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Retrospectiva

2010

Uma publicação da Aver Editora - Dezembro de 2010 - Ano II - Nº 23 R$ 5,00

As entrevistas que marcaram o ano


Fernando Eiras, Lucélia Santos, Totia Meireles, Leona Cavalli, Edwin Luisi e Barbara Heliodora

fotos: Divulgação

Formação
Como nasce um diretor
Reportagem de teatro?
Arquivo Miroel Silveira, da Pág. 4
USP, reúne mais de seis mil
peças originais
Págs. 16 e 17

Momento
Saiba por que
“Vestido de Noiva” Multimídia História
revolucionou o As criações A origem do
Teatro Brasileiro coletivas do termo “merda”
Págs. 14 e 15 Drama Diário no camarim
Pág. 10 Pág. 11
02 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

editorial sumário

Bob Sousa
Momentos de 2010
Nem sempre melhores, mas sempre importantes. Quando me pediram
para selecionar algumas matérias para uma edição de retrospectiva do
ano teatral registrado no Jornal de Teatro uma lista gigantesca surgiu.
Como escolher entre as matérias que apresentavam momentos históricos,
por exemplo, qual foi mais decisivo para o país? Qual seria a entrevista
mais significativa dentre tantos e tão diferentes profissionais?
21
história
Os primeiros passos do teatro em Brasília

Como bons artistas que defendem a sua obra, também é preciso reconhe-
cer alguns tropeços. Uma palavra que foi mal editada ou uma pauta que 3 Prêmios
Vencedores do Shell temporada 2009/2010
não deu muito certo. Olhando edições passadas vimos nossos momentos.
“Nem sempre melhores, mas sempre importantes”. Alguns companheiros
da equipe já não estão conosco e outros renovam a energia na redação. E
4 formação
Como nasce um diretor de teatro?

o respeito aos “que dedicam sua vida à paixão e a humanidade existentes


nestes metros de tablado” - como diz Paulo Autran em “Liberdade, Liber- 5 Marketing cultural
Enciclopédia Itaú Cultural de Teatro
dade” - permanece e se fortifica a cada novo fechamento.
6 entrevistas
Fernando Eiras, Edwin Luisi, Totia Meireles, Lucélia Santos e
Terminamos o ano com muita expectativa para o próximo. Novos palcos, Barbara Heliodora
encontros e uma sensação de que a cortina está quase abrindo. Aquele
frio da barriga do terceiro sinal, aquela insegurança vital. Isso por que 10 multimídia
Criação dramatúrgica no Drama Diário
novas perspectivas do Jornal de Teatro nos possibilitarão, no próximo ano,
extrapolar os limites quadrados e geográficos do papel jornal. Enfim, diva-
gações para um outro momento.
11 História
As diferentes origens para a saudação dos camarins

É hora de agradecer aos colaboradores e à fontes que estiveram conos- 14 momento


“Vestido de Noiva” : Um marco no teatro brasileiro
co durante este ano. Entre nossos melhores momentos elencados nesta
edição estão as entrevistas com os atores Fernando Eiras, Lucélia Santos, 16 Reportagem
Anotações originais dos censores à disposição do público
Totia Meireles, Leona Cavalli e Edwin Luisi – além da crítica e pesquisa-
dora Barbara Heliodora. Contrapondo tradição e modernidade estão as
matérias sobre os primeiros passos do teatro em Brasília e uma nova e
18 Técnica
Audiodescritores democratizam o teatro

brilhante safra de dramaturgos cariocas que mantém o site Drama Diá-


rio. Se “Vestido de Noiva” foi a primeira peça brasileira com o registro de 19 Vida e Obra
A genialidade e maestria de Eugenio Kusnet
um diretor encenador, hoje escolas formam estes profissionais das mais
variadas formas. 20 Política Cultural
Medidas do congresso que interessam à classe artística

Para fechar, desejamos a todos muita merda em 2011! E se esse desejo


não lhe pareceu muito natural, confira a matéria da página 11.
22 História
A ousadia dos profissionais de teleteatro

Rodrigoh Bueno, editor do Jornal de Teatro 23 grand finale


Confira a galeria de fotos das melhores festas da cena

Redação Brasília: SCS - Quadra 02 - Bloco D


Brasília - Sérgio Nery Correspondência: Edifício Oscar Niemeyer - sala 1101 -
Presidente: Cláudio Magnavita Castro Redação São Paulo: Rua da Consolação, 1992 - 10º Brasília-DF. CEP: 70316-900 -
magnavita@avereditora.com.br Presidente: Cláudio Magnavita Porto Alegre - Adriana Machado andar - CEP: 01302-000 - São Paulo (SP) - Fone/FAX: Tel.: (61) 3327-1449
Vice-presidentes: (11) 3257.0577
Helcio Estrella Diretores: Anderson Espinosa Redação Porto Alegre: Avenida Borges de
Florianópolis - Adoniran Peres
helcio@avereditora.com.br
Medeiros, 410 - sala 916 - Centro -
Anderson Espinosa
a.espinosa@avereditora.com.br Redação: Rodrigo Figueiredo (editor-chefe) e E-mail Redação: redacao@jornaldeteatro.com.br www.jornaldeteatro.com.br Porto Alegre (RS). CEP: 90020-023. -
Publicações da Aver Editora: Rodrigoh Bueno (editor) Tel.: (51) 3231-3745 / 3061 3483
Jornal de Turismo - Aviação em Revista - JT Magazine - Editor de arte: Fabiano Spadari Redação Rio de Janeiro: Rua General Padilha, 134
SET - Próxima Viagem Rio de Janeiro - Felipe Neyemeier e Monica Turboli - São Cristóvão - Rio de Janeiro (RJ). CEP: 20920-390 - Redação Florianópolis:
Designer: Fernando Rodella Fone/Fax: (21) 2509-1675 Tel.: (48) 3024-3575 / 3024-3571
www.avereditora.com.br São Paulo - Fabiana Mattos e Pablo Ribera Barbery
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 03

prêmios

Shell premia os melhores do teatro


no Rio e em São Paulo por: Douglas de Barros, redação Rio de Janeiro

E
xatamente na noite em que
a cidade do Rio de Janeiro Vencedores no
foi atingida pela maior
tempestade dos últimos Rio de Janeiro
tempos (no último dia 5 de abril), o Música: Tim Rescala por “Miranda por Miranda”
Jockey Club, na Gávea, foi o palco do 22º Figurino: Rodrigo Cohen por “Farsa da boa
Prêmio Shell de Teatro, um dos mais preguiça”
esperados do ano para a classe teatral Iluminação: Paulo César Medeiros por “O
despertar da primavera”
brasileira. Com duas premiações, a peça
Cenário: Alberto Renault por “Dois irmãos”
“In on It” foi o destaque da cerimônia.
Ator: Fernando Eiras por “In on It”
A homenageada da noite foi a atriz Eva
Atriz: Beth Goulart por “Simplesmente eu,
Tudor, que foi aplaudida de pé por sua Clarice Lispector”
trajetória de 76 anos ininterruptos de Direção: Enrique Diaz por “In on It”
sucesso no cenário artístico brasileiro. Autor: Gustavo Gasparani e Eduardo Rieche por
“Este é um reconhecimento que resume “Oui oui... A França é aqui”
fotos Marcos Issa / Argosfoto

uma vida inteira de compensações”, Categoria especial: Claudio Botelho pela


comemorou Eva, ao ganhar o troféu. versão das músicas de “Avenida Q”
O prêmio de melhor atriz foi para Homenagem: Eva Tudor por sua trajetória no
Beth Goulart, por sua atuação em cenário artístico brasileiro.
“Simplesmente eu, Clarisse Lispector”. 
A atriz dedicou o prêmio à própria direção, concedido a Enrique Diaz, que é musical, Cláudio Botelho foi agraciado composto por nomes como o da atriz e
escritora a quem ela chamou de “sua não conseguiu chegar à premiação. na categoria especial pela versão das bailarina Fabiana Valor, o iluminador
musa inspiradora”. Em seu lugar, Fernando Eiras subiu músicas de “Avenida Q”, enquanto Jorginho de Carvalho, o diretor do
Já o prêmio de melhor ator ficou com ao palco para receber a honraria. Gustavo Gasparani e Eduardo Rieche grupo AfroReggae João Madeira, o
Fernando Eiras, conquistado pelo seu “Estamos aqui celebrando a vontade receberam o prêmio pela autoria de diretor e dramaturgo Sérgio Fonta e a
trabalho na montagem “In on it”. A que temos de fazer”, disse Eiras. “Oui oui... A França é aqui”. pesquisadora e professora de história
peça rendeu ainda o título de melhor Referência no Brasil quando o assunto O corpo de jurados no Rio de janeiro foi do teatro brasileiro Tania Brandão.

São Paulo consagra ‘Memória da Cana’


O
espetáculo “Memória da Cana” drade, pelo trabalho cenográfico Moreno contou com nenhum representante da São Jorge de Variedades pela pesquisa
foi duplamente condecorado havia conquistado o Shell pela primeira produção de seu espetáculo no evento, e criação do espetáculo “Quem não
na noite do dia 12 de abril, no vez por “Agreste” em 2004. “Esse prêmio foi mais uma vez eleita a melhor atriz sabe mais quem é, o que é e onde está,
Estação São Paulo, durante é uma de minhas inspirações para tra- por sua interpretação em “Viver sem precisa se mexer”.
a 22ª edição do Prêmio Shell de Teatro balhar até hoje”, declarou o diretor. tempos mortos” e o ator João Miguel, Em São Paulo, o desafio de selecionar
na capital paulista. A peça, que teve o O homenageado especial da noite também ausente na premiação, o que houve de melhor em 2009 ficou
maior número de indicações e foi uma paulistana foi o diretor, ator, ensaísta ganhou o troféu de melhor ator pelo com o jornalista e pesquisador do
das mais aplaudidas pelos presentes no e tradutor Fernando Peixoto. “É um trabalho em “Só”.   teatro Kil Abreu, com o jornalista
evento, levou o troféu em duas categorias: prazer muito grande receber esse Um dos destaques da noite foi o Valmir Santos, a dramaturga Marici
Direção e Cenário. reconhecimento pelo trabalho de tantos autor Rafael Primot que recebeu Salomão, o professor e pesquisador de
Para receber as estatuetas subiu ao anos”, declarou Peixoto após ter sido o reconhecimento por “O livro dos teatro Mario Bolognesi e com a atriz,
palco o diretor Newton Moreno, que foi aplaudido de pé pelo público presente. monstros guardados”. Na categoria dramaturga e diretora Noemi Marinho.
premiado ainda, ao lado de Marcelo An- Fernanda Montenegro, que não Especial, os jurados escolheram a Cia.
Referência no teatro nacional
O Prêmio Shell de Teatro foi criado em
Vencedores em São Paulo 1988 e se tornou uma das principais
Música: William Guedes por “Concerto de ispinho e fulô” premiações e ponto de referência no
Figurino: Wanda Sgarbi por “O capitão e a sereia” teatro brasileiro. Em cada edição do
Iluminação: Luiz Päetow por “Music hall” prêmio são divulgadas duas listas de
Cenário: Marcelo Andrade e Newton Moreno por “Memória da cana” indicados. Os espetáculos selecionados na
Ator: João Miguel por “Só” segunda fase estrearam entre os meses
Atriz: Fernanda Montenegro por “Viver sem tempos mortos” de julho e dezembro de 2009 e cumpriram
Direção: Newton Moreno por “Memória da cana” o número mínimo de 24 apresentações.
Autor: Rafael Primot por “O livro dos monstros guardados” Os ganhadores em cada categoria
Categoria especial: Cia. São Jorge de Variedades pela pesquisa
receberam uma escultura do artista
e criação do espetáculo “Quem não sabe mais quem é, o que é
plástico Domenico Calabroni, com a
e onde está, precisa se mexer”
forma de uma concha, inspirada na
Homenagem: Ao diretor, ator, ensaísta e tradutor Fernando
logomarca da Shell, e uma premiação
Peixoto pela contribuição ao teatro brasileiro.
individual de R$ 8 mil.
04 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

formação

Aprendendo uma direção


“... o que é desejável para a
formação de um diretor
na Alemanha não o é,
na mesma medida,
para um diretor
no Brasil...”
Por Adair de Oliveira,
redação de Brasília

