Vous êtes sur la page 1sur 81

CONJUNTO FRANCISCANO DE OLINDA

PLANO DIRETOR DE CONSERVAÇÃO

Relatório Intermediário

Centro de Estudos Avançados da Conservação Integrada

Olinda - 2006
CECI

Sílvio Mendes Zancheti (coordenador geral)

Jorge Eduardo Lucena Tinoco (coordenador técnico)

Fernando Diniz Moreira (coordenador executivo)

Roberto de Araújo Dantas

Ana Cláudia Fonseca

Ana Florinda Ferreira

Ana Karina Lapa

Carolina Buarque

Marina Cabral

World Monuments Watch, World Monuments Funds

American Express

Fundação Maria Nóbrega


1

OS PROPÓSITOS DO PLANO

Este Relatório Intermediário foi desenvolvido as ações de restauro realizadas após o


com o propósito de fornecer os elementos tombamento da propriedade;
analíticos necessários para a compreensão e • Apresenta os resultados preliminares do
avaliação das características físico-espaciais, de estudo das patologias e danos
gestão e dos valores culturais do Convento de atualmente existentes na construção;
Nossa Senhora das Neves e da Ordem Terceira
de São Francisco (doravante denominados • Descreve e analisa o processo de gestão
Conjunto Franciscano de Olinda). Portanto, o da conservação do Conjunto;
relatório fornece os elementos fundamentais • Apresenta uma declaração de
para orientar as propostas do Plano Diretor de significância para servir de guia para as
Conservação que serão desenvolvidas na ações do Plano Diretor;
segunda fase desse trabalho.
• Formula as diretrizes e os objetivos de
O relatório fornece, também, elementos para a intervenção para a fase de propostas do
compreensão da autenticidade e do grau de Plano Diretor.
conservação do Conjunto Franciscano.

A analise realizada inclui, inclusive, uma 1.1. As instituições envolvidas na


proposta de criar atividades complementares às elaboração do PD
tradicionais do Conjunto, as quais contribuam
O Plano Diretor está sendo elaborado pelo
para a sua sustentabilidade econômica e
Centro de Estudos Avançadas da Conservação
financeira.
Integrada (CECI) em estreita colaboração com os
Esse relatório apresenta os seguintes resultados proprietários do imóvel, isto é, a Província
parciais do PD: Franciscana de Santo Antônio do Brasil e a Ordem
• Descreve o Conjunto Franciscano Franciscana Secular do Brasil. O Instituto do
segundo os aspectos locacionais, tutela Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)
patrimonial, usos construtivos, e a Prefeitura de Olinda também estão sendo
arquitetônicos e artísticos; consultados. O trabalho foi patrocinado e
supervisionado pelo World Monuments Watch,
• Apresenta o estado das prospecções por meio do World Monumento Fund, fundo
arqueológicas realizadas até o presente estabelecido e mantido pelo Americam Express. A
momento; Fundação Maria Nóbrega contribuiu para a
• Apresenta um histórico das principais viabilização do trabalho, principalmente nas
intervenções realizadas na estrutura fases iniciais do projeto.
físico-espacial do Conjunto, ressaltando
1
2

A LOCALIZAÇÃO E A PROPRIEDADE

2.1. A localização
O Conjunto Franciscano localiza-se na cidade de
Olinda, Estado de Pernambuco, Brasil, região
tropical da América do Sul, no Nordeste do
Brasil (Figura 2.1).

O Conjunto está inserido no núcleo histórico da


cidade de Olinda (Fotos 2.1 e 2.2), que apresenta
as seguintes características físico-ambientais.

A cidade encontra-se na Latitude: 08°01'42' e


Longitude: 34°51'42"' . Tem uma altitude média
de 16 m.

O município faz limites com Paulista (norte),


Recife (sul), Oceano Atlântico (leste) e Recife
(oeste). Tem a distância de apenas 6,0 km da
capital do Estado de Pernambuco, a cidade do
Recife.

O clima de Olinda é tipicamente tropical, ou


seja, quente e úmido, com uma temperatura
média anual de 27° C, apresentando uma
amplitude térmica de 5° C. A precipitação
pluviométrica total anual varia de 1.000 a 2.000
mm.

Por ser uma cidade tropical à beira do mar, sua Figura 2.1: Localização
média anual é de 80% , sendo a mínima em
torno de 74%, e a máxima de 97%.

3
Foto 2.1: O sítio histórico de Olinda

Foto 2.2: O Conjunto Franciscano e a cerca conventual

4
2.2. A propriedade
A propriedade tem o regime do direito privado,
pertencendo à Província Franciscana de Santo
Antônio do Brasil, que administra os bens
móveis e imóveis dos franciscanos nos Estados
da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco,
Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará (Figura
2.2). A administração central está localizada à
Rua do Imperador, 206, no Recife – PE .

Figura 2.2: Franciscanos no NE do Brasil. Fonte:


www.franciscanos.org.br

Na maioria dos conventos franciscanos no


Brasil, as edificações da Ordem Terceira 1
encontram-se anexas, ao lado da Ordem
Primeira. No caso particular de Olinda, os
irmãos da Ordem Franciscana Secular do Brasil
– OFS (Ordem Terceira) são os proprietários de,
aproximadamente, 22% do conjunto
arquitetônico construído (vide volume em
vermelho na figura 2). Também são os
administradores do cemitério contíguo à Ordem
Terceira, que rende à fraternidade receita
financeira anual com a venda e aluguel de
jazigos.

5
3

OS VINCULOS LEGAIS E AS NORMAS DE PROTEÇÃO

O Conjunto Franciscano de Olinda está Qualquer interferência na área se sujeita aos projetos
localizado no núcleo histórico da cidade. O especiais de ocupação e uso, tendo em vista a proteção
centro histórico de Olinda foi tombado, pelo á topografia, vegetação e paisagem;
Governo Federal em 1968, e reconhecido, pela Só serão permitidas obras ou novas formas de
UNESCO, como Patrimônio Cultural da ocupação que não impliquem em aterros, desmontes
Humanidade em 1982. e/ou alterações de vegetação existente. Fica
O Conjunto Franciscano foi tombado pelo estabelecida a taxa máxima de ocupação em 5%
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (cinco) da área e gabarito máximo de 01 (um)
Nacional (IPHAN), em 22 de julho 1938 e pavimento, com altura máxima de 3m (três metros)
inscrito no Livro Belas Artes. É formado pela até o nível da platibanda, permitindo acima disso
Igreja e Convento de Nossa Senhora das Neves, telhado com o máximo de inclinação de 30% (trinta),
medidos a partir da soleira, não podendo esta se
capela, casa de oração e claustro dos Terceiros
encontrar a mais de 0.50m (meio metro) acima do
Franciscanos, inclusive o adro e os cruzeiros
meio fio.”
fronteiros e toda a área da antiga cerca
conventual.

No contexto das legislações de proteção à


cidade, o conjunto apresenta as seguintes
restrições edilícias:

3.1. Legislação Federal


Sob a égide da legislação federal de proteção aos
bens culturais, instituída a partir do Decreto-Lei
n° 25, de 30/novembro/1937, o Sítio Histórico
de Olinda (SHO) regula-se pela Re-ratificação
do Polígono de Tombamento do Município e Figura 3.1: Planta de zoneamento da Notificação n°
seu Entorno, por meio da Notificação de nº. 1.155/79, com o Setor C
1155/79. Por esse documento, o terreno da cerca
conventual dos franciscanos está localizado no 3.2. Legislação Municipal
Setor C – Área verde de preservação rigorosa,
Em relação à legislação municipal de proteção, o
Sub-setor C3 (Figura 3.1):
Conjunto Franciscano está inserido na Zona de
“O Sub-setor C3, se caracteriza como área especial Especial Proteção Cultural (ZEPC1), no
de proteção florestal; chamado Conjunto Monumental, Setor Verde 1
(SV 1), área de grande densidade de vegetação e
solo virgem que envolvem monumentos

7
tombados. Observa-se na Figura 3.2 que os
perímetros de proteção das duas legislações são
Segunda refere-se à vida monástica feminina
semelhantes.
contemplativa ligada a Santa Clara. A Ordem Terceira
O Art. 26, Lei Municipal n° 4.849/1992, diz: corresponde aos irmãos leigos, e suas atividades
remontam à Idade Média, quando eram conhecidos
“No Setor Verde 1 não será permitido aumento de
como “Irmãos e Irmãs da Penitência”. Estes últimos
taxa de ocupação existente, ficando os Setores Verdes estão divididos em Regular, com vida religiosa
2 e 3 sujeitos aos projetos especiais de ocupação e uso, consagrada por votos, e Secular, com vida religiosa
tendo em vista a proteção à topografia, vegetação e sem consagração de votos (É o caso dos Terceiros de
paisagem, sendo obrigatória análise especial pelo Olinda). Fonte: Flos Sanctuorum, in Brotéria LXXII, nº.
órgão federal competente e Conselho de Preservação 2 – Lisboa 1961.
dos Sítios Históricos de Olinda e aprovação pela
Prefeitura Municipal, observados os seguintes
requisitos :

I - Somente serão permitidas obras ou novas formas


de ocupação que não impliquem em aterros,
desmontes e/ou alteração da vegetação existentes:

II - A taxa de ocupação permitida é de até 5% (cinco


por cento) da área;

III - O gabarito permitido é de 01 (um) pavimento


(h= 3,00m).”

A mencionada lei prossegue com várias outras


determinações para a área do conjunto franciscano.

Figura 3.2: Planta de zoneamento da legislação


municipal com o Setor ZEPC1, sub-setor SV-1

Notas

1 A Ordem Primeira corresponde ao serviço


masculino dos religiosos franciscanos. A Ordem

8
4

AS CARACTERÍSTICAS DA CONSTRUÇÃO

4.1. Dimensões da edificação O conjunto edificado antigo, excluídos os anexos


recentes, tem uma área construída de 5.935 m²,
O conjunto arquitetônico tem uma área de
sendo 3.009 m² no pavimento térreo, 1.751m² no
projeção construída de 3.349 m² em um terreno
primeiro pavimento e 1.172 m² no segundo
com 28.190 m², portanto, com uma taxa de
pavimento. A Ordem Terceira tem uma área
ocupação de 11,87% (Figura 4.1). A área total
construída correspondente a 14,8%, enquanto a
construída é de 6.294 m², contabilizando os
Ordem Primeira fica com os 85,2% restantes.
anexos.

Figura 4.1: Planta do terreno e localização das edificações

9
4.2. Topografia e locação das
edificações
A planta do levantamento topográfico apresenta
a delimitação do terreno da cerca conventual e
localiza as edificações e a cobertura vegetal da
cerca conventual. Esse documento encontra-se
no Anexo 1.

Com referência à cobertura vegetal, constituída


na sua totalidade por árvores frutíferas, ressalta-
se que, no incêndio ocorrido em março de 2006,
perderam-se em torno de 30% das árvores
adultas. O incêndio foi alertado pela equipe do Figura 4.3: Primeiro Pavimento
CECI no relatório preliminar, encaminhado aos
franciscanos e ao WHF em fevereiro de 2006.

4.3. Disposição dos ambientes


internos
O Conjunto Franciscano de Olinda é uma
edificação de três andares, que pode ser
dividida em dois setores (Figuras 4.2, 4.3 e 4.4).
O primeiro setor corresponde ao Convento
Franciscano e ocupa todos os andares. O outro
setor corresponde a Ordem Terceira, que ocupa
apenas o pavimento térreo e o primeiro andar. Figura 4.4: Segundo pavimento
A interseção desses dois setores encontra-se na A fachada principal mostra, claramente, a
passagem da Igreja de Nossa Senhora das Neves divisão em setores. O bloco construído central,
para a capela de São Roque. correspondente à Igreja de Nossa Senhora das
Neves e à capela de Santa Ana, é recuado em
relação aos blocos da Ordem Terceira, à
esquerda, e ao Convento de São Francisco, à
direita.

O acesso ao Conjunto pode ser feito por quatro


entradas: pela portaria da Ordem Terceira
(ambiente 42); pela Igreja de Nossa Senhora das
Neves (ambiente 33); pela capela de Santa Ana
(ambiente 24) e pela portaria do Convento
(ambiente 1). Diariamente, apenas este último
acesso está disponível.

O pavimento térreo é composto por três áreas


Figura 4.2: Pavimento térreo (Figura 4.5).

10
A primeira área é privativa dos frades e é formada por três ambientes: a galilé (ambiente
funcionários do Convento. É composta por 33), a nave (ambiente 34) e a capela-mor
cozinha (ambiente 12 e 14), refeitório (ambiente (ambiente 35). A igreja possui ainda um trás-
2), despensa (ambiente 13), depósitos (ambientes altar (ambiente 32), local destinado ao
3, 4, 6, 7, 8, 9 e 10), sanitários (ambiente 5) e armazenamento de objetos da igreja, e o
garagem (ambiente 15). Também fazem parte corredor (ambiente 31) que liga a capela-mor
dessa área a copa (ambiente 27) e a biblioteca diretamente à sacristia. Esse corredor também é
(ambiente 28), acessível, também, aos conhecido com corredor dos mortos, por possuir
professores e estudantes do curso do Instituto jazigos. Ambos os ambientes são de acesso
Franciscano de Teologia de Olinda (IFTO). restrito aos frades e aos funcionários. Completa
a área a capela de São Roque (ambientes 36 e
37).

A última área corresponde à Ordem Terceira.


Apenas à nave e à capela-mor de São Roque
(ambientes 36 e 37) é permitido o acesso do
público. A sacristia (ambiente 45) e suas
dependências (ambientes 46 e 47), a capela do
Senhor (ambiente 43), a portaria (ambiente 42), o
auditório (ambiente 41) e o pátio são de acesso
restrito aos membros da Irmandade.

O acesso ao primeiro pavimento pode ser feito


por três escadas. A primeira (ambiente 17) e a
segunda (ambiente 31) são de uso exclusivo dos
Figura 4.5: Áreas do pavimento térreo
frades. A terceira (ambiente 29) é utilizada,
A segunda área é aquela aberta à visitação também, por estudantes e professores do IFTO.
pública. Inicia-se na pela portaria do Convento
O primeiro pavimento não possui uma
(ambiente 1), seguindo pelo parlatório
organização clara, mas pode ser dividida em 4
(ambiente 16). Esse ambiente é o primeiro
áreas (Figura 4.6).
distribuidor de fluxo, dando acesso ao auditório
(ambiente 18), à circulação do terraço –mirante A primeira área é privativa dos frades, com uma
ou ambiente 20, ao primeiro andar (ambiente ala de serviço com sala (ambiente 2), rouparia
17), restrito aos frades, e ao claustro (ambientes (ambiente 4), biblioteca (ambientes 5, 6, 9 e 32),
21 e 22). O claustro é o segundo distribuidor de depósito (ambiente 7) e fotocópia/computador
fluxo. Por ele se tem acesso à capela de Santa (ambiente 8). Existe uma outra ala com as celas
Ana (ambiente 24), à capela do Capítulo para visitantes religiosos (ambientes 13 e 14),
(ambiente 23), ao corredor de circulação dos residentes (ambientes 15, 16, 17 e 18) e do
(ambiente 26) que leva à sacristia (ambiente 30), guardianato (ambientes 20 e 21).
e à nave da Igreja de Nossa Senhora das Neves A segunda é destinada ao IFTO, com três salas
(ambiente 34). de aula (ambientes 30, 23 e 10), secretarias
A Igreja de Nossa Senhora das Neves pode ser (ambientes 27 e 28) e sala dos professores
considerada um espaço divisor. À sua esquerda, (ambiente 26).
ou seja, no lado norte do Conjunto, encontra-se
a Ordem Terceira, e à sua direita o lado sul do
Conjunto, o Convento de São Francisco. A igreja
11
Francisco (Foto 4.1), uma das cinco bicas de
água natural construídas na cidade para
abastecê-la. Hoje se encontra fora de uso.

Figura 4.6: Áreas do primeiro pavimento

Ainda nesse pavimento, existem ambientes de


uso comum para frades, professores e
estudantes, como a clausura (ambiente 24), a
capela (ambiente 22), os banheiros (ambiente
11), o terraço (ambiente 19) e o coro da Igreja de
Foto 4.1: Bica (fonte) de São Francisco
Nossa Senhora das Neves (ambiente 34). Este
último dá acesso à torre sineira (ambiente 35) No centro do terraço – mirante localiza-se a
que está interditada. Essa é a terceira área. cacimba, local onde os frades se abasteciam de
água.
A quarta área corresponde à Ordem Terceira. O
acesso a ela se dá pelo auditório do térreo
(ambiente 41) e é composto, apenas, por dois
ambientes: o consistório (ambiente 37) e a
presidência (ambiente 36), de uso restrito aos
membros da Ordem.

O último pavimento é de uso restrito aos frades


do Convento (Figura 4.4). Seu acesso se dá
apenas por uma escada (ambiente 37). É
composto por celas dos residentes (7 celas), celas
disponíveis para visitantes religiosos (17 celas), Foto 4.2: Terraço com cacimba

banheiro (ambiente 10), biblioteca (ambiente 34) Outro elemento é a casa de banhos, localizada
e sala de recreação (ambiente 26). abaixo do terraço – mirante (Foto 4.3). Esse
espaço mantém sua configuração original, sendo
Além das áreas construídas do Conjunto
importante registro dos hábitos franciscanos.
Franciscano, alguns outros elementos não
podem ser esquecidos.

