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O primeiro dos fatos consiste em que, freqüentemente, a criança pequena parece mais bem
dotada do que a criança de mais idade, nos domínios do desenho, da expressão simbólica
(representações plásticas, papéis representados nas cenas coletivas organizados
espontaneamente, etc.) e por vezes na música. Quando se estuda as funções intelectuais ou
os sentimentos sociais contata-se um progresso mais ou menos continuado, enquanto que
no domínio da expressão artística, ao contrário, a impressão freqüente é de um recuo.
O segundo fato (e que se reduz em parte ao primeiro) consiste em que é muito mais difícil
estabelecer estágios regulares de desenvolvimento no caso das tendências artísticas do que
no caso das outras funções mentais.
Sobre o primeiro desses pontos estamos relativamente bem esclarecidos. O estudo do jogo
infantil e especialmente no jogo simbólico (habitualmente chamado jogo de faz-de-conta)
mostra, com efeito, que o pensamento e a vida afetiva da criança são orientadas por dois
pólos opostos.
Existe, de um lado, a realidade material ou social à qual a criança deve adaptar-se e que
lhe impõe suas leis, regras e meios de expressão: é a essa realidade que se submetem os
sentimentos sociais e morais, o pensamento conceitual ou socializado, com os meios
coletivos de expressão constituídos pela linguagem, etc. Mas existe, de um outro lado,
aquilo que é vivido pelo eu: os conflitos, os desejos conscientes ou inconscientes, as
preocupações, alegrias e inquietude e são as realidades individuais, freqüentemente
inadaptadas e sempre inexprimíveis somente pelos instrumentos coletivos de comunicação,
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que requerem uma forma particular de expressão. Ora, o jogo simbólico não é outra coisa
que não o procedimento de expressão, criado quase que totalmente por cada sujeito
individual, graças ao emprego de objetos representativos e de imagens mentais que,
ambos, complementam a linguagem. Suas funções essenciais são permitir a realização
dos desejos, a compensação com relação ao real, a livre satisfação das necessidades
subjetivas e, enfim, uma expansão tão completa quanto possível do próprio "eu", enquanto
que distinto da realidade material ou social.
Eis porque é conveniente saudar como uma ação ao mesmo tempo necessária e libertadora
todas as tentativas que visam reintroduzir nas disciplinas escolares a vida estética, que a
lógica de uma educação baseada na autoridade intelectual e moral leva a eliminar
totalmente ou ao menos reduzir.
Mas, aqui novamente -- mais que em outros campos -- é necessário evitar a tentação que
ameaça cada vez que uma nova matéria é introduzida na escola: a educação artística deve
ser, antes de tudo, a educação da espontaneidade estética e da capacidade de criação
cuja presença é manifesta na criança pequena; e ela não pode, menos ainda que outras
formas de educação, se contentar com a transmissão e aceitação passiva de uma verdade ou
de um ideal totalmente elaborado: a beleza, como a verdade, somente tem valor quando
recriada pelo sujeito que a conquista.