D
foto: Divulgação

esde a Grécia antiga até o século XIX professor e coordenador de projetos da FADM. Antônio Araújo não acredita na ideia de curso ideal,
o teatro contou com dois protagonistas O modelo de aprendizado na SP Escola de Teatro “pois me parece que um curso é algo em contínuo pro-
responsáveis pelo processo cênico, a dra- baseia-se no artista-aprendiz. O curso de direção cesso de avaliação e de transformação. O que hoje fun-
maturgia e o ator. Oficialmente, no final trabalha durante dois anos quatro módulos diferentes ciona, talvez, daqui a dois ou três anos, já não funcione
do século XIX, a arte ganha mais outra assinatura com um operador e um tema cada. “Possibilitamos dar mais”. O pesquisador acrescenta ainda, “o que é desejá-
com a chegada do diretor ou encenador. A cena, antes instrumentos para que o artista-aprendiz faça a sua vel para a formação de um diretor na Alemanha não o
composta por uma dupla, agora começa a ser marcada própria opção. Ele irá passar tanto pelo processo cola- é, na mesma medida, para um diretor no Brasil. Porém,
por um trio. Para ajudar na formação deste “ator” o borativo em dramaturgia quanto numa direção mais para além da formação em direção, o curso precisa ter
russo Vsevolod Meyerhold, no ano de 1918, sistemati- individual. Com isso possibilitando o desenvolvimento sempre em mente que ele está formando um artista. E
zou o primeiro curso de direção teatral que compunha de um projeto estético pessoal percorrido durante dois esse questionamento – ininterrupto, a meu ver – sobre
as seguintes disciplinas: Técnicas da cena, História do anos, mas sempre envolvendo os outros cursos da esco- o sentido, a necessidade, o desejo, a ação do artista,
Teatro, Pintura, Música (disciplina fundamental do la,” completa Hugo Possolo, coordenador do curso. no aqui e agora, num determinado tempo histórico e
curso), Trabalho com o Ator e Dramaturgia. Na USP o aprendizado também ocorre por meio da contexto geográfico – especialmente no caso do teatro
“Meyerhold pretendia desenvolver uma formação graduação em Direção Teatral a partir de um eixo -, deveria ser um eixo norteador ou um dispositivo de
sistemática de encenadores, além do desejo de criar conceitual que consiste na formação de um diretor- provocação nos cursos de formação,” conclui.
uma nova disciplina, que ele denominou de cenologia pesquisador-pedagogo. “Numa perspectiva de trabalho Francis Wilker cita que o estudo acadêmico dessa
- estudo das leis da cena. Essa iniciativa inaugurou teórico-prático procuramos basear a aprendizagem na função é mais forte em alguns estados do Brasil, como
uma perspectiva pedagógica na formação de diretores investigação de procedimentos, linguagens e temas, São Paulo e Rio de Janeiro, porém, a discussão hoje
que veio a marcar tanto o teatro russo quanto os paí- em uma dinâmica que valoriza o processo de criação está bem mais ampla e pensar a prática desse profis-
ses eslavos em geral. Aliás, além da fortíssima tradi- mais do que o resultado final bem-acabado. Tal pro- sional tem gerado muitas iniciativas. “Acredito que o
ção eslava na formação de diretores, poderíamos ainda cesso deve gerar também uma reflexão crítica sobre Núcleo de Direção Teatral que foi criado na Escola Li-
citar a Alemanha como outro país de ponta nessa a metodologia aplicada, além da documentação e do vre de Teatro de Santo André (SP) foi uma experiência
área”, informa Antônio Araújo, professor do CAC/USP registro do percurso criativo”, explica Antônio Araújo. bastante motivadora no pensar a formação do diretor
(Departamento de Artes Cênicas da Universidade de e da diretora de teatro, ” complementa.
São Paulo) e diretor do Grupo Vertigem. DEBATE foto: lucas arantes

O modelo ideal de ensino é tema de discussão entre Atividades na SP


Escola de Teatro
ESCOLAS pesquisadores, diretores e professores das artes
A formação em direção na FADM (Faculdade Dulcina cênicas. No ano de 1995 ocorreu o primeiro Director
de Moraes) na cidade de Brasília (DF) dá-se no curso Training Symposium (Simpósio de Formação de Di-
de Artes Cênicas. Além disso, a faculdade a partir retor). Na segunda edição, em 1997, as questões mais
deste ano iniciou curso Pós-Graduação em direção te- debatidas foram entorno da aprendizagem, como ela
atral. “Nossa Pós-Graduação foi pensada com ênfase deveria ocorrer no âmbito da Graduação ou da Pós-
numa discussão sobre teatro contemporâneo. No final Graduação. E se esse ensino deveria ocorrer por um
o aluno deverá apresentar um trabalho de conclusão sistema de tutorias ou de disciplinas - estruturadas
que será teórico-prático, onde o estudante deverá sequencialmente numa grade curricular. Como se
efetivamente dirigir um trabalho e elaborar uma re- tratou de temas complexos, naquele momento não
flexão teórica sobre o mesmo”, explica Francis Wilker, resultou num modelo pedagógico.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 05

marketing cultural

Enciclopédia para os
Itaú Cultural oferece grande
acervo teatral, com biografia
de personalidades, espetáculos
amantes do teatro
“Um Moliere Imaginário”
foto: Bianca Aun

e companhias do grupo Galpão

por Pablo Ribera, redação São Paulo

V
oltado para apoiar as diversas artes bra-
sileiras, o instituto Itaú Cultural oferece
aos interessados pela cultura nacional
um grande acervo das artes cênicas do
Brasil. Chamada Enciclopédia Itaú Cultural de
Teatro, esta base de dados virtual é um dos cinco
projetos criados para incentivar a cultura brasi-
leira, com o intuito de trazer informações sobre
as principais personalidades que trabalharam no
País, os espetáculos que por aqui passaram e as
companhias que atuam no Brasil.
O projeto foi, na verdade, criado pelo crítico carioca
Yan Michalski, em 1987, que na época trabalhava
em uma coleta de dados sobre o teatro brasileiro.
Após a morte do crítico, o projeto foi retomado por
Johana Albuquerque, que viabilizou uma primeira
análise do material e a atualização de informações
durante 1999 e 2000. O Itaú Cultural assumiu o
projeto em 2001 e lhe deu um tratamento virtual,
tendo como modelo a Enciclopédia Itaú Cultural de lados ao longo da pesquisa e 115 verbetes redigidos Espetáculos - o verbete traz texto histórico sobre o
Artes Visuais, com adaptações de formato e conteú- por ele foram reorganizados por Johana. As imagens espetáculo, ficha técnica, outras montagens, fontes
do para o contexto do teatro. que aparecem em parte dos verbetes pertencem ao consultadas Conceitos relacionados - texto histórico
“A Enciclopédia de Teatro entrou no ar em 2004, Acervo Idart/ Centro Cultural São Paulo e ao Acervo sobre conceitos e fontes consultadas Todos os textos
com o objetivo de disponibilizar livre acesso à cul- Cedoc/Funarte, no Rio de Janeiro. oferecem hyperlinks, para que o internauta possa
tura brasileira”, afirma Tânia “Nós nos preocupamos muito com essa questão do se informar ainda mais sobre o teatro brasileiro.
Rodrigues, gerente do Núcleo de Enciclopédias do Itaú direito autoral. As imagens, por exemplo, são de Juntas, essas categorias somam mais de 800 arti-
Cultural. “Nós temos em nossa enciclopédia ape- acervos que muitas vezes são pessoais e nós cita- gos. Além das informações organizadas em verbetes,
nas personalidades e espetáculos brasileiros ou que mos isso”, afirma a gerente. ordenados alfabeticamente, a Enciclopédia possibi-
fizeram fama no Brasil”. As pesquisas tiveram como A Enciclopédia possui quatro tipos de verbetes: lita a consulta a dados resumidos sobre aproxima-
base bibliografias especializadas, programas de peças Personalidades - traz biografia de autores, diretores, damente 15 mil personalidades e cerca de oito mil
teatrais, críticas jornalísticas e pesquisas acadêmicas. atores, cenógrafos/figurinistas, músicos, iluminado- espetáculos, que integram as bases de dados do Itaú
Foram também consultados arquivos pessoais de ar- res e teóricos, cronologia, espetáculos, fontes consul- Cultural.
tistas de teatro e questionários por eles respondidos. tadas, links internos e links externos Companhias Sempre atualizada, a Enciclopédia ainda contará,
O trabalho efetuado anteriormente por Michalski foi e Grupos - texto histórico sobre companhias, grupos em breve, com trechos em vídeo de peças, com no
um suporte fundamental. O arquivo de dados acumu- e espaços de produção teatral, fontes consultadas máximo cinco minutos, e imagens de cartazes de
foto: Edouard Fraipont espetáculos. “Nós continuaremos trabalhando em
Tânia Rodrigues prol da história da cultura brasileira e aumentan-
do as nossas enciclopédias ainda mais”, diz Tânia.
Para acessar a Enciclopédia Itaú Cultural de Te-
atro e as demais (Arte e Tecnologia, Artes Visuais,
Literatura Brasileira e Super 8 – Cinema), basta
acessar o site do instituto (www.itaucultural.org.
br) e clicar no menu “Enciclopédias”.
foto: Monteiro Schmidt

“Relações Naturais”
do Giramundo
06 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

entrevistas
divulgação

peça “In on It”. Caminhos primeiro contato com o teatro.

Descaminhos de tortuosos e saídas luminosas,


para Hamlet, Fausto, Niet- JT: Em 99, você faz “As Três Irmãs”, seu primeiro

Fernando
zsche ou mesmo para essas trabalho dirigido por Enrique Dias. Como foi esse
singelas perguntas.    encontro com ele? Além de Tchekhov, você já atuou
em peças de Shakespeare, Moliére, interpretou o

Eiras
Jornal de Teatro: Qual foi seu Fausto, numa adaptação de Goethe. Como é fazer
primeiro contato com o teatro? personagens que são interpretados há décadas (ou
O que daquele primeiro encan- mesmo há séculos) no mundo inteiro?  
tamento você ainda conserva?
Passos e tropeços Fernando Eiras: Eu cresci
FE: Nosso primeiro encontro foi regido por Anton
tchekhov , o que acontece é que tanto Kike quanto
a serviço do ao lado de meu pai, que era eu temos amor por Tchekhov , não só pelo criador
personagem músico, compositor, produtor,
e Babalorixá. Ele era um
como também pela criatura. Está tudo no texto, ele
nos dá tudo, o que você tem que fazer é preencher, che-
homem de terno e gravata gar no lugar que ele propõem. É como se você tivesse
que trabalhava no centro da fazendo alta costura. Portanto quando você faz uma
cidade todos os dias em rádio parceria com alguem num texto do Tchekhov você fica
como radialista, em televi- irmanado com esse alguém. Porque a experiência é
“Complicar para chegar ao simples.” Dizer que essa são, como produtor e apresentador. Até os anos vertical, você pega no martelo e vai esculpindo a pedra 
frase seria uma espécie de lema para Fernando 70 todas as segundas e sextas feiras ele recebia até que de dentro da pedra venha surgindo a imagem. 
Eiras seria apenas mais uma das falsas simplifi- entidades de luz, ou seja, preto velho um caboclo, Com o Shakespeare foi diferente, foi mais autoral,
cações que a imprensa costuma recorrer. Diríamos um exu lindo chamado Zé pelintra, uma entida- nos conversamos com o texto o tempo todo, usando
então que essa síntese seja uma constante na de criança. Meu pai evocava a presença dessas e contando nossas vivências e experiências mistura-
carreira do ator, de 53 anos. Do primeiro encan- entidades e ele permitia que elas incorporassem, das com as dele. Levamos o Tchekhov pra dentro do
tamento com o teatro, ocorrido num terreiro de o mais espantoso era que eu não o reconhecia. Ele Hamlet onde eu contava uma história que havia
candomblé até ao prêmio Shell de melhor ator, pela se transfigurava através de sua fé. Esse foi o meu acontecido comigo nas “Três irmãs.”