O primeiro é o sítio ou pomar que se localiza a


leste do Conjunto. Esse pomar é uma das
maiores áreas verdes do sítio histórico de
Olinda. É nele que se encontra a bica de São
12
4.4. Sistemas construtivos utilizados
Para fins deste texto, entende-se Sistema
Construtivo como o conjunto de elementos
materiais e técnicos que, associados, formam um
todo de uma edificação. As partes desses
elementos constituem em si um sistema
(subsistema), com vários elementos
interdependentes, formados pelos componentes
materiais da construção, organizados e
compatibilizados de modo a cumprir os
Foto 4.3: Antiga casa de banhos requisitos e critérios funcionais e construtivos
Na Ordem Terceira, junto à sacristia, está (Weidle, 1995).
localizado o cemitério, onde estão os
O sistema construtivo que o Conjunto
sepultamentos e jazigos dos irmãos.
Franciscano de Olinda apresenta é coerente com
Por último existe o Adro do Conjunto as técnicas e materiais utilizados no período
Franciscano, com seu cruzeiro. Atualmente, uma colonial brasileiro – sistema composto por
área desse adro encontra-se com uma escavação alvenarias estruturais em pedras e tijolos,
arqueológica interrompida. apoiando uma cobertura em madeira sob telhas
cerâmicas (Figura 4.5). Aliás, em Olinda, não se
tem ainda conhecimento sobre a existência de
vestígios das construções em terra (adobe) e/ou
madeira dos primeiros momentos da
colonização portuguesa. Pela fartura da
Natureza em disponibilizar a pedra calcária e a
argila, a cidade adotou rapidamente os sistemas
construtivos mais sólidos, com pedras e tijolos,
argamassados com a cal. Nesse sentido, o Foral
de Olinda, lavrado em 12 de março de 1537, já
indicava a existência de construções em pedra e
Foto 4.4: Cruzeiro
cal.
A documentação arquitetônica (plantas, cortes e
O Conjunto Franciscano de Olinda tem
fachadas) do conjunto arquitetônico encontram-
características construtivas tipicamente luso-
se no final deste capítulo e no Anexo 2.
brasileiras, assim é que os espaços são
A documentação foi realizada tomando-se por configurados por maciços em pedras ou tijolos,
base levantamentos anteriores, realizados pela argamassados e revestidos com uma mistura de
5ª Superintendência Regional do Instituto do cal, com areia ou argila. A essa estrutura auto-
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e pela portante soma-se a adoção de cercaduras em
Prefeitura de Olinda. A equipe do CECI utilizou pedras lavradas (cantaria) para marcar os vãos
o processo de levantamento expedido, 1 próprio de portas, janelas e arcos, como também os
para um Plano Diretor, onde é importante o arremates de canto de quadra e ilhargas, com os
macroplanejamento do conjunto arquitetônico. cunhais ou pilastras. O uso da pedra é tão
importante na arquitetura franciscana, não só
em Olinda mas no Nordeste do Brasil, que,

13
diferentemente dos beneditinos, carmelitas e barrotes deteriorados. Entretanto, não houve
jesuítas, a utilizaram na colunata do claustro, prejuízos para a autenticidade da técnica e do
onde os arcos deram leveza e suavidade a esse sistema construtivos da alvenaria, porque esses
antigo espaço de deambulação e meditação. foram mantidos.

Ao sistema maciço e estático das alvenarias, Sobre as estruturas de madeira dos assoalhos
juntam-se as estruturas flexíveis e articuladas do assentavam-se as paredes divisórias em taipa ou
madeiramento dos pisos acima dos rés-do-chão estuque (tabique), a quais delimitavam as celas
e das coberturas. Coerente com as mais antigas dos frades e outros ambientes da vida monacal
técnicas de construção, todas as alas do nos pavimentos superiores. Também nesse caso,
Conjunto Franciscano possuem barroteamento os materiais da maioria desses ambientes foram
com traves de madeira, que apoiam assoalhos substituídos por alvenaria de tijolos cerâmicos
ou forros. revestidos com argamassa à base de cimento, de
modo que a aparência ondulada dos rebocos e a
Ao longo dos anos 1970 e 1980, o IPHAN
“selagem” nos assoalhos desapareceram – itens
substituiu todo o madeiramento dos pisos e
importantes na percepção do antigo nas alas
forros, trouxe prejuízos para a autenticidade dos
conventuais.
materiais, pois, segundo consta, não houve
tentativas de recuperação ou consolidação dos

Figura 4.5: Esquema do sistema construtivo

O sistema construtivo das coberturas apresenta nenhum testemunho das antigas telhas
dois modelos comuns à colônia luso-brasileira: coloniais3.
tesouras e terças de empena a empena. Segundo O sistema das tesouras é o do tipo canga-de-
Lopes (2004), os sistemas das tesouras e o porco, utilizado ora com linha alta ora com linha
madeiramento dos telhados não são mais os baixa, sustentando uma trama composta por
originais, inclusive estes últimos não têm mais caibros e ripas sobre linhas de terças, frechais e

14
cumeeira. A maioria dos telhados não tem mais
a técnica autêntica dos caibros roliços e ripas de
embira (trama) e das madeiras lavradas
(estrutura), sendo substituída pelo
madeiramento serrado, industrializado. Nesse
sentido, o caso mais significativo é o dos
cachorros do telhado do terraço da Ordem
Terceira que foi totalmente reconstruído
décadas atrás. Nele, não ficou nenhum vestígio
que indique este telhado ter sido de madeiras
lavradas. As que estão atualmente expostas são
madeiras serradas industrialmente (ver: Fotos 4.5: Painel de azulejos do claustro

Capítulo 9, Fotos 9.12 e 9.13), visíveis a ponto de


se observar perfeitamente os sulcos da serra Nos pisos existem dois materiais e técnicas
elétrica4. distintas de grande importância para a leitura
das épocas dos ambientes: tijoleiras e ladrilhos
A visão atual dos telhados como novos e
hidráulicos. No claustro, alpendre do
acabados contrasta com a percepção dos antigos,
belvedere, corredor da sacristia e capela do
anteriormente aos serviços emergenciais
capitulo, as tijoleiras de barro cozido de
realizados nas coberturas do conjunto. As
confecção artesanal assinalam, pelo desgaste do
figuras abaixo demonstram a perda total da
tempo, os períodos mais remotos da construção
pátina do telhamento do conjunto, além de não
ou as intervenções mais recentes.
haver mais a possibilidade de se encontrar
nenhuma telha antiga nas coberturas.

Outras técnicas e materiais encontrados em São


Francisco de Olinda são dignos de registro pela
significância que seus elementos impregnam
nos ambientes a tal ponto que modificam
completamente as percepções e sentimentos do
observador. As principais técnicas das artes
decorativas no Conjunto Franciscano de Olinda
estão nos revestimentos das paredes, dos pisos e
dos tetos. Inicialmente, há o relevante
patrimônio de azulejos, cujos silhares estão
aplicados nas paredes dos principais ambientes
Fotos 4.6: Tijoleira do claustro
internos da igreja e convento – nave, claustro,
sacristia, capelas, corredores e escadarias (foto
Os ladrilhos hidráulicos estão presentes
4.5). O acervo do convento de Olinda remete às
principalmente na nave e capela-mor da igreja e
técnicas antigas da tradição azulejar lusa do
nas Capelas de São Roque e Santa Ana. Esses
século XVII – a técnica majólica2 ou faiança,
pisos foram introduzidos no conjunto
onde a policromia dos azulejos
provavelmente a partir do final do século XIX e
geometricamente atapetados (séc. XVI) foi
início do XX, sendo os mais antigos os indicados
substituída pelo monocromatismo reproduzido
pelas letras E e D nas Fotos 4.6 a 4.14 abaixo,
em azul e branco.
pois, pelo desenho e feitura, podem ser belgas.
15
Os mais recentes, sem dúvida, são os mostrados
nas letras F, G e H.

Fotos 4.6 a 4.14: Principais tipos de ladrilhos hidráulicos encontrados nos ambientes do conjunto.

Nos tetos dos ambientes, há alguns excelentes seus tetos. Alguns deles estão encobertos por
exemplos de técnicas construtivas na elaboração tinta óleo, outros tiveram a decoração raspada,
de forros em madeira, tais como artesoado, uns estão com iluminação absolutamente
emoldurado, caixotão, tábuas corridas (lisos), comprometedora da integridade da pintura
com rompantes e roda-teto (cimalha) (Fotos 4.14 decorativa. Seja como for, salvo prospecções
a 4.24). Os forros da nave e capela-mor da mais acuradas, os forros guardam suas
Ordem Terceira e os da Ordem Primeira e principais características técnico-construtivas:
Convento têm técnicas elaboradas na talha e madeiras lavradas, fixadas com pregos e cravos
decoração sobre madeira. Aliás, os franciscanos em ferro forjado.
de Olinda foram profícuos na arte de revestir

16
Fotos 4.15 a 4.24: Imagens dos forros da nave e coro da Ordem
Primeira, nave e capela-mor da Ordem Terceira, salão da irmandade,
galilé, parlatório, sacristia, biblioteca do térreo e auditório,
respectivamente.

17
18
19
20
21
22
1 O levantamento arquitetônico expedido
corresponde à documentação rápida dos dados de
uma edificação, de modo a registrar as linhas gerais
de medidas horizontais e verticais, volumetria e
ornamentação.

2 Técnica vinda de Itália e introduzida na Península


Ibérica a meados do século XVI.

3 Todo o telhamento antigo foi totalmente substituído


em 2005/2006 por novas telhas artesanais,
padronizadas em único tipo. Constatação in loco do
arquiteto Jorge Tinoco junto ao mestre das obras, Sr.
Carlos Silva, da construtora WSM Ltda.

4 Nesse caso se pode estabelecer uma das principais


antinomias entre entre alguns teóricos da restauração.
Há quem advogue ser esse o procedimento correto e
coerente com as recomendações de se dar a marca da
época da intervenção. Por outro lado, há quem
considere correta a aplicação e execução de materiais
e técnicas tradicionais, porque uma datação da
intervenção poderia ser garantida por meio de marcas
em locais tecnicamente discretos.

5 Técnica inda da Itália e introduzida na península


Ibérica em meados do século XVI.

23
5

OS USOS

5.1. Usos permanentes oferecidas todos os anos. Já as turmas do


terceiro e quarto ano acontecem alternadamente.
Apesar da redução da significância da vida
Portanto, cada ano letivo é composto de fato por
religiosa na sociedade atual, os franciscanos
três turmas.
conseguiram manter por mais de quatro séculos
o uso religioso do Conjunto Franciscano. As O curso ainda não funciona como é desejado em
missas acontecem uma vez por semana, sempre termos de infra-estrutura. Existe a necessidade
aos domingos de manhã, na Igreja de Nossa de expansão, visto a entrada de dez alunos de
Senhora das Neves. O convento possui seis diversas regiões do Nordeste que virão morar
frades que residem nele permanentemente e no convento nos próximos meses.
quatro funcionários encarregados dos serviços Desde 2000, o convento é aberto à visitação
gerais. turística, sendo um das principais atrações
Além desse uso principal, o convento ainda turísticas de Olinda, chegando a receber 4.000
abriga o curso de teologia do Instituto turistas por mês, entre os meses de janeiro e
Franciscano de Teologia de Olinda (IFTO). Uma março, e 1.500 turistas ao mês no restante do
parceira entre os franciscanos e os capuchinhos, ano. Os visitantes têm acesso apenas ao térreo,
esse curso visa à formação de novos quadros incluindo a nave da igreja, à sacristia, à Capela
religiosos. O curso tem cerca de setenta alunos de Santa Ana, ao claustro e ao terraço.
matriculados e seis professores em seu quadro. Já na Ordem Terceira, essas visitações não são
Desses alunos, quatro pertencem à comunidade permitidas. O uso religioso acontece apenas
franciscana e residem no convento. duas vezes por ano, por ocasião da celebração
O curso ocupa três salas de aula destinadas das festas de São Roque e Santa Isabel da
diariamente aos estudantes, todas localizadas no Hungria na Capela de São Roque.
primeiro pavimento. No térreo, o curso ocupa Seu auditório é utilizado cerca de uma vez por
ainda a biblioteca e, eventualmente, o auditório. mês para reuniões de informação da Irmandade
A área administrativa restringe-se a uma e reuniões da Ministra com seu Conselho. Os
secretaria, uma sala de professores, uma copa e outros espaços são utilizados como suporte para
uma sala para foto-copiadoras, todas no essas atividades, como copa, banheiros, pátio,
primeiro andar. O curso tem um diretor, um hall, secretaria e presidência.
vice-diretor, um secretário, uma bibliotecária e
Apesar dessas atividades a mensais, a Ordem
uma zeladora.
Terceira permanece a maior parte do tempo
O curso perfaz um período de quatro anos e fechada.
cada ano letivo é dividido em dois semestres. As
turmas do primeiro e segundo ano são

25
5.2. Usos temporários
O convento é utilizado para casamentos,
recepções, seminários e encontros de empresas.
Ocorrem cerca de dois casamentos por mês, e,
em cada três casamentos, pelo menos, um há
recepção no próprio convento, com 300 a 400
pessoas que circulam entre o claustro e o
terraço.

Os seminários e reuniões de empresas


acontecem na razão de um por mês. Alguns
eventos chegam durar três dias e a reunir
setenta pessoas no máximo. Os espaços
ocupados restringem-se basicamente ao
auditório e a uma sala no primeiro andar, mas
os participantes podem circular pelo terraço,
claustro e demais espaços comuns do térreo.

Portanto, diante da já referida redução da


atividade religiosa, o convento apresenta
grandes espaços ociosos no seu dia-a-dia. As
funções permanentes e temporárias que ele
abriga acontecem de forma precária,
necessitando de investimentos e melhorias para
que desempenhem adequadamente sua função.

O convento oferece espaços únicos e de singular


beleza artística para eventos, mas eles carecem
de uma infra-estrutura de suporte apropriada,
como banheiros, cozinha e espaços para estoque,
no caso de recepções de maior porte. Esse foi o
grande problema apontado por companhias de
eventos que realizaram casamentos e recepções
no Conjunto Franciscano. A falta de espaços
climatizados revela-se como grande obstáculo
para que o convento possa cumprir
adequadamente a recepção de eventos, como
seminários e reuniões.

Na Ordem Terceira, apenas a capela do


noviciado possui um uso temporário.
Eventualmente, esse espaço é utilizado para a
realização de velórios.

26
6

O SÍTIO ARQUEOLÓGICO

Devido à implantação do Conjunto Franciscano (valas) de prospecções e foram confirmadas as


no sítio remontar ao segundo quartel do século suspeitas.
XVI e de sua localização ter sido o ambiente
natural da ocupação indígena pré-cabralina pela
nação Caetés, sem dúvida, toda a área do
conjunto e seu entorno oferece grandes
possibilidades de vestígios arqueológicos. Até o
momento da confecção deste relatório, não
foram localizadas referências sobre a realização
de prospecções arqueológicas anteriores a 2002.
Em fevereiro desse ano, foram achados vestígios
do antigo adro franciscano - um beiço de pedra
lavrada -, por ocasião das instalações do
Foto 6.1: Buraco deixado pela escavação
canteiro de obras do Projeto de Recuperação do arqueológica.
Largo e Cruzeiro de São Francisco. Quando
estava sendo cavado um buraco no terreno para Os trabalhos do cruzeiro foram concluídos e os
se construir a fossa séptica do sanitário dos do adro paralisados. Desde abril/2002 até hoje,
operários 1, o mestre-de-obras deparou-se com a janela maior das prospecções (Foto 6.1) ficou a
uma laje de pedra. Devido à sua experiência 2 céu aberto, exposta às intempéries. Pelo clamor
em obras de restauro, o mestre solicitou a dos franciscanos e da sociedade civil
presença da equipe de arquitetos e arqueólogos organizada4, devido inclusive aos prejuízos
da Municipalidade, que realizou uma varredura causados aos frades pela redução das atividades
no local usando o método Ground Penetrating religiosas e dos eventos – falta de espaço para o
Radar (GPR) 3 . O resultado da interpretação dos estacionamento de veículos – o fosso dessa
dados denunciou uma área sólida mais ou escavação foi encoberto provisoriamente até
menos a 1,50m abaixo do piso atual, fazendo a uma definição do projeto final pelas entidades
equipe suspeitar tratar-se do antigo adro da competentes.
igreja e cruzeiro. Foram abertas cinco janelas

27
Figura 6.1: Plano das prospecções arqueológicas do adro de São Francisco de Olinda. Fonte:
SEPACCTUR/Olinda – maio/2006

Neste sentido, a Prefeitura de Olinda resolveu projeto já encaminhado às instituições estatuais


com a equipe da Diretoria do Patrimônio e federais de preservação – Fundação do
Histórico da SEPCCTUR promover escavações Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco
em todo o adro, conforme se pode verificar na (Fundarpe) e IPHAN, respectivamente. A planta
Figura 6.1, na área achuriada “prospecções a e os cortes apresentados nas Figuras 6.1 a 6.3
realizar em 2006”5. A proposta da dão uma idéia da escala da investigação
Municipalidade é muito arrojada, segundo o arqueológica proposta.

Figuras 6.2 e 6.3: Projeto de exposição arqueológica. Fonte: SEPCCTUR, 2006


O CECI verificou que o projeto não contempla decisão quanto aos vestígios do adro antigo que
nenhuma diretriz pré-estabelecida de tomada de serão aflorados, bem como de outros que

28
porventura surpreendam a equipe. Inclusive, na realizado com estudos incompletos, ameaçando
borda norte da Janela A (Figura 6.1), foram um dos importantes itens sobre a significância
localizados vestígios de sepultamento indígena6. da arquitetura franciscana – o adro.
Na verdade, o projeto aparece mais como uma
proposta de revelar um passado perdido.
Desconsidera o trabalho secular construtivo e de 1 Procedimento arcaico, pois desde a época em que
formulação de uma concepção artístico-barroca foi inventado o container, esse tipo de fossa não é
do espaço urbano que integrou o adro à fachada mais utilizado em canteiros de obras devido às
do Conjunto Franciscano, ao cruzeiro, aos agressões ao meio ambiente e ao sítio histórico.
caminhos e à vegetação, em uma topografia 2 Mestre Narciso Alves, com 76 anos, é um dos mais
acidentada. O projeto também não oferece antigos mestres-de-obras em restauração ainda em
soluções para as seguintes questões elementares: atividade no país.

A exposição dos vestígios arqueológicos para os 3 Trabalho contratado com a empresa paulista de
visitantes não poderia ser feita por consultoria Terrascience Ltda, em março/2002.
representações de realidade virtual?
4 A Sociedade dos Moradores e Amigos de Olinda
Como será resolvido o desnível para o acesso à Antiga (SODECA), criada em 1981, é uma entidade
igreja pelo adro, pois com o corte para a vigilante e atuante na preservação dos valores
culturais do sítio histórico da cidade.
abertura da Rua de São Francisco, no segundo
quartel do século passado, não serão mais 5 Informação dos arquitetos André Pina e Emanuel
localizadas partes desse ambiente? Almeida, do Departamento de Patrimônio Histórico
da SEPACCTUR, em 5/mai/2006
Qual será o critério para o preenchimento das
lacunas das lajes de pedra faltantes e de outros 6 André Renato, citado.
materiais antigos?

Já foram realizados testes físico-químicos nas


lajes de pedra encontradas para a determinação
do seu estado de conservação? Para saber que
tipo de consolidação será necessário?

Como ficará o desnível entre a base atual do


cruzeiro e o antigo nível do adro? Ele será
desmontado e remontado? Se ficar no nível
atual, como será tratado o arremate de transição
entre um nível e outro?

O fluxo da Rua de São Francisco será


interrompido? Em caso afirmativo, como será
resolvida a circulação dos veículos do hotel e
moradores vizinhos?

E tantas outras questões estão sem resposta. A


principal, que não se cala, é a que trata da
garantia dos recursos financeiros nos
orçamentos públicos (Município, Estado e
União) para essa empreitada. Afinal, passaram-
se quatro anos para se decidir sobre um projeto

29
7

A ARQUITETURA DO CONJUNTO FRANCISCANO

7.1. A “escola franciscana” de Igarassu, em Pernambuco, e o de João Pessoa,


arquitetura na Paraíba.

