceu aconselhamento sobre técnicas de gestão
a sua empresa, a Anderson Investments, ligação com agricultores do distrito das culturas, para os ajudar a aumentar
após ter trabalhado durante 6 anos em de Mbale, no Uganda oriental, para a o rendimento. Os agricultores também
padrões de qualidade, como representante produção de café Arábica. Ele obtém o recebem apoio no manuseamento pós-
de comerciantes de café europeus. Sempre café Robusta de produtores do distrito -colheita para garantir que os padrões de
no meio de constantes desacordos relativos de Masaka, no Uganda central. Garante qualidade são respeitados. Está disponível
à qualidade entre os exportadores de que os produtores recebem um preço crédito isento de juros para ajudar os
café ugandeses e os compradores de café justo; actualmente, 7500 xelins ugandeses produtores a pagar insumos essenciais,
europeus, Daniel considerou haver ali a (2,41 €) por kg de café Arábica, e tais como fertilizantes e pulverizadores.
oportunidade de estabelecer uma cadeia 4500 xelins ugandeses (1,44 €) por kg de Um sistema flexível de pagamento da
de valor eficaz. Os exportadores enviavam café Robusta. Os agricultores que cultivam dívida deduz os empréstimos dos ganhos
muitas vezes um produto diferente café para a Anderson Investments dos produtores, numa taxa que eles
daquele que forneciam como amostra. também recebem um bónus no final da possam suportar. Os agricultores recebem
“A amostra era muito superior ao que estação, que varia normalmente entre os também gratuitamente os encerados para
enviavam depois como produto final. Isto 200 e os 500 xelins ugandeses (0,06 € e secagem dos grãos de café.
criava problemas entre os comerciantes 0,15 €) por kg, dependendo do volume Uma vez que o café é uma cultura
e os torrefactores na Europa,” diz Kizito. total fornecido pelo agricultor. A empresa sazonal, a empresa apoia os seus
“Pareceu-me haver uma lacuna no exporta uma média de 420 toneladas pequenos fornecedores a diversificar
mercado, devido à falta de comunicação por mês, na sua maioria para mercados e estabelecer-se noutras actividades
entre os compradores e os produtores. europeus. geradoras de receita. A maioria dos
Os compradores achavam que, sendo os O bónus pretende ser um incentivo para produtores dedica-se agora à criação
donos do dinheiro, tinham sempre razão.” dissuadir os agricultores de venderem de abelhas e aos lacticínios para obter
o seu café a outros compradores. Kizito receitas suplementares, o que ajuda a
Uma abordagem em controla cuidadosamente toda a cadeia impedir que se sintam tentados a vender
prol do consumidor de valor, pagando aos agentes de recolha o seu café a outros compradores.
A experiência de Kizito na análise da uma comissão e exigindo deles um Angella Nabwowe

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 25


UM CASO EXEMPLAR

es ENTREVISTA
Opportunités Une volonté
et risques
Avaliando os prognósticos
politique conhecimento para investir no acesso a
esses novos mercados.

E quais os que têm maior


É crucial entender estruturas de investimento e comerciais
probabilidade de ficar de fora?
as oportunidades e apropriadas, e colaborar com os
Os que têm menos terras, que estão
os riscos inerentes agricultores para que possam melhorar e
© Seville

