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Análise Matemática

- funções reais de variável real -


(versão beta)
Copyright 2009,
c Miguel Patrı́cio, Portugal.
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incluindo fotocopiar, gravar ou através do armazenamento de informação ou sistema
de recuperação, sem a permissão escrita do autor.
Prefácio

“The time has come,”the Walrus said,


“To talk of many things:
Of shoes - and ships - and sealing-wax -
Of cabbages - and kings -
And why the sea is boiling hot -
And whether pigs have wings

Lewis Caroll
Through the Looking-Glass and What Alice Found There, 1871.

Estes apontamentos são uma versão beta, pelo que se encontram ainda em fase de de-
senvolvimento. Agradece-se aos leitores que indiquem eventuais gralhas ou incorrecções.
s
Conteúdo

1 Funções reais de variável real 1


1.1 Revisões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1.1 Conceitos Básicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1.2 Algumas funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.2 Funções trigonométricas directas e inversas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
1.3.1 Continuidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
1.3.2 Diferenciabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
1.4 Cálculo Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
1.4.1 Primitivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
1.4.2 Integrais Definidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
1.4.3 Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
1.5 Equações Diferenciais Ordinárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63

2 Anexos 65
2.1 Regras de Derivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
2.2 Tabelas de Primitivas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

Index 69
Capı́tulo 1

Funções reais de variável real

No primeiro capı́tulo destes apontamentos debruçamo-nos sobre o estudo de funções


reais de variável real. Alguns dos conceitos apresentados já deverão ser conhecidos dos
leitores. Em particular, as secções 1.1 e 1.3 serão certamente familiares. Já as funções
trigonométricas inversas, o cálculo integral e as equações diferenciais ordinárias, objec-
tos de atenção das secções 1.2, 1.4 e 1.5, serão novidade para a maioria dos alunos.

1.1 Revisões

Começamos por recordar alguns conceitos básicos sobre funções. Incluimos também
algumas propriedades de funções que se presumem conhecidas.

1.1.1 Conceitos Básicos

Formalmente, uma função real de variável real f : A −→ B consiste em três partes:

• um conjunto A ⊆ R, a que chamamos de domı́nio de f;

• um conjunto B ⊆ R, a que chamamos de conjunto chegada de f;

• uma regra y = f(x), a que chamamos expressão analı́tica, que permite associar a
cada objecto x ∈ A uma única imagem f(x) ∈ B.

É usual a notação
2 Funções reais de variável real

f : A −→ B
x 7−→ y = f(x).

Muitas vezes, quando o domı́nio e o conjunto chegada da função estão subentendidos,


escrevemos apenas f para nos referirmos à função, em vez da notação mais completa
f : A −→ B. É assim frequente uma função ser dada apenas pela sua expressão analı́tica
y = f(x), que pode não ser válida para todos os valores de R. Nesse caso, define-se o
domı́nio Df da função como sendo o subconjunto de R constituido pelos objectos para
os quais a função faz sentido, isto é,

Df = {x ∈ R | f(x) ∈ R}.

Na determinação de domı́nios de funções deveremos tomar os seguintes aspectos em


consideração:

• argumentos de funções logarı́tmicas têm de ser positivos;


• argumentos de raizes têm de ser não-negativos;
• argumentos de funções trigonométricas inversas têm de pertencer aos respectivos
domı́nios;
• funções em denominador de uma função racional não se podem anular.

No parágrafo 1.2 examinaremos com atenção as funções trigonométricas inversas, que


ainda não foram introduzidas. No exemplo seguinte, ilustramos a determinação do
domı́nio de uma função.

Exemplo 1 √Consideremos a função real de variável real definida por f(x) = x − 1. Como
para x < 1, x − 1 não é um número real, o domı́nio desta função é

Df = {x ∈ R | x ≥ 1} = [1, +∞[.

Pela definição de uma função, todas as imagens têm de pertencer ao conjunto chegada.
Porém, pode haver elementos desse conjunto que não sejam imagens de nenhum ob-
jecto. Ao conjunto Df0 de todos os possı́veis valores que a função pode tomar, ou seja,

Df0 = {y ∈ B | ∃x ∈ Df : y = f(x)},

chamamos contradomı́nio , ou conjunto imagem, de f.


1.1 Revisões 3

Quando uma função é dada apenas pela sua expressão analı́tica, assumimos que o
seu conjunto chegada é o seu contradomı́nio. A função é então caracterizada pelo seu
domı́nio, contradomı́nio e expressão analı́tica. Por uma questão de simplicidade, a par-
tir de agora assumiremos que o conjunto de chegada de uma função coincide sempre
com o seu contradomı́nio ou, alternativamente, com o conjunto dos números reais.

Quando pretendermos caracterizar uma função f da qual apenas conhecemos a ex-


pressão analı́tica, bastará então apresentá-la na forma

f : Df −→ Df0
x 7−→ y = f(x),

onde Df e Df0 deverão ser substituı́dos pelos conjuntos correspondentes e f(x) pela ex-
pressão analı́tica da função.

Para melhor visualização, é usual representar-se uma função pelo seu gráfico, que con-
siste nos pares ordenados dos objectos e respectivas imagens. O gráfico de uma função f
é o conjunto

Gf = {(x, y) | x ∈ Df e y = f(x)}.

Observação: Note que podem ser usadas várias notações para representar uma mesma
função. Em vez de escrevermos f(x) = x2 + 1 podemos escrever g(x) = x2 + 1 ou mesmo
y = x2 +1 (neste último caso, subentende-se que y é uma função de x, ou seja, y = y(x)).
Também em vez da variável muda x para denotar os objectos, podemos usar qualquer
outra letra. É indiferente escrever f(x) = x2 + 1 ou f(w) = w2 + 1.

Incluimos de seguida dois exercı́cios que ilustram os conceitos anteriores.