“A parte lúdica é fundamental, não dá


pra matar sua criança interior na arte”
Ele já foi Freud, Mozart e por pouco não foi médico. A náusea na
primeira autópsia deu ao teatro brasileiro um de seus atores mais
premiados. Edwin Luisi já levou pra casa o Shell, o Qualidade
Brasil, o prêmio da APCA e outros.
Por: Igor Miguel Pereira, redação de Brasília

Jornal de Teatro: Sua estreia foi em “Ensaio Selvagem”, mente distinta com o seu talento. Quando eu fui fazer
peça de José Vicente, encenada num bar. A peça tinha a peça, muita gente veio me falar que o personagem
bem o clima underground dos anos 70, com narrativa era a minha cara. E a parte lúdica é fundamental, não
descontinuada, frases incompletas, obscuras passagens dá pra matar sua criança interior na arte. Tanto que o
em inglês. Fala um pouco sobre como foi essa experiência. verbo pra interpretar em inglês (to play) e em francês
Edwin Luisi: Como quase tudo daquela época a peça (jouer) é sinônimo de brincar, jogar. A sociedade nos
era fruto de uma viagem de ácido. Era a história de paga pra isso, pra mentir, iludir.
uma atriz brasileira raptada por uma companhia de
teatro inglesa, que vivia num trem. Lá ela sofria uma JT: Você trabalhou com inúmeros diretores consagrados
lobotomia e assumia a personalidade de Ataulpa, Antunes Filho, Bibi Ferreira, Flávio Rangel. O que guar-
guerreiro indígena, seu último personagem. Eu fazia da de cada um deles? Direção faz parte dos seus planos?
essa atriz e ganhei com a peça meu primeiro prêmio. O EL: O que mais me marcou foi o Flávio, que fez três
engraçado é que eu fui chamado pra fazer uns 20 dias sucessos comigo e me pegou num momento muito
antes da estreia e não entendi muito bem aquele texto. importante: minha fase de formação como ator. Ele me
Como eu estava começando, tive vergonha de pergun- ensinou muita coisa sobre o amor pelo teatro, o respeito
tar. Ganhei o prêmio sem saber o que estava fazendo. com quem faz teatro, com a equipe. Muito do que eu
sou como ator eu devo a ele. O Antunes impressionava,
JT: Você interpretou Mozart em “Amadeus”, peça que por ser de todos os diretores que eu trabalhei o mais in-
ressaltava a infantilidade do gênio. A parte lúdica é quieto. Ele tem essa insanidade do artista de um modo
frequente no seu processo de interpretação? muito intenso. A Bibi tem uma vida de teatro tão vasta
EL: A personalidade dele era assim. Ele era desagra- que qualquer coisa que ela fala é essencial. Em pou-
dável, pornofônico, falava palavrões infantis, “cocô”, cas palavras ela te leva a lugares insondáveis. É uma
“xixi”. Era uma criança mimada, sentava no colo das combinação de tempo, estudo e talento que faz com que
rainhas, das damas da corte. Foi um menino prodígio ela sempre te peça as coisas de um modo muito preciso.
divulgação

que nunca cresceu. Ele tinha uma personalidade total- Depois, quando você vê o resultado é impressionante.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 07

entrevistas
divulgação

Entrega
visceral
Em cartaz com o espetáculo
“Gypsy”, Totia Meireles revela os
desafios da personagem
por: André Gomes, redação Rio de Janeiro

H
á sete anos, Totia Meireles enfrentou, durante toda a temporada. “A personagem é um fu- forma, a atriz sabe que está em seu mais celebra-
sem reclamar, frio intenso do lado de racão: grita, briga, tem canções complexas, não tem do momento da carreira e não pensa duas vezes
fora do Shubert Theater, na Broadway, espaço para você fazer uma cena sequer no auto- quando convidada a defender sua personagem.
para cumprimentar a atriz Bernadet- mático. Eu mesma, na Broadway, fiz questão de ir a “Acho que a única defesa possível é que ela é fiel
te Peters, que estrelava, na ocasião, um revival uma sessão vespertina da peça para ver se de tarde ao que pensa e luta com unhas e dentes pelo que
do aclamado musical “Gypsy”. Na ocasião nem a LuPone fazia com a mesma entrega e a danada lá, acredita”, aponta.
sonhava que, um dia, viveria em palcos brasilei- impecável, inteira”, lembra Totia. Seus temores só se
ros exatamente a mesma personagem que tanto a dissiparam depois da estreia e do bom andamento No princípio, “Chorus Line”
havia impressionado. da temporada no Rio. “Foi quando percebi que era Por essas e outras, Totia está feliz com a boa
De lá para cá, Mama Rose, a personagem em ques- capaz. No início, entre pré-estreias e estreia, fize- repercussão do trabalho. “Acho que a Mama é um
tão, já foi vivida na Broadway por outro grande mos, durante uma semana, apresentações diárias do upgrade total em minha carreira. Ela me permite
nome dos musicais americanos, a diva Patti LuPo- espetáculo. Isso dá uma resistência. Andei brincan- colocar em cena tudo o que fiz até aqui. É, antes de
ne. Por aqui, impressionado agora está o público do com a produção dizendo que, agora, se quiserem, tudo, uma vitória pessoal, algo que eu precisava
brasileiro com a performance de Totia Meirelles no até sessão dupla eu encaro”, brinca. provar para mim mesma”, diz a atriz, cujo nome
papel, considerado um dos mais complexos e desa- verdadeiro é Maria Elvira. No teatro musical, ela já
fiadores do gênero. Fôlego de atleta esteve em montagens como “As Noviças Rebeldes” e
No cinema, a mítica personagem foi defendida por Para levar a bem-sucedida temporada de “Gypsy” “A Pequena Loja de Horrores”, além de “Cristal Ba-
Bette Midler, e tanto frisson em torno dos desafios adiante, Totia pouco fala e se esqueceu da vida so- charach” e “Company” (com produção do jornalista
que a envolvem andou tirando o sono da intérprete cial. Dorme cedo, malha, corre, cumpre uma rotina Claudio Magnavita), suas outras duas parcerias
brasileira. “Quando fui convidada para o papel, me rígida para não pegar um resfriado sequer. “Para com a dupla Möeller e Botelho. Adepta de cuidados
deu um pânico, achei que não ia conseguiria fazer. interpretar a Mama, como diz o Charles (Möeller), como acupuntura para relaxar a musculatura, a
Nestes momentos, no entanto, pensei na confiança tem que ser atleta. Tive que ficar duas semanas atriz, casada há 19 anos, é naturalmente uma en-
depositada pelos meninos (os diretores Charles sem fazer ginástica por um problema na coluna tusiasta do gênero musical, mas sabe que há quem
Möeller e Claudio Botelho, responsáveis pela mon- e já me senti meio dura. Não tem jeito, não posso não goste dele. “Tem quem ache um saco”, admite.
tagem brasileira) em mim e também que o certo nem pensar em parar a ginástica e, quando acaba “Mas quem gosta vê nele uma alegria, um colori-
era encarar um dia de cada vez”, lembra Totia. a peça, calo a boca para economizar a voz”, conta do todo especial. E hoje em dia, com o know how
Mesmo com tanto zelo, Totia ainda temia pela es- Totia, que já foi bailarina e estreou no musical alcançado por nossos profissionais, é um enorme
treia e pensava, secretamente, se seguraria o tranco “Chorus Line”, em 1984. Aos 51 anos e em ótima prazer assistir a um bom musical aqui no Brasil”.
08 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

entrevistas

A intensidade de Lucélia Santos


Entrega total e dedicação aos personagens são marcas essenciais para a atriz  

D
esapego. A lição principal da filosofia conquistou corações tão diferentes como os de Nelson vam de temas polêmicos na época (religião, sexualidade,
budista é uma constante na vida da atriz Rodrigues e Fidel Castro, Lucélia explicita sua entre- desbunde). Como você se identificava com os textos que
Lucélia Santos. Assim ela saiu de Santo ga a qualquer personagem, seja a mocinha ingênua ou encenou? Como foi conviver com um elenco tão diverso,
André (SP), aos 15 anos, e foi estudar a “bonitinha, mas ordinária”. “Não é uma atriz, é uma que ia desde atores iniciantes até ao Tom Zé?  
teatro no Rio de Janeiro com o mestre Eugênio Kusnet. força da natureza”, foi a definição que Nelson encon- Lúcelia Santos: Foi uma fase maravilhosa de minha
Estreou na televisão protagonista de novela, vacinada trou para ela. Nessa entrevista descobrimos o porquê. vida: Liberdade, sonho, confiança na profissão! Fé no
contra o deslumbre. Arriscou o emprego sendo musa da Teatro e no trabalho do ator. Até hoje sinto todos esses
esquerda dos anos 80. Foi fazer seu cinema na China e Jornal de Teatro: Nos seus primeiros anos de Rio de Ja- valores bem fundos, bem marcados em mim... 
no Timor Leste, como produtora e documentarista. neiro você atuou em dois musicais que eram a cara dos
Dona de um estilo visceral de interpretação que anos 70, “Godspell” e “Rock Horror Show”. Ambos trata- JT: Você estrelou depois “Ciranda Cirandinha”, a pri-
divulgação meira série voltada para o público jovem da televisão
brasileira. Você disse algumas vezes, ser esse um dos
trabalhos na TV que mais te agradou. O que fazia o
Ciranda ser tão bom?  Você acha que hoje há menos
espaço para o experimental na TV?  
LS: “Ciranda Cirandinha” foi um marco na linguagem
na TV. Tinha uma direção genial do Daniel Filho e
autores igualmente geniais como Domingos de Olivei-
ra, Euclides Marinho e outros da sua grandeza. Era
mesmo muito bom. Nós inventamos o naturalismo na
representação na TV, aquilo tinha um sentido naquele
programa, naquele momento. Depois foi adotado como
estilo e usado às vezes equivocadamente pelos atores
sem formação que fazem molinho pra ficar gostosinho
(risos) Intenção zero! Sim, acho que há pouco espaço
experimental para dramaturgia em TV hoje. 

JT: Nas telas de cinema dos anos 80 você se converteu


em musa de Nelson Rodrigues, estrelando “Engraçadi-
nha”, “Bonitinha, mas ordinária”, “Álbum de Família”.
Você se considera uma atriz rodrigueana? Como você
vê a definição que Nelson lhe deu: “ela não é uma
atriz, mas uma força da natureza”? 
LS: Sim, eu sou uma atriz rodrigueana. Amo a obra de
Nelson e poucos autores têm o vôo e a grandeza dele.
Fazer Nelson faz parte da formação de um ator, eu
acho. Quanto à citação dele. Não tenho qualquer con-
trole sobre a mente, nem a dos outros, nem a minha
mesma, quanto mais a do Nelson...  
JT: Como foi o seu contato com o budismo e como você
acha que isso influencia na sua maneira de interpretar?  
LS: O Budismo mudou a minha vida, minha pos-
tura na vida, dada a sua profundidade. Quanto à
maneira de interpretar, vem de encontro a minha
crença de que o Teatro é algo ritualístico, ligado
ao sagrado e dedicado em benefício dos seres, não
sendo, portanto instrumento de exercício mera-
mente do ego do ator ou dos criadores envolvidos.
Quando atuo, e cada vez mais no Teatro, não o faço
para brilhar individualmente, mas para colaborar
e expressar um contato maior com quem assiste.
Com o todo! 