O convento de Nossa Senhora das Neves faz Esses conventos não foram produtos isolados
parte de um magnífico grupo de conventos da criação individual, mas sim de um contínuo
construídos pela Ordem Franciscana no litoral processo de adições e reformas que se
do Nordeste brasileiro durante o período desenvolveu de acordo com uma particular e
colonial. As características ímpares desses clara concepção arquitetônica da vida
conventos levaram vários autores a monacal. O programa arquitetônico desses
designarem a escola franciscana de conventos conjuntos apresenta algumas características
como a primeira manifestação de uma constantes, como:
arquitetura legitimamente brasileira (Bazin, Um claustro com uma série de atividades
1983:137; Gomes, 2002:11). Ao contrário dos estruturadas ao redor;
jesuítas que importaram seus modelos dos
Uma igreja que se destaca como um corpo
riscos maneiristas de Filippo Terzi, os
mais alto no conjunto, com nave única, capela-
franciscanos adotaram soluções inéditas ao
mor, sacristia e coro;
adaptarem elementos e funções da vida
monacal medieval e renascentista às condições Um campanário único, elemento vertical de
tropicais. destaque da composição, geralmente recuado
da fachada e localizado em uma das ilhargas
A cristalização do programa arquitetônico
do templo;
franciscano só atingiu corpo a partir da
segunda metade do século XVII, com a Uma fachada marcada pela presença da galilé,
expulsão dos holandeses dessa parte do Brasil espécie de nártex que precede a igreja,
(1630-1654). Os franciscanos iniciaram então elemento que remonta às origens do
um amplo programa de reconstrução e de cristianismo;
construção dos seus mosteiros, findo o qual Um adro com o cruzeiro estendendo-se em
haviam criado um agrupamento de catorze frente à igreja.
estabelecimentos ao longo da costa nordestina.
Esse conjunto inclui os conventos de Cairu, Espaço de meditação, oração e recolhimento, o
Paraguaçu, São Francisco do Conde e claustro recebeu um tratamento diferenciado.
Salvador, na Bahia; São Cristóvão em Sergipe; Foi a partir dele que orbitaram todas as
Penedo e Marechal Deodoro em Alagoas; unidades arquitetônicas integrantes do
Ipojuca, Sirinhaém, Paudalho, Olinda, Recife e conjunto. Os claustros possuíam nítida
inspiração renascentista, composto por

31
graciosas arcadas, geralmente de ordem solução comum nas casas senhoriais, mesmo
toscana, encimada por outra galeria. Ao redor em algumas igrejas (Bazin, 1983: 154).
do claustro estavam os locais da vida comunal,
Ainda segundo Bazin (1982:149-150), em
como refeitórios e bibliotecas no primeiro
relação às fachadas das igrejas existiam dois
pavimento, além dos acessos à nave da igreja e
tipos de frontispício adotados pelos conventos
a outros espaços religiosos. Muitas vezes os
franciscanos. O primeiro, o mais simples e
dormitórios abriam-se para o claustro no
clássico, era encimado por um frontão
segundo andar (Teles, 1975:28; Bazin,
triangular, cuja origem parece remontar ao
1983:149).
convento de Ipojuca, e de forma mais geral à
A nave da igreja estava geralmente do lado arquitetura-chã portuguesa (Sousa, 2005:27-28;
esquerdo do claustro. Com a exceção de Bazin, 1983: 151). O segundo tipo, cuja origem
Salvador, todas possuíam nave única, com a se encontra na fachada do convento de Cairu,
capela-mor pouco profunda e mais estreita. na Bahia, apresentava uma composição
Uma das marcas das igrejas franciscanas reside monumental de formato piramidal, realizada
nas capelas das Ordens Terceiras e sua relação pela superposição de pavimentos decrescentes.
direta com a nave da igreja conventual. As O pavimento inferior apresentava cinco
capelas das Ordens Terceiras eram arcadas, o intermediário possui três tramos
implantadas ao lado ou, muitas vezes, divididos por pilastras, e o terceiro era
engastadas perpendicularmente em relação à composto por um tabernáculo contendo uma
nave das igrejas. Podiam ter uma entrada estátua (Campello, 2001:43; Bazin, 1983: 153).
independente e abriam-se diretamente para a Segundo Alberto Sousa ( 2005:93-96), essa
nave da igreja através de grandes aberturas fachada foi pioneira na introdução do gosto
emoldurada por arcos. É justamente nessas barroco nas fachadas brasileiras. As fachadas
capelas onde se podem encontrar os excessos dos conventos de João Pessoa e de Paraguaçu
ornamentais da arquitetura barroca no também foram enquadradas dentro de um
Nordeste do Brasil. triângulo eqüilátero (Fonseca, 1988: 34). Os
exemplos desse segundo tipo mostram a
Em relação ao aspecto externo, esses
influência da tratadística clássica na
complexos apresentavam fachadas austeras e
arquitetura franciscana.
despojadas, com toda a atenção voltada para o
frontispício que recebia um tratamento Outra particularidade dos conventos
diferenciado. franciscanos reside no enquadramento
urbanístico. Os complexos arquitetônicos dos
Uma marca dos conventos franciscanos é a
frades são famosos pelo amplo adro balizado
galilé, ou o nártex reentrante, elemento que
por um cruzeiro de pedra, que constitui
remonta às primeiras basílicas cristãs, quando
solução inédita e particular dessa ordem. Além
eram criados pórticos para abrigar os não-
de proverem espaços adequados para se
batizados. Esse elemento foi retomado no
admirar a fachada, o adro funcionava como
Brasil pelos franciscanos e beneditinos,
elemento de intermediação, entre o aspecto
demonstrando o esforço de adaptação às
mundano da cidade e o caráter sacro do
condições climáticas tropicais, na medida em
convento, clamando por uma atmosfera de
que provia uma adequada transição entre o
resignação (Campello, 2001:51; Fonseca, 1988:
exterior e o interior da igreja. A galilé pode ser
25; Bazin, 1982:152). Os adros tiveram o seu
vista como uma derivação do alpendre, uma
mais requintado exemplar no conjunto de João
Pessoa. Os adros franciscanos remontam a

32
espaços claramente barrocos, mas não embora suas proporções se mostram bastante
procuram aqueles grandes eixos e perspectiva refinadas.
do barroco italiano, e sim objetivam tirar
Uma das marcas do claustro são os contrastes
partido da topografia e dos edifícios
entre a rusticidade do piso em lajotas e as
circundantes. É um barroco mais modesto, mas
paredes revestidas por painéis de azulejos,
não menos belo e dramático.
entre esses mesmos painéis e o delineamento
das colunas de arenito, entre a claridade
7.2. A arquitetura do Conjunto emanada das paredes caiadas do corpo da
Franciscano igreja e a sombras criadas pela varanda do
segundo pavimento.
O complexo franciscano de Olinda foi
resultado de sucessivas adições e reformas,
visto que foi formado por conjunto de blocos
interligados. A melhor forma de se realizar
uma análise da sua arquitetura é tomar como
referência os blocos principais.

7.2.1. O Claustro

O claustro é o espaço principal do complexo, já


que as outras unidades e espaços
arquitetônicos gravitam em torno dele (Foto
7.1). É um espaço de meditação que possui
origem nos monastérios medievais.
Claramente inspiradas em protótipos
renascentistas, o claustro é cercado por
graciosas arcadas, de ordem toscana, encimada
por outra galeria que tem uma varanda com
telhado sobre uma estrutura de madeira
apoiada em colunas e mureta de pedra.

Segundo Bazin, “o estilo pançudo das colunas,


corpo cilíndrico do capitel mais reduzido,
almofada menos saliente, o ábaco mais bem Foto 7.1: Claustro
delineado, com uma parte de litel saliente, os
arcos em asa de cesto, a rica modinatura que 7.2.2. O frontispício da igreja
sustentam as colunas altas” indicam que a A fachada atual apresenta frontispício
construção não pode ser anterior ao século dividido horizontalmente em três partes: a
XVIII. primeira consiste na galilé, com colunas e
Os claustros franciscanos apresentam um arcadas; a segunda apresenta as três janelas do
nítido processo de evolução desde o de coro, de verga e com ornatos de cantaria; e na
Ipojuca, o menor e mais despojado, até o terceira apenas aparecem o frontão em volutas
enorme e suntuoso claustro de Salvador. O e o nicho central com imagem, encimado por
claustro de Olinda parece situar-se a meio pináculos e cruz (Foto 7.2).
termo, por suas dimensões relativamente Analisando essa fachada, verifica-se a
modestas e pela sobriedade e despojamento, existência de duas fases construtivas: uma que

33
corresponde à galilé, e outra que corresponde transformando em um grande frontão. Os
aos andares superiores, fruto de reforma ou pináculos fecham a composição provendo um
modernização posterior. A galilé, ou o nártex tom ascendente à fachada.
reentrante, foi uma adição à primitiva fachada,
A torre única é recuada da fachada e possui
avançando sobre a rua. A galilé era
sineira em arco pleno, coroada por cúpulas de
inicialmente saliente ao corpo da igreja e
arestas com pináculo piramidal (Foto 7.3). O
aberta para os lados, uma situação habitual nas
recuo da torre revela-se uma solução
construções franciscanas. Com as obras de
engenhosa na medida em que liberta o
reconstrução iniciadas em meados do século
frontispício para ser totalmente simétrico.
XVIII, ela adquiriu a feição atual, incorporada
ao corpo da igreja, com três grandes portas em 7.2.3. A nave da igreja
arco. Uma cruz de pedra, encostada a uma das
A nave central possui planta retangular e pé-
arcadas da galilé, acusa a data de 1700, mas o
direito duplo, sendo acessada do exterior
término da fachada parece ser posterior a essa
através da galilé e pelo claustro (fotos 7.3 e
data.
7.4). Possui nave única, com a capela-mor
pouco profunda e mais estreita. O interior
destaca-se pela ornamentação composta por
painéis de azulejos e talha. Retratando cenas
religiosas, os painéis do forro, consistem em
dezoito octógonos dispostos de forma a
conferir um aspecto abobadado. As paredes
são revestidas com azulejos que ilustram
passagens bíblicas, emolduradas por barras
sinuosos compostas por anjos e querubins.

Foto 7.2: Fachada e torre da igreja

A fachada da igreja de Olinda parece ter


conjugado a austeridade da do convento de
Ipojuca com os contornos gerais da fachada do
convento de Cairu, na Bahia. Ela mantém
ainda certa simplicidade e rigidez da
arquitetura chã portuguesa. Há uma clara
hierarquia proporcionada pela regularidade
dos planos demarcados por pilastras e
cimalhas, pela expressividade das cimalhas
retas, pela regularidade na disposição das
janelas. As aletas e volutas, entretanto, provêm
um grande movimento que contrasta com a
regularidade do conjunto e confere unidade Foto 7.3: Nave e altares laterais
entre os dois pavimentos superiores, quase os

34
Os altares colaterais, barrocos do final do
século XVIII, emolduram o arco cruzeiro, que é
pouco decorado. A capela-mor tem um teto
abobadado, acompanhando o arco cruzeiro e
as tribunas laterais. O retábulo do altar
apresenta nichos entre as colunas ornadas por
motivos florais.

Foto 7.5: Sacristia

Foto 7.4: Nave e coro


Acima da galilé e no começo da nave,
encontra-se o coro apoiado em uma estrutura
de madeira. O coro é somente acessado pelo
pavimento superior, a partir do claustro, onde
Foto 7.6: Lavatório
está uma passagem para a torre sineira. Possui
mobiliário em talha e o mesmo forro da nave No forro de caixotões da sacristia, o barroco
central, embora apresente uma decoração mais parece manifestar-se mais livremente em
sóbria. relação às outras partes do convento. Entre os
octógonos se encaixam losangos que retratam
7.2.4. Sacristia frutas e plantas. Numa das paredes existe um
grande arcaz com espaldar em talha e espelho,
A sacristia está localizada atrás da igreja,
que é um excelente exemplar do gosto D. João
colocada transversalmente e ocupando toda a
V. Na parede à sua frente, um armário
largura da nave central. Essa forma assegura
incrustado na parede impressiona por sua
boas proporções à sacristia, uma das mais
beleza e perfeita adaptação ao ambiente.
belas das construídas pelos franciscanos. Seu
volume possui duas arcadas salientes ao corpo
7.2.5. Capela de São Roque e o conjunto da
retangular e em uma delas se encontra um belo
Ordem Terceira
lavatório de mármore de Lioz. A sacristia é
acessível por meio de dois corredores que A capela de São Roque (Foto 7.7) foi
ladeiam a capela-mor. construída perpendicularmente à nave central
da igreja do convento, sendo ligada a ela por
A beleza de seu espaço interno emana,
meio de um grande arco, inteiramente
sobretudo, da azulejaria e do magnífico forro.
revestido de madeira entalhada (Foto 7.8). Essa
As paredes são revestidas até o teto de azulejos
maneira singular de relacionar os dois
azuis que retratam a vida de São Francisco e a
ambientes de culto é uma característica
trajetória dos franciscanos no Brasil.

35
freqüente nos conventos franciscanos do
Nordeste.

Foto 7.8: Arco cruzeiro, altares colaterais e laterais.

O complexo da Ordem Terceira inclui ainda a


Foto 7.7: Capela de São Roque sacristia dos terceiros, situada ao lado direito
da Capela, uma Casa de Oração paralela à
A capela tem seu forro em artezoados com as
igreja da Ordem Primeira, uma sala para
quais pinturas de santos da devoção
assembléias e reuniões, que possui dois
franciscana, impressiona pela beleza e
andares e avança em direção à rua. A sacristia
harmonia das formas e desenhos. É admirável
dos terceiros tem um belo forro pintado,
a forma como se harmonizam nesse forro os
provavelmente da segunda metade do século
octógonos e os losangos, que levam a um
XVIII.
perfeito enquadramento dos caixotões.

A talha de feição robusta manifesta-se no altar, 7.2.6. A Capela de Santana e a biblioteca


trabalhado em madeira e douração, no púlpito,
O bloco que contém a Capela de Santanna, ou
nas tribunas e nas portas. No arco cruzeiro e
da Portaria, e a biblioteca foi finalizado em
dos altares colaterais e laterais, a talha mostra-
1754, de acordo com a inscrição na fachada.
se com uma ornamentação mais profusa. Na
Percebe-se claramente que foi engastado no
Capela-mor, uma seqüência de tábuas
conjunto e foi feito com o intuito de se tornar a
pintadas e emolduradas, semelhantes aos
entrada principal do complexo. É um volume
caixotões artezoados, encontra-se disposta na
que se destaca por sua composição simétrica e
abóbada de berço. O conjunto de talha e
seu formato cúbico. Possui cobertura em
pintura da capela da Ordem Terceira possui
quatro águas com amplos beirais à sua volta.
uma unidade muito grande foi executado entre
Para se construir a portaria, foi destruída a
o final do século XVII e o início do século
parede exterior daquela ala do convento,
XVIII.
permanecendo a que define o claustro. Dessa
ala antiga, conforme ainda se pode ver, resta

36
um pequeno trecho de parede, entre o bloco da A talha do altar apresenta uma movimentação
portaria e a igreja, na altura da galilé. inusitada, representando o gosto do barroco
português da época de D. João V.
Emoldurada por largas pilastras de pedra, a
fachada apresenta uma ortogonalidade
austera. A planaridade da fachada é
interrompida apenas pelas janelas. No térreo, a
porta central de verga reta marca o eixo da
composição, sendo complementada por duas
janelas, uma de cada lado, também de verga
reta. Essa porta central, hoje não utilizada, dá
acesso direto para o exterior do edifício. As
janelas retas são gradeadas e encimadas por
ornatos de cantaria. A porta central é
encimada pelo organograma da ordem
emoldurado por colunas, sob as quais se
apoiava um antigo alpendre. Típico das
construções franciscanas, servindo para
proteger os fiéis do sol, esse alpendre
encontrava-se no mesmo alinhamento da
galilé.

Esse arranjo entre uma porta central ladeada


por duas janelas continua nos dois pavimentos
superiores. No segundo pavimento, existem
três janelas retas, e no terceiro repete-se o Fotos 7.9 e 7.10: Capela de Santanna
mesmo esquema, mas há uma sacada central. A biblioteca principal localiza-se no segundo
No térreo, existe a Capela de Santa Ana, pavimento, acima da Capela da Portaria.
também chamada de Capela da Portaria, que Possui uma vista para o claustro, através de
possui planta simétrica. Na parede ao fundo duas de suas janelas. É ocupada por estantes
da sala está situado o altar de Santa Ana, em fixas, com colunas divisórias, cornijas e
estilo barroco português, de onde se tem ornamentações pintadas e douradas. O teto é
acesso ao claustro por duas aberturas também contornado por elegante cornija, sendo todo
simétricas ladeando esse altar. A capela é composto por painéis a óleo, tendo com centro
aberta diretamente para a rua, por meio de um quadro da Virgem.
uma grande porta de madeira com almofadas
7.2.7. Capela do Capítulo
e duas janelas que inundam o recinto com uma
luz diáfana, formando uma zona de sombra, A Capela do Capítulo abre-se para o claustro e,
em contrasta com a enorme luminosidade do apesar de pequena, é uma das mais belas dos
exterior. conventos franciscanos (Foto 7.11). Ela é
revestida internamente por azulejos do mesmo
Ao redor de toda a sala há um belo painel de
tipo daquele a da escada de acesso aos
azulejos, provavelmente do século XVIII,
dormitórios, que remontam à fase inicial da
narrando passagens da vida de Santa Ana e de
construção do convento, provavelmente em
Nossa Senhora. A admirável pintura do forro
torno de 1660. Ao redor de toda a sala,
dessa capela refere-se a motivos franciscanos.

37
encontram-se bancos de madeira que se
encostam diretamente no silhar de azulejos.

Foto 7.12: Bloco conventual

A fachada do bloco apresenta, no térreo, uma


serie de óculos e, nos dois andares superiores,
Foto 7.11: Capela do Capítulo janelas de vergas retas, estreitas e altas. Possui
um robusto embasamento de pedra que
A talha do retábulo dessa sala capitular
acompanha a linha do piso do bloco da
enquadra-se, na classificação de Lúcio Costa
portaria e da igreja. Como está locado em um
(1941: 52), no modelo de transição entre os
declive, o embasamento atinge altura
retábulos de gosto proto-barroco e os ditos
significativa em sua outra extremidade. O
propriamente franciscanos. Nesse modelo de
interior é dividido em celas, isto é, pequenos
transição, ainda não está presente a exuberante
quartos para moradia dos religiosos. Cada cela
decoração barroca e ainda se pode perceber a
possui uma pia e uma janela que dá para o
marcação da estrutura arquitetônica. A sala é
exterior. Algumas celas funcionam como salas
ornamentada com um belo altar que reflete o
de aula e como secretaria do curso de teologia.
gosto D. João V. A composição do forro plano
O interior desse bloco é marcado pelo
com painéis apresenta certas similaridades
despojamento.
com a da Capela do Terceiros. Em suma, no
interior da sala, talhas, azulejos e as pinturas
7.2.9. O terraço e o mirante
do forro de madeira harmonizam-se de forma
sublime, conferindo um exemplo marcante do
final do século XVII.

