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SUMÁRIO

1. PROGRAMA DA DISCIPLINA ........................................................................... 1


1.1 EMENTA .......................................................................................................... 1
1.2 CARGA HORÁRIA TOTAL ................................................................................... 1
1.3 OBJETIVOS ..................................................................................................... 1
1.4 CONTEÚDO PROGRAMÁTICO ............................................................................. 1
1.5 METODOLOGIA ................................................................................................ 1
1.6 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO ............................................................................... 1
1.7 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA .......................................................................... 1
1.8 PLANO DE AULAS ............................................................................................. 2
CURRICULUM VITAE DO PROFESSOR ....................................................................... 2

2. INTRODUÇÃO.................................................................................................. 5
2.1 CONTEXTUALIZANDO O CDC ............................................................................. 5
2.2 A EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO ........................................................ 6
2.3 O DIREITO DO CONSUMIDOR E O DIREITO PRIVADO CLÁSSICO ............................ 7
2.4 PRINCÍPIOS ...................................................................................................10

3. POLÍTICA NACIONAL DAS RELAÇÕES DE CONSUMO ..................................... 15


3.1 OBJETIVOS ....................................................................................................15
3.2 IDENTIFICANDO O CONSUMIDOR .....................................................................16
3.2.1 COMPREENDENDO MELHOR A EXPRESSÃO “DESTINATÁRIO FINAL” ....................17
3.3 IDENTIFICANDO O FORNECEDOR ......................................................................18
3.4 IDENTIFICANDO SERVIÇO ...............................................................................19
3.5 IDENTIFICANDO PRODUTO ..............................................................................20

4. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR ........................................... 21


4.1 A TEORIA DO RISCO CRIADO ...........................................................................21
4.2 RESPONSABILIDADE POR VÍCIO E POR DEFEITO ................................................23
4.2.1 PRAZOS PARA RECLAMAÇÃO .........................................................................25
4.2.2 COMPOSIÇÃO INDENIZATÓRIA ......................................................................27

5. INSTITUTOS E INSTRUMENTOS DA DEFESA DO CONSUMIDOR ..................... 29


5.1 RESPONSABILIDADE OBJETIVA ........................................................................29
5.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE ..........................................................29
5.3 RESPONSABILIDADE DO PROFISSIONAL LIBERAL ...............................................30
5.4 RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ......................................................................30
5.5 RESPONSABILIDADE DO COMERCIANTE ............................................................31
5.6 EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE .............................................................31
5.7 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ...........................................32
5.8 A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.....................................................................33
5.9 FORO PRIVILEGIADO .......................................................................................33
5.10 DIREITO DE ARREPENDIMENTO ......................................................................34
6. AS PRÁTICAS COMERCIAIS SOB A ÓTICA DO CDC ........................................ 35
6.1 OFERTA .........................................................................................................35
6.1.1 REQUISITOS DA OFERTA...............................................................................35
6.1.2 CAMPO DE ABRANGÊNCIA .............................................................................35
6.1.3 REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO ..................................................................36
6.2 PUBLICIDADE .................................................................................................36
6.2.1 PRINCÍPIOS NORTEADORES ..........................................................................37
6.2.2 CLASSIFICAÇÃO...........................................................................................37
6.3 PRÁTICAS ABUSIVAS E SUA VEDAÇÃO ..............................................................38
6.3.1 A COBRANÇA DE DÍVIDAS .............................................................................40
6.3.2 OS BANCOS DE DADOS E CADASTROS DOS CONSUMIDORES ...........................40
6.3.3 REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO ..................................................................40

7. A PROTEÇÃO CONTRATUAL SOB A ÓTICA DO CDC ......................................... 42


7.1 A NULIDADE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS ..........................................................42
7.2 ANÁLISE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS ................................................................42
7.3 REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO ....................................................................44

8. MATERIAL COMPLEMENTAR .......................................................................... 45


1

1. PROGRAMA DA DISCIPLINA

1.1 Ementa
Código de Defesa do Consumidor. Conceitos e relação entre consumidor e fornecedor.
Política nacional das relações de consumo. Prevenção e reparação de danos.
Responsabilidade por vício do produto e serviço.

1.2 Carga Horária Total


24 horas/aula.

1.3 Objetivos
Analisar o surgimento da tutela do consumidor no Brasil, sua fundamentação histórico-
filosófica e os aspectos gerais como conceitos, natureza jurídica, princípios aplicáveis,
direitos básicos e instrumentos a serem utilizados.

1.4 Conteúdo Programático


Introdução. Política Nacional das Relações de Consumo. A Relação Jurídica de Consumo.
Instrumentos da Defesa do Consumidor. Prevenção e Reparação de Danos. A
Responsabilidade Civil do Fornecedor. As Práticas Comerciais Sob a Ótica do CDC. A
Proteção Contratual Sob a Ótica do CDC.

1.5 Metodologia
Aulas expositivas, trabalhos em grupo, discussão dirigida e exibição de slides

1.6 Critérios de Avaliação


A avaliação será feita através de trabalhos e prova individual, respeitadas as normas
acadêmicas do regulamento da FGV.

1.7 Bibliografia Recomendada


Leitura Obrigatória – Apostila do Professor

ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Revista dos
Tribunais

FILOMENO, José Geraldo de Brito. Manual de direitos do consumidor. São Paulo: Atlas

GRINOVER, Ada Pellegrini. et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado


pelos autores do Anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária

MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos contratos eletrônicos de consumo via


internet. Rio de Janeiro: Forense

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo:


Revista dos Tribunais.

Direito do Consumidor
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1.8 Plano de Aulas


AULAS CONTEÚDO PROGRAMÁTICO LEITURA “CASES”/TRABALHO
RECOMENDADA EM
#1e2 Política Nacional das Relações Apostila do Estudos de caso
de Consumo. professor. constantes da apostila.
#3e4 A Relação Jurídica de Consumo.
A Responsabilidade Civil do
Fornecedor.
A Proteção Contratual Sob a
Ótica do CDC.

Curriculum vitae do professor


Nayra Assad Pinto é advogada, com especialização em Direito do Consumidor pela
EMERJ (Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro). Sócia do escritório Assad
Pinto Advogados. Conferencista e consultora de empresas. Membro do Brasilcon
(Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor). Autora do livro "Aspectos
jurídicos em saúde". Autora do livro "Estratégias de comunicação em marketing".
Professora homenageada pelo IDE/FGV Management com o Prêmio "Excelência em
Ensino". Em 2012 passou a integrar a categoria "Quadro de Honra", do qual fazem parte
os professores contemplados com a homenagem por mais de 5 anos consecutivos.

Direito do Consumidor
3

O TELEFONE 1

“Honrado Senhor Diretor da Companhia Telefônica:

Quem vos escreve é um desses desagradáveis sujeitos chamados assinantes; e do tipo


mais baixo: dos que atingiram essa qualidade depois de uma longa espera na fila.

Não venho, senhor, reclamar de nenhum direito. Li o vosso Regulamento e sei que não
tenho direito a coisa alguma, a não ser a pagar a conta. Esse Regulamento, impresso na
página 1 de vossa interessante Lista (é meu livro de cabeceira), é mesmo uma literatura
que recomendo a todas as almas cristãs que tenham, entretanto, alguma propensão para
o orgulho ou soberba. Ele nos ensina a ser humildes; ele nos mostra quanto nós,
assinantes, somos desprezíveis e fracos.

Aconteceu por exemplo, senhor, que outro dia um velho amigo deu-me o prazer de me
fazer uma visita. Tomamos uma modesta cerveja e falamos de coisas antigas – mulheres
que brilharam outrora, madrugadas dantanho, flores doutras primaveras. Ia a conversa
quente e cordial ainda que algo melancólica, tal soem ser as parolas vadias de
cumpinchas velhos – quando o telefone tocou. Atendi. Era alguém que queria falar ao
meu amigo. Um assinante mais leviano teria chamado o amigo para falar. Sou,
entretanto, um severo respeitador do Regulamento; em vista do que comuniquei ao meu
amigo que alguém lhe queria falar, o que infelizmente eu não podia permitir; estava,
entretanto, disposto a tomar e transmitir qualquer recado. Irritou-se o amigo, mas fiquei
inflexível, mostrando-lhe o artigo 2 do Regulamento, segundo o qual o aparelho instalado
em minha casa só pode ser usado „pelo assinante, pessoas de sua família, seus
representantes ou empregados‟.

Devo dizer que perdi o amigo, mas salvei o Respeito ao Regulamento; „dura lex sed lex‟;
eu sou assim. Sei também (artigo 4) que se minha casa pegar fogo terei de vos pagar o
valor do aparelho – mesmo se esse incêndio (artigo 9) for motivado por algum circuito
organizado pelo empregado da Companhia com o material da Companhia. Sei finalmente
(artigo 11) que se, exausto de telefonar do botequim da esquina a essa distinta
Companhia para dizer que meu aparelho não funciona, eu vos chamar e vos disser, com
lealdade e com as únicas expressões adequadas,o meu pensamento, ficarei eternamente
sem telefone, pois „o uso de linguagem obscena constituirá motivo suficiente para a
Companhia desligar e retirar o aparelho‟.

Enfim, senhor, eu sei tudo; que não tenho direito a nada, que não valho nada, não sou
nada. Há dois dias meu telefone não fala, nem ouve, nem toca, nem tuge, nem muge.
Isso me trouxe, é certo, um certo sossego no lar. Porém amo, senhor, a voz humana;
sou uma dessas criaturas tristes e sonhadoras que passa a visa esperando que de
repente a Rita Hayworth me telefone para dizer que o Ali Khan morreu e ela está ansiosa
para gastar com o velho Braga o dinheiro de sua herança, pois me acha muito simpático
e insinuante, e confessa que em Paris muitas vezes se escondeu em uma loja defronte ao
meu hotel só para me ver entrar ou sair.

1
BRAGA, Rubem. 200 crônicas escolhidas, 22 ed. Rio de Janeiro: Record, 2004, p. 221-222.

Direito do Consumidor
4

Confesso que não acho tal coisa provável: o Ali Khan ainda é moço, e Rita não tem meu
número. Mas é sempre doloroso pensar que se tal coisa acontecesse eu jamais saberia –
porque meu aparelho não funciona. Pensai nisso, senhor: um telefone que dá sempre
sinal de ocupado – „cuém, cuém, cuém‟ – quando na verdade está quedo e mudo na
modesta sala de jantar. Falar nisso, vou comer; são horas. Vou comer contemplando
tristemente o aparelho silencioso, essa esfinge de matéria plástica; é na verdade algo
que supera o rádio e a televisão, pois transmite não sons nem imagens, mas sonhos
errantes no ar.

Mas batem a porta. Levanto o escuro garfo do magro bife e abro. Céus, é um empregado
da Companhia! Estremeço de emoção. Mas ele me estende um papel: é apenas o
cobrador. Volto ao bife, curvo a cabeça e mastigo devagar, como se estivesse
mastigando meus pensamentos, a longa tristeza de minha humilde vida, as decepções,
os remorsos. O telefone continuará mudo; não importa: ao menos é certo, senhor, que
não vos esquecestes de mim”.

Março de 1951

Direito do Consumidor
5

2. INTRODUÇÃO

2.1 Contextualizando o CDC


Ao longo da História das sociedades, tivemos três paradigmas básicos de organização
política: o Estado de Direito, o Estado de Bem-Estar Social e o Estado Democrático de
Direito.

O primeiro paradigma também chamado Estado Liberal tem como princípio basilar o da
legalidade. A teoria dos Três Poderes, consolidada por Montesquieu, fundamenta o
Estado Liberal, coibindo o arbítrio dos governantes e oferecendo segurança jurídica para
os governados. É o Estado legalmente contido, também chamado, por isso, Estado de
Direito.

Durante o período em que vigorou o Estado Liberal, a ordem era a não intervenção do
Estado nos negócios privados, permitindo que esses fluíssem livremente segundo as
regras do mercado. A burguesia passou a dirigir a máquina estatal diretamente, visto
que a soberania, concentrada, no Estado Absolutista nas mãos do soberano, havia sido
transferida para o povo. No Liberalismo, como se sabe, exaltava-se o individualismo, com
ausência e desprezo da coação estatal.

Segundo Fernando Scaff, caracterizam o Estado Liberal: o princípio da liberdade, a


separação dos Poderes, o voto censitário, observando-se o critério de renda para que
fosse possível a participação no processo eletivo, a liberdade contratual, a propriedade
privada dos meios de produção e a separação entre os trabalhadores e os meios de
produção, objetivando a apropriação da mais-valia produzida pelos trabalhadores em
razão da venda de sua força de trabalho.

Com o advento da Revolução Industrial, surgem necessidades sociais, as quais ficam


mais evidenciadas, posteriormente, pelos sucessivos movimentos socialistas.
Demonstram, com clareza, que não basta ao ser humano o atributo da liberdade. Há um
imperativo maior, que é a própria condição de usufruir dessa liberdade, ou seja, a
condição sócio-econômica capaz de admiti-lo como pessoa humana.

Diante da crise econômica do primeiro pós-guerra, o Estado foi premido, pela sociedade,
a assumir um papel ativo, seja como agente econômico (instalando indústrias, ampliando
serviços, gerando empregos, financiando atividades), seja como intermediário na disputa
entre poder econômico e miséria (defendendo trabalhadores em face dos patrões,
consumidores em face de empresários).

Os modernos textos constitucionais incorporaram as novas preocupações:


desenvolvimento da sociedade e valorização dos indivíduos socialmente inferiorizados. O
Estado abandona o papel não intervencionista para assumir uma postura de agente do
desenvolvimento e da justiça social. Surge, então, o Estado Social.

O Estado Social contrapõe-se, assim, ao Estado Liberal, na medida em que vê alteradas


suas principais características: o princípio da legalidade e separação dos Poderes foram

Direito do Consumidor
6

mantidos; o voto censitário, por pressão das massas excluídas, foi substituído pelo
sufrágio universal, com ampla participação de todas as camadas da população, com isso
aumentando o prisma das propostas políticas; a liberdade contratual deixou de ser
ampla, passando-se ao dirigismo contratual na área econômica; surgiu a função social da
propriedade dos meios de produção.

A evolução culmina no Estado Democrático de Direito. Superada a fase inicial, o Estado


de Direito incorporou, paulatinamente, instrumentos democráticos, permitindo a
participação do povo no exercício do poder e guardando coerência com o projeto inicial
de controlar o Estado.

O Estado Democrático de Direito é aquele: a) criado e regulado por uma Constituição; b)


onde os agentes públicos fundamentais são eleitos e renovados periodicamente pelo
povo e respondem pelo cumprimento de seus deveres; c) onde o poder político é
repartido entre o povo e órgãos estatais independentes e harmônicos, que se controlam
uns aos outros; d) onde a lei, produzida pelo Legislativo, é necessariamente observada
pelos demais Poderes; e, e) onde os cidadãos, sendo titulares de direitos, inclusive
políticos, pode opô-los ao próprio Estado.

Paralelamente a esses paradigmas de organização política do Estado, fala-se nos direitos


de primeira geração (individuais), de segunda geração (coletivos e sociais) e direitos de
terceira geração (difusos, compreendendo os direitos ambientais, do consumidor e
congêneres).

Na Europa, nos Estados Unidos e em nosso País, verificaram-se pressões sociais, com
reivindicação de novos direitos. Nesse contexto, desponta, então, a tutela do consumidor
no Brasil.

2.2 A Evolução das Relações de Consumo


As recentes transformações do direito contemporâneo têm apontado para a adoção de
providências legislativas visando à equalização de relações jurídicas marcadas pelo traço
da desigualdade.

Desigualdade essa que pode se apresentar de diversos modos, seja originária de


desproporção da capacidade econômica das partes, ou mesmo da ausência de acesso e
compreensão das informações sobre os aspectos da relação jurídica em que participa,
assinalando o fenômeno da vulnerabilidade de um dos seus sujeitos.