JT: Como você avalia seus últimos trabalhos como


produtora e diretora de cinema (O filme “Destino” e o
documentário sobre o Timor Leste)? Tem planos para
algum próximo projeto?    
LS: Eu adoro o resultado de “Timor Lorosae” e tenho
ainda grandes problemas a serem solucionados com
minha última produção: “Destino”, o filme e a série.
Estão para ser lançados e depois que isso ocorrer é que
começarei novas produções em cinema, até lá estarei
firme atuando no Teatro.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 09

entrevistas

“É preciso amar muito


divulgação

o teatro para não desistir”


Barbara Heliodora, considerada uma das maiores críticas de
teatro do Brasil, fala sobre sua profissão, Shakespeare e um
“número imenso de espetáculos ruins”
Por Felipe Sil , redação Rio de Janeiro

O
nome de Barbara Heliodora já é suficien- que um espetáculo ruim é bom só estimula quem o
te para fazer tremer artistas e diretores faz a continuar no mesmo caminho. Creio que seja
de teatro em todo o Brasil. Reconhecida obrigação do crítico alertar o jovem quando ele está
pela total sinceridade com que dá suas indo para o caminho errado.
opiniões sobre as peças que assiste (o que pode oca-
sionar resenhas altamente negativas e ácidas), seus JT: “Você tem que ter um amor imenso pelo Teatro,
ensaios e opiniões são esperados com ansiedade por para fazer críticas sobre ele”. Explique essa frase sua.
quem faz os espetáculos. Quase unanimidade, jura BH: Porque você não pode imaginar como é cansa-
que não se considera uma crítica a nível internacio- tivo ver um número imenso de espetáculos ruins,
nal e conversa com o Jornal de Teatro como se fosse como acontece com o crítico que tenta ficar o mais
apenas uma especialista no teatro local do Rio de possível em dia com o que está acontecendo na sua
Janeiro. O meio artístico, porém, sabe da verdadeira cidade. Ocupam palcos nesta cidade, o Rio, que é portamento humano, seja nas relações inter-pessoais
importância desta crítica de 86 anos, do Jornal O pobre em número deles, espetáculos totalmente como na fantástica penetração nas estruturas sociais
Globo, que quase foi atriz e já dirigiu peças memo- despreparados, sem um mínimo de competência, e políticas, permite que, mesmo no final do séc.XVI
ráveis no cenário nacional, além de ser considerada embora chamem a si mesmos de profissionais. É e início do XVII ela tenha sempre o que nos dizer, já
uma das maiores experts de Shakespeare no Brasil. preciso amar muito o teatro para não desistir. que não ficou preso a modismos fortuitos, e escreveu
sobre o mais profundo e permanente. Emocionar
Jornal de Teatro: O crítico Paschoal Carlos Magno JT: Fale sobre sua relação com Shakespeare? mas, principalmente, fazer pensar, é o que Shakespe-
defendia o incentivo a certos jovens atores. A senhora BH: A mistura de ação, personagens e linguagem que are soube sempre fazer, e não saberia encontrar uma
sempre costumava e acredito que continua contra existe na obra dele a torna fascinante. Essencialmen- única vez em que, relando qualquer uma de suas
isso. Por quê? te, boa parte do fascínio de Shakespeare vem do fato peças, não me tenha apanhado surpreendida por não
Barbara Heliodora: O Paschoal achava que era de ele, como Molière, ter vivido dentro do teatro e ter captado mais aquela idéia, mais aquela imagem,
certo estimular tudo; eu sempre acreditei que dizer criado textos para atores. Sua observação do com- mais aquela força dramática no texto.

As multifaces de Leona Cavalli


Ela se diz tímida, mas é algo difícil de se acreditar. Como pode uma
pessoa tímida sair de Rosário do Sul (RS) completamente desencorajada
por seu pai e ir parar em São Paulo na busca do sonho de ser atriz?
Por Daniel Pinton Schilklaper, redação Rio de Janeiro

Jornal de Teatro - Havia alguém na sua família ligado maturgia como José Celso Martinez, Bibi Ferreira,
ao meio artístico? Como seus parentes receberam a ideia Paulo Autran... Qual o grande aprendizado nessa
de que queria seguir por um caminho “não tradicional”? interação com profissionais mais experientes?
Leona Cavalli - Meu pai é advogado e político e nun- LC - Eu acho que a disciplina e a capacidade de
divulgação

ca acreditou em carreira de atriz. Me ajudou ban- rir de si mesmo. O teatro é prático, interpretação é
cando minha ida para Porto Alegre, onde fiz curso prática. Aprendi muito com essas pessoas na práti-
de artes cênicas na UFRGS (Universidade Federal ca da interpretação.
do Rio Grande do Sul), depois bancou a minha ida
para São Paulo, mas nunca quis que eu seguisse na JT - Você acredita que leva algo das personagens
carreira, nunca achou que era sério. Aliás, meu pai que você interpreta? Ou é uma relação descartável,
só me deixou cursar artes cênicas em Porto Alegre algo que você consegue manter separação completa?
porque eu estava em Londres e disse que só voltaria LC - Eu acho que é um trabalho de entrada e
se ele deixasse eu fazer o curso. Acabei que fiz artes saída. Não é uma coisa simples: é muito sensível e
cênicas e direito por causa dele. Só há um tempo a nossa matéria-prima somos nós mesmos. Tem de
atrás que ele começou a ver que era bastante sério. ter sempre um cuidado, uma atenção para isso. Por
Já minha mãe é professora de português e é mais li- outro lado, sempre procuro manter uma distância,
gada à beleza. Gosta de arte, mas como observadora. não misturar uma coisa com a outra. No começo da
carreira isso acontecia, mas depois fui aprendendo
JT - Você trabalhou com grandes nomes da dra- a não deixar isso acontecer.
10 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

multimídia

As cenas de

fotos: divulgação
Felipe Barenco

todos os dias
na internet
Sete autores do Rio de Janeiro dividem a
função de criar (e postar) uma nova cena a
cada dia no dramadiario.com
Por: Adoniran Peres, redação Florianópolis

N
este século XXI, de tantas tecnologias, é legal para ser encenado. Não
preciso criatividade e se reinventar para queremos perder o foco, que é
não virar passado. A internet é encarada produzir dramaturgia para a
como uma importante ferramenta aliada internet: um texto multi-meios,
da comunicação, com possibilidades globais, princi- em que você lê, ouve uma mú-
palmente de divulgação, informação e aprendizado. sica, assisti televisão e posta
Abre as cortinas e as artes cênicas têm sessões no twitter. Mas temos pro-
gratuitas onde o presencial deixa o virtual atuar. jetos de peças relacionados
Entre os exemplos mais conhecidos, opção alternati- a alguns textos do Drama
va para o público apaixonado por teatro, são os sites Diário”, explica Barenco.
que hospedam peças na internet, como o Teatro Para
Alguém (www.teatroparaalguem.com.br) e o Cenna- Temas e talentos
rium (www.cennarium.com). Sem imagens, mas com O Drama Diário é for-
possibilidades variadas de montagens, o Drama Diá- mado pelo dreamteam
rio (www.dramadiario.com) é destinado aos interes- de uma nova geração
sados em dramaturgia, com objetivo de ser um banco da dramaturgia cario-
de textos inéditos, gratuito e de fácil acesso. ca. Além dos autores na hora, bate
O site reúne sete jovens dramaturgos do Rio de buscarem comprovar aquele desespe-
Janeiro que todos os dias apresentam pequenos diariamente os talen- ro. Como o tema
textos novos de teatro na rede. “A internet é uma tos no site, o grupo não era óbvio, os
grande ferramenta de divulgação e as artes cênicas traz uma caracterís- autores pira-
ainda podem se beneficiar muito mais dela. Na tica marcante muito ram e as cenas
internet, quando a estratégia é bem traçada e o presente nesta era ficaram muito
conteúdo é interessante, você tem possibilidade de tecnológica: são legais”, explica
divulgar seu trabalho para um número imenso de empreendedores e Felipe.
pessoas sem custo algum”, ressalta Felipe Barenco, inseridos no merca- O site ficou fora do
um dos autores do dramadiario.com que, além do do. Alguns já comemoram ar por algum tempo,
site, tem um blog pessoal e portfólio com postagem indicações ao Prêmio Shell, como Carla Faour e esta parada se
sobre teatro, cinema e televisão. e Rodrigo Nogueira. “Não ficamos esperando nin- deu porque, apesar
Quando surgiu, em 19 de maio de 2008, a principal guém para produzir nossos textos. Encarar o desafio do sucesso entre os leitores e a classe artística, o
proposta do Dramadiario.com era ser um espaço de de escrever uma cena nova toda semana, sobre os Drama Diário deixou de ter hospedagem gratuita
experimentação e exercício dos autores. Com o tempo, temas mais variados, comprometidos com a qualida- e os autores tiveram, mais uma vez, que repensar
quando os autores foram ganhando habilidade e en- de e, ao mesmo, conscientes que o mais importante o projeto. “As empresas ainda custam a perceber a
tendendo o formato, o site recebeu outros contornos e naquele momento era brincar, se divertir”. importância de investimento num projeto como o
ampliando as possibilidades. “A ideia surgiu do meu Com as escolhas feitas pelos próprios autores, o nosso, infelizmente. Todos os custos do site são ban-
interesse em pesquisar caminhos de explorar a inter- dramadiario.com apresenta temas variados, desde cados por nós, autores. Fazemos tudo, desde escrever
net dentro do meu trabalho com dramaturgia. Gosto os mais clichês, como sexo, traição, até os mais ab- até produzir nossas leituras dramatizadas ou fazer
sempre de pensar que tipo de diálogo é possível entre surdos, como gorila e epizeuxe. “Às vezes, trocamos a parte visual, de webdesign”. Para dar continuida-
uma arte presencial (teatro) com um meio virtual em cima da hora, como foi o caso da morte do Mi- de ao trabalho, a equipe se inscreveu em um edital,
(internet)”, explica Felipe Barenco. De acordo com chael Jackson. Como homenagem, ele virou o tema mas não foi contemplada. “Como o patrocínio não
ele, o site é o maior banco de textos dramatúrgicos da nossa semana”, explica o autor, que também rolou, nos reunimos e decidimos nós mesmos bancar
inéditos da web, com mais de 400 cenas publicadas e analisa que alguns temas despertam mais interes- essas alterações. Erika Sarti, amiga e webdesiger, se
com uma média de 10 mil acessos por mês. se, como a “sexualidade”. “Um tema campeão de uniu a nós e estamos reestruturando tudo. Por isso o
Os textos postados no site também são apresenta- acessos é “Marisa Monte”. Tudo depende muito de site ficou fora do ar até que a migração para o novo
dos nos palcos, mas segundo os autores o objetivo como nós conseguimos brincar com ele. Os leito- sistema fosse concluída”, explica. Os sete autores do
principal não é esse. “Ao longo desse tempo perce- res gostam quando percebem que somos capazes Drama Diário são: Camilo Pellegrini, Carla Faour,
bemos que é preciso não se deixar levar pela ten- de surpreender. Teve uma semana em que um de Felipe Barenco, Henrique Tavares, Julia Spadaccini,
tação, pois nem tudo que escrevemos para o site é nós escolheu “Caixinha de fósforo” como tema e, Renata Mizrahi e Rodrigo de Roure.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 11

história

Merda
pra vocês!