7.2.8. O bloco conventual

Locado rente à rua e ao lado do bloco da


portaria, está o bloco das celas conventuais.
Apresenta-se como um grande bloco maciço
de grande força (Foto 7.12). Originalmente em
forma de U, hoje tem a forma de um quadrado,
quando a face leste foi construída em meados
do século XVIII. Suas alas são cobertas por um Foto 7.13: Terraço mirante com cisterna e relógio de
sol
telhado em duas águas. Como o bloco da
portaria, também possui suas esquinas A partir da colocação da laje de cobertura da
marcadas por largas e robustas pilastras. cisterna, criou-se um terraço a céu aberto,
conformado por duas robustas paredes caiadas
do volume conventual, formando um dos

38
espaços mais propícios para a meditação e dos célebres conjuntos de João Pessoa e Cairu.
recolhimento do convento (Foto 7.13). É um Em Olinda, é, por excelência, um elemento
espécie de claustro, com duas de suas faces plástico urbano e não arquitetônico, porque é
abertas para o verde da encosta e para o azul um espaço aberto, rigidamente organizado por
do mar e do céu, elementos que atestam o um triângulo com base na forte geometria da
caráter divino. A vista é emoldurada pelas reentrância da fachada do Conjunto (fachada
paredes e pelo piso do terraço, eliminando o da igreja e do bloco da portaria) e pelo ponto
caráter mundano da cidade e concentrando-se focal criado pelo cruzeiro (Fotos 7. 14 e 7.15).
concentrar no céu e no mar. Do terraço há uma
bela vista do Recife. 7.2.11. A adaptação à paisagem

O Complexo Franciscano de Olinda é


7.2.10. O adro
composto por um conjunto de blocos que se
O adro é um dos mais marcantes elementos de ligam internamente e se adaptam aos declives
integração entre a arquitetura do Conjunto e o do terreno. O programa franciscano era uma
sítio histórico. forma matriz com inúmeras possibilidades de
disposição e combinação, sabiamente
adaptadas às circunstâncias locais.

Foto 7.14: Adro na década de 1980

Foto 7.16: Vista geral, década de 1970

Localizado em sítio exclusivo, um morro com


declive acentuado em direção ao mar, o núcleo
inicial do complexo foi construído em um dos
poucos pequenos platôs (Foto 7.16). A partir
de então, foi crescendo por adição e reformas
em uma perfeita adaptação aos acidentes do
terreno. Nessa adaptação do conjunto ao sítio,
Foto 7.15: Cruzeiro antes da pavimentação da área
estabelece-se uma relação poética com a
O adro do conjunto de Olinda desenvolve-se paisagem urbana e natural.
de maneira completamente diferente da dos
espaços semicerrados, com murros azulejados,
39
dos painéis de azulejos, em contraste com as
calmas paredes caiadas; nos grandes beirais
que geram ambientes sombreados; nas
pequenas aberturas retangulares a
emoldurarem a paisagem; nas portadas e
cercaduras de cantaria, que delimitam as
janelas, e na simples articulação da arcada
renascentista do claustro. A originalidade e o
valor estão na simplicidade, unidade e coesão
dos elementos arquitetônicos e espaciais. Essas
características reforçam a expressão
Foto 7.17: Fachada oeste franciscana da língua portuguesa, como termo
Na fachada principal do Conjunto, o bloco que indica simplicidade, franqueza e
conventual e o bloco da sala de reuniões da abnegação, características essas presentes
Ordem Terceira avançam para a rua, em nesse Conjunto.
relação ao bloco da portaria e da igreja,
criando uma reentrância em frente a estes
últimos, o que cria espaço agradável para
admirar as fachadas desses (Foto 7.17). Isso
ainda é acentuado pela relativa mudez e
discrição dos blocos que avançam que faz com
que nossa a atenção se volte para as fachadas
mais elaboradas da igreja e do bloco da
portaria.

***

Embora esses elementos arquitetônicos


tivessem origem na vida monástica medieval,
a flexibilidade com que foram empregados
confere caráter único aos conventos
franciscanos no Brasil. A singularidade desse
conjunto, como de outros conjuntos
franciscanos, reside menos em seus elementos
tipológicos e mais na forma como eles foram
articulados entre si e distribuídos no espaço.
Em outras palavras, o que torna este exemplar
da Escola Francisna único é articulação dos
espaços e volumes.

Por fim, restam a simplicidade e a sinceridade


da arquitetura franciscana. Em vários pontos
do convento, notam-se essas respostas claras e
francas, como nos vigamentos de madeira a
repousarem diretamente sobre o arenito das
colunas toscanas do claustro; no azul cobalto

40
8

OS ELEMENTOS ARTÍSTICOS INTEGRADOS À ARQUITETURA

Como um ente vivo, a arquitetura guarda as diversos ambientes manifestações que, em seu
marcas do tempo. Os elementos artísticos que a conjunto, constituem um patrimônio impar.
ela se sobrepõem ajudam a situá-la, marcando a Sem se concentrar no gênero “quadro”, cujas
ação da cultura humana mediante seus aspectos datações quase sempre se inserem do século XIX
estético-estilísticos. Nas paredes, tetos e pisos e ainda possuem a propriedade da mobilidade,
acumulam-se informações que ajudam a marcar pode-se destacar no conjunto pictórico do
o momento nos quais se estabeleceram as Conjunto Franciscano de Olinda os magníficos
informações estéticas que datam e ajudam a “forros em caixotão” da Capela da Ordem
desvendar a formação dos espaços. Terceira, com seu altar-mor, da nave da Igreja
Pintura,talha e azulejaria fundem-se no estilo de Nossa Senhora das Neves e de sua sacristia,
barroco, criando uma ambiência artística e além do da Capela do Capítulo.
gerando as informações de que a igreja Coloca-se assim, em segundo plano, a pintura
necessitava para passar suas idéias e orientações em tabuado de madeira do forro da Capela de
catecísmicas. Elas hoje fornecem os subsídios Santa Ana Mestra e a pintura do teto abaixo do
necessários para desvendar os momentos de coro (Foto 8.1), cujas perspectivas, de tendência
formação espacial do Convento de São ilusionista, demonstram a busca dos modelos
Francisco, marcando com suas características as italianos do período, guardadas as devidas
fases de organização pelas quais passaram os proporções e apuro técnico.
diversos ambientes que constituem o edifício.
Assim sendo, é o conjunto desses elementos,
aliado à estrutura ornamental típica do barroco
luso-brasileiro que permite afirmar uma
inserção espaciotemporal dos atuais espaços do
Convento de São Francisco de Olinda entre a
segunda metade do século XVII e o século XVIII,
constituindo em si uma verdadeira aula de
estética barroca desse período.

8.1. A pintura
Foto 8.1: Pintura ilusionista no forro do coro da Igreja
Dentro dos princípios gerais que caracterizam a de Nossa Senhora das Neves - séc. XVIII
pintura do período barroco, difundida no Brasil Também se pode citar, embora já tenha sido
durante os séculos XVII e XVIII, o Convento de retocado e esteja em avançado grau de
São Francisco de Olinda apresenta em seus deterioração, o forro em painéis da Biblioteca,

41
que apresenta de maneira bastante singela e vernizes e marcam a inserção do forro no início
tardia os mesmos motivos religiosos e naturais do século XVIII.
dos exemplares anteriores.

Do século XVII para o XVIII, a pintura situava-


se a painéis de madeira, afixados isoladamente
em estruturas montadas abaixo dos tetos das
igrejas. O forro em caixotão é formado por
painéis pintados com imagens, quase sempre
emoldurados por talha. No início do período
barroco no Brasil, segunda metade do século
XVII, tais molduras eram simples e retas. À
medida que se apróxima a metade do século
XVIII, como ocorreu no Conjunto Franciscano,
as molduras tornaram-se mais elaboradas, com
ótimos trabalhos de carpintaria e apliques com
grandes relevos. Os painéis pintados se
apresentam-se em formas octogonais mescladas
com intervalos losangulares preenchidos por
pinturas ou constituindo-se de elementos de
talha aplicada. Existem, assim, quatro excelentes
trabalhos que caracterizam por ser do final do Foto 8.2: Forro da nave da Igreja de Nossa Senhora
século XVII a meados do século XVIII. das Neves - século XVIII

Já na capela dos Terceiros o foco foi dado aos


Nos primeiros exemplares, a pintura insere-se
ícones de santos pertencentes ao universo
nos forros de maneira educativa. Na composição
franciscano, tais como São Roque e Santa Isabel
dos painéis da nave única da Igreja de Nossa
Rainha de França, ambos colocados no forro do
Senhora das Neves, estão distribuídos dezoito
altar-mor em uma construção da segunda
octógonos, três a três, de maneira a dar ao forro
metade do século XVII, o que se evidencia tanto
uma forma levemente abobadada (Foto 8.2). As
pela simplicidade da estrutura, quanto pelo
imagens mostram cenas bíblicas, tais como “São
modelo em abóbada de berço que conserva
José ensinando Jesus a carpintaria”, situado do
ainda a forma trazida de Portugal. Os quinze
lado do Evangelho, acima do altar lateral. São
caixotões, dispostos cinco a cinco, articulam-se
lições de religião que, junto com as barras de
por meio de molduras retas, brancas, com
azulejo logo abaixo, eram mostradas aos fiéis em
exterior dourado. Nos ângulos, talhas em folhas
uma aplicação catequética. Nessa concepção,
de acanto para os quatro lados e uma dália
não poderia faltar um ícone evocativo da
central marcam a composição.
Virgem, em destaque no centro do conjunto. Os
espaços entre os octógonos são preenchidos não Na nave da Capela de São Roque, o esquema de
por pintura mas por apliques de talhas, em imagens repete-se de maneira mais próxima ao
forma de quatro almofadas triangulares brancas, final do século XVII e início do XVIII. Ali são
entre as quais se forma uma cruz de acantos e vistos, por exemplo, ícones de São Francisco de
fitomorfos dourados, inserida nos espaços azuis Assis, antes da capela-mor, e de São Carlos, que
que limitam as molduras dos caixotões. Essas se segue à aduela do arco cruzeiro que separa a
pinturas, embora bastante elaboradas, Capela da Igreja de Nossa Senhora das Neves e
encontram-se escurecidas pela oxidação dos a Capela dos Terceiros (Foto 8.3). No centro da

42
composição vê-se mais uma vez a imagem de rocalhas, o que ainda indica as primeiras
Nossa Senhora da Conceição, em destaque décadas do século XVIII. Também se verifica a
conseguido por meio de grande saliência da pintura de veios azuis, que pretendem dar
talha que se forma em moldura polilobada aparência de marmoreado, e as arestas entre os
cercada de acantos. caixotões são preenchidas com trabalho de talha
dourada, confirmando a inserção temporal.

Foto 8.3: Capela de São Roque (dos Terceiros) - século Foto 8.4: Detalhe do forro - Capela de São Roque -
XVIII século XVIII.

Ali, em forro plano, as figuras centrais são Na Capela do Capítulo, com características
inseridas nos octógonos retos ou polilobados muito próximas da Capela dos Terceiros em
formados pelos caixotões. Os ambientes termos de composição do forro, encontramos
pintados nos quais as figuras se apresentam, um forro plano, com painéis temáticos sobre a
internos ou externos, estão perspectivados de infância de Cristo, tendo ao centro um painel no
maneira ingênua, fazendo com que as imagens qual o anjo avisa a José, em sonho, para que
sejam visualizadas quase sempre soltas, em suas fosse em direção ao Egito. O forro coincide com
vestes mais escuras que o entorno (Foto 8.4). a talha do retábulo e a azulejaria que marcam o
Figuras mais modestas foram inseridas ao final do século XVII.
molde de bustos nos losangos que ocupam os
No último forro em caixotão plano, o da
espaços entre os caixotões maiores. Na Capela
sacristia (Foto 8.5), o barroco se manifesta em
Terceira, o enquadramento dos caixotões,
sua forma mais plena. São quinze caixotões
bastante mais elaborado do que no altar-mor, foi
octogonais pintados com grande maestria,
feito por meio de da talha com contornos
exibindo cenas da vida de São Francisco e uma
dourados em fundo branco, no qual se
imagem destacada da Virgem (Foto 8.6). Entre
desenvolveu uma decoração fitomorfa, pintada
os octógonos situam-se losangos nos quais se
em tom vermelho, sem apresentar indícios de

43
inserem naturezas-mortas, em composições perspectiva ilusionista, cujo teor sempre tentam
muito diversificadas de fruteiras, e as arestas inserir as imagens centrais da composição num
são marcadas por volumosos apliques de verdes ambiente arquitetônico. Cria-se um efeito
folhas de acanto e flores de cores variadas. O ilusório com o prolongamento da cimalha por
colorido é exuberante e as perspectivas, meio da pintura. Colunas e parapeitos em que
perfeitas. O volume da talha, o colorido e a se debruçam personagens de importância para a
composição, com o conjunto de talha e azulejos, Igreja ou para a Ordem religiosa, circundam a
permitem datar o espaço como sendo da cena central, reproduzindo ilusoriamente um
primeira metade do século XVIII, quando anjos espaço arquitetônico que não existe. Foi assim
e zoomorfos povoam a iconografia barroca. que se deu efeito no tabuado do teto abaixo do
coro, onde cenas arquitetônicas simulam balcões
laterais que precedem a profundos espaços
falsos, enfeitados por guirlandas e decoração
arquitetônica barroca, onde anjos observam o
passante. No centro, um poço de cúpula,
emoldurado por cartelas, e uma balaustrada.

Foto 8.5: Vista geral do forro em caixotão da sacristia -


século XVIII

Foto 8.7: Pintura do forro Capela de Santa Ana - São


Francisco e os estigmas

O mesmo ocorre na Capela de Santa Ana


Mestra, situada em um espaço ampliado em
meados do século XVIII para acompanhar a
nova fachada da igreja. Nesse momento foram
introduzidos os painéis de azulejo, reportados
mais adiante, e foram pintadas as cenas de São
Francisco recebendo os estigmas de Cristo, em
volta de um arabesco formado pelas cordas
(Foto 8.7). Em torno da cena, personagens da
Ordem Franciscana visualizam a cena inserida
em cartelas, que se situam dentro do espaço
arquitetônico emoldurado por balaustradas
Foto 8.6: Imagem central do forro da sacristia -
Virgem - século XVIII. pintadas em volta da composição. Esse painel
Seguindo o caminho natural do Barroco, ao tem a visualização prejudicada pelo baixo pé
penetrar-se na segunda metade do século XVIII, direito, que não permite um domínio completo
existem no Conjunto Franciscano as pinturas em

44
da composição, bem como pela oxidação dos apresenta-se por meio das aspirais de acantos,
vernizes que o escureceu. rendilhados fitomorfos e concheados de
desenho simétrico.
Destaca-se no conjunto pictórico a imagem da
Virgem que, seguindo os ditames da Igreja
Contra-reformista, aparece em sua evocação
como a Imaculada Conceição e na sua visão das
Neves. Em todos os ambientes foi dado
destaque à figura da Virgem entre as imagens
delimitadas pelos caixotões. Também se destaca
o sentido arquitetural da pintura, à medida que,
se num primeiro momento os caixotões
representam uma divisão do plano
arquitetônico do teto, em um segundo momento
a própria pintura tenta imitar a arquitetura,
criando elementos que a reproduzem.
Foto 8.8: Conjunto dos altares da Igreja de Nossa
Senhora das Neves
8.2. A talha
A talha barroca expressa-se no Convento de São
Francisco de Olinda a partir de seu apogeu. Isso
se dá quando, no início do século XVIII, o
Barroco libera-se definitivamente da prisão à
estrutura compositiva arquitetônica e expressa-
se por meio de uma talha volumosa e opulenta,
que continua repleta dos fitomorfos mais
diversos, como folhas de acantos, parreiras,
frutos e flores dos mais variados, passando a
entremear a essa vegetação zoomorfos, tais
como fênixes e pelicanos, que são assimilados
pela mitologia cristã, além das mais variadas
estirpes de anjos, tais como querubins com
apenas cabeças e asas, serafins, anjinhos
rechonchudos e atlantes. O Conjunto
Franciscano também apresenta excelentes Foto 8.9: Detalhe do capitel do arco cruzeiro entre a
exemplares do Rococó religioso do Brasil os Capela dos Terceiros e nave da igreja Nossa Senhora
quais marcam o visual da Igreja de Nossa das Neves
Senhora das Neves com seus três altares (Foto Essa estrutura compositiva geral, ainda parietal
8.8). e plana, já indica a expressão de talha barroca
chamada D. João V, pois nela se inicia o jogo de
A talha do arco cruzeiro (Foto 8.9) e dos altares
volutas formando quartelões que movimentarão
colaterais e laterais da Capela da Ordem
a composição em direção ao Barroco da primeira
Terceira do Convento de São Francisco de
metade do século XVIII.
Olinda apresenta um esquema no qual o
douramento se espalha e se impõe perante o Embora todos os conjuntos da Capela dos
fundo branco. Neles, a profusão ornamental Terceiros ainda se remetam aos esquemas