Exercı́cio 1 Mostre que as funções definidas por

f : [1, 2] −→ R
x2 − 1
x 7−→ ,
x+1

g : {w ∈ R : 1 ≤ x ≤ 2} −→ R
w 7−→ g(w) = w − 1,

são iguais.
4 Funções reais de variável real

Resposta: Como vimos, uma função é caracterizada pelo seu domı́nio, pelo seu contradomı́nio e
pela sua expressão analı́tica. Assim, para mostrarmos que duas funções são iguais, basta mostrar
que estas três entidades são as mesmas para ambas as funções. Facilmente se verifica que f e g
têm o mesmo domı́nio [1, 2], a mesma expressão analı́tica y(x) = x − 1 e consequentemente o
mesmo contradomı́nio.

Exercı́cio 2 Considere as funções definidas por

f:R −→ R
x 7−→ (x + 1)2 − 2,

g : R+ −→ R
w 7−→ w2 + 2w − 1.

• As funções f e g são iguais?


• Determine f(2), f(z) e f(z + 1).
• Indique o domı́nio, o conjunto chegada e o contradomı́nio de f.
• Determine e esboce o gráfico de f.
• Determine os zeros de f.

As funções são elementos básicos da linguagem matemática. É pois natural que haja
várias formas de classificar uma função real de variável real f.

Paridade

f é uma função par se

∀x ∈ Df , −x ∈ Df ∧ f(−x) = f(x);

f é uma função ı́mpar se

∀x ∈ Df , −x ∈ Df ∧ f(−x) = −f(x);

Injectividade, sobrejectividade e bijectividade

f é uma função injectiva se


1.1 Revisões 5

∀x, y ∈ Df , f(x) = f(y) ⇒ x = y;

f é uma função sobrejectiva se o seu contradomı́nio coincide com o seu conjunto chegada.

f é uma função bijectiva se é simultaneamente injectiva e sobrejectiva.

Periodicidade

f é uma função periódica de perı́odo P se

∀x ∈ Df , x + P, x − P ∈ Df ∧ f(x + P) = f(x − P) = f(x);

Monotonia

f é uma função estritamente crescente se

∀x, y ∈ Df , x > y ⇒ f(x) > f(y);

f é uma função estritamente descrescente se

∀x, y ∈ Df , x > y ⇒ f(x) < f(y);

f é uma função crescente em sentido lato se

∀x, y ∈ Df , x ≥ y ⇒ f(x) ≥ f(y);

f é uma função descrescente em sentido lato se

∀x, y ∈ Df , x ≥ y ⇒ f(x) ≤ f(y);

f é uma função estritamente monótona se for estritamente crescente ou estritamente de-


screscente;

f é uma função monótona em sentido lato se for crescente em sentido lato ou decrescente
em sentido lato.

Função limitada

f é uma função limitada superiormente se


6 Funções reais de variável real

∃L ∈ R : f(x) ≤ L, ∀x ∈ Df ;

f é uma função limitada inferiormente

∃M ∈ R : f(x) ≥ L, ∀x ∈ Df ;

f é uma função limitada se for limitada superiormente e inferiormente.

Terminamos este parágrafo com uma breve revisão sobre as operações sobre funções.
Dadas duas funções f : Df → R e g : Dg → R, pode-se definir as funções soma f + g,
diferença f − g, produto f × g e quociente gf . Para n ∈ IN, definimos também as funções

potência fn e raiz n f.

Soma Diferença

f + g : Df ∩ Dg −→ R f − g : Df ∩ Dg −→ R
x 7−→ y = f(x) + g(x). x 7−→ f(x) − g(x).

Quociente
Produto

f
: Df ∩ Dg ∩ {x ∈ Dg : g(x) 6= 0} −→ R
f × g : Df ∩ Dg −→ R g
x 7−→ f(x) × g(x). f(x)
x 7−→ .
g(x)

Potência Raiz (se n é ı́mpar)


fn : Df −→ R n
f : Df −→ R
7−→ (f(x))n . 7−→ n f(x).
p
x x

Raiz (se n é par)


f : Df ∩ {x ∈ Df : f(x) ≥ 0} −→ R
n

x 7−→ n f(x).
p

Para além destas operações básicas podemos também definir a composição de funções,
bem como a inversa de uma função. Formalmente, a função composta de g : Dg −→ R
com f : Df −→ Dg , que se denota por (g ◦ f) (lê-se “g após f”) é definida como sendo
1.1 Revisões 7

g ◦ f : Df −→ R
x 7−→ (g ◦ f)(x) := g(f(x)).

No exemplo seguinte calculamos a composta de duas funções.

Exemplo 2 Considere as funções reais de variável real expressas por f(x) = x + 2 e g(t) = t2 .
A função composta g ◦ f é a função real de variável real de expressão analı́tica (g ◦ f)(x) =
g(f(x)) = g(x + 2) = (x + 2)2 .

Uma outra noção importante é a de função inversa. Dada uma função injectiva f, a sua
inversa é a única função f−1 que verifica

y = f(x) ⇔ x = f−1 (x), ∀x ∈ Df .

Observação: Em bom rigor, uma função f é invertı́vel, ou seja, tem uma inversa, se e só
se for bijectiva. Porém, como vimos antes, se não tiver sido explicitado o conjunto de
chegada de uma função, podemos considerar que este coincide com o contradomı́nio.
Uma função injectiva f : Df → Df0 será então naturalmente bijectiva, logo, invertı́vel
com inversa f−1 : Df0 → Df .

O cálculo da expressão analı́tica da inversa de uma função injectiva expressa por y =


f(x) pode fazer-se recorrendo aos passos do seguinte algoritmo. Antes de ser aplicado,
porém, deverá sempre verificar-se se f é efectivamente uma função injectiva. Se não for,
não será invertı́vel.

Algoritmo 1 [para determinar a expressão analı́tica da função inversa]

• Escreva y = f(x) e substitua f(x) pela expressão correspondente;

• Determine x em função de y;

• Substitua x por f−1 (y).