Várias versões para uma mesma palavra 


por Igor Miguel Pereira, redação de Brasília 

A
s visões de mundo mais cínicas costu- Outros repudiam esse racionalismo extremado e nou: “Bravos franceses, rendam-se”. Pierre Jacques
mam gerar alguma frase charmosa para buscam sua resposta numa fábula singela. Um Etienne, o Barão de Cambronne (1770-1842), ficou
ser usada nos momentos de síntese. A ator iniciante se preparava para a mais importan- furioso e respondeu: “Merda! A guarda não se rende
citação mais famosa dessa faceta do te apresentação de sua carreira, jamais!”.A frase de Cambronne
jornalismo foi pronunciada no faroeste “O Homem com a presença dos críticos mais Nos países de língua inglesa a foi imortalizada no livro “Os Mise-
que Matou o Facínora”, de John Ford. No filme, o conceituados da cidade. Ansioso, o frase dita antes de entrar em ráveis”, do escritor francês Victor
repórter Maxwell Scott, resumia assim sua filosofia pobre rapaz errou o caminho, foi cena é “break a leg” (quebre a Hugo, e virou uma exclamação
profissional. “Se a lenda for maior assaltado, deparou-se perna). A origem da expressão usada sempre em situações difí-
que o fato, publique a lenda”. Mr. com um incêndio e quan- é ainda mais controversa. O ceis e decisivas, logo incorporada
Scott radiaria de felicidade ao rece- No Brasil, especialmente do finalmente chegou ao pelos atores de teatro.”
no período de repressão, “dicionário Partridge de Gírias
ber essa pauta, sobre como “merda” teatro, pisou nas fezes Existe ainda uma versão menos
a expressão merda e Expressões” registra várias
tornou-se a coisa certa a ser dita que um cachorrinho heróica. A causa da expressão
era identificada com a hipóteses.
nos momentos que antecedem uma deixou por ali. Abriu a seria econômica. Na bélle epóque,
peça. Palpites e lendas prevalecem contestação e a atitude porta gritando um dos Seria uma abreviação para muitas carruagens paradas na
onde a certeza já não existe.  libertária, própria dos nomes daquilo que em- “break a legend” (quebrar porta do teatro indicavam duas
Mas primeiro, vamos aos fatos. Um movimentos teatrais. porcalhara seu sapato. uma lenda) coisas. Calçadas sujas e bilhe-
dos pontos em comum do teatro em Foi homenageada por Pouco depois, subiu ao Teria surgido na época em terias esgotadas. Quanto mais
diversas culturas é a superstição. Caetano, na música palco e consagrou-se que os atores ganhavam excremento mais sucesso. Sim-
Nessa lógica nada poderia ser me- com a melhor atuação “gorjetas” da plateia e tinham ples, revelador e parecido com a
“Merda”, composta em
nos digno de sorte do que o simples de sua vida. Essa é a de se abaixar para pegar as explicação de Freud para a fase
1986, para o espetáculo
desejar de boa sorte, frase tida como explicação predileta da moedinhas atiradas no palco anal das crianças.  
“Miss Banana”, estrelado
maldita para atores e diretores de atriz Guta Stresser, que (nesse caso “break a leg” Se a simpatia pela “merda” é
todo o mundo. Era necessária uma por Regina Duarte contou o fato à revista constante no universo do teatro,
e dirigido por Wolf significaria dobrar os joelhos).
outra sentença, um código próprio TPM, respondendo uma poucos levaram tão longe esse
Maya. Alguns versos da Seria uma homenagem a atriz
ao espaço teatral. A palavra mérde enquete feita pela publi- fascínio quanto o dramaturgo
canção censurada: Nem Sarah Bernhard que perdeu
começou a ficar popular nas coxias cação sobre a relação dos francês Antonin Artaud. O cria-
uma doce oração, nem uma perna num acidente.    
da França a partir do século XIX.   atores com a palavra.    dor do Teatro da Crueldade, que
Aí começam as divergências. sermão, nem comício à Já para Marcelo Duar- Uma referência a John Wilkes abolia a supremacia da palavra e
Há inúmeras versões para o acon- direita ou à esquerda/ te, autor dos livros da Booth, ator que quebrou a distância entre o ator e a pla-
tecido, cada qual com seu nexo Fala mais ao coração do série Guia dos Curiosos perna no palco, após atirar no teia, via o ato de defecar como
próprio. Uns vão pelo caminho mais que a voz de um colega (espécie de Bíblia nerd presidente Abraham Lincoln. uma forma de purificar o corpo e
simples, o da dialética. Se boa sorte que sussurra “merda”. nos tempos pré-Google) atingir ao sagrado. “Onde cheira
dá azar, logo é preciso desejar algo a origem é literária. “Em 18 de junho a merda, cheira a ser,” escreveu em “Para acabar
muito ruim para garantir que tudo de 1815, tropas inglesas derrotaram o com o julgamento de Deus.” Foi a senha para que o
corra bem. E o que pode ser pior que... Bem, já deu exército francês, que foi intimado a se render em sentido literal atropelasse a metáfora, saindo dos
pra entender.   Waterloo, na Bélgica. O general inglês Colville orde- bastidores para ocupar o centro do palco.  
 
14 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

momento
fotos: divulgação

Um bar, um polonês
e um vestido Como “Os Comediantes”
mudaram o teatro brasileiro
por: Igor Miguel Pereira, redação de Brasília

U
m refugiado polonês que mal sabia falar preparação do ator. Nesta matéria, o Jornal de Tea- apresentações, um grupo de jovens da elite carioca,
português, um jornalista que quis escre- tro, conta a história de quem tornou isso possível: o inquietava-se com a ausência de algo daquele nível
ver para teatro por dinheiro, um cenó- grupo de teatro amador “Os Comediantes”. realizado por brasileiros. Discutiam Copeau, Sta-
grafo funcionário público, uma socialite nislavski, Pirandello, acabavam com a cena cario-
estreando como atriz. O encontro de personagens Da teoria ao palco ca, divagavam entre utopias, bravatas e drinks do
tão díspares sugere o enredo de uma comédia pica- Dominada por atores-empresários a cena teatral bar do Palace Hotel, na Avenida Rio Branco.
resca com desencontros absurdos. Mas esse autên- brasileira do final dos anos 30 era bastante pareci- O hotel era a sede da Associação de Artistas Brasi-
tico “exército de Brancaleone” existiu fora de cena e da com atual programação televisiva dos fins de se- leiros. Eram frequentes as exposições, saraus e fes-
foi responsável pela maior revolução do teatro bra- mana. Resumia-se a comédias de consumo rápido e tivais de teatro amador, onde algumas das teorias
sileiro: a encenação de “Vestido de Noiva”, de Nelson dramalhões rasos. Para se ter acesso a uma forma discutidas nas mesas poderiam ser postas em prá-
Rodrigues. Entre as mudanças que estrearam com a mais sofisticada de teatro só assistindo as tem- tica. O grupo “Os Independentes” venceu o primeiro
peça estão: o destaque da figura do diretor, o uso da poradas de espetáculos estrangeiros, que vez ou deles, em 1938, levando a peça “A Verdade de Cada
luz como efeito dramático e os ensaios com método e outra ocupavam nossos palcos. Público fiel dessas Um”, de Pirandello para o circuito comercial.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 15

momento

Entre seus fundadores estavam Luiza Barreto Lei- será aqui? Se for bem aceita, consagrará... o público.” sique du role” as meninas tinham. Dois dos rostos
te, atriz e jornalista, Brutus Pedreira, ator e músico, Público que nunca havia visto algo parecido. A mais belos do Rio de Janeiro aumentaram ainda
que tinha no currículo importante participação no peça tinha três planos de ação distintos. O da rea- mais as expectativas geradas pela noite de estreia.
filme “Limite”, de Mário Peixoto, Tomás Santa Rosa, lidade, em que a protagonista Alaíde era operada, Que ocorreu, enfim, na noite de 28 de dezembro de
cenógrafo, artista plástico e funcionário do Banco do após ser atropelada; o da alucinação, em que con- 1943, no teatro Municipal do Rio de Janeiro, contan-
Brasil e Adacto Filho, professor de português, cantor tracenava com o fantasma de madame Clessi, pros- do com uma pequena ajuda na iluminação. Insatis-
lírico e diretor improvisado. O nome logo foi trocado tituta assassinada pelo amante de 17 anos, antiga feito com as luzes do teatro Ziembiski usou parte dos
para “Os Comediantes.” Uma ironia, já que a pro- moradora da casa de Alaíde; e o da memória, com refletores dos jardins do Palácio da Guanabara. A
posta era de se fazer um “teatro de arte” no Brasil, recordações de Pedro, seu marido, ex-namorado de plateia comparecia em peso, ansiosa para ver o texto
em oposição às peças leves, apresentadas após o Lúcia, irmã de Alaíde, que a jurara de morte no dia e a trupe tão comentados e exaltados pela imprensa.
jantar para ajudar na digestão. de seu casamento. Uma ação não cronológica, cita- Os poucos aplausos ao fim do primeiro ato e os
Dois fatores contribuíram para que “Os Comedian- ções ao cinema e as frases geniais do Nelson: “as inexistentes do segundo pareciam indicar uma
tes” fosse o mais bem sucedido entre eles: o dinhei- mulheres só deveriam amar meninos de dezessete frustração certa do público. Mas eles estavam só
ro e o acaso. O Ministério da Educação do governo anos”, completavam as inovações. estupefatos. A ovação ao fim do terceiro e último
Vargas deveria ter a “hora do cafezinho” mais Era a chance que “Os Comediantes” tinham de ato e os gritos de “o autor, o autor” consagraram o
interessante da República. Manuel Bandeira tra- fazer um teatro brasileiro com um nível de profun- texto de Nelson Rodrigues, os cenários de Tomás
balhava por lá e Carlos Drummond de Andrade era didade e dramaturgia equivalente ao produzido na Santa Rosa e a direção de Ziembiski. “Os Come-
o chefe do gabinete. O poeta de Itabira foi quem Europa e nos Estados Unidos. Deram a Ziembiski diantes” foram comemorar na sorveteria de luxo “A
tirou a pedra do meio do caminho dos “Comedian- autonomia total na condução dos ensaios, que o Brasileira”, na Cinelândia. Nelson preferiu dividir
tes” e convenceu o ministro Gustavo Capanema, polonês exerceu com gosto em oito horas diárias um bife com batata frita com a esposa na leiteria
a liberar uma verba de 200 contos de réis, logo na durante os oito meses seguintes. Palmira. A glória ainda não pagara sua sobremesa.
primeira temporada do grupo, em 1940. Desneces- Sua primeira medida foi abolir o “ponto”, era deco- Depois do “Vestido de Noiva”, o grupo consagrado
sário dizer que a subvenção oficial provocou uma rar o texto ou rua. Depois foi o estoicismo dos pola- passou a temporadas mais constantes e veio a
tremenda ciumeira das companhias profissionais. cos, Ziembiski não parava o ensaio nem para comer, profissionalizar após o fim da Era Vargas, quan-
Certos fatos se repetem indefinidamente na histó- se alimentava apenas de ovos quentes, enquanto do secaram as fontes de recursos públicos. Não
ria do teatro, alguns deles sempre como farsa. dava broncas homéricas na equipe e no elenco. O duraram muito. O fim do grupo veio em 1947, após
Foi numa noitada no Cassino da Urca, que Brutus rigor e a ferocidade de Ziembiski espantariam até uma nova apresentação de “Vestido de Noiva”, com
Pedreira descobriu Ziembiski. O polonês que aos 23 Hitchcock, que dizia “tratar os atores feito gado”. Cacilda Becker no elenco. Saíram cedo de cena,
anos fora diretor do teatro Nacional de Varsóvia, Impressiona o fato de não ter havido nenhuma de- tendo cumprido seu papel: salvar o teatro brasilei-
chegara ao Rio fugindo dos nazistas e iluminava as sistência, principalmente porque o elenco principal ro da mediocridade.
pernas das vedetes em seu primeiro emprego. Sem não era lá muito acostumado às durezas da vida.
ele, “Os Comediantes” não sairiam da rotina de Carlos Perry era Pedro, sua esposa Stella Perry
discussões intermináveis, ensaios caóticos, peças era Lúcia e Evangelina Guinle era Alaíde. Todos
que não passavam do fim de semana de estreia, filhos de famílias ilustres da sociedade carioca, sem
apenas para convidados. “Zimba” foi o primeiro no nenhuma experiência anterior. Carlos que desejava
Brasil a exercer plenamente a função de diretor, ser ator foi o primeiro escalado. Stella foi convidada
traduzindo no palco as ambições artísticas de uma pelo próprio Ziembiski. Evangelina foi chamada por
geração bem-intencionada, mas inexperiente. Tudo Stella, a pedido de Brutus Pedreira. Ao menos “phy-
isso enquanto tentava aprender português.
Mas mesmo ele nada poderia fazer se não fosse por
um texto inédito de um autor nacional, recusado
pelos outros grupos. Uma peça que mesmo com a
possibilidade de nunca ser encenada já havia circu-
lado por metade da imprensa e da crítica do Rio de
Janeiro. Alguns achavam genial, outros nada en-
tendiam. Quando Ziembiski leu foi enfático. “Não
conheço nada no teatro mundial que se pareça com
isto.” Era Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues.