em zonas mais remotas, com menos


à participação ter acesso a mercados mais exigentes mas
capacidades, que sofrem a barreira da
numa cadeia também mais lucrativos. Isto não quer
Don Seville é co- língua, sem acesso à irrigação nem a
-director do Labora-
de valor. Há dizer que os mercados formais sejam
organizações agrícolas eficazes. Muitas
tório de Alimentação diversos mercados adequados a todos os agricultores.
vezes é necessário investimento público
Sustentável. Trabalha possíveis, mas
Será que alguns mercados para reforçar a capacidade dos produtores,
no desenvolvimento é importante
de parcerias entre as são melhores do que outros remover obstáculos em termos de
escolher o mais
empresas e as ONG para as cadeias de valor? infra-estruturas, e edificar organizações
para orientar mode-
adequado.
Os mercados são diferentes – alguns intermediárias que possam ligar os
los comerciais que Como podem oferecem barreiras maiores à penetração. pequenos produtores aos mercados.
liguem produtores de
pequena escala aos
as cadeias de Os de vegetais e fruta fresca estão entre os
Quais os riscos mais prováveis da
mercados modernos. valor ajudar os tecnicamente mais exigentes, mas podem
participação em cadeias de valor e
produtores e gerar rendimentos elevados para pequenas
qual a melhor estratégia para os gerir?
transformadores de pequena escala? parcelas de terra. Em contrapartida, os de
Os riscos incluem entrar num mercado
As cadeias de valor ajudam os produtores bens essenciais são frequentemente os
com poucos compradores, dificuldades
de pequena escala a aceder a bons mercados tecnicamente mais acessíveis,
técnicas relacionadas com algumas
mercados. As cadeias de valor comerciais com elevada procura local, mas nos quais
culturas – levando a taxas de
de índole formal são muitas vezes é difícil realizar valor suficiente com
desperdício mais elevadas – mudanças
tecnicamente mais difíceis do que pequenas parcelas de terra. Ultimamente
no mercado que provoquem a retirada
os mercados informais. Mas, quando têm surgido mais oportunidades para
de compradores, pressão sobre os
os produtores triunfam, ficam com estabelecer relações de cadeia de valor
preços reduzindo as margens de lucro,
a possibilidade de acelerar a sua com tendência crescente para mercados
desconhecimento pelos agricultores da
profissionalização e competitividade. mais formais e regionais – produção de
produtividade necessária para se poder
cerveja, aves, etc.
De que modo o seu trabalho ajuda ter lucro, e variabilidade climática.
a melhorar as perspectivas deles? Que tipo de pessoa é o beneficiário A gestão do risco inclui contratos formais
É claro que todos queremos evitar os mais provável de uma cadeia de valor? que garantam um entendimento claro
riscos de ligar os produtores mais fracos Os transformadores e produtores dos termos de troca, contratos e preços
aos mercados mais exigentes. O nosso com mais probabilidade de triunfar mais duradouros, fundos de seguro,
trabalho centra-se no apoio às empresas são aqueles que têm um espírito irrigação para reduzir os riscos climáticos,
para que possam chegar aos agricultores empreendedor, vontade de comunicar, investimentos de adaptação ao clima e
de pequena escala, desenvolver e a capacidade agrícola, financeira e de diversificação de mercados.

que liga agricultores e especialistas no


Para mais informações desenvolvimento de cadeias de valor.
Under what Conditions Are Value Chains
Effective Tools for Pro-Poor Development?
CTA http://goo.gl/9L6nu
http://tinyurl.com/3d34hjz
Making the Connection: Value chains for
Transforming Smallholder Agriculture DFID KIT
6 a 9 de Novembro de 2012, Addis Ababa, Livro criado com a ferramenta wiki sobre
Portal sobre cadeias de valor do Royal Tropical
Etiópia cadeias de valor para os pobres.
Institute.
http://makingtheconnection.cta.int www.valuechains4poor.org/toolbook.php
http://tinyurl.com/7oab5kt
GIZ Value Chains for Development: An
Eat Caribbean Informações sobre cadeias de valor do Introduction to Pro-Poor Value Chain
Portal de comunicação concebido para o Instituto Alemão para o Desenvolvimento. Development
fortalecimento das cadeias de valor agrícolas http://tinyurl.com/82mjb93 http://tinyurl.com/6n2x28y
nas Caraíbas.
The Methodology of Value Chain Promotion
www.eatcaribbean.net
http://tinyurl.com/7hgnlqs
Linking Worlds
Plataforma online que liga os
eRAILS IIED agricultores aos mercados.
Serviço electrónico de aconselhamento www.iied.org www.linkingworlds.org

26 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


4 | UM CONTEXTO FAVORÁVEL

Uma vontade
política
Vários elementos contribuem para o desenvolvimento e
viabilidade das cadeias de valor. Um ambiente favorável
combina políticas com uma formação adaptada para
© FAO/G. Napolitano

todos os actores, investigação específica e comunidades


económicas regionais activas.

julho 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 27


4 | UM CONTEXTO FAVORÁVEL

N
enhum consumidor dos países ACP virá
Une volonté
comprar os seus produtos agrícolas no lo-
politique cal de produção. Esta evidência demons-
tra até que ponto a intervenção do Estado
é crucial para o desenvolvimento das cadeias de va-
lor. Estradas, electricidade, etc., as infra-estruturas,
da competência do Estado, são indispensáveis. Mas
não só. Outra condição sine qua non para o desen-
volvimento das cadeias de valor é a existência de
políticas adequadas. Políticas agrícolas, fundiárias,
comerciais, industriais, fiscais, monetárias, todos os
elos são afectados pelas escolhas e pela acção do
Estado, qualquer que seja a fileira. Quanto mais o
Estado dá garantias (regime fundiário, acesso aos
financiamentos, etc.), quanto mais assegura a trans-
parência (dos preços no mercado), implementa po-
líticas económicas e comerciais favoráveis (regime
estável e equilibrado das taxas de câmbio, da moe-
da e das políticas fiscais, regulamentação bancária
favorável sobre a fiscalidade comercial e empresa-
rial, legislação sobre o emprego, execução de con-
tratos, etc.), tanto mais favorece o desenvolvimento
das cadeias de valor.
As escolhas e as opções dos Governos determi-
nam, muitas vezes, a sua competitividade. Um es-
tudo recente sobre cereais, realizado no Zimbabué,
recomenda que o Governo encontre um equilíbrio
justo entre a protecção da indústria local e a promo-
ção do comércio regional, em nome da soberania

