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Relatório Intermediário
Olinda - 2006
CECI
Carolina Buarque
Marina Cabral
American Express
OS PROPÓSITOS DO PLANO
A LOCALIZAÇÃO E A PROPRIEDADE
2.1. A localização
O Conjunto Franciscano localiza-se na cidade de
Olinda, Estado de Pernambuco, Brasil, região
tropical da América do Sul, no Nordeste do
Brasil (Figura 2.1).
Por ser uma cidade tropical à beira do mar, sua Figura 2.1: Localização
média anual é de 80% , sendo a mínima em
torno de 74%, e a máxima de 97%.
3
Foto 2.1: O sítio histórico de Olinda
4
2.2. A propriedade
A propriedade tem o regime do direito privado,
pertencendo à Província Franciscana de Santo
Antônio do Brasil, que administra os bens
móveis e imóveis dos franciscanos nos Estados
da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco,
Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará (Figura
2.2). A administração central está localizada à
Rua do Imperador, 206, no Recife – PE .
5
3
O Conjunto Franciscano de Olinda está Qualquer interferência na área se sujeita aos projetos
localizado no núcleo histórico da cidade. O especiais de ocupação e uso, tendo em vista a proteção
centro histórico de Olinda foi tombado, pelo á topografia, vegetação e paisagem;
Governo Federal em 1968, e reconhecido, pela Só serão permitidas obras ou novas formas de
UNESCO, como Patrimônio Cultural da ocupação que não impliquem em aterros, desmontes
Humanidade em 1982. e/ou alterações de vegetação existente. Fica
O Conjunto Franciscano foi tombado pelo estabelecida a taxa máxima de ocupação em 5%
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (cinco) da área e gabarito máximo de 01 (um)
Nacional (IPHAN), em 22 de julho 1938 e pavimento, com altura máxima de 3m (três metros)
inscrito no Livro Belas Artes. É formado pela até o nível da platibanda, permitindo acima disso
Igreja e Convento de Nossa Senhora das Neves, telhado com o máximo de inclinação de 30% (trinta),
medidos a partir da soleira, não podendo esta se
capela, casa de oração e claustro dos Terceiros
encontrar a mais de 0.50m (meio metro) acima do
Franciscanos, inclusive o adro e os cruzeiros
meio fio.”
fronteiros e toda a área da antiga cerca
conventual.
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tombados. Observa-se na Figura 3.2 que os
perímetros de proteção das duas legislações são
Segunda refere-se à vida monástica feminina
semelhantes.
contemplativa ligada a Santa Clara. A Ordem Terceira
O Art. 26, Lei Municipal n° 4.849/1992, diz: corresponde aos irmãos leigos, e suas atividades
remontam à Idade Média, quando eram conhecidos
“No Setor Verde 1 não será permitido aumento de
como “Irmãos e Irmãs da Penitência”. Estes últimos
taxa de ocupação existente, ficando os Setores Verdes estão divididos em Regular, com vida religiosa
2 e 3 sujeitos aos projetos especiais de ocupação e uso, consagrada por votos, e Secular, com vida religiosa
tendo em vista a proteção à topografia, vegetação e sem consagração de votos (É o caso dos Terceiros de
paisagem, sendo obrigatória análise especial pelo Olinda). Fonte: Flos Sanctuorum, in Brotéria LXXII, nº.
órgão federal competente e Conselho de Preservação 2 – Lisboa 1961.
dos Sítios Históricos de Olinda e aprovação pela
Prefeitura Municipal, observados os seguintes
requisitos :
Notas
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4
AS CARACTERÍSTICAS DA CONSTRUÇÃO
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4.2. Topografia e locação das
edificações
A planta do levantamento topográfico apresenta
a delimitação do terreno da cerca conventual e
localiza as edificações e a cobertura vegetal da
cerca conventual. Esse documento encontra-se
no Anexo 1.
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A primeira área é privativa dos frades e é formada por três ambientes: a galilé (ambiente
funcionários do Convento. É composta por 33), a nave (ambiente 34) e a capela-mor
cozinha (ambiente 12 e 14), refeitório (ambiente (ambiente 35). A igreja possui ainda um trás-
2), despensa (ambiente 13), depósitos (ambientes altar (ambiente 32), local destinado ao
3, 4, 6, 7, 8, 9 e 10), sanitários (ambiente 5) e armazenamento de objetos da igreja, e o
garagem (ambiente 15). Também fazem parte corredor (ambiente 31) que liga a capela-mor
dessa área a copa (ambiente 27) e a biblioteca diretamente à sacristia. Esse corredor também é
(ambiente 28), acessível, também, aos conhecido com corredor dos mortos, por possuir
professores e estudantes do curso do Instituto jazigos. Ambos os ambientes são de acesso
Franciscano de Teologia de Olinda (IFTO). restrito aos frades e aos funcionários. Completa
a área a capela de São Roque (ambientes 36 e
37).
banheiro (ambiente 10), biblioteca (ambiente 34) Outro elemento é a casa de banhos, localizada
e sala de recreação (ambiente 26). abaixo do terraço – mirante (Foto 4.3). Esse
espaço mantém sua configuração original, sendo
Além das áreas construídas do Conjunto
importante registro dos hábitos franciscanos.
Franciscano, alguns outros elementos não
podem ser esquecidos.
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diferentemente dos beneditinos, carmelitas e barrotes deteriorados. Entretanto, não houve
jesuítas, a utilizaram na colunata do claustro, prejuízos para a autenticidade da técnica e do
onde os arcos deram leveza e suavidade a esse sistema construtivos da alvenaria, porque esses
antigo espaço de deambulação e meditação. foram mantidos.
Ao sistema maciço e estático das alvenarias, Sobre as estruturas de madeira dos assoalhos
juntam-se as estruturas flexíveis e articuladas do assentavam-se as paredes divisórias em taipa ou
madeiramento dos pisos acima dos rés-do-chão estuque (tabique), a quais delimitavam as celas
e das coberturas. Coerente com as mais antigas dos frades e outros ambientes da vida monacal
técnicas de construção, todas as alas do nos pavimentos superiores. Também nesse caso,
Conjunto Franciscano possuem barroteamento os materiais da maioria desses ambientes foram
com traves de madeira, que apoiam assoalhos substituídos por alvenaria de tijolos cerâmicos
ou forros. revestidos com argamassa à base de cimento, de
modo que a aparência ondulada dos rebocos e a
Ao longo dos anos 1970 e 1980, o IPHAN
“selagem” nos assoalhos desapareceram – itens
substituiu todo o madeiramento dos pisos e
importantes na percepção do antigo nas alas
forros, trouxe prejuízos para a autenticidade dos
conventuais.
materiais, pois, segundo consta, não houve
tentativas de recuperação ou consolidação dos
O sistema construtivo das coberturas apresenta nenhum testemunho das antigas telhas
dois modelos comuns à colônia luso-brasileira: coloniais3.
tesouras e terças de empena a empena. Segundo O sistema das tesouras é o do tipo canga-de-
Lopes (2004), os sistemas das tesouras e o porco, utilizado ora com linha alta ora com linha
madeiramento dos telhados não são mais os baixa, sustentando uma trama composta por
originais, inclusive estes últimos não têm mais caibros e ripas sobre linhas de terças, frechais e
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cumeeira. A maioria dos telhados não tem mais
a técnica autêntica dos caibros roliços e ripas de
embira (trama) e das madeiras lavradas
(estrutura), sendo substituída pelo
madeiramento serrado, industrializado. Nesse
sentido, o caso mais significativo é o dos
cachorros do telhado do terraço da Ordem
Terceira que foi totalmente reconstruído
décadas atrás. Nele, não ficou nenhum vestígio
que indique este telhado ter sido de madeiras
lavradas. As que estão atualmente expostas são
madeiras serradas industrialmente (ver: Fotos 4.5: Painel de azulejos do claustro
Fotos 4.6 a 4.14: Principais tipos de ladrilhos hidráulicos encontrados nos ambientes do conjunto.
Nos tetos dos ambientes, há alguns excelentes seus tetos. Alguns deles estão encobertos por
exemplos de técnicas construtivas na elaboração tinta óleo, outros tiveram a decoração raspada,
de forros em madeira, tais como artesoado, uns estão com iluminação absolutamente
emoldurado, caixotão, tábuas corridas (lisos), comprometedora da integridade da pintura
com rompantes e roda-teto (cimalha) (Fotos 4.14 decorativa. Seja como for, salvo prospecções
a 4.24). Os forros da nave e capela-mor da mais acuradas, os forros guardam suas
Ordem Terceira e os da Ordem Primeira e principais características técnico-construtivas:
Convento têm técnicas elaboradas na talha e madeiras lavradas, fixadas com pregos e cravos
decoração sobre madeira. Aliás, os franciscanos em ferro forjado.
de Olinda foram profícuos na arte de revestir
16
Fotos 4.15 a 4.24: Imagens dos forros da nave e coro da Ordem
Primeira, nave e capela-mor da Ordem Terceira, salão da irmandade,
galilé, parlatório, sacristia, biblioteca do térreo e auditório,
respectivamente.
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1 O levantamento arquitetônico expedido
corresponde à documentação rápida dos dados de
uma edificação, de modo a registrar as linhas gerais
de medidas horizontais e verticais, volumetria e
ornamentação.
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OS USOS
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5.2. Usos temporários
O convento é utilizado para casamentos,
recepções, seminários e encontros de empresas.
Ocorrem cerca de dois casamentos por mês, e,
em cada três casamentos, pelo menos, um há
recepção no próprio convento, com 300 a 400
pessoas que circulam entre o claustro e o
terraço.
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O SÍTIO ARQUEOLÓGICO
27
Figura 6.1: Plano das prospecções arqueológicas do adro de São Francisco de Olinda. Fonte:
SEPACCTUR/Olinda – maio/2006
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porventura surpreendam a equipe. Inclusive, na realizado com estudos incompletos, ameaçando
borda norte da Janela A (Figura 6.1), foram um dos importantes itens sobre a significância
localizados vestígios de sepultamento indígena6. da arquitetura franciscana – o adro.
Na verdade, o projeto aparece mais como uma
proposta de revelar um passado perdido.