O paradigma individualista, sobretudo no direito privado, cede espaço a novos interesses


igualmente reconhecidos pelo Estado, cuja intervenção em favor do sujeito reconhecido
como vulnerável tem por objetivo a recomposição da igualdade jurídica, corrigindo os
elementos fáticos de desigualdade. Georges Ripert, em estudo clássico, assinala que a
democracia moderna repele a fraternidade no que pode lembrar a caridade, assim como
rejeita a noção de dever, substituindo-a pela noção do direito. Assinala, pois, que a
liberdade não basta para assegurar a igualdade, pois os mais fortes depressa se tornam
opressores, cabendo ao Estado intervir para proteger os fracos.

Direito do Consumidor
7

Esta tem sido a orientação de diversos sistemas jurídicos desde o princípio do século XX 2,
por intermédio de uma maior intervenção do Estado nas relações entre os particulares, e
o aumento das inter-relações entre temas tradicionalmente divididos de modo estanque
como de direito público ou de direito privado, característica do direito contemporâneo,
denominado por muitos como um direito pós-moderno.

A este respeito, o reconhecimento de direitos subjetivos distintos atendeu a diferentes


etapas, começando pela tutela de situações específicas – como a proteção do direito dos
trabalhadores e o estabelecimento de uma disciplina jurídica própria do direito do
trabalho. O último passo dessa trajetória está na concepção de direitos difusos ou
coletivos, onde a determinação dos titulares do direito é relativa, e seus efeitos dizem
respeito a todo um grupo ou à coletividade.

Nessa etapa mais recente se incluem os direitos do consumidor. Em trabalho conhecido,


Fabio Konder Comparato – ainda na década de 70 – afirmava que a dialética entre
consumidor versus produtor é bem mais complexa e delicada do que a dialética capital
versus trabalho. Ao contrário dessa última, onde as definições dos polos da relação de
direito são, em regra, claras e precisas, aquela obedece a uma dinâmica própria, na qual
os sujeitos estarão, ora em um dos polos da relação, ora no outro. Daí porque a proteção
do consumidor, antes de consagrar direitos subjetivos específicos a este novo sujeito de
direitos, teve de observar certo período de maturação, visando a consolidação desta nova
posição jurídica.

As origens da preocupação com os direitos dos consumidores são tradicionalmente


indicadas ao conhecido discurso, nos Estados Unidos, do Presidente John Kennedy, no
Congresso norte-americano, em 1962, que, ao enunciar a necessidade de proteção do
consumidor, referiu-se como direitos básicos o direito à segurança, o direito à
informação, o direito de escolha e o direito a ser ouvido. A partir de então diversas leis
foram aprovadas nos Estados Unidos, ainda nos anos 60, contendo normas de proteção
aos consumidores norte-americanos.

No Brasil, o Código de Defesa do Consumidor vai ser promulgado no início dos anos 90,
cumprindo a determinação constitucional específica sobre o tema (art. 48, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias). Estabelece normas declaradamente de ordem
pública (artigo 1º), conferindo-lhes efetividade através da atribuição de competência
jurisdicional cível, criminal e administrativa a diversos órgãos do Estado, assim como
reconhece papel de destaque à auto-organização da sociedade civil, por intermédio das
associações de consumidores e demais entidades de defesa do consumidor.

2.3 O Direito do Consumidor e o Direito Privado Clássico


O direito do consumidor, uma vez que se trata de um direito de proteção da parte
vulnerável em uma relação de consumo, afasta-se do direito privado clássico e de seus
postulados de origem na escola jurídica do jusracionalismo (séculos XVII e XVIII),
reproduzidas nas codificações do século XIX, em especial o Código Francês de 1804 – o
Código de Napoleão.

2
Georges Ripert traz diversos exemplos da legislação francesa, no que se refere à proteção da parte
menos favorecida.

Direito do Consumidor
8

O direito privado clássico, representado pelo Código Civil como centro do ordenamento
jurídico e expressão de todo direito privado da época, é de tal modo hermético e
abrangente, a ponto de dar origem à escola da exagese, pela qual a identificação e
compreensão de todo direito residia no Código Civil, e só era direito o que estava
expresso nessa codificação.

Dentre os principais postulados do direto civil moderno encontra-se a autonomia da


vontade, sendo o contrato e o direito de propriedade suas expressões maiores,
configurados pela liberdade de manifestação da vontade, e correspondente vinculação ao
pactuado (pacta sunt servanda) e a liberdade de exercício de propriedade, como direito
que se exerce de modo mais absoluto (segundo o art. 544 do Código Civil francês, até
hoje vigente, “a propriedade é o direito de dispor e gozar da coisa do modo mais
absoluto, sempre que não se faça dela uso proibido por lei ou pelos regulamentos”).

Contudo, a força e o protagonismo do princípio do pacta sunt servanda irão sofrer, ao


longo do final do século XIX e no decorrer do século XX sensíveis transformações.

São exemplos destas alterações, o desenvolvimento, na França, da doutrina do abuso do


direito, a partir de casos judiciais que reconheceram limites ao exercício do direito de
propriedade, a chamada revolta do direito contra o Código – em contraposição ao
caráter absoluto e estrito da interpretação e aplicação da lei – e, adiante, o gradativo
reconhecimento em diversos ordenamentos jurídicos europeus, de uma finalidade social
aos direitos subjetivos.

Já no princípio do século XX, a autonomia da vontade e sua decorrência lógica, o


princípio do pacta sunt servanda, sofrem sensível modificação, por conta das
consequências da I Guerra Mundial. No caso, a eclosão do conflito e seus efeitos sobre os
contratos já celebrados, e que deveriam ser cumpridos, fizeram-se sentir em todo
continente europeu. Então é que, em resposta às situações que passaram a ocorrer, de
impossibilidade de cumprimento das obrigações pelas partes, sobretudo por conta de
circunstâncias supervenientes, posteriores à celebração do contrato, mas que ao mesmo
tempo eram imprevisíveis para os contratantes, surge, por obra da jurisprudência
francesa, a chamada Teoria da Imprevisão 3. Destinada a corrigir o desequilíbrio das
prestações em contratos, em face da alteração das circunstâncias, a teoria da imprevisão
fundamentou, a partir do ressurgimento da cláusula rebus sic stantibus (“enquanto as
coisas permanecerem as mesmas”), a possibilidade de revisão do contrato para
reestabelecer o equilíbrio.

A possibilidade de revisão, neste caso, supera a premissa inicial vinculada ao princípio do


pacta sunt servanda, de imutabilidade do contrato, uma vez que permite a alteração das
prestações para corrigi-las, determinando-lhe o equilíbrio, em homenagem à justiça
contratual.

3
Em geral é citado como leading case da teoria da imprevisão na França o caso da Compagnie General
d’Éclairage de Bordeaux, decidido pelo Conselho de Estado, em 30 de março de 1916, em que a ocupação
em razão da guerra de áreas produtoras de carvão afetaram o preço da matéria-prima e consequentemente o
custo da prestação da concessionária de serviço público, implicando na necessidade de revisão do contrato
em razão das circunstâncias imprevistas determinadas pela guerra.

Direito do Consumidor
9

Adiante, as crises econômicas pelas quais passou o mundo em fins da década de 1910 e
durante grande parte da década de 1920, culminando com as consequências da quebra
da Bolsa de Valores de New York, em 1929, fizeram com que a alternativa da revisão
contratual, sobretudo sob o risco do inadimplemento, permanecesse a ser utilizada.

Com a Segunda Guerra Mundial e, sobretudo, após seu término, assiste-se a profunda
modificação da estrutura econômica dos países capitalistas e de seus modelos de
negócio. Em grande parte impulsionados pelos avanços tecnológicos da área militar,
consolida-se após o conflito, uma crescente indústria dos bens de consumo de massa,
assim como a crescente massificação do crédito e da atividade publicitária, como novos
elementos no cenário econômico mundial. Com isso, altera-se igualmente o próprio
modelo de contrato que inspirou as codificações do século XIX e o próprio Código Civil
brasileiro de 1916.

O contrato, a rigor vislumbrado como um acordo pessoal entre dois sujeitos, que
negociam e estabelecem seu objeto através do pleno exercício da sua liberdade de
contratar, tem seus laços fundamentais sensivelmente alterados. Ocorre o que se
convencionou denominar despersonalização do contrato. Ou seja, em decorrência da
distância, da crescente ausência de contato direto entre os contratantes, não mais se
observará uma autêntica negociação dos termos do ajuste. Os contratantes não mais se
conhecem, no máximo, o contato se dá com um empregado ou preposto das empresas,
muitas vezes sem poder de decisão. Ao mesmo tempo, o crescimento das empresas e a
adoção de estruturas cada vez mais complexas de decisão pelas grandes corporações,
terminam por dar causa a que, por parte destas, passe a existir a necessidade de
uniformização dos contratos celebrados, facilitando seu planejamento e mesmo a
obtenção de maiores vantagens. Nasce aí, a figura das condições gerais dos contratos e
dos contratos de adesão que restringem a vontade de um dos contratantes apenas à
decisão de celebrar ou não o ajuste, mas sem nenhuma relevância para a definição do
seu conteúdo.

Estas circunstâncias dão origem ao então fenômeno dos contratos de massa, ou


simplesmente o fenômeno da massificação dos contratos, pelo qual a adoção de práticas
agressivas de contratação e a sensível restrição da liberdade de contratar uma das partes
(os não-profissionais, leigos) assinalam a debilidade destes sujeitos na relação
contratual, indicando a necessidade do reconhecimento desta situação pelo direito, de
modo a promover a proteção do vulnerável. A liberdade de contratar e o princípio da
autonomia da vontade, que fundamentavam o direito civil clássico, tornam-se
insuficientes para assegurar a justiça e o equilíbrio nestas relações contratuais,
determinando a necessidade de proteção dos mais fracos na sociedade de consumo de
massas.

Isto passa, por certo, pela crítica da noção de igualdade advinda da Revolução Francesa,
e que serve de inspiração para todo o direito civil moderno. A igualdade formal,
consagrada no direito civil francês, e por sua influência, nos Códigos Civis de todos os
países de tradição romano-germânica até então, propunha que o critério de igualdade
que identificava a todos, era o fato de existirem como seres humanos, embasando, por
outro lado, o individualismo filosófico e, afinal, o individualismo jurídico. Neste sentido,
todos deveriam estar sujeitos a uma mesma lei, e exercer sua liberdade na esfera de

Direito do Consumidor
10

permissão do direito privado, em absoluta igualdade de condições jurídicas. É certo que


este conceito, que tem sua origem na reação da Revolução Francesa contra estamentos
privilegiados do Antigo Regime (nobreza e clero), atendeu aos reclamos da época em que
se desenvolveu, e neste tempo teve, certamente, uma importante função de afirmação
das liberdades públicas e da proteção do indivíduo contra o Estado.

Todavia, com o advento da sociedade de consumo de massas e da nova forma de


produção capitalista, o reconhecimento de que, ainda que sejam todos os seres humanos
substancialmente iguais, podem ocupar posições de desigualdade no curso de relações
sociais e econômicas. Tal consideração inspirou a recuperação, pelo direito, da antiga
noção de igualdade, derivada do pensamento de Aristóteles, conhecida como igualdade
material, admitindo-se o reconhecimento de diferenças e, neste sentido, a possibilidade
de um tratamento desigual para desiguais. Consiste a igualdade material na preposição
de que se devem tratar os iguais de modo igual, e os desiguais, desigualmente, na
medida de sua desigualdade. A sociedade de consumo de massas identificou, em termos
de apropriação de bens de consumo, duas personagens bem definidas. De um lado, um
sujeito cuja função social é consumir, adquirir os bens de seu interesse ou necessidade.
De outro, uma ampla e cada vez mais complexa cadeia de agentes econômicos,
ocupados do processo de produção e fornecimento destes bens que, por sua força
econômica ou expertise profissional, assumem posição de poder na relação contratual
com o adquirente dos produtos ou serviços fornecidos.

O direito do consumidor tem nesta tensão entre os interesses dos agentes econômicos
que se dedicam ao fornecimento de produtos ou serviços e os seus consumidores seu
objeto de regulação. E parte do reconhecimento da existência de uma desigualdade entre
eles, a justificar o estabelecimento de normas de proteção para os consumidores, por
intermédio da intervenção do Estado em setores que até então estavam confiados
exclusivamente à liberdade de iniciativa dos particulares. Esta distinção implicará,
necessariamente, na diferenciação das normas do direito do consumidor com relação ao
direito civil. Tanto em matéria contratual, mediante o reconhecimento de normas
cogentes de formação do conteúdo do contrato e de vinculação do fornecedor, quanto em
matéria de responsabilidade civil.

O princípio orientador, que ao mesmo tempo justifica e orienta a defesa do consumidor é


o de sua vulnerabilidade, que se apresenta como uma presunção legal: todo consumidor
é vulnerável e, por isso, destinatário de proteção jurídica especial.

2.4 Princípios
O Direito, todos sabemos, não pode ser interpretado em tiras, nem aplicado aos pedaços.
Exige interpretação harmoniosa com todo o sistema e isso só se consegue por meio dos
princípios que iluminam e indicam o caminho a ser seguido na atuação hermenêutica 4
de descoberta do valor que está sendo resguardado pela regra. Traduzem o núcleo
básico do sistema jurídico, indicando as finalidades e objetivos a serem alcançados.
São frequentes no CDC as chamadas normas principiológicas, isto é, normas que
veiculam valores, estabelecem fins a serem alcançados. Aliás, o direito atual se

4
Hermenêutica é a ciência filosófica voltada para o meio de interpretação de um objeto. No caso do
Direito, trata-se de técnica específica que visa a compreender a aplicabilidade de um texto legal.

Direito do Consumidor
11

caracteriza por utilizar, cada vez mais, conceitos abertos (também chamados de
conceitos jurídicos indeterminados) e normas com conteúdo semântico flexível. Isto é, ao
lado de regras jurídicas, que operam com causas e consequências, vinculadas por um
nexo de imputação, os princípios, assim como os conceitos jurídicos indeterminados,
possibilitam uma alteração do direito sem que o texto de lei tenha necessariamente que
mudar. Possibilitam, portanto, uma adequação das normas às mudanças sociais, cada
vez mais velozes.

Antes de ingressar no exame das normas estabelecidas na Lei nº 8.078/90 é necessário


colocar uma questão preliminar. É preciso que se estabeleça claramente que o CDC tem
vida própria, tendo sido criado como subsistema autônomo e vigente dentro do sistema
constitucional brasileiro. Além disso, os vários princípios constitucionais que o embasam
são elementos vitais ao seu entendimento.

Não será possível interpretar adequadamente a legislação consumerista se não se tiver


em mente esse fato de que Lei comporta um subsistema no ordenamento jurídico, que
prevalece sobre os demais – exceto, claro, o próprio sistema da Constituição -, sendo
aplicável às outras normas de forma supletiva e complementar 5.

O CDC é uma lei principiológica, modelo até então inexistente no Sistema Jurídico
Nacional. Infelizmente, ainda há uma série de interpretações equivocadas da Lei nº
8.078/90, em função do desconhecimento de que o CDC é um sistema próprio, que tem
autonomia em relação às demais normas.