45
formais do período anterior, com coroamento ornamentos se apresentem menos volumosos, o
marcado pela presença do arco pleno, já que permite situá-lo no início do século XVIII.
apresentam a tendência barroca de desintegrar o Vale salientar que ele se sobrepõe a um frontal
plano da arquitetura. Assim se quer deixar a em azulejo, provavelmente do século XVII.
entender que o conjunto de talha da Capela da
Em seguida há a Capela de Santana, que embora
Ordem Terceira do Convento de N. Sra. das
já tendo sofrido retoques em sua pintura e
Neves foi executado, sucessivamente, entre o
douramento, ainda mostra alguma clareza
final do século XVII e o início do século XVIII,
arquitetônica, como ocorre na Capela do
quando nos momentos finais se compôs a
Capítulo. Aqui, no entanto, além de um
volumosa talha do arco cruzeiro, na qual
intrincado jogo de ramagens douradas que
querubins já participam da composição. No
proliferam desde o frontal de altar até os
início de século XVIII, situa-se a magnífica talha
capitéis das colunas torsas, já se verifica uma
do arco que separa a Capela dos Terceiros da
movimentação mais intensa do conjunto e a
Igreja de N. Sra. das Neves, em que a maestria
introdução de zoomorfos policromados
do escultor praticamente solta da superfície as
aplicados às colunas, que sustentam um
enormes margaridas, folhas de acanto e anjos,
volumoso coroamento com folhagens e volutas
que constituem os principais motivos
em “S”, a que ainda se sobrepõe um grande
decorativos do início desse século.
brasão. Essa composição movimentada remete a
Nenhum outro conjunto escultórico do um gosto D. João V, o que a faz adentrar
Conjunto Franciscano de Olinda é tão singular esteticamente na primeira metade do século
como a talha da Capela do Capítulo, no qual se XVIII.
podem inserir esquemas nos do século XVII,
Em período mais avançado e com exímia
chamado pelos estudiosos da talha de Nacional
execução, situa-se o conjunto de talha da
Português, com claras intrusões do século XVIII.
sacristia (Foto 8.10), na qual a expressão barroca
O fato que permite situá-lo nessa posição é a
D. João V assume todo o seu esplendor, em uma
marcação da estrutura arquitetônica, ainda
magnífica composição em ébano constituída por
visível, na qual um par de colunas torças,
duas exímias peças parietais de arcazes e
recobertas de ornamentos fitomorfos
gaveteiros para paramentos. Embora esses
entranhados, dividem o plano da composição
elementos constituam exemplares de mobiliário,
intermediária, e uma cimalha separa esse nível
o fato de preencherem um espaço parietal e,
do superior, destacando um nicho central. Após
inclusive, embuti-se nele, pode-se fazer
a cimalha, o conjunto é coroado por um frontão
referência a esse conjunto como o mais
já bastante desfigurado pela ornamentação
exuberante do Conjunto Franciscano de Olinda.
fitomorfa terminada por um concheado. Essas
Nos arcazes, o negro do ébano, embora não
composições ornamentais, embora já demasiado
ajude na visualização da riqueza de detalhes da
carregadas e marcadas por pesados
talha, torna mais enigmático o conjunto de
douramentos e policromia, não desenvolvem a
fitomorfos, zoomorfos, anjos e atlantes que
volumetria, nem apresentam ainda os
constituem os motivos decorativos de quatro
zoomorfos e antropomorfos que marcarão o
dos cinco tramos que constituem a peça. Apenas
século XVIII. Tudo isso, aliado à falta de
o corpo central foi completamente dourado, e
espaçamento entre as colunas, permite crer que
nele inseriu-se um nicho com um Cristo
o esquema compositivo desse altar se insere no
crucificado. A simplicidade da composição
final do século XVII. O frontal de altar apresenta
indica que houve nesse tramo uma intervenção
uma estrutura compositiva mais leve, embora os
na segunda metade do século, mantendo-se os

46
gaveteiros. O terço inferior é dominado pelas planos nos quais as rocalhas se distribuem,
gavetas. Nos dois tramos centrais situam-se os formando curvas e contra-curvas graciosas de
espelhos, e nos tramos das extremidades ícones aparência quase oriental. As composições dos
pintados com Jesus, e Maria com o menino. O dois exemplares ocupam os cantos frontais da
segundo gaveteiro, para pequenas peças, está nave, emoldurando o arco cruzeiro, e são
embutido na parede situada diante do gaveteiro coroadas por exuberantes sanefas vazadas,
maior. Esse, embora de menores dimensões e compostas de rocalhas.
tratamento decorativo, não deixa de
impressionar pelo trabalho quase de rendilhado
de seu coroamento. Aqui, nas duas peças, o
caráter escultórico e ornamental já predomina
completamente frente à composição
arquitetônica, situando-os em meados do século
XVIII. A beleza do conjunto foi realçada pelo
magnífico forro e pela azulejaria que completam
a ambiência.

Foto 8.11 : Altar colateral da nave da Igreja de Nossa


Foto 8.10: Arcaz da sacristia - século XVIII Senhora das Neves - Rococó, final do XVIII

Finalmente, o conjunto escultórico dos altares da Nos últimos anos do século XVIII, o altar mor
Igreja de N. Sra. das Neves (Foto 8.11). Nele já se da Capela dos Terceiros foi reformado,
torna marcante a substituição dos motivos recebendo apliques de influência rococó na
acânticos pelas rocalhas, o único elemento que mesa e uma limpeza de sua estrutura
atesta os esquemas compositivos rococós. A arquitetônica anterior, que foi assim despojada
confusão ornamental da primeira metade do da maior parte da decoração D. João V (Foto
século XVIII foi então substituída pela 8.12). O arco do camarim, plano de fundo do
contenção, e outra vez a talha passa a ser um altar, recebeu então um belo dossel que
motivo ornamental sobreposto ao plano infelizmente se encontra atualmente bastante
arquitetônico dos altares. danificado. Tornou-se assim um exemplar
híbrido, porém inserido no contexto estético do
Na Igreja de Nossa Senhora das Neves, os
século XVIII.
altares colaterais mostram uma composição do
final do século XVIII. O douramento já deixou O altar-mor ocupa uma capela profunda e
de predominar, restringindo-se a filigranas que apresenta características de ter sido executado
acompanham a decoração, e o branco domina os após os altares colaterais que o precedem. As

47
rocalhas são ainda o centro da composição, que “Naves inteiras, por vezes desproporcionadas, capelas
termina com um enorme plano semelhante a um nuas e mimos arquitetônicos, imensos corredores
frontão, no qual está aplicada uma inflexão de claustrais, pátios e sacristias, escadas mesquinhas,
rocalhas encimadas por um medalhão. Os tudo se transforma em cor, tudo ganha em
festões e guirlandas de flores e os laços de fita monumentalidade e em espetáculo com esses azulejos
que decoram diversos espaços do conjunto policromos, dinamizando e ampliando o espaço; é
prenunciam esquemas neoclássicos, sem podemos dizer, o milagre do azulejo português”
quebrar o sabor rococó do conjunto que O Convento de São Francisco foi um dos
esteticamente se situa no final do século XVIII. depositários de tais elementos, possuindo dois
conjuntos de exemplares da família classificada
como Palmeta ou Massaroca, datados de
meados para segunda metade do século XVII. O
padrão tapete aparece na Capela do Capítulo
(Foto 8.13), em padrão com escamas com pontos
nas cores amarela e azul em fundo branco, e
também na escada (Foto 8.14), na qual aparece
apenas a variedade com pontos, porém com as
mesmas cores da capela.

As barras são formadas por exemplares do


mesmo momento classificados como “perolados
em óvulo”, possuindo as mesmas cores que o
Foto 8.12 : Altar mor da capela dos terceiros século
XVIII conjunto azulejar e separado desse por um
estreito friso de cor branca. Esses exemplares
No conjunto, a talha que compões os diversos
representam uma raridade, tanto pela
espaços do Convento de São Francisco de
antiguidade como pelo padrão em escamas, não
Olinda remete a um período que abrange todo o
registrado em outro lugar do Brasil.
século XVIII, destacando-se o caráter único na
talha luso-brasileira de exemplares, como o altar
do Capítulo.

8.3. A azulejaria
Na enumeração dos aspectos artísticos do
Conjunto Franciscano de Olinda, merece
destaque o conjunto azulejar. Juntamente com a
pintura e especialmente com a talha, o azulejo
significou uma particularidade expressiva do
barroco luso-brasileiro, adquirindo
Foto 8.13: Azulejos padrão tapete capela do Capítulo
personalidade própria a partir do século XVII,
– séc. XVII
quando o Brasil já recebia azulejos de Portugal.
Esses elementos começavam então a se tornar O século XVIII foi marcado na azulejaria pela
comuns na arquitetura, ajudando a proteger e utilização dos padrões em azul obtido com o
embelezar os ambientes, como afirma Santos óxido de cobalto em fundo branco, e pelo início
Simões em sua obra “Azulejaria em Portugal no do enquadramento de cenas, adquirindo
Século XVII”. personalidade e monumentalidade.

48
emoldurada com a mesma barra de acantos, na
qual uma solitária figura pesca em baixo de uma
árvore. Pode-se situar esse conjunto ainda na
primeira metade do século XVIII.

Foto 8.14: Painel padrão tapete - Escada – séc. XVII

São esses painéis artísticos figurados que


constituem também um grande destaque no
Conjunto Franciscano de Olinda. São quatro
conjuntos de grande imponência, os quais
permitem ao Professor Antônio Cruz Muniz
poder afirmar:

“Entre 1725 e 1755 é o período das oficinas anônimas


de Lisboa, Coimbra e Porto, que praticamente
produziram os azulejos do século XVIII que se
encontram no Brasil. Época em que Bartolomeu
Foto 8.15: Painel de barra barroca reta - corredor da
Antunes fez os painéis da capela mor da Igreja de São sacristia - cenas bucólicas laicas
Francisco, de Salvador, assinados com a data de
Na sacristia, o conjunto de pintura e talha do
1737. Também é deste período o revestimento de
forro e do mobiliário completa-se com
azulejos da Sacristia do Convento de Santo Antônio
magníficos painéis em tapeçaria, com as
de Cairú, considerado o mais notável do Brasil e sem
mesmas características que os do corredor,
paralelos em Portugal. Mais completo que o das
Sacristias dos conventos de Igarassu, do Convento de porém com motivos religiosos. A famosa cena
Santo Antônio do Recife e tão importante quanto o do dos estigmas de São Francisco (Foto 8.16)e a sua
Convento de N. Sra. das Neves, de Olinda (1740).” visão do Menino Jesus estão cercadas por barras
barrocas retas, de folhas de acantos com
Existem, então, no Convento de São Francisco querubins nos quatro ângulos. Alinhando toda a
de Olinda, dois conjuntos de painéis artísticos composição da sala, uma barra de azulejos
figurados de barra reta. O primeiro, situado no acompanha todo o recinto, marcando a altura do
corredor de acesso à sacristia, constitui-se de peitoril das janelas com as mesmas
dois enormes painéis que ladeiam a passagem características dos grandes painéis, enfocando a
(Foto 8.15). Neles aparecem cercados por uma
posição desses com cartelas cercadas de anjos e
faixa de folhas acanto encurvadas e marcadas querubins. A composição sobe em todas as
por duas linhas azuis contínuas, as quais se
paredes, emoldurando os portais e marcando os
podem denominar “barras barrocas retas”, por cantos, prova de que foram confeccionados por
constituírem motivo o ornamental desse estilo. encomenda para ocupar esses mesmos espaços.
No centro, acontecem cenas cortesãs de caça, A ornamentação permite datar esse conjunto
passeios, descanso, e um pequeno, no arremate
de uma das paredes, uma curiosa cena, também

49
como do período D. João V, isto é, primeira
metade do século XVIII.

Foto 8.17: Painel de azulejos na nave da Igreja de


Nossa Senhora das Neves

Por ordem, ressalta-se o da nave da Igreja de


Nossa Senhora das Neves, no qual as cenas
ilustram passagens bíblicas, tais como a
“Anunciação”, a “Fuga da Sagrada Família para
o Egito” e a rara cena da “Circuncisão de
Cristo”, emolduradas por barras cujas
características estéticas indicam claramente o
período Joanino, estando incluídas no momento
Foto 8.16: Painel de barra reta sacristia - São Francisco da grande produção de azulejo barroco que vai
e os estígmas - século XVIII da terceira à sexta década do século XVIII (Foto
As “barras retas” dão, ainda na primeira metade 8.17). Nas barras, anjos e querubins escondem-se
do século XVIII, espaço às ditas “barras barrocas e sustentam volutas fitomorfos e concheados, e
recortadas”, que foram produzidas em grande os painéis são separados por quartelões
quantidade para historiar as paredes das igrejas sobrepostos de cimalhas perspectivadas em
e claustros em Portugal e, principalmente, no cercaduras muito dinâmicas, coroadas com um
Brasil. Os painéis em azulejo eram usados pelos medalhão encimado por um querubim que
padres não só para embelezar e proteger as refuta cada cena com uma frase em latim.
paredes das igrejas. As imagens eram usadas O mesmo esquema repete-se no claustro, só que
também para ilustras as histórias bíblicas, um com cenas da vida de São Francisco de Assis,
verdadeiro Evangelho em ladrilhos, como a famosa passagem do “Sermão aos
complementado pelas pinturas dos tetos e Peixes” (Foto 8.18)ou o “Recebimento do
paredes. chamado de Cristo” (Foto 8.19).
No Convento de São Francisco de Olinda há três
magníficos conjuntos de azulejaria de barra
barroca recortada.

50
Foto 8.18: Painel do claustro - São Francisco pregando Foto 8.19: Painel da série cenas da Vida de São
para os peixes - séc. XVIII Francisco
A ornamentação movimenta-se ainda mais com
a adição de jarrões nos cantos que emolduram
as laterais das cenas. Aparecem então as
rocalhas, mescladas com os mesmos motivos
barrocos que situam a produção desses
exemplares, também em meados do século
XVIII. A exposição ao ambiente e a passagem de
veículos pesados na Rua de São Francisco vem
causando um sério problema de
desprendimento e desagregação a esses painéis.

Finalmente, destaca-se o conjunto da Capela de Foto 8.20: Painel da série Vida de Santa Ana, Capela
Santana, no qual se observa uma maior de Santa Ana 2ª metade do XVIII.
apreensão do vocabulário rococó na composição A partir dessa breve exposição, pode-se
moldurar que ainda guarda referências constatar que o Convento de São Francisco de
barrocas. A perspectiva é primorosa, dando Olinda possui um conjunto azulejar cuja datação
realmente efeito de profundidade não só nas se estende desde os padrões em tapete do século
cenas que representam raras passagens da vida XVII, passando por motivos galantes e religiosos
de Santa Ana e Nossa Senhora, como também do princípio do século XVIII e voluptuosas
do emolduramento arquitetônico que as separa, barras recortadas de meados do século XVII
caracterizando já um caminho estético para a para a segunda metade do século XVIII,
segunda metade do século XVIII (Foto 8.20). constituindo uma verdadeira aula de arte
azulejar barroca em um conjunto que representa
como poucos o Barroco no Brasil, em todos os
seus aspectos artísticos.

51
9

10 O HISTÓRICO DAS INTERVENÇÕES NA CONSTRUÇÃO

O estudo dos conventos e da obra franciscana com a ação direta ou supervisão do IPHAN,
no Brasil carece de uma bibliografia mais foram voltadas para a conservação e
completa. Em relação aos jesuítas, que tiveram restauração.
em seus quadros historiadores de renome
registrando minuciosamente a obra dessa
10.1. Primeira fase: a chegada dos
ordem no Brasil, os franciscanos foram menos
favorecidos. As obras básicas de consulta
franciscanos e a ocupação inicial
consistem nos primeiros registros feitos pelo Os franciscanos desembarcaram em Olinda no
Frei Manuel da Ilha, na obra do Frade Antônio dia 12 de abril de 1585. Depois de mais de três
de Santa Maria Jaboatão (1858-62), e nas meses de viagem por mar, hospedaram-se na
pesquisas mais recentes empreendidas pelo residência de um nobre, Felipe Cavalcanti, no
Frei Venâncio Willeke (1979). O Novo Orbe alto da Sé, onde logo levantaram um oratório e
Seráfico Brasileiro de Jaboatão, publicado começaram a prestar socorro espiritual aos
originalmente em Lisboa em 1761 e reimpresso enfermos do Hospital da Misericórdia. D.
entre 1858 e 1862, continua sendo a principal Maria da Rosa, viúva e terciária franciscana, já
obra de referência. tinha construído uma capela em um
Na história do convento, podem ser recolhimento para órfãs e terciárias no local
identificadas algumas fases relativas à sua que o convento ocupa hoje, na esperança de
construção. A primeira corresponde às obter uma fundação de Frades Menores.
construções iniciais, entre a chegada dos Chegando os franciscanos em Olinda, ela
franciscanos em 1585 e o abandono do ofereceu à pessoa de Frei Melchior aquele
convento por ocasião da invasão holandesa em recolhimento e igreja para a instalação dos
1630. A segunda fase inicia-se com a religiosos. Em 4 de outubro de 1585, com
reconstrução empreendida a partir de 1654, ano grande festa, ocuparam os franciscanos o seu
da expulsão dos holandeses, e estende-se definitivo convento, sob a denominação de
durante todo o século XVIII, quando o Nossa Senhora das Neves (Willeke, 1979: 41,
convento atinge sua forma atual. Uma terceira Jaboatão, 1858-62: 145).
fase acontece após as restrições das ordens O terreno doado situava-se à margem de uma
religiosas impostas no final do período ladeira, que ligava o alto da Matriz até o futuro
colonial, as quais levaram a um lento processo convento carmelita, passando próximo ao Real
de declínio do convento. A quarta fase foi Colégio dos Jesuítas. O terreno limitava-se ao
inaugurada em 1937, com a criação do Serviço sul com uma olaria, e a leste, junto ao mar, com
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional um outro caminho que, acompanhando a praia,
(SPHAN, hoje IPHAN) e o tombamento onde também se situava um fortim construído
nacional do convento no ano seguinte, quando de paliçada, parte integrante do sistema de
ocorreu o reconhecimento oficial do valor defesa da vila.
histórico e artístico do convento, e as ações,

53
O terreno detinha um forte declive para o estas casas se concluíram com brevidade, e
litoral e isso iria determinar a lógica de perfeição, com esmola dos devotos e agência
crescimento do convento mediante ampliações do prelado " (Jaboatão, 1858-62: 148).
que, na maioria das vezes, tiveram de recorrer A capela original, construída por ordem de D.
a aterros e à construção de muros de arrimo. A Maria Rosa, provavelmente correspondia à
implantação do convento franciscano seguiu a atual capela-mor.
lógica de implantação das primeiras cidades Em 1590, essas primeiras obras estavam
brasileiras. Procurando obedecer a certos concluídas e, na gestão do custódio Frei
requisitos (proximidade de um porto, Leandro de Jesus (1606-1609), foram bastante
facilidade de defesa, disponibilidade de fontes aumentadas, segundo Frei Jaboatão. Pereira da
de água potável), Olinda, assim como outras Costa, citando o cronista franciscano,
cidades brasileiras, foi criada em uma área de acrescenta que tais obras resultaram em “um
montes próxima ao mar e a um porto natural, edifício de grandiosa e bela fábrica, como os
nesse caso, o do Recife. As principais ordens próprios invasores holandeses o referem”
religiosas, incluindo os Franciscanos, (Pereira da Costa, 1983: 546). Entre 1588 e 1590,
instalaram-se na periferia desses pequenos chegaram mais dezoito religiosos vindos de
organismos urbanos. As igrejas e os conventos Portugal e, em 1596, os frades abriram um
construídos por essas ordens passaram a curso de estudo superior no Convento. De 1606
organizar a estrutura urbana. Por trás de seus a 1609, foram executadas novas ampliações,
conventos e igrejas, desenvolviam-se jardins e aumentando as habitações e estendendo os
áreas de cultivo que se estendiam pelas áreas edifícios. Em 1624, foi construída uma cisterna
periféricas, marcando os limites da cidade. devido à falta d’água.
As construções recebidas pelos frades As obras de ampliação da casa primitiva
franciscanos não satisfaziam ao crescimento da duraram, portanto, de 1586 até 1630, quando
ordem e logo foram iniciadas as ampliações. Pernambuco foi tomado pelos holandeses. É
Logo após a mudança, Frei Francisco dos difícil precisar exatamente o que estava
Santos foi nomeado guardião e prelado da construído, mas uma análise dos mapas e
casa. Descrito como um "sujeito de prudência, gravuras produzidos na época da invasão
zelo e atividade para obras”, esse frade holandesa pode fornecer importantes
“ordenou a formalidade material da casa" indicações.
(Jaboatão, 1858-62: 147), ou seja, iniciou as
primeiras obras de ampliação das construções
doadas. Essas novas construções consistiram
em dois cômodos, próximos à capela inicial,
um para abrigar os noviços e outro para abrigar
os filhos de índios convertidos:
“porque era forçoso receber a ordem alguns
noviços,... e não havia domicílio particular para
este efeito. Também se devia fabricar na cerca
uma casa suficiente, na qual se criassem dentro
os filhos dos índios, convertidos, como em
Seminário, para que, bem instruídos..., fossem
depois pregadores de seus naturais;... e ambas

54
Figura 9.1: Gravura “Marin d’Olinda”

Figura 9.2: Gravura Marin D”Olinda, detalhe mostrando o Convento Franciscano

Na estampa intitulada Marin d'Olinda 1, um frontão triangular. As fachadas são


observa-se um modesto conjunto franciscano sinceras e traduzem fielmente a volumetria do
em relação aos edifícios religiosos vizinhos edifício, a exemplo da Igreja da Graça. São
(Figuras 9.1 e 9.2). Comparando com a nave da claramente visíveis dois edifícios colados no
vizinha Igreja de N. Sa. da Graça, percebe-se corpo da igreja, saindo perpendicularmente em
que o convento, mesmo tendo dois direção à encosta. Certamente construídos
pavimentos, não chega a apresentar a altura nessa primeira fase de obras, esses edifícios
das naves da Igreja de Nossa Senhora da Graça induzem a pensar que nesse momento o
e da Matriz do Salvador (atual Igreja da Sé). claustro estava no início de sua formação. A
Mesmo assim, os três edifícios apresentam fachada que aparece em primeiro plano não
tamanhos similares em termos de área ocupada corresponde à fachada da igreja, que não é
de terreno. visível devido ao ângulo tomado, mas sim à do
A gravura mostra que a arquitetura do bloco conventual original, não mais existente
convento é em estilo chão português, uma hoje. Em segundo plano, o bloco menor que se
arquitetura econômica e utilitária, com destaca da nave da igreja corresponde à Capela
fachadas compostas por frontispício formado do Capítulo, já existente nesse período.
por um retângulo ou quadrado encimado por

55
A torre da igreja parece estar localizada
lateralmente no lado norte, alinhada com a
fachada. A cerca aparece como uma paliçada,
contornando o conjunto conventual e descendo
até próximo à praia. Diante da igreja, do lado
de fora da cerca, um cruzeiro aparece bem
definido.