O algoritmo anterior é aplicado no exemplo seguinte.

Exercı́cio 3 Considere a função real de variável real definida por


f(x) = 2 + x − 1.

Caracterize f e f−1 , indicando os respectivos domı́nios, contradomı́nios e expressões analı́ticas.


8 Funções reais de variável real

Solução: Começamos por determinar o domı́nio e contradomı́nio de f e f−1 . Posteriormente,


encontraremos a expressão de f−1 .

Df = ?

Como o argumento da raiz tem de ser não-negativo, então x − 1 ≥ 0. Assim, Df = [1, +∞[.

Df0 = ?
√ √
Como x − 1 ≥ 0, então vem que 2 + x − 1 ≥ 2. Conclui-se que Df0 = [2, +∞[.

Como Df−1 = Df0 e Df0 −1 = Df , vem Df−1 = [2, +∞[ e Df0 −1 = [1, +∞[.

Para determinar a expressão de f−1 , notamos que f é uma função injectiva, logo é invertı́vel.
Usando o algoritmo 2, podemos escrever


• y = f(x) ⇔ y = 2 + x − 1 ⇔

• y = 2 + x − 1 ⇔ x − 1 = (y − 2)2 ⇔ x = (y − 2)2 + 1 ⇔
• f−1 (y) = (y − 2)2 + 1.

Resposta: As funções f e f−1 são caracterizadas por

f : [1, +∞[ −→ [2, +∞[



7 → f(x) = 2 + x − 1
x −

f−1 : [2, +∞[ −→ [1, +∞[


7 → f−1 (x) = (x − 2)2 + 1.
x −

1.1.2 Algumas funções

Ao longo deste curso trabalharemos com várias funções. Algumas destas, cujas definições,
propriedades e gráficos incluimos de seguida, supõem-se já conhecidas.

Funções Potência

Uma função potência é uma função cuja expressão analı́tica é da forma f(x) = kxp , onde k
e p são constantes reais e k 6= 0. Destacamos os casos seguintes, onde por simplicidade
tomamos k = 1:
1.1 Revisões 9

i) p = n, n ∈ IN. Na Figura 1.1 esboçamos o gráfico de f para diferentes valores de n.


Observe-se que quando n é par, a função é par e quando n é ı́mpar, a função é ı́mpar.

y
y
20

y=x5
4
y=x
4 10

y=x3

1 x
−1
2 y=x2

−10

−1 1 x
−20

Figura 1.1: Funções potência de expoente par (esquerda) e de expoente ı́mpar (direita).

ii) p = 1/n, n ∈ IN. A função f é designada de função raiz. Na Figura 1.2 esboçamos os
gráficos das funções raiz quadrada e raiz cúbica, de domı́nios respectivamente Df = R+ 0
e Df = R.

y
1/3
y=x

y=x1/2

1
x

Figura 1.2: Funções raiz quadrada (esquerda) e raiz cúbica (direita).

iii) p = −1. A função expressa por função, f(x) = x1 , de domı́nio Df = R \ {0}, é chamada
função recı́proca, ver Figura 1.3.

Funções Racionais

Uma das funções comuns mais simples, o polinómio, não é mais que a soma de funções
potências com coeficientes inteiros não negativos. O polinómio de grau n com coefi-
cientes ai , i = 0, 1, . . . , n tem a forma
10 Funções reais de variável real

3
y=1/x
2

−1

−2

−3

−4

−5

−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2


x

Figura 1.3: Função recı́proca

P(x) = an xn + . . . + a1 x + a0 , an 6= 0.

Na figura 1.4 apresentamos alguns gráficos de polinómios.

4 8
5
3 6

4
4
2 y=x3
y=x2
2 3 2 2
y=(x−0.5) *(x−1.5)
1
0 2
0
−2
1
−1
−4
0
−2 −6
−1
−3 −8
−2 0 2 −2 0 2 −2 0 2
x x x

Figura 1.4: Da esquerda para a direita: polinómios quadrático, cúbico e de grau 4.

Uma função racional f é a razão de dois polinómios, ou seja, a sua expressão analı́tica é
da forma

P(x)
f(x) = ,
Q(x)

onde P e Q são polinómios. Observe-se que Df = {x ∈ R : Q(x) 6= 0}. Para além disso,
1.1 Revisões 11

se P(x) = 1 e Q(x) = x, então obtemos a função recı́proca. Por outro lado, se Q(x) = 1,
então f é um polinómio.

Função Exponencial

A função exponencial de base a ∈ R+ \ {1} é expressa por

f(x) = ax .

A base a determina a monotonia da função. Assim, para a > 1, f é uma função crescente
e para a ∈]0, 1[ é uma função decrescente. A base a usada com mais frequência é o
número de Neper, representado pela letra e. Nesta base, obtemos a função exponencial
natural, ver Figura 1.5.

4
7
3.5
6
3
5
2.5
x
y=(1/2) 4 y=ex
2

1.5 3

1 2

0.5
1
0
0
−0.5
−2 −1 0 1 2 −2 −1 0 1 2
x x

1
Figura 1.5: Exponencial de base a = 2 (esquerda) e função exponencial natural (direita).

Na prática, é essencial conhecer algumas propriedades das funções exponenciais. Sejam


a, b ∈ R \ {1}. Então, quaisquer que sejam x, y ∈ R:

ax
ax+y = ax ay ; ax−y = ;
ay
(ax )y = axy ; (ab)x = ax bx ;
ax  a  x 1
= ; a−x = x ;
bx b
√ a
ax/y = ax .
y

Função Logarı́tmica
12 Funções reais de variável real

Consideremos de novo a função exponencial expressa por f(x) = ax , com a ∈ R+ \ {1}.


Tratando-se de uma função monótona, é também injectiva e admite inversa, a chamada
função logarı́tmica de base a, que denotamos por loga x. Assim, atendendo à definição
de função inversa tem-se

loga x = y ⇔ ay = x.