Desconsidera o trabalho secular construtivo e de 1 Procedimento arcaico, pois desde a época em que
formulação de uma concepção artístico-barroca foi inventado o container, esse tipo de fossa não é
do espaço urbano que integrou o adro à fachada mais utilizado em canteiros de obras devido às
do Conjunto Franciscano, ao cruzeiro, aos agressões ao meio ambiente e ao sítio histórico.
caminhos e à vegetação, em uma topografia 2 Mestre Narciso Alves, com 76 anos, é um dos mais
acidentada. O projeto também não oferece antigos mestres-de-obras em restauração ainda em
soluções para as seguintes questões elementares: atividade no país.
A exposição dos vestígios arqueológicos para os 3 Trabalho contratado com a empresa paulista de
visitantes não poderia ser feita por consultoria Terrascience Ltda, em março/2002.
representações de realidade virtual?
4 A Sociedade dos Moradores e Amigos de Olinda
Como será resolvido o desnível para o acesso à Antiga (SODECA), criada em 1981, é uma entidade
igreja pelo adro, pois com o corte para a vigilante e atuante na preservação dos valores
culturais do sítio histórico da cidade.
abertura da Rua de São Francisco, no segundo
quartel do século passado, não serão mais 5 Informação dos arquitetos André Pina e Emanuel
localizadas partes desse ambiente? Almeida, do Departamento de Patrimônio Histórico
da SEPACCTUR, em 5/mai/2006
Qual será o critério para o preenchimento das
lacunas das lajes de pedra faltantes e de outros 6 André Renato, citado.
materiais antigos?
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7
O convento de Nossa Senhora das Neves faz Esses conventos não foram produtos isolados
parte de um magnífico grupo de conventos da criação individual, mas sim de um contínuo
construídos pela Ordem Franciscana no litoral processo de adições e reformas que se
do Nordeste brasileiro durante o período desenvolveu de acordo com uma particular e
colonial. As características ímpares desses clara concepção arquitetônica da vida
conventos levaram vários autores a monacal. O programa arquitetônico desses
designarem a escola franciscana de conventos conjuntos apresenta algumas características
como a primeira manifestação de uma constantes, como:
arquitetura legitimamente brasileira (Bazin, Um claustro com uma série de atividades
1983:137; Gomes, 2002:11). Ao contrário dos estruturadas ao redor;
jesuítas que importaram seus modelos dos
Uma igreja que se destaca como um corpo
riscos maneiristas de Filippo Terzi, os
mais alto no conjunto, com nave única, capela-
franciscanos adotaram soluções inéditas ao
mor, sacristia e coro;
adaptarem elementos e funções da vida
monacal medieval e renascentista às condições Um campanário único, elemento vertical de
tropicais. destaque da composição, geralmente recuado
da fachada e localizado em uma das ilhargas
A cristalização do programa arquitetônico
do templo;
franciscano só atingiu corpo a partir da
segunda metade do século XVII, com a Uma fachada marcada pela presença da galilé,
expulsão dos holandeses dessa parte do Brasil espécie de nártex que precede a igreja,
(1630-1654). Os franciscanos iniciaram então elemento que remonta às origens do
um amplo programa de reconstrução e de cristianismo;
construção dos seus mosteiros, findo o qual Um adro com o cruzeiro estendendo-se em
haviam criado um agrupamento de catorze frente à igreja.
estabelecimentos ao longo da costa nordestina.
Esse conjunto inclui os conventos de Cairu, Espaço de meditação, oração e recolhimento, o
Paraguaçu, São Francisco do Conde e claustro recebeu um tratamento diferenciado.
Salvador, na Bahia; São Cristóvão em Sergipe; Foi a partir dele que orbitaram todas as
Penedo e Marechal Deodoro em Alagoas; unidades arquitetônicas integrantes do
Ipojuca, Sirinhaém, Paudalho, Olinda, Recife e conjunto. Os claustros possuíam nítida
inspiração renascentista, composto por
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graciosas arcadas, geralmente de ordem solução comum nas casas senhoriais, mesmo
toscana, encimada por outra galeria. Ao redor em algumas igrejas (Bazin, 1983: 154).
do claustro estavam os locais da vida comunal,
Ainda segundo Bazin (1982:149-150), em
como refeitórios e bibliotecas no primeiro
relação às fachadas das igrejas existiam dois
pavimento, além dos acessos à nave da igreja e
tipos de frontispício adotados pelos conventos
a outros espaços religiosos. Muitas vezes os
franciscanos. O primeiro, o mais simples e
dormitórios abriam-se para o claustro no
clássico, era encimado por um frontão
segundo andar (Teles, 1975:28; Bazin,
triangular, cuja origem parece remontar ao
1983:149).
convento de Ipojuca, e de forma mais geral à
A nave da igreja estava geralmente do lado arquitetura-chã portuguesa (Sousa, 2005:27-28;
esquerdo do claustro. Com a exceção de Bazin, 1983: 151). O segundo tipo, cuja origem
Salvador, todas possuíam nave única, com a se encontra na fachada do convento de Cairu,
capela-mor pouco profunda e mais estreita. na Bahia, apresentava uma composição
Uma das marcas das igrejas franciscanas reside monumental de formato piramidal, realizada
nas capelas das Ordens Terceiras e sua relação pela superposição de pavimentos decrescentes.
direta com a nave da igreja conventual. As O pavimento inferior apresentava cinco
capelas das Ordens Terceiras eram arcadas, o intermediário possui três tramos
implantadas ao lado ou, muitas vezes, divididos por pilastras, e o terceiro era
engastadas perpendicularmente em relação à composto por um tabernáculo contendo uma
nave das igrejas. Podiam ter uma entrada estátua (Campello, 2001:43; Bazin, 1983: 153).
independente e abriam-se diretamente para a Segundo Alberto Sousa ( 2005:93-96), essa
nave da igreja através de grandes aberturas fachada foi pioneira na introdução do gosto
emoldurada por arcos. É justamente nessas barroco nas fachadas brasileiras. As fachadas
capelas onde se podem encontrar os excessos dos conventos de João Pessoa e de Paraguaçu
ornamentais da arquitetura barroca no também foram enquadradas dentro de um
Nordeste do Brasil. triângulo eqüilátero (Fonseca, 1988: 34). Os
exemplos desse segundo tipo mostram a
Em relação ao aspecto externo, esses
influência da tratadística clássica na
complexos apresentavam fachadas austeras e
arquitetura franciscana.
despojadas, com toda a atenção voltada para o
frontispício que recebia um tratamento Outra particularidade dos conventos
diferenciado. franciscanos reside no enquadramento
urbanístico. Os complexos arquitetônicos dos
Uma marca dos conventos franciscanos é a
frades são famosos pelo amplo adro balizado
galilé, ou o nártex reentrante, elemento que
por um cruzeiro de pedra, que constitui
remonta às primeiras basílicas cristãs, quando
solução inédita e particular dessa ordem. Além
eram criados pórticos para abrigar os não-
de proverem espaços adequados para se
batizados. Esse elemento foi retomado no
admirar a fachada, o adro funcionava como
Brasil pelos franciscanos e beneditinos,
elemento de intermediação, entre o aspecto
demonstrando o esforço de adaptação às
mundano da cidade e o caráter sacro do
condições climáticas tropicais, na medida em
convento, clamando por uma atmosfera de
que provia uma adequada transição entre o
resignação (Campello, 2001:51; Fonseca, 1988:
exterior e o interior da igreja. A galilé pode ser
25; Bazin, 1982:152). Os adros tiveram o seu
vista como uma derivação do alpendre, uma
mais requintado exemplar no conjunto de João
Pessoa. Os adros franciscanos remontam a
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espaços claramente barrocos, mas não embora suas proporções se mostram bastante
procuram aqueles grandes eixos e perspectiva refinadas.
do barroco italiano, e sim objetivam tirar
Uma das marcas do claustro são os contrastes
partido da topografia e dos edifícios
entre a rusticidade do piso em lajotas e as
circundantes. É um barroco mais modesto, mas
paredes revestidas por painéis de azulejos,
não menos belo e dramático.
entre esses mesmos painéis e o delineamento
das colunas de arenito, entre a claridade
7.2. A arquitetura do Conjunto emanada das paredes caiadas do corpo da
Franciscano igreja e a sombras criadas pela varanda do
segundo pavimento.
O complexo franciscano de Olinda foi
resultado de sucessivas adições e reformas,
visto que foi formado por conjunto de blocos
interligados. A melhor forma de se realizar
uma análise da sua arquitetura é tomar como
referência os blocos principais.
7.2.1. O Claustro
33
corresponde à galilé, e outra que corresponde transformando em um grande frontão. Os
aos andares superiores, fruto de reforma ou pináculos fecham a composição provendo um
modernização posterior. A galilé, ou o nártex tom ascendente à fachada.
reentrante, foi uma adição à primitiva fachada,
A torre única é recuada da fachada e possui
avançando sobre a rua. A galilé era
sineira em arco pleno, coroada por cúpulas de
inicialmente saliente ao corpo da igreja e
arestas com pináculo piramidal (Foto 7.3). O
aberta para os lados, uma situação habitual nas
recuo da torre revela-se uma solução
construções franciscanas. Com as obras de
engenhosa na medida em que liberta o
reconstrução iniciadas em meados do século
frontispício para ser totalmente simétrico.
XVIII, ela adquiriu a feição atual, incorporada
ao corpo da igreja, com três grandes portas em 7.2.3. A nave da igreja
arco. Uma cruz de pedra, encostada a uma das
A nave central possui planta retangular e pé-
arcadas da galilé, acusa a data de 1700, mas o
direito duplo, sendo acessada do exterior
término da fachada parece ser posterior a essa
através da galilé e pelo claustro (fotos 7.3 e
data.
7.4). Possui nave única, com a capela-mor
pouco profunda e mais estreita. O interior
destaca-se pela ornamentação composta por
painéis de azulejos e talha. Retratando cenas
religiosas, os painéis do forro, consistem em
dezoito octógonos dispostos de forma a
conferir um aspecto abobadado. As paredes
são revestidas com azulejos que ilustram
passagens bíblicas, emolduradas por barras
sinuosos compostas por anjos e querubins.
34
Os altares colaterais, barrocos do final do
século XVIII, emolduram o arco cruzeiro, que é
pouco decorado. A capela-mor tem um teto
abobadado, acompanhando o arco cruzeiro e
as tribunas laterais. O retábulo do altar
apresenta nichos entre as colunas ornadas por
motivos florais.
