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Fundamentos de Microeconomia I

Marcelo Verdini e Yihao Lin

Abril de 2020 - Draft

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1 Introdução

O objetivo das notas de aula é orientar o aluno sobre os temos cobertos em sala de aula. De
forma alguma, substitui a leitura das referências indicadas no plano de ensino.

Como está em constante evolução, quaisquer comentários, críticas ou sugestões serão muito
bem vindos.

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2 Teoria do Consumidor

Nesse curso, estudamos a teoria da decisão individual. Como vimos na aulas introdutórias, o
problema do agente econômico se resume a escolhas diante da escassez de recursos. Assim, pre-
cisamos caracterizar o problema do consumidor sob a ótica econômica tradicional (abordagem
marginalista/neoclássica). Nesse sentido, faz-se necessário entender:

1. Como os agentes econômicos descrevem suas preferências (que são consideradas estáveis)
em relação a objetos disponíveis;

2. Dado que os objetos disponíveis são escassos (existem restrições financeiras, físicas, e
sociais/políticas), como isso se reflete em restrições às escolhas dos agentes.

Após essa caracterização, especificamos e resolvemos o problema do consumidor, além de estu-


dar extensões sobre o resultado encontrado.

De forma simples, podemos considerar que o problema do consumidor é o seguinte: Qual a me-
lhor cesta de consumo desejada (de acordo com suas "preferências/utilidade") que o consumidor
é capaz de consumir? Ser capaz de consumir significa ter recursos, especialmente financeiros,
que o permitam comprar os bens desejados ("restrição orçamentária").

Iremos a seguir estruturar o problema acima em um modelo matemático de decisão.

2.1 Preferências e Utilidade

• Preferências
Seja X ⊆ Rn+ o conjunto de todas as cestas que podem ser consumidas (cestas factíveis)
denominado por Conjunto de Consumo. Esse conjunto contém todas as possibilidades
de consumo que um agente pode vir a ter. Um elemento desse conjunto, x ∈ X, é chamado
de cesta de consumo e é representado por um vetor x = (x1 , x2 , ..., xn ). Por exemplo,
quando n = 2 e daí X ⊆ R2+ , sejam duas cestas de consumo denotadas por x = (x1 , x2 ) e
y = (y1 , y2 ), onde cada elemento do vetor representa a quantidade consumível de um bem
de consumo distinto, isto é, x1 e y1 representam diferentes quantidades de um mesmo
bem.
Precisamos definir como um consumidor pode exprimir sua preferência em relação a di-
ferentes cestas que lhe são apresentadas.

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Utilizamos uma relação binária denominada Relação de Preferências, representada
pelo símbolo , onde os desejos dos indivíduos se dão da seguinte forma: x é fracamente
preferível a y, x  y, se para o indivíduo a cesta x é "pelo menos tão boa quanto"a cesta
y.
Dessa definição, decorrem o seguinte

1. Preferência Estrita: Dizemos que x é estritamente preferida a y, x  y, se


o consumidor prefere estritamente adquirir a cesta x em detrimento da cesta y.
Em outras palavras, temos que se as cestas x e y estiverem disponíveis para serem
adquiridas, o consumidor irá optar sempre pela cesta x. Matematicamente, temos
que x  y, se x  y mas não y  x (ou y 6 x).
2. Indiferença: Dizemos que o consumidor é indiferente entre as cestas x e y, x ∼ y,
se ele se mostra indiferente entre escolher qualquer uma das duas, isto é, x é pelo
menos tão boa quanto y e y é pelo menos tão boa quanto x, isto é, se x  y e y  x,
então x ∼ y .

Note que quando um consumidor, ao se deparar com duas cestas x e y, exprime a seguinte
relação de preferências x  y, não podemos afirmar de pronto se a cesta x é indiferente a
cesta y ou se x é estritamente preferível a y!
Modelamos o comportamento de um indivíduo a partir de um conceito de escolha racio-
nal, isto é, queremos que o agente apresente uma certa noção de consistência entre suas
preferências. Para tal, adotamos dois axiomas: completude e transitividade.

Definition 2.1. Dizemos que uma relação de preferências () é completa se dadas
quaisquer duas cestas de consumo x e y ∈ X é possível compará-las, isto é, temos uma
das seguintes possibilidades:

1. x é preferível a y, (x  y) ou
2. y é preferível a x, (y  x) ou
3. x é indiferente a y, (x ∼ y)

Definition 2.2. Dizemos que uma relação de preferências é transitiva se dadas quaisquer
três cestas de consumo x, y e z ∈ X, se x é preferível a y e y é preferível a z, então devemos
ter que x é preferível a z.
Isto é, sob completude sempre é possível comparar quaisquer duas cestas e sob transi-
tividade, adicionamos um certo grau de consistência na ordenação das preferências do
indivíduo.

Definition 2.3. Dizemos que uma relação de preferências  é racional se ela é completa
e transitiva.

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Remark. A Reflexividade, x ∼ x, é uma consequência direta dos axiomas da transitivi-
dade e da completude. Tentem como exercício demonstrar.

• Curvas de Indiferença
As curvas de indiferença são uma forma gráfica de descrever as preferências de um con-
sumidor. Seja X o conjunto de todas as cestas disponíveis de consumo. Definimos os
seguintes conjuntos:

1. Conjunto de Indiferença: O conjunto de indiferença de y é definido por:


CI(y) = {x ∈ X : x ∼ y}
2. Conjunto Contorno Superior : O conjunto contorno superior de y é definido por:
CCS(y) = {x ∈ X : x  y}
3. Conjunto Contorno Inferior : O conjunto contorno inferior de y é definido por:
CCI(y) = {x ∈ X : y  x}

A figura a seguir ilustra uma curva de indiferença, onde nos eixos temos as quantidades
consumidas do bem 1 e do bem 2. Todas as cestas de consumo que se localizam sobre a
mesma curva de indiferença são indiferentes para o consumidror.

Figura 1: a curva de indiferença é formada pelo CI(x) onde x = (x1 , x2 )

A parte sombreada do gráfico (incluindo a própria curva de indiferença) representa o


CCS(x), isto é, são as cestas que são fracamente preferidas à x. Por outro lado, a região
abaixo da curva de indiferença (incluindo a própria curva de indiferença) representa o

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CCI(x), isto é, para qualquer y no conjunto de contorno inferior, temos que x é pelo
menos tão boa quanto y.
A transitividade das preferências implica em uma importante propriedade das curvas
de indiferença: duas curvas de indiferença distintas (que denotam diferentes níveis de
preferências) nunca se cruzam.

Proposition 2.4. Assumindo a transitividade das preferências, duas curvas de indife-


rença distintas nunca se cruzam.

Demonstração: Sejam três cestas dadas por x, y e z. Assuma que duas curvas de indife-
rença distintas se cruzam e considere as cestas x, y e z, conforme gráfico abaixo, sendo
z a cesta que se encontra exatamente no cruzamento das curvas de indiferença. Nessa
situação, as cestas x e z pertencem a mesma curva de indiferença, que podemos denomi-
nar de C1 e, ao mesmo tempo, as cestas z e y pertencem a outra curva de indiferença,
denominada por C2 . Como, por hipótese, as curvas de indiferença representam níveis
distintos de preferência, podemos considerar que necessariamente x  y.
Por outro lado, sob a hipótese de transitividade e pela definição de curvas de indiferença,
temos que, z ∼ y e x ∼ z. Mas então, x ∼ y. Isso é uma contradição!!
Portanto, na presença de transitividade das preferências, curvas de indiferença dis-
tintas não podem se cruzar. CQD.

Figura 2: Duas curvas de indiferença não podem se cruzar

Como consequência (corolário) da proposição acima, temos dois resultados importantes:

1. as curvas de indiferença devem ser paralelas entre si.

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2. podemos construir um mapa de indiferença formado por todas as curvas de indife-
rença que representam níveis distintos de preferências (são também conhecidas como
curvas de nível).