O domı́nio da função logarı́tmica é Df = IR+ . Indicamos de seguida algumas pro-


priedades fundamentais, válidas para x, y ∈ R+ :

loga 1 = 0 aloga x = x
x
loga (xy) = loga x + loga x; loga = loga x − loga y;
y
loga xr = r loga x.

Para x ∈ R, tem-se ainda a igualdade

loga (ax ) = x.

No caso particular em que a = e, a função logarı́tmica é designada por função logarı́tmica


natural e escreve-se

loge x = ln x.

Note-se que o logaritmo de base a pode ser escrito como uma razão entre dois logarit-
mos naturais

ln x
loga x = .
ln a

O logaritmo natural encontra-se representado na Figura 1.6.

Função Módulo

A função módulo, ou função valor absoluto, associa a cada ponto x ∈ R a sua distância à
origem
1.1 Revisões 13

1
y=ln(x)

−1

−2

−3
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2
x

Figura 1.6: Função logarı́tmica natural.

|·|:R −→ R+
0

x para x ≥ 0,
x 7−→ |x| =
−x para x < 0,

1.8

1.6

1.4
y= |x|
1.2

0.8

0.6

0.4

0.2

−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2


x

Figura 1.7: Função módulo.

Algumas propriedades fundamentais da função módulo, esboçada na Figura 1.7, são:

|x| ≥ 0; |x| = | − x|;


|x + y| ≤ |x| + |y|; |x| = a ⇔ x = a ou x = −a;
|x| < a ⇔ −a < x < a; |x| > a ⇔ x > a ou x < −a.
14 Funções reais de variável real

1.2 Funções trigonométricas directas e inversas

Comecemos por relembrar as funções trigonométricas directas seno e co-seno. Para tal, con-
sideremos uma circunferência unitária, centrada na origem, e uma semi-recta, começando
na origem e que faz com o eixo das abcissas um ângulo de amplitude θ, ver Figura 1.8.

sin q
q
1 x

cos q

Figura 1.8: Cı́rculo trigonométrico.

O ponto P de intersecção da circunferência com a semi-recta tem coordenadas (cos θ, sin θ).
As funções seno e co-seno, representadas na Figura 1.9, são periódicas de perı́odo 2π.

1 1 y=cos (x)

y=sin (x)

0.5 0.5

0 −π π 0 −π π

−0.5 −0.5

−1 −1

−5 0 5 −5 0 5
x x

Figura 1.9: Funções seno (esquerda) e co-seno (direita).

Note que
1.2 Funções trigonométricas directas e inversas 15

π
cos 0 = 1 cos( ) = 0
2
π
sin 0 = 0 sin( ) = 1.
2

Facilmente se determinam os senos e co-senos dos ângulos de amplitude múltipla de π2 .


Para além destes, é comum usar como referência os ângulos de amplitude π6 , π4 e π3 , ver
Tabela 1.1.

Tabela 1.1: Senos, co-senos, tangentes e co-tangentes de alguns ângulos.

Amplitude θ sin θ cos θ tan θ cot θ


π 1

3

3

6 2 2 3 3
√ √
π 2 2
4 2 2 1 1
π

3 1
√ √
3
3 2 2 3 3

Já definidas as funções seno e co-seno, podemos a partir destas definir outras funções
trigonométricas. Para valores de x que verifiquem cos x 6= 0 a função tangente, represen-
tada na Figura 1.10, é definida por

sin x
tan x = .
cos x

Deste modo, Dtan = {x ∈ R : x 6= π/2 + kπ, k ∈ Z}.

Para valores de x que verifiquem sin x 6= 0 a função co-tangente, representada na Figura


1.11, é definida por

cos x
cot x = .
sin x

Deste modo, Dcot = {x ∈ R : x 6= kπ, k ∈ Z}.

Definimos também as funções secante e co-secante, respectivamente, por

1
sec x = , x ∈ {x ∈ R : x 6= π/2 + kπ, k ∈ Z};
cos x
1
csc x = , x ∈ {x ∈ R : x 6= kπ, k ∈ Z}.
sin x
16 Funções reais de variável real

6
y= tan (x)

0 −π π

−2

−4

−6

−6 −4 −2 0 2 4 6
x

Figura 1.10: Função tangente.

4 y=cot x

0 −π π

−2

−4

−6

−6 −4 −2 0 2 4 6
x

Figura 1.11: Função co-tangente.

Em muitas situações pretendemos determinar o ângulo que tem um determinado seno.


Se, por exemplo, quisermos determinar o ângulo cujo seno é 1, temos de resolver a
equação

sin x = 1,

que tem muitas soluções, nomeadamente

π π π
x= , ± 2π, ± 4π, . . .
2 2 2
1.2 Funções trigonométricas directas e inversas 17

Se exigirmos que x ∈ [− π2 , π2 ], então a equação terá solução única x = π2 . Esta exigência


torna-se necessária para garantir unicidade de solução pois a função seno não é injectiva
no seu domı́nio, havendo vários objectos que têm a mesma imagem. Restrigindo o
domı́nio do seno obtemos a restrição principal do seno, a função injectiva expressa por

π π
[− , ] −→ [−1, 1]
2 2
7 → sin x.
x −

Trata-se de uma função que admite inversa, a função arco seno que representamos por
arcsin : [−1, 1] −→ [− π2 , π2 ] e que é definida por

arcsin x = y ⇔ sin y = x,

onde x ∈ [−1, 1] e y ∈ [− π2 , π
2 ]. O gráfico da função arco seno está representado na
Figura 1.12.

1.5
π

1
y=arcsin(x)

0.5

0
−1 1

−0.5

−1

−π
−1.5
−2 −1.5 −1 −0.5 0 0.5 1 1.5 2
x

Figura 1.12: Função arco seno.