35
freqüente nos conventos franciscanos do
Nordeste.
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um pequeno trecho de parede, entre o bloco da A talha do altar apresenta uma movimentação
portaria e a igreja, na altura da galilé. inusitada, representando o gosto do barroco
português da época de D. João V.
Emoldurada por largas pilastras de pedra, a
fachada apresenta uma ortogonalidade
austera. A planaridade da fachada é
interrompida apenas pelas janelas. No térreo, a
porta central de verga reta marca o eixo da
composição, sendo complementada por duas
janelas, uma de cada lado, também de verga
reta. Essa porta central, hoje não utilizada, dá
acesso direto para o exterior do edifício. As
janelas retas são gradeadas e encimadas por
ornatos de cantaria. A porta central é
encimada pelo organograma da ordem
emoldurado por colunas, sob as quais se
apoiava um antigo alpendre. Típico das
construções franciscanas, servindo para
proteger os fiéis do sol, esse alpendre
encontrava-se no mesmo alinhamento da
galilé.
37
encontram-se bancos de madeira que se
encostam diretamente no silhar de azulejos.
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espaços mais propícios para a meditação e dos célebres conjuntos de João Pessoa e Cairu.
recolhimento do convento (Foto 7.13). É um Em Olinda, é, por excelência, um elemento
espécie de claustro, com duas de suas faces plástico urbano e não arquitetônico, porque é
abertas para o verde da encosta e para o azul um espaço aberto, rigidamente organizado por
do mar e do céu, elementos que atestam o um triângulo com base na forte geometria da
caráter divino. A vista é emoldurada pelas reentrância da fachada do Conjunto (fachada
paredes e pelo piso do terraço, eliminando o da igreja e do bloco da portaria) e pelo ponto
caráter mundano da cidade e concentrando-se focal criado pelo cruzeiro (Fotos 7. 14 e 7.15).
concentrar no céu e no mar. Do terraço há uma
bela vista do Recife. 7.2.11. A adaptação à paisagem
***
40
8
Como um ente vivo, a arquitetura guarda as diversos ambientes manifestações que, em seu
marcas do tempo. Os elementos artísticos que a conjunto, constituem um patrimônio impar.
ela se sobrepõem ajudam a situá-la, marcando a Sem se concentrar no gênero “quadro”, cujas
ação da cultura humana mediante seus aspectos datações quase sempre se inserem do século XIX
estético-estilísticos. Nas paredes, tetos e pisos e ainda possuem a propriedade da mobilidade,
acumulam-se informações que ajudam a marcar pode-se destacar no conjunto pictórico do
o momento nos quais se estabeleceram as Conjunto Franciscano de Olinda os magníficos
informações estéticas que datam e ajudam a “forros em caixotão” da Capela da Ordem
desvendar a formação dos espaços. Terceira, com seu altar-mor, da nave da Igreja
Pintura,talha e azulejaria fundem-se no estilo de Nossa Senhora das Neves e de sua sacristia,
barroco, criando uma ambiência artística e além do da Capela do Capítulo.
gerando as informações de que a igreja Coloca-se assim, em segundo plano, a pintura
necessitava para passar suas idéias e orientações em tabuado de madeira do forro da Capela de
catecísmicas. Elas hoje fornecem os subsídios Santa Ana Mestra e a pintura do teto abaixo do
necessários para desvendar os momentos de coro (Foto 8.1), cujas perspectivas, de tendência
formação espacial do Convento de São ilusionista, demonstram a busca dos modelos
Francisco, marcando com suas características as italianos do período, guardadas as devidas
fases de organização pelas quais passaram os proporções e apuro técnico.
diversos ambientes que constituem o edifício.
Assim sendo, é o conjunto desses elementos,
aliado à estrutura ornamental típica do barroco
luso-brasileiro que permite afirmar uma
inserção espaciotemporal dos atuais espaços do
Convento de São Francisco de Olinda entre a
segunda metade do século XVII e o século XVIII,
constituindo em si uma verdadeira aula de
estética barroca desse período.
8.1. A pintura
Foto 8.1: Pintura ilusionista no forro do coro da Igreja
Dentro dos princípios gerais que caracterizam a de Nossa Senhora das Neves - séc. XVIII
pintura do período barroco, difundida no Brasil Também se pode citar, embora já tenha sido
durante os séculos XVII e XVIII, o Convento de retocado e esteja em avançado grau de
São Francisco de Olinda apresenta em seus deterioração, o forro em painéis da Biblioteca,
41
que apresenta de maneira bastante singela e vernizes e marcam a inserção do forro no início
tardia os mesmos motivos religiosos e naturais do século XVIII.
dos exemplares anteriores.
42
composição vê-se mais uma vez a imagem de rocalhas, o que ainda indica as primeiras
Nossa Senhora da Conceição, em destaque décadas do século XVIII. Também se verifica a
conseguido por meio de grande saliência da pintura de veios azuis, que pretendem dar
talha que se forma em moldura polilobada aparência de marmoreado, e as arestas entre os
cercada de acantos. caixotões são preenchidas com trabalho de talha
dourada, confirmando a inserção temporal.
Foto 8.3: Capela de São Roque (dos Terceiros) - século Foto 8.4: Detalhe do forro - Capela de São Roque -
XVIII século XVIII.
Ali, em forro plano, as figuras centrais são Na Capela do Capítulo, com características
inseridas nos octógonos retos ou polilobados muito próximas da Capela dos Terceiros em
formados pelos caixotões. Os ambientes termos de composição do forro, encontramos
pintados nos quais as figuras se apresentam, um forro plano, com painéis temáticos sobre a
internos ou externos, estão perspectivados de infância de Cristo, tendo ao centro um painel no
maneira ingênua, fazendo com que as imagens qual o anjo avisa a José, em sonho, para que
sejam visualizadas quase sempre soltas, em suas fosse em direção ao Egito. O forro coincide com
vestes mais escuras que o entorno (Foto 8.4). a talha do retábulo e a azulejaria que marcam o
Figuras mais modestas foram inseridas ao final do século XVII.
molde de bustos nos losangos que ocupam os
No último forro em caixotão plano, o da
espaços entre os caixotões maiores. Na Capela
sacristia (Foto 8.5), o barroco se manifesta em
Terceira, o enquadramento dos caixotões,
sua forma mais plena. São quinze caixotões
bastante mais elaborado do que no altar-mor, foi
octogonais pintados com grande maestria,
feito por meio de da talha com contornos
exibindo cenas da vida de São Francisco e uma
dourados em fundo branco, no qual se
imagem destacada da Virgem (Foto 8.6). Entre
desenvolveu uma decoração fitomorfa, pintada
os octógonos situam-se losangos nos quais se
em tom vermelho, sem apresentar indícios de
43
inserem naturezas-mortas, em composições perspectiva ilusionista, cujo teor sempre tentam
muito diversificadas de fruteiras, e as arestas inserir as imagens centrais da composição num
são marcadas por volumosos apliques de verdes ambiente arquitetônico. Cria-se um efeito
folhas de acanto e flores de cores variadas. O ilusório com o prolongamento da cimalha por
colorido é exuberante e as perspectivas, meio da pintura. Colunas e parapeitos em que
perfeitas. O volume da talha, o colorido e a se debruçam personagens de importância para a
composição, com o conjunto de talha e azulejos, Igreja ou para a Ordem religiosa, circundam a
permitem datar o espaço como sendo da cena central, reproduzindo ilusoriamente um
primeira metade do século XVIII, quando anjos espaço arquitetônico que não existe. Foi assim
e zoomorfos povoam a iconografia barroca. que se deu efeito no tabuado do teto abaixo do
coro, onde cenas arquitetônicas simulam balcões
laterais que precedem a profundos espaços
falsos, enfeitados por guirlandas e decoração
arquitetônica barroca, onde anjos observam o
passante. No centro, um poço de cúpula,
emoldurado por cartelas, e uma balaustrada.
44
da composição, bem como pela oxidação dos apresenta-se por meio das aspirais de acantos,
vernizes que o escureceu. rendilhados fitomorfos e concheados de
desenho simétrico.
Destaca-se no conjunto pictórico a imagem da
Virgem que, seguindo os ditames da Igreja
Contra-reformista, aparece em sua evocação
como a Imaculada Conceição e na sua visão das
Neves. Em todos os ambientes foi dado
destaque à figura da Virgem entre as imagens
delimitadas pelos caixotões. Também se destaca
o sentido arquitetural da pintura, à medida que,
se num primeiro momento os caixotões
representam uma divisão do plano
arquitetônico do teto, em um segundo momento
a própria pintura tenta imitar a arquitetura,
criando elementos que a reproduzem.
Foto 8.8: Conjunto dos altares da Igreja de Nossa
Senhora das Neves
8.2. A talha
A talha barroca expressa-se no Convento de São
Francisco de Olinda a partir de seu apogeu. Isso
se dá quando, no início do século XVIII, o
Barroco libera-se definitivamente da prisão à
estrutura compositiva arquitetônica e expressa-
se por meio de uma talha volumosa e opulenta,
que continua repleta dos fitomorfos mais
diversos, como folhas de acantos, parreiras,
frutos e flores dos mais variados, passando a
entremear a essa vegetação zoomorfos, tais
como fênixes e pelicanos, que são assimilados
pela mitologia cristã, além das mais variadas
estirpes de anjos, tais como querubins com
apenas cabeças e asas, serafins, anjinhos
rechonchudos e atlantes. O Conjunto
Franciscano também apresenta excelentes Foto 8.9: Detalhe do capitel do arco cruzeiro entre a
exemplares do Rococó religioso do Brasil os Capela dos Terceiros e nave da igreja Nossa Senhora
quais marcam o visual da Igreja de Nossa das Neves
Senhora das Neves com seus três altares (Foto Essa estrutura compositiva geral, ainda parietal
8.8). e plana, já indica a expressão de talha barroca
chamada D. João V, pois nela se inicia o jogo de
A talha do arco cruzeiro (Foto 8.9) e dos altares
volutas formando quartelões que movimentarão
colaterais e laterais da Capela da Ordem
a composição em direção ao Barroco da primeira
Terceira do Convento de São Francisco de
metade do século XVIII.