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• Propriedades Adicionais

1. Desejabilidade
É razaoável questionar se, ao oferecermos uma maior quantidade de um, ou mais
bens, de uma cesta a um consumidor, qual seria a preferência desse consumidor em
relação a essa nova cesta. Estritamente preferível ou indiferente? Por exemplo,dadas
duas cestas distintas (x1 , x2 ) e (y1 , y2 ) onde x1 6= y1 e x2 6= y2 como o consumidor
pode classificá-las de acordo com a sua preferência?
A desejabilidade é responsável por relacionar as quantidades dos bens consumidos
com as preferências do agente. É natural assumir que, em regra, maiores quantidades
de bens são preferíveis a menores quantidades. Essa noção é capturada pela definição
de monotonicidade.
Iremos assumir que sempre é possível o consumo de quantidades cada vez maiores
de uma cesta. Isto é, se x ∈ X e y ≥ x, então y ∈ X.
Definition 2.5. Dizemos que uma relação de preferências  é estritamente mo-
nótona (monotônica), ou simplesmente monótona (monotônica), se x ∈ X e
y >> x implica que y  x. Ou seja, se todo elemento da cesta y é de quantidade
estritamente maior que a da cesta x (y >> x), então y  x.
Definition 2.6. Dizemos que uma relação de preferências  é fortemente mo-
nótona se dadas as cestas x e y, tivermos que y ≥ x e pelo menos um bem com
quantidade estritamente maior (y 6= x), então temos que y  x .1
Remark. O Varian define em seu livro o conceito de monotonicidade forte, mas
apenas o denomina de monotonicidade, sem fazer qualquer referência à definição
de monotonicidade estrita. Entretanto, estamos seguindo a convenção da maior
parte da literatura técnica nas definições 2.4 e 2.5 acima, monotonicidade estrita (ou
monotonicidade) e monotonicidade forte.

Repare que a definição de preferências monotônicas permite a existência de indife-


rença entre uma cesta x e uma cesta y, mesmo que um bem da cesta x, mas não
todos, esteja presente em quantidades maiores. Por quê?
Por outro lado, monotonicidade forte exige que, se uma cesta y é maior do que
uma cesta x, em que pelo menos um elemento seja estritamente maior, y deva ser
estritamente preferível a x.
Example 2.7. Considere duas cestas x = (1, 1) e y = (1, 2). Se  é fortemente
monotônica, então podemos afirmar que y  x.
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Podemos encontrar em alguns livros uma outra classificação para monotnicidade, a monotonicidade fraca.
Dizemos que uma relação de preferências  é fracamente monótona se dadas as cestas x = (x1 , x2 ) e
y = (y1 , y2 ) tais que x1 ≥ y1 e x2 ≥ y2 então x  y.

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Remark. Consequências das definições:
(a) Preferências estritamente monótonas e fortemente monótonas ⇒ curvas de in-
diferença não podem ser grossas e não podem ter inclinação positiva;
(b) Monotonicidade forte ⇒ monotonicidade estrita, mas a recíproca não é ver-
dadeira. Ou seja, monotonicade forte é uma hipótese mais restritiva do que
monotonicidade estrita.

Existe uma propriedade menos restritiva do que monotonicidade que é largamente


adotada na teoria das decisões: Não-saciedade local
Ao representarmos as preferências dos agentes em relação aos bens de consumo,
queremos de alguma forma expressar uma noção de que o desejo por consumo é
ilimitado. Em outras palavras, queremos que sempre exista alguma forma de me-
lhorarmos estritamente a situação em que um indivíduo se encontra por meio de
ajustes na composição de cestas de consumo. Formalmente, temos o conceito de
não-saciedade local, que é dado por:
Definition 2.8. Dizemos que uma  é não-saciável localmente se para todo
x ∈ X e para todo ε > 0, existir y ∈ X tal que kx − yk < ε e y  x.

Em palavras, a definição acima nos diz que para qualquer vizinhança de uma cesta
x (não importa o quão pequena seja essa vizinhança, uma vez que podemos escolher
ε o tão próximo de zero o quanto quisermos) sempre existirá uma cesta y na qual
o consumidor irá preferir y à x. Repare que diferentemente de monotonicidade,
não precisamos necessariamente aumentar o consumo de algum bem para expressar
preferência. A ideia está ilustrada no gráfico da figura 3.

Figura 3: Vizinhança de x é representado pelo círculo e y  x sob não-saciedade local

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Remark. Se as preferências apresentam não-saciedade local, então as curvas de
indiferença não podem ser grossas. Mas elas podem ter inclinação positiva?

Os conceitos de não-saciedade local e monotonicidade estão fortemente ligados. Sob


a ideia de que um consumidor sempre irá preferir consumir mais do que menos, temos
que se a preferência  for monotônica, então ela automaticamente será localmente
não saciável. Note que na figura 3, temos que o ponto y representa uma cesta de
bens que possui quantidades estritamentes maiores dos bens 1 e 2. Mas também,
pela não-saciedade local, podemos encontrar uma cesta com menor quantidade de
um dos bens e ainda assim essa cesta ser estritamente preferível!
Em suma temos que:
(a) se  é fortemente monotônica, então é estritamente monotônica.
(b) se  é estritamente monotônica, então é localmente não saciável.
(c) se  não é localmente não saciável, então não é estritamente monotônica.

2. Convexidade
Esta propriedade está relacionada ao fato de o consumidor se deparar com trade-offs
ao desejar consumir diferentes cestas de bens. É natural pensarmos que o consumidor
prefira sempre diversificar seu consumo em detrimento a consumo extremo de certos
bens. Podemos pensar que sob  convexas se misturarmos uma cesta x com uma
cesta pelo menos tão boa quanto ela y, devemos estar em situação pelo menos tão
boa quanto consumir apenas a cesta x. Formalmente, temos que:
Definition 2.9. Dizemos que uma  é convexa se dados y  x , z  x e α ∈ [0, 1],
tivermos que αy + (1 − α)z  x.
Definition 2.10. Dizemos que uma  é estritamente convexa se dados y  x ,
z  x e α ∈ (0, 1), tivermos que αy + (1 − α)z  x.

Figura 4: Preferências convexas, note que z  x, y  x e αy + (1 − αz)  x

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Remark. Sob  convexa, devemos ter o conjunto de contorno superior convexo.

A convexidade é uma hipótese forte, mas importante, em economia. Uma das con-
sequências dessa hipótese será vista quando tratarmos de taxa marginal de substi-
tuição. Uma segunda consequência é a preferência dos agentes pela diversificação.

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• Função Utilidade
A função utilidade é um modo útil, e mais tratável, de representar as preferências dos
agentes ao atribuir um número a cada possível cesta de consumo, de modo que se atribua
números maiores para as cestas mais preferidas. Por quê?
Como a relação de preferências é uma relação binária, o estudo do comportamento do
consumidor teria que ser realizado cesta por cesta, de cada vez. Esse tratamento não é
muito útil e pode consumir muito tempo de análise. Caso sejamos capazes de descrever
as preferências de um agente por intermédio de fórmulas matemáticas, poderíamos então
melhor instrumentalizar a análise, por meio de técnicas matemáticas de cálculo.
A ferramenta que surge, então, é a função utilidade.
De maneira mais formal, temos que a função utilidade é representada por U : X → R,
onde X representa o conjunto de consumo.
Embora atribua-se valores mais elevados de utilidade a cestas que mais se deseja, a te-
oria tradicional considera que o valor absoluto dos números atribuidos não é relevante,
isto é, somente nos interessa a ordenação que estes valores atribuem às cestas de con-
sumo. Dizemos, portanto, que a função de utilidade tem propriedades ordinais (Teoria
Ordinal).

Remark. A função de utilidade tem propriedades cardinais em algumas aplicações em


economia. Porém a microeconomia atual adota de forma geral a função de utilidade
apenas como forma de ordenação.

Definition 2.11. Uma função qualquer u : X → R é uma função de utilidade que


representa a relação de preferências , se vale a seguinte propriedade: ∀x, y ∈ X,
temos que x  y ⇐⇒ u(x) ≥ u(y). Em palavras, x será pelo menos tão boa quanto y,
se e somente se, a utilidade atribuida a cesta x for maior ou igual a utilidade atribuida a
cesta y.

A consequência direta da definição acima é que a função de utilidade ao representar uma


relação de preferências  herda consigo a propriedade de que duas cestas em uma mesma
curva de indiferença deverão ter a mesma utilidade, i.e., u(x) = u(y).
Por outro lado, se observarmos que u(x) > u(y), então a cesta x encontra-se em uma
curva de indiferença "superior"a que y se encontra, e portanto, x  y.
Como nosso objetivo é garantir a existência de uma função utilidade que represente as
preferências dos agentes, quais são as propriedades sobre a relação de preferências sufici-
entes para tal? Com as hipóteses adotadas até agora, só podemos determinar o seguinte
resultado: se existe uma função utilidade que representa a relação de preferências ,
então a relação de preferências é racional. Ou seja, racionalidade das preferências é uma

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condição necessária para a existência da função utilidade. Isto quer dizer que a racio-
nalidade por si só não garante a existência de uma função utilidade que represente as
preferências. O exemplo tradicional é o das preferências lexicográficas, que são racionais,
mas não existe função utilidade que as represente! Veremos daqui a pouco.
Uma hipótese importante para a existência de uma função utilidade que represente  é
de continuidade.