Figura: 9.4: Mapa de Olinda de 1648

Figura 9.3: “Olinda” de Franz Post (B:


Conjunto Franciscano)
Na gravura intitulada “Olinda”de Franz Post
que ilustra o Livro de Barleus, pode-se chegar a Figura 9.5: Mapa de Olinda de 1648 (detalhe)
conclusões similares (Barlaeus, 1980: 334).2
Devido ao ângulo inusitado que Post escolheu
(Figura 9.3), o convento aparece em primeiro
plano, à frente da Catedral da Sé e à esquerda
do colégio dos jesuítas. Podem-se ver
claramente as arcadas na fachada principal.
Bazin afirma que tais arcadas poderiam ser as
de um pórtico ou galilé (Bazin, 1983, vol. II:
128). Menezes não concorda com tal assertiva,
pois, devido ao ângulo escolhido por Post,
estar-se-ia vendo a face do convento voltada
para o terreno e não sua face pública, voltada
para sudoeste e para a cidade. As arcadas
Figura 9.6: Mapa de Olinda de 1648
parecem ser não as de um pórtico, conforme
sugere Bazin, mas sim uma espécie de
estrutura de apoio da antiga sacristia,
construída para vencer a declividade do morro
(Menezes, s/d: 12). Essa sacristia existiu antes
da atual, que foi construída em meados do
século XVIII. Os pilares dessas arcadas foram
encontrados durante o reforço das fundações
realizado na década de 1980.

Figura 9.7: Mapa de Olinda de 1648 (detalhe)


Nos mapas de Olinda de 1648 (Fotos 9.4 a 9.7),
os três monumentos, Igreja de Nossa Senhora
da Graça, Matriz do Salvador e Convento de N.

56
Sa. das Neves, aparecem em tamanho similar, maiores, pode indicar datas para partes da
o que leva a concluir que o convento não era construção.
tão pequeno quanto se tem dito, mas sim que Em relação ao claustro, existe uma pedra
deveria ter um caráter mais horizontal, tumular de 1686, o que induz a considerar essa
esparramando-se sobre o terreno.3 parte da construção como já existente. Por
A análise desses mapas e ilustrações permite outro lado, conforme observou Bazin, o estilo
algumas conclusões sobre a configuração das colunas indica o primeiro quartel do século
inicial do convento. Durante a ocupação XVIII. Pode-se aventar a hipótese de que,
holandesa, o corpo da igreja estava definido, quando os holandeses desembarcaram em
embora ainda sem a galilé, sem a sacristia e Olinda, parte da quadra encontrava-se
sem os elementos decorativos. Não há definida, mas o claustro ainda não estava
indicação da existência de uma galilé ou terminado. Desse modo, parte das construções
alpendre, como era comum em conventos que rodeiam o claustro, como salientou Bazin,
franciscanos. Da nave da igreja saiam são anteriores a 1630. Devido ao fato de esses
perpendicularmente os primeiros blocos conventos terem sido construídos em etapas, os
utilizados pelos franciscanos, blocos que autores dos riscos tinham de prever e construir
viriam a conformar o claustro posteriormente. gradativamente. Há registros de que os painéis
As ilustrações provam que a quadra do de azulejos do claustro, a última intervenção
claustro não estava fechada ainda. No entanto, para finalizá-lo, foram aplicados entre os anos
os mapas acima mostrados já apresentam um de 1734 e 1745 (Mueller, 1961: 35).
volume como se estivesse fechado, mas eles Para reforçar o argumento, ressalte-se que no
não especificam o claustro, como parece estar corpo da quadra, que sai na lateral da capela-
representado no colégio jesuíta ao lado. O fato mor, existe uma escada de acesso aos
de ter sido edificada uma nova portaria em dormitórios, toda revestida de azulejos, com o
1754 e destruídas as obras anteriores, torna mesmo padrão seiscentista da Capela do
difícil qualquer conclusão definitiva. Capítulo, o que coopera para definir esse corpo
da construção como anterior a 1700. As obras
de reconstrução do convento devem ter
10.2. Segunda fase: a reconstrução
continuado por todo o século XVII, e a
após a expulsão dos holandeses construção da quadra deve ter continuado até a
O conjunto franciscano, como outros lateral da igreja, na altura do coro. Jaboatão
monumentos de Olinda, foi alvo de destruição afirma que a quadra, na parte voltada para a
pelos holandeses, seja pelo incêndio ladeira, ainda era antiga quando da construção
provocado em 1631, seja pela retirada de da nova portaria, entre 1753 e 1754.
material de construção, em 1637, necessário A fachada da igreja foi construída em etapas. A
para as obras de ampliação do Recife. Em 1654, galilé, ou o nártex reentrante, avançando sobre
logo após os holandeses assinarem a a rua, já foi uma adição à primitiva fachada. A
capitulação, os frades reocuparam o Convento galilé era inicialmente saliente ao corpo da
de Olinda, então bastante arruinado. A igreja e aberta para os lados, uma situação
reconstrução começou imediatamente. Deve ter habitual nas construções franciscanas. A parte
aproveitado parte das paredes não destruídas e superior dessa fachada teria uma solução mais
ampliou o edifício. Não há, em termos de sóbria, com o seu coroamento em frontão
documentos, meios de esclarecer a forma exata triangular e clássico. Com as obras de
como ocorreu essa reconstrução. No entanto, a reconstrução iniciadas em meados do século
análise do edifício, mesmo sem prospecções XVIII, ela adquiriu a feição atual, incorporada
ao corpo da igreja, com três grandes portas em

57
arco. Uma cruz de pedra, encostada a uma das ainda ver, resta um pequeno trecho de parede,
arcadas da galilé, acusa a data de 1700, mas o entre o bloco da portaria e a igreja, na altura da
término da fachada parece ser posterior a essa galilé. A sua única porta de acesso ao exterior
data. A parte superior da fachada, com seus era emoldurada por um pequeno alpendre,
elementos decorativos mais efusivos, deve ter muito comum nas casas religiosas franciscanas
sido definida nessa etapa de obras, na segunda e mais ainda em uma região de clima tropical.
metade do século XVIII. Esse alpendre foi perdido, provavelmente na
Já em relação ao seu interior, Jaboatão afirma segunda metade do século XIX. A Capela da
que a igreja, teve a sua capela-mor reedificada Portaria tem ao redor belos painéis de azulejo
em torno de 1714 ou 1715, datas possíveis, que foram assentados também em meados do
desde que se pode datar a execução do atual século XVIII.
forro, em artezoados, e a aplicação dos painéis Em 1711, os Terceiros Franciscanos de Olinda
de azulejos, em torno de 1745 (Jaboatão, 1858- começam a construção de sua capela, situada
62: 407-08). A igreja foi gradativamente de forma perpendicular em relação à igreja da
recebendo elementos decorativos ao gosto de Ordem Primeira. Essa forma de relacionar os
cada momento. Os dois altares colaterais ao dois ambientes de culto foi uma característica
arco cruzeiro e o da capela-mor, por exemplo, peculiar aos conventos franciscanos do
mostram influências do gosto rococó do final Nordeste (Bazin, 1983: 144). A capela dos
do século XVIII (Menezes, s/d: 22). Terceiros de Olinda abre-se para a nave da
As obras da atual sacristia também pertencem Igreja de Nossa Senhora das Neves por meio
à fase iniciada em 1654. Os elementos de um grande arco. Tal arco foi revestido com
construtivos e arquitetônicos mostram que a uma bela obra de talha, de linguagem e
construção teve sua conclusão por volta de execução eruditas da época de D. João V.
1660. Germain Bazin (1983: 129), na A capela certamente deveria ter sido toda
comparação que fez entre as arcadas da galilé revestida de madeira entalhada, como a Capela
do convento de Ipojuca e as arcadas existentes Dourada, mas não foi concluída. Bazin acredita
nas edículas dessa sacristia, concluiu que que o revestimento de talha arco da capela-mor
foram produzidas na mesma oficina, por volta é uma dos mais antigos no estilo, enquanto o
de 1660. No entanto, a sacristia somente foi dos dois retábulos colaterais é posterior, já do
decorada no século seguinte, visto que final do século XVIII (Bazin, 1983: 128-29). A
azulejos, pinturas e talhas representam o gosto sacristia dos Terceiros, ao lado da capela, foi
de meados do século XVIII. decorada com pinturas que remetem ao último
O edifício da portaria, contendo a Capela da quartel do século XVIII. Em um período
Portaria ou Capela de Santa Ana, e as duas posterior, os Terceiros também construíram,
bibliotecas, foi construído entre os anos 1753 e paralelamente à igreja da Ordem Primeira,
1754, como revela a data inscrita na fachada. uma Casa da Oração, hoje oculta pela
Tem uma grande unidade construtiva e construção de um Consistório que avança em
decorativa, já que foi construído em uma só direção à galilé.
empreitada. Tal unidade, aliada ao seu Como foi visto acima, o claustro recebeu um
formato cúbico, permite distingui-la revestimento azulejar entre os anos de 1734-45.
claramente do resto da construção. O edifício Pressupõe-se que, logo após, os frades
foi engastado na antiga quadra do primeiro tivessem ampliado aquela antiga quadra
convento. Para se construir a portaria, foi conventual com um novo bloco em direção ao
destruída a parede exterior daquela ala do sul, por meio de aterros e muros de arrimo para
convento, permanecendo a que define o conformá-la à declividade da ladeira. O atual
claustro. Dessa ala antiga, conforme se pode bloco conventual pode ser datado como da

58
segunda metade do século XVIII. Do lado do tinha acesso direto para a rua. Ele ruiu em 1951,
mar, junto a esse corpo, foi construída uma devido à movimentação do terreno. No
grande cisterna, com magníficas abóbadas de entanto, as obras empreendidas pelos frades
tijolos. Por cima dessas abóbadas foi criado o alemães foram reparadoras, objetivando
terraço ainda existente na sua forma primitiva. apenas manter o edifício em funcionamento.
A construção da cisterna foi citada por As condições ainda não eram das melhores. Em
Jaboatão, que escreveu sua obra no final da 1950, foi iniciada a construção erguida
década de 1750. paralelamente ao Salão Pio X, que é a atual
Portanto, pode-se concluir que após esse ciclo lavanderia e, nos anos 1960, foram construídas
de obras de meados do século XVIII, com os as baterias de banheiros presentes no andar
trabalhos de decoração efetuados até o final das celas (Livro de Crônicas: 229-230).
daquela centúria, o convento encontrou, em
linhas gerais, a sua forma definitiva.
10.4. Quarta fase: conservação e
restauro após o tombamento
10.3. Terceira fase: declínio e
Em 1937, foi criado o Serviço do Patrimônio
estabilização no século XIX
Histórico e Artístico Nacional e o Conjunto
Em 1855, o Império Brasileiro proibiu a Franciscano de Olinda foi um dos primeiros a
admissão de noviços nas casas religiosas ser tombado, em julho do ano seguinte. 4 Esse
conventuais, fato que atingiu duramente os fato demarcou uma nova fase na história do
franciscanos, levando à decadência do conjunto, pois, a partir dessa data, houve o
convento. Essa decadência atingiu seu ápice no reconhecimento oficial de seu valor histórico e
final do século XIX, e, quando da morte do artístico, a ação do governo federal, e a
último frade, em 1885, o convento foi intencionalidade da conservação e restauração
abandonado. Sua famosa biblioteca, por da edificação.
exemplo, foi integrada à Biblioteca Pública do No entanto, tendo em vista o grande número
Estado. Algumas partes do convento chegaram de bens que necessitavam de obras de
a ser perdidas, como o alpendre que delimitava conservação e a escassez de recursos, não
a entrada da portaria. foram de imediato efetuadas obras no
A República reconheceu a liberdade de culto e conjunto, apesar de esse apresentar uma das
permitiu a vinda de religiosos estrangeiros. piores condições em relação aos
Dessa forma, frades alemães da Província estabelecimentos religiosos de Olinda.
Saxônica da Santa Cruz, da Alemanha De acordo com a documentação encontrada no
começaram a chegar em 1894 e assumiram os atual IPHAN e as Crônicas do Convento, em
conventos que estavam em grande parte 1945, o guardião do convento solicitou ao
abandonados e danificados (Mueller, 195: 140- IPHAN recursos para obras de conservação.
1). No caso do convento de Olinda, os frades, Por meio da ação desse dirigente e de uma
ao assumirem em 1901, fizeram reparos e campanha nos jornais, foram obtidos recursos
alterações internas, como a cozinha hoje para as obras de conservação no ano seguinte.
existente no antigo pátio do bloco conventual e
as celas individuais criadas por meio de
divisórias onde existiam dormitórios coletivos.
Provavelmente nos anos 1920, o convento foi
ampliado com a construção do salão Pio X. Esse
salão localizava-se na faixa lindeira da Rua de
São Francisco, continuando o bloco coventual e

59
queriam os frades, e exigiu que se construísse
um muro lindeiro à rua no lugar do salão. O
desabamento desse salão, apesar de não ser ele
uma construção significativa se comparada aos
outros blocos do convento, serviu como um
bom instrumento de propaganda devido à
repercussão que teve na imprensa. Nesse
período, por sinal, a imprensa ocupou-se
diversas vezes da preservação do convento,
Foto 9.1: Renovação do telhado com reportagens que abordavam o risco de
As obras tiveram início imediatamente, perda dos painéis de azulejo e as rachaduras
visando à conservação das partes mais críticas existentes na sacristia. 6 A repercussão na
do convento. Essas obras incluíram a imprensa certamente contribuiu para que
renovação de estruturas de parte dos telhados fossem liberadas verbas ainda no mesmo ano.
(Figura 9.1), a renovação dos rebocos, e a Essas verbas foram conseguidas pelo guardião
pintura e consertos de esquadrias. Apesar de o do convento, Frei Martim, diretamente com a
primeiro ciclo de obras ter sido concluído em Presidência da República.7 Também nesse
1949, é importante salientar que um edifício de mesmo ano foi feito um levantamento
tal magnitude sempre requisita novas obras à preliminar do convento. 8
medida que os pontos mais críticos passam a
ser sanados. De fato, mal terminavam as obras
em uma parte do monumento, outra começava
a necessitar de reparos. Deve-se ressaltar que,
nesse primeiro ciclo de obras, não foi feita
nenhuma documentação completa dos
trabalhos, sobretudo no que se refere aos
muros sem os rebocos, o que impossibilitou
um conhecimento mais adequado das diversas
fases do restauro do conjunto.
Portanto, após as obras emergenciais, o
conjunto adentrou em um período de obras
contínuas que se estendeu por cerca de quase
vinte anos, embora com uma série de
interrupções, como a documentação disponível Foto 9.2: Restauro de talhas
no atual IPHAN e as crônicas do convento o No final de 1952, registra-se que os trabalhos
atestam. As obras de vulto estendem-se desde andavam de forma muito lenta, mas o telhado
1950 até o final da década de 1960, sendo os fora todo refeito (Livro de Crônicas: 239). Em
trabalhos retomados apenas na década de 1980, abril de 1953, um oficio do novo guardião, Frei
com a grande recuperação da sacristia e, bem Bonifácio Mueller, atesta que as obras se
mais recentemente, entre 1998 e 2005, um novo encontravam paradas por falta de verba e pedia
ciclo de obras com recursos captados pelo a continuidade delas junto ao IPHAN. As
próprio convento. obras foram retomadas em 1953.9 O período de
Em junho 1951, ocorre o desabamento do salão 1953 a 1956 foi dos mais profícuos em termos
Pio X, uma construção lindeira à Rua de São de obras, incluindo a restauração de boa parte
Francisco e anexa ao bloco conventual.5 O de seus bens artísticos, como talhas e azulejos
IPHAN proibiu sua reconstrução como (Foto 9.2).