Olinda apresenta um esquema no qual o
douramento se espalha e se impõe perante o Embora todos os conjuntos da Capela dos
fundo branco. Neles, a profusão ornamental Terceiros ainda se remetam aos esquemas
45
formais do período anterior, com coroamento ornamentos se apresentem menos volumosos, o
marcado pela presença do arco pleno, já que permite situá-lo no início do século XVIII.
apresentam a tendência barroca de desintegrar o Vale salientar que ele se sobrepõe a um frontal
plano da arquitetura. Assim se quer deixar a em azulejo, provavelmente do século XVII.
entender que o conjunto de talha da Capela da
Em seguida há a Capela de Santana, que embora
Ordem Terceira do Convento de N. Sra. das
já tendo sofrido retoques em sua pintura e
Neves foi executado, sucessivamente, entre o
douramento, ainda mostra alguma clareza
final do século XVII e o início do século XVIII,
arquitetônica, como ocorre na Capela do
quando nos momentos finais se compôs a
Capítulo. Aqui, no entanto, além de um
volumosa talha do arco cruzeiro, na qual
intrincado jogo de ramagens douradas que
querubins já participam da composição. No
proliferam desde o frontal de altar até os
início de século XVIII, situa-se a magnífica talha
capitéis das colunas torsas, já se verifica uma
do arco que separa a Capela dos Terceiros da
movimentação mais intensa do conjunto e a
Igreja de N. Sra. das Neves, em que a maestria
introdução de zoomorfos policromados
do escultor praticamente solta da superfície as
aplicados às colunas, que sustentam um
enormes margaridas, folhas de acanto e anjos,
volumoso coroamento com folhagens e volutas
que constituem os principais motivos
em “S”, a que ainda se sobrepõe um grande
decorativos do início desse século.
brasão. Essa composição movimentada remete a
Nenhum outro conjunto escultórico do um gosto D. João V, o que a faz adentrar
Conjunto Franciscano de Olinda é tão singular esteticamente na primeira metade do século
como a talha da Capela do Capítulo, no qual se XVIII.
podem inserir esquemas nos do século XVII,
Em período mais avançado e com exímia
chamado pelos estudiosos da talha de Nacional
execução, situa-se o conjunto de talha da
Português, com claras intrusões do século XVIII.
sacristia (Foto 8.10), na qual a expressão barroca
O fato que permite situá-lo nessa posição é a
D. João V assume todo o seu esplendor, em uma
marcação da estrutura arquitetônica, ainda
magnífica composição em ébano constituída por
visível, na qual um par de colunas torças,
duas exímias peças parietais de arcazes e
recobertas de ornamentos fitomorfos
gaveteiros para paramentos. Embora esses
entranhados, dividem o plano da composição
elementos constituam exemplares de mobiliário,
intermediária, e uma cimalha separa esse nível
o fato de preencherem um espaço parietal e,
do superior, destacando um nicho central. Após
inclusive, embuti-se nele, pode-se fazer
a cimalha, o conjunto é coroado por um frontão
referência a esse conjunto como o mais
já bastante desfigurado pela ornamentação
exuberante do Conjunto Franciscano de Olinda.
fitomorfa terminada por um concheado. Essas
Nos arcazes, o negro do ébano, embora não
composições ornamentais, embora já demasiado
ajude na visualização da riqueza de detalhes da
carregadas e marcadas por pesados
talha, torna mais enigmático o conjunto de
douramentos e policromia, não desenvolvem a
fitomorfos, zoomorfos, anjos e atlantes que
volumetria, nem apresentam ainda os
constituem os motivos decorativos de quatro
zoomorfos e antropomorfos que marcarão o
dos cinco tramos que constituem a peça. Apenas
século XVIII. Tudo isso, aliado à falta de
o corpo central foi completamente dourado, e
espaçamento entre as colunas, permite crer que
nele inseriu-se um nicho com um Cristo
o esquema compositivo desse altar se insere no
crucificado. A simplicidade da composição
final do século XVII. O frontal de altar apresenta
indica que houve nesse tramo uma intervenção
uma estrutura compositiva mais leve, embora os
na segunda metade do século, mantendo-se os
46
gaveteiros. O terço inferior é dominado pelas planos nos quais as rocalhas se distribuem,
gavetas. Nos dois tramos centrais situam-se os formando curvas e contra-curvas graciosas de
espelhos, e nos tramos das extremidades ícones aparência quase oriental. As composições dos
pintados com Jesus, e Maria com o menino. O dois exemplares ocupam os cantos frontais da
segundo gaveteiro, para pequenas peças, está nave, emoldurando o arco cruzeiro, e são
embutido na parede situada diante do gaveteiro coroadas por exuberantes sanefas vazadas,
maior. Esse, embora de menores dimensões e compostas de rocalhas.
tratamento decorativo, não deixa de
impressionar pelo trabalho quase de rendilhado
de seu coroamento. Aqui, nas duas peças, o
caráter escultórico e ornamental já predomina
completamente frente à composição
arquitetônica, situando-os em meados do século
XVIII. A beleza do conjunto foi realçada pelo
magnífico forro e pela azulejaria que completam
a ambiência.
Finalmente, o conjunto escultórico dos altares da Nos últimos anos do século XVIII, o altar mor
Igreja de N. Sra. das Neves (Foto 8.11). Nele já se da Capela dos Terceiros foi reformado,
torna marcante a substituição dos motivos recebendo apliques de influência rococó na
acânticos pelas rocalhas, o único elemento que mesa e uma limpeza de sua estrutura
atesta os esquemas compositivos rococós. A arquitetônica anterior, que foi assim despojada
confusão ornamental da primeira metade do da maior parte da decoração D. João V (Foto
século XVIII foi então substituída pela 8.12). O arco do camarim, plano de fundo do
contenção, e outra vez a talha passa a ser um altar, recebeu então um belo dossel que
motivo ornamental sobreposto ao plano infelizmente se encontra atualmente bastante
arquitetônico dos altares. danificado. Tornou-se assim um exemplar
híbrido, porém inserido no contexto estético do
Na Igreja de Nossa Senhora das Neves, os
século XVIII.
altares colaterais mostram uma composição do
final do século XVIII. O douramento já deixou O altar-mor ocupa uma capela profunda e
de predominar, restringindo-se a filigranas que apresenta características de ter sido executado
acompanham a decoração, e o branco domina os após os altares colaterais que o precedem. As
47
rocalhas são ainda o centro da composição, que “Naves inteiras, por vezes desproporcionadas, capelas
termina com um enorme plano semelhante a um nuas e mimos arquitetônicos, imensos corredores
frontão, no qual está aplicada uma inflexão de claustrais, pátios e sacristias, escadas mesquinhas,
rocalhas encimadas por um medalhão. Os tudo se transforma em cor, tudo ganha em
festões e guirlandas de flores e os laços de fita monumentalidade e em espetáculo com esses azulejos
que decoram diversos espaços do conjunto policromos, dinamizando e ampliando o espaço; é
prenunciam esquemas neoclássicos, sem podemos dizer, o milagre do azulejo português”
quebrar o sabor rococó do conjunto que O Convento de São Francisco foi um dos
esteticamente se situa no final do século XVIII. depositários de tais elementos, possuindo dois
conjuntos de exemplares da família classificada
como Palmeta ou Massaroca, datados de
meados para segunda metade do século XVII. O
padrão tapete aparece na Capela do Capítulo
(Foto 8.13), em padrão com escamas com pontos
nas cores amarela e azul em fundo branco, e
também na escada (Foto 8.14), na qual aparece
apenas a variedade com pontos, porém com as
mesmas cores da capela.
8.3. A azulejaria
Na enumeração dos aspectos artísticos do
Conjunto Franciscano de Olinda, merece
destaque o conjunto azulejar. Juntamente com a
pintura e especialmente com a talha, o azulejo
significou uma particularidade expressiva do
barroco luso-brasileiro, adquirindo
Foto 8.13: Azulejos padrão tapete capela do Capítulo
personalidade própria a partir do século XVII,
– séc. XVII
quando o Brasil já recebia azulejos de Portugal.
Esses elementos começavam então a se tornar O século XVIII foi marcado na azulejaria pela
comuns na arquitetura, ajudando a proteger e utilização dos padrões em azul obtido com o
embelezar os ambientes, como afirma Santos óxido de cobalto em fundo branco, e pelo início
Simões em sua obra “Azulejaria em Portugal no do enquadramento de cenas, adquirindo
Século XVII”. personalidade e monumentalidade.
48
emoldurada com a mesma barra de acantos, na
qual uma solitária figura pesca em baixo de uma
árvore. Pode-se situar esse conjunto ainda na
primeira metade do século XVIII.
49
como do período D. João V, isto é, primeira
metade do século XVIII.
50
Foto 8.18: Painel do claustro - São Francisco pregando Foto 8.19: Painel da série cenas da Vida de São
para os peixes - séc. XVIII Francisco
A ornamentação movimenta-se ainda mais com
a adição de jarrões nos cantos que emolduram
as laterais das cenas. Aparecem então as
rocalhas, mescladas com os mesmos motivos
barrocos que situam a produção desses
exemplares, também em meados do século
XVIII. A exposição ao ambiente e a passagem de
veículos pesados na Rua de São Francisco vem
causando um sério problema de
desprendimento e desagregação a esses painéis.
Finalmente, destaca-se o conjunto da Capela de Foto 8.20: Painel da série Vida de Santa Ana, Capela
Santana, no qual se observa uma maior de Santa Ana 2ª metade do XVIII.
apreensão do vocabulário rococó na composição A partir dessa breve exposição, pode-se
moldurar que ainda guarda referências constatar que o Convento de São Francisco de
barrocas. A perspectiva é primorosa, dando Olinda possui um conjunto azulejar cuja datação
realmente efeito de profundidade não só nas se estende desde os padrões em tapete do século
cenas que representam raras passagens da vida XVII, passando por motivos galantes e religiosos
de Santa Ana e Nossa Senhora, como também do princípio do século XVIII e voluptuosas
do emolduramento arquitetônico que as separa, barras recortadas de meados do século XVII
caracterizando já um caminho estético para a para a segunda metade do século XVIII,
segunda metade do século XVIII (Foto 8.20). constituindo uma verdadeira aula de arte
azulejar barroca em um conjunto que representa
como poucos o Barroco no Brasil, em todos os
seus aspectos artísticos.