A Política Nacional de Relações de Consumo está lastreada nos seguintes princípios:


a) Vulnerabilidade do consumidor. É a espinha dorsal da proteção ao consumidor,
sobre o qual se assenta toda a linha filosófica do movimento. É induvidoso que o
consumidor é a parte mais fraca das relações de consumo; apresenta ele sinais de
fragilidade e impotência diante do poder econômico. Há reconhecimento universal
no que tange a essa vulnerabilidade. Nesse sentido já se manifestou a ONU e sob
esse enfoque o tema é tratado em todos os países ocidentais. No Brasil, a
Constituição Federal reconhece claramente essa situação de hipossuficiência, ao
declarar que o Estado promoverá a defesa do consumidor, de um lado assumindo
a postura de garantidor, e, de outro, outorgando tutela a quem, filosoficamente,
reconhece carecedor de proteção.
b) Boa-Fé Objetiva. A boa-fé objetiva é talvez o mais importante princípio do direito
contratual contemporâneo. Trata-se do dever, imposto a quem quer que tome
parte em relação negocial, de agir com lealdade e cooperação, abstendo-se de
condutas que possam esvaziar as legítimas expectativas da outra parte. Daí
decorrem múltiplos deveres anexos, deveres de conduta que impõem às partes,
ainda na ausência de previsão legal ou contratual, o dever de agir lealmente.
c) Transparência. O dever de agir com transparência permeia o CDC. Conduta
transparente é conduta não ardilosa, conduta que não esconde, atrás do
aparente, propósitos pouco louváveis. O CDC, prestigiando a boa-fé, exige
transparência dos atores do consumo, impondo às partes o dever de lealdade

5
A designação do alcance específico da Lei nº 8.078/90 se dá pela explicitação do sentido de relação de
consumo, fixada no estabelecimento da definição do conceito de consumidor, de fornecedor, de produto e de
serviço.

Direito do Consumidor
12

recíproca, a ser concretizada antes, durante e depois da relação contratual.


d) Informação. A informação é fundamental no sistema de consumo. Ausência de
informação, informação falha ou defeituosa gera responsabilidade. É dever do
fornecedor fazer chegar ao consumidor, de forma simples e acessível, as
informações relativas ao produto ou serviço. Tal obrigação se evidencia em
diversos dispositivos legais, como, por exemplo, no art. 6º, III 6, no art. 31 7 ou
mesmo no art. 54, § 3º e § 4º 8.
e) Segurança. Ao fornecedor cabe assegurar que os produtos ou serviços postos no
mercado de consumo sejam seguros e não causem danos de qualquer espécie aos
consumidores. Deve ser ressaltado que todo consumidor possui 3 esferas de
segurança que merecem proteção: segurança física, segurança patrimonial e
segurança moral. Prover segurança significa não atentar contra quaisquer destas
esferas.
f) Equilíbrio nas Prestações. Trata-se de um vetor fundamental, cuja inobservância
pode levar à anulação de um negócio jurídico. Serão inválidas as disposições que
ponham em desequilíbrio a equivalência entre as partes. Se o contrato situa o
consumidor em situação inferior, com nítidas desvantagens, tal contrato poderá
ter sua validade judicialmente questionada, ou, sem sendo possível, ter afastada
apenas a cláusula que fere o equilíbrio. O princípio do equilíbrio material entre as
prestações, ou princípio da equivalência, apresenta-se como um dos princípios
fundamentais do atual direito contratual, aplicável não apenas às relações de
consumo, mas às relações contratuais em geral.
g) Solidariedade. Sendo solidária a responsabilidade dos fornecedores, isso significa
que havendo mais de um causador, os danos deverão ser ressarcidos por todos
solidariamente, cabendo à vítima escolher em face de quem promoverá a ação de
reparação – se contra um, mais de um ou contra todos. A cadeia de
responsabilidade se estende a todos quantos tomaram parte na atividade de
colocar o produto ou o serviço no mercado.
h) Interpretação Mais Favorável ao Consumidor. Em conformidade com o art. 47 9, o
intérprete, diante de um contrato de consumo, deverá atribuir às suas cláusulas
conexões de sentido que atendam, de modo equilibrado e efetivo, aos interesses
do consumidor, parte vulnerável da relação.
i) Presença do Estado. O princípio da presença do Estado nas relações de consumo
é, de certa forma, corolário do princípio da vulnerabilidade do consumidor, pois,
se há reconhecimento da situação de hipossuficiência, de fragilidade e
desigualdade de uma parte em relação à outra, está claro que o Estado deve ser
chamado para proteger a parte mais fraca, por meio legislativo e administrativo,
de sorte a garantir o respeito aos seus interesses.

6
São direitos básicos do consumidor: a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços,
com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os
riscos que apresentem.
7
A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas,
ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço,
garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde
e segurança dos consumidores.
8
§ 3º - Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e
legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo
consumidor; e, § 4º - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser
redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.
9
As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

Direito do Consumidor
13

j) Harmonização de interesses. Interessa às partes, ou seja, aos consumidores e


fornecedores, o implemento das relações de consumo, com o atendimento das
necessidades dos primeiros e o cumprimento do objeto principal que justifica a
existência do fornecedor: fornecer bens e serviços. Colima-se, assim, o equilíbrio
entre as partes. Por outro lado, a proteção ao consumidor deve ser
compatibilizada com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico,
em face da dinâmica própria das relações de consumo, que não podem ficar
obsoletas e entravadas, em nome da defesa do consumidor. Novos produtos e
novas tecnologias são bem-vindos, desde que seguros e eficientes.
k) Coibição de abusos. Deve-se garantir não só a repressão aos atos abusivos, como
a punição de seus autores e o respectivo ressarcimento, mas também a atuação
preventiva tendente a evitar a ocorrência de novas práticas abusivas, afastando-
se aquelas que podem causar prejuízos aos consumidores, como a concorrência
desleal e a utilização indevida de inventos e criações industriais. A coibição
preventiva e eficiente dessas práticas representará o desestímulo dos potenciais
fraudadores. A contrario sensu, a ausência de repressão, ou mesmo o
afrouxamento, representará impunidade, e, pois, estímulo.
l) Incentivo ao autocontrole. Apesar do Estado interpor-se como mediador nas
relações de consumo, procurando evitar e solucionar os conflitos de consumo, não
deve, por outro lado, deixar de incentivar que tais providências sejam tomadas
pelos próprios fornecedores, mediante a utilização de mecanismos alternativos por
eles próprios criados e custeados. Essa é a solução ideal e significa modernização
das relações de consumo. De três maneiras pode-se dar o autocontrole. Em
primeiro lugar, pelo eficiente controle da qualidade e segurança de produtos
defeituosos no mercado, o que refletirá na diminuição ou eliminação de atritos
com o consumidor. Em segundo lugar, a prática de recall, ou seja, a convocação
dos consumidores de bens produzidos em série e que contenham defeitos de
fabricação que possam atentar contra a vida e a segurança dos usuários, arcando
o fornecedor com as despesas de substituição das peças defeituosas. Há o
reconhecimento do defeito, mas ao mesmo tempo ele é sanado pelo próprio
fabricante, sem prejuízo ou custo para o consumidor 10. E, em terceiro lugar, pela
criação, pelas empresas, de centros ou serviços de atendimento ao consumidor,
resolvendo diretamente a reclamação ou queixa apresentada contra seu produto
ou serviço.
m) Conscientização do consumidor e do fornecedor. Se o que se busca é o equilíbrio
nas relações de consumo, para que se atendam às necessidades do consumidor e
o interesse do fornecedor, sem grande conflituosidade, é natural que a maior
conscientização das partes no que toca aos seus direitos e deveres conduzirá
fatalmente a esse objetivo. Pode-se adiantar que, quanto maior for o grau de
conscientização das partes envolvidas, menor será o índice de conflito nas
relações de consumo. Por conscientização entende-se a educação, formal e
informal, para o consumo, bem como a informação do consumidor e do
fornecedor.

10
A indústria automobilística utilizou-se largamente do recall, notando-se que a partir de 1991, cresceu
enormemente no país o número de convocações dirigidas aos consumidores, por montadoras nacionais e
estrangeiras, o que pode ter ocorrido tanto pela conscientização do fabricante como pelo efeito da vigência do
CDC.

Direito do Consumidor
14

n) Melhoria dos serviços públicos. Não apenas a área privada está obrigada a prestar
serviços eficientes e seguros ao seu usuário. Também a área pública, oficial, deve
ter o compromisso de prestar serviços públicos igualmente seguros e eficientes
que não atentem contra a vida, a saúde e a segurança do consumidor. Ante o
reconhecimento da alta precariedade com que são prestados os serviços públicos,
notadamente os de transporte e saúde, é feita a recomendação aos governos no
sentido de racionalizá-los e de melhorá-los, o que se enquadra no objetivo maior
de proteger o consumidor e melhorar-lhe a qualidade de vida.

Direito do Consumidor
15

3. POLÍTICA NACIONAL DAS RELAÇÕES DE CONSUMO


O Código de Defesa do Consumidor antes de cuidar das próprias relações de consumo,
cuida da Política de Relações de Consumo, dispondo sobre objetivos e princípios que
devem nortear o setor. A defesa do consumidor não pode ser encarada como
instrumento de confronto entre produção e consumo, senão como meio de compatibilizar
e harmonizar os interesses envolvidos.

3.1 Objetivos
A Política Nacional de Relações de Consumo deve ter como objetivos, em primeiro plano,
o atendimento das necessidades dos consumidores – objetivo principal das relações de
consumo -, mas deve preocupar-se também com a transparência e harmonia das
relações de consumo, de modo a pacificar e compatibilizar interesses eventualmente em
conflito. O objetivo do Estado, ao legislar sobre o tema, não será outro que não o de
eliminar ou reduzir tais conflitos, sinalizar para a seriedade do assunto e anunciar sua
presença como mediador, mormente para garantir proteção à parte mais fraca e
desprotegida.

Objetivo importante dessa política é também a postura do Estado de garantir a melhoria


da qualidade de vida da população consumidora, quer exigindo respeito à sua dignidade,
quer assegurando a presença no mercado de produtos e serviços não nocivos à vida, à
saúde e à segurança dos adquirentes e usuários, quer, por fim, coibindo os abusos
praticados e dando garantias de efetivo ressarcimento, no caso de ofensa a seus
interesses econômicos.

Para efetiva aplicação do generoso conjunto de normas do CDC se faz necessária a


caracterização de uma relação jurídica de consumo. Esta existirá todas as vezes que
estiverem presentes em determinada relação, em polos opostos, um consumidor e um
fornecedor, tendo como objeto a contratação de um produto ou um serviço. Ou seja, o
Código de Defesa do Consumidor tem um campo de aplicação abrangente e difuso, que
permeia todas as áreas do Direito onde ocorram relações de consumo.

Todavia, deve ser ressaltado que o CDC é uma lei especial que, em razão de seus
destinatários, só é aplicável aos consumidores e fornecedores em suas relações. Nesse
sentido, a lição de nossos mais autorizados doutrinadores:

“(...) o campo de aplicação do CDC é especial, regulando a relação entre fornecedor


e consumidor. (...) Um Código diferente para agentes diferentes da sociedade ou
consumidores em relação entre diferentes (um vulnerável – o consumidor – e um
expert – o fornecedor) 11.

11
MARQUES. Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais,
p. 31.

Direito do Consumidor
16

O Código de Defesa do Consumidor, além de ter um campo especial de aplicação – as


relações de consumo - regula relações entre desiguais: o fornecedor e o consumidor,
este reconhecidamente mais fraco (vulnerabilidade). O CDC busca a igualdade material
(real), reconstruída por uma disciplina jurídica voltada para o diferente, porque é preciso
tratar desigualmente os desiguais para que eles se igualem. Só se justifica a aplicação de
uma lei protetiva se estivermos diante de uma relação entre desiguais; entre iguais não
se pode tratar privilegiadamente um deles sob pena de se atentar contra o princípio da
igualdade.

3.2 Identificando o Consumidor


Diz o art. 2º que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza
produto ou serviço como destinatário final”.

Portanto, por definição legal, consumidor há de ser:


a) pessoa física ou jurídica, não importando os aspectos de renda e capacidade
financeira. Em princípio toda e qualquer pessoa física ou jurídica pode ser
havida como consumidora. Por equiparação é também toda coletividade.
Cumpre observar, no particular, que há quem entenda que o consumidor só
pode ser pessoa física, ou seja, individual. Entretanto, há jurisprudência
afirmando que pessoa jurídica, quando destinatária final, é considerada
consumidora;
b) aquele que adquire (compra diretamente) ou que, mesmo não tendo
adquirido, utiliza (usa, em proveito próprio ou de outrem) produto ou serviço,
entendendo-se por produto “qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou
imaterial” (CDC, art. 3º, 1º) e por serviço qualquer atividade fornecida a
terceiros, mediante remuneração, desde que não seja de natureza trabalhista
(CDC, art. 3º, 2º);
c) destinatário final, ou seja, adquire para uso próprio, privado, individual,
familiar ou doméstico, e até para terceiros, desde que o repasse não se dê
por revenda (um presente, por exemplo). Não se incluiu na definição legal,
portanto, o intermediário, e aquele que compra com o objetivo de revender
após montagem, beneficiamento ou industrialização. A operação de consumo
deve encerrar-se no consumidor, que utiliza ou permite que seja utilizado o
bem ou serviço adquirido, sem revenda. Ocorrida esta, consumidor será o
adquirente da fase seguinte, já que o consumo não teve, até então,
destinação final. Deve-se ressaltar que aquele que adquire produtos ou
serviços para o desempenho de atividade profissional também é consumidor,
bastando, para tanto, que não haja finalidade de revenda. Assim o advogado
que adquire livros jurídicos para bem desempenhar sua função é, sem dúvida,
destinatário final dessa aquisição e, como tal, consumidor segundo a definição
legal.

Todavia, a legislação consumerista também é aplicável a terceiros que não são


consumidores, sem sentido jurídico, mas que foram equiparados a consumidores para
efeitos de tutela legal por força das disposições contidas no parágrafo único do art. 2°, e
nos arts. 17 e 29. Tais dispositivos funcionam como verdadeiras normas de extensão do
campo de incidência originário do Código de Defesa do Consumidor, na medida em que

Direito do Consumidor
17

colocam sob o manto protetivo deste os sujeitos nelas descritos. Assim, estão igualmente
amparados todos aqueles que, muito embora não se amoldem ao conceito jurídico de
consumidor padrão, estão expostos aos efeitos decorrentes das atividades dos
fornecedores no mercado, podendo ser por elas atingidos ou prejudicados.

O art. 17 equipara ao consumidor todas as vítimas do acidente do consumo. A finalidade


desse dispositivo é dar a maior amplitude possível à responsabilidade pelo defeito de um
produto ou serviço. Não faz qualquer sentido exigir que o fornecedor disponibilize no
mercado de consumo produtos ou serviços seguros apenas para o consumidor, não se
importando com terceiros que possam vir a sofrer danos, razão pela qual se deu a estas
vítimas um tratamento diferenciado, que se justifica, repita-se, pela relevância social que
atinge a prevenção e a reparação de tais danos.

Nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

“Código de Defesa do Consumidor. Acidente aéreo. Transporte de malotes.


Relação de consumo. Caracterização. Responsabilidade pelo fato do serviço.
Vítimas do evento. Equiparação a consumidores. Artigo 17 do CDC.
I - Resta caracterizada relação de consumo se a aeronave que caiu sobre a casa
das vítimas realizava serviço de transporte de malotes para um destinatário final,
ainda que pessoa jurídica, uma vez que o artigo 2° do Código de Defesa do
Consumidor não faz tal distinção, definindo como consumidor, para fins
protetivos da lei (...) II – Em decorrência, pela aplicação conjugada com o artigo
17 do mesmo diploma legal, cabível, por equiparação, o enquadramento dos
autores, atingidos em terra, no conceito de consumidores. Logo, em tese,
admissível a inversão do ônus da prova em seu favor. Recurso especial provido”
(REsp 772.248/SP, Rel. Min. Castro Filho, Terceira Turma).

3.2.1 Compreendendo Melhor a Expressão “Destinatário Final”


Destinação final é a necessidade legalmente imposta de que a aquisição do produto ou a
fruição do serviço não ocorra com fins profissionais, com o objetivo de revender após
montagem, beneficiamento ou industrialização.

