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Melanie Klein
Joan Riviere
(2� Edição)
ISBN 85-312-0869-6
JAYME SALOMÃO
(Preparada pelo Centro de Catalogação-na-fonte do
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, R])
Bion, W. R.
B514e Experiências com grupos : os fundamentos da psi
coterz,pía de grupo; tradução e prefácio ldej Waldere
do Ismael de Olinira. 2. ed. Rio de Janeiro,
lmago; São PatiÍo, Ed. da Universidade de São
Paulo, 1975.
186p. 21cm (Psicologia psicanalítica)
CDD - 616.8915
616.8917
CDU ...__ 615.851
75-o285 159.9642
Experiências com Grupos
Título original
EXPERIENCES IN GROUPS AND OTHER PAPERS
1 970
Impresso no Brasil
Printed in BJ:azil
W. R. BION
EXPERIÊNCIAS COM
GRUPOS
Os Fundamentos da Psicoterapia de Grupo
Direção
JAYME SALOMÃO
Membro-Associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise
do Rio de Janeiro. Membro da Associação Psiquiátrica
do Rio de Janeiro
Tradução e Prefácio
WALDEREDO ISMAEL DE OLIVEIRA
Presidente da Associação Brasileira de Psicoterapia Analítica
de Grupo. Analista-Didata da Sociedade Brasileira de
Psicanálise do Rio de Janeiro. Professor Adjunto de
Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Introdução XI
Apresentação
Revisão
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meira m1ssao, assim, foi descobrir o que a busca dêssa
objetivo significaria em função de horário e organização.
Não pude trabalhar nessa tarefa numa atmosfera
de calma claustral. Mal me sentava à escrivaninha, com
meus papéis, e já era assediado por urgentes problemas
apresentados por pacientes importunos e outras pessoas.
Poderia ir ver os praças graduados encarregados da ala
de reabilitação e explicar-lhes quais eram os seus de
veres? Poderia receber o soldado A, que tinha urgente
necessidade de uma licença de 48' horas para ir encon
trar um velho amigo que acabara de regressar do Orien
te Médio? O soldado B, por outro lado, pedia conselhos,
porque um infeliz atraso ferroviário deixara-o exposto
à má interpretação de haver ultrapassado o prazo de
sua licença, e assim por diante.
Pouco mais de uma hora desta espécie de coisas con
venceu-me que era de disciplina que se precisava. Exas
perado pelo que considerava um adiamento de meu tra
balho, voltei-me para a consideração dêste problema.
4
presença do inimigo, que fornece um perigo comum e
um obj etivo comum; (II) a presença de um oficial que,
sendo experimentado, conhece algumas de suas próprias
deficiências, respeita a integridade de seus homens e não
tem mêdo de sua boa vontade nem de sua hostilidade.
Um oficial que aspire a ser psiquiatra encarrega
do de uma ala de reabilitação tem de saber o que é estar
numa posição de responsabilidade, numa ocasião em
que a responsabilidade significa ter de enfrentar ques
tões de vida e morte. Tem de saber o que é exercer au
toridade em circunstâncias que tornam seus companhei
ros incapazes de aceitar sua autoridade, exceto na me
dida em que êle parece ser capaz de sustentá-la. Tem de
saber o que é viver em estreita relação emocional com
seus semelhantes. Em resumo, tem de conhecer a espé
cie de vida que é levada por um oficial combatente. Ao
psiquiatra que conheça isso será pelo menos poupado o
odioso e crasso êrro de achar que seus pacientes são car
ne para canhão em potencial, a serem devolvidos como
tal a suas unidades. Compreenderá que é tarefa sua pro
duzir homens que se respeitem a si mesmos, socialmente
ajustados à comunidade e, dessa maneira, desejosos de
aceitar suas responsabilidades tanto na paz quanto na
guerra. Sàmente assim ficará êle livre de profundos sen
timentos de culpa que frustram redondamente quaisquer
esforços que, doutra maneira, possa fazer· para o tra-
tamento.
Qual o perigo comum que é partilhado pelos solda
dos da ala de reabilitação? Que objetivo poderia uni-los?
Não houve dificuldade em descobrir um perigo co
mum; extravagâncias neuróticas de um tipo ou de outro
colocam perpetuamente em perigo o trabalho do psi
quiatra ou de qualquer instituição criada' para o trata
mento das perturbações neuróticas. O perigo comum na
ala de treinamento era a existência da neurose como
uma ·incapacidade da comunidade. Achava-me agora de
volta a meu ponto de partida : a necessidade, no trata
mento de um grupo, de apresentar a neurose como um
problema do grupo. Entretanto, graças à minha excur
são pelo problema da· disciplina, retornara com dois
5
acréscimos. A neurose precisa ser apresentada como um
perigo para o grupo e sua apresentação deve, de alguma
maneira, ser tornada o objetivo comum do grupo.
Mas como poderia o grupo ser persuadido a en
frentar a incapacidade neurótica como um problema
comum?
O paciente neurótico nem sempre deseja o tratamen-.
to e quando, afinal, sua aflição o leva a êle, não o dese
ja irrestritamente. Esta relutância foi identificada na
discussão da resistência e fenômenos correlatos, mas a
existência de fenômenos comparáveis nas sociedades não
fo� reconhecida. •
6
se espaço, o paciente seria admitido em determinado
ponto e as atividades no interior do mesmo seriam or
ganizadas de maneira a poder êle movimentar-se livre
mente em qualquer direção, de acôrdo com a resultante
de seus impulsos conflitantes. Seus movimentos, até
onde possível, não seriam deformados por interferên
cia externa. Em resultado disso, poder-se-ia confiar que
seu comportamento proporcionasse uma indicação cor
reta de sua vontade e obj etivos efetivos, em oposição aos
obj etivos por êle próprio proclamados ou àqueles que o
psiquiatra desej aria que êle tivesse.
Era de esperar que algumas das atividades organi
zadas dentro do 'espaço' fôssem claramente bélicas ; ou
tras, igualmente, claramente civis e outras, ainda, sim
ples expressões de importância neurótica. À medida que
se visse o progresso do paciente avançar ao longo de
um ou de outro dêsses caminhos, assim também seu
'ativo e passivo' - para utilizar uma expressão empre
gada na esfera da seleção de oficiais pelo Major Eric
Wittkower - poderiam ser avaliados com razoável ob
jetividade. À medida que seu progresso se mostrasse efe
tuar na direção de uma ou outra das saídas possíveis
dêsse espaço imaginário, também seu verdadeiro obje
tivo poderia ser julgado.
Ao mesmo tempo, a organização poderia ser utiliza
da para ampliar o objetivo principal da ala de reabili
tação : a educação e o treinamento da comunidade nos
problemas das relações interpessoais. Se êle pudesse
aproximar-se dessa construção teórica, permitiria aos
membros da ala de reabilitação colocar-se (por assim
dizer) fora da estrutura e observar com isenção de âni
mo e uma compreensão crescente os problemas de seu
funcionamento.
A EXPERI:Ê NCIA
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1 . Todos os homens teriam de fazer uma hora
diária de treinamento físico, a menof, que um cer
tificado médico os isentasse disso.
2 . Todos os homens teriam de ser membros
de um ou mais grupos, sendo os grupos proj etados
para o estudo de artes manuais, cursos de corres
pondência do Exército, carpintaria, leitura de ma
pas, mesas de tipografia, etc.
3 . Qualquer homem poderia formar um nôvo
grupo, se assim desejasse fazê-lo, f'ôsse por não
existir nenhum grupo para a sua atividade especí
fica, fôsse porque, por uma razão ou outra, não
estivesse apto a unir-se a um grupo similar já
existente.
4 . O homem que se sentisse incapaz de fre
qüentar seu grupo teria de ir para a sala de re
pouso.
5 . A sala de repouso ficaria a cargo de um
enfermeiro e deveria ser mantida tranqüila para a
leitura, a escrita ou jogos do tipo damas. Falar em
tom baixo era permitido, com a autorização do en
fermeiro, mas os outros pacientes não deveriam ser
perturbados; eram fornecidos sofás, de maneira que
qualquer homem que se sentisse inapto para qual
quer atividade pudesse repousar nêles. O enfermei
ro tomaria o nome de todos aquêles que se encon
trassem na sala de repouso, como questão de rotina.
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Durante os primeiros dias, pouca coisa aconteceu,
mas era evidente que, entre os pacientes, realizavam-se
grandes debates e reflexões. As primeiras reuniões das
12,10 foram pouco mais que tentativas para auferir a
sinceridade dos propósitos ; depois, os grupos começa
ram a se formar a sério. Entre as atividades mais apa
rentes, havia um grupo de planejamento, destinado a
elaborar gráficos das horas de funcionamento dos gru
pos e de sua localização, emitir comunicados e reservar
entradas para· concertos gratuitos e coisas semelhantes .
Em muito pouco tempo a sala de planejamento, que
apresentava por meio de bandeiras aplicadas sôbre um
gráfico de trabalho as atividades de todos os homens
da ala de teabilitação, crescendo então ràpidamente de
tamanho, tornou-se quase primaveril en;1 sua mostra de
bandeiras multicoloridas, de padrões sugeridos pela in
genuidade dos pacientes. Graças a uma lembrança feliz,
um suprimento de bandeiras a apresentar a caveira e
os ossos cruzados foi preparado, prontas para o uso por
parte daqueles cavalheiros que se sentissem compelidos
a permanecer ausentes sem permissão.
9
queixado a mim de que uma de suas objeções ao Exér
cito era o 'engôdo'. A presença dêle na ala de reabili
tação, assim, parecia realmente ser um ponto digno de
estudo e debate.
i:ste comunicado deixou a audiência parecendo sen
tir-se como se houvesse sido 'apanhada '. Voltei à discus
são, nesse ponto, para um assunto de responsabilidade
comunal e não mais ·algo que concernia a mim, como
oficial, sàzinho.
Com surpreendente rapidez a ala de reabilitação
tornou-se autocrítica. A liberdade de movimentos conce
dida pela organização original permitiu que as caracte
rísticas de uma comunidade neurótica se mostrassem
com uma penosa clareza : dentro de poucos dias os ho
mens se queixavam de que as enfermarias (que até en
tão eram apresentadas como impecáveis) estavam sujas
e não podiam ser mantidas limpas sob o presente sis
tema de uma hora de rotina para faxina da enferma
ria. Pediram e foi-lhes concedida permissão para orga
nizar, sob o grupo de planejamento, um 'grupo de ser
ventes', cuja função seria manter as enfermarias lim
pas durante todo o dia. O resultado disso foi que, numa
subseqüente inspeção semanal, o. oficial comandante do
hospital fêz uma observação sôbre a grande mudança
em limpeza que se verificara.
ALGUNS RESULTADOS
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ma até que seus limites se houvessem definido clara
mente ajudou a produzir, após vívida e saudável impa
ciência, uma, crença real de que a unidade estava deci
dida a enfrentar a tarefa com seriedade científica. Um
crítico advertiu que, certamente, tal sistema de obser
vação de pacientes seria excepcionalmente lento em pro
duzir resultados, se é que, na verdade, produzisse al
gum. Respondeu-se-lhe lembrando-o de que apenas pou
cos dias antes o próprio crítico havia espontâneamente
observado que a disciplina militar e o comportamento
da ala de reabilitação haviam melhorado além de qual
quer identificação, dentro do curto período de um mês.
O segundo exemplo ilustra o desenvolvimento de
uma idéia, da fase de impulsos neuróticos bastante sel
vagens para uma atividade prática de bom senso.
Por grande diferença, o maior grupo de homens pro
pôs a formação de um curso de dança. A despeito da
aparência de ser um desejo de testar minha sincerida
de na promessa de facilidades para a atividade grupal,
a patética sensação de inferioridade em relação às mu
lheres que se ocultava sob esta proposta, partida de ho
mens que não estavam tomando parte na luta, era óbvia
demais. Foi-lhes dito que apresentassem proposições
concretas. Não precisamos deter-nos nas etapas pelas
quais isto foi feito; ao fim, o curso foi efetuado durante
horas geralmente ocupadas por um divertimento notur
no; foi confinado, pela vontade dos próprios homens,
apenas àqueles que não possuíam conhecimento ne
nhum de dança e a instrução foi efetuada pela equipe
do ATS .* Em resumo, uma proposta que havia começa
do como uma idéia inteiramente impraticável, comple
tamente contrária a qualquer obj etivo militar aparen
temente sério ou a um sentido de responsabilidade so
cial para com a nação em guerra, terminou por ser um
estudo inofensivo e sério, realizado ao fim de uma j or
nada de trabalho. Além disso, os homens interessados
tiveram de se aproximar do oficial comandante, dos ofi-
*
A.T.S.- A uxiliary Territorial Service ( Serviço Territorial Auxiliar);
o seu quadro era composto de mulheres (N. do Trad.).
12
ciais do ATS e do próprio ATS, como questão de disci
plina, em primeiro lugar, e de cortesia social, em se
gundo .
Entrementes, as formaturas das 12, 10 haviam evo
luído muito ràpidamente para reuniões animadas e
construtivas, semelhantes às de negócios, e isso apesar
do fato de a ala estar recebendo agora pesados refor
ços de pacientes novos à organização, bem como per
dendo outros que haviam recebido alta do hospital, mui
tas vêzes quando se haviam tornado úteis.
Dentro de um mês do início do esquema, grandes
alterações se haviam processado. Onde quer que, a prin
cípio, se afigurara difícil descobrir maneiras de utilizar
os homens, ao fim do mês era difícil encontrar tempo
para o trabalho que desejavam realizar. Os grupos já
haviam começado a funcionar bem fora daquilo que era
comumente considerado horas de formatura; o afasta
mento sem permissão foi, durante um considerável pe
ríodo, inexistente e, em todo o período, houve apenas
um caso dêle; os pacientes que não pertenciam à ala de
reabilitação ficaram ansiosos para passar para ela e, a
despeito da população flutuante, a ala possuía um in
discutível esprit de corps, que se mostrava em porme
nores tais como a correção com que os homens entra
vam em posição de sentido quando os oficiais ingres
savam na sala, nas reuniões das 12,10. A relação dos sol
dados com os oficiais era amistosa e cooperativa; mos
travam-se ávidos em angariar a simpatia dos oficiais
para concertos e outras atividades que estavam arran
jando. Havia uma sensação sutil mas inequívoca de que
tanto os oficiais como os praças achavam-se empenha
dos numa tarefa importante e valiosa, mesmo quando
os homens não haviam ainda apreendido inteiramente
a natureza da missão em que estavam engajados. A at
mosfera não era diferente da que é vista numa unidade
de exército sob o comando de um general em que os
soldados têm confiança, mesmo que não possam conhe
cer-lhe os planos.
13
COMENTARIO
14
resultados do que aquêles que se devotaram aos estrei
tos caminhos da entrevista individual.
Finalmente, deve-se novamente chamar a atenção
para o fato de que a sociedade, tal como o indivíduo,
pode não querer tratar de suas afliçôes por meios psico
lógicos até que seja levada a fazê-lo pela compreensão
de que, pelo menos, alguns de seus sofrimentos são psi
cológicos na origem. A comunidade representada pela
ala de reabilitação teve de aprender êste fato antes que
a fôrça plena de sua energia pudesse ser liberada na
cura de si própria. O que se aplicou à pequena comuni
dade da ala de reabilitação bem pode ser aplicado à co
munidade em geral e um nôvo discernimento (insight)
poderá ser necessário antes que um apoio irrestrito pos
sa ser obtido para aquêles que tentam, desta maneira,
tratar com as fontes profundamente situadas do moral
nacional.
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a) Uma vez que a residência nesta enfermaria é
temporária, com alguns indo para a ala de reabilitação
e outros chegando da enfermaria de admissão, para
ocupar seu lugar, como pode ser enfrentada esta situa
ção flutuante? Deveríamos nós (a distinção entre médi
co e paciente, oficiais e outros postos, era um outro tó
pico especial) ter de acomodar-nos às pessoas que in
gressavam em nosso grupo, para quem nossa atitude
para com nossa -enfermaria (que era sempre referida
como sendo a 'nossa enfermaria' ) não significava abso
lutamente nada; seriam encarados como estranhos ou
gente de dentro imperfeitamente adaptada? Assim tam
bém com aquêles que 'saíam' para a ala de reabilitação :
êles não poderiam esperar manter a atitude do grupo
da enfermaria indefinidamente, nem tampouco ter es
peranças de incluir a ala de reabilitação, muito maior,
em seu grupo de enfermaria; teriam de encontrar seu
lugar nos novos agrupamentos e deixar que sua expe
riência de enfermaria fôsse apenas uma lembrançà, mas
esperava-se que fôsse uma lembrança útil. Havia ainda
outro ponto; se os da ala de reabilitação deveriam retor;;,
nar para os debates diários de grupo, não sendo a ques
tão o que se conseguiria dêles (parecia haver pouca dú
vida de que se achavam entre as experiências mais in
teressantes que já havíamos tido) mas sim se, vindos
de outra formação grupal ou havendo perdido seu con
tato com a enfermaria, não poderiam mostrar ser uma
distração para aquêles que estavam tomando pé no gru
po da enfermaria.
b) Até onde as diferenças de graduação adquiri
das 'fora' deveriam determinar o comportamento dos
membros do grupo, um para com o outro, enquanto na
enfermaria? Uma tentativa de igualização funcionaria?
Ou seria melhor, sem esquecer o pôsto adquirido fora,
considerar quais os equivalentes de pôsto que surgem na
enfermaria, e se assim fôsse, qual a base dêsses equi-
·
valentes?
c) O que provoca descontentamento na enferma
ria? É algo peculiar à guerra, a qualquer enfermaria ou
a qualquer associação de pessoas?
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d) O que provoca contentamento e felicidade na
enfermaria? Seria o exercício da iniciativa individual
tendo por único critério a livre expressão das próprias
iniciativas privadas da pessoa ou aquelas só surgiriam
após o reconhecimento daquilo que a enfermaria pede
do indivíduo? Existiria uma incompatibilidade funda
mental entre êsses dois pontos de vista e, se assim fôs
se, aplicar-se-ia ela a todos ou apenas a alguns dos mem
bros? Se apenas a alguns, o que faria com que ela apa
recesse nêles e tratar-se-ia de uma característica que le
vavam em .suas vidas todo o tempo ou seria mais forte
em certas ocasiões do que em outras? Se variasse, po
deria a enfermaria diminuí-la sem se tornar opressiva
aos indivíduos assim dotados?
CONCLUSõES
'
17
a) Um propósito comum, seja êle vencer um ini
migo ou defender e nutrir um ideal ou uma constru
ção criativa no campo das relações sociais ou das comu
nidades físicas.
b) Um reconhecimento corrium, por parte dos
membros do grupo, dos 'limites' dêste e sua posição e
função em relaçã.o às de unidades ou grupos maiores.
c) A capacidade de absorver novos membros e per
der outros sem mêdo de perder a individualidade gru
pal, isto é, o 'caráter do grupo' deve ser flexível.
d) A liberdade dos subgrupos internos de terem li
mites rígidos (isto é, exclusivos) . Se um subgrupo achar
se presente, êle não deve ser centrado em nenhum de seus
membros nem em si próprio, tratando os outros mem
bros do grupo principal como se êles não fizessem par
te da principal barreira grupal; o valor do subgrupo
para o funcionamento do grupo principal deve ser ge
ralmente reconhecido.
e) Cada membro individual é valorizado por sua
contribuição ao grupo e possui liberdade de movimen
tos dentro dêle, com sua liberdade de locomoção sendo
limitada apenas pelas condições geralmente aceitas, es
peradas e impostas pelo grupo.
f) O grupo deve ter a capacidade de enfrentar o
descontentamento dentro de si e possuir meios de tra
tar com êle.
g) O tamanho mínimo do grupo é três. Dois mem
bros têm relações pessoais ; com três ou mais, há uma
mudança de qualidade (relação interpessoal) .
Estas experiências na ala de reabilitação de um hos
pital militar psiquiátrico de neuroses sugerem a neces
sidade de um exame mais aprofundado da estrutura dos
grupos e da ação recíproca das fôrças dentro dêles. A
psicologia e a psicopatologia focalizaram a atenção sô
bre o indivíduo, muitas vêzes com a exclusão do campo
social de que êle faz parte. Há um futuro útil no estudo
da ação recíproca das psicologias individual e social, en
caradas como elementos interatuantes igualmente im
portantes.
18
EXPERIÊNCIAS
COM GRUPOS
1
21
po, uma conversa desconexa inicia-se novamente e tom
ba um outro silêncio. Torna-se claro para mim que sou,
num certo sentido, o foco da atenção do grupo. Além
disso, dou-me conta de sentir desconfortàvelmente que
se espera que eu faça alguma coisa. Neste ponto, con
fio minhas ansiedades ao grupo, observando que, por
mais equivocada que minha atitude possa ser, sinto exa
tamente isso.
Logo descubro que minha confidência não é muito
bem recebida. Na verdade, há uma certa indignação por
eu expressar tais sentimentos sem parecer apreciar o
fato de que o grupo tem direito a esperar algo de mim.
Não discuto isso, mas contento-me em apontar que, evi
dentemente, o grupo não pode tirar de mim o que sen�
tem ter direito a esperar. Fico pensando quais são essas
expectativas e o que as despertou.
A amistosidade do grupo, embora doloridamente
testada, permite-lhes fornecer-me algumas informações.
Disseram à maior parte dos membros que eu 'aceitaria'
o grupo; alguns dizem que tenho a reputação de saber
um bocado a respeito de grupos ; outros acham que eu
deveria explicar o que iremos Jazer e outros ainda pen
sam que seria uma espécie de seminário ou, talvez, uma
conferência. Quando chamo a atenção para o fato de
que essas idéias me parecem ser baseadas em boatos,
parece haver a impressão de que estou tentando negar
minha eminência como 'aceitador' de grupos. Sinto e
digo que é evidente que o grupo tem certas boas expec
tativas e crenças sôbre mim e que estão tristemente de
sapontados por descobrirem que elas não são verdadei
ras. O grupo acha-se persuadido de que as expectativas
são verdadeiras e que meu comportamento é provocador
e deliberadamente desapontador, a ponto de dizer que
eu poderia comportar-me diferentemente, se assim o qui
sesse, e que estou apenas conduzindo-me dêsse modo por
despeito. Ap9nto que é difícil para o grupo admitir que
esta poderia ser minha maneira de aceitar grupos ou
mesmo que me deveria ser permitido aceitá-los de tal
modo .
22
Neste ponto, a conversa parece-me indicar que o
grupo mudou de intenção.
Enquanto espero que o grupo se firme em seu nôvo
curso, pode ser útil tentar oferecer ao leitor alguma ex
plicação de meu comportamento, que pode, a esta altu
ra, intrigá-lo tanto quanto intriga o grupo. Naturalmen
te, eu não sonharia em fazer isto num grupo, mas o lei
tor acha-se numa posição diferente da do homem ou da
mulher que tem muito mais provas por que guiar-se que
a palavra escrita. Diversas perguntas podem ter ocorri
do ao leitor. Poderá pensar que minha atitude para com
o grupo é artificialmente ingênua e certamente egoísta.
Por que deveria um grupo se incomodar em discutir as
suntos irrelevantes tais como a personalidade, história,
carreira, etc., de um só indivíduo? Não posso ter espe
ranças de fornecer qualquer tipo de resposta integral a
tais questões, mas direi, pnwisóriamente, que nâo con
sidero ter forçado o grupo a me discutir, embora eon·
corde que êle foi forçado a proceder assim. Por mais
irrelevante que se afigure ser para o propósito da reu
nião, a preocupação com minha personalidade certamen
te pareceu-me intrometer-se, por indesej ável que isso
possa ser ao grupo ou a mim próprio. Estava simples
mente declarando o que pensava estar acontecendo. Na
turalmente, pode-se discutir que provoquei essa situação
e se tem de admitir que isso é inteiramente possível,
embora não pense assim. Mas mesmo supondo que mi
nhas observações sejam corretas , pode-se ficar pensan
do a que propósito se serve fazendo-as. Aqui posso ape
nas dizer que não sei se alguma intenção útil é servida
ao fazê-las, nem tampouco me acho muito seguro sôbre
a natureza dêste tipo de observação. Seria tentador, por
analogia com a psicanálise, chamá-las de interpretações
de transferência de grupo, mas penso que qualquer psi
canalista concordaria comigo no sentido de que, antes
de que tal descrição possa ser j ustificada, uma grande
quantidade de provas oriundas de grupos teria de ser
avaliada. Entretanto, pelo menos , posso alegar que ob
servações dessa espécie são feitas espontânea e natural
mente na vida cotidiana, que não podemos evitar fazê-
las, inconsciente senão conscientemente, e que seria
muito útil se pudéssemos saber que, quando fazemos
observações dêsse tipo, elas correspondem a fatos. So
mos constantemente influenciados por aquilo que acha
mos ser a atitude de um grupo para conosco e consciente
ou inconscientemente governados por nossa idéia dela.
Ver-se-á em seguida que não se depreende disso que de
vamos deixá-lo escapar da maneira em que até agora me
descrevi como fazendo no grupo . Isto, confesso, deve
ser encarado como peculiar, embora, se precedentes fôs
sem exigidos, todos nós estaríamos familiarizados com
certos tipos de pessoas, particularmente aquelas que ten
dem a se sentir perseguidas, que se comportam dessa
maneira . Não é um precedente feliz, pensará o leitor,
e não demorará muito até ser evidente que o grupo pen
sa isso também . Mas é necessário agora retornar ao
grupo, a quem deixamos no processo de mudar de curso.
A primeira coisa a nos impressionar é a melhoria
que se realizou na atmosfera. O Sr. X., que tem uma
personalidade simpática, tomou conta do grupo e j á está
adotando medidas para reparar a deplorável situação
criada por mim. Mas dei uma impressão equivocada se
pareci sugerir que podemos olhar êste grupo com isen
ção, porque o Sr. X., que está ansioso pelo bem-estar
do grupo, muito corretamente volta sua atenção para a
fonte da dificuldade, que, segundo seu ponto de vista,
sou eu mesmo. Pode-se ver que êle tem uma idéia mui
to boa de enfrentar de saída aquêles elementos de seu
grupo que são destrutivos do estado de ânimo e da boa
camaradagem. Dessa maneira, pergunta-me diretamen
te qual o meu objetivo e porque não posso dar uma ex
plicação franca de meu comportamento. Posso apenas
desculpar-me e dizer que, além de achar que a declara
ção de que desejo estudar tensões de grupo seja provà
velmente uma descrição muito inadequada de meus mo
tivos, não posso lançar qualquer luz sôbre o problema .
E:le recebe uma grande simpatia do grupo quando deixa
de lado esta resposta muito insatisfatória para ques
tionar um ou dois dos outros, que parecem ser mais coo
perativos e francos do que eu. Posso detectar, contudo,
24
uma certa má-vontade por parte do grupo em seguir ir
restritamente sua liderança. Os dissidentes parecem ha
ver-se tranqüilizado, dizendo-se a si mesmos que a Co
missão da Clínica Tavistock deve ter tido algum bom
propósito em afirmar que eu deveria aceitar o grupo;
dão a impressão de que se acham determinados a acre
ditar que a experiência de um grupo aceito por mim é
valiosa, a despeito de suas observações até o presente.
Sem embargo, o Sr. X. está obtendo algum sucesso.
O Sr. Y. diz-lhe · que é um funcionário encarregado da
conduta daquêles que tiveram alta e veio a ter um co
nhecimento científico de grupos, que achou seria de
valor para êle. O Sr. R., embora não interessado profis
sionalmente, sempre teve interêsse no estudo científico
de grupos. O Sr. X., o Sr. Y. e o Sr. R. fornecem também
alguns pormenores de seus antecedentes e explicam por
que acham que um estudo científico os ajudaria.
Mas, agora, parecem estar surgindo dificuldades .
Outros membros do grupo não são tão acessíveis como o
Sr. Y. ou o Sr. R. Além disso, parece haver certa irri
tação com o Sr. X., por haver assumido a liderança. As
respostas se tornam evasivas e parece como se mesmo as
informações que foram obtidas não fôssem, realmente,
as informações que eram desejadas. Começo a sentir, à
medida que a conversa se torna mais desconexa, que
sou novamente o foco do descontentamento. Sem saber
inteiramente por que, sugiro que o que o grupo realmen
te desej a conhecer são os meus motivos para estar pre
sente e, uma vez que êstes não foram revelados, êles
não se acham satisfeitos com nenhum sucedâneo.
É claro que a minha interpretação não é bem-vinda
Um ou dois membros desejam saber por que eu deveria
atrair a curiosidade, que pareceria válida sem qualquer
outra explicação, sôbre mim mesmo. A impressão que
recebo é que muito pouca importância é dada à opinião
que expresso, como uma possível explicação do que está
acontecendo. Ela me parece ser ignorada ou, então, to
mada como prova de uma aparência deformada em mim.
Para tornar as coisas piores, não me é de modo algum
claro que minha observação, embora correta, seja real-
25
mente a mais útil a fazer na ocasião. Mas eu a fiz e pre
paro-me para ver o que dela decorre.
Devo explicar que esta descrição despojada não faz
j ustiça ao estado emocional do grupo neste ponto. O Sr.
X. parece mortificado por ter visto sua iniciativa mal
recebida e o resto do grupo parece encontrar-se em es
tágios variados de constrangimento. De minha parte,
tenho de confessar que se trata de uma reação com que
me acho familiarizado em todos os grupos de que fui
membro. Não posso, dessa maneira, simplesmente pô-la
de lado como uma peculiaridade dêste grupo. Para mim,
é claro que, sej a o que fôr que o grupo possa pensar a
respeito do Sr. X . , êle tem suspeitas muito mais sérias
sôbre mim. Em particular, desconfio que minha perso
nalidade e, especialmente, minha capacidade de rela
ções sociais e, dessa maneira, minha aptidão para o
papel que se espera que eu preencha, acha-se em ques
tão. No grupo ora objeto de nossas considerações, des
contente com o que está acontecendo e, particularmente,
com o meu papel em seu ocasionamento, o descontenta
mento subiu a um tom tão alto que mesmo a existência
continuada do grupo se torna matéria de dúvida para
mim. Por alguns inconfortáveis momentos penso que
tudo terminará por eu tendo de explicar à Comissão
Profissional que seu projeto foi águas abaixo pela in
capacidade do grupo em tolerar meu comportamento.
Suspeito, pelo seu proceder, que sombrios pensamentos
semelhantes, diferentemente orientados, estão passan
do pelas mentes do resto do grupo.
Na tensa atmosfera que prevalece, meus próprios
pensamentos não são inteiramente tranqüilizadores.
Para não dizer mais nada, tenho recentes lembranças
de um grupo em que minha exclusão foi abertamente
defendida, e, além disso, é-me bastante comum experi
mentar uma situação em que o grupo, embora não di
zendo nada, simplesmente ignora minha presença e me
exclui da discussão, tão efetivamente como se eu não
estivesse lá. Em algumas ocasiões desta espécie de crise,
a reação assumiu a forma mais suave de sugestões de
que eu já me havia excluído do grupo e que tornava
26
as coisas mais difíceis por não participar. Uma reação
tão suave como esta última é bastante tranqüilizadora,
mas não posso esquecer que quando pela primeira vez
tentei colocar tais métodos em funcionamento, a expe
riência foi terminada por minha remoção, de fato, do
meu pôsto. Preferiria acerditar que, nessa ocasião, a dis
pensa foi devida a circunstâncias coincidentes, mas re
cordo-me que, mesmo assim, os pacientes com quem
estava lidando constantemente advertiram-me, basea
dos em quê não sei, que sérias tentativas estavam sendo
feitas para sabotar o esquema. T'enho, por conseguinte,
numa situação como a que estou descrevendo, tàda ra
zão para acreditar que o descontentamento é real e pode
fàcilmente conduzir à ruptura do grupo.
Nesta ocasião, porém, minhas ansiedades foram ali
viadas por uma nova virada dos acontecimentos. O Sr.
Q. sugere que, neste ponto, dificilmente os argumentos
lógicos poderiam obter a informação desejada e, na ver
dade, era possível que eu preferisse não explicar porque
fizera tal interpretação, porque ela seria contrária a
qualquer idéia de deixar o grupo experimentar a natu
reza dos fenômenos de grupo por si próprio. Argumenta
que, afinal de contas, devo ter boas razões para seguir
a linha que sigo. A tensão do grupo é imediatamente re
laxada e uma atitude muito mais amistosa para comigo
se torna aparente. É claro que o grupo tem, afinal de
contas, uma alta opinião de mim e começo a sentir que
talvez tenha estado tratando-o injustamente, por não
ser mais comunicativo. Por um momento, sou impelido
a dar uma satisfação, reagindo àquela mudança amisto
sa com alguma explicação de meu comportamento. Mas
me contenho ao compreender que o grupo simplesmente
retornou ao seu estado de espírito anterior de insistir
que boato é fato; dessa maneira, em vez disso, aponto
que agora o grupo parece estar-me adulando para cor
rigir meus modos e coincidir com seu desejo de que meu
comportamento se conforme mais ao que é esperado
ou lhes é familiar em outros campos. Observo também,
que, em essência, o grupo ignorou o que foi dito pelo
Sr. 'Q. A ênfase foi deslocada daquilo que o Sr. Q. pre-
27
tendia dizer para apenas uma parte do que dissera, ou
seja, que, afinal de contas, era provável que eu soubes
se o que estava fazendo. Noutras palavras, fôra difícil
a um membro individual transmitir ao grupo signifi
cados diferentes daqueles que o grupo desejava manter.
Desta vez, o grupo fica realmente irritado e é neces
sário explicar que êles têm todo o direito de assim estar.
É perfeitamente claro que ninguém nunca lhes explicou
o que significava estar num grupo em que eu me acha
va presente. A propósito, nunca ninguém me explicara
- como era estar num grupo em que todos os membros in
dividuais dêste grupo estivessem presentes. Mas tenho
de compreender que a única pessoa cuja presença até
agora foi achada desagradável sou eu mesmo, de ma
neira que quaisquer queixas que eu possa ter não pos
suem a mesma validade que as dos outros membros.
Para mim, é mais do que nunca claro que há uma con
tradição bastante surpreendente na situação em que me
encontro. Também ouvi boatos sôbre o valor de minha
contribuição a grupos; dei o melhor de mim para des
cobrir exatamente sob que aspecto minha contribuição
era tão notável, mas não consegui obter nenhuma in
formação. Posso, dessa maneira, simpatizar fàcilmente
com o grupo, que sente que tem direito a esperar algo
diferente do que, na realidade, está obtendo. Posso ver
que minhas declarações devem parecer ao grupo tão
inexatas como o são geralmente as opiniões de nossa
própria posição numa determinada sociedade, e além
disso, possuírem pouca relevância ou importância para
qualquer pessoa, à exceção de mim mesmo. Sinto, dessa
maneira, que devo tentar apresentar da situação uma
visão mais geral do que o fiz até agora.