51
9
O estudo dos conventos e da obra franciscana com a ação direta ou supervisão do IPHAN,
no Brasil carece de uma bibliografia mais foram voltadas para a conservação e
completa. Em relação aos jesuítas, que tiveram restauração.
em seus quadros historiadores de renome
registrando minuciosamente a obra dessa
10.1. Primeira fase: a chegada dos
ordem no Brasil, os franciscanos foram menos
favorecidos. As obras básicas de consulta
franciscanos e a ocupação inicial
consistem nos primeiros registros feitos pelo Os franciscanos desembarcaram em Olinda no
Frei Manuel da Ilha, na obra do Frade Antônio dia 12 de abril de 1585. Depois de mais de três
de Santa Maria Jaboatão (1858-62), e nas meses de viagem por mar, hospedaram-se na
pesquisas mais recentes empreendidas pelo residência de um nobre, Felipe Cavalcanti, no
Frei Venâncio Willeke (1979). O Novo Orbe alto da Sé, onde logo levantaram um oratório e
Seráfico Brasileiro de Jaboatão, publicado começaram a prestar socorro espiritual aos
originalmente em Lisboa em 1761 e reimpresso enfermos do Hospital da Misericórdia. D.
entre 1858 e 1862, continua sendo a principal Maria da Rosa, viúva e terciária franciscana, já
obra de referência. tinha construído uma capela em um
Na história do convento, podem ser recolhimento para órfãs e terciárias no local
identificadas algumas fases relativas à sua que o convento ocupa hoje, na esperança de
construção. A primeira corresponde às obter uma fundação de Frades Menores.
construções iniciais, entre a chegada dos Chegando os franciscanos em Olinda, ela
franciscanos em 1585 e o abandono do ofereceu à pessoa de Frei Melchior aquele
convento por ocasião da invasão holandesa em recolhimento e igreja para a instalação dos
1630. A segunda fase inicia-se com a religiosos. Em 4 de outubro de 1585, com
reconstrução empreendida a partir de 1654, ano grande festa, ocuparam os franciscanos o seu
da expulsão dos holandeses, e estende-se definitivo convento, sob a denominação de
durante todo o século XVIII, quando o Nossa Senhora das Neves (Willeke, 1979: 41,
convento atinge sua forma atual. Uma terceira Jaboatão, 1858-62: 145).
fase acontece após as restrições das ordens O terreno doado situava-se à margem de uma
religiosas impostas no final do período ladeira, que ligava o alto da Matriz até o futuro
colonial, as quais levaram a um lento processo convento carmelita, passando próximo ao Real
de declínio do convento. A quarta fase foi Colégio dos Jesuítas. O terreno limitava-se ao
inaugurada em 1937, com a criação do Serviço sul com uma olaria, e a leste, junto ao mar, com
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional um outro caminho que, acompanhando a praia,
(SPHAN, hoje IPHAN) e o tombamento onde também se situava um fortim construído
nacional do convento no ano seguinte, quando de paliçada, parte integrante do sistema de
ocorreu o reconhecimento oficial do valor defesa da vila.
histórico e artístico do convento, e as ações,
53
O terreno detinha um forte declive para o estas casas se concluíram com brevidade, e
litoral e isso iria determinar a lógica de perfeição, com esmola dos devotos e agência
crescimento do convento mediante ampliações do prelado " (Jaboatão, 1858-62: 148).
que, na maioria das vezes, tiveram de recorrer A capela original, construída por ordem de D.
a aterros e à construção de muros de arrimo. A Maria Rosa, provavelmente correspondia à
implantação do convento franciscano seguiu a atual capela-mor.
lógica de implantação das primeiras cidades Em 1590, essas primeiras obras estavam
brasileiras. Procurando obedecer a certos concluídas e, na gestão do custódio Frei
requisitos (proximidade de um porto, Leandro de Jesus (1606-1609), foram bastante
facilidade de defesa, disponibilidade de fontes aumentadas, segundo Frei Jaboatão. Pereira da
de água potável), Olinda, assim como outras Costa, citando o cronista franciscano,
cidades brasileiras, foi criada em uma área de acrescenta que tais obras resultaram em “um
montes próxima ao mar e a um porto natural, edifício de grandiosa e bela fábrica, como os
nesse caso, o do Recife. As principais ordens próprios invasores holandeses o referem”
religiosas, incluindo os Franciscanos, (Pereira da Costa, 1983: 546). Entre 1588 e 1590,
instalaram-se na periferia desses pequenos chegaram mais dezoito religiosos vindos de
organismos urbanos. As igrejas e os conventos Portugal e, em 1596, os frades abriram um
construídos por essas ordens passaram a curso de estudo superior no Convento. De 1606
organizar a estrutura urbana. Por trás de seus a 1609, foram executadas novas ampliações,
conventos e igrejas, desenvolviam-se jardins e aumentando as habitações e estendendo os
áreas de cultivo que se estendiam pelas áreas edifícios. Em 1624, foi construída uma cisterna
periféricas, marcando os limites da cidade. devido à falta d’água.
As construções recebidas pelos frades As obras de ampliação da casa primitiva
franciscanos não satisfaziam ao crescimento da duraram, portanto, de 1586 até 1630, quando
ordem e logo foram iniciadas as ampliações. Pernambuco foi tomado pelos holandeses. É
Logo após a mudança, Frei Francisco dos difícil precisar exatamente o que estava
Santos foi nomeado guardião e prelado da construído, mas uma análise dos mapas e
casa. Descrito como um "sujeito de prudência, gravuras produzidos na época da invasão
zelo e atividade para obras”, esse frade holandesa pode fornecer importantes
“ordenou a formalidade material da casa" indicações.
(Jaboatão, 1858-62: 147), ou seja, iniciou as
primeiras obras de ampliação das construções
doadas. Essas novas construções consistiram
em dois cômodos, próximos à capela inicial,
um para abrigar os noviços e outro para abrigar
os filhos de índios convertidos:
“porque era forçoso receber a ordem alguns
noviços,... e não havia domicílio particular para
este efeito. Também se devia fabricar na cerca
uma casa suficiente, na qual se criassem dentro
os filhos dos índios, convertidos, como em
Seminário, para que, bem instruídos..., fossem
depois pregadores de seus naturais;... e ambas
54
Figura 9.1: Gravura “Marin d’Olinda”
55
A torre da igreja parece estar localizada
lateralmente no lado norte, alinhada com a
fachada. A cerca aparece como uma paliçada,
contornando o conjunto conventual e descendo
até próximo à praia. Diante da igreja, do lado
de fora da cerca, um cruzeiro aparece bem
definido.
56
Sa. das Neves, aparecem em tamanho similar, maiores, pode indicar datas para partes da
o que leva a concluir que o convento não era construção.
tão pequeno quanto se tem dito, mas sim que Em relação ao claustro, existe uma pedra
deveria ter um caráter mais horizontal, tumular de 1686, o que induz a considerar essa
esparramando-se sobre o terreno.3 parte da construção como já existente. Por
A análise desses mapas e ilustrações permite outro lado, conforme observou Bazin, o estilo
algumas conclusões sobre a configuração das colunas indica o primeiro quartel do século
inicial do convento. Durante a ocupação XVIII. Pode-se aventar a hipótese de que,
holandesa, o corpo da igreja estava definido, quando os holandeses desembarcaram em
embora ainda sem a galilé, sem a sacristia e Olinda, parte da quadra encontrava-se
sem os elementos decorativos. Não há definida, mas o claustro ainda não estava
indicação da existência de uma galilé ou terminado. Desse modo, parte das construções
alpendre, como era comum em conventos que rodeiam o claustro, como salientou Bazin,
franciscanos. Da nave da igreja saiam são anteriores a 1630. Devido ao fato de esses
perpendicularmente os primeiros blocos conventos terem sido construídos em etapas, os
utilizados pelos franciscanos, blocos que autores dos riscos tinham de prever e construir
viriam a conformar o claustro posteriormente. gradativamente. Há registros de que os painéis
As ilustrações provam que a quadra do de azulejos do claustro, a última intervenção
claustro não estava fechada ainda. No entanto, para finalizá-lo, foram aplicados entre os anos
os mapas acima mostrados já apresentam um de 1734 e 1745 (Mueller, 1961: 35).
volume como se estivesse fechado, mas eles Para reforçar o argumento, ressalte-se que no
não especificam o claustro, como parece estar corpo da quadra, que sai na lateral da capela-
representado no colégio jesuíta ao lado. O fato mor, existe uma escada de acesso aos
de ter sido edificada uma nova portaria em dormitórios, toda revestida de azulejos, com o
1754 e destruídas as obras anteriores, torna mesmo padrão seiscentista da Capela do
difícil qualquer conclusão definitiva. Capítulo, o que coopera para definir esse corpo
da construção como anterior a 1700. As obras
de reconstrução do convento devem ter
10.2. Segunda fase: a reconstrução
continuado por todo o século XVII, e a
após a expulsão dos holandeses construção da quadra deve ter continuado até a
O conjunto franciscano, como outros lateral da igreja, na altura do coro. Jaboatão
monumentos de Olinda, foi alvo de destruição afirma que a quadra, na parte voltada para a
pelos holandeses, seja pelo incêndio ladeira, ainda era antiga quando da construção
provocado em 1631, seja pela retirada de da nova portaria, entre 1753 e 1754.
material de construção, em 1637, necessário A fachada da igreja foi construída em etapas. A
para as obras de ampliação do Recife. Em 1654, galilé, ou o nártex reentrante, avançando sobre
logo após os holandeses assinarem a a rua, já foi uma adição à primitiva fachada. A
capitulação, os frades reocuparam o Convento galilé era inicialmente saliente ao corpo da
de Olinda, então bastante arruinado. A igreja e aberta para os lados, uma situação
reconstrução começou imediatamente. Deve ter habitual nas construções franciscanas. A parte
aproveitado parte das paredes não destruídas e superior dessa fachada teria uma solução mais
ampliou o edifício. Não há, em termos de sóbria, com o seu coroamento em frontão
documentos, meios de esclarecer a forma exata triangular e clássico. Com as obras de
como ocorreu essa reconstrução. No entanto, a reconstrução iniciadas em meados do século
análise do edifício, mesmo sem prospecções XVIII, ela adquiriu a feição atual, incorporada
ao corpo da igreja, com três grandes portas em
57
arco. Uma cruz de pedra, encostada a uma das ainda ver, resta um pequeno trecho de parede,
arcadas da galilé, acusa a data de 1700, mas o entre o bloco da portaria e a igreja, na altura da
término da fachada parece ser posterior a essa galilé. A sua única porta de acesso ao exterior
data. A parte superior da fachada, com seus era emoldurada por um pequeno alpendre,
elementos decorativos mais efusivos, deve ter muito comum nas casas religiosas franciscanas
sido definida nessa etapa de obras, na segunda e mais ainda em uma região de clima tropical.