São Vicente valor, conseguir melhores preços e a melhorar a embalagem. A CaFAN


e Granadinas garantir um mercado de exportação estabeleceu um acordo com a
seguro. Solcaribbean, um fornecedor do

Uma boa Com o colapso da indústria regional


da banana, muitos agricultores de São
mercado britânico, e os produtores
locais, organizados em grupos,
ajuda Vicente viraram-se para o taro, o que
provocou uma descida dos preços.
são há 4 anos parte integrante
da cadeia de valor. O grupo de
Um centro comunitário Em busca de soluções para os seus agricultores realiza a embalagem e a
disponibilizado pelo Governo de problemas, os agricultores de três entrega, e a ECTAD coordena o envio
São Vicente e Granadinas é o ponto das principais áreas de produção de por barco.
de confluência das actividades de inhame juntaram-se para desenvolver Os produtores garantem bons
gestão pós-colheita dos agricultores uma cadeia de valor, com apoio da preços por meio da manutenção da
locais de taro ou inhame dos Caribbean Farmers Network (CaFAN), qualidade. Este inhame, que antes
Açores (Colocasia esculenta). Estas que acolhe a ECTAD. era vendido por apenas 0,18 € por
instalações, em conjunto com o A CaFAN dá formação no âmbito kg, pode agora valer até 1 € por kg.
apoio de uma organização local de da estratégia das cadeias de O sucesso atraiu outros agricultores
agricultores, a Eastern Caribbean valor. Os agricultores aprenderam para o grupo, que é já constituído
Trading Agriculture and Development a aumentar o compasso entre as por 400 produtores. Existem planos
Organisation (ECTAD), permitiram aos plantas para poderem obter maiores para alargar esta estratégia à
agricultores acrescentar qualidade e rendimentos. Também aprenderam batata-doce e ao gengibre.

28 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


economicamente rentável para todos os actores, e
Définir les chaînes Mariages reposicionar
d’affaires os Camarões num mercado
Opportunités mundial
Une em
volonté
de valeur expansão.et risques politique
A colaboração entre o Estado e o sector privado tam-
bém pode ser muito benéfica para as cadeias de valor.
No Uganda e na Tanzânia, por exemplo, os sectores
público, privado e industrial trabalharam concertada-
mente para permitir o desenvolvimento da criação da
perca do Nilo, uma actividade ameaçada pelas cres-
centes exigências em matéria de normas sanitárias da
União Europeia, o grande importador. As autorida-
des dos dois países estabeleceram normas e critérios
de qualidade, implementaram sistemas de controlo,
legislaram com a colaboração de vários ministérios:
Agricultura, Pescas, Indústria, Comércio, mas também
Meio Ambiente. Actualmente, a cadeia de valor forne-
ce um meio de subsistência para numerosas comuni-
dades de pescadores.

Mais serviços, mais valores


Os serviços de extensão, formação e investigação
deverão permitir a implementação e o fortalecimen-
to de cadeias de valor eficientes. Núcleos de serviços
com empréstimos, insumos, informações, oportuni-
dades de mercado, apoiados pelo Estado, por coo-
© D. Lagandré/Gret

perativas ou privados, fazem parte de um ambien-


te favorável e deverão contribuir para o acesso dos
pequenos produtores e outros actores às cadeias de
valor.
O Instituto Internacional de Investigação sobre
alimentar. Os produtores Políticas Alimentares (International Food Policy
Milho no mercado
de Kibaigwa, o e moleiros zimbabueanos con- Research Institute – IFPRI) e um grande núme-
maior mercado de correm com a África do Sul ro de instituições parceiras do Grupo Consultivo
milho da Tanzânia
onde o acesso aos OGM é livre. para a Investigação Agrícola Internacional (GCRAI)
Uma forma de concorrência (Consultative Group on International Agricultural
desleal para eles, para quem o acesso aos OGM está Research – CGIAR) implemen-
severamente regulamentado. Os moleiros sul-africa- taram dois projectos que exa-
Feijões produzidos
nos têm assim acesso a cereais 47% menos caros do minarão, entre outros, como se no Quénia e prontos
que os zimbabueanos. podem promover cadeias de para exportação