Definition 2.12. A relação de preferências  é contínua se quando x  y tivermos que:

1. Existe bola de centro x tal que para toda cesta pertencente à bola, temos que ela
também é preferida a y.
2. Existe bola de centro y tal que para toda cesta pertencente a esta bola, temos que
x  y.

A ideia por trás do conceito de continuidade é a de que as preferências do consumidor


não podem exibir "saltos", isto é, se tivermos duas sequência de cestas dadas por {xn } e
{yn } tal que, para todo n ∈ N, xn  yn , então no limite destas sequências devemos ter
que as preferências irão se manter. Isto é, para um sequência de cestas {(xn , yn )}n∈N tal
que ∀n ∈ N, xn  yn , então quando x = limn→∞ xn e y = limn→∞ yn temos que x  y.
Ou seja, no limite, a ordenação das preferências se mantém.

Example 2.13 (Função de utilidade lexicográfica). A  lexicográfica é dada por x  y


se tivermos x1 > y1 ou x1 = y1 e x2 ≥ y2 . Esta relação de preferências não é contínua.

Com o conceito de continuidade das  podemos então introduzir o teorema da existência


de uma função de utilidade que representa .

Theorem 2.14 (Existência da Função de Utilidade). Se  forem racionais,contínuas


e estritamente monotônicas, então existe uma U (.) função de utilidade contínua que
representa essas preferências.

Remark. 1. O teorema acima nos dá as condições suficientes para que exista uma
função de utilidade que represente as preferências. Note a importância da hipótese
de continuidade das preferências para garantir a existência de uma função utilidade.
Isto porque existem preferências que são racionais e estritamente monótonas mas não
existe função utilidade que represente tais preferências - preferências lexicográficas.
2. Podemos demonstrar que apenas as hipóteses de racionalidade e continuidade são
suficientes para a existência da função utilidade. No teorema acima, a hipótese de
monotonicidade estrita é útil para facilitar a prova do teorema.

Dado que estamos adotando a teoria ordinal (ordenação da função utilidade), pergunta-
se: existe apenas uma única função utilidade U (x) que representa as preferências de um

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agente? Mostraremos a seguir que a resposta ao questionamento anterior é que não, ou
seja, existe mais de uma forma de representar as preferências por meio da função utilidade,
segundo a teoria ordinal.
Para mostrarmos que existe mais de uma função de utilidade que representa as preferên-
cias, precisamos definir o conceito de transformação monotônica positiva.

Definition 2.15. Seja a função U : X → R, temos que a função f : R → R é uma


transformação monotônica positiva (ou crescente) de U se ∀x, y ∈ X tivermos que
u(x) ≥ u(y), então f (u(x)) ≥ f (u(y)).

Proposition 2.16. Seja U : X → R, uma função de utilidade que representa , então


uma transformação monônica crescente de U , também será uma função de utilidade que
representa U .

Demonstração: Exercício.

Example 2.17 (Função de utilidade Cobb-Douglas). U (x1 , x2 ) = xα1 xβ2 , onde α, β ∈ R+


Temos que a função ln(.) é uma transformação monotônica positiva (crescente). Portanto,
devemos ter que:

f (u) = ln(u) = ln(xα1 xβ2 ) = αln(x1 ) + βln(x2 )

também é uma função de utilidade que representa a mesma  que a função Cobb-Douglas.

Remark. Mostramos anteriormente que várias funções podem representar a mesma ,


mas vale ressaltar que ocorre se, e somente se, uma for a transformação monotônica
positiva da outra.

Podemos agora formalmente definir propriedades ordinais e cardinais.

– Propriedades Ordinais: se as propriedades de uma função de utilidade são preserva-


das por transformações monotônicas positivas. Dependem apenas de como as cestas
de bens são ordenadas de acordo com as preferências do consumidor.
– Propriedades Cardinais: se as propriedades da função de utilidade não são preserva-
das por transformações monotônicas positivas.

Preferências e Utilidade - Casos Especiais:

1. Substitutos Perfeitos:
Dois bens são substitutos perfeitos quando o consumidor deseja trocá-los a uma
taxa constante, de forma a manter um mesmo nível de utilidade.

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Example 2.18. considere que U (x1 , x2 ) = x1 + x2 representa uma certa relação
de preferências de um agente. As cestas dadas por (10, 10), (9, 11), (8, 12) forencem
o mesmo nível de utilidade (U = 20), e portanto pertencem a mesma curva de
indiferença.

A forma geral da função utilidade dos substitutos perfeitos é dado por: U (x1 , x2 ) =
a
ax1 + bx2 , onde a, b > 0, onde b
é a taxa de substituição do bem 1 pelo bem 2.
Graficamente:

Figura 5: Curvas de indiferença de bens que são substitutos perfeitos

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2. Complementares Perfeitos: Em uma situação completamente diferente do caso dos
substitutos perfeitos, temos os complementares perfeitos. Estes bens são consumidos
juntos a uma taxa constante (fixa).
Definition 2.19. Dois bens são complementares perfeitos se estes forem con-
sumidos a uma taxa constante, de modo a manter o mesmo nível de utilidade. A
função de utilidade que representa a preferências por bens que são complementares
perfeitos é dada por:

U (x1 , x2 ) = min{ax1 , bx2 }, onde a, b > 0


a
, onde a, b > 0, e b
é a taxa de complementariedade entre o bem 1 e o bem 2.

Quando dizemos que os bens são consumidos de maneira proporcional, pense em


pares de sapato onde para cada pé de sapato esquerdo deve ser acompanhado de um
pé direiro. Graficamente temos que:

Figura 6: Curvas de indiferença de bens que são complementares perfeitos, onde os consumi-
dores tem que consumir os bens em proporções fixas.

3. Males e Neutros
(a) Males
Um mal é uma mercadoria que causa desutilidade para o consumidor. Mais
formalmente, dizemos que um "bem"é um mal para o consumidor se:
Definition 2.20. Um bem i é um mal se para todo xj = yj , j 6= i e x  y, se
e somente se, yi ≥ xi .
Em palavras temos que, a cesta x é fracamente preferível a cesta y pois a quan-
tidade do bem i de males é menor/igual a quantidade contida na cesta y. Gra-
ficamente:

(b) Neutros

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Figura 7: Curvas de indiferença, onde o bem 2 é um mal, note que a utilidade cresce no sentido
das setas ao reduzirmos a quantidade consumida do bem 2.

Dizemos que um bem é neutro se o consumidor não se importar no consumo


deste bem. Isto é, consumir o bem não gera utilidade, nem desutilidade para o
agente. Graficamente:

Figura 8: Curvas de indiferença, onde o bem 2 é neutro, note que a utilidade cresce no sentido
das setas ao aumentarmos o consumo do bem 1 independentemente da quantidade consumida
do bem 2.

4. Saciedade Global
Existem situações nas quais o consumidor classifique uma cesta melhor que todas
as outras e quanto mais próximo dela, melhor ele estará. Nessas situações, dizemos
que existe uma cesta que é um ponto de saciedade. Nos casos em que se apresenta
saciedade global, note que consumir muito de um bem e pouco de outro pode gerar
desutilidade para o consumidor.
Suponha que tenhamos uma cesta dada por (x1 , x2 ) de maior preferência do consu-
midor e que quanto mais próxima dela, maior será o nível de utilidade. Dizemos que
(x1 , x2 ) é o ponto de saciedade. Graficamente:

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Figura 9: Curvas de indiferença representando preferências saciadas, onde (x1 , x2 ) é o ponto de
saciedade.

5. Bens Discretos
Denifamos por bens discretos, os bens que não podem ser consumidos em quan-
tidades fracionárias, isto é, os bens por sua própria natureza são representados em
unidades discretas. Como por exemplo o consumo de celulares, o indivíduo só ira
usufruir de quantidades discretas de celulares, isto é, não faz sentido consumir, por
exemplo, meio celular.
No caso dos bens discretos as curvas de indiferença serão representados por pontos.
Graficamente:

Figura 10: Curvas de indiferença onde o bem 1 só está disponível em quantidades discretas,
note que as linhas tracejadas ligam as cestas que são indiferentes.

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6. Preferências Quase lineares
Definition 2.21. Dizemos que  é quase linear com relação ao bem 2 se:
i) (x1 , x2 ) ∼ (y1 , y2 ), então (x1 , α + x2 ) ∼ (y1 , α + y2 ), para qualquer α ∈ R.
ii) (x1 , α + x2 )  (x1 , x2 ) , α > 0

As curvas de indiferença das preferências quase lineares são versões deslocadas de


uma curva de indiferença.
Remark. Uma relação de preferências contínua  é quaselinear com respeito ao bem
2 se, e somente se, existe uma função utilidade da forma U (x1 , x2 ) = f (x1 ) + x2 ,
onde f é uma função aplicada ao bem 1, por exemplo, a função log.