Em linha de princípio, o CDC se aplica aos consumidores não profissionais, como tais
entendidos aqueles que, ao adquirir produto ou serviço, o fazem de modo alheio às
finalidades profissionais, sem procurar, por meio da aquisição, aumentar seus lucros.

Porém, tais restrições não são absolutas. A jurisprudência tem eventualmente


flexibilizando tal restrição, com vistas a preservar a filosofia do CDC. É preciso analisar o
caso concreto e suas circunstâncias. Sempre que estiver evidenciada a desigualdade
material, a parte mais fraca deverá ser protegida.

Direito do Consumidor
18

A linha de precedentes do STJ inclina-se pela teoria maximalista, posto que considera
consumidor o destinatário final fático do bem ou serviço, ainda que utilizado no exercício
de sua profissão ou empresa. Nesse sentido:
1) REsp 208.793/MT, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, o
qual considerou existir relação de consumo entre Fertiza Companhia Nacional
de Fertilizantes e Edin Fachin, por ser o agricultor destinatário final do adubo
que adquiriu e utilizou em sua lavoura: “A meu sentir, esse cenário mostra
que o agricultor comprou o produto na qualidade de destinatário final, ou
seja, para utilizá-lo no preparo de sua terra, não sendo este adubo objeto de
nenhuma transformação”;
2) REsp 329.587/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, o
qual considerou existir relação de consumo entre a pessoa jurídica
contratante do serviço de transporte aéreo e a transportadora, tendo por
objeto o transporte de lote de peças de reposição de propriedade daquela;
3) REsp 488.274/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, o qual
considerou existir relação de consumo entre Pastifício Santa Amália Ltda. e
Baan Brasil Sistemas de Informática Ltda., porquanto aquela adquiriu,como
destinatária final, programas de computador distribuídos por esta, com o
intuito de melhor gerenciar seu estoque de produtos: “Extrai-se dos autos
que a recorrente é qualificada como destinatária final, já que se dedica à
produção de alimento e que se utiliza dos serviços de software, manutenção e
suporte oferecidos pela recorrida, apenas para controle interno de produção.
Deve-se, portanto, distinguir os produtos adquiridos pela empresa daqueles
que são, de fato, repassados aos consumidores”;
4) REsp 445.854/MS, Rel. Min. Castro Filho, Terceira Turma, o qual considerou
ser consumidor o agricultor Francisco João Andrighetto, ao adquirir crédito
bancário para a compra de colheitadeira a ser utilizada em sua atividade
econômica.

3.3 Identificando o Fornecedor


Talvez seja mais cômodo definir fornecedor por exclusão, ou seja, dizer quem não pode
ser considerado fornecedor. Em princípio só estariam excluídos do conceito de fornecedor
aqueles que exerçam ou pratiquem transações típicas de direito privado e sem caráter de
profissão ou atividade, como, por exemplo, a compra e venda de imóvel entre pessoas
físicas particulares, por acerto direto e sem qualquer influência de publicidade. Sem
habitualidade no desempenho da atividade dificilmente teremos a figura do fornecedor.
Não será fornecedor, portanto, o escritório de advocacia que, pretendendo remodelar o
ambiente de trabalho, põe à venda os móveis antigos. Será, à evidência, uma relação
civil de compra e venda.

Pode-se aceitar a definição legal de fornecedor, que engloba “toda pessoa física ou
jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação,
construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de
produtos ou prestação de serviços” (CDC, art. 3º).

Direito do Consumidor
19

Para evitar interpretações contraditórias, o legislador resolveu definir produto como


sendo “qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (art. 3º, 1º), e
serviço como “qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante
remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo
as decorrentes das relações de caráter trabalhista” (art. 3º, 2º).

Praticamente, a definição legal esgotou todas as formas de atuação no mercado de


consumo. Fornecedor não é apenas quem produz ou fabrica, industrial ou
artesanalmente, em estabelecimentos industriais centralizados ou não, como também
quem vende, ou seja, comercializa produtos. Nesse ponto, portanto, a definição de
fornecedor se distancia da de consumidor, pois enquanto este há de ser o destinatário
final, tal exigência não se verifica quanto ao fornecedor, que pode ser o fabricante
originário, o intermediário ou o comerciante, bastando que faça disso sua profissão ou
atividade principal. Fornecedor é, pois, tanto aquele que fornece bens e serviços ao
consumidor como aquele que o faz para o intermediário ou comerciante, porquanto o
produtor originário também deve ser responsabilizado pelo produto que lança no
mercado de consumo (CDC, art. 18).

A definição do que seja fornecedor aliada à explicitação do entendimento dos termos


“produto” e “serviço” facilita sobremodo a aplicação da lei, pois elimina, na medida do
possível, dúvidas que poderiam pairar sobre o correto entendimento do conteúdo de cada
termo. Tal medida, inclusive, define bem o alcance da tutela do consumidor, pois permite
a clara identificação de quem está abrangido por ela e, por exclusão, quem a ela não se
submete.

3.4 Identificando Serviço


Dúvida também poderia surgir no que tange à prestação de serviços, mas é importante
ter em mente que tal prestação será remunerada e não subordinada a vínculo
trabalhista. Sendo gratuita, como ocorre, por exemplo, com os atos de camaradagem, os
decorrentes de parentesco e vizinhança (favores), não serão considerados serviços aos
quais a lei empresta tutela. Todavia, vale ressaltar que, não se confundem os serviços
puramente gratuitos – estes, sim, afastados da incidência do CDC -, que seriam aqueles
prestados no exclusivo interesse do beneficiário, sem nenhuma vantagem financeira para
o executor, com os serviços aparentemente gratuitos – aos quais se aplica a lei
consumerista -, que seriam aqueles em que, indiretamente, o executor tem interesse ou
vantagem patrimonial no serviço, estando os custos destes cobertos pelos benefícios daí
advindos para o prestador, caso é o caso de certas facilidades oferecidas por shopping
centers, ou serviços prestados por Santas Casas de Misericórdia, cujos respectivos
custos, ainda que parcialmente, são cobertos pelo SUS – Sistema Único de Saúde.

Do mesmo modo, se o serviço é prestado por força de um contrato de trabalho, mediante


vínculo de subordinação, dependência econômica e hierarquia, estará fora da definição
de serviço tal qual definido no CDC, e, por isso mesmo, submetido à legislação pertinente
(CLT).

O próprio legislador cuidou de enumerar algumas atividades que caracterizariam


prestação de serviço, como as de natureza bancária, financeira, creditícia e securitária.
Tal enumeração, no entanto, é exemplificativa e não exaure o rol das atividades também
enquadradas.

Direito do Consumidor
20

Prestadoras de serviço também são as concessionárias de serviços públicos, pois a


definição legal enumera explicitamente, entre as modalidades de fornecedores, a pessoa
jurídica de direito público e de direito privado. Assim, também estariam incluídos na
tutela os serviços de transporte, saúde, telefonia, correios, alguns deles operados por
empresas ou entidades governamentais, outros objeto de concessão a empresas privadas
ou privatizadas.

O Código definiu serviço em seu art. 3º, 2º, e buscou apresentá-lo da forma mais
completa possível. É importante lembrar que a enumeração é exemplificativa, realçada
pelo pronome “qualquer”. Dessa maneira, como a lei diz, serviço é qualquer atividade
fornecida, ou melhor dizendo, prestada no mercado de consumo. Os chamados serviços
essenciais têm regulação complementar no art. 22.

3.5 Identificando Produto


O CDC definiu produto em seu art. 3º, 1º e, de maneira adequada, seguindo o conceito
contemporâneo, em vez de falar de “bem” ou “coisa”, como fazia o Código Civil de 1916.

Esse conceito de produto é universal nos dias atuais e está estreitamente ligado à ideia
do bem, resultado da produção no mercado de consumo das sociedades capitalistas. É
vantajoso seu uso, pois o conceito passa a valer no meio jurídico e já era usado por
todos os demais agentes do mercado (econômico, financeiro, de comunicações, etc.).

Na definição de produto, o legislador coloca “qualquer bem”, e designa este como “móvel
ou imóvel”, e ainda “material ou imaterial”. Da necessidade de interpretação sistemática
do CDC nascerá também a hipótese de fixação do produto como “durável” e “não
durável”, na previsão do art. 26 12. Diante do referido artigo, importa esclarecer o que são
produtos duráveis (inciso I) e produtos não duráveis (inciso II). Temos que duráveis são
os bens tangíveis que não se extinguem após o seu uso regular. Foram feitos para durar;
para serem utilizados várias vezes. Não são, todavia, eternos. Sofrem os desgastes
naturais com o passar do tempo e a sequência de uso. Assim são os livros, as roupas, os
automóveis, os imóveis, os equipamentos eletrônicos etc. Com o tempo, maior ou
menor, deixarão de atender às finalidades para as quais se destinam ou, quando nada,
terão reduzidas a sua eficiência ou capacidade de funcionamento. No segundo caso, a
contrario sensu, temos que não duráveis são aqueles bens tangíveis que desaparecem,
se destroem, acabam com o seu uso regular. A extinção pode ser imediata (alimentos,
remédios, bebidas) ou paulatina (caneta, sabonete).

A distinção se reveste de importância na medida em que o Código de Defesa do


Consumidor confere prazos decadenciais distintos para a reclamação pelos vícios do
produto ou do serviço, sendo menor o prazo quando se refere a produto/serviço não
durável e maior quando se refere a produto/serviço durável.

12
Há uma diferenciação com relação ao prazo para reclamação em razão da classificação do produto como
durável ou não durável.

Direito do Consumidor
21

4. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR

4.1 A Teoria do Risco Criado


Os produtos e serviços ofertados no mercado destinam-se a satisfazer as necessidades
dos consumidores, nos aspectos de indispensabilidade, utilidade e comodidade, sendo
natural a expectativa de que funcionem conveniente e adequadamente ou se prestem à
finalidade que deles legitimamente se esperam. Não fosse assim não estaria justificada a
razão de sua existência.

Por outro lado, os fornecedores procuram produzir bens e serviços adequados ao


consumo, seguros, eficientes e indenes de defeitos, utilizando-se, para tanto, de testes e
controles de produção e qualidade, com o objetivo de eliminar ou pelo menos reduzir a
colocação no mercado de produtos defeituosos.

Ocorre, porém, que, mesmo com o emprego de diligência na produção ou prestação e de


rigoroso controle, ainda assim produtos e serviços acabam entrando no mercado de
consumo com defeitos que culminam por lesar à saúde, à segurança e ao patrimônio dos
consumidores.

A inevitabilidade dessas falhas no sistema de produção e a impossibilidade prática de sua


completa eliminação conduziram à ideia de criação de mecanismos legais de
ressarcimento de danos pela simples colocação no mercado de produtos e serviços
potencialmente danosos, atribuindo ao fornecedor a responsabilidade pelos danos nessa
condição causados à vítima e a terceiros, dentro do princípio de que aquele que lucra
com a atividade deve responder pelos riscos e desvantagens dela decorrentes. Daí o
surgimento da teoria do risco criado, que tem o sentido de atribuir ao fornecedor o dever
de reparação pelos danos causados pelo fato de desenvolver atividade potencialmente
danosa. Ou seja, faz com que o fornecedor assuma todos os riscos de sua atividade.

Subjacente ao tema cumpre verificar que ao dever geral de não causar prejuízo a
outrem, correspondeu o dever especial de não colocar no mercado produtos e serviços
que possam acarretar riscos à saúde e à segurança dos consumidores (CDC, art. 8º).
Esse dispositivo impõe ao fornecedor os seguintes deveres:
a) não colocar no mercado produtos e serviços que impliquem riscos à saúde e
segurança, exceto os havidos normais e previsíveis em decorrência de sua
natureza e fruição; e
b) dar ao consumidor informações necessárias e adequadas a respeito do
funcionamento e da potencialidade danosa.

Em consequência da não-observância desses deveres surge a responsabilidade do


fornecedor pelo fato do produto ou serviço (CDC, arts. 12 e 14).

O dever de informar é um dos principais deveres do fornecedor, corolário do princípio da


boa-fé, que se traduz na cooperação, na lealdade, na transparência, na correção, na
probidade e na confiança que devem existir nas relações de consumo. Cumpre-se o
dever de informar quando a informação recebida pelo consumidor preenche três

Direito do Consumidor
22

requisitos: adequação – os meios de informação devem ser compatíveis com os riscos


do produto ou do serviço e seu destinatário; suficiência – a informação deve ser
completa e integral; veracidade – além de completa, a informação deve ser verdadeira,
real. Somente a informação adequada, suficiente e veraz permite o consentimento
informado, pedra angular na apuração da responsabilidade do fornecedor.

Vem a propósito o caso julgado pela 5ª. Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, na Apelação Cível n° 20.632/99, relator o Desembargador Roberto Wider. O
paciente foi submetido a uma cirurgia de prostatectomia, decorrente de hipertrofia
prostática, ou seja, próstata aumentada de volume. Realizada a intervenção cirúrgica, o
paciente veio a sofrer incontinência urinária e impotência sexual. Na ação indenizatória
movida pelo paciente contra o médico que fez a cirurgia foi alegado o risco inerente,
tendo a perícia médica confirmado que a incontinência urinária e a impotência sexual são
consequências inevitáveis naquele tipo de cirurgia, pelo menos naquele caso específico,
pelo que não haveria que se falar de culpa, sequer em defeito do serviço. Mesmo assim o
pedido indenizatório foi acolhido porque o paciente não havia sido informado desses
riscos, para que pudesse decidir, e só ele, se os correria ou não. Em suma, faltou o
consentimento informado.

O voto do relator destacou: “Se um paciente sofre de hipertrofia prostática com as


conhecidas consequências em relação às dificuldades de micção e frequentes infecções
urinárias, e o tratamento cirúrgico indicado tem riscos tão elevados, sequelas frequentes
de incontinência urinária e impotência, impõe-se que se comprova expressamente que o
paciente estava ciente de tais riscos e com eles concordou, pois é intuitivo e de sabedoria
comum, que ninguém, em sã consciência, trocaria um problema de próstata aumentada,
dificuldades de micção e infecções urinárias pelo risco de sequela permanente de
impotência sexual, incontinência urinária e uso de fraldas pelo resto da vida”.

O dever de segurança é o dever jurídico que se contrapõe ao risco. Risco e segurança são
dois elementos que atuam reciprocamente no meio do consumo. Há um relacionamento
entre essas duas palavras, como vasos comunicantes. Quanto maior o risco criado pela
atividade empresarial, maior será o dever de segurança.

As regras da experiência comum evidenciam que os bens de consumo sempre têm um


resíduo de insegurança, que pode não merecer a atenção do legislador. O Direito só atua
quando a insegurança ultrapassar o patamar da normalidade e da previsibilidade.

Pondera o insigne Herman Benjamin que “o Código não estabelece um sistema de


segurança absoluta para os produtos e serviços. O que se quer é uma segurança dentro
dos padrões da expectativa legítima dos consumidores. E esta não é aquela do
consumidor-vítima. O padrão não é estabelecido tendo por base a concepção individual
do consumidor, mas, muito ao contrário, a concepção coletiva da sociedade de
consumo” 13.

13
BENJAMIN, Antônio Herman. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo, Savaiva, p. 60

Direito do Consumidor
23

Resumindo, pode-se então dizer que o Código de Defesa do Consumidor esposou a teoria
do risco do empreendimento ou teoria do risco empresarial que se contrapõe à teoria do
risco do consumo.

Pela teoria do risco do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer
alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais
vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este
dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como
os critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os
destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se
alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou
executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e
serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança
dos mesmos.