Estados motores – Estados


parceiros
Em alguns países, os Governos até to-
maram a iniciativa de relançar um cer-
to número de cadeias de valor. É o caso
dos Camarões, onde o Governo se asso-
ciou com os produtores, com a ajuda do
Centro Internacional de Comércio (ITC)
para relançar o sector do café – outrora
um dos sectores de exportação mais di-
nâmicos do país – enfrentando agora sé-
© COLE ACP/PIP

rias dificuldades devido a uma liberaliza-


ção não regulada. O objectivo: criar uma
fileira profissionalizada e sustentável,

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 29


4 | UM CONTEXTO FAVORÁVEL

valor de modo a beneficiar as populações pobres, abordagem orientada para o mercado) para desenvol-
não apenas em termos de rendimentos, mas também
Une volonté ver a indústria regional.
politique e de alimentação. No seio da Comunidade
de saúde
das Caraíbas (CARICOM), o Instituto de Investigação As regiões, pontas de lança
e Desenvolvimento Agrícola das Caraíbas (CARDI) tra- O desenvolvimento das cadeias de valor é parte inte-
balha com o modelo de cadeias de valor (coordena- grante do Programa Integrado para o Desenvolvimento
ção entre os actores, valor acrescentado a cada etapa, da Agricultura em África (PDDAA) da NEPAD, no

reportagem
diplomas depois de terem montado uma
oficina de transformação agro-alimentar,
que funcione adequadamente. Os
estudantes podem escolher entre a
transformação de farinhas e sucedâneos,
frutos, leite, legumes, produtos de
carne, aves ou peixe. A formação inclui
uma componente de gestão, destinada a
ensinar aos estudantes a voarem com as
suas próprias asas.
A presença do ISTACHA em Kimpese,
cidade hortícola, é uma dádiva para
os agricultores. “Sei que com esta
instituição tenho a garantia de escoar a
minha malagueta”, diz Alain Lukebana,
entusiasmado. Tal como ele, são muitos
© A. Nekwa Makwala

© A. Nekwa Makwala

os agricultores que encontraram um


canal para vender a sua produção.
Os consumidores dos produtos do
ISTACHA são geralmente citadinos.
“Algumas pessoas apenas confiam
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA nestes produtos, sobretudo a
DO CONGO (ISTACHA), a primeira instituição chickwangue, porque são naturais e são

A formação,
universitária agro-alimentar da RDC, bem embalados”, explica um vendedor
criada em 2005. Este país, que se de alimentos de “Didier Chic” em Matadi
debate com uma enorme carência de (a 365 km de Kinshasa). Héritier Lusadisu
um elo indústria alimentar, importa, a preço de
ouro, uma grande parte dos produtos
é um destes compradores “Tenho mais
confiança nestes produtos e compro-os
indispensável de consumo corrente. Não obstante,
não há falta de matérias-primas.
para incentivar os produtores”, declara.
Não satisfeito em desenvolver os laços
Na República Democrática do Congo Grandes quantidades de fruta e legumes entre os produtores e os consumidores,
(RDC), várias lojas de alimentos e apodrecem, por falta de conservação. Charles Kusita também estimula a
supermercados de Kinshasa e da Estes produtos são transformados pelos cooperação a plano nacional. No início
província do Baixo Congo (no Sudoeste) estudantes do ISTACHA em modernas de Abril, recebeu a visita do Ministro
vendem produtos agro-alimentares instalações. “A construção dum futuro da Indústria que ficou impressionado
com o rótulo “Centro de Informação e alimentar colectivo na RDC é possível com os seus produtos agro-alimentares.
Extensão Agro-Alimentar de Kimpese se cada um de nós criar o seu próprio Segundo o Director do ISTACHA, os
(CIVAK)”. Chickwangue (pão de emprego”, declara o padre Charles produtos agro-alimentares podem
mandioca), compotas, malaguetas Kusita, fundador e Director-Geral da alimentar a província e Kinshasa com os
em boiões, etc. Estes produtos, escola. Neste instituto, o programa seus 15 milhões de habitantes. “É tudo
bem acondicionados, são obra dos dedica mais tempo à prática do que à uma questão de formação, de redes… e
estudantes do Instituto Superior de teoria. Ao fim de três meses de ensino, de políticas”, conclui.
Técnicas Aplicadas em Química Alimentar os estudantes só recebem os seus Alphonse Nekwa Makwala

30 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


seu “pilar II”: quadro de melhoria das infra-estru- agrícolas, reforçar as capacidades africanas para que o
turas rurais e da capacidade
Définir les chaînes comercial de acesso aos
Mariages d’affairescontinente se torne um actor importante
Opportunités na economia
Une volonté
de valeur
mercados, que inclui um “domínio estratégico” de agrícola mundial,
et risquese limitar a nova corrida mundial às
politique
desenvolvimento da cadeia de valor e do acesso aos terras e aos recursos hídricos de África e gerir as alte-
serviços financeiros. rações climáticas.
A Comissão Económica para a África (CEA) promo- Nas Caraíbas, onde as importações constituem a
base da segurança alimentar, o fortalecimento regio-