Figura 11: Curvas de indiferença de preferências quase lineares no bem 2.

Repare que para preferências desse tipo é possível deduzir completamente a relação
de preferências do agente analisando somente uma curva de indiferença em particular.

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7. Preferências Homotéticas
Definition 2.22. Dizemos que uma relação de preferências  estritamente monóto-
nas são homotéticas se (x1 , x2 ) ∼ (y1 , y2 ), se e somente se, (λx1 , λx2 ) ∼ (λy1 , λy2 ),
onde λ ∈ R+ .
Example 2.23. (2, 3) ∼ (3, 2) , se e somente se, (6, 9) ∼ (9, 6)
Remark. As curvas de indiferença de preferências homotéticas tem inclinação que
depende apenas da razão entre os bens, não depende da distância entre as curvas
e a origem. Portanto, podemos estudar um indivíduo apenas olhando para uma de
suas curvas de indiferença sob preferências homotéticas. Graficamente, temos alguns
gráficos de exemplos de preferências homotéticas:

Figura 12: Curvas de indiferença de preferências homotéticas.

Repare que, do mesmo modo que para as preferências quaselineares, para preferências
homotéticas é possível deduzir completamente a relação de preferências do agente
analisando somente uma curva de indiferença em particular.
8. Preferências Bem Comportadas
Ao estudar a teoria do consumidor, muitas vezes estamos interessados em analisar o
comportamento do indivíduo sob algumas características razoáveis de serem assumi-
das. Vamos agora, definir alguns pressupostos que serão utilizados daqui em diante
sem que haja menção explícita.
Assumiremos que as preferências do consumidor tenham a característica de serem
bem comportadas.
Dizemos que as preferências de um consumidor são bem comportadas se estas forem
fortemente monotônicas e convexas.

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Figura 13: Curvas de indiferença de preferências monotônica, cuja inclinação é negativa.

Remark. Sob convexidade estrita, a cesta média será estritamente preferível a cesta
extrema.

Figura 14: Curvas de indiferença de preferências convexas, onde o conjunto de contorno superior
de uma cesta é convexo.

• Cobb-Douglas
As preferências Cobb-Douglas são as representantes das denominadas “preferências bem-
comportadas”, além de serem também homotéticas. Como ja foi definido anteriormente,
aqui apenas introduziremos o gráfico da função de utilidades cobb-douglas.

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Figura 15: Curvas de indiferença cobb-douglas.

• Funções Homogêneas

Definition 2.24. Dizemos que f : R → R é homogênea de grau k, onde k ∈ R se


∀λ ∈ R tivermos que f (λx1 , λx2 ) = λk f (x1 , x2 ).

Example 2.25. f (x, y) = x2 y 2 =⇒ f (λx, λy) = (λx)2 (λy)2 = λ2 x2 λ2 y 2 = λ4 f (x, y),


portanto f é homogênea de grau 4.

Theorem 2.26. Uma relação de preferências  é homotética se, e somente se, admite
uma função de utilidade u(x) homogênea de grau um. Isto é,  é homotética ⇐⇒
∃u(x, y) homogênea de grau 1.

A demonstração do teorema acima foge do escopo deste curso, intuitivamente temos que
 será homotética sempre que conseguirmos uma transformação monotônica crescente
que nos dê uma função de utilidade homogênea de grau 1. A volta do teorema é direta.
1
Example 2.27. Seja U (x, y) = x2 y 2 , defina, f (x) = x 4 , uma transformação monotônica
1 1
crescente, aplicando a temos uma nova função de utilidade dada por U (x, y) = x 2 y 2 , que
é homogênea de grau 1 e representa as mesmas preferências que a função de utilidade
original.

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• Taxa Marginal de Substituição (TMS)
A Taxa Marginal de Substituição (TMS) é a inclinação da curva de indiferença em deter-
minado ponto. Ela mede a taxa pela qual um consumidor está disposto, na margem, a
trocar um bem pelo outro de forma a permanecer na mesma curva de indiferença. Repare
que é um conceito marginal: não basta dizer que o consumidor permanecerá na mesma
curva de indiferença, mas também que a taxa marginal de substituição é o quanto o con-
sumidor aceita trocar um bem pelo outro de forma a estar na iminência de sair do ponto
em questão.
Vamos supor que retiramos do consumidor um pouco (quantidade infinitesimal) do bem
1, ∆x1 e, em contrapartida, damos a ele ∆x2 em quantidade suficiente apenas para que
ele continue na mesma curva de indiferença, ou seja, o agente está em situação pelo menos
∆x2
tão boa quanto a situação inicial. Temos que esta razão dada por ∆x1
é a taxa pela qual
o indivíduo está propenso a trocar o consumo do bem 2 pelo bem 1.

Figura 16: Taxa Marginal de Substituição, TMS = − ∆x


∆x1
2
.

Sob monotonicidade temos que as curvas de indiferença tem inclinação negativa2 , isto
∆x2
é, ∆x1
é um número negativo3 . Como a TMS é uma medida numérica da inclinação da
curva de indiferença, ela seria um número negativo. Entretanto, por convenção, temos
que a TMS é dada por:

∆x2
T M S(x1 , x2 ) = − |∆x →0∆x2 →0
∆x1 1
2
Uma inclinação positiva de uma curva de indiferença implicaria em um consumidor que é indiferente entre
uma cesta x e uma cesta y ambas em uma mesma curva de indiferença, mesmo no caso em que a cesta y >> x,
o que vai no sentido contrário da definição de monotonicidade.
3
Lembre-se de que em geral estamos considerando ambos bens (e não males).

23
Assim, ao tratar de TMS estaremos sempre pensando no valor absoluto, lembrando que o
sinal negativo indica que ao aumentar a quantidade de um bem necessariamente teremos
que reduzir a do outro como forma de permanecer na mesma curva de indiferença (mesma
∆x2
utilidade). É comum também a seguinte representação: |T M S| = |
∆x1 ∆x1 →0∆x2 →0
.

Remark. Princípio da Taxa Marginal de Substituição Decrescente.

1. Se  forem convexas, então TMS não crescente.


2. Se  forem estritamente convexas, então TMS decrescente (em valor absoluto), à
medida que aumentamos o consumo do bem 1. .

Note que sob preferências estritamente convexas as cestas médias são estritamente pre-
feríveis a cestas mais extremas, de modo que ao nos locomovermos no sentido de um
consumo mais extremo em uma curva de indiferença, temos que a TMS deverá decrescer.
Isto reflete que, em pontos mais extremos, a TMS será menor pois o agente está disposto
a trocar a uma taxa maior o consumo do bem que está se tornando mais escasso.

• Utilidade Marginal
Já vimos que as funções de utilidade são uma forma de descrever as preferências de um
consumidor, de modo que atribuimos um número real a cada possível cesta de consumo
e, dessa forma, podemos ordenar as preferências dos agentes.
Agora, vamos refinar o conceito de utilidade introduzindo a noção de utilidade marginal.
A utilidade marginal é responsável por captar como varia a utilidade de um consumidor
quando variamos de maneira infinitesimal as quantidades de bens que são consumidos em
determinada cesta.
Ao variarmos a quantidade consumida do bem 1 na quantidade ∆x1 , de modo que, ∆x1 →
0, representamos a utilidade marginal com respeito ao bem 1 por U M g1 e definimos ela
como:

∆U U (x1 + ∆x1 , x2 ) − U (x1 , x2 )


U M g1 = =
∆x1 ∆x1
Onde o numerador é a taxa de variação da utilidade com relação ao denomidor que é uma
variação infinitesimal do bem 1. Note que a quantidade do bem 2 dada por x2 manteve-se
inalterada ao computarmos a utilidade marginal com respeito ao bem 1 (ceteris paribus).
A utilidade marginal com respeito ao bem 2 pode ser calculada de maneira análoga a
descrita acima.

Remark. A utilidade marginal nada mais é do que a derivada parcial da utilidade com
respeito as suas coordenadas.