Com isto em vista, digo que penso que minhas in
terpretações estão perturbando o grupo. Além disso, que
o grupo as interpreta como uma revelação da natureza
de minha personalidade. Não há dúvida de que estão
sendo feitas tentativas de considerar que são, de alguma
maneira, descritivas da vida mental do grupo, mas tais
tentativas são obscurecidas pela suspeita de que minhas
interpretações, quando interpretadas, arrojam mais luz
28
sôbre mim mesmo que sôbre qualquer outra coisa e que
o que é então revelado acha-se em acentuado contraste
com as expectativas que os membros do grupo tinham,
antes de chegar aqui. Isso, penso, deve ser muito per
turbador, mas , inteiramente à parte de qualquer questão
dêste tipo, temos de reconhecer que talvez os membros
do grupo presumam muito fàcilmente que o rótulo de
uma caixa é uma boa descrição de seu conteúdo.
Temos de reconhecer agora que uma crise foi atin
gida, crise na qual os membros bem podem haver desco
berto que a filiação a um grupo de que sou membro
acontece ser úma experiência que êles não gostariam de
ter. Dessa maneira, temos de enfrentar francamente o
fato de que membros de nosso grupo podem precisar
abandoná-lo, exatamente da mesma maneira que uma
pessoa pode necessitar abandonar uma sala em que en
trou baseado numa impressão enganada. Eu próprio não
acredito que isto seja uma descrição inteiramente cor
reta, porque, lembro ao grupo, foi bastante evidente, de
início, que êles estavam com muito má vontade em en
treter qualquer idéia de que não se haviam satisfeito
corretamente da precisão de boatos ouvidos a meu res
peito. Em minha opinião, dessa maneira, aquêles que
achassem que haviam sido mal encaminhados por ou
tros, e, agora quisessem retirar-se, deveriam considerar
seriamente porque resistiam tão intensamente a quais
quer declarações que parecessem questionar a validade
de sua crença no valor de minhas contribuições a um
grupo.
Neste ponto, é necessário que eu diga considerar
as fôrças emocionais subjacentes a esta situação como
muito poderosas. Não acredito, por um só momento, que
o fato obj etivo - ou seja, que sou simplesmente um
dos membros de um grupo que possui um certo grau
de conhecimento especializado e, a êsse respeito, não
diferente de qualquer outro membro do grupo - tenha
probabilidades de ser aceito. As fôrças opostas a isso são
muito mais fortes. Um grupo externo - isto é, a Clí
nica responsável por dizer que eu devo aceitar um grupo
- aplicou o sêlo de sua autoridade a um mito de di-
29
mensões desconhecidas ; afora isso, no entanto, estou
certo de que o grupo é bastante incapaz de enfrentar as
tensões emocionais dentro dêle, sem acreditar que pos
sui alguma espécie de Deus que é inteiramente respon
sável por tudo o que acontece. Assim, tem-se de enfren
tar o fato de que, sejam quais forem as interpretações
que possam ser dadas, por eu mesmo ou por alguém
mais, a probabilidade é que o grupo as reinterpretará
para ajustá-las aos seus próprios desejos, exatamente
como há pouco vimo-lo proceder com a contribuição do
Sr. Q. Dessà maneira, torna-se importante apontar que
os meios de comunicação dentro do grupo são extre
mamente tênues e bastante incertos em sua ação. Na
verdade, poder-se-ia quase pensar que seria menos de
sorientador se cada membro individual do grupo falas
se uma linguagem desconhecida pelos restantes, pois
haveria então menos risco de presumir que entendemos
o que qualquer indivíduo determinado disse.
O grupo agora voltou-se, um tanto ressentidamente
mas com mais ansiedade que ressentimento, para outro
membro do grupo. Tenho a impressão de que o estão
examinando para ser líder, mas sem nenhuma convic
ção real de que êle possa sê-lo. Esta impressão é forta
lecida porque o homem em questão mostra todo desejo
de se apagar. A conversa torna-se cada vez mais desco
nexa e sinto que, para a maioria do grupo, a experiên
cia está-se tornando penosa e desinteressante. Ocorre
me um pensamento, de maneira que o transmito.
Digo ao grupo que me parece que estamos determi
nados a ter um líder e que o líder que desejamos parece
possuir certas características contra as quais compara
mos as características do diferentes indivíduos que ex
perimentamos. A julgar por nossas rejeições, parecemos
saber perfeitamente o que queremos. Ao mesmo tempo,
seria muito difícil dizer, por nossa experiência até agora,
o que são essas características desejáveis. Tampouco é
óbvio porque exigiríamos um líder. O tempo de reunião
do grupo foi estabelecido e, realmente, não parece haver
outras decisões que o grupo tenha de fazer. Poder-se-ia
pensar que era preciso um líder a fim de dar ordens
30
efetivas para o grupo, para executar decisões tomadas
momento a momento, mas, se assim é, o que existe em
nossa atual situação que nos faça pensar ser preciso um
Hder dêsse tipo? Não pode ser a situação externa, por
que nossas necessidades materiais e nossas relações com
os grupos externos são estáveis e não parecem indicar
que quaisquer decisões serão necessárias em futuro pró
ximo. Ou o desejo de um líder é alguma sobrevivência
emocional, funcionando inutilmente no grupo como ar
caísmo, ou então há uma certa consciência de uma si
tuação, ainda não definida, que exige a presença de uma
pessoa assim.
Se minha descrição do que é estar num grupo de
que sou membro foi adequada, o leitor terá experimen
tado alguns receios, acolhido algumas objeções e reser
vado muitas questões para discussão futura. No presen
te estágio, desejo isolar apenas dois aspectos da expe
riência de grupo, para inspeção; um dêles é a futilidade
da conversa no grupo. Julgado pelos padrões comuns de
intercâmbio social, o desempenho do grupo é quase des
pido de conteúdo intelectual. Além disso, se observar
mos como suposições passam incontestadas, como decla
rações de fatos, e são aceitas como tal, parece claro que
o juízo crítico acha-se quase inteiramente ausente. Para
apreciar êste ponto, o leitor deve lembrar-se de que pode
ler êste relato com tranqüilidade, com o livre uso de
seu julgamento. Não é esta a situação no grupo. Sej a
o que fôr que ela pareça ser na superfície, essa situação
está carregada de emoções que exercem uma influência
poderosa e freqüentemente inobservada sôbre o indiví
duo. Em resultado, suas emoções são estimuladas, em
detrimento de seu j ulgamento. De acôrdo com isso, o
grupo amiúde lutará com problemas intelectuais que,
poder-se-ia acreditar, o indivíduo resolveria sem difi
culdade em outra situação - crença que mais tarde se
verá ser ilusória. Um dos principais objetos de nosso
estudo bem poderá mostrar ser, precisamente, os fenô
menos que produzem estas perturbações do comporta
mento racional do grupo, fenômenos cuj a existência
apenas pude indicar por descrições de fatos que apre-
31
sentam menos relação com o objeto .de nosso estudo que
as linhas de uma gravura monocrômica com as côres
de uma pintura em que a côr é a qualidade mais im
portante.
O segundo aspecto ao qual tenho de aludir é a na
tureza de minha própria contribuição. Seria satisfatório
se eu pudesse agora fornecer uma descrição lógica de
minha técnica - a técnica que a Comissão Profissional,
como devem lembrar-se, desejou que eu empregasse -
mas acho-me persuadido que isso seria também muito
impreciso e enganador. No decorrer dos capítulos se
guintes, fornecerei uma descrição tão exata quanto pu
der do que falo e faço, mas me proponho também a
indicar o que os grupos pensam que digo e . faço e isto
não apenas para ilustrar o funcionamento mental de um
grupo, mas para suprir tanto material quanto possível
para o leitor utilizar no alcance de suas próprias con
clusões. Enfatizarei, contudo, um dos aspectos de minhas
interpretações de comportamento grupal que parece ao
grupo - e, provàvelmente, ao leitor - ser meramente
incidental à minha personalidade, mas que é, na ver
dade, inteiramente deliberado : o fato de as interpreta
ções parecerem se achar relacionadas com assuntos de
nenhuma importância para qualquer pessoa, à exceção
de mim mesmo.
32
2
33
É por isso que eu me queixo d�qui. Fiz uma
pergunta perfeitamente simples. Disse o que eu
pensava que estava acontecendo, porque não con
cordo com o Dr. Bion. Disse que seria interessante
saber o que outras pessoas pensam, mas algum de
vocês responde? Nem um só. E vocês, mulheres,
são as piores de tôdas, com a exceção da Srta. X.
Como é que podemos chegar a algum resultado se
as pessoas não nos respondem? Vocês sorriem
quando eu falo, à exceção da Srta. X., e eu sei o
que estão pensando, mas vocês estão errados.
34
Chamarei a atenção para um aspecto apenas dêstes
episódios . A primeira paciente disse : 'Vocês (o grupo)
sempre dizem que estou monopolizando . . . ' Na realida�
de, apenas uma pessoa havia dito isso e somente em
uma ocasião, mas sua referência foi feita para o grupo
inteiro e indicava claramente que ela pensava que todo
o grupo sempre sentia isso a respeito dela. O homem do
segundo exemplo falou : 'Vocês sorriem quando eu falo,
à exceção da Srta. X., e eu sei o que estão pensando . . . '.
No terceiro exemplo, a mulher disse : ' . . . só porque era
apenas eu, ninguém me deu a menor atenção.' No quar�
to exemplo, a mulher pensou que o grupo não estava in�
teressado e achou melhor abandonar sua iniciativa. Já
indiquei acima que qualquer pessoa que tenha qualquer
contato com a realidade está sempre consciente ou in�
conscientemente formando uma estimativa da atitude
do grupo para com ela própria . .l!:stes exemplos tirados
de grupos de pacientes mostram, se houvesse realmente
alguma necessidade de demonstração, que o mesmo tipo
de coisas acontece no grupo de pacientes. Por enquanto,
estou ignorando fatos óbvios, como o de que há algo na�
quele que fala que colore sua avaliação da situação ení
que se encontra. Ora, mesmo que ainda seja mantido que
a opinião do indivíduo sôbre a atitude do grupo para
com êle próprio não tem importância para ninguém, a
não ser êle mesmo, espero que fique claro que esta es�
pécie de j ulgamento faz tanta parte da vida mental do
indivíduo quanto a sua avaliação, digamos, das infor�
mações que lhe são trazidas pelo sentido do tato. Dessa
maneira, o modo pelo qual um homem avalia a atitude
do grupo para com êle próprio é, de fato, um importante
objeto de estudo, mesmo que não nos conduza a nada
mais.
Mas meu último exemplo, de ocorrência muito co
mum, mostra que, na realidade, a maneira pela qual
homens e mulheres de um grupo fazem essas estimati
vas é um assunto de grande importância para o grupo,
porque dos juízos que os indivíduos fazem depende o flo
rescimento ou a decadência da vida social daquele.
35
O que acontecerá se eu usar esta idéia da atitude
grupal para com o indivíduo, como base para interpre
tação? Já vimos algumas das reações na primeira parte.
Nos exemplos que dei, podiam ser vistos, embora eu não
os tivesse acentuado, alguns resultados dêste tipo de in
terpretação, mas mencionarei agora uma reação comum.
O grupo tenderá a expressar ainda mais sua preocupação
comigo e, depois, parece ter atingido um ponto em que,
por algum tempo, a sua curiosidade é satisfeita. Isto pode
levar duas ou três sessões. Depois, o grupo começa a
coisa tôda de nôvo, mas, desta vez, com algum outro
membro do grupo. O que acontece é que outro membro
torna-se o objeto das fôrças que estavam anteriormente
concentradas sôbre mim . Quando penso que j á se
acumularam provas suficientes para convencer o gru
po, digo que penso que isso aconteceu. Uma das dificul
dades para fazê-lo é que a transição de uma preocupa
ção comigo para uma preocupação com outro membro
do grupo é assinalada por um período durante o qual a
preocupação com o outro membro mostra sinais inequí
vocos de conter uma preocupação continuada comigo .
Já descrevi esta situação na primeira parte (pág. 25) ,
onde me descrevo como fornecendo uma interpretação
em que, ao questionar outros, o grupo se encontra real
mente preocupado comigo. Penso que, nessa ocasião,
teria sido mais exato se houvesse interpretado a situa
ção emocional como uma transição do tipo que acabei
de descrever.
Muitas pessoas discutem a exatidão dessas interpre
tações. Mesmo quando a maioria dos membros do grupo
teve provas inequívocas de que seu comportamento está
sendo influenciado por uma avaliação consciente ou in
consciente da atitude do grupo para com êles, dirão que
não sabem o que o resto do grupo pensa a seu respeito
e que não acreditam que alguém mais tampouco o saiba.
Esta objeção à exatidão das interpretações deve ser acei
ta, mesmo se a modificarmos alegando que a exatidão
é uma questão de grau, porque é um sinal de consciên
cia que um dos elementos na avaliação automática do
indivíduo quanto à atitude do grupo para com êle sej a
36
a dúvida. Se um indivíduo alega que ri.ão tem dúvida
alguma, gostar-se-ia realmente de saber porque não.
Existem ocasiões em que a atitude do grupo é comple
tamente inequívoca? Ou é o indivíduo incapaz de to
lerar a ignorância sôbre um assunto em que é essencial
ser · exato, se é que seu comportamento numa sociedade
deve ser judicioso? Num certo sentido, eu diria que um
indivíduo de um grupo está aproveitando sua experiên
cia, se, num só e mesmo tempo, êle se torna mais exato
na apreciação que faz de sua posição no campo emocio
nal e mais capaz de aceitar como um fato que mesmo
sua exatidão aumentada acha-se lamentàvelmente mui
to abaixo de suas necessidades.
Poder-se-ia pensar que minha admissão destrói as
bases de qualquer técnica que se appie neste tipo de in
terpretação, mas ela não o faz. A natureza da experiên
cia emocional da interpretação é clarificada, mas sua
inevitabilidade como parte da vida mental humana per
manece inalterada e, assim, também o seu primado como
método. Isso só pode ser atacado quando se puder de
monstrar que alguma outra atividade mental trata com
mais exatidão de assuntos de maior relevância para o
estudo do grupo.
Apresentamos, a seguir, um exemplo de uma rea
ção em que a exatidão da interpretação é questionada ;
o leitor poderá desejar ter as passagens anteriores em
mente quando considerar as conclusões que tiro disto
e dos exemplos correlatos.
Por algum tempo, eu estivera dando interpreta
ções que haviam sido escutadas com civilidade, mas a
conversa havia-se tornado cada vez mais desencontra
da, comecei a sentir que minhas intervenções não eram
desejadas e assim o disse, nos seguintes têrmos : - Du
rante a última meia-hora o grupo estêve discutindo a
situação internacional, mas estive alegando que a con
versa mostrava alguma coisa sôbre nós mesmos. Cada
vez que fiz isso, senti que minha contribuição era des
toante e mal recebida. Agora, acho-me certo de ser o
objeto da hostilidade de vocês, por persistir neste tipo
de contribuição.
37
Por um momento ou dois após haver eu falado, hou
ve um silêncio e, então, um membro masculino do
grupo disse muito cortêsmente que êle não havia sen
tido hostilidade alguma por minhas interpretações e
que não havia observado que alguém tampouco a hou
vesse sentido. Dois ou três outros membros do grupo
concordaram com êle. Além disso, as afirmativas foram
feitas com moderação e de uma maneira perfeitamente
amistosa, exceto, possivelmente, pelo fato de se poder
pensar que era um incômodo desculpável ter-se de dar
uma tranqüilização que deveria ser desnecessária. Sob
alguns aspectos, poderia novamente dizer que me senti
tratado como uma criança a quem se trata paciente
mente, a despeito de ser cansativa. Contudo1 não me
propus a considerar êsse ponto j ustamente então, mas
antes tomar perfeitamente a sério a declaração feita por
aquêles membros do grupo que me pareciam represen
tar o grupo inteiro muito bem, ao negar qualquer sen
timento de hostilidade. Senti que uma avaliação correta
da situação exigia que eu aceitasse como um fato que
todos os indivíduos do grupo eram perfeitamente since
ros e exatos quando diziam não sentir qualquer hostili
dade para comigo.
Lembro-me de outro episódio, de tipo semelhante.
Além de mim, três homens e quatro mulheres acha
vam-se presentes no grupo; um homem e uma mulher
encontravam-se ausentes. Um dos homens disse a uma
das mulheres :
38
Após uma curta pausa, o homem enceta no
vamente :
39
zeram tudo o que puderam, que agora compete a mim
e, na realidade, acho que estão absolutamente certas.
Penso se haveria alguma vantagem em dizer que êles
se sentem assim a meu respeito, mas afasto a idéia, por
que não parece haver sentido em lhes dizer o que j á
devem saber.
As pausas estão ficando mais longas, os comentá
rios cada vez mais fúteis, quando me ocorre que os sen
timentos que eu próprio estou experimentando - em
particular, uma opressão pela apatia do grupo e uma
premência de dizer algo útil e iluminador - são pre
cisamente aquêles que os outros presentes devem ter.
Um grupo cujos membros não podem freqüentá-lo re
gularmente tem de ser apático e indiferente aos sofri
mentos do paciente individual.
Quando começo a pensar o que posso dizer à guisa
de interpretação, defronto-me com uma dificuldade que
j á terá ocorrido ao leitor : o que é êste grupo que é anti
pático e hostil ao nosso trabalho? Tenho de presumir
que êle consiste nas mesmas pessoas que vejo esforçan
do-se àrduamente para efetuar o trabalho, mas, até onde
me concerne, pelo menos, êle também inclui os dois au
sentes. Lembro-me de haver um dia olhado ao micros
cópio uma secção demasiadamente espêssa; com um dos
focos eu via, não muito claramente talvez, mas com bas
tante nitidez, uma imagem. Se alterava o foco muito
ligeiramente, via outra. Usando isto como analogia para
o que estou fazendo mentalmente, lançarei agora outro
olhar sôbre êste grupo e descreverei a configuração que ·
40
Numa sessão anterior, êste grupo foi liderado por um
dos membros hoje ausentes. Como dizia, estou inclinado
a pensar que os atuais líderes dêste grupo não se en
contram na sala; são êles os dois faltosos, que são sen
tidos como não apenas desdenhando do grupo, mas tam
bém expressando êsse desdém em ações. Os membros do
grupo que estão presentes são seguidores. Fico pensan
sando, enquanto escuto o debate, se posso tornar mais
precisos os fatos que rrie dão essa impressão.
A princípio, tenho de confessar, vejo pouca coisa
que me confirme minhas suspeitas, mas então observo
que um dos homens que está fazendo as perguntas em
prega um tom particularmente arrogante. Sua reação
às respostas que recebe me parece, se mantenho meu
microscópio mental no mesmo foco, expressar uma poli
da incredulidade. Uma mulher a um canto examina as
unhas com um ar de leve desgôsto. Quando um silêncio
ocorre, é quebrado por uma mulher (que, sob o foco
anterior, parecia estar dando o melhor de si para man
ter em funcionamento o trabalho do grupo) através de
uma interjeição que expressa claramente sua dissocia
ção de participar num j ôgo essencialmente estúpido.
Não penso que me tenha saído muito bem em dar
precisão às minhas impressões, mas acho que encontrei
o caminho para resolver a dificuldade em que me en
contrei no primeiro exemplo. Naquela ocasião, como deve
ser lembrado, senti muito positivamente que o grupo
estava hostil a mim e às minhas interpretações, mas
não possuía nem uma migalha de prova para respaldar
persuasivamente minha interpretação. Para falar a ver
dade, achei as duas experiências muito desconcertantes;
parecia que meu método escolhido de investigação se
havia desmoronado, e da maneira mais evidente. Qual
quer pessoa acostumada à terapêutica individual pode
ria ter predito que um grupo de pacientes negaria uma
interpretação e qualquer pessoa poderia haver predito
que o grupo apresentaria uma oportunidade enviada
pelos céus para negá-la efetivamente. Ocorre-me, con
tudo, que se um grupo se permite esplêndidas portuni
dades para evasão e negação, deveria também permitir
41
oportunidades igualmente esplêndidas para a observa
ção da maneira pela qual estas evasões e negações são
efetuadas. Antes de investigar isto, examinarei os dois
exemplos que forneci, com vistas à formulação de aigti.
ma hipótese que dê forma à investigação.
Pode-se ver que aquilo qu e um indivíduo diz ou faz
num grupo ilumina tanto sua própria personalidade
quanto a sua opinião do grupo; às vêzes, sua contribui
ção ilumina uma mais que a outra. !le está preparado
para efetuar algumas contribuições como provindas ine
quivocamente de si mesmo, mas existem outras que gos
taria de fazer anônimamente. Se o grupo pode fornecer
meios pelos quais as contribuições possam ser feitas anô
nimamente, acham-se então· lançadas as bases para um
sistema bem sucedido de evasão e negação e, no.s pri
meiros exemplos que dei, era possivelmente porque a
hostilidade dos indivíduos estava sendo colocada anô
nimamente no grupo, de modo que cada membro dêle
podia, com tôda a sinceridade, negar que estivesse se
sentindo hostil. Teremos de examinar intimamente a
vida mental do grupo para descobrir como êste fornece
meios para a efetivação destas contribuições anônimas.
Postularei uma mentalidade de grupo como o fundo co
mum ao qual as contribuições anônimas são efetuadas e
através do qual os impulsos e desejos implícitos nestas
contribuições são satisfeitos. Qualquer contribuição a
esta mentalidade de grupo tem de angariar o apoio das
outras contribuições anônimas dêle ou achar-se em con
formidade com elas. Deveria esperar que a mentalidade
de grupo se distinguisse por uma uniformidade contras
tante com a diversidade de pensamento existente na
mentalidade dos indivíduos que contribuíram para a sua
formação. Deveria esperar que a mentalidade de grupo,
tal como a postulei, se opusesse aos objetivos confessa
dos dos membros individuais do grupo. Se a experiên
cia demonstrar que esta hipótese preenche uma função
útil, outras características da mentalidade de grupo po
dem ser-lhe acrescentadas, a partir da observação
clínica.
42
A seguir, algumas experiências que me parecem es
tar correlacionadas com o assunto.
O grupo consiste em quatro mulheres e quatro ho
mens, inclusive eu. As idades dos pacientes acham-se
entre 35 e 40 anos. A atmosfera prevalecente é de boa
disposição e prestimosidade. A sala acha-se alegremen
te iluminada pela luz da tarde.
43
Sra. Z. : - Eu posso ficar sentada em casa per
feitamente, mas é nunca ser capaz de sair para
parte alguma que me incomoda. Se não pode ficar
sentado em casa, por que não não vai a um cinema
ou coisa assim?
44
pode ser obtida fora de um grupo propriamente dito. De
momento, observarei que na mentalidade de grupo o
indivíduo encontra um meio de expressar contribuições
que êle desej a fazer anônimamente e, ao mesmo tempo,
o maior obstáculo à consecução dos objetivos que deseja
atingir pela filiação ao grupo.
Poder-se-á pensar que existem muitos outros obstá
culos à consecução dos objetivos do indivíduo num gru
po. Não desejo prej ulgar o assunto, mas, por enquanto,
não concederei muita importância a êles. É claro que
quando um grupo se forma, os indivíduos que o formam
esperam obter alguma satisfação dêle. É claro, também,
que a primeira coisa de que se dão conta é um sentimen
to de frustração produzido pela presença do grupo de
qut; s�o mem.bros. Pode-se argumentar que é inteira
mente inevitável que um grupo satisfaça alguns dese
jos e frustre outros, mas me sinto inclinado a pensar que
as dificuldades inerentes a uma situação de grupo, tais
como, por exemplo, a perda de intimidade (privacy)
que deve decorrer do fato de que um grupo fornece
companhia, produzem um tipo de problema diferente da
espécie de problema produzido pela mentalidade de
grupo.
Freqüentemente mencionei o indivíduo no decurso
de minhas discussões do grupo, mas avançando o con
ceito de uma mentalidade de grupo. Descrevi o indiví
duo, especialmente no episódio em que os dois ausentes
desempenharam um grande papel na orientação emocio
nal do grupo, como sendo, de certa maneira, oposto à
mentalidade do grupo, embora contribuindo para êle.
Já é tempo de nos voltarmos para a discussão do indi
víduo e, assim fazendo, proponho-me a abandonar o neu
rótico e seus problemas.
A_ristóteles disse que o homem é um animal político
e, na medida em que compreendo a sua Política, de
preendo que o que êle quis dizer com isso é que para
um homem levar uma vida plena o grupo é essencial.
Não pretendo defender o que sempre me pareceu ser
uma obra extremamente árida, mas penso que esta afir
mação é uma daquelas que os psiquiatras não podem
45
.
esquecer sem risco d e chegar a uma visão desequilibra
da de seu tema. A proposição que desejo demonstrar é
a de que o grupo é essencial para a realização da vida
mental de um homem - tão essencial para isto quanto
para as atividades mais evidentes da economia e da
guerra. No primeiro grupo acima descrito (págs. 2 1 e
segs.) , pude dizer que o grupo era essencial para mim
mesmo porque desejava ter um grupó para estudar; pre
sumivelmente, os outros membros podiam dizer o mes
mo, mas, mesmo havendo admitido isto como o obj etivo
dos membros individuais, inclusive eu próprio (e deve
rá ser lembrado que não fiz tal coisa) , considero que a
vida mental de grupo é essencial para a vida integral
do indivíduo inteiramente à parte de qualquer necessi
dade temporária ou específica, e que a satisfação dessa
necessidade tem de ser buscada através da filiação a um
grupo. Ora, aquilo que emerge de todos os grupos de
que estive tirando exemplos é que o sentimento mais
proeminente experimentado pelo grupo é um sentimen
to de frustração - uma surprêsa muito desagradável
para o indivíduo que chega buscando gratificação. O
ressentimento causado por isto pode, naturalmente, ser
devido a uma incapacidade ingênua de compreender o
argumento que acima demonstrei, de que é da natureza
dos grupos negar certos desejos satisfazendo outros, mas
suspeito que a maior parte do ressentimento é causada
pela expressão num grupo de impulsos que os indivíduos
desejam satisfazer anônimamente e a frustração produ
zida no . indivíduo pelas conseqüências que para si mes
mo decorrem dessa satisfação. Noutras palavras, é nesta
área, que temporàriamente demarquei como meiltali-.
dade de grupo, que proponho procurar as causas do fra
casso do . grupo em conceder ao indivíduo uma vida ·
plena. A situação será percebida como paradoxal e con
tradidória, mas não me proponho f!:!zer nenhuma ten
tativa para resolver estas contradições exatamente ago
ra. Presumirei que o grupo é potencialmente capaz de
suprir o indivíduo com a satisfação de um certo núme
ri de necessidades de sua vida mental que só podem ser
.fornecidas por um grupo. Estou excluindo, evidentemen-
46
te, as satrsfações de sua vida mental que podem ser ob
tidas na solidão e, menos evidentemente, as satisfações
que podem ser obtidafJ dentro de sua família. O poder
que tem o grupo de satisfazer as necessidades do indi- ·
víduo é, sugiro eu, desafiado :�ela mentalidade de grupo.
O grupo enfrenta êsse desafi o pela elaboração de uma
cultura característica sua. E1nprego a expressão 'cultu
ra de grupo' de uma maneira extremamente vaga; in
cluo nela a estrutura que o grupo atinge em qualquer
momento determinado, as ocupações que persegue e a
organização que adota. Referir-me-ei agora às minhas
especulações (pág. 31) sôbre os motivos subjacentes à
insistência do grupo num líder. Disse então que pare
cia ser, na situação que estava descrevendo, uma sobre
vivência emocional funcionando inutilmente ou então
a reação a alguma exigência criada pela consciência de
uma situação que não havíamos então definido. Naque
la ocasião, a tentativa de construir o grupo de maneira
a êste consistir num líder e seus seguidores, acima dos
quais se salientava de modo supremo, · é um exemplo
muito bom da espécie de coisas que incluo na palavra
'cultura'. Se presumirmos que a situação indefinida é a
mentalidade de grupo de que estive falando -
· e penso
que houve boas razões para presumir isso - então o
grupo estava tentando enfrentar o desafio apresentado
à sua capacidade de atender à necessidade do indivíduo
por esta simples cultura de líder e seguidores. Ver-se-á
que, no esquema que estou agora apresentando, o grupo
pode ser encarado como uma ação recíproca entre as ne�
cessidades individuais, a mentalidade de grupo e a cul
tura. Para ilustrar o que desejo significar por esta tría
de, apresento a seguir outro episódio tirado de um
grupo.
Por um período de três ou quatro semanas, eu es
tivera muito mal visto num grupo de pacientes : minhas
contribuições eram ignoradas, com a reação costumei
ra sendo um polido silêncio e, depois, uma continuação
da conversa que, até onde podia ver, não mostrava si
nais de ter-se desviado por quaisquer comentários de
minha parte. Então, subitamente, · um paciente come-
47
çou a apresentar o que o grupo sentiu serem sintomas
de loucura, fazendo afirmações que pareciam ser produ
to de alucinações. Instantâneamente, descobri que fôra
readmitido no grupo. Eu era o líder bom, senhor da si
tuação, inteiramente capaz de tratar com uma crise
daquela natureza ou seja, em resumo, tão excepcional
mente o homem certo para aquela missão que seria pre
sunção de qualquer outro membro do grupo tentar to
mar qualquer iniciativa útil. A rapidez com que a cons
ternação se tranSformou em amena complacência tinha
de ser vista para ser acreditada. Antes do paciente co
meçar a alarmar o grupo, minhas interpretações pode
riam ter sido pronunciamentos oraculares pelo cerimo
nioso silêncio com que eram recebidas, mas eram os pro
nunciamentos de um oráculo em decadência - ninguém
sonharia em considerar seu conteúdo como digno de
nota. Após o grupo ter ficado alarmado, fui o centro de
um culto em seu pleno poder. Encarada do ponto de
vista de um homem comum tentando fazer um trabalho
sério, nenhuma das situações era satisfatória. Uma es
trutura grupal em que um dos membros é um deus, seja
estabelecido ou desacreditado, possui uma utilidade mui
to limitada. A cultura de grupo neste exemplo quase po
deria ser descrita como uma teocracia em miniatura.
Não dou importância a esta fra.se como uma descrição,
exceto na medida em que ajuda a definir o que, naque
la ocasião, eu teria querido dizer por cultura. Havendo
feito isso, o emprêgo adequado de minha hipótese de
indivíduo, mentalidade de grupo e cultura exige uma
tentativa de definir as qualidades das outras duas com
ponentes da tríade. Antes do ponto crucial, a mentali
dade grupal tinha sido de natureza tal que as necessi
dades do indivíduo estavam sendo exitosamente dene
gadas pelo fornecimento de uma boa relação amistosa
entre os pacientes e de uma atitude hostil e cética para
comigo. A mentalidade de grupo funcionou muito du
ramente sôbre êsse paciente em especial, por motivos
em que é desnecessário entrar. Foi possível nessa oca
sião, pela exibição de algo da cultura do grupo, efetuar
uma alteração nêle sem elucidar a mentalidade de gru-
48
po -ou o efeito que ela estava tendo sôbre o indivíduo. O
grupo modificou�se e tornou-se, em sua aparência e com
portamento, muito semelhante a crianças de escola no
período de latência. o paciente, seriamente perturbado,
exteriormente pelo menos, deixou de ser perturbado. Os
indivíduos tentaram então novamente enunciar seus
casos, mas apresentaram apenas problemas que eram
de natureza trivial ou indolor. Pude então sugerir que
o grupo havia adotado um padrão cultural análogo ao
do pátio de recreio e que, embora tivesse de se presumir
que isso atendesse de modo bastante adequado a algu
mas das dificuldades do grupo (queria significar aten
der à mentalidade de grupo, mas não o disse) era essa
uma cultura que permitia apenas mencionar o tipo de
problema que se poderia esperar uma criança de escola
solvesse. O grupo modificou-se novamente e se tornou
um grupo em que todos os membros, inclusive eu pró
prio, pareciam estar mais ou menos no mesmo nível. Na
mesma ocasião, uma mulher mencionou, pela primeira
vez em seis meses, dificuldades conj ugais bastante sérias
que a estavam perturbando.
Espero que êstes exemplos dêem alguma idéia do
que desejo significar por cultura e também uma certa
idéia do que considero ser a necessidade de tentar elu
cidar, se possível, duas das três componentes da tríade.
Minha tentativa de simplificar, através dos concei
tos que esbocei, mostrará ser muito enganadora, a me
nos que o leitor mantenha em mente que a situação
grupal é, na maior parte das vêzes, desorientadora e
desconcertante . Funcionamentos daquilo que chamei de
mentalidade de grupo ou de cultura de grupo apenas
ocasionalmente emergem de maneira excepcionalmente
clara . Além disso, o fato de nos acharmos envolvidos na
situação emocional torna a lucidez difícil . Há ocasiões,
tal como a que descrevi, quando dois membros do grupo
estavam ausentes, em que é claro que os indivíduos estão
lutando contra a apatia do grupo . Nessa ocasião, atribuí
comportamento ao grupo baseado na intensidade do
comportamento de um ou dois de seus indivíduos . Não
há nada fora do comum nisto : diz-se à uma criança
49
que êle ou ela está trazendo desonra para a escola, por
que se espera que o comportamento de um seja inter
pretado como o comportamento de todos . Diz-se aos
alemães que êles são responsáveis pelo comportamento
do govêrno · nazista; quem cala, diz-se, consente . Não
traz muito felicidade insistir sôbre a responsabilidade
coletiva desta maneira, mas presumirei, não obstante,
que a menos que um grupo desautorize ativamente seu
líder, êle estará, de fato, seguindo-o . Resumindo, direi
que tenho plenas j ustificativas para dizer que o grupo
se sente assim ou assado, quando, na realidade, apenas
uma ou duas pessoas pareceriam fornecer, através de
seu comportamento, justificativa para tal afirmação, se,
na ocasião de assim comportar-se, o grupo não mostrar
sinais exteriores de repudiar a liderança que recebe .
Atrevo-me a dizer que será possível basear a crença na
cumplicidade do grupo em algo mais convincente que
provas negativas, mas, por enquanto, encaro a prova
negativa como suficientemente boa .