60
A restauração dos ornamentos da Capela da
Ordem Terceira foi iniciada com a recuperação
do forro em artezoados, um trabalho inovador,
visto que se aproveitou a estrutura existente,
restaurando-a em seus apoios, nivelando-a e
prendendo-a com perfis de metal.
Também foram recuperadas as talhas da
capela, contra o ataque de cupins. A técnica
utilizada foi a de mergulhar as partes
estragadas na cera de abelhas, que preencheria
as perfurações. As pinturas foram limpadas,
delas retirando-se os vernizes oxidados, e
repostos outros. A Capela dos Terceiros
possuía um coro alto, situado na sua entrada,
semelhante ao existente na Capela dos Foto 9.3: Azulejos danificados na sacristia
Terceiros do Recife. Esse coro interceptava o Em 1956, a cobertura está em grande parte
arco entalhado. O IPHAN decidiu retirar tal renovada, incluindo também a do bloco
elemento de arquitetura e restabeleceu as duas conventual, e prosseguiam as obras de
tribunas que foram danificadas quando da sua recuperação do telhado da sacristia. Saliente-se
execução. Trabalhos de conservação também que, nessa intervenção na cobertura, foi
foram realizados na Capela do Capítulo, no mantido o sistema estrutural primitivo, isto é,
claustro e na nave, que tiveram suas talhas e caibro armado, distanciado aproximadamente
pinturas restauradas. Em junho de 1954, os 50 cm de eixo a eixo (Livro de Crônicas: 259). 10
frades registraram elogios em relação à atuação Os trabalhos que prosseguiam referiam-se aos
do IPHAN, pela sensação de “clareamento” da assoalhos do coro da igreja e do claustro. As
igreja, quando foram retirados os andaimes. traves de sustentação do coro encontravam-se
Os azulejos, atacados pela salinidade, estavam carcomidas e foram todas trocadas.
muito danificados nas partes próximas ao nível No entanto, em abril de 1957, as obras estavam
do piso (Foto 9.3). Na Capela da Portaria e no novamente paralisadas. Somente em 1961
claustro os azulejos foram refixados. Os vazios foram terminados os trabalhos de renovação
de peças que faltavam foram preenchidos com do travejamento de sustentação do coro da
massa, para evitar que pudessem ser retirados igreja. O forro de caixotões foi escorado e
por furto (Livro de Crônicas: 251, 258). removidos o cadeiral e o assoalho. Foram,
Em novembro de 1955, o IPHAN retomou os também, aplicados cachorros de cantoneira de
trabalhos no convento com a reforma do ferro com abraçadeiras nos apoios das traves,
telhado e do madeiramento do andar superior, substituído o barroteamento estragado
a qual terminou por substituir quase todas as empregando-se madeira de lei com dimensões
traves, assim como boa parte das telhas. idênticas. Posteriormente, foi reassentado do
assoalho, com a substituição das tábuas
estragadas, e refixado o forro de caixotões.11
Em 1957, a calçada que passava debaixo das
janelas do antigo refeitório, atual auditório, foi
refeita, assim como foi criado um novo acesso
do terraço para a área da lavanderia abaixo do
terraço (Livro de Crônicas: 268). Entre agosto e
dezembro de 1967, foi executa uma série de

61
serviços com recursos provenientes da Foto 9.4: Rachaduras na Sacristia
Adveniat, uma instituição da Igreja Católica. Anos passaram sem uma solução devido à
Tais obras prolongaram-se até o ano seguinte e magnitude dos recursos a serem empregados,
incluíram diversas reparos de esquadrias, O problema foi sanado apenas entre 1983 e
compra de mobiliário, pintura externa e 1984, quando foram efetuados grandes
interna, além da construção da bateria de trabalhos de recuperação (Foto 9.5). Foram
banheiros existentes no primeiro e segundo feitos trabalhos de consolidação de fundações,
pavimentos das celas, e de uma nova caixa na qual que se aplicaram estacas profundas,
d’água, que proveram as celas de água tirantes inclinados e cintas de concreto armado,
encanada. além da construção de um piso de concreto
Desde 1950, já era notado que um problema igual à área da sacristia e que a suporta
sério estava afetando a sacristia.12 O Livro de inteiramente.
Crônicas do Convento relatou esse problema
em 1951, 1956 e 1967 (Livro de Crônicas: 235,
259, 289). As grandes rachaduras nas paredes
laterais e o forte desnivelamento do piso da
sacristia anunciavam o risco de colapso (Foto
9.4). Esse risco era causado pelo movimento
resultante dos deslizamentos dos morros, como
também foi observado na Igreja do Carmo e no
Mosteiro de São Bento. O mesmo problema
causou o desabamento do Salão Pio X do
próprio convento, em 1951, como foi visto. A
recém-construída lavanderia também já
apresentava problemas dessa natureza em
1957, alguns anos depois de ser construída,
além de parte do muro do terreno ter ruído
nesse mesmo ano (Livro de Crônicas: 268).

Foto 9.5: Obras de consolidação da sacristia


Durante as obras na sacristia, foram
descobertos os pilares da primitiva construção
do século XVIII (Foto 9.6) (Gusmão, 2001: 159-
163). 13 Todos os painéis de azulejos foram
desmontados e refixados. Em suma, a sacristia
foi praticamente remontada, utilizando-se os
materiais antigos. Desde então, o
comportamento do morro vem sendo
monitorado e não se registrou nenhum
movimento do solo na base da sacristia.
Também, nesse momento, foram efetuados
vários serviços de caiação e de acabamento nas
grades de ferro e de pintura a óleo nas portas

62
da sacristia. As pinturas do forro em caixotões por provocar danos ao piso anterior e à
foram também restauradas, removendo-se o estrutura do Conjunto devido à fragilidade do
verniz oxidado e repondo nova proteção. terreno onde foi realizado.
Após as obras da sacristia, passaram-se alguns Em 2004, o IPHAN, mediante de uma verba
anos sem obras importantes até que, no final emergencial, refez toda a instalação elétrica do
dos anos 1990, foi inaugurado um novo ciclo. convento, a qual estava em estado precário e
oferecia sérios riscos de incêndio ao Conjunto.
Apesar de ter resolvido um problema sério do
Convento, o sistema de iluminação colocado na
nave da igreja e na biblioteca do térreo
revelou-se bastante infeliz em relação aos
trabalhos no forro.

Foto 9.7: Interferência das luminárias na


visualização do forro pintado da biblioteca.
O caso da biblioteca é bastante preocupante
pela incidência direta de luz artificial sobre as
Foto 9.6: Antigos pilares na sacristia delicadas pinturas e, especialmente, pela
Em 1998 foi trocado todo o madeiramento do interferência na visualização do forro pintado
piso do bloco conventual, o qual se encontrava como um todo (Foto 9.7).
carcomido. As grandes traves de sustentação
foram trocadas por madeira de lei, trazida do
Pará. As paredes do bloco conventual tiveram
de ser abertas para que as grandes traves
pudessem ser colocadas. Essa obra foi feita
com recursos da própria ordem e foi
acompanhada pelo IPHAN.
Em 2001, em uma obra conduzida pela
Prefeitura de Olinda, foram descobertos
vestígios do antigo adro. Iniciou-se uma
escavação arqueológica em frente ao convento,
mas sem os recursos e os meios necessários Foto 9.8: Estado precário das instalações
assegurados, a escavação foi interrompida e elétricas na Ordem Terceira
restou um buraco a céu aberto, o qual destruiu As instalações elétricas da Ordem Terceira não
foram reformadas e estão em estado
a composição barroca do espaço urbanístico do
deplorável, colocando em risco o Conjunto
lugar, essencial para a significância do bem (Foto 9.8).
patrimonial. O buraco também pode terminar

63
Em 2005, com recursos do Ministério da Justiça desse importante elemento para a arquitetura
foram trocadas todas as telhas da coberta do Conjunto Franciscano.
(Fotos 9.10 e 9.11), parte do madeiramento e
introduzidas mantas durafoil para evitar o
aparecimento de goteiras (Foto 9.12).

Foto 9.12: Telhado com madeira serrada, telhas


novas e manta Durafoil
Somente na Ordem Terceira, onde não foram
realizadas trocas de madeiramento, é que ainda
se pode observar o telhado construído segundo
as técnicas e materiais tradicionais (Foto 9.13).

Fotos 9.10 e 9.11: Vistas dos telhados antes e


depois das intervenções em 2005. Fonte:
Sepacctur (DPH)
Infelizmente, o IPHAN optou pelo emprego de
Foto 9.13: Telhado com materiais e técnicas
madeira serrada, em padrões industriais (Foto construtivas tradicionais na Ordem Terceira.
), substituindo as vigas lavradas com enxó, os O Quadro 1 resume as ações realizadas após o
caibros armados, os caibros roliços e as ripas tombamento do Conjunto
de imbira, que mantinham a autenticidade

64
Quadro 1: Cronologia das ações de restauro e conservação realizadas após 1945

1945-46: Renovação de estruturas de parte dos telhados, renovação dos rebocos, pintura e consertos
de esquadrias.
1953: Restauração dos ornamentos da Capela da Ordem Terceira, recuperação do forro em
artezoados, recuperadas as talhas da capela contra o ataque de cupins. As pinturas foram limpadas,
delas se retirando os vernizes oxidados, e repostos outros. Trabalhos de conservação realizados na
Capela do Capítulo, no claustro e na nave. As talhas foram restauradas e a pinturas limpadas.
1954: Os azulejos, atacados pela salinidade, estavam muito danificados nas partes próximas ao
nível do piso. Na Capela da Portaria e no claustro, os azulejos foram refixados. Os vazios de peças
que faltavam, foram preenchidos com massa, para evitar que pudessem ser retirados por furto.
1955: Reforma do telhado e madeiramento do andar superior, a qual substituiu quase todas as
traves
1956-57: A cobertura foi em grande parte renovada, incluindo também a do bloco conventual.
Prosseguiam as obras de recuperação do telhado da sacristia. Obras nos assoalhos do coro da igreja
e do claustro. As traves de sustentação do coro encontravam-se carcomidas e foram todas trocadas.
1967: Reparos de esquadrias, compra de mobiliário, pintura externa e interna, construção da bateria
de banheiros existentes no primeiro e segundo pavimentos das celas, e uma nova caixa d’água que
proveu as celas de água encanada.
1983-84: Consolidação das fundações da sacristia com micro-estacas, tirantes e cintas de concreto
armado. Os painéis de azulejos da sacristia foram desmontados e refixados. Caiação das paredes e
pintura a óleo nas portas da sacristia. Restauradas as pinturas do forro em caixotões dos quais se
removeu o verniz oxidado e se repôs nova proteção.
1998: Troca do madeiramento do piso do bloco conventual por madeira de lei, trazida do Pará.
2004: Refez-se (com exceção dos ambientes da Ordem Terceira), a instalação elétrica do convento
que estava em estado precário, oferecendo sério risco de incêndio.
2005: Nova ação no madeiramento dos telhados com a introdução de mantas DURAFOIL que
evitam a propagação do fogo

65
Notas
decorrente do escorregamento dos morros
1 Laet, Joannes de, História ou Annais dos terciários de Olinda (ainda sem solução).
Feitos SPHAN Ofício nº 136.75.D, de 30/06/1975
afirma que deve ser prevista a reestabilização
Notas da sacristia, com um estudo de drenagem de
1 Laet, Joannes de, História ou Annais dos água pluviais, projetando um novo sistema de
Feitos da Companhia Privilegiada das Indias esgoto.
Ocidentaes, Tradução e notas dos Drs. José 13 SPHAN: Documento 55 Informação n.º
Hygino Duarte Pereira e Pedro Souto Maior, 23/AMC/84 – informa sobre a conclusão das
Rio de Janeiro, 1916/1925, p.232-233 obras da sacristia da Igreja
2 Pintura titulada Olinda, nº 74 do Catálogo de
Joaquim de Sousa Leão. Sousa Leão, Joaquim,
Frans Post-1612/1680, Rio de Janeiro: Livraria
Kosmos Editora, 1973.
3 O mapa que deve ter dado origem a gravura
nº 9, do livro de Barlaeus, é titulado " Civitas
Olinda", e é de autoria de Georg Marggravius,
executado entre 1637 e 1644.
4 Monumento Nacional, conforme Processo nº
143-T, Inscrição nº 189, Livro de Belas Artes, fl.
33, datado de 22. 07. 1938.
5 SPHAN, Documento 45 de 06/06/1951. Livro
de Crônicas, p.238
6 “Noticia de Olinda: ainda sobre a
preservação de nossas preciosidades
históricas”, Jornal Do Commercio, junho, 1950.
Barbosa Lima Sobrinho “Patrimônio Histórico
em Perigo” Jornal do Commercio 02-10-1951
7 SPHAN, Ofício 19/51. Informa que a verba
para obras no convento foi liberada.
8 SPHAN, Ofício 214/51. Apresenta o arquiteto
Gerson Barreto de Loretto, que deverá e
encarregar dos serviços de levantamento do
convento para o fim especial de confecção de
atual plano de obras a executar em benefício
do monumento.
9 SPHAN, Documento 50 de 19-11-1953.
10 SPHAN, Ofício 016/56.
11 SPHAN, Documento 1206-11-1961 Obras no
soalho de madeira
12 SPHAN, Ofício 086 74P de 16/09/1974.
Ayrton Carvalho, Chefe 1º Distrito IPHAN,
reduz o tom de alerta da imprensa e e esclarece
ao Diretor Geral do SPHAN, Renato de
Azevedo Duarte Soeiro, que o problema é

67
10

AS PATOLOGIAS E OS DANOS

Neste capítulo são analisados o estado de Essas obras tiveram como orientação geral o
conservação físico-ambiental do Conjunto; os uso de técnicas e materiais contemporâneos,
principais danos e patologias, procurando algumas vezes de forma radical (e talvez
identificar suas causas; as intervenções necessária), como foi o caso das obras
reparadoras mais significativas realizadas a empreendidas na sacristia, onde predominou o
partir de meados do século passado; o sistema uso do concreto armado.
atual de monitoramento e controle da
Os materiais e técnicas construtivas
decadência dos materiais e sistemas
tradicionais foram geralmente desprezados,
construtivos.
sendo evidente a perda de autenticidade nas
ações em que foram inseridos. Foi comum a
10.1. Estado de conservação atual prática da reposição de rebocos com o uso do
cimento tipo Portland em todos os tipos de
A identificação dos principais danos por
argamassa, o uso de tintas, vernizes e esmaltes
componentes construtivos foi realizada com a
sintéticos. Como conseqüência, algumas das
elaboração de um mapeamento geral do
patologias atuais são decorrentes justamente
Conjunto, ambiente por ambiente. Esse
das diferenças entre os materiais novos e os
procedimento resultou numa visão qualitativa
antigos.
dos danos e patologias. Para uma melhor
compreensão espacial desses danos, deve-se
recorrer às plantas baixas, com a indicação de
sua incidência por ambiente numerado.

Desde o seu tombamento em 1938, o Conjunto


Franciscano de Olinda vem sendo objeto de
obras de conservação e restauro, sendo que o
maior período sem obras ocorreu entre 1957 e
1967 (dez anos) e 1967 e 1983 (dezesseis anos).
Uma análise geral revela o estado de relativa
conservação de suas estruturas e reflete bem os
Fig. 10.1 Troca de peças de tesouras do telhado
cuidados da ordem, do IPHAN e demais (Foto IPHAN)
instituições envolvidas no processo de
conservação e restauro (Ver Capítulo 9,
Quadro 9.1).

69
refere aos ambientes e estruturas afetadas (ver
Anexo 3: Mapa de Danos – Alvenaria), há uma
concentração quase absoluta desses danos,
sugerindo uma origem ou fenômeno único.
Deve-se observar que justamente tal
concentração é um indicativo de seu índice de
gravidade.

A alvenaria do Conjunto Franciscano


apresenta técnicas construtivas diferenciadas,
Fig. 10.2 Restauro de assoalhos (Foto IPHAN) resultantes dos vários períodos de sua
construção. As partes mais antigas, pelo menos
10.2. Principais danos e patologias construídas até o século XVII, são de grossas
alvenarias de pedras calcárias irregulares,
O mapeamento identificou os danos,
assentadas com argamassa de cal e argamassa
enumerou as causas e classificou os principais
de cal e argila. São usados tijolos apenas em
tipos de patologias que ocorrem no Conjunto
componentes estruturais, como arcos de
Franciscano de Olinda. Os elementos
escarcel, e como elementos de regularização de
construtivos analisados foram: alvenarias,
fiadas. Esse sistema construtivo caracteriza-se
cantarias, esquadrias, forros, pisos, talhas de
pela sua pouca rigidez, capaz apenas de
madeira e instalações elétricas.
absorver pequenos recalques decorrentes de
10.2.1. Alvenarias movimentos do solo sobre suas fundações.

Os principais danos nas alvenarias do A seguir, os principais ambientes identificados


convento são rachaduras e trincas. No que se com danos na alvenaria:

Quadro 10.1: Tipos de patologias nas alvenarias

Patologias Térreo/ambiente 1º pav. / ambiente 2º pav./ambiente

desagregação da argamassa de 11,31,32,38,43,45 31,35,37 1,18,19,34,35


assentamento

desagregação/ dissolução do tijolo não há danos intensos 14,35 1


ou pedra

fissura 20,32,35,45 1,8,10,12,13,14,16,22,37 2,15,17,18,19,20,23,24,2


5,26,30,31,32,33,

trinca/ rachadura 20,23,26,28,29,30,31,32, 14,16,19,23,29,30,31,35, 2,4,14,15,17,18,19,20,23


35,37,45 ,24,25,26,28,29,31,33,35

abatimento não há danos intensos 31 27,28,29,30,33

70
zona entre a nave da igreja do convento e a
sacristia.

Essas rachaduras têm formas e dimensões


variadas e apresentam-se no primeiro e
segundo pavimentos, numa mesma zona,
indicando provir de fenômenos comuns.
Presume-se que tais rachaduras se devam às
diferenças de estabilidade entre as antigas e a
novas fundações da sacristia, estabilizada por
um conjunto de microestacas e vigas de
concreto armado.

10.2.2. Azulejos
Fig 10.3 Manchas de umidade (Ambiente 17–
pavimento térreo) O conjunto azulejar do Conjunto Franciscano
foi submetido, ao longo dos 61 anos de
conservação e restauro sob a tutela do IPHAN,
a duas intervenções: a primeira (1954) deu-se
nos painéis da Capela da Santa Ana (portaria)
e no claustro, por se encontrarem em áreas de
maior circulação e mais expostos às
intempéries. A segunda (1983/84) ocorreu
durante os trabalhos de consolidação de
fundações da sacristia, quando todos os
painéis foram desmontados, classificados e
refixados. Os vazios de peças faltantes foram
Fig. 10.4 Rachaduras (Ambiente 32, pavimento
térreo) preenchidos com massa a fim de se evitar ser
retirados por furto.
Esses danos estão provavelmente relacionados
tanto com a situação geológica onde se fundou Os principais ambientes identificados com
o Conjunto quanto com as grandes obras de danos nos azulejos estão listados no Quadro
consolidação empreendidas entre 1983 e 1984 10.2.
pelo IPHAN, visando à consolidação estrutural
O estado atual de conservação dos azulejos do
da sacristia.
claustro não é satisfatório (sofrível), indicando
Encontram-se no local, antigos marcos que as causas dos antigos danos não foram
(testemunhas) fixados entres as rachaduras resolvidas. Notam-se descolamentos e um
para medição instrumental das alterações. número razoável de perda de vidrado próximo
Nota-se que as patologias da década de 1980 às juntas.
encontram-se sanadas, ou seja, as rachaduras
atualmente visíveis na área do convento são
novas e estão justamente localizadas numa

71
Quadro 10.2: Tipos de patologias em azulejos

Patologias Térreo /ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente

falta de peças 21,24,29,30,34 não há danos intensos não há danos intensos

inversão de peças 24,26,30 não há danos intensos não há danos intensos

descolamento do tardoz (biscoito) 23,26 não há danos intensos não há danos intensos

perda do tardoz 29,34 não há danos intensos não há danos intensos

trinca no tardoz 21,23,24,26,29,30 não há danos intensos não há danos intensos

perda do vitrificado 21,23,24,26,30,34 não há danos intensos não há danos intensos

trinca do vitrificado 21,23,24,26,29,30,34 não há danos intensos não há danos intensos

manchas 21,23,24,26,29,30,34 não há danos intensos não há danos intensos

Uma hipótese é que tais danos podem estar desses agentes depende da resistência do
associados não apenas às patologias comuns azulejo, variando de acordo com a composição
em áreas próximas do mar (processo de da matéria-prima utilizada na sua fabricação.
salinização), mas a outros fatores, como a ação
de agentes mecânicos sobre as alvenarias que
servem de suporte aos azulejos. Além disso,
não há atualmente no conjunto azulejar
qualquer tipo de monitoramento ou
manutenção.