24
Remark. Por ser uma derivada, a utilidade marginal tem uma interpretação cardinal.

Note que a utilidade marginal possui propriedade cardinal. Então, sob a teoria ordinal,
qual seria a importância de seu uso? A importância da utilização do conceito de utilidade
marginal se dá no cálculo da taxa marginal de substituição. Lembre-se de que a taxa
marginal de substituição mede a inclinação da curva de indiferença no ponto de uma
determinada cesta de bens e pode ser interpretada como a taxa pela qual um consumidor
está propenso a substituir uma pequena quantidade de um bem pelo outro.
Com essa noção em mãos note que se tivermos uma variação no consumo de ambos
os bens dado por (x1 + ∆x1 , x2 + ∆x2 ) que não varie a utilidade do indivíduo, isto é,
U (x1 + ∆x1 , x2 + ∆x2 ) = U (x1 , x2 ), logo, esta variação apenas nos move ao longo da
curva de indiferença. Portanto, podemos mostrar que a variação total da utilidade é:

U M g1 ∆x1 + U M g2 ∆x2 = ∆U = 0

Realizando um pequeno algebrismo obtemos:


∆x2 U M g1
T M S(x1 , x2 ) = − |∆x1 →0∆x2 →0 =
∆x1 U M g2
Remark. Podemos provar que, sob preferências homotéticas, ao longo de um mesmo
raio partindo da origem, as inclinações dos pontos em que o raio intercepta as curvas de
indiferença serão as mesmas. Portanto, a TMS também será a mesma. Isto é:

T M S(αx, αy) = T M S(x, y)

25
2.2 Restrição Orçamentária

O problema econômico se reflete na teoria econômica do consumidor no seguinte pressu-


posto: os consumidores escolhem a melhor cesta que podem adquirir. Nesta seção iremos
descrever o conceito de "poder adquirir", que se materializa no conceito de restrição
orçamentária.
Seja X o conjunto de consumo e x ∈ X uma cesta de consumo, onde x = (x1 , x2 ). Defina
por p = (p1 , p2 ) o vetor de preços exógeno desta economia, sendo pi o preço do bem
i ∈ {1, 2}. Além disso, temos a renda exógena do consumidor dada por m.

Definition 2.28 (Conjunto Orçamentário). Seja X o conjunto de consumo, x ∈ X uma


cesta de consumo e m a renda do consumidor. Definimos como conjunto orçamentário
do consumidor dados preços p e renda m por:

B(p, m) = {x ∈ X : p1 x1 + p2 x2 ≤ m}

e temos que B(p, m) ⊂ X , isto é, o conjunto orçamentário é um subconjunto do conjunto


de consumo.

Note que, pi xi é a quantidade de dinheiro que o consumidor gasta com o consumo do


bem i ∈ {1, 2}. A equação p1 x1 + p2 x2 ≤ m intuitivamente nos diz que o valor gasto nos
dois bens não pode exceder a renda do consumidor. As cestas que o consumidor pode
adquirir são aquelas cujo o custo não seja maior que m, por isso o sinal ≤. O conjunto
orçamentário é o conjunto factível de consumo, ou seja, conjunto de todas as cestas que
um consumidor pode adquirir dado um par de preços p = (p1 , p2 ) e renda m.
Definimos reta orçamentáriacom sendo o conjunto de cestas de consumo que custam
exatamente a renda m do consumidor. A reta orçamentária é dada por: {x ∈ X :
p1 x1 + p2 x2 = m}, donde podemos rearranjar a equação de modo a obter uma fórmula
m p1
linear para reta orçamentária dada por: x2 = p2
− x.
p2 1
Graficamente:

Figura 17: Conjunto orçamentário, onde as cestas na área sombreada são aquelas que o consu-
midor pode adquirir.

26
A inclinação da reta orçamentária tem uma interpretação econômica: ela mede a taxa
pelo qual o mercado está disposto a substituir o bem 1 pelo bem 2. Repito: a taxa pelo
qual o mercado está disposto a substituir o bem 1 pelo bem 2.
O que ocorre quando o consumidor varia um pouco o seu consumo de cada bem? Suponha,
mais especificamente, que o consumidor varie o seu consumo pelo bem 1. Em que medida
deve o consumidor variar o seu consumo pelo bem 2, de modo a respeitar a restrição
orçamentária?
Representemos a variação do consumo por: ∆x = (∆x1 , ∆x2 ).
Antes da variação temos a seguinte equação da reta orçamentária:

p 1 x1 + p 2 x2 = m

ao variarmos o consumo em ∆x = (∆x1 , ∆x2 ), obtemos:

p1 · (x1 + ∆x1 ) + p2 · (x2 + ∆x2 ) = m

após subtrair uma equação da outra, obtemos:


∆x2 p1
p1 ∆x1 + p2 ∆x2 = 0 ⇐⇒ =−
∆x1 p2
que é exatamente a inclinação da reta orçamentária. O sinal negativo aparece uma vez que
∆x1 e ∆x2 devem ter sinais contrários, ora para consumirmos mais de um bem precisamos
reduzir o consumo de outro para mantermos a igualdade da restrição orçamentária.
p1 U M g1
Remark. Note que p2
= − ∆x2
∆x1
= U M g2
, esta relação não é uma coincidência. Isso ficará
mais claro ao longo das aulas.

A inclinação da reta orçamentária nada mais é do que o Custo Oportunidade ao se


consumir o bem 1 (ou o bem 2), uma vez que, para consumir mais do bem 1, deve-se
abrir mão de consumo de alguma quantidade do bem 2, e abrir mão desse consumo é o
custo real econômico de consumir mais do bem 1.

Estática Comparativa:

1. Mudança de preços

Suponha que o vetor inicial de preços p = (p1 , p2 ) mude de (p1 , p2 ) → (p01 , p2 ). Vamos
analisar o que acontece com a reta de restrição orçamentária. (Suponha que p01 > p1 )

27
Figura 18: Mudança da inclinação da reta de restrição orçamentária sob aumento do preço do
bem 1, Ceteris Paribus.

2. Variação da Renda

Suponha que a renda inicial do consumidor seja dada por M , imagine que tenhamos
um aumento da renda de M → M 0 , onde temos M 0 > M . É fácil notar que este
aumento da renda irá deslocar a reta de restrição orçamentária de maneira paralela
e para fora. Porém, este deslocamento não afeta a inclinação da reta. Graficamente:

Figura 19: O aumento da renda provoca o deslocamento paralelo e para fora da reta orçamen-
tária.

3. Racionamento

Os governos em algumas situações impõe o racionamento, que consiste em limitar o


consumo de determinado bem a uma determinada quantidade.

28
Suponhamos que o bem 1 seja racionado, de modo que o consumidor não possa
consumir mais do que x1 . Então, o conjunto orçamentário do consumidor dada esta
restrição é dada pela seguinte figura:

Figura 20: Se o bem 1 estiver racionado, a parte do conjunto orçamentário que ultrapassar a
quantidade racionada será eliminada.

4. Impostos

(a) Imposto de Montante Fixo (lump-sum)

O imposto de montante fixo é aquele no qual o governo se apropria de uma


quantia fixa de dinheiro, independentemente do comportamento do indivíduo.
Isto é, não depende do padrão de consumo do indivíduo. O imposto de montante
fixo funciona como uma variação na renda do consumidor de modo que a reta
orçamentária de um consumidor se desloque para dentro em virtude da redução
da renda monetária.

(b) Imposto sobre quantidade (ou unitários)


O imposto sobre quantidade é um imposto que incide sobre a quantidade con-
sumida. Um imposto de t por unidade consumida de bem 1 implica em um
aumento de preço de p1 para p1 + t.
(c) Imposto Ad Valorem

O imposto Ad Valorem, é um imposto sobre valor que incide sobre o preço dos
bens e não sobre a quantidade comprada. Seja a alíquota de imposto dada por
t, o imposto sobre valor faz com que o preço do bem 1 varie de p1 → p1 + p1 t.
Graficamente temos uma mudança na reta de restrição orçamentária equivalente
ao gráfico representado pela figura 18.

Proposition 2.29. A restrição orçamentária é homogênea de grau 0.

29
Demonstração:
B(p, m) = {x ∈ X : p1 x1 + p2 x2 ≤ m} é o conjunto de restrição orçamentária. Note
que, B(αp, αm) = {x ∈ X : αp1 x1 + αp2 x2 ≤ αm}. Para provar que a restrição
orçamentária é homogênea de grau zero, preciso mostrar que B(p, m) = B(αp, αm).
Para tal, notemos que:
αp1 x1 + αp2 x2 = α(p1 x1 + p2 x2 ) ≤ αm ⇐⇒ p1 x1 + p2 x2 ≤ m
Portanto, B(p, m) = {x ∈ X : p1 x1 + p2 x2 ≤ m} = {x ∈ X : αp1 x1 + αp2 x2 ≤
αm} = B(αp, αm). Logo, a restrição orçamentária é homogênea de grau zero.

2.3 Exercícios

Questão 01

Enumere e explique resumidamente os sete primeiros princípios de Economia descri-


tos em Mankiw (2010), capítulo 1.

Questão 02

Um consumidor consome somente dois bens, e suas preferências podem ser represen-
tadas pelas curvas de indiferença abaixo (as setas indicam o sentido do crescimento
da utilidade). Esse consumidor possui preferências que são fortemente monótonas?
São estritamente monótonas? São convexas? Justifique.