Observe-se que

π π
arcsin(sin x)) = x, ∀x ∈ [− , ];
2 2
sin(arcsin x)) = x, ∀x ∈ [−1, 1].

Analogamente podemos obter as funções inversas das restrições principais das funções
co-seno, tangente e co-tangente. Restrigindo o domı́nio da função co-seno ao intervalo
18 Funções reais de variável real

[0, π] obtemos a restrição principal do co-seno, que é uma função injectiva. A sua função
inversa arccos : [−1, 1] −→ [0, π], designada por arco co-seno, é definida por

arccos x = y ⇔ cos y = x,

onde x ∈ [−1, 1] e y ∈ [0, π], ver Figura 1.13. Temos ainda

arccos(cos x)) = x, ∀x ∈ [0, π];


cos(arccos x)) = x, ∀x ∈ [−1, 1].

π
3

2.5

1.5 y=arcos (x)

0.5

−0.5
−1 −0.8 −0.6 −0.4 −0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1
x

Figura 1.13: Função arco co-seno.

A restrição principal da tangente tem como domı́nio o intervalo ] − π2 , π2 [. A sua inversa,


representada na Figura 1.14, designa-se por arco tangente. A função arctan : R −→
] − π2 , π2 [ é definida por

arctan x = y ⇔ tan y = x,

onde x ∈ R e y ∈] − π2 , π
2 [. Temos ainda

arctan(tan x)) = x, ∀x ∈ R;
π π
tan(arctan x)) = x, ∀x ∈] − , [.
2 2

De modo análogo se podem definir as inversas das restrições principais das funções
co-tangente, secante e co-secante. Na tabela 1.2 podem-se encontrar os domı́nios e con-
tradomı́nios das inversas das restrições principais de algumas funções trigonométricas.
1.2 Funções trigonométricas directas e inversas 19

1.5
π/2
y=arctan (x)
1

0.5

−0.5

−1

−π/2
−1.5

−6 −4 −2 0 2 4 6
x

Figura 1.14: Função arco co-tangente.

Tabela 1.2: Domı́nios e contradomı́nios de inversas das restrições principais de algumas


funções trigonométricas .

Função Domı́nio Contradomı́nio


arcsin [−1, 1] [− π2 , π2 ]
arccos [−1, 1] [0, π]
arctan R ] − π2 , π2 [
arccotan R ]0, π[

De seguida incluimos alguns exercı́cios relacionados com as funções trigonométricas


directas e inversas.

Exercı́cio 4 Considerando as restrições principais, calcule


2
• arcsin 2

• arccos(cos(− π4 ))

Solução:

√ √
• arcsin 2
2
= x ⇔ sin x = 2
2
∧ x ∈ [− π2 , π
2] ⇔x= π
4.
√ √
• arccos(cos(− π4 )) = arccos( 2
2 ) = x ⇔ cos x = 2
2
∧ x ∈ [0, π] ⇔ x = π
4.
20 Funções reais de variável real

Exercı́cio 5 Considere a função real de variável real definida por

f(x) = 2 + 3 arccos(−4x + 1).

Caracterize f−1 em termos do seu domı́nio, contradomı́nio e expressão analı́tica.

Solução: Notemos que Df−1 = Df0 e Df0 −1 = Df . Assim, começaremos por determinar o
domı́nio e contradomı́nio de f. Posteriormente, encontraremos a expressão de f−1 .

• Df = ?
Como Darccos = [−1, 1], então o argumento da função arccos pertence necessariamente a
este intervalo, ou seja −1 ≤ −4x + 1 ≤ 1. Assim temos

−1 ≤ −4x + 1 ≤ 1 ⇔ −2 ≤ −4x ≤ 0 ⇔ 0 ≤ x ≤ 1/2.


• Df0 = ?
0
Como Darccos = [0, π], então sabemos que

0 ≤ arccos(−4x + 1) ≤ π ⇔ 0 ≤ 3 arccos(−4x + 1) ≤ 3π ⇔
2 ≤ 2 + 3 arccos(−4x + 1) ≤ 2 + 3π.

• Para determinar a expressão de f−1 , notamos que no domı́nio onde f é invertı́vel se tem
f(x) = y ⇔ x = f−1 (y). Deste modo, usando o algoritmo 2, podemos escrever

– y = f(x) ⇔ y = 2 + 3 arccos(−4x + 1)
3 ⇔ −4x + 1 = cos( 3 ) ⇔ x = −(cos( 3 ) − 1)/4
– arccos(−4x + 1) = y−2 y−2 y−2

– f−1 (y) = −(cos( y−1


3 ) − 2)/4

Resposta: O domı́nio, o contradomı́nio e a expressão analı́tica de f−1 são dados respectivamente


por Df−1 = Df0 = [2, 2 + 3π], Df0 −1 = Df = [0, 21 ] e f−1 (y) = −(cos( y−1 3 ) − 2)/4.

Exercı́cio 6 Considere a função expressa por

π
f(x) = 2 arctan(4x + 6) − ,
2

definida na restrição principal da função tangente.

• Determine o domı́nio e o contradomı́nio de f.


π
• A equação f(x) = 2 tem raizes? Justifique.
• Caracterize f−1 .
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 21

1.3 Continuidade e Diferenciabilidade

Na secção 1.3 revemos os conceitos de continuidade e diferenciabilidade. O leitor de-


verá já estar familiarizado com estes tópicos, pressupondo-se também não ter dificul-
dades no cálculo de limites.

1.3.1 Continuidade

A velocidade escalar de um carro varia de forma contı́nua. Travando ou acelerando,


mesmo que de forma abrupta, o carro nunca poderá passar dos 0 km/h aos 100 km/h
sem que a sua velocidade escalar passe por todos os números reais entre 0 e 100. A
velocidade escalar do carro pode ser expressa por uma função do tempo que varia con-
tinuamente, sem saltos. Funções com esta caracterı́stica são designadas por funções
contı́nuas.