“Trata-se de atenuar a fragmentação nal da agricultura é uma preocupação constante dos

do mercado agrícola regional africano”


veu uma iniciativa destinada à criação e à promoção
de cadeias de valor regionais para os produtos alimen-
tares agrícolas estratégicos em África. Duas comuni-

© USAID West Africa Trade Hub


dades económicas regionais: o Mercado Comum da
África Oriental e Austral (COMESA) e a Comunidade
Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO)
implementaram, a partir de 2006, um projecto-pilo-
to assente em três produtos: gado, milho e arroz. O
processo é conduzido em parceria com a Comissão
da União Africana (CUA) e a FAO. A participação de
outros parceiros de desenvolvimento e de centros de Uma conferencista Estados, através do Programa de
explica o
investigação nacionais e internacionais também visa funcionamento Transformação Agrícola Regional
facilitar o processo. Trata-se de atenuar a fragmen- da cadeia de da CARICOM (Caricom Regional
valor do Karité.
tação do mercado agrícola regional africano e criar Transformation Programme for
um sector agro-alimentar e agro-industrial dinâmico, Agriculture). A batata-doce, a ma-
a fim de vincular os agricultores simultaneamente lagueta e o coco são as cadeias de valor que benefi-
aos meios de produção e aos mercados de produtos ciam de uma atenção particular à escala regional.

Esquema de uma cadeia de valor e dos factores


de política e institucionais com impacto nos resultados
Transformação

Produção Recolha Venda por grosso Venda a retalho Consumo

Factores-chave institucionais/de política influenciando as dinâmicas e o comportamento dos actores

Leis fundiárias Regulamentos Política sobre investimento directo estrangeiro Preferências culturais
do mercado

Regime fundiário
consuetudinário Infra-estruturas Imposto sobre vendas
Política Estratégias de aquisição
Serviços industrial de negócios Atitudes
governamentais Taxas sobre serviços dos consumidores
© Intactile Design. Fonte Vermeulen et. al 2008

Normas Empresariais de Qualidade e Segurança Alimentar

Normas Públicas de Qualidade e Segurança Alimentar

Organizações de produtores/cooperativas

Lei das cooperativas Tarifas de importação

Práticas de corrupção no comércio

Cultura individual dos agricultores Zoneamento do uso


da terra

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 31


A palavra aos especialistas
3 | Agir pour moderniser

Une volonté
politique Josué Dioné

Empregos para o futuro


Qual o papel africanos é a grande fragmentação dos acesso seguro a bens produtivos (especial-
dos Governos e mercados. A integração regional deveria mente à terra) e a insumos fiáveis e bara-
© UNECA