Questão 03

Considere uma estrutura de preferências que, semelhantemente ao regime usado para


medir desempenho de países em Jogos Olímpicos, ordene cestas genéricas x e y da
seguinte forma:

30
x  y ⇐⇒ x1 > y1 ou x1 = y1 e x2 ≥ y2 (1)

Verifique se essa relação de preferências é completa, transitiva, monótona, fortemente


monótona e convexa. Antes de verificar, enuncie a definição formal de cada conceito.

Questão 04

Em relação às funções de utilidade dos consumidores, verdadeiro ou falso. Justifique:

(a) Para um consumidor com uma função de utilidade do tipo: U (X, Y ) = X 0,4 Y 0,6
os bens X,Y são substitutos perfeitos.
(b) Uma transformação monotônica de uma função de utilidade do tipo: U (X, Y ) =
1
(X + Y ) 2 não muda a taxa marginal de substituição.
(c) Caso a função utilidade do consumidor seja homotética, a taxa marginal de
substituição depende apenas das quantidades relativas dos bens consumidos e
não das quantidades absolutas.

Questão 05

Resolva os exercícios dos capítulos 3 e 4 do Varian.

Questão 06

Verdadeiro ou falso. Justifique:


(a) Se U (X, Y ) = 100 + 3M in{x, 2y} for a função de utilidade de um consumidor,
as preferências serão convexas.
(b) Se as preferências de um consumidor são transitivas, isso implica que este prefere
mais bens do que menos.
(c) Um indivíduo com preferências estritamente côncavas entre dois bens especializa-
se no consumo de um dos bens.
(d) Ao longo de uma curva de demanda individual, o nível de utilidade do consumi-
dor permanece constante.

31
Questão 07

Anpec 2015 - Questão 01

Com relação às preferências do consumidor, é correto afirmar que:


(a) A existência de um bem neutro viola o axioma da monotonicidade, a existência
de bens substitutos perfeitos viola o axioma da convexidade estrita e a existência
de preferências lexicográficas viola o axioma de continuidade.
1
(b) Para a função utilidade: U (X, Y ) = (X ρ + y ρ ) ρ as taxas marginais de substitui-
ção (TMS) nas cestas (2, 3) e (4, 6) são idênticas.
(c) Sejam três cestas de bens: A, B e C. Se, para um consumidor temos que A  B,
A ∼ C e C ∼ B, então para este consumidor se aplica o princípio de que duas
curvas de indiferença não se cruzam.
(d) Sejam dois bens x e y, em que nenhum deles é um mal. Se tivermos duas cestas
com quantidades estritamente positivas destes dois bens (x1 , y1 ) e (x2 , y2 ), sendo
que x2 ≥ x1 e y2 > y1 , então, pela hipótese da monotonicidade das preferências,
temos que: (x2 , y2 )  (x1 , y1 ).
(e) Supondo que não existem males, a hipótese de convexidade estrita implica que,
se houver duas cestas A e B, com A ∼ B, para uma cesta C definida como
tA + (1 − t)B, 0 < t < 1 , é necessariamente verdade que C  A e C  B.

Questão 08

Anpec 2010 - Questão 01.

Com respeito a critérios de decisão, relações de preferência e funções de utilidade,


julgue as questões a seguir justificando a resposta:

(a) Seja u(x, y) uma utilidade homotética. Suponha que u(x0 , y0 ) = u(x1 , y1 ), em
que (x0 , y0 ) e (x1 , y1 ), são duas cestas dadas, e seja t > 0 um escalar positivo.
Então u(tx0 , ty0 ) = u(tx1 , ty1 );
(b) Seja u(x, y) uma utilidade homotética e seja t > 0 um escalar positivo. Denote
por T M Su (x, y) a taxa marginal de substituição da utilidade u na cesta (x, y).
Então T M Su (x, y) = T M Su (tx, ty);
(c) Seja  uma relação de preferência monotônica e contínua sobre R2 + e suponha
que u e U são duas funções numéricas que representam a relação de preferência
 . Suponha que u(x, y) < U (x, y), para qualquer cesta (x, y) ∈ R2 + . Se
T M Su (x, y) e T M SU (x, y) denotam a taxa marginal de substituição da função
u e U , respectivamente, na cesta (x, y), então T M Su (x, y) > T M SU (x, y), para
qualquer cesta (x, y) ∈ R2 + .

32
(d) Considere a função de utilidade u(x, y) = min{2x + y, x + 2y}, em que x denota
a quantidade do bem 1 e y a quantidade do bem 2. Então os bens 1 e 2 são
complementares perfeitos;
(e) Considere a relação binária  sobre R2 + definida por (x, y)  (z, w) se, e somente
se, x ≥ z y ≤ w. Então  é uma relação transitiva e reflexiva, mas não é
estritamente monotônica.

Questão 09

Seja  racional, mostre que as seguintes afirmações são válidas explicitando cada
hipótese4 utilizada no desenvolvimento do raciocínio:
(a) x  y  z, então x  z
(b) x  y ∼ z, então x  z
(c) x  y  z, então x  z
(d) x ∼ y  z, então x  z
Questão 10

Defina os seguintes conceitos:


(a) Conjunto Orçamentário
(b) Função de Utilidade Quase Concava
(c) Taxa Marginal de Substituição

Questão 11

(a) Considere que um consumidor consuma um bem x e horas de lazer h. O preço


do bem é p = 1, e o consumidor pode trabalhar a um salário por hora s =1.
Determine o conjunto orçamentário deste consumidor e represente graficamente.
(Dica: o salário por hora s = 1 representa o preço do consumo de lazer).
(b) Agora suponha uma situação mais realista. O consumidor ainda consome o
bem x e horas de lazer h. O preço do bem é p =1 e o salário por hora é s =1.
Entretanto, o salário por hora de s =1 é devido caso o consumidor trabalhe até 8
horas. Caso o consumidor faça hora-extra (trabalhe mais de 8 horas), o salário
por hora será de s’= 2. Ainda, o consumidor é tributado (paga um imposto
de renda) a uma alíquota de 10% quando sua renda ultrapassa 20. Representa
graficamente esta nova restrição orçamentária.

Questão 12
Resolver todos os exercícios do capítulo 2 do Varian.
4
Completude e transitividade.

33
3 Escolha

Neste capítulo, uniremos o conjunto orçamentário e a teoria das preferências para


analisar a escolha ótima dos consumidores. Dissemos anteriormente que o modelo
econômico da escolha do consumidor baseia-se no princípio de que as pessoas esco-
lhem a melhor cesta que podem adquirir.
Com os conceitos desenvolvidos até agora, podemos refinar essa ideia ao afirmarmos
que o consumidor escolhe a cesta preferida em seu conjunto orçamentário.

3.1 Escolha Ótima

Diante das hipóteses usuais das preferências do consumidor, nosso objetivo é en-
contrar no conjunto orçamentário a cesta que esteja na curva de indiferença mais
elevada. Consequentemente, obtém-se o maior nível de utilidade factível. Para tal,
o consumidor resolve o seguinte problema de maximização de utilidade, de modo a
obter a cesta ótima:

M ax U (x1 , x2 ), sujeito à p1 x1 + p2 x2 ≤ m (2)


x1 ,x2

Em palavras, queremos maximizar a utilidade do consumidor, restringindo as ces-


tas que respeitam a restrição orçamentária do agente, considerando como variáveis
exógenas o vetor de preços p = (p1 , p2 ) e a renda m.
Seja (x1 ∗ , x2 ∗ ) a solução do problema acima dados (p, m). Definimos essa solução
por função demanda Marshalliana. Isto é, a cesta ótima do consumidor em
função dos preços p e da renda m. Repare que ao variarmos os preços e a renda, as
cestas ótimas provavelmente irão variar. Daí, denominarmos por função demanda
Marshaliana do bem 1, x∗1 (p, m), e a função demanda Marshalliana do bem 2,
x∗2 (p, m).

Como garantir então que o problema do consumidor possui solução?


Theorem 3.1 (Teorema do Máximo). Se uma função de utilidade u(.) é uma função
contínua (a relação de preferências é contínua e racional), então existe uma solução
para o problema de maximização de utilidade do agente dado por (2).
Remark (Lei de Walras). Sob não saciedade local (hipótese mais fraca do que
monotonicidade das preferências), podemos restringir nossa atenção às cestas de
bens que se encontram sobre a reta orçamentária, sem nos preocuparmos com as
cestas situadas abaixo da reta orçamentária.