Uma forma simples para verificar se uma função é contı́nua consiste em esboçar e anal-
isar o seu gráfico. Assim, se for possı́vel desenhar o gráfico sem tirar o lápis do pa-
pel, trata-se de uma função contı́nua. Formalmente, a continuidade é definida em cada
ponto do domı́nio de uma função. A função real de variável real f é contı́nua no ponto
xo ∈ Df se

lim f(x) = f(x0 ).


x→x0

Então, define-se que uma função f é contı́nua no ponto x0 se se verificam em simultâneo


as três condições:

• x0 pertence ao domı́nio da função;

• limx→x0 f(x) existe;

• limx→x0 f(x) = f(x0 ).

Por outro lado, se x0 ∈ Df e f não é contı́nua em x0 , então diz-se que f é descontı́nua


nesse ponto. Para melhor ilustração destas noções, consideramos o exemplo seguinte.

Exemplo 3 Na figura 1.15 encontra-se representada uma função que aparenta ser contı́nua em
todos os pontos do conjunto R \ {x1 , x2 , x3 }.

Em x1 , a função é descontı́nua pois apesar de se verificar a primeira condição da definição de


continuidade, limx→x1 f(x) não existe (falha a segunda condição).
22 Funções reais de variável real

Em x2 , a função não é contı́nua, pois x2 ∈


/ Df (falha a primeira condição). Também não é
uma função descontı́nua em x2 , pois uma função apenas pode ser descontı́nua em pontos que
pertençam ao seu domı́nio.

Em x3 , verificam-se as duas primeiras condições da definição de continuidade, mas o limite da


função não é igual ao valor que ela tem no ponto (falha a terceira condição).

Em todos os restantes pontos, tanto quanto é possı́vel observar do gráfico, a função é contı́nua.

y4

y3
y2

y1

x1 x2 x3

Figura 1.15: Gráfico de uma função.

No exemplo anterior, a função não é contı́nua no ponto x1 porque o seu valor passa
repentinamente de y1 para y3 , sem passar por todos os valores intermédios. Porém, se
olharmos só para a função no intervalo ] − ∞, x1 ], a função comporta-se de um modo
contı́nuo. É à direita de x1 que ocorre a descontinuidade. Dizemos então que a função é
contı́nua à esquerda no ponto x1 . Generalisando, uma função f é contı́nua à esquerda no
ponto x0 se se verificam as três condições

• x0 pertence ao domı́nio da função;

• limx→x−
0
f(x) existe;

• limx→x−
0
f(x) = f(x0 ).

Analogamente, uma função f é contı́nua à direita no ponto x0 se se verificam as três


condições

• x0 pertence ao domı́nio da função;

• limx→x+
0
f(x) existe;
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 23

• limx→x+
0
f(x) = f(x0 ).

Assim, quando uma função é simultaneamente contı́nua à esquerda e à direita num


ponto do seu domı́nio, então é contı́nua nesse ponto.

A noção de continuidade de uma função num ponto pode ser estendida a conjuntos.
Diz-se que f é contı́nua num conjunto quando é contı́nua em todos os pontos do con-
junto. Em particular, diz-se que a função f é contı́nua no intervalo aberto ]a, b[ se é
contı́nua em todos os pontos do intervalo. Diz-se que a função f é contı́nua no intervalo
]a, b], aberto à esquerda e fechado à direita, se é contı́nua em todos os pontos do inter-
valo aberto ]a, b[ e é também contı́nua à esquerda no ponto x = b. Diz-se que a função
f é contı́nua no intervalo [a, b[, fechado à esquerda e aberto à direita, se é contı́nua em
todos os pontos do intervalo aberto ]a, b[ e é também contı́nua à direita no ponto x = a.
Diz-se que a função f é contı́nua no intervalo fechado [a, b] se é contı́nua em todos os
pontos do intervalo aberto ]a, b[, é contı́nua à direita no ponto x = a e é contı́nua à
esquerda no ponto x = b.

Finalmente, quando a função é contı́nua em todo o seu domı́nio, diz-se simplesmente


que a função é contı́nua. Ilustramos alguns dos conceitos agora introduzidos no exemplo
que se segue.

Exemplo 4 Na figura 1.16 encontra-se representada uma função definida em ] − ∞, x3 ], que


sabemos ser contı́nua em todos os pontos do seu domı́nio excepto possivelmente em x1 , x2 ou x3 .

Então, por análise do gráfico da função, conclui-se que a função é contı́nua à esquerda e de-
scontı́nua à direita em x = x1 . Em x = x2 , a função é contı́nua à direita e descontı́nua à
esquerda. Em x = x3 , a função é contı́nua à esquerda. Note que por x3 ser o extremo direito do
intervalo onde a função está definida, limx→x0 f(x) = limx→x− 0
f(x), logo f é também contı́nua
em x3 .

Concluimos assim que f é contı́nua no conjunto ] − ∞, x3 ] \ {x1 , x2 }.

Muitas funções conhecidas são contı́nuas, conforme enunciado na propriedade seguinte.

Teorema 1 Funções polinomiais, racionais, exponenciais, logaritmo e trigonométricas são contı́nuas.


Para além disso, a soma (consequentemente, também a diferença), produto, quociente e com-
posição de duas funções contı́nuas é uma função contı́nua.

Esta propriedade é muito útil para identificar funções contı́nuas, conforme se pode ver-
ificar no exemplo seguinte.

Exemplo 5 São contı́nuas as funções definidas por

• f(x) = cos x + x2 + 2, pois trata-se da soma de funções contı́nuas;


24 Funções reais de variável real

y4

y3
y2

y1

x1 x2 x3

Figura 1.16: Gráfico de função definida em ] − ∞, x3 ].

• g(x) = cos(x3 − 3), pois trata-se da composição de funções contı́nuas;

• h(x) = sin(tan(x))−1
2 cos(x)−x3
, pois trata-se do quociente de funções que são contı́nuas. De facto,
tanto o numerador como o denominador desta função racional são obtidos pela composição,
soma e produto de funções contı́nuas.