das políticas no resolver o problema da fragmentação dos tos. Nos anos mais recentes, tem-se assisti-
desenvolvimento mercados (54 países e mais de uma dúzia do em África a um crescente investimento
Dr. Josué Dioné, das cadeias de agrupamentos sub-regionais) tendo em estrangeiro directo na terra arável, o que,
Director, Divisão de de valor? vista a concretização do potencial do co- em si, é positivo desde que traga consigo
Segurança Alimentar Os Estados têm de mércio alimentar intra-africano. um investimento significativo e efectivo
e Desenvolvimento definir e dirigir a vi- Em primeiro lugar, a integração regio- na agricultura africana. Todavia, muitos
Sustentável, Comissão são. Num ambiente nal deveria permitir criar economias de casos de aquisição de terra em larga es-
Económica das Nações económico cada complementaridade entre as diferentes cala através de acordos de investimento
Unidas para África (UNECA) vez mais globaliza- sub-regiões, especialmente através da co- estrangeiro directo têm resultado em si-
www.uneca.org do e competitivo, operação regional, para desenvolver cin- tuações em que as comunidades locais e
determinado pelos turas estratégicas de bens alimentares e os pequenos agricultores visados não são
mercados, há a necessidade de adoptar uma agrícolas (por ex. milho, arroz, lacticínios, envolvidos ou consultados, e acabam des-
estratégia abrangente de desenvolvimento gado/carne, etc.), baseadas em vantagens tituídos de direitos e bens. É também im-
e transformação da agricultura, e de inci- comparativas de natureza agro-ecológica. portante promover e fazer vigorar regimes
dir em todo o sistema agrícola e alimentar Em segundo lugar, a integração regional contratuais inovadores (tais como agricul-
em vez de numa agricultura estreitamente deveria ajudar a criar economias de maior tura contratual, esquemas de produção
limitada ao cultivo. Temos de passar de es- escala em todas as fases das cadeias de integrada e trocas de mercadorias) para
tratégias e programas específicos para as valor, especialmente nas fases de agro- ajudar a integrar os pequenos agricultores
diferentes fases da cadeia de valor (cultivo, -indústria e agro-negócio, que muitas ve- no desenvolvimento de cadeias de valor,
agro-indústria, comercialização, etc.), em zes requerem uma escala mínima para ser ligando-os a empresas de agro-negócios.
separado e fragmentariamente, para uma viáveis e rentáveis. Em terceiro lugar, a
perspectiva integrada de desenvolvimento integração regional deveria criar também Qual o papel da UNECA no
de todas as fases da totalidade das cadeias economias de coordenação vertical, atra- desenvolvimento das cadeias de
de valor. Os Estados têm a responsabilidade vés da redução dos custos de transacção valor?
de criar um ambiente institucional e regu- entre os actores-chave dos sectores produ- Desde 2003, a UNECA apoia com suces-
lador favorável ao investimento, e forne- tivo e de serviços pertencentes à cadeia de so a Comissão da União Africana na de-
cer os bens e serviços públicos necessários valor. Em quarto lugar, a ligação dos cam- fesa e na ajuda à operacionalização para
(particularmente I&D, infra-estruturas, fa- pos agrícolas ao mercado, tanto ao nível o desenvolvimento de cadeias de valor
cilitação comercial, etc.) para estimular o nacional como regional, pode ser também alimentares e agrícolas coordenadas re-
investimento do sector privado e assegurar uma fonte importante de criação de em- gionalmente, no quadro do Programa
a rentabilidade deste último. pregos e receitas. Integrado para o Desenvolvimento da
As políticas devem visar a eliminação de Agricultura em África (CAADP) da NEPAD.
todas as barreiras ao investimento e ao co- Que papel devem ter as Actualmente, estamos a trabalhar no alar-
mércio. As políticas devem igualmente criar autoridades públicas na promoção gamento de parcerias multi-institucionais
incentivos ao investimento, com eficiência da inclusão e da participação com a COMESA e a ECOWAS (incluindo
crescente em todas as fases da cadeia de va- dos pequenos produtores nas a FAO, o CTA e com forte interesse da
lor. São particularmente importantes códigos cadeias de valor agrícolas? UNCTAD e da UNIDO), para operacionali-
de investimento, políticas fiscais, políticas É óbvio que nem todos os actores das ca- zar esta mudança de paradigma através de
fundiárias, etc., que promovam a segurança deias de valor têm o mesmo poder opera- uma abordagem integrada da agricultura
e a rentabilidade do investimento privado. cional e de negociação. Ajudar ao envol- ao mercado para desenvolver cadeias de
vimento dos pequenos agricultores em valor de produtos do milho, arroz e gado.
Qual a importância da integração cadeias de valor implica facilitar e apoiar Com base na experiência obtida nestes es-
regional para o desenvolvimento das as organizações de agricultores e coope- forços piloto, pensamos alargar este traba-
cadeias de valor? rativas a reforçarem a sua capacidade de lho a outros produtos alimentares e agrí-
Um dos principais obstáculos ao desenvol- participação. Requer também a garantia colas estratégicos e a outras sub-regiões de
vimento da indústria e do agro-negócio de que os pequenos produtores tenham África.

32 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012


reportagem

Définir les chaînes Mariages d’affaires Opportunités Une volonté


FIJI de valeur et risques politique

Aliança entre público e privado


Devido à sua localização, a milhares de quilómetros de
distância dos mercados-alvo, a indústria de papaia das
Fiji tem nos custos de transporte e logística um poderoso
© D. Tabureguci