Vestido de Noiva
Durante seu horário do expediente no Jornal “O
Globo”, Nelson Rodrigues começou a batucar na
máquina de escrever a ideia que tivera na noite
anterior, ao voltar pra casa de bonde. Foi descoberto
e passou a ter apenas as madrugadas livres para
finalizar sua segunda peça. A anterior, “Mulher sem
Pecado”, que Nelson escrevera para tentar ajudar a
cobrir as despesas do lar (sua esposa Elza esperava
o primeiro filho), não havia provocado impacto ne-
nhum. Mas alguns elogios recebidos, como o de Ma-
noel Bandeira, lhe animaram a uma nova tentativa.
E foi Bandeira quem recebeu a primeira cópia de
“Vestido de Noiva”, assim que Nelson terminou sua
obra em seis dias, deixando o sétimo para revisão.
Leu, gostou e assim escreveu em artigo publicado no
jornal “A Manhã”. “Nelson Rodrigues é poeta. Talvez
não faça nem possa fazer versos. Eu sei fazê-los. O
que me dana é não ter como ele esse dom divino de
dar vida às criaturas da minha imaginação. ‘Vestido
de noiva’, em outro meio, consagraria um autor. Que
16 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

reportagem

No palco da
CENSURA
Arquivo Miroel Silveira da USP conta a história
do teatro brasileiro por meio dos prontuários
de mais de 6 mil peças censuradas

Por Guilherme Genestreti, redação São Paulo

“A
fotos: divulgação

classe teatral só
tem intelectuais,
pés sujos, desvai-
rados e vagabun-
dos, que entendem de tudo,
menos de teatro”. Foi com essa
frase truculenta que o General
Juvêncio Façanha resumiu
a opinião da ditadura militar
quanto aos espetáculos de teatro no país. Mas se teatro, e todo espetáculo tinha que garantir lugares
engana quem pensa que o teatro brasileiro só sofreu reservados caso algum deles resolvesse assistir a
com a censura durante os anos de chumbo. alguma das apresentações. A única alternativa para
Quem tem a oportunidade de conhecer as mais de fugir à censura seria empregar alguma linguagem ci-
6 mil peças censuradas que compõem o Arquivo frada ou distrair o censor quando das apresentações.
Miroel Silveira, parte da biblioteca da Escola de Contudo, muitas das companhias que tiveram seus
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, espetáculos vetados acabavam entrando em falên-
percebe que o teatro penou com a censura não ape- cia. O professor Ferdinando Martins, pesquisador
nas nas épocas de ditadura, mas também quando o do acervo, explica que era comum que os grupos
país vivia períodos de democracia. teatrais tomassem empréstimos para custear as
“A censura no teatro sempre existiu, desde que apresentações e, a poucos dias da estreia, fossem
o primeiro jesuíta veio para cá”, explica Cristina proibidos de encenar por conta da censura: “Essa
Costa, atual coordenadora do acervo. Para ela, era uma forma de acabar com várias companhias
embora cada época tivesse um determinado órgão de teatro. Muitos grupos nunca se recuperaram
responsável por essa função, a censura atravessou dos prejuízos sofridos”.
Documentos originais com
os séculos ininterruptamente, sempre zelando pela
observações dos censores ordem política e pelos bons costumes. Uma parte da história do teatro
De fato, é interessante notar que alguns dos casos Se o teatro sempre foi vítima da censura, a conser-
mais emblemáticos do arquivo datam da década vação dos processos contidos no arquivo reconstitui
de 50, período em que o Brasil vivia a democracia uma parte da sua história no Brasil.
do Governo JK. Foi nessa época que dois textos im- Todos os prontuários que hoje integram o acervo
portantes de Nelson Rodrigues, “Perdoa-me por me antes estavam abrigados na Divisão de Diversões
traíres” e “A Mulher sem Pecado”, tiveram a ence- Públicas, órgão estadual que foi o responsável por
nação vetada. Junto ao texto da primeira das peças vetar espetáculos em São Paulo por mais de qua-
encontra-se um longo abaixo-assinado elaborado renta anos. No final dos anos 80, quando a censura
pela Liga das Senhoras Católicas, inconformadas prévia acabou abolida do país, todos os arquivos
com o teor “indecoroso” da peça. Já em “A Mulher daquele departamento seriam incinerados, não
Sem Pecado”, os censores opinaram pela reelabo- fosse a iniciativa do professor Miroel Silveira, que
ração de toda a cena final do texto, julgando que percebeu o valor histórico daqueles prontuários e
a consumação de um adultério atentaria contra a os levou à Universidade de São Paulo, onde eles
moral do público. são mantidos até hoje.
Cada espetáculo precisava ter autorização expres- Ao analisar os processos, que vão desde 1926 até
sa para ser apresentado, o que significa que todos 1970, ano em que o Governo Federal passou a
os textos teatrais precisavam ser submetidos à centralizar em Brasília a vigilância desses espetá-
leitura por parte de um censor. Em seguida, com o culos, reconta-se toda a evolução do teatro nacional
texto avaliado, o produtor teatral tinha que apre- pela ótica dos censores. Conforme explica Ferdi-
sentar o ensaio geral da peça a um funcionário da nando, “o século XX no Brasil percebeu a transição
censura para mostrar que estava seguindo todas de um teatro que antes era leitura encenada para
as recomendações contidas no prontuário. uma arte na qual o corpo se codificava e passava a
E não havia como driblar os vetos durante a tempo- ocupar um lugar central nos espetáculos”.
rada: os censores eram freqüentadores assíduos do Os funcionários da censura, obviamente, tiveram
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 17

reportagem
fotos: divulgação

Cristina Costa,
coordenadora do
Arquivo Miroel Silveira

Trajetória da censura no teatro


brasileiro:
- Brasil colonial: O teatro eclesiástico praticado
pelos jesuítas sofria censura por parte da Igreja
Católica, que impunha uma série de regras quan-
to aos textos que poderiam ser encenados.
- Brasil imperial: Com a chegada de D. João VI e
a vinda de companhias portuguesas ao país, o
Império criou mecanismos de censura prévia para
proteger o bom emprego do idioma, além de de-
fender a monarquia, a moral e os bons costumes.
Ferdinando Martins
analisa a evolução do - Brasil republicano: O estado herdou várias das
teatro no Brasil instituições de censura e a polícia ficava respon-
sável por vigiar as produções teatrais.
- Era Vargas: Getúlio organizou e documentou
todos os processos sobre censura prévia ao
teatro e subordinou a tarefa de fiscalizar os
espetáculos ao DIP (Departamento de Imprensa
e Propaganda)
- República Populista; Embora o país tivesse se
redemocratizado, ainda havia mecanismos de
censura exercidos em cada estado da federa-
ção, como era o caso da Divisão de Diversões
Públicas em São Paulo.
- Ditadura Militar: o sistema anterior vigorou
até 1970, quando a censura passou a ser centra-
lizada em Brasília. Isso se prolongou até 1988,
quando a nova Constituição extinguiu de vez
qualquer forma de censura prévia ao teatro.

produção teatral no Brasil ainda parece sofrer com


as cicatrizes do passado. “A prática de tantos anos
de censura leva a uma cultura da autocensura”,
defende Cristina Costa, argumentando que muitos
temas como o aborto, por exemplo, ainda são um
tabu da época da censura.
Questionada se além da autocensura, o teatro
que se adaptar a essa trajetória e as anotações que versão. Daí porque qualquer peça que remetesse brasileiro ainda sofre algum tipo de restrição
faziam nas peças ilustram essa mudança de men- a ideias revolucionárias era logo vetada. A atriz aos espetáculos, a pesquisadora argumenta que
talidade. Se antes as marcações se concentravam Nilda Maria, que chegou a ser perseguida nessa muitas vezes textos engajados continuam sendo
em aspectos dos textos, como palavrões e lingua- época, conta que o Estado via na classe teatral um boicotados: “Existe uma censura econômica, mui-
jar popular, alguns anos mais tarde os censores inimigo que deveria ser reprimido: “Os militares tas vezes exercida por gestores de marketing de
passaram a opinar também sobre a movimentação tinham ódio pelo teatro”, recorda-se ela. empresas que não querem apoiar determinados
no palco ao vetar algumas ações e sugerir, por projetos e que acabam privilegiando espetáculos
exemplo, que houvesse menos iluminação em cenas Herança da censura de mero entretenimento”.
mais polêmicas. A censura prévia ao teatro só acabou em 1988, Mas se a censura do passado está escancarada em
No auge da ditadura militar, a censura ficou ainda quando a Constituição proibiu qualquer forma de um acervo como o do Arquivo Miroel Silveira, os
mais atenta à questão política, temerosa de que inibir a produção artística. Mas tendo convivido vetos dos dias de hoje talvez nunca cheguem ao
o engajamento do teatro levasse o público à sub- tanto tempo com a ameaça de vetos e interdições, a conhecimento de todos.
18 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

técnica

Uma outra forma


de ver o teatro
O trabalho dos audiodescritores permite que deficientes visuais tenham
acesso total às novas produções teatrais
Por Guilherme Genestreti, Redação São Paulo
 

L
evar o teatro para quem não pode vê-lo.
É essa a premissa dos audiodescritores, Dedicação dos
profissionais para
profissionais empenhados em descrever descrever os momentos
tudo o que ocorre numa peça de teatro do espetáculo
para uma plateia de deficientes visuais - pessoas
que agora podem acompanhar espetáculos sem que
seus acompanhantes fiquem sussurrando o que se
passa em cada cena.
A proposta, que já tinha sido implantada no cine-
ma e na televisão, nunca havia sido colocada em
prática no teatro. E ainda que várias salas da cida-
de já elaborem programas de inclusão para esses
deficientes, tais como a distribuição do programa
das peças em braile - a audiodescrição ainda é uma
ferramenta pouco utilizada.
Foi em “Andaime”, peça escrita por Sérgio Roveri e
dirigida por Elias Adreato, que a técnica foi em-
pregada pela primeira vez num país da América
Latina. Isso no ano de 2007, quando a peça estreou
no Teatro Vivo, em São Paulo.
De lá pra cá, montagens como “A Cabra”, dirigida
por Jô Soares, e “Vestido de Noiva”, encenada por
Gabriel Villela, foram algumas das peças que pude-
ram fazer uso desse recurso naquele mesmo espaço,
possibilitando que portadores de deficiência visual
tivessem acesso total ao que ocorre em cena.
fotos: divulgação

Em 2009, as óperas começaram a participar dessa


tendência. O marco ocorreu em Manaus, quando
voluntários se propuseram a levar a estrutura de
cabines de som e equipamentos para narrar “San-
são e Dalila”, algo que nunca havia sido feito no Traduzindo a cena para que as narrações não atropelem as falas dos
Brasil nesse gênero de espetáculo. O processo consiste no seguinte: um profissional em atores. Para chegar a esse estágio, esses voluntá-
Com o precedente aberto, foi a vez da Secretaria audiodescrição acompanha os ensaios gerais das rios passam por um treino de 2 meses com profis-
de Cultura do Estado de São Paulo estrear a ópera peças e anota todas as movimentações e expressões sionais qualificados e se tornam aptos a operar a
“Cavalleria Rusticiana”, de Pietro Mascagni, com dos atores, descreve os cenários, figurino e também audiodescrição.
a presença de audiodescritores. No tradicional as alterações de luz. No momento das apresentações Rosilene Cortes Almeida foi uma das voluntárias
Theatro São Pedro, na capital paulista, monitores são distribuídos fones de ouvidos e dois voluntários do projeto. Analista financeira da empresa que
orientavam a plateia a se locomover pelo espaço e treinados narram o que se passa no espetáculo, gerencia o teatro, ela viu no curso a oportunidade
narravam por fone de ouvido a sinopse, a disposição aproveitando os momentos em que não há diálogos. perfeita para realizar um trabalho de inclusão
do cenário e a descrição do figurino para o público. Todo o trabalho tem que ser muito bem coordenado social: “Como fiz parte da primeira turma de audio-
descritores, fomos aprendendo juntos, construindo
e aprimorando o conhecimento que temos hoje”, diz
ela, satisfeita.
E o retorno tem sido bastante positivo, não apenas
pela repercussão do trabalho entre os deficientes
visuais. Rosilene completa que passou a gostar
ainda mais de teatro quando fez parte da au-
diodescrição: “Temos a oportunidade de sentir a
essência das peças e o que elas querem nos dizer
nos mínimos detalhes.”
Embora poucas salas teatrais do país disponham
dos recursos necessários para oferecer esses ser-
viços, a iniciativa dos audiodescritores do Teatro
Vivo já constitui um grande avanço: leva toda a
riqueza do teatro a quem só não pode enxergá-lo. 
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 19

vida e obra

Maestro russo em terra brasileira

Fotos: Reprodução
Eugênio Kusnet veio direção de Alberto D’Aversa, em 1957.
No ano seguinte, passou a integrar o conjunto
ao País revolucionar artístico do Teatro de Arena, na produção de
“Eles Não Usam Black-Tie”, elogiada obra de
o fazer teatral com seus Gianfrancesco Guarnieri. Kusnet destacou-se
métodos e genialidade como o favelado e líder operário Otávio, sendo
dirigido por José Renato. Ainda em 1958,
figurou novamente no TPA, em “A Alma Boa
Por Pablo Ribera, redação São Paulo
de Set-Suan”, primeira encenação profissional
de Bertolt Brecht no Brasil, interpretando
João P. Teles