O consumidor não pode assumir os riscos das relações de consumo, não pode arcar
sozinho com os prejuízos decorrentes dos acidentes de consumo, ou ficar sem
indenização. Tal como ocorre na responsabilidade do Estado, os riscos devem ser
socializados, repartidos entre todos, já que os benefícios são também para todos. E cabe
ao fornecedor, através dos mecanismos de preço, proceder a essa repartição de custos
sociais dos danos. É a justiça distributiva, que reparte equitativamente os riscos
inerentes à sociedade de consumo entre todos, através dos mecanismos de preços,
repita-se, e dos seguros sociais, evitando, assim, despejar esses enormes riscos nos
ombros do consumidor individual.

4.2 Responsabilidade por Vício e por Defeito


O Código tratou, em seções diferentes, da responsabilidade pelo fato do produto e do
serviço e da responsabilidade por vício (Seção II e Seção III do Capítulo IV), significando
que o legislador pretendia diferenciá-las e impor-lhes regime próprio.

A responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço está intimamente ligada à


ocorrência de defeitos, que, por ocasionarem danos, conduzem à perspectiva de
reparação.

Defeito é, portanto, toda anomalia que, comprometendo a segurança que legitimamente


se espera da fruição do produto ou serviço, termina por causar danos físicos,
patrimoniais ou morais aos consumidores.

Se essa anomalia apenas compromete o funcionamento do produto ou serviço, mas não


apresenta risco à saúde e segurança do consumidor, não se fala em defeito, mas em
vício. Fato do produto está ligado a defeito, que, por sua vez, está ligado a dano.

Em suma, defeito é vício grave que compromete a segurança e causa danos ao


consumidor. Vício é ocorrência menos grave, circunscrito ao produto ou serviço, que
apenas causa seu mau funcionamento. Como bem observa Luiz Antônio Rizzatto Nunes 14,

14
RIZZATTO, Luiz Antônio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, p. 214.

Direito do Consumidor
24

“há vício sem defeito, mas não há defeito sem vício; o defeito pressupõe o vício. O
defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínsica ao produto ou
ao serviço, que causa dano maior que simplesmente o mau funcionamento ou não-
funcionamento”.

Dispõe o Código que é considerado defeituoso o produto quando não oferece a segurança
que dele legitimamente se espera, levando-se em conta circunstâncias relevantes como
apresentação, a normal utilização e os riscos que dele razoavelmente se esperam e a
época em que foi colocado no mercado (risco do desenvolvimento), pois o avanço
tecnológico faz com que os produtos atuais sejam muito mais seguros e eficientes do que
os do passado. O simples fato de ser colocado no mercado produto de melhor qualidade
ou mais seguro não induz à conclusão de que os mais antigos sejam considerados
defeituosos, já que deve ser analisado o contexto da época do lançamento e, a lei não
deve amordaçar o avanço tecnológico (art. 12, § 1º e 2º).

Com relação aos serviços, o fornecedor está obrigado à reparação de danos causados aos
consumidores por defeitos, sob qualquer modalidade, exceto a de caráter trabalhista
(art. 3º, 2º) ou, em virtude da ausência de remuneração, quando decorram de atos de
camaradagem, parentesco ou vizinhança. Da mesma forma, responde o fornecedor em
razão da insuficiência ou inadequação de informações sobre fruição e riscos de sua
atividade (art. 14).

Para maior clareza, diz o CDC que o serviço é considerado defeituoso quando não fornece
a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em conta as circunstâncias
relevantes como o modo de seu fornecimento ou de sua prestação, o resultado e os
riscos que dele razoavelmente se esperam e á época em que foi fornecido, também não
se considerando defeituoso pela adoção de novas técnicas (art. 14, § 1º e 2º).

Enquanto a responsabilidade pelo fato do produto ou serviço visa tutelar a integridade


físico-psíquica do consumidor, ensejando ampla reparação de danos, a responsabilidade
por vício busca proteger a esfera econômica, segundo as alternativas previstas na lei
consumerista.

A lei permite ao consumidor, não sendo o vício sanado no prazo máximo de 30 dias,
contados a partir do dia da reclamação acerca da ocorrência do vício, exigir,
alternativamente é á sua escolha: substituição do produto por outro da mesma espécie,
em perfeitas condições de uso; a restituição imediata da quantia paga, monetariamente
atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; o abatimento proporcional do
preço; a complementação de peso ou medida, no caso de vício de quantidade; a
reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível.

Duas recomendações, neste ponto, se fazem necessárias: 1) o consumidor deve realizar


sua reclamação acerca da ocorrência do vício formalmente para que possa comprovar
que o mesmo não foi sanado no prazo legal de 30 dias; e, 2) o consumidor só poderá
pleitear a substituição do produto ou a devolução do valor por este pago após haver
escoado o prazo do fornecedor.

Direito do Consumidor
25

Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do STJ em reiterados precedentes, verbis:

“Código de Defesa do Consumidor. Vício de qualidade. Automóvel. Não sanado o vício de


qualidade, cabe ao consumidor a escolha de uma das alternativas previstas no art. 18,
1°, do CDC. Recurso conhecido e provido para restabelecer a sentença que dera
procedência da ação, condenada a fabricante a substituir o automóvel” 15.

A diferenciação entre responsabilidade pelo fato do produto ou serviço e vício do produto


ou do serviço permite a conceituação da segunda como aquela atribuída ao fornecedor
por anormalidades que, sem causar riscos à saúde ou à segurança do consumidor,
afetam a funcionalidade do produto ou serviço, nos aspectos qualidade e quantidade,
tornando-os impróprios ou inadequados ao consumo, ou lhes diminuam o valor, bem
como aqueles decorrentes da divergência do conteúdo com as indicações constantes do
recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária.

4.2.1 Prazos Para Reclamação


Estabelece o CDC o prazo de cinco anos para a prescrição da ação tendo por objeto a
reparação de danos causados pelo defeito do produto ou serviço, iniciando-se a
contagem não a partir da tradição ou da ocorrência do defeito, mas do conhecimento do
dano e de sua autoria (art. 27).

No que tange às reclamações por vício do produto ou do serviço, os prazos legais são de
trinta dias para fornecimento de serviço e de produtos não duráveis (art. 26, I), e de
noventa dias, quando se tratar de fornecimento de serviços ou de produtos duráveis (art.
26, II). O termo inicial da contagem do prazo decadencial passou a variar conforme a
natureza do vício: se aparente ou de fácil constatação, conta-se a partir da entrega
efetiva do produto ou do término da execução do serviço; se oculto, a partir do momento
em que o vício ficar evidenciado.

Além da garantia legal (90 ou 30 dias a depender da natureza do produto ou serviço –


durável ou não durável), a lei de consumo permite ao fornecedor conferir uma garantia
aos seus produtos ou serviços. É a chamada garantia contratual ou convencional,
prevista no art. 50 do CDC: “a garantia contratual é complementar à legal e será
conferida mediante termo escrito”. Essa garantia, como se vê, é complementar à legal.

Ao contrário da garantia legal, que é sempre obrigatória, a garantia contratual é mera


liberalidade do fornecedor. Portanto, não se pode excluir, em nenhuma hipótese, a
garantia legal, a pretexto de que o fornecedor já estaria dando mais contratualmente.

15
REsp 185.836/SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4° Turma

Direito do Consumidor
26

“Sempre que houver garantia convencional, entende-se que, ao lado dela, subsistirá a
garantia legal. A garantia contratual será um plus em favor do consumidor. Os termos e
o prazo dessa garantia contratual ficam ao alvedrio exclusivo do fornecedor, que os
estipulará de acordo com sua conveniência, a fim de que seus produtos ou serviços
passam a ter competitividade no mercado, atentando, portanto, ao princípio da livre
iniciativa. Não raras vezes, o conteúdo da garantia de projeta como fator decisivo para o
consumidor optar pela aquisição do produto ou serviço. Há, inclusive, empresas que
promovem anúncios publicitários, centrando sua estratégia de marketing exatamente na
garantia, muito melhor e mais abrangente do que a da concorrência, de sorte a
sensibilizar o consumidor a dar preferência a seus produtos ou serviços” 16.

Em face da dupla garantia, contratual e legal, a questão que se coloca é a de saber


quando cada uma começa a correr.

Ora, como a garantia legal é independente da manifestação do fornecedor e a garantia


contratual, de sua livre disposição, é complementar, só se pode concluir que o prazo da
primeira (garantia legal) começa a correr após esgotado o prazo da segunda (garantia
contratual). Complementar é aquilo que complementa; indica algo que se soma, que
aumenta o tempo da garantia.

Temos como certo, assim, que o prazo da garantia convencional começa a correr a partir
da entrega do produto ou da prestação do serviço, enquanto o prazo da garantia legal
(30 ou 90 dias) tem por termo inicial o dia seguinte ao último dia da garantia
convencional.

Exemplificando, se o fornecedor dá prazo de garantia contratual até a próxima Copa,


dentro do tempo garantido, o produto não pode apresentar vício. Se apresentar, o
consumidor tem o direito de reclamar sem perder o direito à garantia legal, cujo prazo de
estende por 90 dias após o término da garantia convencional.

Se o fornecedor não dá prazo convencional, então os 30 ou 90 dias correm do dia da


aquisição do produto ou término da execução do serviço, não se olvidando que, em se
tratando de vício oculto, o início do prazo para reclamar apenas corre quando o vício se
manifesta.

Pode-se, portanto, afirmar com segurança o sentido exato da expressão complementar,


utilizada no caput do art. 50 do CDC, é de que a garantia contratual vai até o último dia
do prazo nela estabelecido, e só ao seu término tem início o prazo da garantia legal.

Note-se que os prazos de reclamação, tanto para vícios aparentes como para os ocultos
são os mesmos. O que diferencia um do outro é o dies a quo, isto é, o seu ponto de
partida, o momento em que o prazo começa a fluir. No caso de vício aparente ou de fácil
constatação, conta-se o prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do
término da execução do serviço. Se o vício é oculto, o prazo só começa a correr a partir
do momento em que ficar evidenciado o problema.

16
NERY JUNIOR, Nelson. Código de Defesa do Consumidor comentado. Rio de Janeiro: Forense, p. 553-554.

Direito do Consumidor
27

Neste ponto, sem sombra de dúvida, enfrentará a Justiça certa dificuldade para verificar
se o vício é de qualidade ou decorrente do desgaste normal do produto, principalmente
quando o vício se apresentar muito tempo depois de sua aquisição. Um produto, embora
antigo, pode estar bem conservado, servir ao fim a que se destina, e apresentar um vício
que comprometa sua utilização. Se ficar demonstrado que é um vício de qualidade,
decorrente da fabricação, e não decorrente do desgaste normal, não haverá motivo para
negar-se ao consumidor o direito à reparação.

No entanto, se o vício oculto se exteriorizar quando o produto estiver na fase de


degradação do consumo, não pode o fornecedor ser compelido a resolver o problema.
Atentando-se para a vida útil do produto, ter-se-á que apurar, em cada caso,
normalmente através de perícia, qual a verdadeira motivação do vício. Em princípio,
quanto mais distante estiver o produto ou serviço do final da sua vida útil, maior será a
possibilidade de se tratar de um vício de qualidade, devendo, então, ser sanado.

Em resumo: quando o bem for novo, haverá uma presunção relativa de que o vício é de
origem. Quando o bem não for novo, deve-se atentar para a vida útil do produto ou
serviço, e a prova da anterioridade do vício deve ser feita, via de regra, mediante perícia.

4.2.2 Composição Indenizatória


Talvez possamos começar afirmando que a indenização por danos morais é chamada de
indenização compensatória, pois não busca restaurar – o que seria impossível – o estado
anterior ao dano, busca apenas compensar o dano sofrido pela vítima.

Dizemos isso porque a indenização relativa ao dano material é ressarcitória ou


reparatória. Faz voltar ao estágio anterior ao dano. Se um ferro elétrico comprado pelo
consumidor causa danos às roupas, o dano é, em princípio, puramente material. É
possível voltar à situação existente anteriormente ao dano, seja através da entrega, pelo
fornecedor, de roupas semelhantes, seja indenizando o consumidor através do
equivalente monetário.

Essa volta à situação anterior (status quo ante), no entanto, é impossível nos danos
morais. Se um carro, em virtude de defeito no sistema de freios causa um acidente e o
consumidor vem a perder a visão, como fazer voltar à situação anterior? Em casos como
esse, a indenização será compensatória, pois terá lugar para compensar a dor da vítima,
sua humilhação, a perda de um projeto de vida, da honra, enfim, qualquer dano
suficientemente grave que possa ser tido, à luz das circunstâncias, como dano moral.

Há que se ressaltar também que o Código proibiu o tarifamento para a reparação de


danos, quer sejam materiais, quer sejam morais. A indenização por danos materiais há
que ser tal que possibilite, como visto, a reabilitação integral do dano (dano emergente 17
e/ou dos lucros cessantes 18).

17
Perda patrimonial efetivamente já ocorrida.
18
Compreendem tudo aquilo que o lesado deixou de auferir como renda líquida, em virtude do dano.

Direito do Consumidor
28

No que respeita aos danos morais 19, tendo em vista suas características e o modo pelo
qual o quantum deve ser fixado (arbitrado pelo juízo, levando-se em consideração o
caráter satisfativo e o caráter punitivo/pedagógico), não há sequer como falar em
tarifamento.

O STF explicitou a tese ao consignar: “a necessária correlação entre o caráter punitivo da


obrigação de indenizar e a natureza compensatória para a vítima” (STF, Rel. Min. Celso
de Mello, Agravo de Instrumento n° 455.846).

19
É aquele que afeta a paz interior da pessoa lesada; atinge seu sentimento, o decoro, o ego, a honra,
enfim, tudo aquilo que não tem valor econômico mas causa dor e sofrimento. É, pois, a dor física e/ou
psicológica sentida pelo indivíduo lesado.

Direito do Consumidor
29

5. INSTITUTOS E INSTRUMENTOS DA DEFESA DO


CONSUMIDOR

5.1 Responsabilidade Objetiva


A regra basilar da responsabilidade civil, no direito privado, é a responsabilidade com
culpa, derivada de ilícito extracontratual, também chamada aquiliana. Por ela, todo
aquele que causar dano a outrem, por dolo ou culpa, está obrigado a repará- lo.

Tal regra, aplicada eficazmente no campo das relações civis, mostrou-se inadequada no
trato das relações de consumo, quer pela dificuldade intransponível na demonstração de
culpa do fornecedor, titular do controle dos meios de produção e do acesso aos
elementos de prova, quer pela inviabilidade de acionar o vendedor ou prestador de
serviço, que, só em infindável cadeia de regresso, poderia responsabilizar o fornecedor
originário, quer pelo fato de terceiros, vítimas do mesmo evento, não se beneficiariam da
reparação.

Consagrou o CDC, de forma incisiva e clara, que o fornecedor responde,


independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados por
defeitos ou insuficiência e inadequação, em relação aos produtos e serviços que colocou
no mercado (arts. 12 e 14).

Consagrada a responsabilidade objetiva do fornecedor, não se perquire a existência de


culpa; sua ocorrência é irrelevante e sua verificação desnecessária, pois não há
interferência na responsabilização. Para a reparação de danos basta a demonstração do
evento danoso, do nexo causal e do dano ressarcível e sua extensão.

Tal não significará, no entanto, o aniquilamento da responsabilidade com culpa, que


continuará regulando a extensa gama de outras reparações na esfera civil, mas não terá
aplicação nas reparações decorrentes das relações de consumo, para as quais a
responsabilização objetiva mostrou-se mais eficiente e adequada.