obstáculo. Todavia, uma parceria público-privada achou


uma forma de reduzir os custos de expedição quase para
metade – e de duplicar as exportações.
Tal como com todas as ilhas do Pacífico, a cadeia da papaia, e solucionar alguns Queensland, a NWC e a empresa de agro-
a localização remota das Fiji constitui um dos problemas que ainda subsistem, a -negócios baseada nas Fiji, Koko Siga Fiji.
sério obstáculo às exportações, sendo os indústria associou-se ao sector público
custos de transporte um entrave comercial para criar o Projecto Fiji Papaya, com Testar o mercado
significativo. Para contrariar esta situação, apoio do Centro Australiano de Pesquisa A Produce Specialities Ltd, empresa de
uma cooperativa está a conduzir uma Agrícola Internacional (ACIAR). produção e exportação de papaia, foi
dinâmica iniciativa público-privada escolhida para a experiência de expedição
destinada a melhorar a cadeia de valor, Subida acentuada dos custos marítima, e participou com fruta, caixas de
reduzindo os custos e assegurando a Um grande desafio, nos últimos cartão e material de embalagem com 6,5
alta qualidade do produto fornecido ao 3 anos, tem sido a subida dos custos. toneladas de carga. O Projecto Fiji Papaya
mercado. Os exportadores enfrentam aumentos cobriu os custos do frete e deu apoio
O desenvolvimento da fábrica exportadora nos custos de expedição, os preços de técnico e equipamento de monitorização.
Fiji Papaya Fresh, necessária na electricidade dispararam, o tratamento “Além dos tratamentos técnicos, a
sequência do declínio da indústria do da quarentena e a embalagem experiência também nos permitiu testar
açúcar, tem sido orientado pela Nature’s aumentaram quase 30% e os encargos a receptividade da papaia das Fiji no
Way Cooperative (Fiji) Ltd. (NWC). Esta com a biossegurança subiram 25%. O mercado,” diz Kyle Stice, um especialista
cooperativa industrial, criada em 1995 projecto trabalha para diminuir a pressão em horticultura tropical e cadeias de valor,
para cumprir a quarentena obrigatória das económica recorrendo à expedição que coordenou o projecto. “Dantes as Fiji
frutas transportadas por via aérea, é agora marítima, e a uma embalagem à base enviavam por via aérea cerca de 700 caixas
um próspero agro-negócio que fornece de papel de jornal em vez de espuma, por semana para a Nova Zelândia. Com
aos cultivadores serviços técnicos, de conseguindo uma poupança de 80%. o frete marítimo passaram a enviar 1300
embalagem e comercialização. A empresa Durante anos, os cultivadores de papaia caixas por semana.”
tem mais de 140 accionistas, quase todos nas Fiji usavam os aviões que traziam A experiência foi um sucesso comercial. Na
pequenos agricultores. os turistas às ilhas para expedir a sua Nova Zelândia, o projecto contava com a
As exportações de papaia das Fiji produção aos compradores, mas o custo era colaboração do importador, a Fresh Direct,
começaram em 1996, com o envio de cerca exorbitante. Em 2011, a decisão de tentar que fez a promoção da papaia das Fiji nas
de 33 toneladas para a Nova Zelândia. um frete marítimo para a Nova Zelândia lojas e vendeu a totalidade do contentor
Nestes últimos 15 anos a indústria revelou que os custos de transporte podiam experimental numa única semana. O
cresceu, exportando actualmente cerca ser reduzidos até perto de 60%. Para a Projecto Fiji Papaya trabalha agora com
de 800 toneladas anuais para quatro dos experiência de envio por barco, o projecto fabricantes locais de caixas de cartão na
principais mercados transoceânicos – recorreu a especialistas internacionais concepção de caixas mais adequadas ao
Austrália, Hong Kong, Japão e Nova através de parcerias com organizações frete marítimo, que permitam a refrigeração
Zelândia. de pesquisa e com a indústria. As em trânsito e o amadurecimento quando a
A NWC tem sempre trabalhado em parceria questões principais eram como travar o fruta já está no destino.
com os sectores público e privado. A amadurecimento durante a longa rota “Esta bem-sucedida parceria público-
papaia é uma complexa mas próspera marítima, e a necessidade de caixas -privada pode servir de modelo para
cadeia de valor na qual participam muitos de cartão que protegessem a fruta e a outros frutos e vegetais, ajudando a elevar
actores, com envolvimento público no mantivessem fresca. Entre estes parceiros, os padrões de qualidade e as expectativas
que toca à pesquisa e inspecção da incluem-se o Secretariado da Comunidade a todos os níveis”, afirma o Dr. Richard
quarentena, e envolvimento privado em do Pacífico, o Ministério do Emprego, Markham, da ACIAR.
todas as fases da cadeia. Para desenvolver Desenvolvimento Económico e Inovação de Dionisia Tabureguci

JULHO 2012 | Esporo Número ESPECIAL | 33


UM CASO EXEMPLAR

ENTREVISTA
Une volonté
politique Normalização, a chave de novos mercados
Em 2007, a Agência comercial do país, com uma herança desenvolvendo as marcas para que se
de Normalização de 20 anos de controlo estatal. Todos destaquem no mercado. Houve uma
© M. Andriatiana

de Madagáscar se tornaram operadores, sem o mínimo altura em que os produtores cortavam o