brilhantemente na técnica distanciada, sob a

E
ugênio Kusnet não foi apenas condução de Flaminio Bollini. .
um dos maiores atores do teatro Atuou ao lado de Cacilda Becker, em 1962,
brasileiro. Foi também uma na peça “A Visita da Velha Senhora”, de
referência como diretor, professor Dürrenmatt. No mesmo ano, passou a integrar
e escritor, profissões das quais utilizou sua o elenco do Teatro Oficina, nas várias produções
vasta experiência cênica, que inclui diversos efetivadas e ministrando aulas frequentadas por
prêmios e passagens nas fases mais criativas atores da companhia e elevada parcela da classe
dos grupos do Arena e Oficina, em São teatral paulistana.
Paulo, nos quais esteve em cena em peças
importantes, como “Eles Não Usam Black- De volta à terra natal
Tie”, “Pequenos Burgueses” e “Os Inimigos”. Quando estava no auge de sua carreira, decidiu
Nascido na região russa dos Balcãs, em 1898, partir para a Rússia para frequentar cursos
um dos maiores atores de teatro que o Brasil de formação de atores, na Escola Estúdio do
já viu, Eugênio Chamanski Kuznetsov chegou Teatro de Arte e na Escola Teatral de Stuchkin,
ao Brasil em 1926, após ter se formado em anexa ao Teatro Vakhtangov, ocasiões onde
uma escola ligada ao famoso ator e diretor, aperfeiçoou seu método de criação do papel
Constantin Stanislavski. A partir daí, Kusnet e adquiriu novos conhecimentos ligados aos
se estabeleceu como o mais destacado ator de desdobramentos do método de Stanislavski.
formação stanislavskiana no teatro brasileiro, Nesse período, teve desempenho marcante
criador de papéis marcantes e emérito em peças como “Pequenos Burgueses”, de
professor de uma geração de atores nos anos 1963, vivendo o velho Bessemenov; e em 1966,
1960 e 1970. como o patriarca da família aristocrática
No começo, pelas dificuldades diante do idioma flagrada em “Os Inimigos”, 1966, dois textos
português, Kusnet precisou trabalhar no realistas de Máximo Gorki. Em 1967, fez sua
comércio, já que o teatro brasileiro não lhe última aparição nos palcos, na vanguardista
oferecia condições para atuar. Ao aprender e ter montagem de “Marat-Sade”, de Peter Weiss,
total domínio da língua, ele voltou a se dedicar de encenação de Ademar Guerra onde encarna o
corpo e alma ao teatro. aristocrata que assiste o julgamento de Marat.
Em 1951, atendeu a um convite feito pelo ator A partir de então, Kusnet passou a se dedicar
e diretor Ziembinski e, pela primeira vez no à pedagogia, escrevendo sucessivamente
Brasil atuou. Foi no espetáculo “Paiol Velho”, dois livros: “Iniciação à Arte Dramática” e
de Abílio Pereira de Almeida e com produção “Introdução ao Método da Ação Inconsciente”.
do TBC - Teatro Brasileiro de Comédia - que No início dos anos 1970, ambas as obras
Kusnet estreou no País. Neste conjunto, são fundidas e remodeladas, com o título de
Kusnet pôde utilizar todo o seu conhecimento “Ator e Método”, onde toda a sua experiência
e compartilhar do acabamento artístico e rigor teatral serviu para ensinar seus métodos aos
indispensáveis à plena criação de um papel em profissionais e interessados.
nível profissional. Em entrevista à revista “Veja”, em 1975, ao ser
A partir daí, Kusnet tornou-se conhecido do perguntado sobre o que caracteriza uma boa
grande público teatral. Esteve nos elencos do interpretação, Kusnet respondeu: “A impressão
TBC de 1951 em “Seis Personagens à Procura de absoluta verdade. Que não se confunde com
de Um Autor”, de Luigi Pirandello, direção de a mera imitação da realidade. Porque há uma
Adolfo Celi, e “Convite ao Baile”, de Jean Anouilh, eterna dualidade nas grandes interpretações: o
dirigido por Luciano Salce. ator tem de criar uma ilusão quase mágica e ao
Em 1952, estreou como diretor na peça mesmo tempo nunca perder de vista que está
“Manequim”, de Henrique Pongetti, com num palco. Há dois extremos a serem evitados:
atuação de Maria Della Costa e produção do o do ator que se entrega emocionalmente
TPA - Teatro Popular de Arte. de forma absoluta mas realiza um trabalho
Em 1956, voltou ao TBC, agora sob a condução esteticamente inconvincente; e o do ator que se
de Maurice Vaneau, em “A Casa de Chá do deixa levar por um excesso de racionalidade,
Luar de Agosto”, de John Patrick. Seu último até extinguir totalmente a paixão em seu
trabalho no conjunto é como ator em “Os desempenho”. Eugênio Kusnet faleceu em 29 de
Momentos históricos de Eugênio Kusnet nos palcos
Interesses Criados”, de Jacinto Benavente, agosto de 1975, em São Paulo, aos 77 anos.
20 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

política cultural

Novo incentivo para a Cultura


Ministro Juca Ferreira agradece parlamentares pela aprovação do PNC e ProCultura

O
ministro da Cultura, Juca Ferreira,
esteve, no final da manhã do dia 8 de
dezembro, na Comissão de Educação  e
Cultura (CEC)  da Câmara dos Depu-
tados, para agradecer o apoio dos parlamentares
à aprovação do Plano Nacional de Cultura (PNC),
instituído pela Lei nº 12.343, sancionada pelo pre-
sidente Luiz Inácio Lula da Silva no último dia 2.
O texto define os princípios e os objetivos para a
área da Cultura, direcionados aos próximos dez
anos e também cria o Sistema Nacional de Infor-
mações e Indicadores Culturais.
No mesmo dia o setor cultural obteve outra con-
quista: os parlamentares da CEC aprovaram a pro-
posta de criação do Programa Nacional de Fomento
e Incentivo à Cultura (ProCultura), que altera a
Lei Rouanet (Lei nº 8.313/91).
Ao falar durante a sessão, Juca Ferreira enalteceu a
relação sempre próxima do MinC  com o Congresso
Nacional e ressaltou o trabalho desempenhado pelos
parlamentares que compõem a Comissão de Educa-
ção e Cultura. “Conseguimos um diálogo com todos
os partidos. Obtivemos sucesso ao tirar a cultura da
insignificância em que se encontrava, como nas ques-
tões temática e orçamentária”, ressaltou o ministro.

Há muito a ser feito


“Nesses oito anos do governo Lula, seis na gestão
do ministro Gilberto Gil e dois comigo à frente do
MinC, houve um crescimento na área, uma uni-
elza fiuza/ag brasil

dade. No dia-a-dia, a cultura foi sendo retirada de


Ministro Juca Ferreira
um território pouco iluminado”, disse o ministro.
“Numa escala de 1 a 100” -  continuou Juca Ferrei-
ra – “ penso que chegamos a 36,7, nível que mostra
que há muito a ser feito no País, embora tenhamos também prestigiaram a solenidade. tendo em vista que o Vale-Cultura, que está no
avançado mais do que o esperado”. Ângelo Vanhoni disse que a Cultura, hoje, já é en- Congresso para ser aprovado, estará nas mãos dos
A sessão contou com a presença dos deputados  Ân- tendida como um direito, e que, pela primeira vez, trabalhadores que nunca tiveram esse incentivo
gelo Vanhoni, presidente da Comissão de Educação o governo brasileiro conta com um plano elaborado para o acesso à cultura.
e Cultura; Paulo Rubem Santiago, Fátima Bezerra, no sentido de que sejam viabilizadas ações estrutu- Para Alice Portugal, a Cultura brasileira deixou de
Gilmar Machado, Alice Portugal, Severiano Alves e rantes de grande importância para a área. ser a cultura dos eventos. “Nós queremos que isso
outros. Os indígenas Álvaro Tukano, do Amazonas, O deputado Paulo Santiago lembrou que é preciso seja mantido no Brasil”, expressou a parlamentar.
e Rosane de Matos, da comunidade Kaingang (RS), ampliar os equipamentos culturais em todo o país, Por: Glaucia Ribeiro Lira, Comunicação Social/MinC

Governo destina R$ 10,7 milhões para apoiar projetos artísticos e socioculturais


Uma parceria entre os ministérios da Cultura (MinC) e violência também poderão receber o apoio financeiro. projetos premiados pelo edital, com 300, espalhados
da Justiça (MJ) destinará R$ 10,7 milhões para apoiar Cada proposta contemplada poderá receber de em 24 localidades atendidas pelo Pronasci. As outras
700 projetos artísticos e socioculturais voltados para um a 30 salários mínimos (máximo de R$ 15,3 mil), unidades de Federação que têm Territórios de Paz a
pessoas entre 15 e 29 anos. O edital que regulamenta respeitando a particularidade de cada ação social. serem beneficiados pelo edital são: Rio Grande do Sul,
os Microprojetos Mais Cultura para os Tempos de Paz De acordo com o secretário executivo do Pronasci, Bahia, Acre, Alagoas, Ceará, Espírito Santo, Pará, Paraná,
foi publicado no Diário Oficial da União no dia 16 de Ronaldo Teixeira, a parceria do MinC com o MJ é Pernambuco, São Paulo e Distrito Federal. O Ministério
novembro e pretende contemplar 44 localidades de 11 importante para recuperar os jovens de comunidades da Justiça estima que a população contemplada pelo
estados e do Distrito Federal, atendidas pelo Programa carentes. “O Pronasci inova nesse conceito, pois projeto é de 2,5 milhões de habitantes.
Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci). o caminho para a redenção dessas áreas passa As inscrições para o edital Microprojetos estão abertas
A verba será destinada ao financiamento de projetos necessariamente, de um lado, pela presença da polícia até o dia 30 de dezembro. O cadastro pode ser feitos
de hip hop, grafite, rap, teatro, literatura, artesanato e, de outro, pela presença do Estado, aportando nos sites do Ministério da Cultura (www.cultura.gov.br),
e dança. Produções de vídeos e documentários, recursos para que jovens possam acessar bens culturais do Programa Mais Cultura (http://mais.cultura.gov.br) e
bem como gravação de CDs de jovens artistas de e potencializar sua cidadania”, afirmou. do Pronasci (www.mj.gov.br/pronasci).
comunidades de baixa renda e de elevados índices de O estado do Rio de Janeiro concentra boa parte dos Por: João Carlos Rodrigues / Agência Brasil 
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 21

brasília
reprodução

aos ambíguos sentimentos dos que participaram da


mudança da capital. Mas a crítica não estava entre
as intenções de Alfredo Mesquita, e sim, a prati-
cidade. “Escolhi a peça porque não havia cenário,
era tudo muito simples, apenas uma cortina e os
atores.” Declara ele no livro “A Educação pela Arte,
o caso Brasília” de Maria de Souza Duarte.    
O enredo não era mesmo dos mais palatáveis. Com
referência nas grandes tragédias gregas a peça
conta a história de um homem que após muitos
anos retorna a cidade natal para reencontrar a
mãe e a irmã. As duas mulheres administram uma
sinistra pensão, tirando parte de seu sustento do
roubo e assassinato dos hóspedes. O homem fica na
antiga casa, mas não consegue que sua identida-
de seja reconhecida. O desfecho é cruel, ele acaba
morto pela própria família.  
A peça teve uma acolhida boa, de uma plateia
ainda segmentada. “Houve bastante aceitação do
público, mais engenheiros e funcionários, candan-
gos não assistiram”, afirma Alfredo Mesquita em
“A Educação pela Arte, o caso Brasília”. O diretor
ainda retornaria para a cidade para participar de
diversos outros eventos culturais.  
O auditório da Rádio Nacional continuou com um
papel de destaque no teatro local. O radialista e dra-
maturgo Alfredo Ribeiro apresentou lá mais quatro
peças:  “Os Pioneiros”,  “A Bonequinha”, “A província