5.2 Pressupostos da Responsabilidade


Superada a questão da verificação da culpa, já que o CDC adotou expressamente a
responsabilidade objetiva, temos que três pressupostos informam a responsabilização
pelo fato do produto e do serviço:
a) Evento danoso – o dano é, sem dúvida, o vilão da responsabilidade civil. Não há
que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houver dano. Pode
haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem
dano. Ou seja, o dano constitui elemento preponderante da responsabilidade
objetiva;
b) Nexo Causal – para que emerja a obrigação de reparar danos é necessário que
exista uma relação de causa e efeito entre a ação do fornecedor de colocação no
mercado de produto ou serviço potencialmente danoso e o dano verificado. Ou
seja, entre este e um defeito que possa ser atribuído ao fabricante;

Direito do Consumidor
30

c) Dano Ressarcível – é o prejuízo causado ao consumidor. Abrange o dano


emergente, considerando-se tal os prejuízos efetivos, diretos e imediatos e os
lucros cessantes, assim entendidos os que podiam ser previsíveis na data da
infração.

5.3 Responsabilidade do Profissional Liberal


A regra geral da responsabilidade objetiva do fornecedor pelo fato do produto ou serviço
contém uma exceção quanto à responsabilidade dos profissionais liberais, que se
estabelece somente após a verificação de culpa (art. 14, 4º).

O médico, o advogado, o dentista compõem espécies de profissionais liberais. Nas


relações de consumo, ao contratarem com seus clientes, não se comprometem a um
resultado. Inobstante a cura da doença, a vitória na causa, a solução do problema
dentário sejam as pretensões finais, os profissionais liberais não se comprometem, na
área contratual, por alcançar tais resultados porque estes, por maior talento que
possuam, normalmente fogem ao seu controle. O compromisso deles é quanto às
técnicas usadas na prestação do serviço e às diligências regulares exercidas. Em outras
palavras, tais profissionais se comprometem pela obrigação de meio.

Assim sendo, para que haja responsabilização do profissional liberal, necessário que se
verifique sua conduta culposa, ou seja, imprescindível que o fornecedor profissional
liberal tenha agido com culpa, em uma de suas modalidades: negligência, imprudência
ou imperícia.

5.4 Responsabilidade Solidária


Na hipótese de um determinado produto ter mais de um fabricante – pondera o douto
Herman Benjamin -, um de matéria-prima, outro de componente e outro de produto
final, todos são solidariamente responsáveis pelo defeito e por suas consequências. Na
medida em que cada um desses agentes econômicos é responsável pelo dever de
segurança, não lhes sendo cabível alegar ignorância do vício ou, mesmo, carência de
culpa, são todos chamados a responder solidariamente pela colocação do produto
defeituoso no mercado 20.

Como aquele que paga a indenização nem sempre é o único causador do dano, o CDC
assegura o direito de regresso para aquele(s) fornecedor(es) que estiver(em)
inconformado(s) com o pagamento feito. É uma consequência natural da solidariedade
passiva que se opera em favor do devedor que paga a dívida dos outros.

Deve ser ressaltado que o Código, na parte final de seu art. 88, veda a denunciação da
lide, de sorte que o direito de regresso deverá ser exercido em ação autônoma ou nos
próprios autos da indenização consumerista, uma vez findo aquele processo.

20
BENJAMIN, Antônio Herman. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo, Savaiva, 1991, p.
56.

Direito do Consumidor
31

5.5 Responsabilidade do Comerciante


Estando perfeitamente individualizada a responsabilidade do fornecedor pela colocação
do produto ou serviço no mercado de consumo, não há que se falar em responsabilidade
do comerciante, a pessoa ou empresa que vendeu ou fez a entrega do produto ao
consumidor, porque ela, no quadro apresentado, nenhuma interferência tem em relação
aos aspectos intrínsecos de produtos ou serviços que comercializa, já que os recebe
embalados e sem possibilidade de testá-los ou de detectar eventuais defeitos ocultos. Só
por essa razão está justificada a exclusão do comerciante da cadeia de responsabilidade.

Tal exclusão, no entanto, não é absoluta, em virtude de que em determinadas situações,


previstas legislativamente, o comerciante é igualmente responsável e passa a integrar a
cadeia de responsabilidade. Isso ocorre quando o fabricante, o construtor, o produtor ou
o importador não puderem ser identificados (art. 13, I); quando o produto for fornecido
sem identificação clara de seu fabricante, produtor, construtor ou importador (art. 13,
II); e, por fim, quando não conservar adequadamente os produtos perecíveis (art. 13,
III), hipóteses em que assume solidariamente a responsabilidade pela colocação do
produto no mercado e deverá arcar com as consequências jurídicas correspondentes.

5.6 Excludentes da Responsabilidade


Algumas situações excluem a responsabilidade do fornecedor (art. 12, 3º):
a) quando o fornecedor provar que não colocou o produto no mercado (inciso I). A
responsabilização deverá incidir sobre o real fornecedor ou sobre quem tenha
verdadeiramente colocado o produto ou serviço no mercado, visto que a
responsabilidade decorre exatamente dessa ação.
b) quando o defeito inexiste (inciso II). Aqui o fornecedor é responsável pela
colocação do produto ou serviço no mercado; o dano também existe, mas não
existe o defeito apontado. Logo, se os danos não decorrem do defeito, não há
obrigação de indenizar.
c) quando ocorre culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (inciso III). Deixa
de existir a relação de causa e efeito entre o defeito do produto ou serviço e o
dano experimentado. Ocorre a culpa exclusiva do consumidor, por exemplo, nas
seguintes hipóteses: a) inobstante as instruções ou advertências, o consumidor
(ou usuário) emprega o produto de maneira inadequada, ou dele faz uso a
pessoa a quem a mercadoria é contra indicada; ou b) à revelia do prazo de
validade, o produto é utilizado ou consumidor. Atente-se, no entanto, que só a
culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro exclui a responsabilidade do
fornecedor. A culpa concorrente (ou seja, ambos, consumidor e fornecedor,
contribuem para o evento danoso) não exclui a responsabilidade do fornecedor,
apenas conduz a uma redução do quantum indenizatório, como admitido pela
jurisprudência 21.
d) caso fortuito ou força maior. Apesar de não previstas expressamente no CDC,
ambas as hipóteses possuem força liberatória e excluem a responsabilidade do
fornecedor, porque também quebram a relação de causalidade entre o defeito do
produto e o dano causado.

21
“A culpa concorrente da vítima permite a redução da condenação imposta ao fornecedor” (STJ, REsp
287.849, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª Turma).

Direito do Consumidor
32

Também em relação à prestação de serviços ocorre a exclusão da responsabilidade pelo


fornecedor quando restar provado que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste (art.
14, 3º, I), ou que quando ocorrer culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art.
14, 3º, II). Apesar de não haver a expressa previsão do CDC, as hipóteses de não
execução do serviço, assim como as de caso fortuito ou força maior, também excluem a
responsabilidade do prestador dos serviços.

Alguns autores entendem que a força maior e o caso fortuito, por não terem sido
expressamente inseridos no rol das excludentes, não afastam a responsabilidade do
fornecedor. Entretanto, essa é uma maneira muito simplista de resolver o problema,
como também é aquela de dizer que o caso fortuito ou a força maior excluem a
responsabilidade do fornecedor porque essa é a regra geral do nosso Direito.

A distinção entre fortuito interno e fortuito externo é totalmente pertinente no que


respeita aos acidentes de consumo. O fortuito interno não exclui a responsabilidade do
fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento. O
mesmo não ocorre com o fortuito externo, assim entendido aquele fato que não guarda
nenhuma relação com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou
serviço.

5.7 Desconsideração da Personalidade Jurídica


O consumidor, muitas vezes, se vê prejudicado por não conseguir alcançar
patrimonialmente o verdadeiro causador do dano, encoberto sobre o manto da
personalidade jurídica. Em razão disso, o Código optou por adotar integralmente a teoria
da desconsideração da personalidade jurídica, ampliando-a (art. 28, § 2º ao 5º).

O efeito prático da adoção dessa teoria é que, ocorrendo um dos pressupostos do art. 28
– abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos
estatutos ou do contrato social, em detrimento do consumidor -, o juiz pode
desconsiderar a personalidade jurídica e responsabilizar civilmente o sócio- gerente, o
administrador, o sócio majoritário, o acionista controlador, etc. alcançando-lhes os
respectivos patrimônios pessoais. O mesmo procedimento é adotado quando ocorre
casos de falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade de pessoa jurídica
provocados por má administração.

O CDC foi além, consagrando no 5º do art. 28 22, cláusula normativa altamente


genérica, com o claro propósito de evitar que a autonomia patrimonial fosse, de algum
modo, erigida a obstáculo ao ressarcimento dos consumidores.

Fala-se, em doutrina, em “teoria menor da desconsideração”, cujos contornos foram


didaticamente delineados em acórdão do STJ:

22
revê o citado parágrafo: “Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua
personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores”.

Direito do Consumidor
33

“A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso ordenamento jurídico


excepcionalmente no Direito do Consumidor e no Direito Ambiental, incide com a mera
prova de insolvência da pessoa jurídica para o pagamento de suas obrigações,
independentemente da existência de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.
Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser
suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou
administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto
é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa
por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica. A aplicação da teoria
menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exagese autonomia
do 5º do art. 28 do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se subordina à
demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas a provar
de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores” (STJ, REsp 279.273, Rel. Min. Nacy Andrighi, 3ª Turma).

5.8 A Inversão do Ônus da Prova


Sabe-se que o consumidor, por força de sua situação de hipossuficiência e fragilidade, via
de regra, enfrentava grande dificuldade de realizar a prova de suas alegações contra o
fornecedor, principalmente sendo este o controlador dos meios de produção, com acesso
e disposição sobre os elementos de prova. Assim, a regra geral do art. 333, I do Código
de Processo Civil 23, representava obstáculo às pretensões judiciais dos consumidores,
reduzindo suas chances de vitória e premiando a irresponsabilidade do fornecedor.

Para inverter esse quadro desfavorável ao consumidor e assegurar efetiva proteção ao


consumidor, o legislador alterou, para as relações de consumo, a regra processual do
ônus da prova, entendendo que o fornecedor está em melhores condições de realizar a
prova de fatos relacionados à sua atividade.

Compreensivelmente, limitou-a a inversão às seguintes situações: quando houver


verossimilhança nas alegações 24, a critério do juiz e segundo as regras ordinárias de
experiência, ou quando houver comprovação da condição de hipossuficiência do
consumidor.

5.9 Foro Privilegiado


Merece destaque a norma do art. 101, inciso I, do CDC, que permite o ajuizamento da
ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos ou serviços no foro do
domicílio do consumidor autor.

O claro objetivo da norma é facilitar o acesso do consumidor à justiça, que pela regra do
Código de Processo Civil (foro do domicílio do réu) teria que acionar o fornecedor na
justiça de outro estado ou cidade muito distante.

23
“o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito”.
24
Verossímil é aquilo que é crível ou aceitável em face de uma realidade fática. Não se trata de prova robusta
ou definitiva, mas daquela decorrente de primeira aparência.

Direito do Consumidor
34

Por força do art. 101, inciso I (foro do domicílio do consumidor), a jurisprudência, da


primeira à mais elevada instância, não admite o foro de eleição nos contratos de
consumo quando este, de alguma forma, dificulte o acesso à justiça.

Merece transcrição, a título de exemplo, precedente do Superior Tribunal de Justiça no


Conflito de Competência nº 23.968-DF, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior:

“Conflito negativo de competência. Ação monitória. Mútuo concedido por entidade de


previdência complementar. Foro de eleição em Belo Horizonte. Contrato celebrado em
Brasília. Local de domicílio dos réus. Código de Defesa do Consumidor. Serviço.
Facilidade de Defesa.

Não prevalece o foro contratual de eleição, se configurada que tal indicação, longe de
constituir-se mera adesão a cláusula preestabelecida pela instituição mutuante, implicar
em dificultar a defesa da parte mais fraca, em face dos ônus que terá para acompanhar o
processo em local distante daquele em que reside e, também, onde foi celebrado o
mútuo”.

5.10 Direito de Arrependimento


No artigo 49 do CDC temos outro significativo instrumento de proteção do consumidor. É
o direito de arrependimento ali consagrado nos seguintes termos: “O consumidor pode
desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de
recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de
produtos ou serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por
telefone ou a domicílio”.

A finalidade da norma, como se depreende de sua clara redação, é proteger o


consumidor sempre que a compra se der fora do estabelecimento comercial. A referência
a telefone ou a domicílio contida no seu final é meramente exemplificativa, porquanto o
texto faz uso do advérbio especialmente. Estão, portanto, na abrangência da norma
todos os sistemas de vendas externas, como em domicílio mediante a visita do
vendedor; vendas por telemarketing ou por telefone; por correspondência – mala direta
ou carta-resposta; pela TV, internet ou qualquer outro meio eletrônico.

O sistema de vendas externas, mormente pela TV, internet ou telemarketing, é


altamente agressivo, atinge o consumidor em casa, no momento em que ele está mais
vulnerável, criando-lhe necessidade artificial sobre algo de que não precisa, tanto assim
que não saiu de casa para procurá-lo.

Essa é a principal razão do direito de arrependimento do consumidor. Conceder-lhe uma


oportunidade de refletir calmamente sobre a compra que fez premido pelas técnicas
agressivas de vendas fora do estabelecimento comercial. A lei confere o prazo de sete
dias para isso. É o chamado prazo de reflexão ou de arrependimento.

Nesse prazo, o consumidor pode desistir do contrato independentemente de qualquer


justificativa. A lei dá essa faculdade ao consumidor de desistir daquela compra feita por
impulso, efetuada sob forte influência de publicidade sem que o produto esteja sendo
visto de perto, concretamente, ou sem que o serviço possa ser bem examinado.

Direito do Consumidor
35

6. AS PRÁTICAS COMERCIAIS SOB A ÓTICA DO CDC

6.1 Oferta
A evolução das relações de consumo conduziu à necessidade de novo tratamento
atinente à oferta e publicidade. A escassa regulamentação pressupunha a igualdade das
partes e tinha presente o entendimento de que a oferta se dava entre pessoas
determinadas: proponente e aceitante. Fruto dessa insuficiência normativa e da
constatação de que a oferta nas relações de consumo poderia dar- se entre pessoas
indeterminadas, alcançando tanto o consumidor efetivo (aquele que atua adquirindo
produtos ou serviços), como o potencial (aquele que está propenso a consumir ou
exposto às práticas de consumo, como oferta, publicidade e práticas abusivas), verificou-
se que este último também merecia proteção especial da lei.

6.1.1 Requisitos da Oferta


Os requisitos da oferta estão elencados no art. 31. Sendo a oferta o momento
antecedente da conclusão do ato de consumo, deve ser precisa e transparente o
suficiente para que o consumidor, devidamente informado, possa exercer o seu direito de
livre escolha. Assim, as informações devem ser verdadeiras e corretas, guardando
correlação fática com as características do produto ou serviço, redigidas em linguagem
clara, lançadas em lugar e forma visíveis. Além disso, devem ser escritas em língua
portuguesa. Em caso de oferta por telefone ou reembolso postal há um requisito extra:
para possibilitar a responsabilização, o nome do fabricante e seu endereço deverão
constar obrigatoriamente da embalagem, publicidade e impressos utilizados na transação
comercial (art. 33).

6.1.2 Campo de Abrangência


A oferta é sempre feita pelo fornecedor, interessado na apresentação, lançamento,
divulgação ou venda de produto ou serviço. Além de responsável pela oferta que fizer
diretamente, o fornecedor é solidariamente responsável por aquela feita por seus
empregados, agentes e representantes, inclusive autônomos, que em nome dele atuarem
(art. 34).

No campo específico das relações de consumo, oferta é toda proposta de fornecimento de


produto ou serviço, mediante apresentação 25, informação 26 ou publicidade 27, que tem
como finalidade alcançar o consumidor como provável cliente. Desde que tenha por meta
atingir o consumidor, para municia-lo de informações, para atraí-lo ou para influenciá-lo,
será sempre oferta.