(BNM) elevou o respeito pela qualidade dos produtos seu café para produzirem milho e arroz.
nível das normas e muito menos pelas normas. As Cabe à BNM convencê-los do interesse
dos produtos exportações acusaram o golpe: toneladas das culturas de mercado, respeitando
Patrick Ravoaraharison de exportação de contentores de produtos foram as normas. Em Madagáscar, o grupo
é o Director-Geral malgaxes, com recusadas pelos importadores europeus, ECOCERT (organismo privado de controlo
da Agência de
Normalização de
uma “abordagem americanos e canadianos. Lembro- e de certificação biológica) emite a
Madagáscar (Bureau orientada ao -me de líchias mal acondicionadas que certificação para o mercado europeu.
des normes de cliente”. Objectivo: apodreceram no porto de descarga, Temos no país vários produtores cujos
Madagascar – BNM). responder melhor detritos metálicos descobertos nas vagens produtos (nomeadamente o cacau,
A BNM é membro- às expectativas de baunilha. Madagáscar esteve a ponto o café, as especiarias e os óleos
-correspondente
da Organização
do consumidor. de perder a sua posição de primeiro essenciais como o ylang ylang) têm uma
Internacional de produtor mundial de baunilha. certificação biológica.
Qual é a missão
Normalização (ISO) e As normas antigas tratavam sobretudo
membro permanente
da Agência de Quais são os principais obstáculos
do acondicionamento de produtos, não
da Organização Normalização de enfrentados pela BNM e
mencionando a qualidade. Actualmente
Regional Africana de Madagáscar (BNM)? como são ultrapassados?
Normalização (ORAN)
são muito mais exactas e há laboratórios
A Agência foi criada Em Madagáscar não temos uma cultura
(African Organisation de análise, como o Instituto Pasteur de
em 1999, sob tutela de normas e de qualidade, o que pode
for Standardisation – Madagáscar (IPM), e o Centro Técnico
ARSO).
do Ministério do explicar-se pelos 20 anos de revolução
Hortícola de Toamasina (CTHT), que
Comércio, para socialista e controlo económico estatal
efectuam controlos regulares.
implementar a política nacional de que o país conheceu, que tornaram os
normalização, certificação e qualidade. De que maneira a BNM contribuiu cidadãos menos responsáveis.
Cabe-lhe garantir tanto a qualidade dos para o desenvolvimento das O essencial é a tomada de consciência
produtos como a aplicação voluntária cadeias de valor e para a de todos os actores envolvidos.
das normas pelos vários actores. promoção das exportações? Madagáscar tem necessidade de infra-
Em 2007, Madagáscar decidiu actualizar A adesão dos actores e a aceitação das -estruturas e de um ambiente legislativo
as suas normas, com o apoio da UE, para normas são importantes. Para tal, a BNM favorável, de transparência e de boa
promover a exportação de produtos de criou, para cada produto, um comité governação. Depois fica nas mãos dos
mercado, tais como líchias, café, cravo- técnico de normalização composto por operadores entrarem no jogo, pois a
-da-índia, cacau, pimenta e baunilha. actores a todos os níveis: produtores, aplicação das normas agora é voluntária.
A lógica da “abordagem orientada ao consumidores, sectores económicos Depende da sua vontade aumentar
cliente” foi privilegiada para melhor e científicos, administração pública. ou não a qualidade dos produtos e de
servir a política comercial do país. E há Também formamos os actores sobre as desenvolver as exportações.
uma razão para tal: a liberalização em normas. Para aumentar as exportações, Entrevista conduzida por:
1988 da economia alterou o cenário a agência promove nichos de mercado, Mamy Andriatiana

NEPAD
Para mais informações http://tinyurl.com/6wvw2gf
http://tinyurl.com/3uly4dd

SOS Faim
FAO OCDE Mise en valeur d’une production paysanne:
Formação em cadeias de valor Aide pour le commerce : cas d’expérience. rôle d’Harbu Microfinance dans la filière
http://tinyurl.com/8265vms Appui à la filière café du Cameroun soja en région Oromo (Etiópia) in Zoom
http://tinyurl.com/7kkmeor microfinance, número 33, Setembro de 2011.
IFPRI
http://tinyurl.com/chndawr ONUDI / UNIDO http://tinyurl.com/d5gqnzy
Organização das Nações Unidas para o
ILO UNECA
Desenvolvimento Industrial
Value Chain Development for Decent Work Relatório sobre a criação e a promoção de
“Upgrading Value Chains” de Stefano Ponte in
A guide for development practitioners, Agribusiness for Africa’s Prosperity cadeias de valor regionais para os produtos
government and private sector initiatives K.-K. Yumkella, P. –M. Kormawa, T. –M. alimentares e agrícolas estratégicos em África.
http://tinyurl.com/cpdrbkq Roepstorff, A. –M. Hawkins, págs. 87 a 134 http://tinyurl.com/d4md693

34 | Esporo Número ESPECIAL | JULHO 2012

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