Frequentemente encontramos funções definidas por ramos, que pretendemos estudar


relativamente à sua continuidade. Nesses casos, é usual começar por justificar a con-
tinuidade da função em todos os pontos do seu domı́nio em que seja possı́vel fazê-
lo recorrendo à propriedade anterior. Seguidamente, recorre-se à definição de con-
tinuidade para examinar os pontos onde restam dúvidas. Como ilustração, incluimos
os dois exemplos que se seguem.

Exemplo 6 Estudemos a continuidade da função


x, x<0
f(x) = .
sin x, x ≥ 0

Para x 6= 0, trata-se de uma função contı́nua. De facto, para x > 0, a função f é um polinómio,
logo é contı́nua. Para x < 0, a função f é trigonométrica, logo é contı́nua. Apenas restam
dúvidas sobre a continuidade da função no ponto x0 = 0. Será contı́nua em 0 se se verificarem
as três condições seguintes:

• 0 ∈ Df ;

• limx→0 f(x) existe;

• limx→0 f(x) = f(0).


1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 25

A primeira condição é verificada, pois o domı́nio da função é R. Calculemos então, se existir, o


limite da função quando x → 0. Para que este limite exista, têm de existir os limites laterais.
Como para x < 0 se tem f(x) = x, então vem

lim f(x) = lim− x = 0.


x→0− x→0

Como para x > 0 se tem f(x) = sin x, podemos escrever

lim f(x) = lim+ sin x = sin 0 = 0.


x→0+ x→0

Assim, como ambos os limites laterais existem e são iguais, concluimos que

lim f(x) = 0.
x→0

Como f(0) = sin 0 = 0, a função f é contı́nua em 0.

Resposta: A função f é contı́nua em R.

Exemplo 7 Estudemos a continuidade da função

sin x
x2 +1
, x 6= 0
f(x) = .
1, x=0

Para x 6= 0, a função f é claramente uma função contı́nua, pois é definida como sendo a razão de
funções contı́nuas. Para x = 0, teremos de recorrer à definição de função contı́nua num ponto.
Assim, f será contı́nua em 0 se se verificarem as três condições seguintes:

• 0 ∈ Df ;

• limx→0 f(x) existe;

• limx→0 f(x) = f(0).

A primeira condição é verificada, pois o domı́nio da função é R. Calculemos então, se existir, o


limite da função quando x → 0. Como para x 6= 0 se tem f(x) = xsin x
2 +1 , então vem

sin x sin 0 0
lim f(x) = lim = 2 = = 0.
x→0 x→0 x2 + 1 0 +1 1
26 Funções reais de variável real

Como f(0) = 1, a função f é descontı́nua em x = 0.

Resposta: A função f é contı́nua em R \ {1}.

1.3.2 Diferenciabilidade

Recorde que a velocidade escalar de um carro pode ser expressa por uma função f de-
pendente do tempo, ou seja, y = f(t). A variação da velocidade escalar do carro, a
aceleração, pode também ser descrita por uma nova função f 0 , que é a derivada de f.
Neste parágrafo exploramos a noção de derivada de uma função.

Considere a função real de variável real f cujo gráfico se encontra representado na


Figura 1.17.

y=f(x)

f(b)

f(b)-f(a)

f(a)

h=b-a

a b x

Figura 1.17: Variação de uma função.

Observe que enquanto x varia entre a e b, a função tem a variação f(a + h) − f(a).
Ao quociente entre estas duas variações chama-se taxa de variação média de f, t.v.m., no
intervalo [a, a + h]:

f(a + h) − f(a)
t.v.m. = .
h

Podemos ainda definir a taxa de variação instantânea de f no ponto x = a como sendo


o limite seguinte, se existir,

f(a + h) − f(a)
f 0 (a) = lim .
h→0 h
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 27

Quando o limite anterior existe dizemos que f 0 (a) é a derivada de f em a e que a função
é diferenciável no ponto x = a. Geometricamente, o valor da derivada corresponde ao
declive m da recta tangente ao gráfico de f no ponto (a, f(a)). Como a equação de uma
recta com declive m e que passa pelo ponto (x0 , y0 ) é dada por

y − y0 = m(x − x0 ),

a equação da recta tangente referida é

y − f(a) = f 0 (a)(x − a).

Até agora referimo-nos à derivada de uma função f num ponto. Se considerarmos difer-
entes pontos é de esperar que a derivada seja diferente em cada um deles. Doutro modo,
a derivada, em geral, assume valores diferentes em pontos diferentes e é também uma
função. Assim, definimos a função derivada f 0 do seguinte modo

f(x + h) − f(x)
f 0 (x) := lim .
h→0 h

Note-se que o domı́nio de f 0 é o conjunto de pontos em que a função f é diferenciável,


sendo assim um subconjunto de Df .

Em termos genéricos, podemos dizer que os pontos de diferenciabilidade de uma função


f são aqueles em que a curva y = f(x) tem uma recta tangente não vertical. Por outro
lado, os pontos de não-diferenciabilidade mais comuns podem ser classificados como
pontos angulosos, pontos de descontinuidade e pontos de tangência vertical, ver Figura
1.18.
y y y

x0 x x0 x x0 x

Figura 1.18: Ponto anguloso (esquerda), ponto de descontinuidade (centro) e ponto de


tangência vertical (direita).

No exercı́cio seguinte recorre-se ao esboço de funções para justificar a sua não-diferenciabilidade


num ponto dado.

Exercı́cio 7 Considere as funções f, g e h definidas em [−4, 4] por


28 Funções reais de variável real


x, x ≤ 0
f(x) = |x|; g(x) = x 1/3
, h(x) =
3x, x > 0

Esboce o gráfico de cada uma destas funções para ilustrar a não-diferenciabilidade destas em
x = 0.