Improviso, poeira e arte


de Aratangos” e “Avenida W 33”. Alfredo foi o primei-
ro autor a residir em Brasília. Sua produção foi uma
crônica dos costumes e do cotidiano da nova capital.
Mas a apresentação que provocaria o maior impac-
to da época estava reservada para outro palco, esse
O teatro na pré-história de Brasília  utilizado apenas uma vez: a superfície do Congres-
so Nacional.  Ali se realizou a “Alegoria das Três
por Igor Miguel Pereira, redação Brasília  Capitais”, texto de Josué Montello com direção de
Chianca de Garcia e música de Heitor Villa Lobos

O
teatro no Distrito Federal começou na hora Albert Camus, apresentação dos alunos da EAD e Heckel Tavares.  
do almoço. Como eram raras as folgas entre (Escola de Arte Dramática) da USP, dirigidos por O espetáculo ocorreu em 23 de abril de 1960 e encer-
os trabalhadores da construção da cidade, a seu fundador, Alfredo Mesquita, durante o primei- rou os três dias de festividades pela inauguração da
arte tinha de vir acompanhando a digestão. ro Festival de Arte de Brasília. cidade. Quem permaneceu na Esplanada dos Minis-
A lona preta e empoeirada da carroceria dos cami- “Eu queria uma terra em que o sol matasse todas térios presenciou uma epopeia, com produção sofis-
nhões servia como palco pro elenco trazido na viagem as perguntas.”  ticada e corpo de baile, contando a trajetória do povo
ou feito no acampamento: os bonecos.   A fala da personagem Marta, a amargurada irmã do brasileiro através das três capitais de sua história.  
Os pioneiros que emprestavam aos fantoches a voz protagonista da peça, certamente não passou desper- Os anos seguintes marcariam a aparição de inú-
e os movimentos vinham, em sua maioria, do Nor- cebida pela plateia. No texto de Camus a frase é uma meros grupos de teatro amador, em Brasília. Eram
deste. De lá trouxeram a mistura de circo, feira e alusão à Argélia, mas a identificação dos presentes era formados principalmente por jovens que se apresen-
cordel que fazia dos autores os mais interessantes inevitável. Naquele setembro de 59, viviam o auge do tavam nas ruas ou em palcos improvisados. Uma
personagens do espetáculo. O texto, feito na hora período da seca, quando Brasília mostra aos visitantes geração que começava a explorar as possibilidades
ou aprendido na infância, muitas vezes era em a faceta mais cruel e desértica do seu clima.    daquela terra de poeira vermelha e avenidas largas
verso. Os enredos variavam entre temas do coti- A solidão, o tédio, a impessoalidade e a volta para e vazias. Suas identidades e caminhos seriam como
diano, religiosos ou histórias populares. O humor e um lar que não existe mais eram outros dos temas a cidade em que viviam: difusos, incertos, mais uma
a moral no final apareciam com freqüência.   de “O Mal Entendido” que podiam ser associados invenção do que uma descoberta.
O mamulengo era a mais cândida distração daqueles
tempos. Para desafogar da rotina das obras, os can- Cronologia do teatro brasiliense (primeiros anos) 
dangos iam até as farras e zonas de meretrício nos
31/05/1958: Inauguração da Rádio Nacional de Brasília, principal referência cultural da cidade nos
arredores da capital em formação. Entre a cachaça e
primeiros anos da construção.   
as moças esqueciam da saudade da terra natal, dos
turnos massacrantes e da violência dos capatazes.   20/09/1959: Apresentação da peça “O Mal entendido” de Albert Camus, com atuação dos alunos da EAD
Para a elite do futuro Distrito Federal havia outras (Escola de arte Dramática) da USP, dirigidos por Alfredo Mesquita durante a primeira Semana de Arte de
opções. Os salões do Clube Paranoá e do Brasília Brasília no auditório da Rádio Nacional.  
Palace Hotel recebiam concertos, bailes de carna- 23/04/1960: Encerramento da festa da inauguração da cidade com a peça “Alegoria das três capitais”, de Josué
val, sessões de cinema e até mesmo um show das Montello, com direção de Chianca de Garcia e música de Villa Lobos e Heckel Tavares.  
rainhas do rádio Emilinha Borba e Marlene, com a Julho de 1960: Estreia do Teatro do Estudante de Brasília, primeiro grupo teatral da cidade com a peça “ A revolta
apresentação de Grande Otelo.   dos brinquedos” de Pernambuco de Oliveira e Pedro Veiga.  
Em 31 de maio de 1958 inaugurou-se a Rádio 21/04/1966: Inauguração da sala Martins Pena, a primeira das salas do Teatro Nacional a ser aberta ao público.  
Nacional e logo seu auditório se tornou o palco 1968: Sylvia Orthof e o grupo TEMA (Teatro de Máscaras) encenam “Morte e Vida Severina” de João Cabral de Melo
dos principais eventos da nova capital, inclusive o Neto, primeiro espetáculo de grande repercussão em Brasília. 
teatro. Ali, foi encenada a primeira peça registra-
Fonte: Histórias do Teatro Brasiliense, de Fernando Villar e Eliezer de Carvalho   
da na história de Brasília, “O Mal Entendido”, de
22 Dezembro de 2010 Jornal de Teatro

história

Teleteatro: um experimento
fotos: divulgação

que deu mais


do que certo Por Daniel Pinton
Schilklaper, redação do
Rio de Janeiro

H
ouve um tempo - e há bastante ficavam a cargo do ator e diretor italiano Adolfo Celi,
tempo - em que os canais de tele- nos idos de 1956, na sessão Grande Teatro Cássio
visão davam mais importância à Muniz. Por conta de uma estafa, Celi abandonou o co-
qualidade de sua programação do mando do programa, passando-o para Sérgio Britto,
que aos números da audiência. Foi nessa épo- que estreou nova fase da programação do teleteatro
ca, nos primórdios da TV brasileira, lá pelos carioca com “Os Espectros”, de
anos 1950, que um gênero de altíssima quali- Henrik Ibsen, ao lado de nomes como Aldo de Maio,
dade ganhava destaque Fernanda Montene-
nas tardes brasileiras: gro, Fernando Torres,
era o teleteatro, que,
Fatos curiosos no teleteatro
Nathália Timberg e
como indica o nome, - Na telepeça “O Marechal”, em 1960, o persona-
Ítalo Rossi. Na capital
levava peças teatrais gem-título interpretado por Mário Lago tinha
carioca, os problemas
diretamente dos palcos um farto bigode postiço. Em uma cena crucial
de infraestrutura e de
à telinha. de bate-boca, Lago virou-se subitamente para
tempo para a realiza-
Tatiana Belinky Esta fase de experiên- Zilka Salaberry e perdeu metade do material
ção das peças na TV
cias talvez tenha sido o cenográfico. Sem titubear, Mário Lago arrancou
também era recorren-
grande elemento incentivador a outra parte do bigode e continuou a peça.
Sérgio Roveri te. A grande saída para
para o televisionamento de - No espetáculo “Santa Joana”, em 1956, no Gran-
driblar os contratem-
obras, muitas delas clássicos, de Teatro Tupi de São Paulo, a garoa não permitia
pos era a criatividade,
quando a nossa TV ainda não que uma fogueira permanecesse acesa na cena
principalmente quando
possuía adventos tecnológicos da morte de Joana D’Arc, interpretada por Maria
se tratava de espetá-
capazes de uma apresentação Fernanda. Eis que o inquisidor interpretado por
culos infantis, onde
sem erros e sem imprevistos, Xisto Guzzi teve uma brilhante ideia que mudou o
o mundo da fantasia
já que, até então, não havia o curso da História: “Levem-na para a forca!”.
tomava conta.
videoteipe e tudo era feito de - Dois anos mais tarde, em 1958, durante apresen-
Uma das grandes
primeira, para valer. “O mais tação de “Processo contra Joana” no Grande Tea-
adaptadoras desse
importante era levar produ- tro Tupi do Rio de Janeiro, com Nathália Timberg
nicho foi a russa
tos de altíssima qualidade, no papel principal, o bispo Cauchon, interpretado
Tatiana Belinky.
literatura de alto nível, que por Oscar Felipe, mudou o script e condenou a
“Ela foi chamada
raramente se encontra hoje. heroína também à forca. Até que o autor Manoel
para implantar uma
Por conta dessa ousadia, em Carlos, no papel de sentinela, sugeriu: “Monse-
programação infan-
nenhum momento passou-se nhor, não seria melhor queimá-la?”.
til na TV brasileira,
pela cabeça baixar o nível de - Na montagem de “A Vida de Cristo” na Tupi do
partiu do zero, não ha-
qualidade, os títulos eram Rio de Janeiro, Paulo Porto, no papel de Jesus,
via nada. Não havia
muito bons. Foi de um pionei- não resistiu a um assédio de uma mosca que es-
desenho, show infantil
rismo muito salutar”, ressalta tava em seu nariz e deu-lhe um tapão. O proble-
e ela partiu de uma
o dramaturgo Sérgio Roveri. ma é que nessa hora Jesus já estava crucificado.
matriz muito boa da
- Em 1959, no programa “Isto é Estória”, em
literatura brasileira.
O PRIMEIRO TELETEATRO vez da salada pedida no script do programa,
A Tatiana Belinky
A primeira obra teatral en- o contra-regra pôs serragem no prato do ator
fazia dois teleteatros
cenada na TV foi “A Vida Por Roberto Maya. O mesmo não se fez de rogado e
por semana: um mais
Um Fio”, adaptação do filme raspou o prato sem titubear.
adulto e outro mais
norte-americano “Sorry, Wrong infantil. Ela tinha
Number”, levada ao ar na TV Tupi de São Paulo, na uma semana para fazer a adaptação, dar para os
Walter Foster e Vida data de 29 de novembro de 1950. O sucesso da apre- atores decorarem e transmitir em um domingo de
Alves em “Sua Vida sentação e a boa aceitação junto aos telespectadores
me Pertence”, 1951
manhã ou à tarde sem erro. Me lembro de um caso
resultou no programa Grande Teatro das Segundas- de uma cena submarina em que ela levou um aquá-
Feiras, da mesma emissora, que estreou em 21 de rio de casa e o colocou na frente da câmera.
maio de 1951 com a montagem “Professor de Astúcia”, Ela achou que tinha sido muito ruim e deu muito
de Vicente Catalano, que ainda estava em cartaz pela certo: os peixinhos em primeiro plano e os atores
capital paulista. atrás, foi assim como tantos outros experimentos.
O elenco da Tupi, recheado de nomes como Cacilda Tinha de se fazer 30 laudas por dia e encenar tudo
Becker, Maria Della Costa, Madalena Nicol, Procópio ao vivo. Tinha de ter rapidez em escrever, dirigir e
Ferreira, Sérgio Britto, entre outros, nada deixava a decorar. Foram heróis”, resume Sérgio Roveri, que
desejar aos muitos clássicos apresentados. também é autor da biografia de Tatiana “...E Quem
No Rio de Janeiro, as principais peças do teleteatro Quiser que Conte Outra”.
Jornal de Teatro Dezembro de 2010 23

grand finale
fotos: Tuca Notarnicola

1 2 5 6

1 - Edu Reyes
3 4
2 - Fabio Ock e Trovão
8

3 - Carina Porto e Tiago


Abravanel

4 - João Fonseca
7
9
5 - José Roberto Jardim,
Anna Cecilia Junqueira e
Alex Gruli

6 - Raphael Viana

7 - Tuca Notarnicola e
11 Fernanda Machado

10 12
8 - Julio Oliveira

9 - Karina Ades, Gero


Camilo e Adriana
Londoño

10 - Cris Nicolotti

11 - Talita Castro, Paula


Burlamaqui, Daniel Alvim
13 e Miro Rizzo
14 15
12 - Vanessa Goulartt e
João Baldasserini

13 - Gabriela Alves

14 - Marcello Airoldi e
Paula Arruda

15 - Equipe Morente e
Forte Comunicação
As revistas de turismo possuem um péssimo hábito.
Querem ensinar o seu leitor a viajar sozinho,
esquecendo o agente de viagem.

POSSO VIAJAR!
a primeira revista dirigida à classe média
brasileira resolveu mudar isso.

Em todas as nossas matérias colocamos: “Para viajar com


segurança e mais barato, consulte um agente de viagem!”

A classe média brasileira vai descobrir, através


da revista POSSO VIAJAR! que o agente de viagem
é o seu anjo da guarda. É a segurança para que
o sonho das férias não vire pesadelo.

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