metade do século XVIII. Esse alpendre foi perdido, provavelmente na
Já em relação ao seu interior, Jaboatão afirma segunda metade do século XIX. A Capela da
que a igreja, teve a sua capela-mor reedificada Portaria tem ao redor belos painéis de azulejo
em torno de 1714 ou 1715, datas possíveis, que foram assentados também em meados do
desde que se pode datar a execução do atual século XVIII.
forro, em artezoados, e a aplicação dos painéis Em 1711, os Terceiros Franciscanos de Olinda
de azulejos, em torno de 1745 (Jaboatão, 1858- começam a construção de sua capela, situada
62: 407-08). A igreja foi gradativamente de forma perpendicular em relação à igreja da
recebendo elementos decorativos ao gosto de Ordem Primeira. Essa forma de relacionar os
cada momento. Os dois altares colaterais ao dois ambientes de culto foi uma característica
arco cruzeiro e o da capela-mor, por exemplo, peculiar aos conventos franciscanos do
mostram influências do gosto rococó do final Nordeste (Bazin, 1983: 144). A capela dos
do século XVIII (Menezes, s/d: 22). Terceiros de Olinda abre-se para a nave da
As obras da atual sacristia também pertencem Igreja de Nossa Senhora das Neves por meio
à fase iniciada em 1654. Os elementos de um grande arco. Tal arco foi revestido com
construtivos e arquitetônicos mostram que a uma bela obra de talha, de linguagem e
construção teve sua conclusão por volta de execução eruditas da época de D. João V.
1660. Germain Bazin (1983: 129), na A capela certamente deveria ter sido toda
comparação que fez entre as arcadas da galilé revestida de madeira entalhada, como a Capela
do convento de Ipojuca e as arcadas existentes Dourada, mas não foi concluída. Bazin acredita
nas edículas dessa sacristia, concluiu que que o revestimento de talha arco da capela-mor
foram produzidas na mesma oficina, por volta é uma dos mais antigos no estilo, enquanto o
de 1660. No entanto, a sacristia somente foi dos dois retábulos colaterais é posterior, já do
decorada no século seguinte, visto que final do século XVIII (Bazin, 1983: 128-29). A
azulejos, pinturas e talhas representam o gosto sacristia dos Terceiros, ao lado da capela, foi
de meados do século XVIII. decorada com pinturas que remetem ao último
O edifício da portaria, contendo a Capela da quartel do século XVIII. Em um período
Portaria ou Capela de Santa Ana, e as duas posterior, os Terceiros também construíram,
bibliotecas, foi construído entre os anos 1753 e paralelamente à igreja da Ordem Primeira,
1754, como revela a data inscrita na fachada. uma Casa da Oração, hoje oculta pela
Tem uma grande unidade construtiva e construção de um Consistório que avança em
decorativa, já que foi construído em uma só direção à galilé.
empreitada. Tal unidade, aliada ao seu Como foi visto acima, o claustro recebeu um
formato cúbico, permite distingui-la revestimento azulejar entre os anos de 1734-45.
claramente do resto da construção. O edifício Pressupõe-se que, logo após, os frades
foi engastado na antiga quadra do primeiro tivessem ampliado aquela antiga quadra
convento. Para se construir a portaria, foi conventual com um novo bloco em direção ao
destruída a parede exterior daquela ala do sul, por meio de aterros e muros de arrimo para
convento, permanecendo a que define o conformá-la à declividade da ladeira. O atual
claustro. Dessa ala antiga, conforme se pode bloco conventual pode ser datado como da
58
segunda metade do século XVIII. Do lado do tinha acesso direto para a rua. Ele ruiu em 1951,
mar, junto a esse corpo, foi construída uma devido à movimentação do terreno. No
grande cisterna, com magníficas abóbadas de entanto, as obras empreendidas pelos frades
tijolos. Por cima dessas abóbadas foi criado o alemães foram reparadoras, objetivando
terraço ainda existente na sua forma primitiva. apenas manter o edifício em funcionamento.
A construção da cisterna foi citada por As condições ainda não eram das melhores. Em
Jaboatão, que escreveu sua obra no final da 1950, foi iniciada a construção erguida
década de 1750. paralelamente ao Salão Pio X, que é a atual
Portanto, pode-se concluir que após esse ciclo lavanderia e, nos anos 1960, foram construídas
de obras de meados do século XVIII, com os as baterias de banheiros presentes no andar
trabalhos de decoração efetuados até o final das celas (Livro de Crônicas: 229-230).
daquela centúria, o convento encontrou, em
linhas gerais, a sua forma definitiva.
10.4. Quarta fase: conservação e
restauro após o tombamento
10.3. Terceira fase: declínio e
Em 1937, foi criado o Serviço do Patrimônio
estabilização no século XIX
Histórico e Artístico Nacional e o Conjunto
Em 1855, o Império Brasileiro proibiu a Franciscano de Olinda foi um dos primeiros a
admissão de noviços nas casas religiosas ser tombado, em julho do ano seguinte. 4 Esse
conventuais, fato que atingiu duramente os fato demarcou uma nova fase na história do
franciscanos, levando à decadência do conjunto, pois, a partir dessa data, houve o
convento. Essa decadência atingiu seu ápice no reconhecimento oficial de seu valor histórico e
final do século XIX, e, quando da morte do artístico, a ação do governo federal, e a
último frade, em 1885, o convento foi intencionalidade da conservação e restauração
abandonado. Sua famosa biblioteca, por da edificação.
exemplo, foi integrada à Biblioteca Pública do No entanto, tendo em vista o grande número
Estado. Algumas partes do convento chegaram de bens que necessitavam de obras de
a ser perdidas, como o alpendre que delimitava conservação e a escassez de recursos, não
a entrada da portaria. foram de imediato efetuadas obras no
A República reconheceu a liberdade de culto e conjunto, apesar de esse apresentar uma das
permitiu a vinda de religiosos estrangeiros. piores condições em relação aos
Dessa forma, frades alemães da Província estabelecimentos religiosos de Olinda.
Saxônica da Santa Cruz, da Alemanha De acordo com a documentação encontrada no
começaram a chegar em 1894 e assumiram os atual IPHAN e as Crônicas do Convento, em
conventos que estavam em grande parte 1945, o guardião do convento solicitou ao
abandonados e danificados (Mueller, 195: 140- IPHAN recursos para obras de conservação.
1). No caso do convento de Olinda, os frades, Por meio da ação desse dirigente e de uma
ao assumirem em 1901, fizeram reparos e campanha nos jornais, foram obtidos recursos
alterações internas, como a cozinha hoje para as obras de conservação no ano seguinte.
existente no antigo pátio do bloco conventual e
as celas individuais criadas por meio de
divisórias onde existiam dormitórios coletivos.
Provavelmente nos anos 1920, o convento foi
ampliado com a construção do salão Pio X. Esse
salão localizava-se na faixa lindeira da Rua de
São Francisco, continuando o bloco coventual e
59
queriam os frades, e exigiu que se construísse
um muro lindeiro à rua no lugar do salão. O
desabamento desse salão, apesar de não ser ele
uma construção significativa se comparada aos
outros blocos do convento, serviu como um
bom instrumento de propaganda devido à
repercussão que teve na imprensa. Nesse
período, por sinal, a imprensa ocupou-se
diversas vezes da preservação do convento,
Foto 9.1: Renovação do telhado com reportagens que abordavam o risco de
As obras tiveram início imediatamente, perda dos painéis de azulejo e as rachaduras
visando à conservação das partes mais críticas existentes na sacristia. 6 A repercussão na
do convento. Essas obras incluíram a imprensa certamente contribuiu para que
renovação de estruturas de parte dos telhados fossem liberadas verbas ainda no mesmo ano.
(Figura 9.1), a renovação dos rebocos, e a Essas verbas foram conseguidas pelo guardião
pintura e consertos de esquadrias. Apesar de o do convento, Frei Martim, diretamente com a
primeiro ciclo de obras ter sido concluído em Presidência da República.7 Também nesse
1949, é importante salientar que um edifício de mesmo ano foi feito um levantamento
tal magnitude sempre requisita novas obras à preliminar do convento. 8
medida que os pontos mais críticos passam a
ser sanados. De fato, mal terminavam as obras
em uma parte do monumento, outra começava
a necessitar de reparos. Deve-se ressaltar que,
nesse primeiro ciclo de obras, não foi feita
nenhuma documentação completa dos
trabalhos, sobretudo no que se refere aos
muros sem os rebocos, o que impossibilitou
um conhecimento mais adequado das diversas
fases do restauro do conjunto.
Portanto, após as obras emergenciais, o
conjunto adentrou em um período de obras
contínuas que se estendeu por cerca de quase
vinte anos, embora com uma série de
interrupções, como a documentação disponível Foto 9.2: Restauro de talhas
no atual IPHAN e as crônicas do convento o No final de 1952, registra-se que os trabalhos
atestam. As obras de vulto estendem-se desde andavam de forma muito lenta, mas o telhado
1950 até o final da década de 1960, sendo os fora todo refeito (Livro de Crônicas: 239). Em
trabalhos retomados apenas na década de 1980, abril de 1953, um oficio do novo guardião, Frei
com a grande recuperação da sacristia e, bem Bonifácio Mueller, atesta que as obras se
mais recentemente, entre 1998 e 2005, um novo encontravam paradas por falta de verba e pedia
ciclo de obras com recursos captados pelo a continuidade delas junto ao IPHAN. As
próprio convento. obras foram retomadas em 1953.9 O período de
Em junho 1951, ocorre o desabamento do salão 1953 a 1956 foi dos mais profícuos em termos
Pio X, uma construção lindeira à Rua de São de obras, incluindo a restauração de boa parte
Francisco e anexa ao bloco conventual.5 O de seus bens artísticos, como talhas e azulejos
IPHAN proibiu sua reconstrução como (Foto 9.2).