50
3
51
exemplos, corno ilustração em têrrnos concretos do que
queria dizer, das experiências que me levaram a desen
volver êsses conceitos .
Fazendo interpretações ao grupo evito empregar
têrrnos tais corno mentalidade de grupo : os têrrnos uti
lizados devem ser tão simples e precisos quanto possível.
Dessa maneira, posso dizer, falando do que chamo de
mentalidade de grupo : - Penso que o grupo se uniu
durante os últimos cinco minutos com o fito de deixar
constrangido quem quer que diz ou faz algo para me
ajudar a fornecer novas interpretações . Descrevo en
tão fatos que mostram corno o grupo fêz tais e tais coi
sas que me fizeram pensar que êle estava atuando junto,
corno uma equipe, mesmo quando possa não ter sido
capaz de detectar a maneira pela qual êsse trabalho de
equipe se efetuou . Se achasse ter alguma prova do modo
pelo qual êle se realizou, eu a daria .
Ou posso dizer, falando do que chamo de cultura
de grupo, que estamos agora nos comportando corno se
fôssemos iguais, homens e mulheres crescidos, discutin
do livremente e juntos o problema, com tolerância por
diferenças de opiniãCJ e sem preocupação com um 'di
reito' de expressar um ponto de vista .
· Ou, falando para o indivíduo, posso dizer : - O Sr. X
está tendo dificuldade porque quer que um problema
seu sej a tratado, mas acha que vai criar problemas com
o resto do grupo, se preseverar em sua tentativa .
Dei êste último exemplo para demonstrar que a si
tuação podia igualmente ter sido descrita em têrrnos de
mentalidade de grupo, corno no primeiro exemplo . Isto
não é algo importante em si próprio, mas o psiquiatra
tem de decidir qual a descrição que melhor lhe escla
rece a situação e, depois, em que têrmos deverá êle des
crevê-la para o grupo .
Não perderei mais tempo com a maneira pela qual
as interpretações devem ser enunciadas ; é importante,
mas não acho que possa ser fàcilrnente transmitida num
livro . Presumirei, dessa maneira, que o leitor compreen
de que a situação deve ser descrita em têrmos concretos
e as informações forneCidas tão plena e precisamente
52
quanto possível, sem mencionar conceito teóricos em
que as próprias opiniões do psiquiatra se basearam .
Como é que o emprêgo dêsses três conceitos - men
talidade de grupo, cultura de grupo e indivíduo - como
fenômenos interdependentes, opera na prática? Não
muito bem : descobri que o grupo reagia de uma ma
neira cansativamente errática . Pude dar interpretações
do tipo que descr evi e, de vez em quando, a reação que
se seguia podia ser explicada como um desenvolvimen
to lógico da interpretação que havia dado, mas havia
exceções desorientadoras . O grupo alterava-se de ma
neiras que me deixavam dificuldade e incapaz de apli
car minhas teorias de qualquer modo que me conven
cesse . Ou, então, sentia que elas eram inaplicáveis ou,
alternativamente, que iluminavam um aspecto da situa
ção que não possuía significação .
Gostaria de poder dar exemplos concretos, mas nào
posso registrar o que foi realmente dito e, de qualque1
modo, aquilo que abria buracos eni minhas teorias nã0
eram as palavras utilizadas, mas sim a emoção que as
acompanhava . Dessa maneira, valer-me-ei de um relato
confessadamente subj etivo .
"Disse que o efeito da interpretação era errático ; en
tretanto, após certo tempo, pensei que alguns padrões
de comportamento estavam aparecendo de nôvo e, em
particular, um padrão que era mais ou menos assim :
dois membros do grupo envolviam-se numa discussão ; às
vêzes, as trocas de palavras entre os dois mal podiam
ser descritas, mas era evidente que estavam envolvidos
um com o outro e que o grupo, como um todo, assim
pensava também . Nessas ocasiões, o grupo ficava sen
tado em silêncio atento, comportamento bastante sur
preendente, tendo em vista a impaciência do neurótico
com qualquer atividade que não se centralize em seu
próprio problema . Sempre que duas pessoas começam a
manter êste tipo de relação no grupo - sejam elas um
homem e uma mulher, dois homens ou duas mulheres
- parece ser uma suposição básica, sustentada tanto
pelo grupo como pelo par interessado, que a relação é
uma relação sexual . É como se não pudesse haver um""
53
razão possível para duas pessoas se reunirem, a não ser
o sexo . O grupo tolera esta situação e, embora sorrisos
de cumplicidade sejam trocados, parece preparado para
permitir que o par continue indefinidamente seu inter
câmbio . Há exceções, mas não são tão numerosas quan
to se poderia imaginar, considerando que os outros in
divíduos do grupo possuem uma boa quantidade de
coisas que gostariam de dizer .
Ora, é claro que duas pessoas de um grupo podem
estar-se reunindo para qualquer número de propósitos
que não sej am sexuais; assim, deve existir um conside
rável conflito �ntre o desej o que tem o par de perseguir
o obj etivo que mantém conscientemente na mente e as
emoções derivadas da suposição básica de que duas pes
soas só se podem reunir para um único propósito e que
êsse propósito é sexual .
No devido curso do tempo, o par cai em silêncio e,
se é perguntado porque, pode encontrar fàcilmente à
mão muitas boas razões para responder : que êles não
desejam monopolizar a conversa, que j á disseram tudo
o que tinham a dizer . Não nego a validade destas expli
cações, mas acrescentaria outra, que é a consciência de
que seu contato não se conforma à suposição básica do
grupo ou, alternativamente, a ela se conforma, mas não
a outras opiniões do que seja um comportamento ade
quado em público .
Qualquer pessoa que j á tenha empregado uma técni
ca de investigação que dependa da presença de duas pes
soas, e a _psicanálise é uma técnica assim, pode ser enca
rada como não apenas tomando parte na investigação
de uma mente por outra, mas também como investigan
do a mentalidade não de um grupo, mas de um par . Se
minha observação sôbre a suposição básica do grupo é
correta, não é de surpreender que tal investigação pa
reça mostrar o sexo a ocupar uma posição central, com
as outras emoções em posição mais ou menos secun
dária .
Se a suposição básica sôbre o par é que êles se reú
nem para p ropósitos sexuais, qual é a suposição básica
de um grupo sôbre pessoas que se reúnem num grupo?
54
A suposição básica é que as pessoas se reúnem em grupo
para fins de preservação do grupo . É comum às dis
cussões tornarem-se cansativas pela preocupação com
membros ausentes como sendo um perigo para a coe
rência do grupo e com membros presentes como sendo
virtuosos por estarem ali .. >Qualquer pessoa que não es
teja acostumada a êste tipo de grupo ficaria surprêsa
em descobrir quanto tempo um grupo de pessoas supos
tamente inteligentes pode ficar conversando, dando vol
tas em tôrno dêste campo muito limitado, como se tal
discussão fôsse emocionalmente satisfatória . Não há
interêsse em tornar o grupo digno de ser preservado e,
na verdade, protestos a respeito da maneira pela qual
êle emprega o seu tempo ou qualquer mudança propos
ta de ocupação são encarados como despropositados à
discussão da temida desintegração do grupo . Fora do
grupo, e às vêzes nêle, os indivíduos acreditam q cw a
maneira pela qual o grupo gasta seu tempo regnla n
intensidade com que as pessoas desejam ser membro:,
dêle, mas, no grupo, demora algum tempo até que o;;
indivíduos deixem de ser dominados pela sensação de
que a adesão ao grupo é um fim em si mesmo .
Meu segundo argumento é o de que o grupo parece
conhecer apenas duas técnicas de autopreservação, a
luta ou a fuga . A freqüência com que um grupo, quan
do está funcionando como um grupo, vale-se de um ou
de outro dêsses dois procedimentos, e apenas dos dois,
para tratar de todos os problemas, fêz-me primeiramen
te suspeitar da possibilidade de existir uma suposição
básica a respeito da formação de um grupo . A obser
vação clínica fornece muitas razões para dizer que a
suposição básica é que o grupo se reuniu para a luta
fuga, como se se dissesse que se encontrou para preser
var o grupo . A última é uma hipótese conveniente para
explicar porque o grupo, que se mostra intolerante com
atividades que não são formas de luta-fuga, tolera, não
obstante, a formação de pares . A reprodução é reconhe
cida como igual à luta-fuga na preservação de um grupo
A preocupação com a luta-fuga leva o grupo a igno
rar outras atividades ou, se não puder fazê-lo, a súp ri-
5'
rní-las ou a fugir delas . Num grupo, a suposição básica
sôbre um grupo conflita tão agudamente com outras opi
niões sôbre o que êle pode fazer quanto a suposição bá
sica sôbre os pares conflita com as outras opiniões sôbre
quais são as atividades adequadas aos pares .
Da suposição básica sôbre grupos origina-se um cer
to número de suposições subsidiárias, algumas de im
portância imediata . O indivíduo sente que, num grupo,
o bem-estar daquele é um assunto de consideração se
cundária : o grupo vem em primeiro lugar; na fuga, o
indivíduo é abandonado; para o grupo, a necessidade
suprema é a de sobreviver ; não o indivíduo .
A suposição básica do grupo entra em conflito muito
agudo com a idéia de um grupo reunido para efetuar um
trabalho criativo, especialmente com a idéia de um gru
po reunido para tratar das dificuldades psicológicas de
seus membros . Haverá o sentimento de que o bem-estar
do indivíduo não importa, desde que o grupo continue,
e haverá também a impressão de que qualquer método
de tratar urna neurose que não seja combatê-la ou fugir
de seu portador é inexistente ou, então, diretamente
oposto ao bem do grupo; um método corno o meu não é
reconhecido corno apropriado para qualquer das técnicas
básicas do grupo .
Todos nós vivemos em grupos, e ternos muita expe
riência, por inconsciente que seja, do que isso represen
ta . Dessa maneira, não é de surpreender que os críticos
de minhas tentativas de utilizar grupos achem que elas
têm de ser cruéis para com o indivíduo ou, então, um
método de fuga de seus problemas . Presume-se que se
o ser humano, como animal gregário, escolhe um grupo,
êle assim o faz para combater algo ou disso fugir .
A existência de tal suposição básica ajuda a expli
car porque os grupos mostram que eu, que sou sentido
como proeminente, como líder do grupo, sou também
sentido como esquivando-me à missão . O tipo de lide
rança que é reconhecido como apropriado é a liderança
do homem que mobiliza o grupo para atacar alguém, ou,
alternativamente, para liderá-lo na fuga . A respeito
56
disso, posso mencionar que quando, com o Dr. Rickman, 1
tentei uma experiência no tratamento de tropas no Hos
pital Militar de Northfield, presumiu-se que estávamos
tentando conseguir tropas para o combate, ou, alterna
tivamente, que nos achávamos interessados em ajudar
uma cambada de cábulas a cóntinuar cabulando . A
idéia de que se pretendia um tratamento foi encarada
como um ardil habilidoso, mas fàcilmente desvendável.
Aprendemos que líderes que não lutam nem fogem não
são fàcilmente compreendidos .
Chegamos agora ao seguinte ponto : reações a inter
pretações baseadas em conceitos de mentalidade de gru
po, cultura de grupo e indivíduo sugeriram que minhas
teorias eram inapropriadas . O reexame expôs a exis
tência de suposições básicas sôbre o objeto das relações
de pares e relações de grupos . A luz destas suposições
básicas, 'proponho modificar os conceitos da mentali
dade grupal, da seguinte maneira :
A mentalidade de grupo é a expressão unânime da
vontade do grupo, à qual o indivíduo contribui por ma
neiras de que não se dá conta, influenciando-o desagra
dàvelmente sempre que êle pensa ou se comporta de um
modo que varie de acôrdo com as suposições básicas .
Assim, trata-se de uma maquinaria de intercomunica
ção que é construída para garantir que a vida de grupo
se acha de acôrdo com as suposições básicas .
A cultura de grupo é uma função do conflito exis
tente entre os desejos do indivíduo e a mentalidade de
grupo .
Seguir-se-á disso que a cultura de grupo apresenta
rá sempre sinais das suposições básicas subjacentes. As
duas suposições básicas que j á descrevi, é necessário
acrecentar mais uma . Trata-se da suposição básica de
que o grupo se reúne para obter segurança de um indi
víduo de quem depende .
O relato anteriormente apresentado (págs. 2 1-32)
mostrou um grupo perplexo pela diferença existente en
tre o que de mim esperavam e o que realmente encon-
57
traram. Houve ansiedade para o grupo avançar ao longo
de linhas bem estabelecidas, como, por exemplo, de um
seminário ou de uma conferência . Embora fôsse com
preendido por cada indivíduo que nos reuníramos para
estudar grupos e suas tensões, no próprio grupo tal ati
vidade de minha parte não parecia ser compreensível .
Quando um líder alternativo surgiu, foi êle pôsto de
lado antes que muito tempo decorresse e o grupo retor
nou à sua lealdade a mim, embora tão contrafeito quan
to antes em reconhecer ou aceitar o tipo de liderança
que eu fornecia . Descrevi o desejo do grupo de me ex
cluir dentre seus membros . Noutra ocasião, não muito
semelhante, membros do grupo disseram-me que esta
vam sendo feitas tentativas para sabotá-lo . Naquele ca
pítulo, disse que o grupo exigia um líder para preencher
uma função que não apresentava objetivo ou, pelo me
nos, uma função para a qual eu não havia observado
nenhum escopo .
A revisão de minhas teorias permitiu-me compreen
der a situação melhor do que antes ; minhas explicações
e interpretações teriam apresentado maior coesão se eu
tiv�sse podido relacioná-las aos conceitos que acabei de
descrever .
Em primeiro lugar, a tentativa de utilizar o grupo
corno" um seminário destinava-se a mantê-lo fixado a um
nível refinado e racional de comportamento, apropriado
à realização dos obj etivos que os indivíduos queriam per
seguir; era como se o grupo se desse conta de que sem
alguma tentativa dêsse tipo, meu procedimento condu
ziria à imposição de um tipo de grupo que seria mais um
entrave que urna ajuda à consumação dos desejos cons
cientes do indivíduo .
Fracassada esta tentativa, começou a emergir o
grupo que é, segundo minha teoria, dominado pelas SU··
posições básicas de unidade para fins de luta ou fuga .
Com o surgimento dêsse grupo, a liderança que eu
estava exercendo não ficou mais reconhecível como lide
rança . Por ocasião da advertência contra sabotagem,
houvesse eu sido o líder que o grupo esperava, teria com
preendido o convite para reconhecer a existência de um
58
inimigo - o primeiro requisito dêste tipo de grupo . Se
só se pode lutar ou fugir, tem-se de se encontrar algo
com que lutar ou de que fugir .
O líder substituto falhou, mas, a êste respeito, D
grupo comportou-se de modo peculiar . Segundo minha
experiência, a maior parte dos grupos - e não apenas
grupos de pacientes - encontra um substituto que a
satisfaz inteiramente . Trata-se geralmente de um ho
mem ou de uma mulher com acentuadas tendências pa
ranóides ; se a presença de um inimigo não fôr talvez
de imediato evidente ao grupo, a melhor coisa que pode
fazer é escolher um líder para quem ela o é .
Uma revisão de minhas experiências passadas com
grupos indica que elas não eram incompatíveis com meus
conceitos revisados . Passarei agora à aplicação dessas
teorias na prática .
Foi o seguinte o que aconteceu com um grupo em
que eu havia dado interpretações, mostrando como o tra
tamento havia produzido sentimentos desagradáveis em
seus membros . O efeito das interpretações foi fazer os
membros sentirem que eu ameaçava o grupo 'bom' . Em
certo ponto, aconteceu minha interpretação basear-se
em observações feitas pela Srta Y . Ela escutou o que eu
disse e continuou muito serena, como se eu não hou
vesse falado nada . Poucos minutos mais tarde, quando
dava outra interpretação da mesma espécie, coisa igual
aconteceu e, alguns instantes depois, a mesma coisa . O
grupo caiu em silêncio . No momento em que a Srta. Y.
ignorara a minha interpretação, dei-me conta de que o
grupo se havia reunido como um grupo ; não tinha qual
quer dúvida sôbre isso . Ao final de minha terceira in
terpretação, estava certo não apenas de que o grupo se
havia reunido, mas que assim o fizera para pôr fim às
minhas intervenções . Fiquei certo de que esta determi
nação recebera sua corporificação na pessoa do Sr. X.,
que não dissera uma só palavra em nenhuma das vêzes.
O Sr. X. era um homem com intensos sentimentos de
ódio e um acentuado mêdo de sua agressividade . Fala
va apenas quando o grupo era um grupo de acasalamen
to ou, então, um grupo reunido para satisfazer a ne-
59
cessidade de dependência . Em ambos os tipos de grupo,
embora falasse, falava com acanhamento, pelo menos
até êle próprio haver-se desenvolvido . Mas, no grupo
reunido como um grupo, êle ficou sentado em silêncio e
deu-me a impressão de se achar profundamente satis
feito emocionalmente . Foi essa a impressão que êle deu
neste ponto de minha história .
Durante o silêncio, dei-me conta de que outro pa
ciente do grupo estava experimentando uma intensa sa
tisfação emocional . Sob alguns aspectos, parecia ser de
menor importância que o Sr . X. e, na verdade, subor
dinado a êle . O Sr. M., pois assim o chamarei, ficou sen
tado com o olhar fixo no Sr . X . De tempos em tempos,
seus olhos vagueavam pensativamente pelos outros
membros do grupo, como se estivesse cuidando para ver
se algum dêles desejava encontrar seu olhar . O Sr. M.
raramente fala de suas próprias dificuldades e, quando
o faz, fala como se desejasse incentivar o grupo, mos
trando-lhes que não há mal nenhum em ser cândido;
apesar disso, se tal é o seu objetivo, deve fracassar nêle,
porque, sem dúvida, os mais perceptivos · tiram outras
conclusões da amostra que sua contribuição apresenta
de uma seleção polida e cuidadosa . Nesta ocasião, em
que seu olhar repousava sôbre todos os indivíduos, como
se fôsse um convite a falar, o seu convite passou des
percebido .
A Srta. J. começou a relatar um mal-estar que ha
via sofrido em seu trabalho . Ao terminar, interpôs ani
madamente uma tentativa de interpretação de seu com
portamento . Descreveu depois ainda alguns episódios,
mas, finalmente, abandonou a tentativa de ignorar a
hostilidade pétrea do grupo e caiu em silêncio, obser
vando que supunha estar demasiadamente embaraçada
para prosseguir .
A Srta. H . , que avançou no hiato seguinte, só con
seguiu pronunciar algumas frases antes de sucumbir .
Após o silêncio haver continuado por algum tempo,
observei que alguns indivíduos, como a Srta. J. e a
Srta. H. em particular, haviam tentado prosseguir com
o tratamento, como achavam que êle deveria ser, falan-
60
do de suas dificuldades, em parte porque sentiam que
me ajudar era uma coisa útil a fazer e em parte porque
desej avam romper o sentimento hostil no grupo . O si
lêncio, pensei, podia ser encarado tanto como uma ex
pressão de hostilidade do grupo, quanto como uma ex
pressão da consciência dos indivíduos de que no grupo,
tal como se achava, nenhum trabalho criativo podia ser
feito .
A situação que descrevi foi uma situação emocional
e ela não é fàcilmente transmissível pelo relato das pa
lavras empregadas . É dês te tipo de episódio de que estou
falando quando falo do grupo se reunindo como um
grupo . Quando o grupo se reuniu desta maneira, tor
nou-se algo tão real e tão parte da vida humana como
uma família, mas êle não é, de maneira alguma, a mes-
ma coisa que uma família . O líder de um grupo assim
acha�se muito distante de ser o pai de uma família. Em
certos estados emocionais especiais, que mais tarde des
creverei, ,o líder aproxima-se de um pai, mas, nesta es
pécie de grupo, qualquer membro seu que apresente qua
lidades paternas cedo descobre que não possui nada do
status, das obrigações ou dos privilégios geralmente as
sociados a um pai ou a uma mãe . Na verdade, na me
dida em que, como psiquiatra, se espera de mim que
apresente qualidades paternas, minha própria posição
no grupo se torna anômala neste ponto e a expectativa
funciona como uma razão adicional para a minha ex
clusão dêle - adicional ao fato de que meu comporta
mento j á fizera o grupo reunir-se contra mim como sen
do o inimigo do grupo . É necessária a autoridade confe
rida pela minha posição de psiquiatra para poder man
ter-me no quadro, quando a suposição básica implica
que uma pessoa cuja preocupação primária é com o
bem-estar do indivíduo está fora de lugar nêle .
O Sr. X. não teve necessidade de falar neste grupo;
estava unido com êle, pois o sentimento sôbre o qual
se sente mais culpado, o seu ódio destrutivo, é um sen
timento permitido pela suposição básica de que o grupo
se reuniu para lutar ou fugir .
61
O Sr. M. desempenhou um papel interessante; acho
necessário dedicar-lhe uma atenção cuidadosa . Antes
que eu pudesse dar uma interpretação que fôsse com
preendida pelo grupo, tinha de observar a expressão do
rosto dêle e a ordem em que convocava os membros do
grupo a participar . Era como se estivesse vendo um fil
me mudo de um homem a reger uma orquestra : que
espécie de música desejaria evocar? A função do Sr. M.
era manter a hostilidade viva, de maneira que ninguém
pudesse deixar de notar a minha impotência em efetuar
qualquer mudança na situação .
Continuei a chamar a atenção, pormenorizadamen
te, para as peculiaridades emocionais desta situação .
Pude indicar que indivíduos que apresentavam dificul
dades suas para pedir ajuda eram ignorados ou repeli
dos, que as tentativas de ser cónstrutivo eram similar
mente tratadas, que parecia haver uma sutil compreen
são entre todos os membros do grupo e que trabalhára
mos juntos como uma equipe em tudo o que fizéramos .
Pude mostrar que diversos membros do grupo, como, por
exemplo, o Sr . M . , estavam-se comunicando por um sis
tema de gestos, amiúde de grande sutileza, com o resto
do grupo . Acrescentei que poderia haver outros meios
de comunicação ainda não identificados, talvez porque
nossos podêres de observação eram ainda muito limi
tados .
Não é inteiramente correto dizer que minhas inter
pretações estavam sendo ignoradas . Havia em anda
mento algo que me fêz sentir que alguma coisa do que
dissera estava sendo recebida, mas, até onde concernia
à aparência exterior, ou poderia ter sido isolado do resto
do grupo por uma chapa de vidro à prova de som. Cer
tamente, minhas interpretações não causaram diferença
alguma ao comportamento do grupo, que continuou sem
reagir por uns bons trinta minutos, até o tempo haver-se
esgotado . Como o leitor pode imaginar, tive de pergun
tar a mim mesmo porque não houvera reação . As teo
rias poderiam achar-se novamente erradas ou, alterna
tivamente, incorreta a minha interpretação . Na reali
dade, sentia que estava tratando com uma situação si-
62
milar àquela que se obtem numa psicanálise, g,uando a
fa lta de reação do paciente revela-se, numa sessao subse
qüente, ter sido muito parcial .
Fôra isso, de fato, o que acontecera . Na sessão se
guinte, o grupo foi aquilo que descrevi como o grupo reu
nido para fins de formação de acasalamento . Preferiria,
contudo, não prosseguir mais com a descrição dêste gru
po, mas, em seu lugar, descrever uma ocasião em outro
que servirá melhor para esclarecer a mudança de uma
cultura de grupo para outra . No exemplo que dei, as
interpretações pareceram operar seus efeitos no inter-·
valo entre as reuniões . Desejo descrever agora uma ses ..
são em que a mudança estava, na realidade, em vias de
se realizar . Escolherei uma ocasião em que a mudança
proveio do grupo de luta-fuga .
.
O grupo estivera freqüentemente no estado de luta
fuga . Nesta ocasião, a cultura de grupo estava-se mos
trando extremamente enfadonha para um certo núme
ro de indivíduos e, nesse ponto, um homem começou a
conversar comigo . Não seria justo dizer que a conversa
era sem sentido, porque possuía substância suficiente
para exigir uma resposta . Após algumas frases, êle se
interrompeu, como se se desse conta de que estava no
fim de seus recursos na arte de falar sem dizer nada e
não quisesse perseverar até chegar a um ponto em que
isso se tornasse óbvio demais . Foi seguido por uma mu
lher a fazer quase a mesma coisa . Ambos se comporta-·
vam como se estivessem satisfeitos com o sucesso de seu
empreendimento . Cada um dêles, por sua vez, repetiu o
procedimento com dois outros membros do grupo . Nes
te ponto, outros tentaram conversar mais ou menos da
mesma maneira que os pioneiros, mas se podia notar
que as conversas não eram mais sem sentido .
Houvesse observado êste comportamento numa psi
canálise, ficaria inclinado a pensar que o paciente de
sejava obter um reasseguramento de confiança pelo es
tabelecimento daquilo que podia achar ser um contato
amistoso comigo, sem de maneira nenhuma divulgar a
natureza da ansiedade sôbre a qual desejava ser tran-
·
qüilizado .
63
Na situação de grupo, quase a mesma interpretação
poderia ter sido feita, mas, se êste comportamento ti
vesse de ser acuradamente afinado às emoções daquela
ocasião e daquele lugar, então a interpretação necessita
ria ser uma interpretação que desse o devido pêso às
funções sociais que os indivíduos estavam desempenhan
do . Por conseguinte, interpretei seu comportamento
como uma manipulação do grupo; êles estavam tentan
do romper a cultura de luta-fuga pelo estabelecimento
de relações de pares . Como primeira · medida dêsse pro
cedimento, entraram em contato comigo, porque a ex
periência havia-lhes mostrado que era menos provável
que eu- estivesse tão envolvido emocionalmente na situa
ção do grupo, a ponto de ser incapaz de reagir . Daí, era
apenas um passo fazer a mesma coisa com outros mem
bros do grupo e, dêsse ponto em diante, apenas questão
de minutos para o grupo se transformar no grupo reu
nido para fins de acasalamento . Uma vez houvesse isso
acontecido, a discussão dos problemas individuais tor
nar-se-ia novamente possível .
Disse que desejava fornecer êste exemplo para ilus
trar a mudança realmente a se efetuar, mas gostaria de
continuar com o episódio para mostrar o que acontece
aos indivíduos quando o grupo passa de uma cultura
de grupo para outra e retorna à primeira .
Como disse, êste grupo estivera sofrendo a frustra
ção de tentar viver numa cultura de luta-fuga . Por al
gum tempo, o grupo de acasalamento pareceu permitir
um alívio bem-vindo, mas, antes que muito tempo se
passasse, tornou-se evidente que essa espécie de grupo .
tinha as suas desvantagens também . Para só mencio
nar isto, meu próprio papel não podia ser desempenha
do muito satisfatàriamente . No grupo de luta-fuga, a
suposição básica do grupo tornava difícil aos indivíduos
prestar muita atenção ao que eu fazia ou dizia . No gru
po de acasalamento, a suposição básica tornava difícil
a qualquer indivíduo sustentar uma conversa comigo .
Ela tornava a conversa difícil para qualquer par, mas a
posição peculiar ocupada pelo terapeuta exacerbava a
dificuldade . As pessoas familiarizadas com a teoria psi-
64
canalítica compreenderão o tipo de dificuldades que se
apresentam quando a conversa continua .
Mencionei que na cultura de luta-fuga, as reações
do grupo colocam em posição saliente o indivíduo com
tendências paranóides . Efeitos semelhantes são obtidos
quando o grupo passa a outras culturas. Desde que nos
demos conta das mudanças de uma cultura de grupo
com uma determinada suposição básica para uma cul
tura de grupo com outra suposição .básica, torna-se pos
sível utilizar essas mudanças para o benefício de nossa
observação clínica, de maneira muito semelhante a que
os cientistas de outros campos empregam quando utili
zam mudanças de comprimento de onda para obter di
ferentes aparências fotográficas do objeto que desejam
estudar .
Nas culturas de grupo que mencionei até agora,
cria:m-se dificuldades para o psiquiatra, porque sua ta
refa não se ajusta fàcilmente àquilo que é exigido pela
suposição básica de um líder de grupo . Isto torna o gru
po despreparado para receber a contribuição que o te
rapeuta efetua . O terapeuta que experimente uma falta
de reação de grupo deve, penso eu, manter isto em men
te como sendo um fator que contribui com sua cota para
os outros fatôres que favorecem a rejeição dêle . Se o
terapeuta suspeitar que sua alta opinião de si próprio
é partilhada pelo grupo, deverá perguntar-se se sua lide
rança começou a corresponder àquilo que é pedido pela
suposição básica do grupo .
Quero agora considerar o estado que descrevi como
cultura de grupo 'dependente' .
A suposição básica desta cultura de grupo parece
ser a de que existe um objeto externo cuja função é
fornecer segurança para o organismo imaturo . Isto
significa que uma pessoa é sempre sentida como se
achando em posição de suprir as necessidades do grupo
e, o resto, numa posição de serem supridas as suas ne
cessidades . Quando o grupo ingressa nesta cultura e a
estabelece como alternativa para qualquer uma das ou
tras duas culturas que vem experimentando, acha-se em
evidência quase a mesma espécie de alívio que j á des-
65
crevi na mudança do grupo de luta-fuga para o grupo
reunido em pares . A medida que a cultura se estabelece,
os indivíduos, novamente, começam a mostrar seu des
.::onfôrto . Um fenômeno muito freqüente é o surgimen
to de sentimentos de culpa sôbre a voracidade . Basta
um só momento de reflexão para mostrar que isto bem
poderia ser esperado . A cultura de luta-fuga ou a cul
tura do grupo que se reúne para a formação de pares
não representam, no que concerne ao indivíduo, sobre
vivências de uma atitude além de seu prazo adequado,
embora se possa considerá-las como formas primitivas
de grupo . Mas o grupo constituído para perpetuar o es-·
tado de dependência significa, para o indivíduo, que êle
está sendo ávido em exigir mais que sua parte justa de
atenção paterna . Há, desta maneira, neste grupo, um
embate bastante nítido entre a suposição básica e as
necessidades do indivíduo como adulto . Nas outras duas
culturas, o embate · se dá entre a suposição básica do
que é exigido do indivíduo como adulto e aquilo que êste,
como adulto, sente-se preparado para dar. Nesta cul
tura, o sentimento de que o psiquiatra é um tipo de fi
gura parenta! acha-se muito mais em evidência e, com
isto, vêm as complicações e dificuldades que se poderia
e�perar . O ressentimento por estar numa posição depen
dente acha-se tão em evidência quanto o alívio . Os cons
trangimentos sexuais são diferentes daqueles apresenta
dos no grupo de acasalamento . A c ólera e o ciúme são
mais fàcilmente expressos, mas não possuem a qualidade
maciça e não despertam o mêdo que possuem e desper
tam no grupo de luta-fuga . Isto, naturalmente, é devi
do à suposição básica de que existe um ser que lá se en
contra para providenciar que nenhum acontecimento
desagradável decorra das irresponsabilidades do indiví- ·
66
Quando falei do grupo que desejava, encl:lrar a ses
são como um seminário, disse que uma das razões para
isso era um mêdo inconsciente de que, a menos que . o
grupo fôsse fixado a uma estrutura madura, a intrusão
dos . tipos de grupo que descrevi seria facilitada e os obje
tivos ostensivos dos indivíduos para se juntar ao grupo
seriam frustrados, em vez de promovidos, pelo fato de
se reunirem em grupo . :S:ste impulso acha-se expresso
no grupo terapêutico pelo próprio fato de o chamarmos
um grupo terapêutico . Parece tão racional que pen
semos nêle como grupo terapêutico, que presumamos
que o psiquiatra é o líder e que falemos apenas sôbre
moléstias neuróticas, que pode não ser observado que,
pensando desta maneira e comportando-nos de acôrdo,
estamos tentando fixar o grupo a um modo de compor
tamento que impeça a intrusão dos tipos de grupo que
são temidos .
67
4
68
trutura refinada, assim o grupo de pacientes tem à mão
uma base para se estruturar na convenção geralmente
aceita que vê a incapacidade neurótica como uma doen-·
ça e os terapeutas como 'médicos' .
O GRUPO DE DEPENDÊNCIA
69
das razões disso é que ela não . passa de um tênue dis
farce para o grupo de dependência, de maneira que as
reações emocionais próprias a êste tipo de grupo são
imediatamente evocadas e a estrutura do refinamento
fraqueja seriamente .
Porque deveria isto ter importância? No capítulo
anterior, chamei a atenção para alguns dos desconfor
tos da situação e podemos agora examinar mais alguns.
O grupo de dependência, com sua característica exal
tação de uma pessoa, cria dificuldades para o ambicioso
ou, na verdade, para qualquer um que queira obter uma
oportunidade de ser ouvido, porque isso significa que,
aos olhos do grupo e de si próprios, tais pessoas encon
tram-se numa posição de rivalidade com o líder . O bene
fício não é mais sentido como oriundo do grupo, mas
somente do seu líder, com o resultado de que os indiví.,.
duos só acham que estão sendo tratados quando falam
com o líder do grupo . Isto conduz a uma. sensação -
a mais desagradável, uma vez que se acha associada
com a sensação de pedir demais e receber muito pouco
- de que estão sendo enganados ou deixados definhar .
O alívio obtido pela idéia de que o psiquiatra cuida de
cada indivíduo é inconvincente num grupo que já está
em existência há algum tempo e sabe que a cura difere
de uma experiência presumivelmente passageira de sen
sações agradáveis . Como cada indivíduo acha que está
sendo tratado apenas quando está falando com o psiquia
tra, a sessão parece a todos os membros progredir num
ritmo muito pouco econômico . Esta impressão é apenas
parcialmente aliviada por elucidações pormenorizadas
da maneira pela qual a estrutura dependente do grupo
acha-se unida, a despeito de seus desconfortos .
O aspecto essencial dos desconfortos nesta espécie
de grupo é que êles se originam precisamente da natu
reza do próprio grupo e êste ponto deve ser sempre de
monstrado .
Quando uma estrutura dependente é manifesta, é
muito comum a um indivíduo chegar com uma expe
riência mental desagradável, sôbre a qual deseja falar .