Fig. 10.6 Perda de vidrado (Ambiente 22–pavimento


térreo)

Os agentes externos causadores de tensões nos


azulejos são os seguintes:

- Cargas produtoras de compressão ou flexão.

Por estar fixado à alvenaria, o azulejo é afetado


Fig.10.5 Preenchimento de vazios com argamassa por toda e qualquer tensão que provoque lesão
(Ambiente 22–pavimento térreo) na parede, o que poderá causar fissuras ou
Sabe-se que os agentes mecânicos levam ao deformações nas peças.
enfraquecimento do material devido às tensões
- Dilatação térmica
provocadas por fatores externos ou mesmo
internos, que podem ocasionar desde micro- Pode ser provocada por agentes climáticos,
fissuras até o rompimento e desprendimento incêndio, ausência ou insuficiência de juntas
da peça de seu suporte. A intensidade da ação de dilatação. Os azulejos externos, como os do

72
claustro, são os mais atingidos por esse fator, já - sais solúveis cristalizam-se a partir da
que ficam expostos diariamente a diferentes evaporação da água causando eflorescência e
temperaturas, o que ocasiona retrações e desagregação da superfície.
expansões nas peças.
10.2.3. Cantaria
Os agentes internos são os seguintes:
Os danos mais comuns levantados na cantaria
- Os sais existentes nos azulejos (geralmente
foram:
cloretos, sulfatos e nitritos).
Alteração cromática, uma alteração superficial
Podem ser provenientes da argamassa de
de múltiplas origens que pode modificar a cor
assentamento, da alvenaria, do solo, da
da pedra;
atmosfera, de material orgânico, ou mesmo de
argamassas de cimento utilizadas em Costa negra, que tem como causa depósito de
intervenções anteriores, as quais podem conter impurezas ambientais formando grossa
sulfato de cálcio e alguns outros sais alcalinos, camada escura que reage com a pedra, levando
formados quando a argila ou o combustível à sua degradação;
usado no processo de queima contém sódio ou Perdas, formação de uma lacuna na cantaria
potássio. Pode-se afirmar que a cristalização de por perda de material lapídeo;
nitrato e sulfato é mais danosa do que a do
Fissuras, resultantes de tensões mecânicas na
cloreto à porosidade do azulejo, assim como de
estrutura;
qualquer outro material de construção, em
função da forma geométrica que adquire Degradação diferenciada, resultante da
quando cristalizado. heterogeneidade física e química entre os
materiais.
A cristalização de sais solúveis pode causar
danos, pelo menos de duas maneiras: Esses danos estão disseminados por toda a
área do Conjunto Franciscano
- sais solúveis atraem água líquida (osmose) ou
água em vapor (hidroscopicidade); eles Os principais ambientes identificados com
causam um aumento do conteúdo crítico de danos na cantaria estão listados no Quadro
umidade e em geral impedem a secagem da 10.3.
alvenaria.

Quadro 10.3: Tipos de patologias nas cantarias


Patologia Térreo/ambiente 1º pav./ ambiente 2º pav./ ambiente
alteração cromática 16,20,21,22,26,29,31,33,3 1,3,10,12,19,24,29,31,32,3 não há danos intensos
4,45 3,34
alveolização 21,22,34,36,39 1,29,31,32,34 não há danos intensos
crosta negra 11,16,20,21,22,24,26,29,3 1,10,12,19,24,29 não há danos intensos
0,33
depósito superficial 20,21,22,26,29,30 3,10,12,19,24 não há danos intensos
perda 20,21,22,24,26,29,30,31,3 1,3,10,12,19,24,29,31,32,3 não há danos intensos
6,39,44 3,34
eflorescência não há danos intensos não há danos intensos não há danos intensos
esfoliação 22,26,39 19,24,29,31 não há danos intensos

73
Por ser um ambiente constantemente exposto
às intempéries e sujeito à grande circulação de
pessoas, concentra um grande número de
patologias Além disso, é uma área que sofreu
variadas intervenções, muita delas danosas à
própria estrutura.

Por exemplo, a base de algumas colunas está


com a cantaria partida, além de os antigos
restauros, realizados com argamassa de
cimento, aparecerem deslocados e trincados.
Fig. 10.7 Crosta negra e fissuras (Ambiente 22– Os fustes da maioria das colunas encontram-se
pavimento térreo) com o arenito mostrando sinais de
desagregação.

10.2.4. Esquadrias, forros, assoalhos e talhas


de madeira

Observou-se que um mesmo grupo de


patologias afeta as esquadrias, forros, pisos e
talhas de madeira. As condições tropicais
favoráveis provocam na madeira uma razoável
quantidade de microorganismos. Os fungos e
os insetos xilófagos foram identificados como
Fig. 10.8 Fissura (Ambiente 20–pavimento térreo)
os maiores causadores da deterioração das
Observa-se que foram utilizados dois tipos de madeiras do Conjunto Franciscano. Dois tipos
rochas na cantaria do Conjunto Franciscano: o de insetos destacam-se, inclusive no quadro
calcário local de cor amarelo-claro e o arenito dos xilófagos ativos no Sítio Histórico de
dos arrecifes (beach rock). O primeiro tipo de Olinda: o cupim de solo (ordem dos
rocha, de menor resistência à flexão e ao atrito, Coptotermes) e o de madeira seca (ordem
compõe elementos decorativos, como frisos, e Isoptera).
elementos estruturais, como cunhais, vergas,
além de soleiras. O exemplo mais evidente e
brilhante de aplicação de rochas do segundo
tipo, o arenito, encontra-se no claustro.
Quadro 10.4: Tipos de patologia nas esquadrias
Patologia Térreo/ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente
desgaste de madeira 23,24,34,35,36,37,43,45 34 não há danos intensos
galerias de xilófagos 23,34,37 não há danos intensos não há danos intensos
oxidação das ferragens 37,43 34 não há danos intensos
manchas por umidade 37 34 não há danos intensos
manchas por fungos 37 não há danos intensos não há danos intensos
descascamento da pintura 23,24,34,35,36,37,43,45 34 não há danos intensos

peças faltantes 23,30,35,37 não há danos intensos não há danos intensos

74
Esquadrias Da mesma forma, as madeiras utilizadas em
seus reparos, quando se recorreu às
Os principais ambientes identificados com
disponíveis no mercado e nunca às originais.
danos nas esquadrias estão no Quadro 10.4.
Isso se deveu não apenas pelas dificuldades
As janelas e portas do Convento foram objeto em consegui-las, mas, principalmente por falta
das primeiras intervenções do IPHAN (1940- de uma cultura de preservação adequada.
45) e de uma outra grande intervenção em
1967. Por serem imprescindíveis na segurança
de seus frades moradores, elas têm sido
constantemente reparadas.

Fig. 10.10: Janela em restauro (Foto IPHAN)


Talha

Os principais ambientes identificados com


Fig. 10.9 Porta almofada resseca pelo sol (Foto danos na talha estão listados no Quadro 10.5.
IPHAN) Mostra-se desolador o estado das talhas. Entre
1983 e 1984, as da sacristia foram restauradas e
Pelo menos as de menor porte e consideradas
as pinturas receberam limpeza. A madeira
comuns foram transformadas e adaptadas.
encontrava-se ressecada, a pintura descascada
Houve, nesse processo, a substituição de tintas
ou desbotada. Em alguns casos, nota-se a falta
tradicionais por tintas industriais à base de
de peças e a presença de insetos xilófagos.
óleo ou esmalte sintético.

Quadro 10.5: Tipos de patologias nas talhas


Patologia Térreo/ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente
desgaste de madeira 23,24,34,35,36,37,43,45 34 não há danos intensos
galerias de xilófagos 23,34,37 não há danos intensos não há danos intensos
oxidação das ferragens 37,43 34 não há danos intensos
manchas por umidade 37 34 não há danos intensos
manchas por fungos 37 não há danos intensos não há danos intensos
descascamento da pintura 23,24,34,35,36,37,43,45 34 não há danos intensos
peças faltantes 23,30,35,37 não há danos intensos não há danos intensos

75
Fig. 10.11 Peças faltantes (Ambiente 38–pavimento Fig. 10.12 Galerias de insetos xilófagos – cupim de
térreo) solo (Ambiente 46–pavimento térreo)

Quadro 10.6: Tipos de patologias nos pisos em madeira

Patologia Térreo/ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente

desgaste do piso 6,8,11,15,20,21,22,44 8,20,21,35 35

perda de componentes 15 20,35 35

trincas 11,20,21,22,23,25 35 35

rachaduras 20,21,22,23 35 35

manchas de umidade 22 35 35

rejuntamento danificado 15,20,22,25 35 35

peças soltas não há danos intensos não há danos intensos 35

abatimento 21,22,25,28 3,20,25,35 27,28,29,30,31,32,33

impregnações superficiais 11,20,21,22,28 20,21,35,36 35

esfoliação 44 não há danos intensos 35

galeria de xilófagos não há danos intensos não há danos intensos não há danos intensos

podridão da madeira não há danos intensos não há danos intensos 35

Pisos em madeira como os assoalhos da torre sineira (ambientes


35 do 1º e 2º andares). A razão disso é que, em
Os principais ambientes identificados com
1998, foi trocado todo o madeiramento do piso
danos nos pisos em madeira estão no Quadro
do bloco conventual o qual se encontrava
10.6.
afetado por fungos e insetos. As grandes peças
São pouco expressivos os danos nos assoalhos. de madeiras de sustentação foram todas
Os abatimentos estão correlacionados com o trocadas por outras em madeira de lei, trazidas
excesso de peso de paredes de construções da Selva Amazônica – Estado do Pará. As
recentes, enquanto a maioria dos danos paredes do bloco conventual tiveram de ser
listados estão restritos a áreas diminutas, tais abertas para que as grandes traves pudessem

76
ser colocadas. Essa obra foi feita com recursos
da Ordem Franciscana e foi acompanhada pelo
IPHAN.

Fig. 10.14 Podridão da Madeira (Ambiente 32–


pavimento térreo)

Fig. 10.13 Trincas e rachaduras (Ambiente 35–


1ºandar)

Quadro 10.7: Tipos de patologias em forros


Patologia térreo/ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente
podridão do madeirame 32,31,23 35,34 16,17,35
galerias de xilófagos no madeirame 19,32,31 não há danos 7
intensos
presença de selamento no madeirame não há danos 28 16
intensos
desagragação/descascamento da pintura 23,26,45 não há danos não há danos
intensos intensos
eflorescência na pintura não há danos não há danos não há danos
intensos intensos intensos
saponificação na pintura não há danos não há danos não há danos
intensos intensos intensos
fissuras na pintura 18,23,29,35 não há danos 16,17,18,19,20
intensos
bolor na pintura não há danos não há danos não há danos
intensos intensos intensos
machas na pintura 18,19,23,26,28,29,35 34 16,19,20,34

Forros Franciscano. Em 1953 foi recuperado o belo


forro artezoado da Capela de São Roque da
Os principais ambientes identificados com
Ordem Terceira e realizada a desinfestação dos
danos nos forros estão no Quadro 10.7.
insetos xilófagos. Também nessa época, foram
Os principias forros de importância artística limpadas as pinturas, delas se retirando os
foram alvo de ações reparadoras desde as vernizes oxidados, sendo repostos outros.
primeiras intervenções no Conjunto Entre 1983 e 1984, foram restauradas as

77
pinturas do forro em caixotões da sacristia, 10.3. Instalações elétricas e
quando se removeu o verniz oxidado e uma hidraulicas
nova proteção foi aplicada. Ainda podem ser
mencionadas as intervenções (indevidas) nas Apesar de recentemente terem sido realizados
instalações elétricas das bibliotecas, onde o vários serviços – como mudança de fiação e
forro foi perfurado para a colocação de embutimento de eletrodutos nas paredes, a
luminárias que prejudicam a conservação das área da Ordem Terceira não foi objeto dessa
camadas pictóricas. intervenção pela administração distinta do
Conjunto. Assim, permanece em
aproximadamente quinze por cento da área
construída do Conjunto Franciscano com
instalações antigas, marcadas por sucessivos
reparos e adaptações.

Fig. 10.15 Desagragação/descascamento da pintura


(Ambiente 45–pavimento térreo)

Fig. 10.17 Risco de curto circuito (Ambiente39–


pavimento térreo)

Em vários ambientes da Ordem Terceira, são


facilmente notados fios emaranhados, sem
nenhuma proteção, em contato direto com
vigas, pisos e talhas de madeira, oferecendo
grande risco de incêndio (já informado pelo
Fig. 10.16 Desagragação/descascamento da pintura CECI no Relatório de Riscos).
(Ambiente 45–pavimento térreo)

Deve-se notar que os forros decorados do


Convento de São Francisco e da Ordem
Terceira devem ser conservados e restaurados,
não apenas como componentes arquitetônicos
mas também como acervos de valor artístico,
com um tipo peculiar de pintura, fazendo um
perfeito contraponto com o revestimento
azulejar.

Fig. 10.18 Risco de curto-circuito (Ambiente


32–pavimento térreo)

78
O Quadro 10.8 apresenta as principais
patologias nas instalações elétricas e
hidráulicas por ambiente.

Quadro 10.8: Patologias das instalações elétricas e hidraulicas


Patologias Térreo/ambiente 1º pav./ambiente 2º pav./ambiente
Instalações elétricas
instalação aparente 3,5,6,7,8,9,10,12,19,25,3 1,3,8,10,12,19,22,24,27, 1,2,3,7,9,12,13,14,20,26,
1,32,34,35,37,38,39,40,4 31,32,34,35,36,37 27,35
1,42,43,44,45,47
instalação desordenada 10,19,25,31,32,38,40,44, 3,10,19,22,24,31,34,35,3 7,9,12,13,19,20,35
45 7
risco de curto-circuito 5,6,19,25,28,31,32,34,35 1,3,10,12,19,22,24,31,34 7,9,12,19,20,35
,38,44,45 ,35,37
Instalações hidráulicas
desgaste de torneiras e registros não há danos intensos 2,4,6,8,11,28 3,4,5,6,7,8,9,10,11,12,13
,14,17,19,20,23,24,26,28
,29,30,31,32,33
desgastes de pias e lavatórios 6 2,6,8,11,28 3,4,5,6,7,8,9,10,12,13,14
,17,19,20,23,24,26,38,29
,30,31,32,33
entupimentos não há danos intensos não há danos intensos 3,19,20
inadequação de torneiras e 5,20,22,25,27 19,23 3,19,20
registros
vazamentos em tubulações não há danos intensos não há danos intensos 19,2

10.4 Intervenção na sacristia realizados à meia encosta do terreno, além de


agravados pela pluviometria dos trópicos. O
O Conjunto Franciscano foi alvo de grandes
processo, que foi denominado “deslizamentos
intervenções na década de 1980 (Gusmão
dos morros de Olinda”, foi lento e gradual,
Filho, 2001:15). O objetivo foi corrigir uma
cabendo notar a construção de grandes
série de danos concentrados na área da
contrafortes no século XVIII, o que prova
sacristia do convento.
serem os danos bem antigos. Como explica o
O que representou uma característica engenheiro e professor Jaime Gusmão Filho,
urbanística lusitana – ocupação de sítios
“as obras então realizadas na década de 1980
eminentes pelas edificações religiosas –,
foram espetaculares no sentido em que se
transmutou-se em risco de desmoronamento.
aplicou os mais avançados recursos da
A sacristia foi construída sobre uma ampliação
engenharia de então sem qualquer tipo de
do terreno em 1654; na verdade, sobre um
restrição patrimonial.
aterro com uma espessura média de 3 metros
Os grandes danos que ocorreram nesse O movimento do talude foi translacional
ambiente foram resultantes de movimentos de produzindo um deslocamento da fundação da
acomodação desse aterro e dos cortes parede posterior, para fora (horizontal) e para
baixo (vertical). Em conseqüência da distorção

79
resultante, as paredes laterais foram apoiada na viga de fundação. As paredes
intensamente cisalhadas, ocorrendo, também, foram mantidas na posição encontrada, as
acentuado abatimento no piso, que trincou rachaduras seladas. E os velhos azulejos
junto às fundações da sacristia primitiva. portugueses recolocados, trazendo o esplendor
da sacristia” (Gusmão Filho, 2001:162-163).
A parede posterior foi contida pelo
travejamento do primeiro andar e pela
cobertura, invertendo seu movimento de
translação para rotação. Apesar dos gigantes
de alvenaria, construídos no início do século
passado para escorar a parte posterior da
sacristia, ao contrário do que se esperava na
época, conduziram a uma aceleração dos
movimentos pré-existentes, devido aos
recalques destes gigantes e ao deslocamento
horizontal do talude adjacente ”(Gusmão
Filho, 2001: 142-143).
Fig. 10.20 Vigas de concreto na fundação (Ambiente
30–pavimento térreo)

Fig. 10.19 Contrafortes “segurando” os fundos da


sacristia (foto IPHAN - 1980)
Fig. 10.21 Novos suportes para o forro (Ambiente
As operações de engenharia foram resumidas
30–pavimento térreo)
pelo mencionado professor:

“A restauração da sacristia começou


removendo-se os três grandes contrafortes.
Também o piso e o aterro foram removidos
para aliviar a carga no talude. Como sub-
fundação foram executadas micro estacas, tipo
presso-ancoragem de 100mm de diâmetro, ao
longo de ambos os lados da parede (...) As
estacas contínuas ligaram-se entre si por blocos
de concreto armado, através de aberturas feitas
nas paredes. Depois foi executada por trechos,
uma viga longitudinal, que suporta a parede, e
recebe os tirantes dirigidos para dentro. O
novo piso é uma laje de concreto armado,
80
ANEXO 1

TOPOGRAFIA
ANEXO 2

DOCUMENTAÇÃO ARQUITETÔNICA
ANEXO 3

MAPA DE DANOS

Vous aimerez peut-être aussi