60
A restauração dos ornamentos da Capela da
Ordem Terceira foi iniciada com a recuperação
do forro em artezoados, um trabalho inovador,
visto que se aproveitou a estrutura existente,
restaurando-a em seus apoios, nivelando-a e
prendendo-a com perfis de metal.
Também foram recuperadas as talhas da
capela, contra o ataque de cupins. A técnica
utilizada foi a de mergulhar as partes
estragadas na cera de abelhas, que preencheria
as perfurações. As pinturas foram limpadas,
delas retirando-se os vernizes oxidados, e
repostos outros. A Capela dos Terceiros
possuía um coro alto, situado na sua entrada,
semelhante ao existente na Capela dos Foto 9.3: Azulejos danificados na sacristia
Terceiros do Recife. Esse coro interceptava o Em 1956, a cobertura está em grande parte
arco entalhado. O IPHAN decidiu retirar tal renovada, incluindo também a do bloco
elemento de arquitetura e restabeleceu as duas conventual, e prosseguiam as obras de
tribunas que foram danificadas quando da sua recuperação do telhado da sacristia. Saliente-se
execução. Trabalhos de conservação também que, nessa intervenção na cobertura, foi
foram realizados na Capela do Capítulo, no mantido o sistema estrutural primitivo, isto é,
claustro e na nave, que tiveram suas talhas e caibro armado, distanciado aproximadamente
pinturas restauradas. Em junho de 1954, os 50 cm de eixo a eixo (Livro de Crônicas: 259). 10
frades registraram elogios em relação à atuação Os trabalhos que prosseguiam referiam-se aos
do IPHAN, pela sensação de “clareamento” da assoalhos do coro da igreja e do claustro. As
igreja, quando foram retirados os andaimes. traves de sustentação do coro encontravam-se
Os azulejos, atacados pela salinidade, estavam carcomidas e foram todas trocadas.
muito danificados nas partes próximas ao nível No entanto, em abril de 1957, as obras estavam
do piso (Foto 9.3). Na Capela da Portaria e no novamente paralisadas. Somente em 1961
claustro os azulejos foram refixados. Os vazios foram terminados os trabalhos de renovação
de peças que faltavam foram preenchidos com do travejamento de sustentação do coro da
massa, para evitar que pudessem ser retirados igreja. O forro de caixotões foi escorado e
por furto (Livro de Crônicas: 251, 258). removidos o cadeiral e o assoalho. Foram,
Em novembro de 1955, o IPHAN retomou os também, aplicados cachorros de cantoneira de
trabalhos no convento com a reforma do ferro com abraçadeiras nos apoios das traves,
telhado e do madeiramento do andar superior, substituído o barroteamento estragado
a qual terminou por substituir quase todas as empregando-se madeira de lei com dimensões
traves, assim como boa parte das telhas. idênticas. Posteriormente, foi reassentado do
assoalho, com a substituição das tábuas
estragadas, e refixado o forro de caixotões.11
Em 1957, a calçada que passava debaixo das
janelas do antigo refeitório, atual auditório, foi
refeita, assim como foi criado um novo acesso
do terraço para a área da lavanderia abaixo do
terraço (Livro de Crônicas: 268). Entre agosto e
dezembro de 1967, foi executa uma série de
61
serviços com recursos provenientes da Foto 9.4: Rachaduras na Sacristia
Adveniat, uma instituição da Igreja Católica. Anos passaram sem uma solução devido à
Tais obras prolongaram-se até o ano seguinte e magnitude dos recursos a serem empregados,
incluíram diversas reparos de esquadrias, O problema foi sanado apenas entre 1983 e
compra de mobiliário, pintura externa e 1984, quando foram efetuados grandes
interna, além da construção da bateria de trabalhos de recuperação (Foto 9.5). Foram
banheiros existentes no primeiro e segundo feitos trabalhos de consolidação de fundações,
pavimentos das celas, e de uma nova caixa na qual que se aplicaram estacas profundas,
d’água, que proveram as celas de água tirantes inclinados e cintas de concreto armado,
encanada. além da construção de um piso de concreto
Desde 1950, já era notado que um problema igual à área da sacristia e que a suporta
sério estava afetando a sacristia.12 O Livro de inteiramente.
Crônicas do Convento relatou esse problema
em 1951, 1956 e 1967 (Livro de Crônicas: 235,
259, 289). As grandes rachaduras nas paredes
laterais e o forte desnivelamento do piso da
sacristia anunciavam o risco de colapso (Foto
9.4). Esse risco era causado pelo movimento
resultante dos deslizamentos dos morros, como
também foi observado na Igreja do Carmo e no
Mosteiro de São Bento. O mesmo problema
causou o desabamento do Salão Pio X do
próprio convento, em 1951, como foi visto. A
recém-construída lavanderia também já
apresentava problemas dessa natureza em
1957, alguns anos depois de ser construída,
além de parte do muro do terreno ter ruído
nesse mesmo ano (Livro de Crônicas: 268).
62
da sacristia. As pinturas do forro em caixotões por provocar danos ao piso anterior e à
foram também restauradas, removendo-se o estrutura do Conjunto devido à fragilidade do
verniz oxidado e repondo nova proteção. terreno onde foi realizado.
Após as obras da sacristia, passaram-se alguns Em 2004, o IPHAN, mediante de uma verba
anos sem obras importantes até que, no final emergencial, refez toda a instalação elétrica do
dos anos 1990, foi inaugurado um novo ciclo. convento, a qual estava em estado precário e
oferecia sérios riscos de incêndio ao Conjunto.
Apesar de ter resolvido um problema sério do
Convento, o sistema de iluminação colocado na
nave da igreja e na biblioteca do térreo
revelou-se bastante infeliz em relação aos
trabalhos no forro.
63
Em 2005, com recursos do Ministério da Justiça desse importante elemento para a arquitetura
foram trocadas todas as telhas da coberta do Conjunto Franciscano.
(Fotos 9.10 e 9.11), parte do madeiramento e
introduzidas mantas durafoil para evitar o
aparecimento de goteiras (Foto 9.12).
64
Quadro 1: Cronologia das ações de restauro e conservação realizadas após 1945
1945-46: Renovação de estruturas de parte dos telhados, renovação dos rebocos, pintura e consertos
de esquadrias.
1953: Restauração dos ornamentos da Capela da Ordem Terceira, recuperação do forro em
artezoados, recuperadas as talhas da capela contra o ataque de cupins. As pinturas foram limpadas,
delas se retirando os vernizes oxidados, e repostos outros. Trabalhos de conservação realizados na
Capela do Capítulo, no claustro e na nave. As talhas foram restauradas e a pinturas limpadas.
1954: Os azulejos, atacados pela salinidade, estavam muito danificados nas partes próximas ao
nível do piso. Na Capela da Portaria e no claustro, os azulejos foram refixados. Os vazios de peças
que faltavam, foram preenchidos com massa, para evitar que pudessem ser retirados por furto.
1955: Reforma do telhado e madeiramento do andar superior, a qual substituiu quase todas as
traves
1956-57: A cobertura foi em grande parte renovada, incluindo também a do bloco conventual.
Prosseguiam as obras de recuperação do telhado da sacristia. Obras nos assoalhos do coro da igreja
e do claustro. As traves de sustentação do coro encontravam-se carcomidas e foram todas trocadas.
1967: Reparos de esquadrias, compra de mobiliário, pintura externa e interna, construção da bateria
de banheiros existentes no primeiro e segundo pavimentos das celas, e uma nova caixa d’água que
proveu as celas de água encanada.
1983-84: Consolidação das fundações da sacristia com micro-estacas, tirantes e cintas de concreto
armado. Os painéis de azulejos da sacristia foram desmontados e refixados. Caiação das paredes e
pintura a óleo nas portas da sacristia. Restauradas as pinturas do forro em caixotões dos quais se
removeu o verniz oxidado e se repôs nova proteção.
1998: Troca do madeiramento do piso do bloco conventual por madeira de lei, trazida do Pará.
2004: Refez-se (com exceção dos ambientes da Ordem Terceira), a instalação elétrica do convento
que estava em estado precário, oferecendo sério risco de incêndio.
2005: Nova ação no madeiramento dos telhados com a introdução de mantas DURAFOIL que
evitam a propagação do fogo
65
Notas
decorrente do escorregamento dos morros
1 Laet, Joannes de, História ou Annais dos terciários de Olinda (ainda sem solução).
Feitos SPHAN Ofício nº 136.75.D, de 30/06/1975
afirma que deve ser prevista a reestabilização
Notas da sacristia, com um estudo de drenagem de
1 Laet, Joannes de, História ou Annais dos água pluviais, projetando um novo sistema de
Feitos da Companhia Privilegiada das Indias esgoto.
Ocidentaes, Tradução e notas dos Drs. José 13 SPHAN: Documento 55 Informação n.º
Hygino Duarte Pereira e Pedro Souto Maior, 23/AMC/84 – informa sobre a conclusão das
Rio de Janeiro, 1916/1925, p.232-233 obras da sacristia da Igreja
2 Pintura titulada Olinda, nº 74 do Catálogo de
Joaquim de Sousa Leão. Sousa Leão, Joaquim,
Frans Post-1612/1680, Rio de Janeiro: Livraria
Kosmos Editora, 1973.
3 O mapa que deve ter dado origem a gravura
nº 9, do livro de Barlaeus, é titulado " Civitas
Olinda", e é de autoria de Georg Marggravius,
executado entre 1637 e 1644.
4 Monumento Nacional, conforme Processo nº
143-T, Inscrição nº 189, Livro de Belas Artes, fl.
33, datado de 22. 07. 1938.
5 SPHAN, Documento 45 de 06/06/1951. Livro
de Crônicas, p.238
6 “Noticia de Olinda: ainda sobre a
preservação de nossas preciosidades
históricas”, Jornal Do Commercio, junho, 1950.