25
Por exemplo, vitrine.
26
Por exemplo, orçamento.
27
Por exemplo, anúncios nos meios de comunicação.

Direito do Consumidor
36

O simples fato de ofertar o produto ou serviço já obriga o fornecedor a cumprir o


ofertado. Completada a relação de consumo, com a aceitação do interessado, surge a
possibilidade, em caso de recusa, de cumprimento forçado da obrigação, nos termos da
oferta. A proteção ao consumidor potencial ocorre, preventivamente, mediante a
regulamentação das atividades de oferta e publicidade e coibição de condutas que
possam influir na decisão do interessado, induzindo-o a erro, e repressivamente, para
garantir-lhe o fornecimento segundo a oferta.

6.1.3 Regime de Responsabilização


A regra básica nesse tema é que aquele que oferta está obrigado a cumprir a obrigação
nos termos propostos. É o chamado princípio da vinculação, acolhido plenamente pelo
CDC (art. 30).

Da oferta, duas consequências derivam para o fornecedor: a) passa a integrar o contrato


e, b) obriga ao cumprimento da obrigação subjacente, porquanto a aceitação do
consumidor aperfeiçoou o círculo obrigacional e a relação de consumo.

Cumprida a oferta, estará satisfeita a obrigação. Recusando-se o fornecedor a


implementá-la ou dar-lhe cumprimento, restará ao consumidor exigir, na via amigável ou
judicial, o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou
publicidade, ou, alternativamente e à sua escolha, aceitar outro produto ou prestação de
serviço equivalente, com complementação do pagamento ou restituição da diferença, ou
ainda, rescindir o contrato, mediante a restituição de quantia eventualmente antecipada,
monetariamente atualizada, e composição de perdas e danos (art. 35, I a III).

6.2 Publicidade
O Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária define publicidade como “toda
atividade destinada a promover instituições, conceitos e ideias”. Na mesma linha é
conceituada pelo Decreto nº 57.690/66, como “qualquer forma remunerada de difusão
de ideias, mercadorias, produtos ou serviços que parte de um anunciante identificado”.

A publicidade deixou de ter papel meramente informativo para influir na vida do cidadão
de maneira tão profunda a ponto de mudar hábitos e ditar comportamento. Trata-se,
como se vê, de poderoso instrumento de influência do consumidor nas relações de
consumo, atuando nas fases de convencimento e decisão de consumir. O quadro assim
exposto revela aquilo que por todos é sabido: o consumidor é induzido a consumir,
bombardeado pela publicidade massiva que o cerca em todos os lugares e momento de
seu dia-a-dia. Como autômato, responde a esses estímulos, sem discernir corretamente.
Age pela emoção, embotado em seu juízo crítico.

Embora a oferta tenha sido regulamentada sucintamente no direito comum, a publicidade


não goza de qualquer disciplina nessa área, encontrando regulamentação esparsa em
outras áreas, como defesa econômica, propriedade industrial, relações trabalhistas e auto
regulamentação.

Direito do Consumidor
37

Revelada a insuficiência da disciplina sobre a matéria, impunha-se a preocupação


protetiva ao consumidor. Assim sendo, o legislador instituiu no CDC medidas
importantes: reprimiu a publicidade enganosa ou abusiva; ensejou a aplicação de
sanções administrativas, dentre as quais a contrapropaganda; propiciou a retirada do ar
de publicidade viciada, com o respectivo ressarcimento de danos, além de vincular o
fornecedor à oferta publicitária; criminalizou a conduta e criou mecanismos processuais,
melhorando o acesso à justiça.

6.2.1 Princípios Norteadores


O texto codificado permite que sejam extraídos os princípios norteadores da atividade
publicitária no seu relacionamento com o consumidor:
a) Princípio da identificação da publicidade (art. 36, caput): a veiculação deve
ser de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como
tal. O objetivo é coibir a publicidade clandestina, inclusive a subliminar.
b) Princípio da veracidade (art. 31): a publicidade deve ser honesta. Deve conter
uma apresentação verdadeira do produto ou serviço oferecido. Visa manter
informado o consumidor para assegurar-lhe a escolha livre e consciente.
Coíbe-se a publicidade enganosa.
c) Princípio da não-abusividade (art. 31, c/c 37, 2º): a publicidade deve
preservar valores éticos de nossa sociedade e não induzir o consumidor a
situação que lhe seja prejudicial. Colima-se afastar a publicidade abusiva.
d) Princípio da transparência na fundamentação (art. 36, parágrafo único): a
publicidade deve fundar-se em dados fáticos, técnicos e científicos que
comprovem a informação veiculada.
e) Princípio da obrigatoriedade do cumprimento (art. 30 e 35): a publicidade
integra o contrato que vier a ser celebrado e obriga o fornecedor a cumprir a
oferta veiculada. Veda-se o anúncio de mera atração de clientela. Também
chamado de princípio da vinculação contratual da publicidade.
f) Princípio da inversão do ônus da prova (art. 38): à constatação de que o
consumidor dificilmente tem condições técnicas e econômicas de provar os
desvios da atividade publicitária, incumbe ao patrocinador, beneficiário da
mensagem, o encargo da prova da veracidade e correção do que foi
veiculado. Harmoniza-se o princípio com o direito do consumidor de
facilitação de sua defesa.

6.2.2 Classificação
O CDC tratou de classificar e definir publicidade enganosa e abusiva, nestes termos:
a) É enganosa “qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo,
mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da
natureza, características, qualidade, quantidade, origem, preço e quaisquer
outros dados sobre produtos e serviços” (art. 37, 1º). Será publicidade
enganosa por omissão aquela que “deixar de informar sobre dado essencial
do produto ou serviço” ( 3º). Em ambos os casos, a publicidade enganosa
vicia a vontade do consumidor, que, iludido, acaba adquirindo produto ou
serviço em desconformidade com o pretendido. São exemplos: a utilização do

Direito do Consumidor
38

termo “liquidação” para causar impacto com o propósito de levar o


consumidor até o local da venda, o uso da palavra “grátis” para impor compra
como condicionamento de brinde, o uso de superlativos “melhor”, “nada
igual”, “único”, etc.
b) É abusiva a “publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à
violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de
julgamento e experiência de criança, desrespeita valores ambientais, ou que
seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou
perigosa à sua saúde ou segurança” (art. 37, 2º). Não chega a ser
mentirosa, mas é distorcida, desvirtuada dos padrões da publicidade
escorreita, viola valores éticos que a sociedade deve preservar. Além disso,
deturpa a vontade do consumidor, que pode, inclusive, ser induzido a
comportamento prejudicial ou perigoso à sua saúde e segurança.

6.3 Práticas Abusivas e Sua Vedação


Discutiu-se de início sobre a taxatividade ou não do rol do art. 39 que enumera as
práticas abusivas. Nos dias de hoje, no entanto, restou sem interesse tal discussão, em
face da Lei nº 8.884, de 13 de julho de 1994, que deu nova redação ao caput do art.
39. A expressão “dentre outras” inserida pela lei e o acréscimo de outras práticas
afastaram toda e qualquer dúvida ainda restante.

As práticas abusivas expressamente enumeradas pelo CDC são as seguintes:


a) “Vendas casadas”: é vedado condicionar o fornecimento de produto ou
serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa
causa, a limites quantitativos.
b) Recusa de fornecimento: colima-se impedir o intuito especulativo e a
discriminação, não se admitindo que, possuindo estoque, o fornecedor se
recuse a fornecer produtos ao interessado, de acordo com os usos e costumes
locais e na conformidade da oferta veiculada.
c) Remessa sem solicitação: a regra é o consumidor tomar a iniciativa de
adquirir produto ou serviço, com isso pretendendo preservá-lo de ser
importunado com a remessa de produtos não solicitados e do desconforto de
providenciar a devolução, quando não quiser adquiri-los. O fornecedor que
assim proceder não terá direito a pagamento, pois o serviço prestado ou
produto remetido ou entregue serão considerados amostras grátis.
d) Prevalecimento abusivo: busca impedir que o fornecedor inescrupuloso tire
proveito de fragilidade ou hipossuficiência de consumidor idoso ou menor,
doente, rude ou com reduzidas condições de discernimento, com isso
objetivando preservar os direitos à higidez física e patrimonial e de livre
escolha.
e) Vantagem excessiva: a ideia central é assegurar o equilíbrio contratual,
impedindo que o fornecedor, utilizando-se de sua condição de superioridade
econômica, cause prejuízo ao consumidor.
f) Execução de serviços sem orçamento: o regime codificado exige que o
fornecedor de serviços, antes de iniciar a respectiva execução, entregue ao
consumidor orçamento válido pelo prazo mínimo de dez dias – discriminando
o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamento a serem empregados,

Direito do Consumidor
39

as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos


serviços, estabelecendo que, uma vez aprovado, obriga o fornecedor ao seu
cumprimento (art. 40, § 1º e 2º). Objetiva-se moralizar a atividade, em face
dos costumeiros abusos até então ocorridos de lucro fácil no momento da
entrega do trabalho.
g) Repasse de informação depreciativa: o fornecedor está proibido de repassar
informação depreciativa acerca de ato praticado pelo consumidor no exercício
de seus direitos, como, por exemplo, a formulação nos órgãos de defesa ou
ajuizamento de demanda. O objetivo da vedação é evitar constrangimentos
ao consumidor, quando tiver que defender seus direitos, impedindo que o
fornecedor se utilize desse fato para denegrir a imagem daquele no meio
comercial e social.
h) Descumprimento de normas: quando o fornecedor está obrigado à
observância de normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes para
colocar produto ou serviço no mercado, não poderá fazê-lo em desacordo com
elas. Pretende-se, com essa providência, preservar a qualidade, a segurança
e a eficiência dos produtos e serviços colocados no mercado.
i) Recusa de venda de bens ou de prestação de serviços: busca impedir o
dispositivo que o fornecedor, com a recusa de fornecimento, cause problemas
ao consumidor e ao mercado de consumo, que poderá ficar temporariamente
desabastecido, bem como objetiva anular manobras especulativas, mormente
em datas próximas a aumento de preços (p. ex., combustíveis). É necessário
que o consumidor queira obter o fornecimento mediante pronto pagamento,
pois, do contrário, se a prazo ou parcelado, poderá justificar-se a recusa.
Também são ressalvados os casos de intermediação regulados em leis
especiais.
j) Elevação injustificada de preços: a justa causa poderá decorrer do aumento
de preços da matéria-prima, da correção substancial dos salários dos
empregados, ou outra causa que reflita no custo final do produto ou serviço.
O que não pode ocorrer é elevação sem justa causa, a depender
exclusivamente da vontade do fornecedor, pois isso significa prejuízo certo
para o consumidor e locupletamento ilícito para o fornecedor, situações que o
Código busca sempre coibir.
k) Aplicação de índice ou fórmula de reajuste: a norma veio embutida no bojo
da medida provisória 28 sobre mensalidades escolares, área em que mais
incidia a conduta que se buscou coibir. A vedação, no entanto, não se aplica
exclusivamente a essa área específica, mas a toda e qualquer relação de
consumo em que haja índice ou fórmula de reajuste estabelecida em lei ou
em contrato.
l) Abusos quanto aos prazos: ao contratar o fornecimento de produto ou
serviço, as partes devem convencionar prazos de entrega e o termo inicial da
execução dos serviços, o que proporciona maior segurança para os
contratantes e a possibilidade de sua execução forçada em caso de
descumprimento.

28
V. Medida Provisória nº 550, de 8 de julho de 1994

Direito do Consumidor
40

6.3.1 A Cobrança de Dívidas


Ainda no campo das práticas abusivas, o Código tratou, em seções autônomas, da
cobrança de dívidas e dos bancos de dados e cadastros de consumidores, justificando-se
o tratamento destacado em face da relevância atribuída aos temas e da importância de
regulamentá-los minuciosamente.

Ciente dos constantes abusos que se perpetravam nessa área, com ofensa à dignidade
do devedor, exposição a ridículo e utilização de práticas violentas como ameaças e
constrangimentos, o legislador procurou estabelecer um modo civilizado de se cobrar. A
lei impede apenas a cobrança abusiva. O consumidor pode sofrer constrangimentos
legais, como protesto do título, penhora, execução, falência etc. Além disso, pode ser
cobrado condignamente em seu trabalho, descanso ou lazer.

6.3.2 Os Bancos de Dados e Cadastros dos Consumidores


Atento aos inúmeros abusos cometidos nessa área, o legislador procurou coibir condutas
abusivas e regulamentar a matéria mediante o estabelecimento das seguintes regras:
a) Acesso: o consumidor tem acesso às informações sobre ele existentes em
cadastros, fichas, registros, bem como sobre dados pessoais e de consumo
arquivados (art. 43, caput).
b) Transparência: os cadastros e dados devem ser objetivos, claros, verdadeiros
e em linguagem de fácil compreensão e não podem conter códigos
indecifráveis, (art. 43, 1º, 1ª parte).
c) Retificação: conhecendo as informações a seu respeito, o consumidor poderá
exigir sua imediata correção, quando encontrar inexatidão em seus dados e
cadastros. Feita a correção, o arquivista, em cinco dias úteis, deverá
comunicá-la aos destinatários das informações incorretas, restabelecendo a
verdade (art. 43, 3º).
d) Comunicação: toda vez que for procedida abertura de cadastro, ficha, registro
e dados pessoais e de consumo, sem sua solicitação, o consumidor deve ser
obrigatoriamente comunicado por escrito, para que as confira, ratificando-as
ou retificando-as (art. 43, 2º).
e) Prescrição: prescrita a dívida, os Serviços de Proteção ao Crédito ficam
proibidos de fornecer quaisquer informações que possam impedir ou
dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores (art. 43, 5º). A
medida impede aplicação de pena em caráter perpétuo, vedada pela
Constituição Federal (art. 5º, XLVII, b).
f) Prazo: os bancos de dados não poderão conter informações negativas
referentes a período superior a cinco anos (art. 43, 1º, 2ª parte).

6.3.3 Regime de Responsabilização


Ao vedar ao fornecedor a conduta de práticas abusivas no fornecimento de produtos ou
serviços, o legislador impôs o dever de atuação em conformidade com a norma,
sancionando a violação.

Assim, no caso de descumprimento, no campo civil, o fornecedor poderá ser condenado a


indenizar danos materiais e morais causados ao consumidor.

Direito do Consumidor
41

A atuação do consumidor também poderá se dar de forma preventiva, buscando a


abstenção de conduta do fornecedor que lhe acarretará danos patrimoniais e/ou morais,
como, por exemplo, no caso de repasse de informação depreciativa.

As práticas abusivas constituem invariavelmente infração administrativa, sancionadas


com multa, interdição, cassação de licença, etc. (art. 39, c/c os arts. 41 e 55 e ss.), bem
como podem, paralelamente, caracterizar infração penal.

Direito do Consumidor
42

7. A PROTEÇÃO CONTRATUAL SOB A ÓTICA DO CDC


Nos últimos tempos, a produção em massa e a comercialização em grande escala
geraram a estandartização dos contratos para a colocação dos produtos e serviços no
mercado de consumo. Paralelamente, notou-se uma nova modalidade contratual
(contratos de adesão), onde o fornecedor estipulava previamente as cláusulas e
condições e praticamente as impunha ao consumidor-aderente. Tais cláusulas, na
verdade, não resultavam de um acordo de vontades das partes 29, mas sobretudo, se
destinavam a dar maior garantia possível ao fornecedor, em regra integrante de grandes
complexos industriais e comerciais. Em resumo: a superioridade econômica conduziu à
superioridade contratual.

A ocorrência de abusos conduziu à modificação da noção de contrato no direito


contemporâneo. Preocupado com a livre formação da vontade do consumidor e para
prevenir eventuais prejuízos decorrentes da contratação, o CDC instituiu regras para os
contratos nas relações de consumo. Além das normas gerais (arts. 46 a 50), tipificou e
sancionou as cláusulas abusivas (art. 51), dispôs sobre crédito, financiamento, compra e
venda, alienação fiduciária e consórcio (arts. 52 e 53), bem como conceituou contratos
de adesão e disciplinou seu regramento e controle (art. 53, c/c o art. 51, 4º).