A atitude do grupo torna difícil qualquer consideração
70
do seu problema e a frustração dos obj etivos do pacien
te que isto envolve pode parecer um sério defeito nesta
técnica de grupo, mas, ainda uma vez, deve ficar .. esta
belecido o fato de que não estamos interessados em for
·
necer tratamento individual em público, mas sim em
chamar a atenção para as experiências reais do grupo e,
neste caso, a maneira pela qual o grupo e o indivíduo
tratam com o indivíduo. Há ainda outro ponto : os pa
cientes de grupo freqüentemente chegam com declara
ções cuidadosamente preparadas e falam apenas quando
pensam que podem participar de uma maneira escolhi
da por êles próprios . Se o psiquiatra reagir como se es
tivesse efetuando um tratamento individual em públi
co, cedo dar-se-á conta de que se acha trabalhando con
tra o grupo e que o paciente está funcionando com êste.
Se possuir a fôrça de espírito necessária para evitar esta
armadilha, observará que a exasperação, à primeira vis
ta tão razoável, do paciente cujas prementes dificulda
des pessoais estão sendo ignoradas é ditada, não tanto
pela frustração d e um objetivo legítimo, como pela ex
posição de dificuldades que o paciente não veio discutir
e, em particular, suas características como membro do
grupo, as características da filiação ao grupo, as suposi
ções básicas e o resto disso . Dêsse modo, uma mulher
que comece com uma dificuldade pessoal que acha que
o psiquiatra poderia aliviar se respondesse pela análise
de suas associações, descobre, se êle não fizer isso, que
uma situação totalmente inesperada se desenvolveu e
será de surpreender se o psiquiatra não fôr, então, capaz
de demonstrar dificuldades do grupo, que incluirão di
ficuldades da paciente em questão, que ela poderá achar
muito sem importância, mas que, ao final, mostram não
ser assim . Isto, naturalmente, é muito comum em psica
nálise , isto é, o fato de os tópicos discutidos não serem
aquêles que o paciente chegou para discutir . Sem em
bargo, é importante compreender que o psicanalista
pode fàcilmente cometer num grupo um êrro que nunca
cometeria numa psicanálise, tratando daquele como se
o procedimento fôsse uma psicanálise em público . O
psiquiatra deverá ficar desconfiado se sentir que está
71
tratando do problema que o paciente ou o grupo acham
que êle deveria tratar . �sse ponto é decisivo : se o psi
quiatra puder conseguir audaciosamente utilizar o gru
po, em vez de gastar seu tempo desculpando-se mais ou
menos inconscientemente por sua presença, descobrirá
que as dificuldades imediatas acarretadas são mais do
que neutralizadas pelas vantagens de um emprêgo cor
reto de seu meio (medium) .
No grupo de dependência, a fuga fica confinada ao
grupo ; a luta, ao psiquiatra . O impulso do grupo é
afastar-se do obj eto hostil; do psiquiatra, aproximar-se
dêle . À parte isso, as emoções grupais parecem achar-se
associadas apenas com transições do estado de espírito
de grupo-dependente para um dos outros dois grupos
básicos . As características dêste grupo são imaturidade
nas relações individuais e ineficiência (exceto no grupo
básico) nas relações de grupo - sendo ambas as con
dições contrariadas até o máximo da capacidade do in
divíduo por uma laboriosa comunicação consciente .
Para apreender tôda a significação destas proposições,
seria necessário comparar êste estado de coisas com as
condições correspondentes nas outras espécies de grupo.
Exceto no líder, a temerosidade torna-se a virtude
suprema do indivíduo neste tipo de grupo . A participa
ção neste campo emocional significa uma elevação da
capacidade de · fuga instantânea, assim que qualquer
membro do grupo experimente mêdo . Tal estado de
coisas é muito desagradável para o indivíduo, que, afi
nal de contas, retém plena consciência de seus desejos
como adulto plenamente desenvolvido .
O grupo, freqüentemente, estrutura-se como um
grupo de dependência a fim de evitar experiências emo
cionais peculiares aos grupos de acasalamento e de
luta-fuga . Sob alguns aspectos o grupo de dependência
presta-se muito bem para isso, porque, como sugeri, êle
pode restringir-se à experiência da fuga, deixando o ana
lista experimentar, se quiser, o que significa dirigir-se
aos problemas de que o grupo está fugindo . Esta rela
ção simbiótica entre o grupo e eu mesmo - o psiquia
tra - s erve para proteger os membros do grupo da ex-
72
penencia de certos aspectos da vida de grupo para os
quais não se sentem preparados . São, assim, deixados
livres para efetuar exercícios no desenvolvimento de re
lações refinadas comigo . Digo 'comigo' porque as pri
meiras experiências do grupo de dependência de qual
quer modo indicam que existe uma acentuada incapa
cidade por parte dos indivíduos no grupo em acre
ditar que tenham possibilidade de aprender algo de valor
uns dos outros .
Do que disse, deveria ficar claro que os membros de
um grupo num estado de espírito dependente acham
que suas experiências são insatisfatórias . De qualquer
modo, seu estado de ânimo contrasta com aquêle que
experimentam quando, havendo jogado tôdas as suas
preocupações sôbre o líder, sentam-se e ficam esperando
que êle solucione todos os seus problemas . Graças às
interpretações que pude dar, êles não podem atribuir
sua desilusão imediata simplesmente ao meu fracasso
em efetuar aquilo que se supõe que um líder dêste tipo
de grupo deva fazer . De fato, se o grupo abrigava al
guma idéia dêsse tipo, só poderia ser porque eu estava
falhando completamente em elucidar o que se estava
passando . O ponto é que esta suposição básica e o cam
po emocional que lhe é concomitante produzem suas
frustrações características, algumas mais aparentes para
um dos pacientes, outras para outro .
Quando a investigação do grupo de dependência se
desenvolve, torna-se possívêl observar o emergir de cer
tas características que agora exigem atenção . O grupo
sempre torna claro que espera que eu atue com autori
dade como líder do grupo e eu aceito essa responsabili
dade, embora não da maneira que o grupo espera . Nas
primeiras fases, parece mais sensato pensar que essa
autoridade baseia-se na idéia de que sou médico e êles
são pacientes, mas há aspectos no comportamento do
grupo cujo emergir no decorrer do tempo mostra que a
situação é mais complexa . A insistência do grupo em
que ninguém, a não ser eu próprio, tem qualquer di
reito a exigir atenção é igualada por uma firme sensa
ção de desapontamento pelo que faço; uma inabalável
73
crença de que estão j ustificados em pensar que me acho
qualificado pelo treinamento e pela experiência a con
duzir o grupo é igualada por uma indiferença quase
igualmente inabalável por tudo o que digo . 1
Se eu levar em conta a atmosfera emocional do gru�
po - e seria preciso uma considerável capacidade de
negação para não fazê-lo - é claro que o grupo não está
interessado em compreender o que tem importância no
que digo, mas sim em utilizar apenas aquelas partes de
minha contribuição que possa convenientemente trans
formar naquilo que parece ser um corpo de crença j á
bem estabelecido . Gestos, tom de voz, maneiras, apa
rência e, em certas ocasiões, até mesmo o assunto do que
falo : nada disso é perdido, se puder ser encaixado na
quele sistema . O grupo está combinando-se para esta
belecer um firme retrato do objeto de que pode depender.
A princípio, não é fácil identificar os traços dêsse
retrato, mas, mesmo assim, é claro que não são os tra
ços de um médico . A mesma sorte recai sôbre qualquer
outro membro do grupo que sej a exaltado em meu lugar,
com o resultado de que os indivíduos do grupo, sem ex
ceção, descobrem influenciar o grupo de uma maneira
caprichosa e apenas obscuramente relacionada com os
pensamento que estão lutando para expressar . O esfôr
ço que eu próprio faço é iluminar as obscuridades da
situação no grupo por um pensamento claro, - nitida
mente expresso; isso é, na melhor das vêzes, uma ambi..:
ção considerável, mas, com o tempo, torna-se nítido que ·
entre outros fatôres que contribuem para tornar isso
74
uma meta difícil de alcançar acha-se a hostilidade do
grupo a ela, como meta . A natureza desta hostilidade
pode ser melhor apreendida se fôr considerada como
uma hostilidade a todo método científico e, assim, como
uma hostilidade a qualquer atividade que possa parecer
estar-se aproximando dêsse ideal . Serão ouvidas queixas
de que minhas observações são teóricas; que não pas
sam de intelectualizações; que falta calor aos meus mo-
. dos; que sou abstrato demais . O estudo do grupo du
rante um certo período mostrará que, embora não haja
necessidade de duvidar da capacidade dos indivíduos no
grupo em trabalhar àrduamente, o grupo, como grupo,
opõe-se inteiramente à idéia de que se reuniram para o
· fim de trabalhar e, na verdade, reagem como se algum
importante princípio seria infringido, se tivessem de
fazê-lo . Não entrarei em mais pormenores sôbre êste as
sunto, mas, talvez, se o leitor quiser retornar a algumas
de minhas descrições anteriores do comportamento no
grupo, reconhecerá nelas alguns dos traços que estou
descrevendo (em particular, pág. 3 1 e págs. 43-4) . Su
gerirei agora que tôdas as facêtas de comportamento
no grupo de dependência podem ser identificadas como
relacionadas, se supusermos que, neste grupo, acredi
. ta-se que o poder decorre não da ciência, mas da magia.
Uma das características exigidas do líder do grupo, en
tão, é que êle seja um mágico ou se comporte como um.
Os silêncios num grupo de dependência são, por conse
guinte, expressões da determinação em negar ao líder
o material que êle necessita para a investigação cien
tífica e, através disso, impedir desenvolvimentos que pa
reçam solapar a ilusão de segurança derivada de serem
cuidados por um mágico - ou expressões de devoção
adoradora pelo líder, como mágico - uma interpretação
muitas vêzes será seguida por um silêncio que é muito
mais um tributo de temor reverencial que uma pausa
para pensar.
Quando o grupo atinge esta fase de desenvolvimen
to, o psiquiatra poderá pensar que está tratando com
'resistências' no sentido comum dessa palavra, mas acre
dito que é mais frutífero considerar o grupo como uma
75
· comunidade que sente estar sendo feito um ataque hos
til às suas crenças religiosas . Na verdade, é muito co
mum descobrir que, neste estágio, as referências à reli
gião são freqüentes . Às vêzes o indivíduo identifica-se
com o investigador e, outras vêzes, com o investigado .
Se identificar-se com o investigador, pode-se notar que
êle assume um ar de auto-segurança um tanto artificial,
como a indicar que está investigando uma interessante
sobrevivência do passado ou uma das religiões bem co
nhecidas do mundo, tais como o budismo ou o cristia
nismo . l!:ste ar é assumido a fim de evitar ter de com
preender que está investigando in loco uma 'religião'
emocionalmente vital, cujos devotos o circundam e estão
à espera para cair-lhe em cima . Se o psiquiatra pres
sionar vigorosamente esta investigação, deverá obter
uma sensação vívida da hostilidade do grupo e uma com
preensão emocional da vitalidade dos fenômenos com
que tem de tratar . Deverá dar-se conta, também, de
que terá de considerar não apenas os dogmas do culto,
mas todos os fenômenos relacionados, tais como as exi
gências que o culto faz às vidas de seus fiéis . Algumas
delas podem ser assistidas no próprio grupo : a repres
são ao pensamento independente, a caça às heresias, a
rebelião que isto por sua vez produz, as tentativas para
justificar as limitações impostas por apelos à razão, ou,
pelo menos, à racionalização, e assim por diante , Ou
tras manifestações, contudo, tornam-se claras no relato
que os indivíduos dão de sua vida cotidiana . Porque os
'devotos' do grupo 'religião', rebeldes ou não, permane
cem 'devotos' também em sua vida de todos os dias, e é
possível demonstrar que alguns de seus conflitos diários
originam-se da tentativa de reconciliar as exigências do
pensamento cotidiano e as demandas de sua filiação ao
grupo como comunidade 'religiosa' . As implicações desta
visão do grupo são grandes e quanto mais vejo dêste as
pecto do grupo de dependência, mais convencido fico
de que os pacientes produzem material num ritmo con
tínuo para sustentar a opinião de que sua filiação ao
grupo de dependência, como seita 'religiosa', exerce uma
influência ampla sôbre suas vidas mentais, tanto quan-
76
do o grupo se dispersa, quanto no curto período em que
se encontram como um grupo .
Passarei agora a outro problema .
77
danç as no grupo antes de descrever o que vê . Há muitas
ocasiões em que êle precisa i�dicar que aquilo que aca
bou de descrever já foi · experimentado pelo grupo em
alguma ocasião anterior, mas foi então mais fàcilmente
observado em outros têrmos, quando, por exemplo (para
tomar o caso de um indivíduo) , um paciente se queixou
�de uma considerável ansiedade sôbre 'desmaiar' . Outras
vêzes, descreveu o mesmo fenômeno como 'ficar incons
·
78
(admito de uma certa magnitude) de minha parte,
significa que estou assistindo a fenômenos de grupo que
não 'começam'; os assuntos em que estou interessado
continuam e evolvem, . mas não 'começam' . No trabalho
que realizo no grupq, dessa maneira, a questão não é
respondida, embora se possa ver qúe, se o grupo se inte
ressa em investir em mim uma liderança de tipo dife
rente daquela que me proponho exercer, pode-se fàcil
mente presumir que é assunto meu saber quando o gru
po começa ou, a propósito, quando termina . Não há
razão por que não se deva dar a resposta que é esperada,
desde. que se estej a ciente que o assunto é de uma certa
importância e envolve uma considerável mudança de
papel, embora êsse ponto possa não parecer evidente no
momento atual .
Se, num grupo, tive sucesso em demonstrar a luta
para manter a estrutura refinada, devo também ter obti
do sucesso em demonstrar o seu 'dual' . O que se segue
é uma descrição do 'dual', embora, à primeira vista, pos
sa ser difícil compreender a sua afinidade com a tenta
tiva de preservar uma estrutura refinada .
Em todos os · grupos será comum, numa ocasião ou
noutra, encontrar pacientes a queixar-se de que o tra
tamento é longo, que êles sempre se esquecem do que
aconteceu na sessão anterior; que não pareçam haver
aprendido nada e que não percebam, não apenas o que
as interpretações tem a ver com seu caso, mas também
o que as experiências emocionais para as quais estou
tentando atrair a atenção possam importar-lhes . Mos
tram também, como na psicanálise, que não possuem
muita fé em sua capacidade de aprender pela experiên
cia : 'O que aprendemos da História é que não aprende
mos nada da História' .
Ora, tudo isto e muitas outras coisas semelhantes,
na realidade, vem a resultar no ódio a um processo de
desenvolvimento . Mesmo as queixas sôbre o tempo, que
parecem bastante razoáveis, destinam-se apenas a se
lamentar um dos fatôres essenciais do processo de de
senvolvimento . Há uma aversão total a ter de aprender
pela experiência e uma falta de fé no valor de tal tipo
79
de aprendizagem . Uma pequena experiência de grupos
logo mostrará que isto não é simplesmente uma atitude
negativa; o processo de desenvolvimento está sendo real
mente comparado com algum outro estado, cuja natu
reza não é imediatamente aparente . A crença neste ou
tro estado amiúde se mostra na vida cotidiana, talvez
mais claramente na crença de escolar no herói que nun
ca faz qualquer trabalho e, apesar disso, encontra-se
sempre no auge da forma - o oposto do 'caxias', na
verdade .
No grupo, torna-se muito claro que esta alternativa
sonhada para o procedimento do grupo é, na realidade,
algo como chegar a ficar inteiramente preparado, como
um adulto apto por instinto a saber exatamente, sem
treinamento ou desenvolvimento, como viver, movimen
tar-se e levar sua existência num grupo .
Existe apenas um espécie de grupo e uma espécie
de homem que se aproximam dêste sonho e são o grupo
básico - à grupo dominado por uma das três suposições
básicas; dependência, acasalamento e fuga ou luta -
e o homem que é capaz de perder sua identidade no
rebanho.
Não sugiro, por um só momento, que êste ideal cor
responda à realidade, porque, naturalmente, tôda a ex
periência terapêutica de grupo demonstra que o grupo
e os indivíduos nêle acham-se desesperançadamente de
dicados a um processo de desenvolvimento, seja o que
fôr que tenha acontecido a nossos ancestrais remotos .
Minha experiência de grupos, na verdade, indica
que o homem está desesperançadamente comprometido
com ambos estados de coisas . Em qualquer grupo po
de-se ver o homem que tenta identificar-se irrestrita
mente com a suposição básica ou com a aparência refi
nada . Se êle se identificar irrestritamente com a supo
sição básica - com o rebanho, por assim dizer - sen
tir-se-á perseguido por aquilo que sente ser o árido inte
lectualismo do grupo e, em particular, das interpreta
ções . Se se identificar, até onde tem possibilidade de
fazê-lo, com a aparência puramente intelectual, desco
brir-se-á perseguido por objetos internos, que, suspeito
80
eu, são realmente uma forma de consciência das inti
mações dos movimentos emocionais do grupo de que é
membro; ·certamente, alguma explicação dêste tipo aju
daria a lançar luz sôbre o sentimento que tem o indiví
duo de estar sendo perseguido pelo grupo, tanto interna
quanto externamente .
No grupo , o paciente sente que deve tentar coope
rar . Descobre que sua capacidade de cooperação é emo
cionalmente mais vital no grupo básico e que, na perse
guição a objetivos que não se prestam fàcilmente às
técnicas do grupo básico, sua capacidade de cooperar
depende de uma espécie de toma lá dá cá que é conse
guida com grande dificuldade, comparada com a rápida
reação emocional que provém da aquiescência às emo
ções do grupo básico .
No grupo, o indivíduo dá-se conta de capacidades
que são apenas potenciais enquanto se encontra em com
parativo isolamento . O grupo, dessa maneira, é mais
que um conjunto de indivíduos, porque um indivíduo
num grupo é mais que um indivíduo em isolamento.
Além disso, o indivíduo num grupo está ciente de
que as potencialidades adicionais que então se tornam
ativadas pela filiação ao grupo são, muitas delas, me
lhor adaptadas para funcionar no grupo básico, ou seja,
no grupo que se reúne para agir segundo as suposições
básicas .
Um dos problemas da terapêutica de grupo, então,
reside no fato de ser o grupo freqüentemente utilizado
para a obtenção de uma sensação de vitalidade pela
submersão total no grupo ou de uma sensação de inde
pendência individual pelo repúdio total dêle . Essa parte
da vida mental do indivíduo, que é incessantemente es
timulada e ativada por seu grupo, é a sua herança ina
lienável como animal de grupo .
.11: êste aspecto da filiação ao grupo que origina no
indivíduo uma sensação de que nunca poderá alcançar
um curso de acontecimentos com que está, em qualquer
momento dado, j á comprometido . Existe uma matriz
de pensamento que reside dentro dos .confins do grupo
básico, mas não dentro dos confins do indivíduo . Há
81
também o desej o que tem êste de sentir que é dono de
seu destino e de se concentrar naqueles aspectos de sua
vida mental que sente serem mais verdadeiramente seus
e originados dentro de si . É êste desejo que tende a tor
ná-lo mais disposto a observar fenômenos que se acham
mais relacionados com aquela espécie de grupo, da
qual pode razoàvelmente dizer que 'começa' do que com
o tipo de grupo em que não cabe o conceito de 'comêço' .
Se o desejo de segurança fôsse tudo o que influen"
cia o indivíduo, então o grupo de dependência poderia
bastar, mas o indivíduo precisa de mais do que segu
rança para si e, dessa maneira, tem necessidade de ou
tras espécies de grupos . Se o indivíduo estivesse pre
parado para suportar as dores do desenvolvimento e tudo
o que isso implica em esforços para aprender, poderia
ultrapassar o grupo de dependência . Mas o fato de de
sejá-lo, mesmo com os impulsos que não são satisfeitos
no grupo de dependências, por um estado no qual, sem
passar pelas dôres de crescimento, possa encontrar-se
integralmente preparado para a vida de grupo, resulta
num impulso na direção de um grupo estruturado para
o acasalamento ou para a luta-fuga .
82
5
83
a ser deduzível dêlé . Até onde concerne ao grupo, a su
posição básica é, essencialmente, uma suposição tácita.
Os indivíduos conduzem-se como se estivessem cientes
dela e é por essa razão que a interpretação da suposição
básica conduz à convicção . Ela é uma afirmação que
dá significação ao comportamento do grupo como um
todo, mas, apesar disso, a suposição não é abertamente
expressa, mesmo quando ela está atuante . Temos, as
sim, uma situação em que os indivíduos comportam-se
como se estivessem conscientes, como indivíduos, da su
posição básica, mas inconscientes dela como membro do
grupo . Isto é como deveria ser : o grupo não possui um
consciente e não é articulado ; compete ao indivíduo
possuí -lo e sê-lo .
É, possível falar de uma sensação de segurança como
existente em cada um dos estados emocionais associa- ·
84
a combinação em que essa sensação é experimentada .
Diversos sentimentos, não desagradáveis em si mesmo e,
na verdade, grandemente desejados pelo indivíduo, não
podem ser experimentados, exceto quando fixados em
combinação com outros sentimentos menos desejados e
amiúde vistos com intensa aversão, de maneira que o
indivíduo tem de se valer do ato de dividir (splitting)
para isolar-se do grupo e de sua própria essencial 'gru
palidade' (groupishness) - ou seja, sua qualidade ina
lienável como animal de rebanho . É freqüentemente ou
vida a queixa de que, no grupo, o indivíduo não pode
pensar . Éle tentará sentir-se seguro em sua filiação ao
grupo, mas esforçar-se-á por expelir (split off) os senti
mentos não apreciados que se acham em combinação
com aquela segurança desej ável . Atribuirá a origem dês
tes a alguma outra causa que não aquela própria segu
rança que exige uma causa tal como a filiação a um
grupo menos importante, algum acontecimento externo
efêmero ou à neurose . Dessa ·maneira, uma boa quanti
dade de tempo tem de ser devotado a elucidar a supo
sição básica da qual o refôrço emocional está sendo de
rivado e, depois, a provar que as experiências emocio
nais que os pacientes freqüentemente introduzem na
discussão como sintomas derivam-se realmente de sua
existência una com outros membros do grupo emocio
nalmente reforçado e de seu conflito tanto com êles pró
prios quanto com o grupo. O ponto que desejo provar é
que a participação numa suposição básica não é apenas
inevitável, mas envolve uma partilha de emoções que
são, até onde a investigação psicológica pode revelá-las,
distintas e separadas umas das outras, mas, na verdade,
apenas são assim aparentemente e, ainda, sõm.ente na
quele ponto de &ua história em que se manifestam como
fenômenos psicológicos . O resultado, para o psicólogo, é
que não há observações disponíveis que possam explicar
porque, quando se age a partir de uma determinada
suposição básica, os sentimentos associados com ela
acham-se sempre mutuamente ligados com a tenacida
de e a exclusividade, nem mais nem menos, que se as
sociam às combinações químicas .
85
Não decorre disso, naturalmente, que será sempre
assim : é concebível que a técnica de grupo possa desen
volver-se até um ponto em que fenômenos que não são
atualmente identificáveis tornar-se-ão perceptíveis. Nes
se ínterim, desejo enfatizar o que decorre do que estive
dizendo sôbre ser a aflição do indivíduo idiopática à su
posição básica atuante, ou seja, ela se origina de seu con
flito com o estado emocional do grupo e daqueia parte
de si próprio que está interessada na participação na
tarefa grupal de mantê-la .
O estado emocional associado com cada uma das su- ·
86
cia, os estados emocionais do grupo de luta�fuga e do
grupo de acasalamento encontram-se em inatividade
temporária. �les não se manifestam no sentido em que
as emoções do grupo de dependência são manifestas. A
êste respeito, há um conflito entre o grupo refinado, per
meado por emoções oriundas de uma determinada supo
sição básica e as outras duas suposições básicas . Neste
contexto, é necessário reconhecer que as interpretações
dadas por mim, se aceitas, são elas próprias interpreta
ções do grupo refinado, o que dá origem imediata a cer
tas especulações. Qual é a diferença entre a forma de in
tervenção que uma interpretação representa e as outras
intervenções do grupo refinado? Se as intervenções do
grupo refinado parecem produzir alguns dos efeitos ou
aparência do conflito entre uma determinada suposição
básica e as outras, uma interpretação também produz
conflito? Se a interpretação não produz conflito, o que
produz? Por enquanto, proponho-me a ignorar estas
questões e passar a considerar a sorte dos estados emo
cionais potenciais representados pelas suposições básicas
sôbre as quais, em determinado momento, não se age e
suas relações com o grupo refinado.
As intervenções do grupo refinado são dissemelhan
tes, mas tôdas possuem em comum o seguinte : são ex
pressões de um reconhecimento da necessidade de se de
senvolver em vez de se apoiar na eficácia da magia . São
dstinadas a enfrentar as suposições básicas e mobilizam
as emoções de uma destas na tentativa de enfrentar as
emoções e fenômenos de outra . É isso o que ocasiona a
aparência de conflito entre suposições básicas, fato já
mencionado por mim . Um dos resultados desta opera
ção de grupo refinado é que quanto mais refinado um
grupo se torna e mais consegue manter um nível refina
do de comportamento, mais êle o faz pela supressão de
um determinado padrão de emoções ligadas por outro .
Dessa maneira, o padrão de emoções ligadas associado
com o grupo de dependência pode ser utilizado para tor
nar difícil ou impossível a intromissão dos padrões de
emoção ligados como o são nos grupos de luta-fuga e de
acasalamento .
87
O GRUPO DE TRABALHO
88
sica parecem estar ligadas, assim também os fenômenos
mentais do grupo de trabalho parecem achar-se ligados
entre si . Certas idéias desempenham um papel prepon
derante no grupo de trabalho e não apenas é a idéia de
'desenvolvimento' em vez de 'equipamento integral por
instinto' que é uma parte integrante dêle, mas também
a idéia do valor de uma abordagem racional ou cientí
fica a um problema . Assim também, como uma conco
mitância inevitável da idéia de 'desenvolvimento', é acei
ta a validade da aprendizagem pela experiência . Se,
contudo, o grupo achar-se identificado com a suposição
básica de dependência, então tôdas essas idéias serão
temidas, não, naturalmente, como idéias simplesmente,
mas como atividades em funcionamento dentro do gru
po . O grupo de dependência cedo mostra que uma parte
integrante de sua estrutura é a crença na onisciência e
onipotência de um determinado membro do. grupo .
Qualquer investigação da natureza desta crença desper
ta reações que fazem lembrar, para não colocá-las em
nível superior, as controvérsias da religião versus ciên
cia. Na verdade, a investigação dêste ponto é, como su
geri anteriormente, uma investigação científica da re
ligião do grupo . As atividades do grupo de trabalho que
parecem envolver a investigação da divindade grupal
geralmente o psiquiatra - são enfrentadas com uma
grande variedade de reações, mas, se se considerar a rea
ção como um todo poder-se-ia imaginar que -a descrição
feita por Gibbon da controvérsia homoousiana * fôsse
realmente um relatório sôbre uma sessão terapêu
tica de grupo, com a suposição básica dependen
te em ação . Talvez fôsse . Na verdade, poderá ser útil
para qualquer psiquiatra que tiver a vontade de verifi
car meus métodos num grupo lembrar-se que poucas
coisas na história despertaram os sentimentos de um
grupo mais poderosamente que a controvérsia sôbre as
características da deidade cujo culto na ocasião flores-
89
cia . Deveria talvez acrescentar que por 'florescer' quero
significar florir tanto negativa quanto positivamente,
isto é, tanto quando o grupo é ateístico como quando é
teístico . É essencial que o psiquiatra seja firme em cha
mar a atenção para a realidade das alegações do grupo
a seu respeito, por mais fantásticas que sua elucidação
faça aquelas alegações se apresentarem, e, depois, para
a realidade da hostilidade que é despertada por sua elu
cidação . É em ocasiões como essas que se pode perceber
tanto a fôrça das emoções associadas com a suposição
básica quanto o vigor e a vitalidade que podem ser mo
bilizados pelo grupo de trabalho . É quase como se os
sêres humanos se achassem cientes das dolorosas e amiú
de fatais conseqüências de terem de agir sem um domí
nio apropriado da realidade e, assim, dessem-se conta
da necessidade da verdade como critério para a avaliação
de suas descobertas .
Temos agora de considerar alguns aspectos do papel
desempenhado pelo grupo de trabalho em combinação
com uma das suposições básicas na supressão da ativi
dade aberta das outras duas suposições básicas . Qual é
a sorte das duas suposições básicas que não são operan- ·
910
panha certos fenômenos protomentais de que é uma ex
pressão . Mesmo esta afirmação é objetável porque esta
belece uma ordem mais rígida de causa e efeito daquela
que desej o subscrever, porque, clinicamente, é útil con
siderar êsses acontecimentos como elos numa série cir
cular . As vêzes, é conveniente achar que a suposição
básica foi ativada por pensamentos conscientemente ex
pressos; noutras, em emoções intensamente estimuladas,
resultado da atividade protomental . Não há mal em dar
comêço à série onde quisermos, se isso lançar luz sôbre
o que acontece . Iniciando, então, ao nível dos aconteci
mentos protomentais, podemos dizer que o grupo se de
senvolve até suas emoções tornarem-se exprimíveis em
têrmos psicológicos . É neste ponto que digo que o grupo
se conduz 'como se' estivesse atuando sôbre uma supo
sição básica .
No sistema protomental existem protótipos das três
suposições básicas, cada um dos quais existindo como
uma função da filiação do indivíduo ao grupo, cada um
dêles existindo como um todo de que parte alguma pode
ser separada do restante . SOmente num nível diferente,
num nível em que os acontecimentos surgem como fe
nômenos psicológicos, parece ser possível uma diferen
ciação dos componentes de cada suposição básica e, nes
te nível, podemos falar a respeito de sentimentos de
mêdo, segurança, depressão, sexo ou outros semelhantes.
Visualizo o sistema protomental como um sistema
em que o físico e o psicológico ou mental são indiferen
ciados . Trata-se de uma matriz donde originam-se os
fenômenos que a princípio parecem - num nível psico
lógico e à luz da investigação psicológica - serem sen
timentos distintos, apenas frouxamente associados uns
com os outros . É desta matriz que as emoções próprias
à suposição básica fluem para reforçar, infiltrar e, oca
sionalmente, dominar a vida mental do grupo . Uma vez
que se trata de um nível em que o físico e o mental são
indiferenciados, é razoável que, quando a aflição origi
nária dessa fonte se manifesta, ela possa manifestar-se
tanto sob formas físicas quanto sob formas psicológicas.
As suposições básicas inoperantes acham-se confinadas
91
dentro do si�tema protomental; isto quer dizer que se o
grupo refinad(> é impregnado pelas emoções associadas
com a suposição básica de dependência, então as supo
sições básicas de fuga-luta e de acasalamento ficam con
finadas dentro das limitações da fase protomental . São
as vítimas de uma conspiração entre o grupo refinado e a
suposição básica operante . Foi apenas a fase protomen
tal do grupo de dependência que se libertou para se de
senvolver em estado diferenciado, onde o psiquiatra pode
discernir sua operação como suposição básica .
São êstes níveis protomentais que fornecem a ma-
. triz das doenças de grupo . Estas doenças manifestam-se
no indivíduo, mas possuem características que tornam
claro ser o grupo e não o indivíduo que é átingido, apro
ximadamente da mesma maneira, apenas no sentido
oposto, em que no grupo de luta-fuga sempre parece ser
o grupo e não o indivíduo que está sendo preservado. Em
resumo, isto tudo equivale a dizer que em qualquer gru
po determinado a matriz para as doenças que se encon
tram presentes deve ser procurada em dois lugares -
o primeiro, na relação do indivíduo com o grupo de su
posição . básica e consigo próprio como participante na
manutenção dêsse grupo; o outro, nas fases protomen
tais das outras duas suposições básicas .
Para tornar o que quero dizer ainda mais claro, to
marei emprestado da medicina física uma analogia, a
qual, se fôr lembrado que a utilizo apenas como analo
gia, poderá servir para esclarecer o que quero dizer .
Presumamos o caso de um paciente que está sofrendo
de sintomas de ansiedade . No decorrer do exame, pa
rece que, além de diversas dificuldades psicológicas, o
paciente apresenta um leve tremor das mãos; presuma
mos que outros exames mostrem sinais de uma tirotoxi
cose suficientemente séria para tornar uma abordagem
física o método escolhido para decidir qual o tratamen
to . No linguajar comum, dir-se-ia que a doença possui
uma origem física . E u preferiria dizer que a matriz da
doença jaz na esfera dos acontecimentos protomentais e
que se o paciente fôsse visto tão cedo que, pelos padrões
medianos atuais, nenhum sinal de doença reconhecível
92
por técnicas de medicina . física ou de psiquiatria esti- ·
vesse presente, então o paciente estaria apresentando
um exemplo muito bom, in petto, do que quero dizer por
fase de acontecimentos protomentais em que o físico e o
psicológico são ainda indiferenciados e na qual, em cer
tas circunstâncias, as doenças de grupo com componen
tes físicos e psicológicos têm sua origem . Onde a ana
logia formada para expressar minha opinião se rompe
é em apresentar a esfera dos acontecimentos protomen
tais como limitada pelo indivíduo; em minha opinião, a
esfera dos acontecimentos protomentais não pode ser
compreendida com referência somente ao indivíduo, e o
campo inteligível de estudo da dinâmica dos aconteci
mentos protomentais encontra-se nos indivíduos reuni
dos num grupo . A fase protomental no indivíduo é ape
nas uma parte do sistema protomental, porque os fenô
menos protomentais são uma função do grupo e, dessa
maneira, devem ser estudados no grupo .
Apresentando o conceito de um sistema protomen
tal, disponho-me a explicar a solidez com que tôdas as
emoções de uma determinada suposição básica parecem
estar fundidas e, ao mesmo tempo, fornecer um conceito
que explique o paradeiro das suposições básicas inope
rantes que foram obviamente sentidas por um grupo
como potencialmente ativas e, dessa maneira, têm de ser
consideradas como estando em 'algum lugar ' . Mas amiú
de descobri que é útil, após uma postulação dêste tipo,
ver o que acontece se se tentar empregar a nova teoria
para fins a que, originalmente, não se destinava. Para
êste obj etivo, descubro ser a indulgência na especulação
um teste de campo tão bom quanto qualquer outro e
espero com isso chegar mais próximo à decisão de en
carar a idéia de um sistema protomental como apenas
uma teoria para reunir minhas observações, uma hipó
tese para estimular novas investigações ou um fato cli
nicamente observável .