Barbosa Lima Sobrinho “Patrimônio Histórico
em Perigo” Jornal do Commercio 02-10-1951
7 SPHAN, Ofício 19/51. Informa que a verba
para obras no convento foi liberada.
8 SPHAN, Ofício 214/51. Apresenta o arquiteto
Gerson Barreto de Loretto, que deverá e
encarregar dos serviços de levantamento do
convento para o fim especial de confecção de
atual plano de obras a executar em benefício
do monumento.
9 SPHAN, Documento 50 de 19-11-1953.
10 SPHAN, Ofício 016/56.
11 SPHAN, Documento 1206-11-1961 Obras no
soalho de madeira
12 SPHAN, Ofício 086 74P de 16/09/1974.
Ayrton Carvalho, Chefe 1º Distrito IPHAN,
reduz o tom de alerta da imprensa e e esclarece
ao Diretor Geral do SPHAN, Renato de
Azevedo Duarte Soeiro, que o problema é
67
10
AS PATOLOGIAS E OS DANOS
Neste capítulo são analisados o estado de Essas obras tiveram como orientação geral o
conservação físico-ambiental do Conjunto; os uso de técnicas e materiais contemporâneos,
principais danos e patologias, procurando algumas vezes de forma radical (e talvez
identificar suas causas; as intervenções necessária), como foi o caso das obras
reparadoras mais significativas realizadas a empreendidas na sacristia, onde predominou o
partir de meados do século passado; o sistema uso do concreto armado.
atual de monitoramento e controle da
Os materiais e técnicas construtivas
decadência dos materiais e sistemas
tradicionais foram geralmente desprezados,
construtivos.
sendo evidente a perda de autenticidade nas
ações em que foram inseridos. Foi comum a
10.1. Estado de conservação atual prática da reposição de rebocos com o uso do
cimento tipo Portland em todos os tipos de
A identificação dos principais danos por
argamassa, o uso de tintas, vernizes e esmaltes
componentes construtivos foi realizada com a
sintéticos. Como conseqüência, algumas das
elaboração de um mapeamento geral do
patologias atuais são decorrentes justamente
Conjunto, ambiente por ambiente. Esse
das diferenças entre os materiais novos e os
procedimento resultou numa visão qualitativa
antigos.
dos danos e patologias. Para uma melhor
compreensão espacial desses danos, deve-se
recorrer às plantas baixas, com a indicação de
sua incidência por ambiente numerado.
69
refere aos ambientes e estruturas afetadas (ver
Anexo 3: Mapa de Danos – Alvenaria), há uma
concentração quase absoluta desses danos,
sugerindo uma origem ou fenômeno único.
Deve-se observar que justamente tal
concentração é um indicativo de seu índice de
gravidade.
70
zona entre a nave da igreja do convento e a
sacristia.
10.2.2. Azulejos
Fig 10.3 Manchas de umidade (Ambiente 17–
pavimento térreo) O conjunto azulejar do Conjunto Franciscano
foi submetido, ao longo dos 61 anos de
conservação e restauro sob a tutela do IPHAN,
a duas intervenções: a primeira (1954) deu-se
nos painéis da Capela da Santa Ana (portaria)
e no claustro, por se encontrarem em áreas de
maior circulação e mais expostos às
intempéries. A segunda (1983/84) ocorreu
durante os trabalhos de consolidação de
fundações da sacristia, quando todos os
painéis foram desmontados, classificados e
refixados. Os vazios de peças faltantes foram
Fig. 10.4 Rachaduras (Ambiente 32, pavimento
térreo) preenchidos com massa a fim de se evitar ser
retirados por furto.
Esses danos estão provavelmente relacionados
tanto com a situação geológica onde se fundou Os principais ambientes identificados com
o Conjunto quanto com as grandes obras de danos nos azulejos estão listados no Quadro
consolidação empreendidas entre 1983 e 1984 10.2.
pelo IPHAN, visando à consolidação estrutural
O estado atual de conservação dos azulejos do
da sacristia.
claustro não é satisfatório (sofrível), indicando
Encontram-se no local, antigos marcos que as causas dos antigos danos não foram
(testemunhas) fixados entres as rachaduras resolvidas. Notam-se descolamentos e um
para medição instrumental das alterações. número razoável de perda de vidrado próximo
Nota-se que as patologias da década de 1980 às juntas.
encontram-se sanadas, ou seja, as rachaduras
atualmente visíveis na área do convento são
novas e estão justamente localizadas numa
71
Quadro 10.2: Tipos de patologias em azulejos
descolamento do tardoz (biscoito) 23,26 não há danos intensos não há danos intensos
Uma hipótese é que tais danos podem estar desses agentes depende da resistência do
associados não apenas às patologias comuns azulejo, variando de acordo com a composição
em áreas próximas do mar (processo de da matéria-prima utilizada na sua fabricação.
salinização), mas a outros fatores, como a ação
de agentes mecânicos sobre as alvenarias que
servem de suporte aos azulejos. Além disso,
não há atualmente no conjunto azulejar
qualquer tipo de monitoramento ou
manutenção.
72
claustro, são os mais atingidos por esse fator, já - sais solúveis cristalizam-se a partir da
que ficam expostos diariamente a diferentes evaporação da água causando eflorescência e
temperaturas, o que ocasiona retrações e desagregação da superfície.
expansões nas peças.
10.2.3. Cantaria
Os agentes internos são os seguintes:
Os danos mais comuns levantados na cantaria
- Os sais existentes nos azulejos (geralmente
foram:
cloretos, sulfatos e nitritos).
Alteração cromática, uma alteração superficial
Podem ser provenientes da argamassa de
de múltiplas origens que pode modificar a cor
assentamento, da alvenaria, do solo, da
da pedra;
atmosfera, de material orgânico, ou mesmo de
argamassas de cimento utilizadas em Costa negra, que tem como causa depósito de
intervenções anteriores, as quais podem conter impurezas ambientais formando grossa
sulfato de cálcio e alguns outros sais alcalinos, camada escura que reage com a pedra, levando
formados quando a argila ou o combustível à sua degradação;
usado no processo de queima contém sódio ou Perdas, formação de uma lacuna na cantaria
potássio. Pode-se afirmar que a cristalização de por perda de material lapídeo;
nitrato e sulfato é mais danosa do que a do
Fissuras, resultantes de tensões mecânicas na
cloreto à porosidade do azulejo, assim como de
estrutura;
qualquer outro material de construção, em
função da forma geométrica que adquire Degradação diferenciada, resultante da
quando cristalizado. heterogeneidade física e química entre os
materiais.
A cristalização de sais solúveis pode causar
danos, pelo menos de duas maneiras: Esses danos estão disseminados por toda a
área do Conjunto Franciscano
- sais solúveis atraem água líquida (osmose) ou
água em vapor (hidroscopicidade); eles Os principais ambientes identificados com
causam um aumento do conteúdo crítico de danos na cantaria estão listados no Quadro
umidade e em geral impedem a secagem da 10.3.
alvenaria.
73
Por ser um ambiente constantemente exposto
às intempéries e sujeito à grande circulação de
pessoas, concentra um grande número de
patologias Além disso, é uma área que sofreu
variadas intervenções, muita delas danosas à
própria estrutura.
74
Esquadrias Da mesma forma, as madeiras utilizadas em
seus reparos, quando se recorreu às
Os principais ambientes identificados com
disponíveis no mercado e nunca às originais.
danos nas esquadrias estão no Quadro 10.4.
Isso se deveu não apenas pelas dificuldades
As janelas e portas do Convento foram objeto em consegui-las, mas, principalmente por falta
das primeiras intervenções do IPHAN (1940- de uma cultura de preservação adequada.
45) e de uma outra grande intervenção em
1967. Por serem imprescindíveis na segurança
de seus frades moradores, elas têm sido
constantemente reparadas.
75
Fig. 10.11 Peças faltantes (Ambiente 38–pavimento Fig. 10.12 Galerias de insetos xilófagos – cupim de
térreo) solo (Ambiente 46–pavimento térreo)
trincas 11,20,21,22,23,25 35 35
rachaduras 20,21,22,23 35 35
manchas de umidade 22 35 35
galeria de xilófagos não há danos intensos não há danos intensos não há danos intensos
76
ser colocadas. Essa obra foi feita com recursos
da Ordem Franciscana e foi acompanhada pelo
IPHAN.
77
pinturas do forro em caixotões da sacristia, 10.3. Instalações elétricas e
quando se removeu o verniz oxidado e uma hidraulicas
nova proteção foi aplicada. Ainda podem ser
mencionadas as intervenções (indevidas) nas Apesar de recentemente terem sido realizados
instalações elétricas das bibliotecas, onde o vários serviços – como mudança de fiação e
forro foi perfurado para a colocação de embutimento de eletrodutos nas paredes, a
luminárias que prejudicam a conservação das área da Ordem Terceira não foi objeto dessa
camadas pictóricas. intervenção pela administração distinta do
Conjunto. Assim, permanece em
aproximadamente quinze por cento da área
construída do Conjunto Franciscano com
instalações antigas, marcadas por sucessivos
reparos e adaptações.
78
O Quadro 10.8 apresenta as principais
patologias nas instalações elétricas e
hidráulicas por ambiente.
79
resultante, as paredes laterais foram apoiada na viga de fundação. As paredes
intensamente cisalhadas, ocorrendo, também, foram mantidas na posição encontrada, as
acentuado abatimento no piso, que trincou rachaduras seladas. E os velhos azulejos
junto às fundações da sacristia primitiva. portugueses recolocados, trazendo o esplendor
da sacristia” (Gusmão Filho, 2001:162-163).
A parede posterior foi contida pelo
travejamento do primeiro andar e pela
cobertura, invertendo seu movimento de
translação para rotação. Apesar dos gigantes
de alvenaria, construídos no início do século
passado para escorar a parte posterior da
sacristia, ao contrário do que se esperava na
época, conduziram a uma aceleração dos
movimentos pré-existentes, devido aos
recalques destes gigantes e ao deslocamento
horizontal do talude adjacente ”(Gusmão
Filho, 2001: 142-143).
Fig. 10.20 Vigas de concreto na fundação (Ambiente
30–pavimento térreo)
TOPOGRAFIA
ANEXO 2
DOCUMENTAÇÃO ARQUITETÔNICA
ANEXO 3
MAPA DE DANOS