7.1 A Nulidade das Cláusulas Abusivas


O regime codificado elencou as cláusulas contratuais abusivas. Após tipificá-las, o Código
sancionou-as de nulidade absoluta (art. 51, seus incisos e parágrafos), com as
decorrentes consequências jurídicas: tais cláusulas nunca terão eficácia; não
convalescem pela passagem do tempo, nem pelo fato de nunca terem sido alegadas pelo
interessado; podem ser pronunciadas de ofício pelo juiz, dispensando a arguição da
parte; não são supríveis e não produzem qualquer efeito jurídico, pois a declaração de
nulidade retroage à data da contratação.

7.2 Análise das Cláusulas Abusivas


Considerando-se sua relevância, e cientes do rol ser apenas exemplificativo, são as
principais cláusulas vedadas pelo CDC:
a) Cláusula de não indenizar (art. 51, I): na área contratual é sancionada, com
nulidade absoluta, cláusula desse teor, bem como a que implique renúncia ou
disposição de direitos. A não-vedação conduziria à irresponsabilidade do
fornecedor e à total desproteção do consumidor, que não encontraria meios
de ressarcir-se.
b) Impedimento de reembolso (art. 51, II): a restituição, outorgada como opção
ao consumidor, deve ser respeitada, sob pena de desfalque a sua proteção
jurídica (art. 18, 1º, II; art. 19, IV, e art. 20, II).
c) Transferência de responsabilidade (art. 51, III): o CDC disciplinou
convenientemente e exaustivamente a questão da responsabilidade do
fornecedor pelo fato e pelo vício do produto ou serviço. Nessa ótica, não
poderia permitir que, mediante cláusula contratual, que essa responsabilidade

29
Princípio da autonomia da vontade (pacta sunt servanda).

Direito do Consumidor
43

fosse transferida a terceiros, burlando o sistema protetivo e dificultando o


ressarcimento.
d) Cláusulas iníquas, abusivas e exageradas (art. 51, IV): objetivando preservar
a dignidade do consumidor e o equilíbrio contratual, a lei vedou cláusulas
iníquas (perversas, injustas, cruéis, contrárias à equidade) e abusivas (que
desrespeitam valores éticos da sociedade), que sejam incompatíveis com a
boa-fé ou a equidade ou que coloque o consumidor em desvantagem
exagerada.
e) Ônus da prova (art. 51, VI): para dar efetividade e impedir subversão ao
sistema, proibiu-se o ajuste de cláusula estabelecendo a inversão do ônus da
prova em favor do fornecedor e, consequentemente, em prejuízo do
consumidor.
f) Arbitragem (art. 51, VII): o recurso á arbitragem, na via judicial é faculdade
das partes. Ninguém é obrigado a submeter-se ao juízo arbitral se assim não
desejar. A superioridade econômica do fornecedor não pode transformar em
obrigatório aquilo que é facultativo para as partes; permitir o contrário seria
deixar o consumidor entregue à própria sorte.
g) Imposição de representante (art. 51, VIII): fugirá à normalidade e beirará as
raias do abuso e da fraude, a imposição pelo fornecedor de representante
para concluir ou realizar negócio jurídico em nome do consumidor, que
restará vulnerável e submetido ao poder econômico daquele.
h) Inversão de papéis (art. 51, IX): como regra, compete ao consumidor
concluir ou não o contrato, assumindo as obrigações dele decorrentes. Resta
evidente que o consumidor poderá ser imensamente prejudicado se a
conclusão do negócio não depender dele.
i) Variação unilateral de preço (art. 51, X): a via normal é a fixação, por
consenso das partes, do preço contratado para o produto ou serviço. Permitir
que o fornecedor, de maneira unilateral, fixe tal valor, prestigiaria sua
superioridade econômica em detrimento da hipossuficiência do consumidor.
j) Cancelamento unilateral do contrato (art. 51, XI): após celebrado, o contrato
deve ser cumprido pelos contratantes. Não se concebe que o fornecedor goze
da faculdade de cancelar o contrato unilateralmente, sem outorgar direito
idêntico ao consumidor, o que denotaria, sem dúvida, uma superioridade
contratual do fornecedor.
k) Ressarcimento de custos (art. 51, XII): o CDC veda ao fornecedor cláusulas
que instituam o ressarcimento dos custos de cobrança da obrigação, sem que
igual direito seja conferido ao consumidor.
l) Modificação unilateral do contrato (art. 51, XIII): após sua celebração, o
contrato não pode ser modificado unilateralmente pelo fornecedor. Exige-se
que o consumidor concorde para que a alteração se realize.
m) Violação de normas ambientais (art. 51, XIV): aqui a preocupação não é com
o consumidor, porém com o meio ambiente. Exige-se que tanto fornecedor,
quanto consumidor estipulem cláusulas que violem a legislação protetiva ao
meio ambiente.
n) Desconformidade com o sistema protetivo (art. 51, XV): as normas
consumeristas são de ordem pública e, portanto, imperativas. O legislador,
em caráter geral, achou por bem instituir uma vedação mais ampla, apesar
de já haver a vedação específica de algumas cláusulas contratuais.

Direito do Consumidor
44

o) Benfeitorias necessárias (art. 51, XVI): após conceituar como necessárias as


benfeitorias que têm por fim conservar a coisa ou evitar que se deteriore, a
lei civil assegura ao possuidor de boa-fé o direito à indenização e o direito de
retenção pelo respectivo valor. Em face da constatação de que era comum o
senhorio, ao contratar a locação, burlar tal dispositivo, sob o manto da
renúncia do direito da indenização, procurou a lei obstar tal conduta,
impedindo a clausulação permissiva.
p) Multa de mora e liquidação antecipada (art. 52, § 1º e 2º, com nova
redação 30): o Código estatui que a multa de mora não será superior a 2% do
valor da prestação (anteriormente o percentual era de 10%) e que o
consumidor poderá liquidar antecipadamente o débito, com redução
proporcional dos juros e demais acréscimos. Será abusiva a cláusula que
impeça ou imponha percentual superior ao limite legal. Além da violação
específica, há violação ao sistema protetivo (art. 51, XV).

7.3 Regime de Responsabilização


O objetivo do CDC é o adimplemento do contrato pelas partes contratantes. Nem a
nulidade de cláusula, em princípio, tem o poder de afetar todo o conteúdo do contrato. A
interpretação das cláusulas e das circunstâncias que envolveram o negócio deve ter
como objetivo salvar o contrato, ou seja, permitir que se cumpra o seu objeto. Só
excepcionalmente, autoriza-se sua revisão ou resolução, quando apesar dos esforços de
integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes (art. 51, 2º, c/c o art. 6º,
V).

Em caso de não cumprimento do contrato, o fornecedor pode ser compelido a fazê-lo


mediante execução específica, respondendo por perdas e danos, patrimoniais e morais
(art. 6º, VI, 35, I, e 84, 1º). O mesmo ocorre na hipótese de não cumprimento do pré-
contrato, quais sejam, recibos e escritos (art. 84).

Esta apostila contém trechos extraídos dos livros: Programa de direito do consumidor,
de Sergio Cavalieri Filho; e Manual de direito do consumidor, de Felipe Peixoto Braga
Netto.

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Redação dada pela Lei nº 9.298, de 1-8-1996.

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8. MATERIAL COMPLEMENTAR
VAMOS TREINAR UM POUQUINHO????

TEMA: VÍCIO DO PRODUTO


Marcos Pereira adquiriu 11 peças mobiliárias de cana da índia. Alguns meses após, foi
apurado, por técnico qualificado, que um dos móveis estava afetado por parasitas, razão
pela qual o consumidor buscou obter a devolução do dinheiro, não obstante a empresa
fornecedora tivesse se prontificado a substituir a peça viciada.

Assiste razão ao consumidor, considerando a diligência da empresa fornecedora no


sentido de trocar a mencionada peça mobiliária?

TEMA: RELAÇÃO DE CONSUMO


Durante um voo do Rio de Janeiro para Paris, a Sra. Daniele, uma das passageiras da
Classe Executiva começa a sentir fortes dores de cabeça e queixa-se à comissária. Esta
última solicita que, caso haja algum médico a bordo, atenda à passageira.

O Dr. Rui, renomado pediatra, atende a Sra. Daniele e constata que sua pressão arterial
está bastante elevada. Como não há nenhuma medicação específica a bordo, Dr. Rui
decide medicar a passageira com um ansiolítico de seu uso pessoal. Cerca de uma hora
depois do atendimento, a passageira vem a falecer.

Pergunta-se:
Existe relação de consumo, entre Dr. Rui e Daniele, no caso narrado? Justifique.

TEMA: DEFEITO DO PRODUTO


Identificando graves defeitos na construção, a defesa civil interditou o Prédio Cruzeiro, o
que acarretou abalo financeiro e psicológico a seus moradores.

Indignados, os moradores ajuizaram ação indenizatória em face da Construtora, da


Incorporadora e, ainda, em face do Diretor Presidente das empresas responsáveis pelo
empreendimento imobiliário, pleiteando danos morais e materiais, estes correspondentes
à desvalorização do imóvel e também ao montante correspondente ao aluguel de um
imóvel similar durante o período de interdição do prédio.

Em contestação, a Construtora sustenta que não firmou qualquer contrato com os


autores, alegando que somente faz parte do mesmo grupo econômico da empresa
incorporadora.

A Incorporadora alega que o evento ocorreu em consequência de fato fortuito, uma vez
que os defeitos de construção decorreram de erros no cálculo estrutural realizado pelo
engenheiro contratado.

Por fim, o Diretor sustenta que as empresas possuem personalidade jurídica própria,
postulando sua exclusão do polo passivo da ação.
Decida a questão fundamentadamente.

Direito do Consumidor
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ESTUDOS DE CASO

1) Maristela foi à loja “Compre Aqui” e adquiriu um novo aparelho de som, cujo
fabricante não conseguiu identificar, para presentear Juliana e Pedro por seu 5º
aniversário de casamento. Estes, ao utilizar o novo equipamento, pela primeira
vez, verificaram que o mesmo não estava reproduzindo o som de forma
adequada.

Analise o caso e responda:


a) Trata-se de vício ou defeito? Fundamente.
b) Quem é o responsável por solucionar o problema ocorrido? Por quê?
c) Quem poderá reclamar pelo problema ocorrido? Fundamente.

2) Marcos propôs ação ordinária em face do Hotel Fazenda Lumiar Ltda., em que
pleiteia indenização por danos sofridos em razão de acidente que lhe causou
tetraplegia.

Alega que contratou um pacote de férias com a Ré e, na 1ª noite da


hospedagem, foi nadar em uma das piscinas do hotel, ocasião em que bateu
violentamente com a cabeça no piso da piscina, que estava parcialmente vazia.
Expõe que não havia qualquer aviso, nem mesmo um obstáculo ou cobertura
que impedisse o acesso dos hóspedes ao local.

Em contestação, o Hotel assevera que o Autor ingeriu bebidas alcoólicas, e que,


por volta das 3 h, resolveu usar a piscina do hotel, na qual já se banhavam
alguns de seus amigos, sem o cuidado de verificar as condições da mesma, que
possui 1,10m de profundidade. Alegou, ainda, que Marcos utilizou um
escorregador para crianças e que a piscina tinha horário de funcionamento até
às 20 h.

Decida a questão. Não se esqueça de discutir a Teoria do Risco Criado.

3) A indústria farmacêutica Cobras & Lagartos, fabricante de um produto


farmacêutico para bronquite, tipo “bombinha”, produziu e colocou tal produto no
mercado. Todavia, um lote contendo 1.000 unidades foi produzido com um
problema na válvula do spray, que, ao ser acionada, destacava-se do inalador.
Sendo de pequeno porte, poderia ser ingerida pelo usuário do remédio.

Após a identificação do problema, a Cobras & Lagartos realizou um recall, mas


poucos consumidores atenderam ao seu chamado para efetivar a troca do
produto.

Com base na Teoria do Risco Criado, analise o caso e responda:


a) Acertou a empresa Cobras & Lagartos ao realizar o recall? Fundamente.
b) Admita a possibilidade de um consumidor ter sabido do ocorrido e da
medida tomada pela empresa, mas, descuidadamente, utilizou o produto.
Ocorrendo o defeito e ele vindo a falecer, a empresa será responsável?
Por quê?

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4) O hospital Todos os Santos recebe um paciente para tratamento de hemodiálise.


O médico especialista recepciona o paciente, leva-o até a sala adequada e
coloca-o no aparelho apropriado ao tratamento.

O médico sai da sala e, no corredor, encontra um antigo colega que o convida


para tomar um café. Passado certo tempo, o médico lembra-se que o paciente
está no aparelho. Corre até a sala. Por azar, o aparelho havia apresentado
defeito. Como não havia ninguém na sala, o problema com o aparelho acabou
ocasionado a morte do paciente.

Levando-se em conta que a família do paciente deseja acionar o(s)


responsável(is) pelo acidente, discuta se a responsabilidade que irá fundamentar
a ação será objetiva ou subjetiva (explicando todas as razões e possibilidades de
sua análise).

Identifique também qual o prazo determinado na lei para que seja proposta a
referida ação.

5) Jonas e seus amigos foram jantar em um famoso e badalado restaurante da


cidade. Uma vez que a fila de espera era grande, foram oferecidos, como
cortesia, canapés de camarão. No dia seguinte, todos eles passaram mal e foram
internados com intoxicação alimentar. Foi constatado, por laudo técnico, que os
canapés estavam deteriorados e impróprios para consumo.

Defendendo-se, o restaurante disse que adquiriu os canapés da empresa “X”,


apesar de não haver nenhuma indicação na embalagem dos canapés apontando
essa empresa como fabricante. Além disso, alegou não haver relação de
consumo, uma vez que os canapés foram cortesia da casa.

Analise o caso e responda:


a) Há relação de consumo, ainda que gratuitos os canapés? Por quê?
b) Trata-se de vício ou defeito do produto? Explique.
c) De quem é a responsabilidade: do fabricante dos canapés e/ou do
restaurante (comerciante)? Explique.

6) Alfa Produção de Eventos Ltda., com base no Código de Defesa do Consumidor,


propôs ação ordinária em face de empresa de telefonia, pretendendo receber
indenização por danos materiais e morais, porque alega ter sofrido perdas em
decorrência do incêndio na central telefônica da Ré, ficando sem poder operar
seus telefones por aproximadamente 15 dias, o que lhe causou cancelamento
de diversos contratos com consequente perda financeira e abalo de seu bom
nome no mercado.

Em contestação, alega a Ré que o incêndio decorreu de caso fortuito e que não


houve abalo ao bom nome da Autora. Argumenta, ainda, que não se aplica a Lei
8.078/90 (CDC), visto que a Autora, por ser pessoa jurídica, não é consumidora.

O laudo pericial constatou que o incêndio decorreu de um fenômeno físico

Direito do Consumidor
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conhecido como “efeito Joule”, resultante de uma falha de operação de


equipamentos adquiridos e mantidos em funcionamento pela Ré.

Admitindo-se como verdadeiros e comprovados os fatos alegados, decida a


questão.

7) Um avião carregado de passageiros, ao decolar do Aeroporto de Congonhas,


sofre pane e cai sobre uma série de casas que ficam ali perto. Todos os
passageiros e tripulação morrem, além de três pessoas que estavam nas casas.
Houve estragos de monta em automóveis estacionados e nos prédios
residenciais e comerciais sobre os quais o avião caiu.

Responda:
a) As pessoas atingidas em terra, na sua integridade física, moral e
patrimonial, podem pleitear indenizações com base no CDC? Explique.

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