Minha primeira especulação tem de se referir àquilo
que constitui um campo inteligível de estudo . O peque
no grupo terapêutico não pode servir enquanto minha
técnica não se achar mais desenvolvida do que se en-
93
contra atualmente e, mesmo que se tivesse desenvolvido
mais ou eu melhorasse meus podêres de observação, per
maneceria sendo ainda uma questão duvidosa e não seria
mais avisado procurar uma solução em algum outro
campo . Antes de Freud, as tentativas para fazer pro
gredir o estudo da neurose foram em grande parte es
téreis porque o indivíduo era considerado como sendo
um campo inteligível de estudo, mas foi somente quando
Freud começou a procurar uma solução na relação en
tre duas pessoas, no estudo da transferência, que des
cobriu qual era o campo inteligível de estudo para, pelo
menos, alguns dos problemas que o paciente neurótico
coloca, e problemas que haviam até então desafiado
tôdas as tentativas de solução começaram a apresentar
um significado . A investigação então iniciada continuou
a se expandir em profundidade e amplitude . O pequeno
grupo terapêutico é uma tentativa de ver se algum nôvo
resultado pode ser produzido pela mudança do campo
de estudo . - Será necessário, em alguma ocasião, conside
rar o emprêgo que o próprio grupo faz das manipula
ções do campo de estudo, mas, de momento, desejo con
siderar as possibilidades de modificar novamente o cam
po, a fim de ver se é possível, procedendo assim, arrojar
novà luz sôbre o pequeno grupo terapêutico . O pequeno
grupo terapêutico não produz provas sôbre as doenças
físicas com rapidez suficiente para os meus obj etivos e
não produz o bastante delas . Prefiro, .dessa maneira,
basear minhas especulações naquilo que poderia ser en
contrado num grupo suficientemente grande para que
indícios característicos de doença fôssem disponíveis
(ver Toynbee, 1935, págs. 12, 17) . Gostaria de possuir
indícios sôbre doenças tais como a tuberculose, as doen
ças venéreas, diabetes e outras, particularmente com re
lação a aspectos de variação numéri.ca de casos, virulên
cia e distribuição que não fôssem fàcilmente explicáveis
em têrmos de anatomia, fisiologia e outras disciplinas
que constituem geralmente o cabedal das investigações
da Saúde Pública . Além disso, seria necessário possuir
estatísticas que fôssem válidas no momento significa
tivo .
94
No que se segue, proponho-me a usar as letras sb
para indicar a suposição básica e seu estado emocional
associado . A suposição básica de dependência será in
dicada pelas letras S'bD, a de acasalamento por sbA e a
de fuga-luta por sbF . Para o sistema protomental, pro
ponho utilizar as letras pm; dessa maneira, pmDA signi
ficará que me refiro a um estado em que as supo
sições básicas de dependência e acasalamento não são
mais identificáveis como fenômenos psiquiátricos, mas
acham-se confinados a um tipo de fase latente, atual
mente não elucidada, no sistema protomental em que o
físico e o mental são indiferenciados . O mesmo aconte
cerá com pmAF ou pmDF. Para o grupo refinado ou de ·
trabalho empregarei T .
(a) Suponha-se que uma doença X origina-se da
fase protomental dos grupos de dependência e de acasa
lamento, quando suprimidos por uma sbF bàsicamente
expressa . Em minha teoria, a doença X será filiada aos
grupos D e A e, assim, quando se tornar patente, pos
suirá filiações psicológicas com as emoções de sbA e sbD.
Além disso, terá uma matriz que, neste caso, será pmD
e pmA . Possuirá também uma causa psicológica que
residirá em s bA . Isto não significa considerar eu que
tôdas as doenças possuem uma causa psicológica, que
tem importância igual a outras causas, mas acredito
que, pelo amor à perfeição, uma doença deve ser clas
sificada de maneira a que conheçamos não apenas os
fatos ordinàriamente descritos na medicina, mas . tam
bém ( 1 ) sua matriz, ou seja, no exemplo que forneci,
pmD e pmA; (2) suas afiliações psicológicas ou, em meu
caso imaginário, sbD e sbA, e (3) sua causa psicológica
ou, neste exemplo, sbF .
Similarmente, acrescentaria que necessitamos co
nhecer a filiação da doença física a outras moléstias
físicas, além das j á bem conhecidas filiações a que se
chega com um estudo da anatomia e da fisiologia, e que
devemos procurar estas outras doenças filiadas conside
rando quais as outras doenças físicas que podem ser
·
95
Matriz pmD e pmA
Filiação s bD e sbA
Causa sbF
96
qualquer espécie ; trata-se do estado mental a que a tu
berculose acha-se filiada e, dessa maneira, não é nem
causa nem efeito . Para descobrir a causa da queixa (re
firo-me, naturalmente, à causa que deve ser compreen
dida como parte do esquema que estou elaborando e não
às causas perfeitamente bem conhecidas e bem estabe-
. lecidas com que a medicina se acha familiarizada) seria
necessário correlacionar . as flutuações na incidência da
doença com a prevalência da sb no grupo, nas diversas
vêzes em que os números da doença foram conseguidos .
.Presumamos que as cifras mais altas correspondam sem
pre a s'bF . Deveríamos então classificar a tuberculose
como possuindo, ao lado das características já estabele
cidas,
Causa s bF
Filiação sbD
Matriz pmDA
97
sistema é postulado como protomental, êle é igualmente,
do ponto de vista da doença física, protofísico . Não
obstante, é mais fàcilmente possível descobrir uma técni�
ca para investigar o sistema protomental como matriz
da perturbação física por uma investigação que efetue
uma abordagem física . Se, utilizando uma abordagem
física, pudermos investigar o aspecto físico do sistema
protomental, poderemos descobrir um meio de obter uma
amostra daquilo que o sistema protomental de um gru
po contém em qualquer momento dado e, a parti \ disso,
dar o outro passo, que consistiria em elaborar uma técni
ca para a observação das contrapartidas protomentais
dos acontecimentos mentais . Qualquer progresso desta
natureza tornaria possível calcular em que o estado psi
cológico de um grupo teria possibilidade de tornar-se,
porque poderíamos investigá-lo muito antes de surgir
como uma suposição básica bàsicamente expressa . Para
mim, isto é importante, porque uma das características
que diferencia o grupo de pacientes dos outros grupos é
a tendência dêle a agir bàsicamente sôbre suposições
básicas .
Graças ao Serviço Nacional de Saúde da Grã-Breta
nha, os pacientes podem sentir que êles efetivamente tra
taram de todos os problemas que se originam do ele
mento financ�iro em suas relações mútuas e com o mé
dico . Mesmo assim, há ocasiões em que problemas fi
nanceiros são mencionados, geralmente como se fôssem
assuntos de preocupação doméstica para o indivíduo,
mas, nem por isso, menos suscetíveis de interpretação
como um material a expressar indiretamente algum as
pecto da vida mental do grupo e do indivíduo nêle . Pro
ponho, dessa maneira, continuar na esfera do dinheiro
as minhas especulações sôbre o sistema protomental,
vendo se posso empregar êsse conceito de uma maneira
paralela àquela em que j á o utilizei na esfera da doença
·
física .
Foi dito que 'o veículo (meio) de troca pode ser qua
se tudo, desde que sej a geralmente aceitável' (Clay, 1916,
pág. 1 64) . :aJle não é apenas um meio de troca, mas tam
bém o padrão de valor . Trabalhos recentes sôbre o di-
98
nheiro primitivo demonstraram que êle não surgiu como
·
*
wergeld ou wehrgeld ( wergild, no original ) , do alemão W ehr, defesa,
e Geld, dinheiro; no direito germânico e principalmente entre os fran
cos, a indenização. que o autor de um ato prejudicial pagava à vítima
ou a seus parentes para subtrair-se à sua vingança. (N. do Trad. ) .
99
e compreensão da doença aos conhecimentos já obtení
veis através da disciplina da medicina física, de maneira
a poder haver base para utilizá-las para acrescentar · co
nhecimentos da doença dos mecanismos de troca aos
conhecimentos que j á s ão obteníveis através da disci
plina da economia . Porque se a fonte do valor do di
nheiro reside não apenas no valor intrínseco e noutras
fontes discutidas por Einzig dos objetos utilizados como ·
dinheiro, mas também nas sbs, deveríamos então espe
rar que o valor psicológico na sbF fôsse diferente de seu
valor na sbA ou na sbD e ass im por diante . Além disso,
poderíamos esperar que o valor de qualquer moeda cor
rente flutuasse, através de variações em valor na fonte
de que o dinheiro deriva seu valor psicológico - as su
posições básicas. Se pudermos determinar clinicamente
a natureza do valor do dinheiro na sbF, na sbD e na sbA,
poderemos remontar à fonte de uma das causas das và
riações no valor do dinheiro, tal como é usado no co
mércio .
Ora, uma das vantagens de estudar o dinheiro no
grupo grande é que êste é suscetível de abordagem esta
tística; é duvidoso se as estatísticas · disponíveis são me
nos abertas à crítica, com base em falta de sensibili
dade, do que as estatísticas de doença, mas, contudo,
uma partida tem de ser dada e por alguém que possua
preparação e competência estatística . Entretanto, o va
lor real do estabelecimento de algum tipo de correlação
entre as flutuações no valor do dinheiro e as alterações
n:::. :; u surgiria se se descobrisse que existe alguma cor
relação entre as configurações das estatísticas da doen
ça e das estatísticas qúe mostram as variações no valor
do dinheiro no grupo . Evidentemente, qualquer tenta
tiva de isolar flutuações em valor devidas a alterações
em valor na fonte psicoló gica do valor monetário, ou
seja, sua origem no wergild e na compra da noiva, de
outras fontes das quais o dinheiro deriva seu valor, po
dem mostrar ser muito a1llbiciosas, a menos que, segun
do desconfio, o valor da moeda corrente repouse muito
mais do que se tem imaginado em bases · psicológicas e,
em particular, na suposição básica dominante e no pm .
100
Se se demonstrar que tais correlações existem, po
dar-se-ia então razoàvelmente presumir que algum in
dício era fornecido para tomar as suposições básicas
como entidades clínicas e isto, por sua vez, poderia con�
duzir a algum esclarecimento das idéias relativas à na
tureza do sistema protomental .
Ao discutir a ligação da emoção numa sb, sugeri
que era necessário encarar qualquer sentimento, tal
como a ansiedade, como diferente de acôrdo com a sb
de que fazia parte; semelhantemente, devemos conside
rar que o valor do dinheiro na sbD, digamos, difere do
seu valor na sbF e, por isso, quero significar que seu
valor difere tanto a respeito da qualidade quanto da
quantidade . O que desej o dizer com isto pode ser per
cebido se considerarmos a atitude para com o dinheiro
e o valor que é a êle concedido num grupo religioso em
que T é suficientemente forte para convocar a sbD à
plena atividade e compararmos êste valor com o valor
que é concedido ao dinheiro numa nação em guerra,
quando a sbF está em plena atividade . No último ca.su,
o valor do dinheiro acha-se ligado com sua conversibili-
dade em munições de guerra; no primeiro, com o seu
valor em compensar sentimentos de culpa por depen
dência além de razoáveis limites de tempo e sôbre ante
passados mais que humanos pela compra de sentimen
tos de virtude . Na sbA, o valor pareceria residir em sua
capacidade de facilitar, pela compra de uma noiva ou
dote, a aquisição de uma companheira .
Minhas especulações parecem sugerir que os con
ceitos de suposições básicas e sistemas protomentais pro
metem facilitar a investigação em áreas diferentes da
quelas de que se derivam, mas, antes de agirmos ba
seados na suposição de que já se acha estabelecido um
caso para posterior investigação, poderá ser bom confe
rir nossas especulações, trazendo-as para uma relação
mais estreita com os fatos . A dificuldade clamante é
afirmar que a suposição básica é operante num grande
grupo; por exemplo, deveremos dizer que a s b numa
nação em guerra é sbF? E, se assim fôr, será que istO'
vale para tôdas as partes da nação - . para a comu:ni "
!OI
dade agrícola, por exemplo? Se presumirmos que uma
nação em guerra exemplifica a sbF, deveremos presumir
que a nação em questão fornece um campo de estudo
inteligível para os fenômenos associados com aquela
suposição básica? Onde procuraremos as provas estatís
ticas das flutuações na doença? Que material estatístico
. revelará as variações no valor da moeda e onde, no tem
po, poderemos esperar encontrar aquelas variações no
valor da moeda ou na incidência de doenças que pode
ríamos esperar serem correlatas, se correlacionadas são,
à suposição básica de, digamos, agôsto de 1939?
Embora isso possa parecer achar-se muito distante
do estudo do pequeno grupo de pacientes, poderá valer
a pena, enquanto se tenta relacionar estas teorias à his
tória recente do grupo grande, ver se elas suportam o
teste de aplicação prática a acontecimentos reais, antes
de se tentar o proj eto mais ambicioso que acha envol
vido em fazer delas o tema de pesquisas estatísticas .
REFER:Ê:NCIAS
102
HODGKIN, R. H. ( 1 9 3 5 ) , History of Anglo-Saxons, Londres, Oxford
University Press, vol. 2, pág. 579.
PETIT-DUTAILLIS ( 19 1 1 ) , Studies Supplementary to Stubbs'Con;tili<
tional History, Manchester University Press, págs. 36-38.
Embora o assunto seja um lugar comum na maioria dos estudos
de história constitucional, há pouco material em qualquer dêles
que seja realmente útil para fornecer confirmação ou refutação de
qualquer tentativa de relacionar o Wergild a uma suposição básica.
TOYNBEE, ARNOLD ( 1 935 ) , A Study of History, Oxford, edição de
1935, vol. I.
A discussão de Toynbee do que constitui um campo inteligi
vel de estudo na história pode aplicar-se igualmente bem ao estudo
da psicologia do grupo.
WITTKOWER, ERIC ( 1 949 ) , A Psychiatrist Looks at Tuberculosis,
Londres, The National Association for the Prevention of Tuber
culosis.
�ste estudo fornece amplo material sôbre o qual formar juí
zos ·experimentais a respeito da validade de minhas teorias sôbre
as filiaç,ões psicológicas da doença.
103
6
104
· interpretações supostamente psicanalíticas a urn indi
víduo, reforço a presunção de que o · grupo consiste ern
pacientes dependentes do médico, o que é a sbD .
Podemos perceber agora o que é que dá origem ao
sentimento de imprecisão, quando se faz interpretações ;
trata-se da percepção de que o grupo é influenciado por
aquêle aspecto da contribuição do médico que incide na
suposição básica e dificilmente pela parte dela que con
siste na interpretação do comportamento do grupo . Ten
tando conseguir exatidão de alvo , eu estava na reali
dade sofrendo, corno todos os rnernbros do grupo sofrem,
pela aversão à qualidade emocional ern rnirn rnesrno e
no grupo que é inerente à filiação ao grupo humano .
Esta qualidade é urna espécie de capacidade de coopera
ção corn o grupo, rnas proponho, doravante, reservar a
palavra 'cooperação' para o funcionamento consciente ·
ou inconsciente corn o resto do grupo a trabalhar, en
quanto que para a capacidade de cooperação espontânea
instintiva na suposição básica, urn exemplo da qual é o
que acabamos de discutir, empregarei a palavra 'va
lência' .
VAL:mNCIA
105
plícito numa palavra como 'suposição '. Em resumo, de
sejaria utilizá-la para acontecimentos que possam pre-:
cisar surgir no sistema pm .
Quando cedi ao impulso de fornecer interpretações
individuais, minha liderança do grupo era mais uma ex
pressão de sofrimento que uma iluminação da realidade
externa claramente percebida . Minha contribuição a T
diminuiu, a s bD aumentou e, assim, o componente 'pa
ciente' em minha contribuição, como um todo, cresceu .
Trato com esta situação, presumindo que todos no
grupo estão sofrendo da mesma maneira e, deixando de
fazer interpretações supostamente psicanalíticas, inter
preto apenas aquêle aspecto da contribuição do indiví
duo que mostra que êle, ao tentar, digamos, conseguir
auxílio para o seu problema, está levando o grupo a es
tabelecer a sbD ou, alternativamente, a mudar para a
sbA ou a s1bF .
Fazendo isso, diminui tanto o componente 'pacien
te' em minha liderança, como chamei a atenção dos in
divíduos interessados para o dilema que resulta da filia
ção ao grupo . Decorrem conseqüências de ambos êstes
fatos, mas, por enquanto, ignoro-as na situação real do
grupo e, nesta descrição, ignoro também as conseqüên
cias que decorrem da diminuição do componente 'pa
ciente' em meu comportamento .
O DILEMA DO INDIVíDUO
106
monstrado é que os indivíduos que experimentam êste
dilema ficam intimidados por êle e estão assim apresen
tando seu temor das suposições básicas e do papel · que
êles próprios desempenham em sua manutenção; êste
temor acha-se intimamente ligado à sensação de ina
daptação à vida de grupo que acompanha o aumento
de insight das até então insuspeitadas complexidades da
participação no grupo humano . Demonstro êste dilema
do indivíduo - a intervalos durante os diversos perío
dos em que outros fenômenos de grupo estão-se apresen
tando com mais premência - durante todo o decorrer
da existência do grupo . Embora nenhuma mudança se
efetue na situação, os indivíduos tornam-se gradualmen
te menos oprimidos pela sensação de estarem impalados
por uma ou outra das pontas do dilema e menos impe
didos de participarem ativamente do grupo . Um resul
tado interessante da familiaridade crescente do dilema
do indivíduo é a demonstração de que não há maneira
pela qual o indivíduo possa, num grupo 'fazer nada' -
nem mesmo não fazendo nada . Assim, voltamos mais
uma vez, embora chegando a ela de um ângulo diferen
te, à nossa desconfiança de que todos os membros do
grupo são responsáveis pelo comportamento do grupo
(ver pág. 50) .
Na prática, as coisas não se passam tão fluente
mente como minha descrição sugere, porque, como in
diquei, durante semanas e meses de cada vez, outros
aspectos do grupo intrometem-se e exigem atenção senão
por outra razão, pela própria razão de se estarem intro
metendo e, dessa maneira, prestando-se melhor à de
monstração . Entre êsses outros fenômenos, encontra-se
a conseqüência que decorre da diminuição do compo
nente ' paciente' na contribuição do terapeuta e para
isto é que devo agora voltar-me .
Deverão lembrar-se de que os grupos, de tempos em
tempos, alegam que sou eu o paciente e sugerem às
vêzes que me beneficiei com a experiência do grupo .
Um dos elementos que contribui para esta expressão de
suas crenças é a inveja de que eu seja aparentemente
mais apto a transformar minha experiência em bons
1 07
resultados e tornar-me, em virtude disso, aproximado
do 'animal político' de Aristóteles, atingindo assim o
crescimento e o desenvolvimento que são concomitantes
a ser-se um organismo em seu ambiente adequado; tal
vez eu tipifique o paciente que está obtendo mais do que
sua parte justa de atenção e uma crença dessas é que
faz o grupo escolher outro membro para líder . Seja como
fôr, o nôvo líder é, na minha experiência, sem exceções,
uma caso psiquiátrico rematado . :B:le é · exaltado por
manter o grupo andando, por falar livremente, em suma,
por ser uma grande melhora sôbre mim, numa varie
dade de maneiras . Embora haja sempre substância nes
tes comentários apreciativos, nunca se questionou que
o homem ou a mulher elevados pelo grupo constituam
um 'caso' .
. Chegamos então à posição seguinte : o grupo está
empenhado em apoiar, aplacar, acalmar, lisonjear e
submeter-se ao seu membro mais doente, que é agora o
líder; temos de encarar êste desenvolvimento como sen
do o dual da sbD e, por conseguinte, devemos voltar-nos
para uma outra consideração .
O DUAL DA sbD
109
bee, pessoas inteiramente comuns recebiam o mesmo tra
tamento que os faraós - tão bom como o dêles, mas a
uma taxa muito mais barata . Dessa maneira, uma mu
dança na técnica colocou todos os benefícios da psico
terapia muito exclusiva dos faraós ao alcance de bôlsas
muito modestas . Parece ser que aquêles de nós que bus
cam encontrar na terapêutica de grupo uma solução dos
problemas econômicos colocados pela psicanálise este
jam realmente seguindo uma tradição de época muito
respeitável . Esta situação em que um povo inteiro é
exaurido para p rover a um só indivíduo, é o que eu des- .
creveria como sendo o dual da sbD . Podemos ver nela
até que ponto o arrastamento da sbD absorve energias
do grupo que poderiam ter sido dedicadas às suas reali
dades externas de segurança, não houvesse existido uma
técnica disponível para um manejo mais direto da sbD .
Teremos de examinar êstes assuntos mais de perto
quanto viermos a considerar T e, particularmente, cer
tas formas especializadas do grupo de trabalho, mas, de
momento, tenho de deixá-las de lado para considerar a
complicação que foi introduzida pela estreita conexão
existente na sbD entre a liderança do grupo e o mem
bro do grupo mais psiquiàtricamente perturbado . Não
quero tentar nenhuma solução do problema da razão
pela qual o grupo, quando abandonado ao comporta
mento espontâneo, escolhe como líder, na sbD, seu mem
bro mais doente . Sempre foi reconhecido que assim é;
tanto mesmo, na realidade, que o grande líder religioso
- e o grupo religioso, por razões evidentes, é um grupo
em que a sbD é ativa e vital - é geralmente conside
rado como louco ou possuído por um demônio, exata
mente como se os membros de um grupo com a sbD em ·
ascensão sentissem que se não forem conduzidos por um
louco, então êles é que terão de sê-lo . Na verdade, po
der-se-ia dizer que, tal como rej eitam qualquer fato que
vá de encontro à crença de que são todos individualmen
te cuidados pela pessoa ou divindade de quem dependem,
assim rejeitam também todos os fatos que poderiam in
dicar que o líder ou divindade seja são . A crença na
santidade dos idiotas e de que o gênio é aparentado com
110
a loucura indica esta mesma tendência que tem o grupo
de escolher, quando é deixado sem estruturação, seu
membro mais doente como líder . Talvez isso sej a um re
conhecimento inconsciente de que o bebê, se não nos
houvéssemos acostumado a associar seu comportamento
com o desenvolvimento físico, é realmente insano e, na
sbD, é tão necessário ter-se alguém que seja dependente
de nós como possuir alguém de quem se dependa .
111
sutil e bem sucedida e os resultados foram tudo aquilo
que poderia ser desejado como forma .de escolha de um
vencedor psiquiátrico .
A CAUSA DA ANSIEDADE
112
fiam ter uma cegonha por rei na fábula do Esopo, os
faraós, todos êles, em graus variáveis, ilustram aspectos
do grupo em sua nova situação . Como mostrei antes,
o grupo volta-se para mim . Naturalmente, não é apenas
o clero que fica alarmado com esta situação . Sempre
que existe um estado que tenha probabilidade de ativar
a sbD ou de êle próprio ser ativado por ela, há um mêdo
à ditadura (um exemplo recente é o mêdo freqüente
mente expresso de que o Estado do Bem-Estar possa con
duzir a uma interferência tirânica com a liberdade) , à
tomada do poder pelos comunistas, pelos burocratas, etc.
Um dos apelos mais comuns nesta situação é pelo re
tôrno de uma fé em Deus e, na verdade, seria de sur
preender se no pequeno grupo terapêutico algum mem
bro não efetuasse exatamente êsse apêlo . l!:le expressa
o desej o de evitar a corporificação concreta da liderança
em um membro real do grupo . Se eu deixar as coisas
se desenvolverem, muitos remédios serão propostos : re
volta contra o líder escolhido, a reivindicação de que o
tratamento deveria ser acessível a todos · e de que uma
só pessoa não deveria monopolizá-lo, etc . Com efeito,
tôdas as soluções sugeridas são identificáveis como es
treitamente semelhantes a procedimentos tentados du
rante o decorrer da história . O que não é tão fácil de
descrever é aquilo contra o que o grupo está procurando
proteger-se .
1 13
efetuado por uma sene de oscilações de uma op1mao
para outra . Se me recuso a intervir, e testei esta situa
ção diversas vêzes, deixando-a ir muito longe, até mesmo
longe demais para a segurança, as oscilações se tornam
muito rápidas . E quando, como nesta situação, a dis
tância a separar as duas crenças é grande - porque é
difícil imaginar duas opiniões mais amplamente sepa
radas que a crença de que o líder é louco e a crença de
que êle seja a pessoa de quem se depende, em que pode
mos apoiar-nos para nosso bem-estar - então as oscila
ções têm de ser tanto rápidas no tempo quanto grandes ·
em amplitude . O resultado é que o grupo não pode mais
conter a situação emocional que, logo após, se espalha
com violência explosiva para outros grupos, até grupos
suficientes serem arrastados para absorver a reação . Na
prática, no grupo pequeno, isto significa um impulso a
queixar-se à autoridade externa, como, por exemplo, es
crever para o jornal, para um membro do Parlamento
ou para as autoridades da Clínica . O objeto dêste alicia- .
menta de outros grupos não é, como a. princípio ima
ginei ser, uma vingança sôbre o psiquiatra pelo descon
fôrto experimentado - embora isso possa existir e da
nos ao psiquiatra ou ao grupo serem o resultado - . mas
sim trazer para dentro tanto material inerte (sob a for
ma de estranhos ao grupo, que não partilham da situa
ção emocional) que o grupo nôvo e muito maior deixe
de vibrar . Não há mais a violenta e desagradável osci
lação de massa .
obviamente, muita coisa depende da rapidez com
que os outros grupos isolados ou mesmo parte de outro
grupo podem ser introduzidos para absorver a oscila- ·
ção. Se chegarem muito lentamente ou em quantidades
muito pequenas, então as oscilações espalhar-se-ão aos
até então inertes e a situação ficará mais desagradável
do que nunca .
Evidentemente, não é desej ável que tal explosão se
efetue e, na verdade, a não ser por razões de pesquisa,
não é j ustificável deixar que uma reação atinj a um pon
to em que o grupo não mais consegue conter suas emo
ções . É necessário que o psiquiatra encontre interpre-
1 14
tações que dêem ao grupo um insight do que está acon
tecendo; que coloque a sb e o T em contacto .
Interpretações que expõem, em pormenor e no de
correr de seu desenvolvimento, os fenômenos que des
crevi aqui em têrnios gerais, parecem-me realizar isso .
O leitor poderá achar divertido ver se pode descobrir
alguma situação que corresponda à descrição que dei
da sbD e de seu dual nos relatórios de atividades de
grupo, semelhantes às que acabei de utilizar, não ape
nas em obras históricas mas também em relatos con
temporâneos como narrativas de j ornais . Neste país,
de qualquer modo, os comentários da imprensa sôbre o
chamado Estado de Bem-Estar parecem-me amiúde trair
uma ansiedade de que a sbD, seja em forma simples ou
duaJ, esteja sendo estimulada ou seja, alternativamente,
a fonte da qual o desejo de um Estado de Bem-Estar se
origina . Acrescentaria, contudo, que é muito mais fácil
acreditar que se pode perceber êstes fenômenos em gru
pos de que se está desligado, do que num pequeno grupo
do qual se participa ativamente . É esta última expe
riência que é a importante .
REFER:í!:NCIAS
J15
Na seção anterior, descrevi uma das causas de os
cilação num grupo . Desejo agora considerar um fenô
meno que pode conquzir a tal oscilação ou, então, ao
cisma. Em meu quinto artigo, disse que o 'desenvolvi
mento' era uma função importante do grupo T . É tam
bém um dos aspectos em que o grupo T difere do grupo
de suposição básica . O grupo T acha-se necessàriamen
te interessado na realidade e, dessa maneira, pode-se di
zer que êle possui algumas das características que Freud ·
atribui ao ego, em sua discussão do indivíduo . Uma vez
que o grupo T acha-se interessado na realidade, suas
técnicas, em última análise, tendem a ser científicas . O
tema agora é a resistência que se forma quando o de
senvolvimento é exigido do grupo ou dos indivíduos que
o compõem .
CISMA
ll6
qualquer sacrifício penoso e, assim, seja popular . Dessa
maneira, a atividade mental se estabiliza num nível que
é cediço, dogmático e indolor . O desenvo:.vimento é in
terrompido e a estagnação resu:,tante é difundida .
O subgrupo recíproco compõe-se daqueles que
apoiam ostensivamente a idéia nova e êste subgrupo se
põe a campo para alcançar o mesmo fim que o primeiro,
mas de maneira bastante diferente . �le se torna tão exi
_gente em suas demandas que deixa de efetuar recruta
mento . Dêste modo, não existe a penosa reunião de ini
ciados e não iniciados, primitivos e refinados que cons
titui a essência do conflito de desenvolvimento . Ambos
os grupos atingem assim o mesmo fim e o conflito é
encerrado . Exagerando, para fins de melhor clareza, eu
diria que o primeiro subgrupo possui grande número
de indivíduos não refinados e primitivos, que vêem seu
número crescer constantemeilté, mas que não se desen
volvem . O outro subgrupo progride, mas numa frente
tão estreita e com . tão poucos recrutas que êle também
evita a penosa reunião da nova idéia e do estado primi
tivo . O mecanismo igualiza o grau de refinamento nos
indivíduos da comunidade e impede também o conflito
entre o desenvolvimento e o instinto no indivíduo . Fico
a lembrar-me das afirmações de que a sociedade gera
copiosamente seus membros menos cultos ou menos edu
cados, enquanto que as 'melhores' pessoas permanecem
obstinadamente estéreis .
O cisma, tal como o descrevi aqui numa forma ex
tremada, deve ser contrastado com aquilo que acontece
quando o grupo tenta acabar com a oscilação pela absor
ção de grupos externos (Seção 6) : o grupo cismático
tenta solucionar seus problemas pela guerra interna; o
outro, pela externa .
J l7
O problema da relação do indivíduo com os outros
e com o seu grupo foi discutido desde tempos muitos.
antigos . Platão deu ênfase à função do indivíduo no
grupo, ou seja, à necessidade de o sapateiro aferrar-se à
sua fôrma em prol da vida harmoniosa do grupo. Esta
opinião parece ingênua quando colocada ao lado das
complexidades da psicologia atual, ma.s pode ser esque
cido que há substância nessa afirmação . Ela pressupõe
que os indivíduos são pessoas racionais e que a consi
deração preàominante é a limitação imposta pela reali
dade . Se o indivíduo mantiver-se fiel à sua tarefa , se
cooperar com os outros indivíduos, permitindo-lhes que
cumpram as suas, então tudo estará bem . Em minha
terminologia, isto equivaleria a dizer que se o grupo T
fôsse o único componente da vida mental do grupci, não
haveria dificuldade . Mas o argumento que demonstrei
durante todos êstes artigos é que o grupo T é constan
temente perturbado por influências oriundas de outros
fenômenos mentais de grupo .
Que isso assim era tornou-se óbvio já em data re
mota e sentiu-se que a teoria platônica não era satis
fatória, por não haver resistido à verificação da expe
riência . Ela foi principalmente criticada por Aristóte
les . Para nossos fins, porém, acho que não precisaremos
considerar quaisquer avanços até Santo Agostinho pro
duzir A Cidade de Deus . É significativo que a captura
de Roma por Alarico houvesse produzido uma reação
tão intensa e que o efeito de tal fato sôbre Santo Agos
tinho fôsse fazê-lo reconsiderar tôda a questão das rela
ções humanas dentro do Estado . O que êle faz é postu
lar uma cidade celestial em que as relações entre os in
divíduos se harmonizam através da relação de cada in
divíduo com Deus . Ora, esta opinião é muito diferente
da de Platão . Santo Agostinho introduziu uma nova
dimensão . Seus postulados implicam que a descrição
platônica daquilo que chamo de grupo T não é uma
visão suficiente do grupo; o que se precisa é de algo
muito próximo daquilo que quero dizer com sbD . Já des
crevi como, na sbD, os indivíduos não possuem relacio
namento uns com os outros, mas cada um se relaciona
I J8
com o líder de dependência . Desde Santo Agostinho
nunca houve nenhum retôrno real à visão clássica, em
bora, sob alguns aspectos, Hobbes dela se aproxime ao
ignorar a classe de fenômenos de que Santo Agostinho
tentou tratar . Os pensadores liberais das épocas recen
tes . estiveram dispostos a argumentar que a emoção e a
razão são fàcilmente harmonizáveis, ou seja, em minha
terminologia, que as operações do grupo T podem ser
fàcilmente harmonizadas com as operações do grupo de
suposição básica . Nietzsche parece reagir contra esta
opinião, parecendo sugerir que um grupo só atinge a
vitalidade pela libertação dos impulsos agressivos . Em
minha terminologia, isto significaria que um sentimen
to de vitalidade só pode ser alcançado pela dominância
da suposição básica, notadamente da sbF . Em minha
experiência de grupos, tôdas estas opiniões parecem ser
expressas de uma forma ou de outra, e até mesmo ga
nhar uma ascendência temporária em ação . Mas, do
que já disse nestes artigos, deverá ter sido compreendido
que não considero que qualquer delas, na prática, pro
porcione alguma solução duradoura . Em todos os casos,
como espero poder demonstrar, as reações grupais são
infinitamente mais complexas do que as teorias anterio
res sugerem, mesmo em todo o seu desdobramento .
Freud des;tprovou expressamente qualquer coisa que não
fôsse um estudo superficial do problema grupal (Psico
logia de Grupo e a Análise do Ego) , baseando suas obser
vações principalmente numa crítica, derivada da psica
nálise, do trabalho feito por outros ( Totem e Tabu, 1950,
pág. 75, nota de rodapé 1 ) .
Em sua Psicologia de Grupo e a AnáliS'e do Ego,
Freud abre a discussão apontando que a psicologia indi
vidual e a psicologia de grupo não podem de modo al
gum ser diferenciadas, porque a psicologia do indivíduo
é, ela própria, uma função de sua relação com outra
pessoa ou objeto . Objeta êle (pág. 3 ) que é difícil atri
buir ao fator numérico uma significação tão grande a
ponto de torná-lo capaz de, por si próprio, introduzir
na vida mental um nôvo instinto que, doutra maneira,
não seria colocado em j ôgo . Em minha opinião, nenhum
119
instinto nôvo é colocado em j ôgo, pois êle está sempre
em jôgo . O único sentido ern reunir um grupo de pes
soas é que isso nos permite ver exatamente como ope
ram as características 'políticas' do corpo humano . Já
disse que não considero necessário que um grupo de pes
soas seja reunido; o individuo não pode deixar de ser
membro de um grupo, mesmo se sua filiação a êle con
siste em comportar-se de maneira a conceder realidade
à idéia de que não pertence a grupo algum . A êste res
peito, a situação psicanalítica não é uma 'psicologia in
dividual' mas sim uma 'psicologia do par' . O indivíduo
é um animal de grupo, em guerra não apenas com o
grupo, mas também consigo próprio, por ser um anima l
de grupo, e com aquêles aspectos de sua personalidade
que constituem sua 'grupalidade' .