34
Para ilustrar uma possível solução desse problema, sob preferências bem comporta-
das, queremos alcançar a curva de indiferença mais distante da origem respeitando
a restrição orçamentária do agente. Graficamente temos que:

Figura 21: A cesta ótima (A) situa-se onde a curva de indiferença tangencia a reta orçamentária.

A escolha (x∗1 , x∗2 ) é a cesta ótima para o consumidor. A única cesta pertencente ao
conjunto de cestas que ele fracamente prefere a (x∗1 , x∗2 ), o conjunto contorno superior
em relação a cesta (x1 , x2 ), intercepta o conjunto factível, o conjunto de cestas que
se localiza abaixo de sua reta orçamentária, somente no ponto (x1 , x2 ). Assim, a
cesta (x1 ∗ , x2 ∗ ) é a melhor que o consumidor pode adquirir.
Ou seja, consequentemente nessa escolha, a curva de indiferença tangencia a reta
orçamentária.
Intuitivamente, temos o seguinte: suponha que o consumidor acredite que a cesta
ótima se dá no ponto B, sob uma curva de indiferença que cruze a reta orçamentária.
Nesse ponto, o consumidor gasta toda sua renda e atinge utilidade U1. Entretanto,
o consumidor pode escolher qualquer cesta da região hachurada em vermelho, pois
são cestas factíveis, e alcançar curvas de indiferença superiores a curva de indiferença
do ponto B. Ou seja, o ponto B não é ponto de ótimo. O consumidor pode repetir
esse processo sempre que sua escolha encontrar-se sob uma curva de indiferença que
cruze a reta orçamentária. Daí, a cesta ótima deve pertencer a curva de indiferença
que tangencia a reta orçamentária.

35
Remark. A condição de tangência acontece quando as inclinações da curva de in-
diferença e da reta orçamentária são iguais.

Na figura acima (21), representamos uma cesta que é escolha ótima interior.
Por interior queremos dizer que a quantidade de ambos os bens na escolha ótima é
estritamente positiva.
Estamos em busca de um resultado que nos permita generalizar e afirmar que sempre
em um ponto de ótimo vale a condição de tangência. Quando que isso é possível?
Resposta: Inicialmente, temos duas situações importantes em que encontramos um
ótimo sem condição de tangência:
(a) Quando a curva de indiferença encontra a reta orçamentária em um ponto em
que a curva não é diferenciável5 ;
(b) Quando as inclinações da curva de indiferença e a reta orçamentária são distin-
tas.
No primeiro caso, representado na figura (22), apesar de existir um ótimo interior,
não podemos dizer que a cesta ótima é dada pela condição de tangência.

No segundo caso, representado na figura (23), temos a denominada solução de


canto ou ótimo de fronteira. É a situação quando a escolha ótima consiste em
algum bem sendo consumido em quantidade zero. Nesse caso, temos a especialização
do consumo.

Então, para relacionarmos a condição de tangência ao ponto de ótimo, precisamos


adotar hipóteses que eliminem a possibilidade de existência tanto de curvas de indife-
rença não diferenciáveis, quanto de solução de canto. Como foge ao escopo do nosso
curso a discussão técnica sobre solução de canto, iremos daqui em diante estabelecer
condições necessárias e suficientes para que um ótimo interior satisfaça a condição
de tangência. Ou seja, estaremos sempre tratando de ótimos interiores!

Condições Necessárias (condições de primeira ordem)


A partir da discussão acima, adotamos a hipótese de que as curvas de indiferença
são suaves (são diferenciáveis) como forma de excluir a situação encontrada na figura
(22). Com isso, se x∗ = (x∗1 , x∗2 ) é uma cesta ótima, então vale a condição de
tangência. Isto é, condição de tangência, juntamente com a hipótese de curvas
de indiferença suaves, é uma condição necessária para um ótimo interior. Ou
seja, Condição de tangência + hipótese de curvas de indiferença suaves são
condições necessárias para ótimo interior6 .
5
Tecnicamente, afirmamos que uma função não possui reta tangente em um ponto quando a função não
possui derivada nesse ponto.
6
As condições necessárias são denominadas também de condições de primeira ordem(CPO ou FOC).

36
Figura 22: Caso em que há um ótimo interior, mas sem condição de tangência
.

Figura 23: Caso em que há uma solução de canto, onde o consumidor escolhe não consumiro
bem 2. A cesta ótima é dada por (x1 ∗ , 0)
.

Condições Suficientes (condições de segunda ordem)


Somente assumindo condição de tangência, e hipótese de curvas de indiferença
suaves, não é suficiente para garantir a condição de ótimo interior. Podemos nos
deparar com uma curva de indiferença em que haja mais de um ponto de tangência

37
e nem todos sejam pontos de ótimo, como ilustrado no gráfico 24.

Figura 24: Caso em que há três pontos de tangência, mas apenas dois deles são ótimos
.

Ou seja, a fim de termos a suficiência da condição de tangência para a existência


de ótimo interior precisamos garantir que as preferências sejam convexas (se forem
estritamente convexas a solução será única)7 .

Após essa discussão intuitiva, e diante das condições necessárias e suficientes, vamos
elaborar a condição formal matemática para o ótimo interior.

Princípio da Maximização de Utilidade: "Um individuo irá comprar bens de


modo a exaurir toda sua renda, o que implica em igualar a taxa marginal de substitui-
ção à taxa na qual os bens são trocados no mercado - razão de preços (taxa marginal
de troca)". Ou seja, sob as condições ncessárias e suficientes, vale a seguinte relação
(condição de tangência ≡ condição de máximo):

∆x2 p1
T M S(x1 , x2 ) = − =
∆x1 p2
Lembre-se da condição que nos garante que a condição de tangência nos dará uma
única cesta ótima. Para tal, precisamos que as curvas de indiferença sejam estrita-
mente convexas de modo que não haja nenhum segmento plano, e que qualquer
combinação convexa de duas cestas em uma mesma curva de indiferença situe-se no
interior do conjunto de contorno superior das cestas originais.
Até agora, para estabelecer a condição máximo, estudamos somente hipóteses refe-
rentes às preferências. Note que a hipótese de convexidade é inerente às preferências.
7
As condições suficientes são também denominadas de condições de segunda ordem.

38
Qual a hipótese em relação às funções utilidade que corresponde à hipotese de con-
vexidade para preferências?

Proposition 3.2. Seja  representada pela função utilidade u. Então, u(x) é (es-
tritamente) quase côncava se, e somente se,  é (estritamente) convexa.

Aqui ressurge um ponto importante sobre a necessidade de termos uma característica


da função que respeite a propriedade ordinal. Observe que a hipótese fundamental é
a de convexidade das preferências, e que essa hipótese implica no princípio da taxa
marginal de substituição decrescente. Ou seja, o que nos interessa é o princípio e, daí,
devemos encontrar uma propriedade da função utilidade que garanta esse princípio.
A correspondência natural é a hipótese de concavidade da função utilidade8 . Ela
também garante que as curvas de indiferença (curvas de nível) tenham taxas margi-
nais de substituição decrescentes. Entretanto, a concavidade de uma função é uma
propriedade cardinal. Precisamos então estabelecer uma propriedade de funções que
tenha a mesma característica da concavidade (em relação à garantia do princípio da
taxa marginal de substituição decrescente), mas que tenha propriedade ordinal. É o
que encontramos nas funções quase côncavas.
Definition 3.3. Dizemos que uma função f : R2 → R é quase côncava se ∀a ∈ R,
o conjunto Ca+ = {x = (x1 , x2 ) ∈ R2 : f (x) ≥ a} é um conjunto convexo.
Equivalentemente, podemos definir uma função f : R2 → R como quase côncava
se dados x, y ∈ R2 e z = αx + (1 − α)y, α ∈ (0, 1) a função apresenta a seguinte
propriedade:

f (z) ≥ M in{f (x), f (y)}

E é estritamente quase côncava se a desigualdade acima for estrita.

Example 3.4. Seja a função utilidade Cobb-Douglas u(x1 , x2 ) = xa1 xb2 . Podemos
mostrar que:
– Para essa função ser côncava, devemos ter que 0 < a < 1, 0 < b < 1, e a + b ≤ 1.
– Para essa função ser quase côncava, basta que a > 0 e b > 0.
Ou seja, existem transformações monotônicas positivas da Cobb-Douglas que não
são côncavas.
De outro modo, toda função côncava é quase côncava, mas nem toda função quase
côncava é côncava.

8
Também porque a concavidade é importante para garantirmos existência de pontos de máximo.

39
Lemma 3.5. Se a relação de preferências  é racional, contínua, estritamente mo-
notônica e (estritamente) convexa, então a função de utilidade u que representa estas
preferências é contínua, estritamente crescente e (estritamente) quase côncava.

Com este conceito em mãos, podemos agora nos perguntar quando podemos afirmar
que a relação de igualdade entre taxa marginal de substituição e razão de preços irá
fornecer uma solução para ótimo interior?
Para tal segue o seguinte lema:
Lemma 3.6. Se a função de utilidade u é diferenciável, estritamente crescente e
quase côncava, se estivermos em um ponto ótimo interior então vale a condição de
máximo dado por:
∆x2 p1
T M S(x1 , x2 ) = −
=
∆x1 p2
Se u for estritamente quase côncava, este ponto de ótimo será único.

Remark. Já mostramos graficamente a relação entre ponto de ótimo e condição de


tangência (figura (21)). Agora vamos mostrar formalmente. Primeiramente, vamos
p1
supor que em um ótimo interior T M S(x1 , x2 ) 6= p2
. Ou seja, estamos em um ótimo
interior, mas não vale a condição de máximo. Sem perda de generalidade, vamos
p1
supor que então esteja acontecendo o seguinte caso: T M S(x1 , x2 ) > p2
.
U M g1
Como T M S(x1 , x2 ) = U M g2
, então, temos que

U M g1 p1
> (3)
U M g2 p2
Suponha agora que haja um aumento de ∆X1 unidades no consumo do bem 1 e, ao
p1
mesmo tempo, uma redução no consumo do bem de p2
∆x1 . Pela restrição orçamen-
tária, essas variações no consumo são factíveis.
Mas, ao investigarmos qual seria a variação na utilidade decorrente dessas variações
de consumo, diante da hipótese na equação (2),teríamos o seguinte:
 
p1 p1
U M g1 ∆x1 − U M g2 ∆x1 = ∆x1 U M g1 − U M g2 >0 (4)
p2 p2
Ou seja, não estávamos em um ponto de ótimo interior (pois conseguimos aumentar
a utilidade e ainda respeitar a restrição orçamentária). Absurdo !! Portanto, vale a
condição de máximo!! CQD.

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Example 3.7 (Função de utilidade Cobb-Douglas). Seja o seguinte problema de
maximização do consumidor:

M ax x1 α x2 β
x1 ,x2
s.a. p1 x1 + p 2 x2 ≤ m

Esse problema é resolvido mais facilmente por intermédio de uma transformação


monotônica positiva. De fato, ao aplicarmos ln na função acima obtemos:

M ax αln(x1 ) + βln(x2 )
x1 ,x2
s.a. p1 x1 + p 2 x2 ≤ m

A função utilidade Cobb-Douglas é diferenciável, estritamente crescente e estrita-


mente quase côncava (para α > 0 e β > 0). Portanto, em um ótimo interior, temos
U M g1 p1
que T M S = U M g2
= p2
.
Vamos calcular a utilidade marginal em relação ao bem 1. Sabemos que U M g1 é
dada pela seguinte relação:
u(x1 + ∆x1 , x2 ) − u(x1 , x2 ) ∆u1 (x1 , x2 )
U M g1 = =
∆x1 ∆x1
Da função utilidade transformada, temos que:

∆u1 (x1 , x2 ) = u(x1 + ∆x1 , x2 ) − u(x1 , x2 ) = αln(x1 + ∆x1 ) + βlnx2 (5)

Vamos analisar especificamente ln(x1 + ∆x1 ).

∆x1 ∆x1
ln(x1 + ∆x1 ) = ln(x1 (1 + )) = lnx1 + ln(1 + )
x1 x1

Podemos demonstrar que, para um x qualquer ∈ R, se x ≈ 0 =⇒ ln(1 + x) ≈ x.


∆x1
Então, quando ∆x1 ≈ 0 =⇒ x1
≈ 0. Daí, temos que:

∆x1 ∆x1 ∆x1


ln(1 + )≈ =⇒ ln(x1 + ∆x1 ) = x1 +
x1 x1 x1
Portanto, a equação (5) acima pode ser reescrita como:

∆x1 ∆x1
∆u1 (x1 , x2 ) = α(lnx1 + ) + βlnx2 = αlnx1 + βlnx2 + α
x1 x1
∆x1
=⇒ ∆u1 (x1 , x2 ) − (αlnx1 + βlnx2 ) = α
x1

41
Ou seja,

∆x1 ∆u1 (x1 , x2 ) α


∆u1 (x1 , x2 ) = α =⇒ U M g1 = ≈
x1 ∆x1 x1

Analogamente,

∆u2 (x1 , x2 ) β
U M g2 = =
∆x2 x2
Repare que a utilidade marginal dos bens mudaria se o cálculo fosse feito com a
função utilidade original, mas a TMS seria a mesma, isto é, a TMS é invariante a
transformações monotônicas.
Podemos usar a condição de tangência, uma vez que o lema anterior é satisfeito por
essa função de utilidade. Logo,

U M g1 αx2 p1
T MS = = =
U M g2 βx1 p2

Substituindo esta relação na restrição orçamentária obtemos:

βx1 p1 p1
p1 x 1 + p2 =
α p2 p2
α m β m
=⇒ x∗1 = =⇒ x∗2 =
α + β p1 α + β p2

Da restrição orçamentária, sabemos que p1 x∗1 é o gasto da demanda do bem 1 e p2 x∗2


β
é o gasto da demanda do bem 2. Assim, temos que p1 x∗1 = α
α+β
m e p2 x∗2 = α+β
m.
α β α
Ou seja, como α+β
+ α+β = 1, α+β
é a proporção da renda m (% da renda) gasta na
β
demanda do bem 1 e α+β
é a proporção da renda m (% da renda) gasta na demanda
do bem 2.

42
3.2 Função Utilidade Indireta

Vimos na seção anterior que o consumidor resolve o seguinte problema:

M ax u(x1 , x2 )
x1 ,x2
s.a. p1 x1 + p 2 x2 ≤ m

Seja X1 ∗ (p1 , p2 , m) e X2 ∗ (p1 , p2 , m) as quantidades ótimas do problema acima, defi-


nimos como Função Utilidade Indireta:

V (p1 , p2 , m) = u(X1 ∗ (p1 , p2 , m), X2 ∗ (p1 , p2 , m))

Ou seja, obtemos a função de utilidade indireta ao substituirmos a solução do pro-


blema de otimização do agente na função de utilidade. No caso da Cobb - Douglas
obtivemos que:

α m
x1 ∗ =
α + β p1
β m
x2 ∗ =
α + β p2

logo a função de utilidade indireta neste caso é dado por:

V (p1 , p2 , m) = u(X1 ∗ (p1 , p2 , m), X2 ∗ (p1 , p2 , m))


 α  β
∗ α ∗ β αm βm
V (p1 , p2 , m) = (x1 ) (x2 ) =
(α + β)p1 (α + β)p2

43
3.3 Função Dispêndio

Muitos problemas de maximização com restrição têm problemas associados de mini-


mização com restrição (problema dual). No nosso caso, o problema dual é a minimi-
zação da renda sujeita a um nível dado de utilidade.Formalmente, temos o seguinte:

M in p 1 x1 + p 2 x2
x1 ,x2
s.a. u(x1 , x2 ) = ū

A teoria que garante essa equivalência é denominada de dualidade.Podemos de-


monstrar que os problemas abaixo nos fornecem o mesmo resultado (sob certas con-
dições):
Dualidade (2 tipos de problema)
(a) Primal

M ax u(x1 , x2 )
x1 ,x2
s.t. p1 x1 + p2 x2 ≤ M

(b) Dual

M in p 1 x1 + p 2 x2
x1 ,x2

s.t. u(x1 , x2 ) = Ū

Assim, o problema dual se resume em encontrar o dispêndio mínimo para uma dada
utilidade, onde a solução deste problema de minimização é denominada de demanda
Hicksiana. Isto é, encontramos xh1 (p1 , p2 , ū) e xh2 (p1 , p2 , ū).
Definimos como Função Dispêndio o gasto mínimo necessário para atingir deter-
minado nível de utilidade, isto é:

E(p1 , p2 , ū) = p1 x1 ∗ (p1 , p2 , ū) + p2 x2 ∗ (p1 , p2 , ū)

A equivalência das demandas Marshallianas e Hicksianas é dada pelo seguinte resul-


tado:

xh (p1 , p2 , ū) = x(p1 , p2 , E(p1 , p2 , ū) (6)

44
3.4 Princípio do Lump Sum

Suponha que o Governo deseja instituir um novo imposto. Para o Governo importa
somente a quantidade arrecadada. Assumindo então que, independentemente do
tipo de imposto, a arrecadação será a mesma, para o consumidor o que é melhor:
tributação via impostos sobre a quantidade ou via impostos sobre a renda?

Figura 25: Princípio do Lump Sum


.

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