É necessário ao gJ;upo reunir-se numa sala, porque
as condições para estudo só podem ser proporcionadas
por essa maneira . Freud e outros d e quem cita, tais
como McDougall e Le Bon, parecem-me considerar que
a psicologia de grupo é algo que passa a existir quando
há um certo número de pessoas reunidas no mesmo
lugar e ao mesmo tempo e, a respeito, concordo com o
protesto formulado por Freud de que, por isso, uma
significação grande demais é atribuída ao número, mas
penso estar êle equivocado ao dizer que a solução só pode
ser buscada em uma ou outra das duas alternativas se
guintes :
J..2 0
monstráveis . Não ligo importância intrínseca à reunião
do grupo . É importante que o grupo se reúna de ma
neira bastante cerrada para eu poder dar uma interpre
tação sem ter de gritá-la . Isto significa que seu núme
ro deve ser limitado . O grau de dispersão do grupo deve
igualmente ser limitado porque desej o que todos os in
divíduos tenham oportunidade de testemunhar a evi
dência em que baseio minha interpretação . Pela mesma
razão, os indivíduos devem também reunir.:se à mesma
hora . Ora, esta congregação do grupo num lugar deter
minado e num tempo determinado é evidentemente mui
to importante pelas razões puramente mecânicas que
forneci, mas não tem qualquer significação na produ
ção dos fenômenos de grupo. A idéia de que tem origi
na-se da impressão errônea de que uma coisa deva ne
cessàriamente começar no momento em que sua exis
tência se torna demonstrável . O argumento que dese
jo prova:r; é que nenhum indivíduo, por mais isolado
que esteja no tempo e no espaço, pode ser encarado
como exterior a um grupo ou que lhe faltem ma
nifestações ativas de psicologia de grupo, embora
não existam condições que tornem possível demons
trá-lo . A aceitação da idéia de que o ser humano é um
animal de grupo solucionaria as dificuldades que se
sente existir no aparente paradoxo de ser um grupo mais
do que a soma de seus membros . A explicação de certos
fenômenos deve ser buscada na matriz do grupo e não
nos indivíduos que vão constituí-lo . A marcação do
tempo não é função de qualquer parte isolada do meca
nismo de um relógio, mas, apesar disso, tal marcação é
uma função do relógio e das diversas partes dêste, quan
do colocadas em combinação umas com as outras .
Não há mais necessidade de ficar-se desconcertado
pela impressão de ser um grupo algo mais que a soma
de seus membros do que se ficaria pela idéia de ser um
relógio mais que uma reunião das partes que são ne
cessárias para fabricar um relógio .
Resumindo, existem características no indivíduo
cuja significação real não pode ser entendida, a menos
que se compreenda que constituem partes de seu equi-
121
pamento como animal de horda e seu funcionamento
não pode ser percebido a menos que seja procurado no
campo inteligível de estudo, o qual, neste caso, é o gru
po . Não podemos compreender um recluso que viva em
isolamento, a menos que nos informemos sôbre o grupo
do qual êle é membro . Argumentar que em tal caso
·
122
sua atividade não é manifesta. O grupo, no sentido de
uma reunião de pessoas dentro de uma sala, não acres
centa nada ao indivíduo ou ao conjunto de indivíduos,
mas simplesmente revela algo que não é visível d e outra
maneira .
Noutras palavras, a aparente diferença entre psico
logia de grupo e psicologia individual é uma ilusão pro
duzida pelo fato de o grupo fornecer um campo inte
ligível de estudo para certos aspectos da psicologia in
dividual e, assim fazendo, colocar em evidência fenôme
nos que parecem estranhos a um observador desacostu
mado a utilizar o grupo . Freud não me parece afirmar
em parte alguma que suas opiniões sôbre o grupo sejam
derivadas de um estudo do animismo : êle declara que
sua contribuição é visível apenas em sua seleção de ma
teriais e opiniões (presumivelmente das obras básicas
que cita, Totem e Tabu, pág. 75, nota 1 ) . As explicações
do comportamento de grupo parecem derivar-se, por
dedução, da situação psicanalítica . Por esta razão, é
possível que a descrição freudiana do grupo e, mais ain
da, a de Le Bon, que Freud cita com certa aprovação,
pareçam-me um tanto estranhas, quando as comparo
com minhas experiências reais num grupo . Por exem
plo, quando Freud cita Le Bon ao dizer que 'Os grupos
nunca têm sêde da verdade . Pedem ilusões e não podem
passar sem elas' (Freud, 1921) , não me é possível con
cordar com essa descrição . Como indiquei no início desta
parte, atribuo grande fôrça e influência ao grupo de tra
balho, que, através de sua preocupação com a realidade,
é compelido a empregar os métodos da ciência, por ru
dimentar que seja a forma , que utiliza . Penso que uma
das coisas notáveis a respeito de um grupo é o fato de
a longo prazo ser o grupo T que triunfa, a de�peito da
influência das suposições básicas . O próprio Freuci pa
rece não considerar - principalmente quando discute o
papel que o grupo desempenha na produção da lingua
gem, canções populares, folclore, etc . - que a descri
ção de Le Bon é injusta para com o grupo . Quando
Freud critica as opiniões de McDougall sôbre o grupo
altamente organizado, indica que McDougall considera
123
que as condições de organização afastam 'as desvanta
gens psicológicas da formação do grupo' . Isto se apro
xima muito de minha opinião sôbre o grupo especializa
do de trabalho, a ter como função o manejo da suposi
ção básica, a fim de impedi-la de entravar o grupo de
trabalho . Freud prefere descrever o problema como con
sistente em conseguir para o grupo 'precisamente aquê
les aspectos que foram característicos do indivíduo e que
nêle se extinguiram pela formação do grupo' . Postula
êle um indivíduo fora do grupo primitivo, que possui
sua própria continuidade, sua consciência de si mesmo,
suas tradições e costumes, suas próprias funções e po
sições particulares . Diz que devido ao seu ingresso num
grupo 'não organizado', o indivíduo perdeu sua quali
dade distintiva por algum tempo . Em minha opinião, a
luta do indivíduo para preservar sua qualidade distin
tiva assume características diferentes, de acôrdo com o
estado de espírito do grupo em qualquer momento dado.
A organização de grupo deve dar estabilidade e perma
nência ao grupo de trabalho, que se sente ser muito mais
fàcilmente submergido pelas suposições básicas se o gru
po fôr desorganizado . A distintividade indiviQ.ual não
faz parte da vida de um grupo a atuar segundo as supo
sições básicas . A organização e a estrutura são as armas
do grupo T. São o produto da cooperação entre os mem
bros do grupo, e seu efeito, uma vez estabelecido no gru
po, é exigir ainda mais cooperação dos indivíduos no
grupo . A êste respeito, o grupo organizado de McDou
gall é sempre um grupo de trabalho e nunca um grupo
de suposição básica . Um grupo que age segundo uma
suposição básica não necessita de organização nem de
cooperação . A contrapartida da cooperação no grupo
d e suposição básica é aquilo que chamei de valência -
uma função espontânea e inconsciente da qualidade gre
gária na personalidade do homem . É apenas quando um
grupo começa a agir segundo uma suposição básica que
as dificuldades surgem . A ação, inevitàvelmente, signi
fica um contato com a realidade e o contato com a reali
dade obriga ao respeito pela verdade, impondo dessa
124
maneira o método científico e, daí, a evocação do grupo
de trabalho .
Podemos voltar a considerar ainda mais o grupo es
pecializado de trabalho . Como sugeri, Freud encontra
va-se em situação desvantajosa por ter de deduzir si
tuações de grupo de seu estudo da transferência . Pelas
razões que forneci, a transferência tem possibilidades
de ser colorida por características de grupo que se deri
vam da sbA, isto é, se considerarmos fenômenos de gru
po que têm possibilidades de serem ativados pelo estímu
lo da situação de par que realmente existe na psicaná
lise . Na verdade, é na situação de grupo que mais fàcil
mente podemos encontrar a fonte, tanto da proeminên
cia dos elementos sexuais na psicanálise, quanto das .
suspeitas e acusações dos opositores de Freud de ser 'se
xual' a psicanálise . As conseqüências imediatas para
sua discussão dos grupos foi que êle pôde deduzir da
psicanálise algumas das características de dois grupos
especializados de trabalho, o Exército e a Igreja, mas
não foi conduzido a uma discussão do grupo especiali
zado de trabalho que mais possibilidades tinha de ter de
tratar com a sbA . O subgrupo de uma sociedade que
mais probabilidades tem de tratar com manifestações da ·
sbA é o subgrupo que dá mais importância à procriação,
ou seja, a aristocracia . Se as características do grupo
de trabalho tivessem de desempenhar um papel domi
nante, elas se manifestariam por meio de alguma ati
vidade parecida com o subsídio de pesquisas genéticas .
Tal como é, não podemos encarar o interêsse demons
trado na procriação como possuindo a aura científica
que deveria ser patognomônica do grupo de trabalho. A
razão, naturalmente, é que êle não trata simplesmente
do problema do grupo de trabalho, mas trata-se de um
subgrupo especializado expelido (split off) para tratar
com a sbA, aproximadamente da mesma maneira pela
qual o Exército e a Igreja têm de tratar com a sbF e
com a sbD, respectivamente . Por esta razão, não é pro
vável que a relação dêste subgrupo com o grupo prin
cipal seja determinada pela precisão científica com que
conduz seus assuntos amorosos segundo princípios estri-
125
tamente genéticos, mas sim pela eficiência com que sa
tisfaz a exigência feita pelo grupo de que a s bA seja tra
tada de maneira a não entravar as funções T do grupo ·
como um todo .
Ora, j á declarei que na sbD a ansiedade origina-se
do sentimento de que tanto o grupo quanto o indivíduo
são subservientes ao gênio futuro . A função da aristo
cracia é, às vêzes, encontrar um escoadouro para a ati
vidade baseada na suposição do grupo de acasalamento,
sem ofender o sentido de realidade do grupo e, outras
vêzes, impedir que o sentido de realidade do grupo so
lape as instituições de cuja preservação o grupo depende
para o fornecimento de um veículo inofensivo para uma
expressão da sbA .
REFEF.:S:NCIAS
126
REVISÃO
Dinâmica de Grupo
129
que o suposto grupo é dotado pelo indivíduo . É dada
substância à fantasia de que o grupo existe pelo fato
de a regressão envolver o indivíduo numa perda de sua
'distintividade individual' (Freud, 1921, pág. 9) , indis
tinguível da despersonalização, e, dessa maneira, obscure
cer a observação de que a reunião é composta de indi
víduos . Decorre disso que se o observador julga um gru
po como em existência, os indivíduos que o compõem
devem haver experimentado essa regressão . Inversamen
te, se os indivíduos que compõem um 'grupo' (utilizando
essa palavra para significar uma agrega<;ão de indiví
duos, todos no mesmo estado de regressão) , por uma
razão ou outra, ficam ameaçados pela consciência de
sua distintividade individual, então o grupo se encontra
no estado emocional conhecido como pânico . Isto não
significa que o grupo está-se desintegrando e ver-se-á
mais tarde que não concordo que, no pânico, o grupo
perca o seu caráter coesivo .
Neste trabalho, resumirei certas teorias a que che
guei pela aplicação a grupos das intuições desenvolvidas
pelo treinamento psicanalítico atual . Estas teorias di
ferem de muitas outras, tanto em méritos quanto em
defeitos, por serem deduzidas nas situações de tensão
emocional que elas pretendem descrever . Introduzo al
guns conceitos novos à psicanálise, em parte por tratar
de u m assunto diferente e em parte porque desej o ver
se um comêço não perturbado por teorias anteriores po
derá conduzir a um ponto em que minhas opiniões sôbre
o grupo e as opiniões psicanalíticas sôbre o indivíduo
poderão ser comparadas e, por isso, j ulgadas comple
mentares ou divergentes .
Há ocasiões em que penso que o grupo tem uma
atitude em relação a mim e que posso enunciar em pa
lavras qual seja essa atitude ; há outras em que outro in
divíduo atua como se êle também pensasse que o grupo
tem uma atitude a seu respeito e acredito que posso de
duzir qual é a sua crença; há, por fim, ocasiões em que
penso que o grupo tem uma atitude em relação a um
indivíduo e que posso dizer qual seja ela . Estas ocasiões
fornecem a matéria-prima sôbre a qual as interpretações
130
se baseiam, mas a própria interpretação é uma tentati
va de traduzir em têrmos precisos o que suponho ser a
atitude do grupo para comigo ou para com algum outro
indivíduo ou do indivíduo para com o grupo . Apenas
algumas dessas ocasiões são 1:1tilizadas por mim; consi- ·
O GRUPO DE TRABALHO
131
guir, um exemplo de uma fase passageira num grupo
assim :
Seis pacientes e eu estamos sentados em volta de
uma sala pequena . A Srta. A. sugere que seria uma boa
idéia os membros concordarem em chamar -se por seus
nomes de batismo . 1 Há um certo alívio de que um tópico
de conversa tenha sido mencionado, olhares são troca
dos e um esbôço de animação sintética torna-se momen
tâneamente visível . O Sr . B . arrisca que isso seria uma
boa idéia e o Sr . C . diz que 'tornaria as coisas mais
amistosas' . A Srta. A. é incentivada a divulgar seu nome,
mas a Srta. D . antecipa-se a ela, dizendo não gostar de
seu primeiro nome e preferir que êle não seja conhecido.
O Sr . E . sugere pseudônimos; a Srta. F . examina as
unhas da mão . Passados alguns minutos da· sugestão da
Srta. A . , a discussão definhou e seu lugar foi ocupado
por olhares furtivos, dos quais um número crescente é
dirigido na minha direç ão . O Sr . B . desperta para di
zer que temos de chamar-nos mutuamente de algo . o
estado de espírito é agora um misto de ansiedade e frus
tração crescentes . Muito antes de ser mencionado, é cla
ro que meu nome tornou-se uma preocupação para o
grupo . Abandonado a seus próprios artifícios, o grupo
promete passar à apatia e ao silêncio .
Para meus fins atuais, apresentarei os aspectos do
episódio que ilus tr em meu emprêgo ela expressão 'grupo
de trabalho' . No próprio grupo, também poderia fazer
o mesmo, mas isso dependeria de minha avaliação da
significação do episódio no contexto da vida mental do
grupo, até onde ela havia então surgido . Em primeiro
lugar, é claro que se sete pessoas terão de conversar
j untas, será útil para o debate haver nomes disponíveis .
Até onde a discussão surgiu através da consciência dêsse
fato, ela é um produto da atividade d.o grupo de traba
lho . Mas o grupo foi mais longe que a proposição de
flar um passo que seria útil em qualquer grupo, qual
quer que seja a sua tarefa . Fêz-se a proposta de os no
mes de batismo serem usados porque isso contribuiria
1 32
para a amistosidade . No grupo de que estou falando,
seria exato dizer que a produção de amistosidade era
encarada como estritamente pertinente às necessidades
terapêuticas . No ponto de sua história de que o exem
plo foi tirado, seria também verdadeiro dizer que tanto
a objeção da Srta. D . , quanto a solução proposta pelo
Sr . E . , seriam encaradas como ditadas pela necessidade
terapêutica ; e de fato, indiquei que as sugestões ajusta
vam-se numa teoria, ainda não explicitamente afirmaw
da, de que nossas doenças seriam curadas se o grupo
pudesse ser conduzido de maneira que sàmente e'tnoções
agradáveis fôssem experimentadas . Ver-se-á que a de
monstração da função do grupo de trabalho deve incluir :
o desenvolvimento de pensamento projetado para ser
traduzido em ação; a teoria (neste exemplo, a necessida
de de amistosidade) em que se baseia; a crença na mo
dificação ambiental como em si própria suficiente para
a cura, sem qualquer mudança correspondente no in··
divíduo e, finalmente, uma demonstração do tipo de fato
que se acredita ser 'real' .
No exemplo que forneci, aconteceu que pude subse
qüentemente demonstrar que a função do grupo de tra
balho, embora eu não o chamasse assim, baseada na
idéia de que a cura podia ser obtida de um grupo em
que apenas sentimentos agradáveis fôssem experimen
tados, não pare<;ia haver produzido a cura esperada e,
na verdade, estava sendo obstruída por um certo tipo
de dificuldade em conseguir uma tradução limitada no
ato aparentemente simples de designar nomes . Antes
de passar à discussão da natureza das obstruções à ati
vidade do grupo de trabalho, mencionarei aqui uma di
ficuldade que j á deve ser evidente na exposição de mi
nhas teorias . Para mim, descrever um episódio de grupo,
tal como o que estive discutindo, e, depois, tentar dêle
a dedução de teorias, destina-se apenas a dizer que pos
suo uma teoria de que aconteceu isso e aquilo e que só
posso enunciá-la de nôvo numa linguagem diferente . A
única maneira pela qual o leitor pode livrar-se do dile
ma é procurando lembrar-se de alguma comissão ou de
outra reunião de que tenha participado e considerar até
133
que ponto pode recordar-se de exemplos que possam
apontar para a existência do que chamo função do gru
po de trabalho, sem esquecer a estrutura administrativa
real, com presidente e tudo o mais, como material a ser
incluído em sua rememoração .
AS SUPOSIÇõES BASICAS
134
poderia ser encarada como mna repetição de minha
observação acima, isto é, de que· o grupo s,upunha que
'se haviam reunido para receber de min1 alguma for:.na
de tratamento', sàm�nte diferindo dela por se achar
enunciada em têrmos metafóricos . Mas o ponto essen
cial é que a suposição básica só pode ser compreendida
se as palavras em que a enunciei são tomadas como lite
rais e não metafóricas .
Temos aqui a descrição de um grupo terapêutico em
que a suposição de dependência, como a chamarei,
acha-se em ação: .
Três mulheres e dois homens estava1n presentes. O
grupo havia, numa ocasião anterior, mostrado sinais de
uma função de grupo de trabalho dirigida para a cura
da incapacidade de seus membros; nesta ocasião, po
der-se-ia supor haverem êles reagido a isso com deses
pêro, colocando tôda a sua confiança em mim· para pôr
em ordem suas dificuldades, ao mesmo tempo em que
se contentavam individualmente em fazer perguntas a
que eu deveria fornecer as respostas. Uma das mulhe
res havia trazido um pouco de chocolate, do qual timi
damente convidou sua vizinha da direita, outra mulher,
a participar. Um dos homens estava comendo um san
duíche. Um graduado em filosofia, que em sessões ante
riores dissera ao grupo não acreditar em Deus e não
possuir religião, ficou sentado em siiêncio, como, na ver
dade, freqüentemente fazia, até que uma das mulheres,
com um toque de aspereza no tom de voz, observou que
êle não havia feito perguntas. :Ele respondeu: 'Não pre
ciso falar porque sei que tenho de vir aqui bastante tem
po e tôdas as minhas 'perguntas serão respondidas sem
ter que fazer coisa alguma'.
Eu disse então que me havia tornado uma espécie
de divindade do grupo; que as perguntas me eram diri
gidas como a alguém que soubesse as respostas sem ne
cessidade de precisar valer-se de trabalho, que o ato de
comer fazia parte de uma manipulação do grupo desti
nada a dar substância a uma crença que desejavam pre
servar a meu respeito e que a resposta do filósofo indi
cava uma descrença na eficácia da oração, mas parecia,
135
sob outros aspectos, desmentir afirmações anteriores que
fizera, a respeito de sua falta de fé em Deus . Quando
comecei minha interpretação achava-me não apenas con
victo de sua veracidade, mas também não sentia dúvidas
de poder convencer os outros pelo confronto com a massa
de material (da qual sàmente posso transmitir um pou
co neste relato impresso) . Na ocasião em que terminei
de falar, senti haver cometido algum tipo de gafe; acha
va-me cercado por olhares inexpressivos e as provas ha
viam desaparecido . Após certo tempo, o homem, que
havia terminado seu sanduíche e colocado o papel cui
dadosamente dobrado no bolso, olhou em volta da sala,
as sobrancelhas ligeiramente levantadas, com interroga
ção no olhar . Uma mulher olhou tensamente para mim,
enquanto que outra, com as mãos j untas, mirava me
ditativamente o chão . Começou a solidificar-se em mim
a convicção <le que fôra culpado de blasfêmia num grupo
de verdadeiros fiéis . O segundo homem, com o braço
pendido sôbre as costas de sua cadeira, brincava com os
dedos . A mulher que estava comendo engoliu apressada
mente o resto de seu chocolate . Int'erpretei então que
me havia tornado uma pessoa muito ruim, a lançar dú
vidas sôbre a divindade do grupo, mas que isto fôra se
guido por um aumento de ansiedade e culpa quando o
grupo fracassou em dissociar-se da impiedade .
Neste relatd, demorei-me sôbre minhas próprias rea
ções no grupo por uma razão que espero poder tornar
mais evidente posteriormente . Pode ser justamente ar
gumentado que interpretações para as quais as provas
mais fortes residem, não nos fatos observados no grupo,
mas nas reações subj etivas do analista, têm mais pro
babilidades de encontrar sua explicação na psicopatolo
gia do analista que na dinâmica do grupo . É uma crí
tica j usta, uma crítica que terá de ser enfrentada por
anos de trabalho cuidadoso, por mais de um analista,
mas, exatamente por essa razão, deixá-la-ei de lado ago
ra e passarei a enunciar uma asserção que defenderei
durante todo êste trabalho . É ela a seguinte : no trata
mento de grupo, muitas inte.rpretações - e,- entre�_elas,
..
136
próprias reações emocionais do analista. Acredito que
estas reações dependem do fato de o analista no grupo
encontrar-se na extremidade receptora daquilo que Me
lanie Klein (1946) chamou de identificação projetiva e
que ê.sse mecanismo desempenha um papel muito im
portante nos grupos. Ora, a experiência da contratrans
ferência me parece possuir uma qualidade inteiramente
distinta, que permite ao analista diferenciar a ocasião
em que é objeto de uma identificação projetiva daquela
em que não o é. O analista sente que está sendo mani
pulado de maneira a desempenhar um papel, por difícil
de identificar que êste seja, na fantasia de outrem ou
. que o seria se não fôsse por aquilo que, rememorando,
só posso chamar de uma perda temporária de insigh:t,
uma sensação de experimentar sentimentos intensos e,
ao mesmo tempo, a crença de que a existência dêstes é
inteira e apropriadamente justificada pela situação obje
tiva, sem recorrer a explicações recônditas de sua cau
sação. Do ponto de vista do analista, a experiência con
siste em duas fases estreitamente relacionadas: na pri
meira, existe a impressão de que, seja o que fôr que se
tenha feito, não se deu certamente uma interpretação
correta; na segunda, há uma sensação de ser-se um tipo
especial de pessoa, numa situação emocional especial.
Acredito que a capacidade para sacudir a paralisante
sensação de realidade concomitante a êste estado é o
primeiro requisito para o analista no grupo; se puder
fazer isso, encontrar-se-á em posição para dar o que
acredito ser a interpretação correta e, assim, perceber
a sua ligação com a interpretação anterior, de cuja va
lidade foi levado a duvidar.
Tenho de voltar a considerar a segunda suposição
básica. Como a primeira, esta também se refere ao pro
pósito para o qual o grupo se reuniu. Minha atenção
foi pela primeira vez despertada por uma sessão em que
a conversa era monopolizada por um homem e uma mu
lher q ue pareciam mais ou menos ignorar o restante do
grupo. A troca ocasional de olhares entre os outros pa
recia sug érir a opinião, não muito seriamente sustenta
da, de que a relação era amorosa, embora dificilmente
137
se pudesse dizer que o conteúdo manifesto da conversa
fôsse muito diferente de outras trocas de palavras efe
tuadas pelo grupo . Fiquei, no entanto, impressionado
pelo fato de que indivíduos que são geralmente sensíveis
a qualquer exclusão de uma atividade supostamente te
rapêutica e que, . naquela ocasião, haviam vindo para
falar e obter uma 'interpretação' de mim ou de algum
outro membro do grupo, parecessem não se importar
em deixar o palco inteiramente àquele par . Posterior:-_ _
138
suficientemente; que a estação vindoura - primavera,
verão, outono, inverno, segundo fôr o caso - será mais
agradável; que alguma nova espécie de comunidade -
um grupo melhorado - deveria ser desenvolvida etc.
Estas expressões tendem a distrair a atenção para al
gum acontecimento supostamente futuro, mas, para o
analista, o ponto crucial não é um acontecimento fu
turo, mas o presente imediato - o próprio sentimento
de esperança. tste sentimento é caracteristico do grupo
de acasalamento e deve em si próprio se.r tomado como
prova de que êsse grupo se acha em existência, mesmo
qua-ndo parecem faltar outras provas. É, êle próprio,
tanto um precursor da sexualidade como uma parte dela.
As idéias otimistas verbalmente expressas são racionali
zações destinadas a efetuar um deslocamento no tempo
e uma transigência com os sentimentos de culpa - o
desfrute do sentimento é justificado pelo apêlo a um
resultado que se supõe moralmente inobjetável. Os sen
timentos assim associados ao grupo de acasala:rnento en
contram-se no pólo opôsto aos sentimentos de ódio, des
trutividade e desespêro. Para que os sentimentos de es
perança sejam sustentados, é essencial que o 'líder' do
grupo, diferentemente dos líderes do grupo de depen
dência e do grupo de luta-fuga, seja futuro. Será uma
pessoa ou uma idéia que salvará o grupo - na reali
dade, dos sentimentos de ódio, destrutividade ou deses
pêro de seu próprio grupo ou de outro -mas a fim de
realizar isso, evidentemente, a esperança messiânica
nunca deve ser alcançada . Apenas enquanto permanece
sendo uma esperança, é que a esperança persiste. A di
ficuldade é que, graças à racionalização da sexualidade
nascente do grupo, a premonição do sexo que intervém
como esperança, há uma tendência para o grupo de tra
balho ser influenciado na direção da criação de um Mes
sias, seja êle pessoa, idéia ou Utopia. Na medida em que
isso acontece, a esperança é enfraquecida, porque, obvia
mente, nada existe então a esperar e, uma vez que a des
trutividade, o ódio e o desespêro não foram, de modo
algum, radicalmente influenciados, sua existência de
nôvo se faz sentir. Isto, por sua vez, acelera um nôvo
139
enfraquecimento da esperança Se, para fins de debate,
o
140
qual .se pode dela escapar . Neste contexto, observaria
que a proposta de usar nomes de batismo, no primeiro
exemplo que dei, bem poderia ter sido interpretada como
expressão do desej o de fuga num grupo de luta-fuga,
embora, na realidade, por razões ligadas à fase de desen
volvimento que o grupo havia atingido, eu a tenha in
terpretado em têrmos de função do grupo de trabalho .
141
que ser um campo apropriado à investigação psicológi
ca depende de outros fatôres, além da natureza do cam
po a ser investigado, sendo um dêles a potência da técni
ca psicológica de investigação . A identificação de um
campo de medicina psicossomática ilustra a dificuldade
que espera qualquer tentativa de determinar a linha que
separa os fenômenos psicológicos dos fenômenos físicos.
Dessa maneira, proponho deixar indeterminados os li
mites que separam a suposição básica ativa daquelas que
releguei ao hipotético sistema protomental .
Muitas técnicas se acham em uso cotidiano para a
investigação da função do grupo de trabalho . Para a
investigação dos fenômenos de suposição básica, con
sidero a psicanálise ou alguma extensão técnica derivada
diretamente dela como essencial . Entretanto, como as
funções do grupo de trabalho são sempre impregnadas
por fenômenos de suposiçã.o básica, é claro que as técni
cas que ignoram os últimos darão impressões enganado
ras das primeiras .
As emoções associadas com as suposições básicas .
podem ser descritas pelos têrmos costumeiros de ansiE)�
dade, mêdo, ódio, amor e outros semelhantes . No en
tanto, as emoções comuns a qualquer suposição básica
são sutil e mutuamente afetadas, como se fôssem expe- ,
rimentadas numa combinação peculiar à suposição bá- 1
sica ativa, ou seja, a ansiedade no grupo de dependência
possui uma qualidade diferente da ansiedade que apa- 1
rece no grupo de acasalamento e o mesmo acontece con:y ·
outros sentimentos.
Tôdas as suposições básicas incluem a existência de
um líder, embora no grupo de acasalamento, como já
disse, o líder seja 'inexistente', isto é, futuro . :F.lste líder
não precisa ser identificado com qualquer indivíduo
do grupo; não necessita ser nem mesmo uma pessoa,
mas pode identificar-se com uma idéia ou um objeto ina
nimado . No grupo de dependência, o lugar de líder pode
ser preenchido pela história do grupo . Um grupo, a
queixar-se de uma incapacidade de lembrar o que acon
tecera . numa ocasião anterior, põe-se a fazer um regis
tro de suas reuniões . :F.lste registro torna-se então uma
142
'bíblia' à qual se apela se, por exemplo, o indivíduo em
que o grupo investiu a liderança mostra ser constituído
de material refratário à moldagem na semelhança pró
pria ao líder de dependência . O grupo vale-se da elabo
ração da bíblia quando é ameaçado por uma idéia cuja
aceitação acarretaria desenvolvimento por parte dos in
divíduos que compreendem o grupo . Tais idéias derivam
fôrça emocional e excitam oposição emocional de sua
associação com características apropriadas ao líder do
grupo de acasalamento . Quando o grupo de dependên
cia ou o · grupo de luta-fuga é ativo, efetua-se um com
bate para suprimir a nova idéia, porque se sente que
seu surgimento ameaça o status quo . Na guerra, a idéia
nova - seja ela um carro de combate ou um nôvo méto
do de seleção de oficiais - é sentida com simples 'moda',
ou seja, oposta à bíblia militar . No grupo de dependên
cia, ela é sentida como ameaçando o líder de depen
dência, seja êste 'bíblia' ou pessoa . Mas o mesmo tam
bém é verdadeiro em relação ao grupo de acasalamento,
porque aqui a nova idéia ou pessoa, sendo equiparada
ao gênio :futuro ou Messias, deve, como disse antes, per
manecer futura , se é que se quer que ela preencha a
função do grupo de acasalamento .
143
o grupo ativo é o de luta-fuga , a tendência é absorver
outro grupo . Se o grupo ativo é o de acasalamento, a
tendência é ao cisma . Esta última reação pode parecer
anômala, a menos que se recorde que no grupo de aca
salamento a esperança messiânica, seja ela pessoa ou
idéia, tem de permanecer irrealizada . O ponto crucial
da questão reside na ameaça da idéia nova a exigir o
desenvolvimento e na incapacidade dos grupos de supo
sição básica em tolerá-lo . Desenvolverei posteriormente
as razões para isso .
144
que são de suà ·jurisdição, então as funções do grupo de
trabalho do grupo principal ficam viciadas pela pressão
dessas s·a.posições básicas . Como a função do grupo de
trabalho consiste essencialmente na tradução de pensa
mentos e sentimentos em comportamentos adaptados à
realidade, é má adaptação dar expressão às suposições
básicas, porque estas tornam-se perigosas proporcional
mente à tentativa que é feita de traduzi-las em ação .
Na verdade, o grupo especializado de trabalho tende a
reconhecer isso e o demonstra pela tentativa de executar
o processo inverso, isto é, traduzir a ação nos têrmos da
mentalidade de suposição básica - procedimento muito
mais seguro . Dessa maneira, uma Igreja, quando lhe
é apresentada alguma notável realização da função do
grupo de trabalho, recomendará ao grupo que a agra
deça à sua divindade e não à sua capacidade de traba
lho duro e realístico -- non nobis, Domine . A Igreja
próspera e bem sucedida, do ponto de vista do facilita
menta da função do grupo de trabalho, deve combinar
o fortalecimento da crença religiosa com a insistência
de que nunca se deve agir segundo ela; o serviço de com
bate bem sucedido deve incentivar a crença de qualquer
coisa poder ser feita pela fôrça, desde que ela nunca
seja usada . Em ambos os casos, chegamos ao seguinte :
a mentalidade de suposição básica não se presta à tra
dução em ação, u�a vez que a ação, para manter con
tacto com a realidade, exige a função do grupo de tra
balho .
No pequeno grupo terapêutico, quando o grupo de
dependência acha-se ativo, a tendência é produzir um
subgrupo que assume então a função de interpretar o
líder do grupo de dependência - geralmente situado no
analista - para o grupo . No grupo de fuga-luta, um
subgrupo semelhante desempenha uma função similar .
Se o analista provar um material resistente, estará su
j eito a evocar reações que já descrevi como associadas
com a ameaça da idéia nova .
Mencionei acima (pg. 125) que uma aristocracia
pode constituir o grupo especializado de trabalho que
desempenha para o grupo de acasalamento funções se-
145
melhantes àquelas que Igreja e Exército desempenham
para os grupos de dependência e de fuga-luta, respecti..,
vamente . A função dêste subgrupo é. fornecer um es
coadouro para sentimentos centrados em idéias de pro:..
criação e nascimento, isto é, para a esperança messiâni
ca, que, como já sugeri, é uma precursora do desejo
sexual, sem nunca despertar o mêdo de que tais senti
mentos dêem origem a um fato que exija o desenvolvi
mento . A aristocracia deve inspirar a esperança mes
siânica, mas, ao mesmo tempo, também a confiança de
que o líder do grupo de acasalamento, caso se materia
lize, nascerá num palácio mas será exatamente igual a
nós próprios, 'democrático' sendo provàvelmente' a ex- ·
146
engendrada tende a determinar que a reação ao surgi
mento da pessoa ou idéia messiânica assumirá uma for
ma aberrante, em vez de dissipar-se na mudança cíclica
de uma suposição básica para outra porque, se um gru
po deseja impedir o desenvolvimento, a maneira mais
simples de fazê-lo é permitir-se ser esmagado pela men
talidade de suposição básica e, assim, aproximar-se da
única espécie de vida mental em que uma capacidade de
desenvolvimento não é exigida . A compensação prin
cipal por tal deslocamento parece ser o aumento de uma
sensação agradável de vitalidade .
A defesa que o cisma concede contra a idéia amea
çadora de desenvolvimento pode ser vista no funciona
mento dos grupos cismáticos, ostensivamente opostos,
mas, na realidade, promovendo o mesmo fim . Um deter
minado grupo adere ao grupo de dependência, amiúde
sob a forma de grupo 'bíblia' . �ste grupo populariza
as idéias estabelecidas, despoj ando-as de qualquer quali
dade que possa exigir um esfôrço penoso e, por êsse
meio, assegura a adesão numerosa daqueles que se
opõem às dores do desenvolvimento . O pensamento fica
assim estabilizado num nível que é cediço e dogmático .
O grupo recíproco, supostamente apoiando a idéia nova,
torna-se tão rigoroso em suas exigências que deixa de
efetuar recrutamento . Dessa maneira, ambos os grupos
evitam a penosa reunião de primitivos e refinados que
constitui a essência do conflito de desenvolvimento . Os
cismáticos superficiais mas numerosos são assim con
traditados pelos cismáticos profundos mas numerica
mente insignificantes . O resultado lembra-nos do temor
algumas vêzes expresso de que uma sociedade reproduz
copiosamente seus membros menos cultos enquanto que
as pessoas 'melhores' permanecem teimosamente es
téreis .
147
são capazes de cor�verter-se em algo de mais fundamen
tal . Admitindo-se que o postulado das suposições bási
cas ajuda a dar forma e significado ao complexo e
caótico estado emocional que o grupo põe à mostra do in
vestigador participante, não existe ainda uma explicação
razoável da razão pela qual tais suposições devam exis
tir . É claro que nenhuma das três suposições básicas
sôbre o grupo alivia satisfatàriamente o mêdo do grupo
e suas emoções, pois, doutra maneira, não haveria ne
nhum dos deslocamentos e mudanças de uma para ou
tra, nem necessidade da formação por mim delineada
dos correspondentes grupos especializados de trabalho . ·
148
uma capacidade de compreensão . O grupo de fuga-luta
expressa um sentimento de incapacidade para compreen
der e o amor sem o qual a compreensão não pode exis
tir . Mas o líder do grupo de luta-fuga traz de volta à
vista um dos componentes temidos : uma aproximação
com o pai temível ou com a criança .
Além disso, os três grupos de suposição básica pa
recem, por sua vez, ser reuniões de indivíduos a parti
lhar entre si as características de um determinado ca
ráter na situação edípica, as quais são dependentes da
suposição básica que se encontra ativa . O paralelo com
os caracteres da situação edípica é, no entanto, marcado
por importantes divergências . A relação parece ser entre
o indivíduo e o grupo, mas o grupo é sentido como um
indivíduo fragmentado, com outro, oculto, na espera . O
indivíduo oculto é o líder e, embora isto pareça contra
dizer a afirmação constantemente reiterada de que 'o
analista é o líder, a contradição se resolve se fôr lem
brado que no grupo terapêutico o analista é o líder do
grupo de trabalho e se se prestar atenção às muitas in
dicações de que êle é suspeito de liderar, mas, na apa
rência, apenas raramente é percebido como liderando .
É muito comum, em minha experiência, ser-me dito que
não estou tomando parte alguma no grupo, nem mesmo
dando ao grupo uma possibilidade de saber quais são
as minhas opiniões, embora a probabilidade seja a de
que eu estej a falando mais do que qualquer outro . O
ponto essencial aqui, como sempre num grupo, é o senti
mento de que a idéia expressa se faz acompanhar e o
ponto que desej aria enfatizar de nôvo é que sou imagi
nado como a liderar o grupo, mas não percebido como
tal .
No plano emocional, onde as suposições básicas são
dominantes, as figuras edípicas, como indiquei, podem
ser discernidas no material tal como o são numa psica
nálise, mas elas incluem um componente do mito de
Édipo sôbre o qual pouco foi dito; êsse componente é a
esfinge . Enquanto sou sentido como líder da função do
grupo de trabalho - e o reconhecimento dêsse fato
acha-se raramente ausente - eu e â função do grupo
14 9
de trabalho com que estou identificado somos investidos
de sentimentos que seriam inteiramente apropriados à
enigmática, meditativa e perguntadora esfinge de quem
a desgraça emana. Na verdade, empregam-se às vêzes
têrmos, em ocasiões em que minha intervenção provocou
mais que a ansiedade costumeira, que mal precisam de
interpretação para capacitar o grupo a apreender a se
melhança. Não sei de experiência que demonstre mais
claramente que a experiência de grupo o temor com que
uma atitude questionante é encarada. Esta ansiedade não
se dirige sàmente ao questionador mas também ao objeto
da inquirição e é, segundo suspeito, secundária à última,
porque o grupo, sendo o objeto da inquirição, desperta
êle próprio temores de um tipo extremamente primitivo.
Minha impressão é de que êle chega demasiadamente
perto, nas mentes dos indivíduos que o compõem, de
fantasias muito primitivas sôbre o conteúdo do corpo
da mãe . 1 A tentativa de efetuar uma investigação ra
cional da dinâmica do grupo é assim perturbada por
temores e mecanismos para manejá-los que são caracte
rísticos da posição paranóide-esquizóide . A investigação
não pode ser efetuada sem a estimulação e a ativação
dêsses níveis .
Encontramo-nos agora em posição melhor para con
siderar se as suposições básicas são capazes de conver
ter-se em algo de mais fundamental . Já chamei a aten
ção para o fato de que êstes três estados de espírito pos
suem semelhanças mútuas que me conduziriam a supor
que podem não ser fenômenos fundamentais, mas antes
expressões de algum estado (ou reações contra êle) mais
digno de ser encarado como primário . De fato, embora
tenha achado a hipótese das suposições um auxílio va
l ioso para colocar ordem no caos do material de uma
sessão de grupo, logo se torna claro que novas investiga
ções exigem hipóteses novas . A necessidade (e o cami
nho para as hipóteses que poderiam satisfazê-la ) tor
nou-se aparente para mim ao considerar o que poderia
precipitar a mudança de uma suposição básica para
1 Melanie Klein.
150
outra . Incluo nesta discussão as formas aberrantes que
j 8. descrevi .
Em resumo, qualquer que seja a suposição básica
ativa, a investigação revela que os elementos da situa
ção emocional acham-se tão intimamente ligados a fan
tasias das primeiras ansiedades que o grupo é compelido,
sempre que a pressão da ansiedade torna-se grande de
mais, a empreender uma ação defensiva . Abordadas
dêste nível primitivo, as suposições básicas assumem um
aspecto diferente do que apresentam nas descrições que
já forneci . O impulso a acasalar-se pode agora ser visto
como possuindo um componente derivado da ansiedade
psicótica associada com primitivos conflitos edípicos a
operar sôbre uma base de relações de objetos parciais .
· Esta ansiedade compele os indivíduos a buscar aliados
e esta derivação do impulso a acasalar-se é ocultada pela
explicação aparentemente racional de que, no grupo de
acasalamento, o motivo é sexual e o obj etivo, a repro�
dução .
Mas se o grupo de acasalamento é ativo, descobri
mos novamente que muitos de seus componentes
acham-se próximos demais a primitivos objetos parciais
para fugir à identificação com êles, de maneira que é
apenas uma questão de tempo antes de a ansiedade
psicótica ser despertada com uma fôrça tal que nova
defesa tem de ser achada . Imaginemos que ela assume
a forma do grupo de luta-fuga, ou seja, a libertação de
ódio que encontra um escoadouro em ataques destruti
vos a um suposto i:tlimigo ou numa fuga ao objeto odia
do . A indiferença do grupo para com o indivíduo e, mais
ainda, a sua incapacidade de fugir por êste meio à pri
mitiva cena primária, conduzem novamente à liberta
ção da ansiedade e à necessidade de outra mudança de
suposição básica .
Ver-se-á por esta descrição que as suposições bási
cas surgem agora como formações secundárias a uma
cena primária extremamente antiga, representada · num
nível de objetos parciais e associada com uma ansiedade
psicótica · e mecanismos de divisão e identificação proje··
tiva tais como os que Melanie Klein descreveu como ca-
151
I
152
RESUMO
!53
mento e a ira e -o ódio no grupo de luta-fuga . Seja como
fôr, o resultado é que o conteúdo de pensamento da
discussão pode aparecer como um resultado que é enga
nadoramente diferente nos três grupos . É possível às
vêzes sentir que o gênio futuro do grupo de acasalamen
to é muito semelhante ao deus do grupo de dependên
cia e, certamente, naquelas ocasiões em que o grupo de
dependência apela para a autoridade de um líder 'pas
sado', êle se aproxima muito do grupo de acasalamento,
que apela para um líder 'futuro' . E m ambos, o líder não
existe; há uma diferença de tempo gramatical e uma
diferença na emoção .
Reitero êstes pontos para mostrar que a hipótese
das suposições básicas por mim apresentada não pode
ser encarada como sendo uma formulação rígida .
154
trabalho de um departamento de genética de uma uni
versidade do que na realidade se assemelha . Mas o in
terêsse mostrado pela procriação não possui a aura cien
tífica que associaríamos com a atividade mental dirigida
para a realidade externa : trata-se de um grupo especia
lizado de trabalho expelido (split off) para tratar com os
fenômenos de grupo de acasalamento aproximadamente
da mesma maneira que o Exército tem de tratar com os
fenômenos de luta-fuga e a Igreja com os fenômenos de
grupo de , dependência . Dessa maneira, a relação dêsse
subgrupo com o grupo principal não será determinada
pelo grau de fidelidade aos estritos princípios genéticos
por que êle conduz seus assuntos, mas sim pela eficiên
cia com que satisfaz a exigência do grupo principal de
que os fenômenos do grupo de acasalamento sejam tra
tados de maneira que as funções de grupo de trabalho
do grupo total não sejam obstruídas por impulsos emo
cionais oriundos daquela fonte . Embora houvesse ex
pressamente desaprovado qualquer estudo do problema
que não fôsse superficial ( 1913, págs. 75 e segs . ) e efe
tuasse suas observações no decorrer de uma discussão
das opiniões de Le Bon, McDougall e Wilfred Trotter,
Freud ( 192 1, passim) de fato possuía ampla experiência
do grupo e do que significava ser um indivíduo apa
nhado em suas tensões emocionais - como indiquei por
minha descrição da posição que a psicanálise tem pos
sibilidade de ocupar num grupo em que ela estimula
um grupo de acasalamento .
Freud ( 1930, págs. 44 e segs.) diz que a psicologia
individual e a psicologia de grupo não podem ser de
modo algum diferenciadas, porque a psicologia do indi
víduo é, ela própria, uma função da relação existente
entre uma pessoa e outra . Objeta êle que é difícil àtri
buir ao número uma significação tão grande a ponto
de torná-lo capaz de, por si próprio, despertar em nossa
vida mental um nôvo instinto que, doutra maneira, não
seria colocado em jôgo . Neste ponto, acho que Freud
tem razão : em ocasião alguma deparei-me com fenôme
nos que exigissem ser explicados pela postulação de um
instinto gregário . O indivíduo é e sempre foi um mem-
1 55
bro ·de um grupo, mesmo se sua filiação a êste consiste
em comportar-se de maneira a dar realidade a uma
idéia de que êle não pertence absolutamente a um gru
po . O indivíduo é um animal de grupo em guerra tanto
com o grupo como com aquêles aspectos de sua persona
lidade que constituem sua 'grupalidade' ( groupishness) .
Freud ( 1 92 1, pág. 29) limita esta guerra a uma luta com
a 'cultura', mas espero demonstrar que isto exige am
pliação .
McDougall e Le Bon parecem falar como se a psico
logia de grupo passasse a existir apenas quando um
certo número de pessoas se reúnem em um só lugar, a
um só tempo, e Freud não desaprova isso . Por minha
parte, não é necessário abrir exceções para tornar o es
tudo possível : a reunião de indivíduos só é necessária
do mesmo modo que é necessário ao analista e ao ana
lisando reunirem-se para que a relação de transferência
sej a demonstrável . Sàmente pela reunião fornecem-se
as condições apropriadas para a demonstração das ca
racterísticas do grupo; apenas se os indivíduos aproxi
mam-se o suficiente uns dos outros é que é possível dar
uma interpretação sem gritar; igualmente, é necessário
que todos os membros do grupo possam assistir às pro
vas em que as interpretações se baseiam . É por estas
razões que o número dos participantes do grupo e o
grau de dispersão deve ser limitado . A reunião do grupo
num determinado lugar, numa hora determinada, é, por
estas razões mecânicas, importante, mas não possui
significação para a produção dos fenômenos de grupo ; a
idéia de que possui origina-se da impressão de que uma
coisa deve começar no momento em que sua existência
torna-se demonstrável . Na verdade, nenhum indivíduo,
por mais isolado que esteja no tempo e no espaço, deve
ser encarado como externo a um grupo ou não possuidor
de manifestações ativas de psicologia de grupo . Não
obstante, a existência do comportamento grupal é, como
disse, claramente mais fácil de demonstrar e até mesmo
de observar se o grupo é reunido e penso ser êste au
mento de facilidade de observação e de demonstração o
responsável pela idéia de um instinto gregário, tal corno
1 56
o que Trotter postula, ou das diversas outras teorias que
ja mencionei, as quais, em última análise, equivalem à
idéia de que um grupo é mais do que a som.a de seus
membros . Minha experiência, segundo as provas atuais,
convence-me de que Freud estava certo em rej eitar qual
qual conceito dêsse tipo como desnecessário . A aparente
diferença entre a psicologia de grupo e a psicologia in
dividual é uma ilusão produzida pelo fato de que o grupo
coloca em realce fenômenos que parecem estranhos a
um observador desacostumado a utilizar o grupo. 1• 2
Atribuo grande fôrça e influência ao grupo de tra
balho, o qual através de sua preocupação com a reali
dade, é compelido a empregar os métodos da ciência,
de forma rudimentar que seja; a despeito da influência
das supoSições básicas e, às vêzes, em harmonia com elas,
a longo prazo é o grupo de trabalho que triunfa . Le Bon
disse que o grupo nunca anseia pela verdade . Concordo
com a opinião de F'reud - dada particularmente ao dis
cutir o papel desempenhado pelo grupo na produção da
linguagem,3 canções populares, folclore, etc . - de que,
ao dizer isso, Le Bon foi injusto para com o grupo. Quan
do McDougall diz que as condições no grupo altamente
organizado afastam 'as desvantagens psicológicas da
formação do grupo', êle aproxima-se de minha opinião
de que a função do grupo especializado de trabalho é
manej ar a suposição básica de maneira a impedir a
obstrução do grupo de trabalho . Freud descreve o pro
blema como sendo procurar para o grupo 'precisamen
te aquêles aspectos que foram característicos do indiví
duo e nêle se extinguiram pela formação do grupo '. Pos
tula êle um indivíduo externo ao grupo primitivo que
possuía sua própria continuidade, sua autoconsciência,
1 57
suas tradições e costumes, suas próprias funções e posi
ções particulares. Diz que, devido ao seu ingresso num
grupo 'não organizado', o indivíduo perdeu sua distintivi
dade por algum tempo. Penso que a luta do indivíduo
para preservar sua distintividade assume características
diferentes de acôrdo com o estado de espírito do grupo
em qualquer momento dado. A organização grupal forne
ce estabilidade e permanência ao grupo de trabalho, que
é sentido como mais fàcilmente submerso pelas suposi
ções básicas se o grupo não fôr organizado. A distintivi
dade individual não faz parte da vida de um grupo que
está agindo segundo as suposições básicas. A organização
e a estrutura são as armas do grupo de trabalho, são o
produto da cooperação entre os membros do grupo, e seu
efeito, uma vez estabelecido naquele, é exigir ainda mais
cooperação dos indivíduos que lhes são pertencentes . A
êste respeito, o grupo organizado de McDougall é sem
pre um grupo de trabalho e nunca um grupo de s upo
sição básica . Um grupo a agir segundo a suposição bá
sica não precisaria de organização nem de capacidade
de cooperação . A contrapartida da cooperação no grupo
de suposição básica é a valência - uma função espon
tânea e inconsciente da qualidade gregária na persona
lidade do homem . É apenas quando um grupo começa
a agir segundo uma suposição básica que as dificulda
des surgem . A ação inevitàvelmente significa contato
com a realidade e êste compele à consideração pela ver
dade; o método científico é imposto e segue-se a evoca
ção do grupo de trabalho . Le Bon descreveu o líder como
alguém sob quem uma reunião de sêres humanos ins�
tintivamente se coloca, aceitando sua autoridade como
chefe dêles . O líder deve aj ustar-se ao grupo em suas
qualidades pessoais e deve, êle próprio, ser sustentado
por uma intensa fé, a fim de despertar a fé do grupo .
Sua visão do líder como alguém que deve ajustar-se ao
grupo em suas qualidades pessoais é compatível com
minha opinião de que qualquer líder é ignorado pelo
grupo quando seu comportamento ou característica
caem fora dos limites estabelecidos pela suposição bá
sica prevalente . Ademais, o líder deve ser sustentado
1 58
pela mesma 'fé' que sustenta o grupo - não a fim de
despertar a fé do grupo, mas porque tanto a atitude do
grupo como a do líder são funções da suposição básica
. ativa . ·
A distinção de McDougall . (1920, pág. 45) entre o
simples grupo 'não organizado' e o grupo 'organizado'
parece-me aplicar-se não a dois grupos diferentes mas
sim a dois estados de espírito que podem ser observados
coexistindo no mesmo grupo . O grupo 'organizado', por
razões que j á forneci, tem possibilidades de apresentar
os traços característicos do grupo de trabalho ; o 'não
organizado', do · grupo de suposição básica . Freud dis- .
cute as opiniões de McDougall, citando sua descrição do
grupo 'não organizado' . Com referência à sugestibili
dade do grupo, penso que ela depende de qual seja a
sugestão . Se esta se incidir dentro dos têrmos da supo
sição básica ativa, o grupo a seguirá; se não, o grupo a
ignorará . Esta característica parece-me surgir muito
claramente no pânico, ao qual me referirei posterior-
. mente .
McDougall, discutido . por Freud na passagem aci
ma mencionada, esboça certas condições necessárias para
elevar o nível da vida mental coletiva . 'A primeira des
sas condições', diz êle (1920, pág. 49) , 'que é a base de
todo o resto, é um certo grau de continuidade de exis
tência do grupo . ' Isto me convence de que, com o grupo .
organizado, McDougall está descrevendo aquilo que cha'"
mo de grupo de trabalho . Meyer Fortes ( 1 949) , debaten
do as opiniões de Radcliffe Brown sôbre a estrutura so�
cial, particularmente a distinção entre 'estrutura como
uma realidade concreta realmente existente' e 'forma es
trutural', diz que a distinção acha-se associada com a
continuidade da estrutura social através do tempo . Em
minha opinião, a continuidade da estrutura social atra
vés do tempo é uma função do grupo de trabalho .
Meyer Fortes afirma que o fator tempo na estrutura
social não é de modo algum uniforme em sua incidência
e acrescenta que todos os grupos incorporados, por de�
finição, devem possuir continuidade . Tal como com a
discussão de McDougall dos grupos organizados e não
159
organizados, assim como com a incidência do fator tem
po, não acredito que estejamos tratando de dois tipos
diferentes de grupos, no sentido de duas reuniões dife
rentes de indivíduos, mas sim com duas categorias dife-
rentes de atividade mental, a coexistirem no mesmo gru
po de indivíduos . Na atividade do grupo de trabalho o
tempo é intrínseco; na atividade da suposição básica,
êle não encontra lugar . As funções do grupo de suposi
ção básica são ativas antes que o grupo se reúna numa
sala e continuam após o grupo haver-se dispersado . Não
há desenvolvimento nem decadência nas funções de su
posição básica e, a êste respeito, elas diferem totalmen
te das do grupo de trabalho . Dessa maneira, é de se
esperar que a observação da continuidade do grupo no
tempo produzirá resultados anômalos e contraditórios
se não foi r�conhecido que dois tipos diferentes de fun
cionamento mental operam dentro do grupo ao mesmo
tempo . O homem que pergunta 'Quando é que o grupo
se reúne de nôvo?' está-se referindo, na medida em que
fala sôbre fenômenos mentais, ao grupo de trabalho .
O grupo de suposição básica não se dispersa ou se reúne
e referências ao tempo não possuem significado para
êle . Conheci um grupo de homens inteligentes, pelos
quais as horas das sessões eram perfeitamente conheci
das, que expressou ira porque a sessão havia terminado
e . foi inteiramente incapaz, por um tempo apreciável,
de apreender um fato que não poderia ser matéria de
dúvida na mentalidade do grupo de trabalho . Aquilo que
é ordinàriamente chamado de impaciência deve, por
tanto, no grupo de suposição básica, ser considerado
como uma expressão da ansiedade que é despertada por
fenômenos intrinsecamente unidos a uma dimensão da
qual a mentalidade de suposição básica nada conhece .
É como se um cego se desse conta de fenômenos que só
poderiam ser compreendidos por alguém a quem às pro
priedades da luz fôssem fami1iares .
Eu descreveria os princípios de McDougall para ele
var a vida mental a um nível mais elevado como sendo
uma expressão da tentativa de impedir a obstrução do
grupo de trabalho pelo grupo de suposição básica . Sua
1 60
segunda condição acentua a necessidade de possuir o
indivíduo uma visão clara dos obj etivos do grupo de tra
balho . Seu quarto ponto ressente-se da falta da exis
tência de um corpo de tradições, costumes e hábitos nas
mentes dos membros do grupo que determinem suas re
lações mútuas e com o grupo como um todo; isto se
aproxima da opinião platônica de que a harmonia do
grupo deve basear-se na função individual e na firmeza
com que o indivíduo se restringe a ela . No entanto,
possui também afinidades com a opinião de Santo Agos
tinho, expressa no 19.0 Livro de A Cidade de Deus, de
que uma relação correta com os seus semelhantes só
pode ser atingida por um homem que primeiramente
regulou sua relação com Deus . Isto parece contradizer
minha afirmação de que McDougall está interessHdo, em
sua descrição do grupo organizado, principalmente em
fenômenos do grupo de trabalho . A diferença entre os
dois escritores pareceria ser esta : McDougall está inte
ressado em enfrentar as suposições básicas pelo fortale
cimento da capacidade que tem o grupo de trabalho de
manter contato com a realidade externa, enquanto que
Santo Agostinho elabora uma técnica pela qual um gru
po especializado de trabalho se forma com a função es
pecífica de manter contato com a suposição básica, em
particular com a suposição básica dependente . Vale a
pena lembrar que êle estava interessado em defender o
cristianismo contra a acusação de haver solapado tanto
o moral que Roma fôra incapaz de resistir à arremetida
de Alarico . Noutros têrmos, surgira um corpo ou um
grupo que se achava sob a suspeita de haver tratado com
as suposições básicas de maneira menos eficiente que a
de seus predecessores pagão�? . Santo Agostinho se acha
inconfortàvelmente preocupado em refutar isso . Tra
ta-se de uma entalada com a qual aquêles que preten
dem liderar o público ou o grupo encontram-se familia
rizados : a estimulação e a manipulação da suposição
básica, especialmente quando feitas - pois de alguma
maneira sempre têm de ser feitas - sem algo que se
assemelha a um conhecimento apropriado ou mesmo
uma consciênçia . do que se está fazendo, tem de condu-
1 61
zir a resultados adversos e, às vêzes, até mesmo ao ban
co dos réus .
Considerarei agora aquela parte da discussão de
Freud que gira em tôrno da afirmação de que, num gru
po, as emoções de um indivíduo se tornam extraordinà
riamente intensificadas, enquanto que sua capacidade
intelectual fica acentuadamente reduzida . A respeito
disto, terei algo a dizer posteriormente, quando consi
derar o grupo do ponto de vista do indivíduo, mas de
sejo, no momento, abordar o assunto, como Freud ( 1921,
pág. 33) faz, como um fenômemo de grupo . Nos grupos
que estudei foi natural para o grupo esperar que eu to
masse a liderança de organizar suas atividades . Como
tiro vantagem da posição que me é assim concedida para
conduzir o grupo para a demonstração da dinâmica
grupal, a 'organização' do grupo não faz o que McDou
gall diz que a organização do grupo deve fazer . O de
sejo de um grupo 'organizado', no sentido que lhe dá
McDougall, é frustrado . O temor à suposição básica,
que não pode ser satisfatoriamente tratada pela estru
tura e pela organização, expressa-se assim pela supres
são da emoção, sendo esta uma parte essencial das su
posições básicas . A tensão assim produzida aparece ao
indivíduo como constituindo uma intensificação da emo
ção : a falta de estrutura promove a intromissão do gru
po de suposição básica e, uma vez que em tal grupo,
como já disse, a atividade intelectual é de um tipo ex
tremamente limitado, o indivíduo, conformando-se com
o comportamento imposto pela participação no grupo
de suposição básica, sente como se sua capacidade inte
lectual estivesse sendo reduzida . A crença de que isto é
realmente assim é reforçada porque o indivíduo tende a
ignorar tôda atividade intelectual que não se ajuste à
suposição básica . Na realidade, não creio de modo a�gum
que haja uma redução da capacidade intelectual no
grupo, nem tampouco que 'as grandes decisões no cam
po do pensamento e das descobertas e soluções momen
tosas só são possíveis a um indivíduo que trabalhe na
solidão' (McDougall, 1 920) , embora a crença de tal
acontecer seja comumente expressa na discussão grupal
1 62
e todos os tipos de planos sejam elaborados para enga
nar a influência supostamente perniciosa das emoções
do grupo . Na verdade, forneço interpretações porque
acredito ser possível num grupo uma atividade inte
lectual de alta ordem, j untamente com uma consciên
cia (e não uma evasão) das emoções dos grupos de su
posição básica . Se se achar que a terapêutica de grupo
possui um valor, acredito que êle reside na experiência
consciente da atividade grupal dêste tipo .
Freud volta-se para a discussão de algo que surge
sob uma variedade de nomes, tal como 'sugestão', 'imi
tação', 'prestígio dos líderes ', 'contágio'" Utilizei 'valên
cia', em parte porque assim evitaria os significados que
já aderem aos têrmos que relacionei. 2 em park; porque
o têrmo 'valência', tal como usado em .física para mos
trar o poder de combinação dos átomos, conduz consigo
a maior aura de sugestividade que é útil para meus
fins . Por êle, significo a capacidade que tem o indivíduo
de combinar-se instantâneamente com outros indivíduos
segundo um padrão estabelecido de comportamento -
as suposições básicas . Posteriormente, considerarei com
maiores pormenores qual o significado que devemos atri
buir a êste têrmo, quando estiver tratando da opinião
psicanalítica sôbre a contribuição do indivíduo .
Não seguirei a discussão de Freud em minúcias, mas
passarei ao seu emprêgo do têrmo 'libido', o qual retira
de seu estudo das psiconeuroses (Freud, 192 1 ) . Aborda
êle assim o grupo pela psicanálise e esta, à luz de minha
experiência de grupo, pode ser encarada como um grupo
de trabalho que tem possibilidades de estimular a supo
sição básica de acasalamento . Sendo assim, é possível
à investigação psicanalítica, ela própria uma parte do
grupo de acasalamento, revelar a sexualidade numa po
sição central. Ademais, é provável que ela própria seja
atacada como constituindo uma atividade sexual, uma
vez que, de acôrdo com minha visão do grupo de acasa
lamento, se o grupo tem de presumir que duas pessoas
se reunem, elas só podem Jazê-lo para fins sexuais .
Dessa maneira, é natural que Freud tenha de enxergar
a natureza da ligação entre os indivíduos num grupo
1 63
como libidinosa . No grupo, o componente libidinoso da
ligação é característico do grupo de acasalamento, mas
penso que êle possui uma compleição diferente no grupo
de dependência e no grupo de fuga-luta . Freud descreve
o comandante-chefe da Igreja como sendo Cristo, mas
eu diria que êle é a Divindade . Cristo, ou o Messias, é
o líder, não do grupo de dependência, mas do grupo de
acasalamento . Na psicanálise, encarada como parte do
grupo de acasalamento, o Messias ou a idéia messiânica
ocupam uma posição central e a ligação entre os indi
víduos é libidinosa . A própria idéia messiânica se trai
na suposição de que o paciente individual merece a de
voção muito considerável no analista, como também na
opinião, às vêzes abertamente expressa, que, em resul
tado do trabalho psicanalítico, será aperfeiçoada uma
técnica que, em última análise, salvará a humanidade .
Em resumo, encaro o emprêgo freudiano do têrmo libido
como correto apenas para uma fase, embora importan
te, e sinto a necessidade de um têrmo mais neutro para
descrever a ligação em todos os níveis de suposição bá
sica . A ligação no grupo de trabalho, que encaro como
sendo de natureza refinada, é mais adequadamente des
crita pela palavra cooperação .
A noção freudiana do líder como sendo aquêle de
quem o grupo depende e de cuja personalidade o grupo
· deriva suas . qualidades parece-me ser oriunda de sua
visão da identificação a constituir quase inteiramente
um processo de introjeção pelo ·ego; para mim, o líder é
tanto criação da suposição básica como qualquer outro
membro do grupo e isto, acho eu, é de esperar-se, se con
siderarmos a identificação do indivíduo com o líder
como dependente não apenas da introj eção, mas tam
bém de um processo simultâneo de identificação proje
tiva (Iv.Ielanie Klein, 1946) O líder, no nível da suposi
.
1 64
qualquer outro - fato que provàvelmente explica al
gumas das atitudes a que as figuras de proa se inclinam.
Assim, o líder no grupo de fuga-luta, por exemp lo, pa,
rece possuir uma personalidade distintiva porque sua
personalidade é de um tipo que se presta à exploração
pela exigência que faz o grupo de um líder que exija
dêle apenas uma capacidade para a luta ou para a fuga;
o líder não possui uma liberdade para ser êle próprio
maior do que qualquer outro membro do grupo . Será
apreciado que isto difere da idéia de Le Bon que o líder
deve possuir . uma vontade forte e imponente e da idéia
de Freud que êle corresponde a um hipnotizador . O
poder que tem deriva-se do fato de haver-se tornado,
em comum com todos os outros membros do grupo,
aquilo que Le Bon descreve como 'um autômato que
deixou de ser guiado pela sua vontade' . Em resumo, êle
é líder em virtude de sua capacidade de combinação
instantânea e involuntária (talvez voluntária também)
com qualquer outro membro . do grupo e somente difere
dêles em que, seja qual fôr a sua função no grupo de
trabalho, êle é a incarnação do líder do grupo de supo
s:ição básica .
A opinião de Freud parece não tornar explícitas as
perigosas possibilidades que existem no fenômeno da li
derança . Sua visão do líder·-· e, na verdade, tôdas as
outras visões de que estou ciente - não se reconcilia
fàcilmente com a minha experiência da liderança, tal
como surge na prática . O líder do grupo de trabalho,
pelo menos, tem o mérito de manter contato com a reali
dade externa, mas nenhuma qualificação assim é exigi
da do líder do grupo da suposição básica . A descrição
costumeira do líder parece ser uma mistura a englobar
diversos fenômenos grupais, com as características do
líder do grupo de trabalho predominando . Pelas razões
que forneci, o líder do grupo de trabalho é inofensivo
por falta de influência sôbre o grupo ou então é um ho
mem cujo domínio da realidade é tal que êle carrega
autoridade . Dessa maneira, é provável que as discussões
de liderança coloridas principalmente por opiniões acêr
ca das qualidades do líder do grupo de trabalho sejam
1 65
otimlsticamente tingidas . Minha op1mao do líder do
grupo de suposição básica não exclui a possibilidade de
sua identidade como o líder do grupo de trabalho, mas
permite a existência de um líder que aparentemente
evoca a adesão entusiástica do grupo, mas é despido de
contato com qualquer realidade que não seja a reali
dade das exigências do grupo de suposição básica . Quan
do se percebe que isto pode significar que o grupo está
sendo liderado por um indivíduo cuj a qualificação para
o cargo foi a obliteração de sua personalidade, por um
autômato, por 'um indivíduo que perdeu a sua distinti
vidade', mas que se acha ainda tão banhado pelas emo
•]Ões do grupo de suposição básica que carrega todo o
prestígio que se gostaria de acreditar ser a remuneração
especial do líder do grupo de trabalho, torna-se possível
explicar algumas das calamidades a que grupos foram
levados por líderes cujas qualificações para o pôsto,
quando as emoções prevalentes em seu apogeu fenece
ram, pareceram ser despidas de substância .
Freud ( 1 9 2 1 , pág. 45) diz que o pânico é melhor
estudado nos grupos militares . Experimentei pânico com
tropas em ação em duas ocasiões e, em diversas outras
vêzes, com pequenos grupos civis, tive razões para pen
sar que a experiência emocional apresentava uma seme
lhança suficientemente estreita com minha experiência
militar para merecer o nome de pânico . Acho que Freud
está discutindo o mesmo fenômeno, embora tais expe
riências não pareçam, em todos os aspectos, confirmar
as teorias freudianas . A descrição do pânico feita por
McDougall refere-se a uma experiência que penso ser
similar, em seus aspectos essenciais, à minha e obtenho
a confirmação disso quando êle diz : 'Outras emoções
cruas e primárias podem espalhar-se por uma multidão
de maneira muito semelhante, embora o processo rara
mente seja tão rápido e intenso como no caso do mêdo'
(McDougall, 1920, pág. 24) e depois descreve numa nota
de rodapé um exemplo por êle assistido em Bornéu de
disseminação quase instantânea da ira através de uma
multidão (ibid . , pág. 26) . McDougall, assim, aproximou
muito, embora sem fazer a conexão, a ira e o mêdo,
1 66
apoiando dessa maneira minha opinião de que o pânico
é um aspecto do grupo de luta-fuga . É afirmativa minha
serem o pânico, a fuga e o ataque descontrolado real
mente os mesmos . Não conheço a paródia de Nestroy,
citada por Freud ( 1 921, pág. 49) mas, aceitando a his
tória tal como êle a relata, concordo que ela poderia ser
considerada como tipificando o pânico, mas acrescenta
ria o seguinte : não existe maneira mais absoluta de
abandonar uma batalha 'do que morrer . Não existe nada
na história da fuga pânica a seguir a morte do general
que possamos encarar como incompatível com a fideli
dade ao líder da fuga-luta; êle é seguido mesmo quando
morto, porque sua morte é um ato de liderança .
O pânico não surge em qualquer situação, a menos
que se trate daquela que poderia, do mesmo modo fácil,
ter dado origem à raiva . Não existem derivativos fàcil
mente disponíveis para a raiva ou para o mêdo : a frus
tração, que é assim inescapável, não pode ser tolerada
porque a frustração exige uma consciência da passagem
do tempo e o tempo não é uma dimensão dos fenôme
nos de suposição básica . A fuga oferece uma oportuni
dade imediatamente utilizável para a expressão da emo
ção no grupo de fuga-luta e, assim, atende à exigência
de satisfação instantânea : dessa marre'ira, o grupo fu
girá . Alternativamente, o ataque oferece um derivativo
semelhantemente imediato e, então, o grupo lutará . O
grupo de fuga-luta seguirá qualquer líder (e, contrà
riamente às opiniões expressas até aqui, mantém sua
coerência em assim proceder) que dê ordens que auto
rizem a fuga instantânea ou o ataque instantâneo. Des
de que um indivíduo do grupo se conforme às limitações
do líder da fuga-luta, não terá dificuldade em fazer um
grupo passar da fuga precipitada para o ataque e do
ataque precipitado para o pânico .
O estímulo para o pânico - ou para a raiva, que
considero ser intercambiável - deve ser sempre um
acontecimento que caia fora das funções do grupo de
trabalho do grupo envolvido . Isto quer dizer que o grau
de organização do grupo não é um fator no pânico, a
menos que a organização (que, como disse, é uma parte
167
da função do grupo de trabalho) tenha evolvido para
enfrentar o acontecimento externo específico responsá
vel pelo pânico . No exemplo freudiano ( 192 1, pág. 47)
de incêndio num teatro ou lugar de diversão, o grupo de
trabalho está dedicado a assistir a peça, mas não a tes
temunhar uma conflagração e menos ainda a extin
gui-la . O ponto essencial a respeito da organização é
que ela deve achar-se disponível tanto para o objetivo
externo do grupo quanto para a manipulação da supo
sição básica que tal . busca mais se calcula evocar . O
pânico num exército não é produzido por um perigo mi�
litar, embora êste, pela natureza das coisas, tenha muita
probabilidade de achar-se presente . Não é provável que
êle seja produzido por qualquer situação em que o ata
que ou a fuga são expressões apropriadas do grupo de
trabalho . Se parece surgir em tal situação, isso se dá
porque a causa real não foi observada .
É claro que entre as teorias apresentadas por Freud
e aquelas que esbocei aqui há um hiato . Êle pode pa
recer ser mais considerável do que é por causa de meu
uso deliberado da nova terminologia com que vesti o
aparelhamento dos mecanismos que penso haver desco
berto . Será necessário testar êstes últimos examinando
o grupo mais do ponto de vista do indivíduo. No entan
to, antes de fazê-lo, resumirei dizendo que Freud vê o
grupo como uma repetição de relações de obj eto-parcial.
Decorre disso que os grupos, na opinião de Freud1 deve
riam aproximar-se dos padrões neuróticos de comporta
mento, enquanto que, na minha, êles se aproximam dos
padrões do comportamento psicótico .
A sociedade ou grupo que é saudável mostra sua se
m elhança com o grupo de família, tal como Freud o des
creve . Quanto mais perturbado é o grupo, menos pro
vável é que êle seja compreendido com base nos padrões
familiais ou no comportamento neurótico, tais como os
conhecemos no indivíduo .
Isto não quer dizer considerar eu que minhas des
crições se apliquem apenas aos grupos enfermos . Pelo
contrário, duvido muito que qualquer terapêutica real
possa ter r€'sultado, a menos que êsses modelos psicóti-
168
cos sejam descobertos em qualquer grupo . Em alguns
dêles, sua existência é discernível desde logo; noutros,
tem-se de trabalhar antes que se tornem manifestos .
�sses grupos assemelham-se ao paciente analítico que
parece muito mais enfêrmo após muitos meses de aná
lise do que parecia antes de haver experimentado qual
quer análise .
O indivíduo que vai a um grupo para tratar-se tem
direito a acreditar que está indo experimentar algo que
o conduzirá à cura . Quase sem exceção - e as próprias
exceções têm-se mostrado mais aparentes que reais -
os pacientes acham-se convencidos de que o grupo não
é bom e não pode curá-los . É algo como um choque para
êles descobrir, pelo menos quando sou um membro do
grupo, que o que acontece não é algo que alivia aquelas
ansiedades, mas parece ser mais uma minuciosa e dolo
rosa demonstração de que suas suspeitas .e ressentimen
tos vagos e mal formulados sôbre o grupo se baseiam,
tão freqüentemente quanto não, apenas em atitudes gru
pais demasiadamente substanciais para êle.s e suas :per
turbações . Suas suspeitas são bem fundadas; acham-se
presos, por um lado pelo menos, ao que parece ser uma
indiferença perfeitamente genuína por êles ou, pior
ainda, por um ódio a êles . Exemplo : uma mulher está
falando num grupo que consistia, nessa ocasião, em seis
pessoas e eu . Queixa-se de uma dificuldade a respeito
de comida, de seu mêdo de engasgar-se se comer num
restaurante e de seu embaraço pela presença, durante
n!lla refeição recente, de uma atraente mulher em sua
mesa . 'N�o me sinto assim', diz o Sr . A., e sua obser
vação é acolhida por um som oriundo de um ou dois
outros, som que poderia indicar acharem-se de acôrdo
com êle . Poderia indicar e o indica, mas, ao mesmo tem
po, deixa-os livres para afirmar (porque êste grupo tor
nou-se agora astuto) , se surgir a necessidade, que 'não
disseram nada' . O restante olha como se o assunto não
os interessasse ou preocupasse . Se um paciente falasse
numa análise tal como a mulher falou, é claro que, de
acôrdo com o estado de sua análise, o analista não es
peraria encontrar qualquer dificuldade maior em perce-
1 69
ber que um certo número de interpretações era pos
sível . Não consige compreender como qualquer dessab
interpretações, que se baseiam em anos de estudo psica
nalítico do par, tem possibilidades de serem encaradas
como apropriadas ao grupo; ou isso ou então teremos de
revisar nossas idéias do que constitui a situação analí
tica . De fato, as interpretações que dei relacionavam-se
quase inteiramente com a indicação de que o material
que seguiu-se à confidência feita pela mulher ao grupo
indicava a ansiedade dêste em negar que a dificuldade
da mulher, por qualquer que ela fôsse, lhes pertencesse
também e, ademais, que eram, a êsse respeito, superio
res à mulher . Pude então mostrar que a recepção que
o grupo havia dado à sinceridade da mulher tornara
agora muito difícil a qualquer um do restante do grupo
falar, individualmente, daqueles outros assuntos em que
êles, numa explosão de franqueza, estariam preparados
para admitir serem 'inferiores' . Em resumo, não foi di
fícil mostrar que se uma paciente avançou tanto, a ponto
de vir ao grupo em busca de auxílio para uma dificul
dade, o que ela obteve foi um aumento dos sentimentos
de inferioridade e um refôrço dos sentimentos de solidão
e falta de valor .
Ora, esta situação não é semelhante àquela que se
obtém numa análise, quando o analista conseguiu tor
nar manifestos os mêdos e as ansiedades inconscientes.
No exemplo que forneci, não foi feita nenhuma inter
pretação que elucidasse à mulher a significação de suas
ansiedades em comer na presença cie 'uma mulher atra
ente ' . A série de interpretações que dei, até onde obti
vessem sucesso, poderiam haver esclarecido para ela
as emoções desagradáveis associadas com ser-se o re
ceptor num grupo que se está valendo livremente da
i dentificação projetiva . Poderia ter-lhe esclarecido que
sua 'refeição' na sessão estava causando o seu embaraço
e, até certo ponto, isto se achava implícito nas interpre
tações que estivera dando ao grupo como um todo. Mas
parece justo dizer que, de um ponto de vista analítico,
a mulher não está obtendo com isso uma interpretação
satisfatória e sofre uma experiência cujo desconfôrto
1 70
não é intrínseco à sua incapacidade, mas inerente ao
fato de ser o tratamento de grupo o tratamento errado.
Há, contudo, outra possibilidade, que é : quando essa
mulher estava falando, embora não tivesse razão para
supor e ainda não suponha que ela seja mais que um
caso de psiconeurose, tôda a maneira pela qual se ex
pressava fizeram-me lembrar intensamente da sinceri
dade e coerência da expressão inconscie·nte que tão fre
qüentemente contrasta, no psicótico, com a confusão
que assiste as suas tentativas de comunicação racional.
Posso tornar meu argumento claro dizendo que acredito
que se esta paciente houvesse falado, quando em análise
comigo, tal como o fêz no grupo, sua entonação e ma·
neiras nunca me haveriam levado a duvidar que a in
terpretação correta seria aquela apropriada a uma inca
pacidade neurótica; no grupo, senti que tanto a maneira
quanto a entonação indicavam que seu comportamento
seria mais precisamente avaliado se fôsse encarado como
aparentado às formulações do psieótico . Visto a esta luz,
diria que ela sentia haver um objeto único, chamado
grupo, que fôra dividido em pedaços (os membros indi
viduais do grupo} pelo seu ato de comer e que a crença
que isso assim era reforçara sentimentos de culpa que
as emoções associadas com ser a receptora das identifi
cações proj etivas constituíssem uma falha de seu com
portamento . Êstes sentimentos de culpa mais uma vez
tornaram-lhe difícil compreender o papel desempenhado
em suas emoções pelas ações dos outros membros do
grupo .
Até agora considerei a 'maldad e do grupo' no que
ela toca o paciente que está tentando conseguir trata
mento; podemos agora passar a considerá-la do ponto
de vista dos membros do grupo que estiveram tentando
obter a 'cura' por mecanismos proj etivos e de divisão
descritos por Melanie Klein (1946) . Não apenas se des
pojam êles de qualquer dos problemas da paciente, mas,
se se quer que êsse mecanismo seja eficaz, abrem-se êles
próprios à necessidade de livrat-se de qualquer sentido
de responsabilidade em relação à mulher . Fazem isso
pela expelição (splitting off) das partes boas de sua
1 71
personalidade e pela colocação delas no analista . Desta
maneira, o 'tratamento' que êstes indivíduos recebem do
grupo é, por um )ado, a consecução de um estado de es
pírito reconhecivelmente aparentado à 'perda da distin
tividade individual' mencionada por Freud e, por outro,
à despersonalização que encontramos nos psicóticos .
Neste ponto, o grupo encontra-se no estado que descre
vi como tendo por dominante a suposição básica de de
pendência .
Não irei adiante com a descrição do desenvolvimen
to subseqüente dêste grupo, exceto para mencionar uma
peculiaridade de seu comportamento posterior muito co
mum a todos os tipos de situações de grupo ; as comuni
cações subseqüentes fizeram-se em têrmos de breves in
terjeições, longos silêncios, suspiros de tédio e movimen
tos de desconfôrto . :G:ste estado de coisas num grupo
merece uma atenção cuidadosa . O grupo parece ser ca
paz de suportar períodos quase infindáveis de tal con
versa ou, então, conversa nenhuma . H á protestos, mas
aturar essa monotonia parece ser um mal menor que a
ação destinada a findá-la . É impossível fornecer tôdas
as minhas razões para acreditar que esta fase do com
portamento do grupo seja significativa . Contentar-ine-ei
em dizer que ela se acha estreitamente ligada · com a
divisão e a despersonalização acima mencionadas. Acre
dito também que se acha ligada com sentimentos de
depressão, provàvelmente da mesma maneira que a ma�
nutenção da posição esquizóide serve para suprimir a
posição depressiva (Klein, 1946) .
A COMUNICAÇÃO VERBAL
1 72
mesmo concedendo estas possibilic;lades, permanece um
resíduo inexplicado . Fui forçado a chegar à conclusão
de que o intercâmbio verbal é uma função do grupo de
trabalho . Quanto mais o grupo corresponde ao grupo
de suposição básica, menos êles fazem qualquer uso ra
cional da comunicação verbal . As palavras servem de
veículo para a comunicação do som . Melanie Klein
( 1930) acentuou a importância da formação simbólica
no desenvolvimento do indivíduo e sua discussão da de
composição de uma capacidade de formação de símbolos
parece-me ser pertinente ao estado grupal que estou
descrevendo . O grupo de trabalho compreende êsse em
prêgo particular dos símbolos que se acha envolvido na
comunicação; o grupo de suposição básica, não . Já ouvi
sugerir que a 'linguagem' do grupo de suposição básica
é primitiva . Não acredito que isto seja verdade : ela pa
rece-me ser antes aviltada do que primitiva . Em vez de
desenvolver a linguagem como um método de pensa
mento, o grupo utiliza uma linguagem existente como
um modo de ação . �ste modo de comunicação 'simpli
ficado' não possui nada da vitalidade da linguagem pri
mitiva ou antiga. Sua simplicidade é degenerada e avil
tada . O contraste com êste estado de coisas é fornecido
pelas ocasiões em que um grupo, ciente das inaproprie
dades de seu vocabulário, tenta debater e concordar
sôbre os têrmos que desejam utilizar no grupo . Neste
exemplo, poder-se-ia dizer que se vê a evolução de um
método científico 'primitivo' como parte da função do
grupo de trabalho, mas não há nada de aviltado a res
peito dêle . Faltam à 'linguagem' do grupo de suposição
básica a precisão e o escopo que são conferidos por uma
capacidade de formação e uso de símbolos : êste auxi
liar do desenvolvimento acha-se portanto faltando e os
estímulos que ordinàriamente promoveriam o desenvol
vimento rião têm efeito . Mas bem se poderia reivindicar
para os métodos de comunicação que o grupo emprega
o título de Lingüística Universal, conferido por Croce à
estética . Por diversas que sej am suas culturas, línguas e
tradições, qualquer grupo humano compreende instan-
173
tâneamente todo outro grupo humano no nível das su
posições básicas .
Como exercício de aplicação de algumas das teorias
que estive apresentando, exemplifiquei com o relato bí
blico da construção da Tôrre de Babel . 1 O mito reúne
(muito à maneira pela qual as assodações de um pa
ciente psicanalítico se reúnem) os seguintes componen
tes : uma linguagem universal; a construção pelo grupo
de uma tôrre que é sentida pela Divindade como uma
ameaça à sua posição; a confusão da linguagem uni
versal e a dispersão dos povos pela face da terra . Que
espécie de acontecimento acha-se encerrado neste mito?
Utilizarei minhas teorias para interpretá-lo como corpo
rificando um relato do desenvolvimento da linguagem
num grupo com a dominância da suposição básica de
dependência . O nôvo desenvolvimento - vale a pena
lembrar que Freud escolhe o desenvolvimento da lingua
gem como um exemplo de atividade grupal de elevada
ordem mental - em si próprio exige novos desenvolvi
mentos no grupo; tomo isto como implícito no simbolis
mo da tôrre, cuja construção ameaça a supremacia da
Divindade . A idéia de que a tôrre atingiria o Céu intro
duz o elemento de esperança messiânica que encaro
como intrínseco ao grupo de acasalamento . Mas uma
esperança messiânica que é preenchida viola o cânone
na suposição básica de acasalamento e o grupo se dis
persa em cismas .
Melanie Klein ( 1 930) demonstrou que a incapaci
dade de formar símbolos é característica de certos indi
víduos . Ampliaria isto para incluir todos os indivíduos
em suas funções como membros do grupo de suposição
básica .
1 Gênese, XI, 1-9. �ste relato faz parte do chamado código Jeovista
e, dessa maneira, poderia ser considerado. como um exemplo de regis
tro feito por um grupo com a suposição básica de dependênc�a em
dominância, quando ameaçado pelo surgimento da suposição básica do
acasalamento.
1 74
RESUMO
175
para promover a tarefa em execução . A investigação
mostra que aquêles objetivos são às vêzes entravados e
ocasionalmente promovidos por impulsos emocionais de
origem obscura . É dada uma certa coesão a estas ativi
dades mentais anômalas se se presumir que, emocional
mente, o grupo atua como se possuísse certas suposições
básicas sôbre os seus objetivos . Estas suposições básicas,
que parecem ser bastante apropriadamente esboçadas
por três formulações - dependência, acasalamento e
luta ou fuga - são, prosseguindo-se a investigação, vis
tas a deslocar-se mutuamente, como que em resposta a
algum impulso inexplicado . Elas parecem, ademais, pos
suir algum laço comum ou, talvez, serem mesmo diferen
tes aspectos umas das outras . Investigações ulteriores
demonstram que cada suposição básica contém aspectos
que correspondem tão estreitamente a obj etos parciais
(part objects) extremamente primitivos que mais cedo
ou mais tarde a ansiedade psicótíca pertencente a essas
relações primitivas é liberada . Estas ansiedades e os me
canismos que lhes são peculiares j á foram apresentados
na psicanálise por Melanie Klein e suas descrições har
monizam-se bem · com os estados emocionais que encon
tram um derivativo na ação de massa do grupo num
comportamento que parece ter coerência, se fôr consi
derado como o resultado de uma suposição básica . Abor
dadas do ângulo da atividade do grupo de trabalho re
finado, as suposições básicas parecem ser a fonte de im
pulsos emocionais dirigidos a objetivos muito diferentes,
tanto da tarefa manifesta do grupo, quanto das tarefas
que pareceriam · ser apropriadas à visão freudiana do
grupo como baseado no grupo familial . Entretanto,
abordados do ângulo da ansiedade psicótica associada
com fantasias de primitivas relações de objeto-parcial
(part-object) , descritas por Melanie Klein e seus colabo
radores, os fenômenos de suposição básica parecem mui
to mais possuírem as características de reações defen
sivas contra a ansiedade psicótica e não se acharem tão
em variância com as opiniões de Freud como serem su
p lementares a elas . Em minha opinião, é necessário
elaborar as tensões que pertencem a configurações fa-
1 76
miliais quanto as ansiedades ainda mais primitivas das
relações de objeto-parcial . Na verdade, acho que essas ·
ansiedades primiti�as encerram as últimas fontes de
todo o comportamento de grupo .
Se achar�se que a tentativa de estabelecer um pro-. ··
·
cedimento terapêutico de grupo como método para tra
tar o indivíduo vale a pena, os psicanalistas serão acon
selhados a encontrar um nome nôvo para êle . Não posso
ver qualquer justificação científica para descrever o
trabalho do tipo que tentei como sendo psicanálise e já
dei minhas razões para tal (págs. 165-9 ) . Soma-se a isso
o fato (de que todos nos damos perfeita conta ) de que
"a amarga experiência nos ensinou que a resistência
contra o inconsciente pode ser tão sutil que chegue a
deformar as descobertas analíticas e reinterpretá-las em
apoio de alguma defesa pessoal" (Jones, 1952) , de ma
neira que o têrmo psicanálise deverá continuar a ser
aplicado, até onde possamos controlar a situação, aos
princípios fundamentais da psicanálise . Resta a ques
tão de que valor terapêutico deve ser atribuído ao pro
cedimento que tentei descrever . Não penso que tenha
chegado a hora de dar uma opinião definitiva e acredito
que pode haver campo para psicanalistas plenamente
qualificados prosseguirem as pesquisas sôbre o seu valor,
possivelmente com grupos compostos de indivíduos que
estejam fazendo ou já fizeram uma psicanálise .
Como descrição da dinâmica de grupo, cada indi
víduo encontra-se em posição de decidir por si próprio
se as teorias que esbocei fornecem significado aos fe
nômenos a que êle, no curso de sua vida diária como
membro de um grupo, pode testemunhar .
REFERBNCIAS
1 77
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178
íNDICE ANALíTICO E REMISSIVO
Alarico, 1 6 1 ciúme, 66
Clay,
alucinações,
- sôbre o dinheiro, cit., 9!1
- situação de grupo e produção
Clínica Tavistock, a,
de, 48
- Comissão Profissional da, 2 1 ,
análise de grupo ver também te 25, 29, 32
rapia de grupo (análise) e psi comêço do grupo, 78, 82
quiatra (grupo) (analista) compra de noiva, 1 0 1
analista ver psiquiatra (grupo) (ana- comunicação verbal, 172-4
lista) comunidade, a,
ansiedade, - não-cooperação e, 1 1 - 1 2
- atitude inquiridora e, 1 5 0 - neurose e , 5, 6
� causa da, e liderança d o gru contratransferência, 1 3 7-8
po, 1 1 1-4 controvérsia homoousiana, 89
- liderança do grupo de trabalho cooperação, 8 1 , 1 05, 124
e, 1 1 1-3 corpo da mãe,
- psicótica, 1 5 1 , 176 - cena primária do grupo e, 1 52
'Apresentação', 57n - grupo e, 1 5 0
aristocracia, 125, 154 cristianismo, 1 6 1
- esperança messiânica e, 146 Croce, 173
cultura de grupo, 47, 48, 49, 5 1-2,
Aristóteles, 45
53, 57, 63, 64
atividade intelectual ( habilidade,
- mudanças, 65
capacidade ) , 1 62 curso de dança,
ATS, 12 - formação de um, 1 2
ausentes,
·� efeito sôbre o comportamento
do grupo, 39, 40- 1 , 45, 49, 5 0
desenvolvimento,
- suposições básicas, tempo e,
1 46
'bíblia' ( grupo ) , 143, 1 52 despersonalização, 1 72
'bom espírito de grupo', 17-8 Deus, 1 1 1 , 1 1 3 , 1 1 8, 135, 1 3 6
'bondade', 83 dificuldades com comida,
Bornéu, 1 66 - de uma paciente, 1 69- 1 7 1
1 79
dinâmica de grupo, 1 29-78 - cit., 1 72
dinheiro, 98- 1 0 1 - crítica da discussão dos grupos
disciplina para o neurótico, 4-7 por, 122
divindade do grupo, - sôbre a família e o grupo, 15 2,
- grupo de dependência e, 1 3 6, 175, 176, 177
153 sôbre o indivíduo e o grupo,
- psiquiatra como, 89-90 cit., 1 2 3 , 157
'dual ', sôbre o instinto social, 1 20
- do grupo de dependência, sôbre o líder do grupo, 1 64
1 0 8- 1 1 - sôbre a linguagem e o grupo,
.
- de situações, 78-8 1 174
doença ver também doenças de sôbre McDougall e o grupo,
.
grupo, 1 24, 1 59
- estudo da, 99 sôbre a natureza libidinosa do
doenças de grupo, 92-93 grupo, 1 6 3
doenças psicossomáticas, 97 sôbre o pânico e o grupo, 166,
167
sôbre a psicologia individual e
de grupo, 1 1 9-20, 155-6
Einzig,
sôbre as relações de objeto
- sôbre a moeda, 99 parcial e o grupo, 168
esfinge, 150 sôbre a regressão e o grupo,
Esopo, 130
- rãs em, 1 1 2- 1 3 - transferência e , 94, 1 2 5
esperança, 1 39-40 frustração nos grupos, 46
Estado do Bem-J:<:star, fuga ver grupo de fuga-luta
- sbL> e, 1 1 3 , 1 1 5
estrutura social, 159
Estudo de História, Um, 109
Gênese, XI, 1-9, 1 74n
Exército, 125, 144, 146, 154
gestos,
Exército Britânico, 74n
- comunicação por, 62
expelição, 1 7 1
Gibbon, 89
'Experiência de Northfield', 74n
gregário,
'Experiência de Wharncliffe', 74n
- o instinto, 1 56-7
grupo, o
- os pré-requisitos essenciais do,
família, a, 120- 1 , 122, 1 56 .
- grupo e, 6 1 , 1 68, 1 75-6, 177 grupos de acasalamento (par, es ) ,
faraós, 64, 66, 72, 87, 1 54
- psicoterapia dos, 1 1 O - ansiedade psicótica e, 1 5 1
Fases Primitivas do Conflito Edi - aristocracia e, 126, 1 5 4 ·
180
grupo especializado de traba nação em, 1 O 1
lho e, 1 44-5, 1 56 Halliday, 97
grupo de trabalho e, 88-9 Heimann, Paula, 1 5::C, 1 52n
liderança patológica no, 1 1 0- 1 1 Hobbes, 1 19
religião e, 7 6-77 Hospital de Emergência de Wharn-
Santo Agostinho e, cliffe, 74n
segurança no, 84 Hospital Militar de Northfield, 74n
- suposições básicas, 1 3 5
horda, a,
- tuberculose e, 9 6
- identificação com, 80, 8 1
grup o da enfermaria, 1 5-8 hospital psiquiátrico militar, 3, 1 8
grupo · especializado de trabalho
- problemas no, 3, 4
ver em grupo de trabalho e
hostilidade no grup o, 60, 6 1 , 75
também Exército, Igreja Human Relations, IX
grupo 'estável', 1 52
grupo de fuga-luta, 55, 5 6, 57, 58,
63, 64, 65, 66, 67, 87, 140,
148 identificação projetiva, X
grup o de dependência e, 72, 73, - análise de grupo e, 1 3 7
82 - líder e , 1 64
grupo especializado de trabalho Igreja, 125, 144, 145, 1 54
e, 143, 144, 1 45, 146 inconsciente,
- liderança do, 149, 164, 1 67
- Jones sôbre o, cit., 1 77
- segurança no, 84-5
indivíduo, o,
grupo organizado, 124, 1 57, 1 58,
- dilema do, e o grupo, 106-7
1 59, 1 60
grupo refinado ver também grupo - fenômenos protomentais e, 9 1 c2
de trabalho Freud sôbre, o grupo e, cit.,
- suposições básicas e, 86-7 1 24
grupo religioso, 75�7 'grupalidade' do, 120, 1 2 1 , 1 22,
grupo terapêutico ver terapia de 1 56, 1 5 7
grupo (análise) e psiquiatra grupo e , 44, 45, 46, 48, 49, 5 1 ,
181
Jones, Ernest, - Freud sôbre o grupo e, cit., .
- sôbre o inconsciente, cit., 177 123, 159-60
- sôbre o grupo organizado, 1 24,
1 57, 1 5 8 , 1 59
- cit., 1 5 7
Klein, Melanie, X, 129, 1 37, 1 5 0n, sôbre o indivíduo, cit., 1 6 2
1 52, 1 52n, 164, 1 7 1 , 1 72, 174, sôbre o pânico, cit., 1 66
175, 176 - sôbre a psicologia de grupo,
156
- sôbre a vida mental coletiva,
Le Bon, 120, 129, 1 5 5 grupo e, 1 6 0
- críticas de Freud sôbre, 1 23-4, mentalidade de grupo, 42, 44-5,
1 57-8 46, 47, 48-9, 5 1 , 52, 53
sôbre grupos, 123 - definição da, 57
Messias (esperança messiânica)
sôbre a liderança do grupo,
- grupo de acasalamento e, 1 39,
158
140, 143, 1 5 3
cit., 1 65
- grupo especializado d e traba-
sôbre a psicologia do grupo,
lho e, 148
156
- grupo de trabalho e, 1 5 0
'libido', 163 - psicanálise e, 164
liderança no grupo, 23, 25, 26, 30, - Tôrre de Babel e, 174
3 1 , 47, 50, 1 3 9, 142-3, 1 54
de acasalamento (futuro ) , 138,
142
neurose,
de dependência, 76-7
de dependência, psiquiatra e, - comunidade e, 5, 6
Nietzsche, 1 1 9
69, 70, 72, 73, 74, 74n
nomes, 1 3 2
Freud sôbre a, a discussão ge
ral, 1 64-5
de fuga-luta, 58, 140- 1, 149,
167 ódio, 5 9 , 62, 6 6
de fuga-luta, mãe e, 6 1 , 66 ódio a aprender pela experiência,
de fuga-luta, pai e, 6 1 77-82
- Le Bon sôbre a, 1 5 8 oscilação emocional num grupo,
- psiquiatra e , 5 7 , 5 8 , 65-6 1 1 3-5
psiquiàtricamente perturbado,
59, 1 1 0- 1 1
de trabalho, 1 65
padrão de pátio de recreio (play-
de trabalho, psiquiatra e, 149
ground ) , 49
líderes religiosos, 109, U 0- 1 1
linguagem, 173 pai, 6 1
-< a Tôrre de Babel e desenvolvi
pânico, 1 66, 1 67
mento do grupo, 1 74 paródia de Nestroy, 167
Lingüística Universal, 173 pirâmides, 1 09
Platão, 1 1 8, 1 6 1
pm ver também fenômenos (siste
mas) protomentais, 1 00
magia, 87 - definição, 9 5
'maldade', 83, 104 pmD ver também fenómenos (sis
McDougall, 120, 129, 155 temas) protomentais, 9 6
182
- definição, 9 5 - interpretações do, 27-9, 3 0, 3 1 ,
pmDA ver também fenômenos (sis 32, 36-7, 40, 4 1 , 48, 5 1 , 63,
temas) protomentais, 87, 1 14-5
- tuberculose e, 97 - interpretações de, apresentação
pmA ver também fenômenos (sis- de, 52
temas ) protomentais, 96 - interpretações do, indivíduo,
poder, IX, X 1 04-5, 1 06
Política, 45-6 - interpretações do, ocasiões para,
posição depressiva, X, 1 52, 172, 1 3 0-1
175 - interpretações do, reações a,
posição esquizóide, 172 5 3 , 57, 59
posição paranóide-esquizóide, X, - interpretações do, reações sub
1 5 0, 1 52, 175 jetivas (do analista) às, 1 3 5-6
pôsto, - interpretações do, resistência a,
- problemas de, 1 6 62-3
preço de noiva, 99, 1 00 - liderança e, 56, 65-6, 73, 145,
procriação, 125, 15 5 149
projeção, - necessidade do grupo de segu-
� o grupo e, 1 52 rança do,· 57
psicanálise, 23, 54, 63, 64, 65, 79, - perspectiva e, 78
1 1 9, 120, 1 3 8, 1 39, 142, 149, - posição do, 5 1 , 68
152n, 174 - qualidades necessárias ao, 14
- análise de grupo e, 7 1 -2, 83, psicoterapia,
1 04, 1 1 0, 176 - Faraós e, 1 1 O
- análise de grupo (dificuldades
de .uma mulher com a comi�
da) , 1 69-7 1
- elementos sexuais da, 125, Quefrén (Faraó ) ; 1 09, 1 1 0
. Quiggin, Hingston,
1 54-5, 1 6 3
- estudo de personagen·s históri - cit., 99
cos em, 122-3
- grupo de acasalamento (par)
e, 120, 1 25, 163 recluso, o, 122
- grupos e, 123, 1 3 0, 1 5 3 , 154-72 regressão,
- Messias e, 1 64 - o grupo e, 129-30
psicologia de grupo, Rei Saul, 1 1 2
- natureza essencial da, 120- 1 religião,
- psicologia individual e, 1 1 9-20 - o grupo de dependência e, 7 5-7
Psicologia de Grupo e a A nálise Rickman, John, IX, 3n, 57, 74n
do Ego, 1 1 9, 129n - crítica da nomenclatura de re-
psicologia individual, 1 1 9-20 lações bipessoais, tripessoais de,
- psicologia de grupo e, 123, 122
1 55-6
Roma, 1 6 1
psiquiatra (grupo) (analista), 22-50
- como bebê, 1 09
- como paciente, 1 07-8
- como pai, 6 1 , 66 sala d e descanso, 8 , 1 0
- divindade grupal e, 89-90, 1 3 5 Samuel, 1 1 1
- interpretações das dificuldades Santo Agostinho, 1 1 8, 1 1 9, 1 6 1
de uma mulher com comida, s b ver também suposições básicas
1 69-71 (grupo ) , 9.7, 1 0 1 , 102, 1 1 5
183
- definição, 9 5 - linguagem e, 173
sbD ver também grupo de depen - participação em, 85, 86
dência, 96, 99, 1 00, 1 0 1 , 1 05, - relações entre, 147-52
1 06, 1 1 1 , 1 1 2, 1 1 5, 1 1 8, 125 - sôbre a segurança quanto ao
- definição, 95
psiquiatra, 57
- dual da, 1 08- 1 1 1
- , tempo e, 159
- Estado do Bem-Estar e, 1 1 3,
115 - tempo e desenvolvimento e,
- tuberculose e, 9 6 1 46-7
sbF ver também grupo de luta
fuga, 96, 99, 1 00, 1 0 1 , 1 06,
1 1 9, 125 T ver também grupo de trabalho,
definição, 95 1 01 , 1 06, 1 1 1 , 1 1 3, 1 1 5, 1 1 6,
tuberculose e, 97 1 1 9, 123
sbA ver também grupo de acasa - definição de, 95
lamento, 96, 1 00, 1 0 1 , 1 06, tamanho do grupo, 18
125, 126 temerosidade, 72
- definição, 9 5 tempo, 1 59-60
segurança, - suposições básicas, desenvolv i
- o indivíduo, grupo e, 8 1 , 84-5 mento e, 146•7
Serviço Nacional de Saúde da Grã- terapia de grupo (análise) ver tam
Bretanha, 98 bém psiquiatra (grupo) ( ana
sexo (sexualidade ) , lista)
- embaraços do grupo de depen- - aplicação da, numa pequena
dência, 66 enfermaria, 1 5 - 1 8
- intercâmbio do grupo e, 54-5 - conceito de grupo terapêutico,
- psicanálise e, 125, 1 54-5, 1 63 68
situação edípica (conflitos, figu- - definição da, 3
ras, mito ) , 149, 1 50, 1 5 1 - discussão ( exemplos ) , 3 3 -4,
- Melanie Klein sôbre a, 1 52 3 8-9, 43-4
soberania, IX, X - gênese da, 2 1
subgrupos ver também aristocra - organização do exército da,
cia, 1 1 6-7, 146 8, 9
suposição (ões) básica(s) ( grupo) - psicanálise e, 7 1 -2, 83, 1 04,
(em geral) ver também sb, sbD, 1 10
sbF, sbA e em grupo de de - psicanálise e, (as dificuldades
pendência, grupo de acasala de uma mulher com a comida) ,
mento (par), grupo refinado, 1 69-7 1
grupo de trabalho, 54, 55, 56, - psicanálise e avaliação final da,
86, 124, 1 3 4-4 1 , 1 5 3-4, 1 6 1-3, 176-7
1 76 - tensões na, 3 -1 8
características comuns a, 141- - valor terapêutico da, 177
143 tirotoxicose, 92
- dinheiro e, 99- 1 00 Tôrre de Babel,
- fenômenos protomentais e, 9 1 , - desenvolvimento da linguag�m
93 de grupo e, 174
formas aberrantes d e mudan Totem e Tabu, 1 1 0, 120, 120n,
ça de uma para outra, 1 43-4 1 3 2n
guerra e, 101 Toynbee, 94, 1 09, 1 1 0
indivíduos e, 84 transferência, 94
184
- grupo e, 23-4 valência, 1 05-6, 124, 1 4 1 , 1 58,
- de grupo, 1 25, 154 1 63
tratamento individual, vontade do grupo, 5 1
voracidade,
- grupo e, 7 1 - culpa no grupo "dependente" a
Trotter, Wílfred, 14 ln, 155 respeito da, 66
- instinto gregário de, 1 56-7
tuberculose,
- pmDA e, 97
wergild, 99, 1 00
- sbD e, 95-6, 97 Wittkower, Maj. Eric,
� sbF e, 97 - cit., 7
185