Como vimos, se uma função é descontı́nua num ponto do seu domı́nio, não é difer-
enciável. Conclui-se então que se uma função é diferenciável num ponto do seu domı́nio,
é contı́nua nesse ponto. Tal é enunciado no resultado seguinte.

Teorema 2 Seja f uma função real de variável real diferenciável no ponto x0 ∈ Df . Então a
função f é contı́nua em x = x0 .

Note-se que o recı́proco não é necessariamente verdadeiro. Ou seja, uma função pode
ser contı́nua num ponto mas não ser diferenciável nesse ponto, conforme se pode ver-
ificar analisando as funções do exercı́cio anterior. Trata-se de funções contı́nuas em R
que não são diferenciáveis em x = 0.

Por análise do esboço de uma função, pode-se intuir em que pontos esta é diferenciável.
Porém, para uma análise mais rigorosa e que nos permita determinar a expressão analı́tica
da derivada, onde esta exista, deve recorrer-se à definição de derivada, conforme ilustrado
no exemplo seguinte.

Exemplo 8 Considere a função real de variável real expressa por f(x) = 2x + 3. Para verificar
se a sua derivada existe no ponto x = x0 ∈ R, empregamos a definição. Analisemos então o
limite

f(x0 + h) − f(x0 )
lim .
h→0 h

A função será diferenciável em todos os pontos x = x0 para os quais o limite anterior exista. Vem
então

f(x0 + h) − f(x0 ) 2(x0 + h) + 3 − (2x0 + 3) 2h


lim = lim = lim = lim 2 = 2.
h→0 h h→0 h h→0 h h→0

Como este limite existe num ponto genérico x0 ∈ R, a função é diferenciável em R e a sua
derivada é expressa por f 0 (x) = 2, ∀x ∈ R.

Recorrendo novamente à definição de derivada de uma função, resolva o seguinte ex-


ercı́cio.
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 29

Exercı́cio 8 Considere a função real de variável real expressa por f(x) = ax + b. Verifique que
se trata de uma função diferenciável em todo o seu domı́nio e que f 0 (x) = a.

Em geral, é moroso verificar em que pontos uma função é diferenciável e calcular a


sua derivada usando a definição. Felizmente, sabe-se que muitas das funções com as
quais trabalhamos com mais frequência são diferenciáveis, conforme afirma o seguinte
Teorema.

Teorema 3 Funções polinomiais, racionais, exponenciais, logaritmo e trigonométricas são ex-


emplos de funções diferenciáveis. Para além disso, a soma, a diferença, produto e quociente de
duas funções diferenciáveis é uma função diferenciável.

Há também alguns resultados que nos permitem obter as expressões das derivadas de
funções mais complexas a partir de funções mais simples. Começamos por enunciar o
resultado que nos permite calcular a derivada da função composta.

Teorema 4 (Regra da cadeia / Derivada da função composta)

Sejam f : Df −→ Dg e g : Dg −→ R duas funções diferenciáveis. Então g ◦ f é uma função


diferenciável e

[g(f(x))] 0 = g 0 (f(x))f 0 (x).

O teorema seguinte estabelece a diferenciabilidade da função inversa.

Teorema 5 (derivada da função inversa)

Seja f : Df ⊆ R → R uma função invertı́vel e diferenciável em Df . Então a sua função inversa


f−1 é diferenciável e

1
[f−1 (x)] 0 =
f 0 (f−1 (x))

para todo x ∈ R que verifique f 0 (f−1 (x)) 6= 0.

Evoque os teoremas anteriores para resolver o exercı́cio seguinte.

Exercı́cio 9 Mostre que as funções do exemplo 5 são diferenciáveis.

Conforme vimos no teorema 3, as funções com que trabalhamos de forma mais fre-
quente são diferenciáveis. Para além disso, são conhecidas regras que permitem o
cálculo das expressões analı́ticas das suas derivadas, ver as tabela das derivadas 2.1-
2.2. Vejamos de seguida alguns exemplos do uso das regras da tabela.
30 Funções reais de variável real

Exercı́cio 10 Determine as expressões analı́ticas das derivadas das funções reais de variável real
expressas por


• f(x) = x;

• g(x) = cos x2 .

Solução:

• Note-se que f é uma função do tipo uk , onde k = 1/2. Conforme se pode verificar consul-
tando a tabela das derivadas, (uk ) 0 = kuk−1 u 0 . Logo,

1 −1/2 0 1
(x1/2 ) 0 = x (x) = √ .
2 2 x

Note que (x) 0 = 1, como se pode concluir do exercı́cio 8;

• Para calcular a derivada de g, usamos a regra (cos u) 0 = −u 0 sin u, onde g(x) = x2 .


Obtemos assim

(cos x2 ) 0 = −(x2 ) 0 sin x2 = −2x sin x2 .

No exercı́cio seguinte, pretende-se determinar os pontos onde uma dada função é difer-
enciável.

Exercı́cio 11 Estude a diferenciabilidade da seguinte função em IR:



x + 3, x < 0
f(x) = .
2x + 3, x ≥ 0

Que pode concluir quanto à sua diferenciabilidade?

O conhecimento das regras de derivação e a capacidade de as aplicar sem esforço é


imprescindı́vel para o bom entendimento dos assuntos estudados nestes apontamentos.

Veremos de seguida uma aplicação da diferenciação. Suponhamos que pretendemos


analisar o limite

f(x)
lim ,
x→x0 g(x)

em que
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 31

lim f(x) = lim g(x) = 0.


x→x0 x→x0

Este limite pode ou não existir, sendo chamado uma indeterminação do tipo 0/0. Quando
ocorre

lim f(x) = lim g(x) = ∞.


x→x0 x→x0

dizemos que temos uma indeterminação do tipo ∞/∞. Considere o exemplo seguinte.

Exemplo 9 Pretendemos determinar

sin x
lim .
x→0 x

Tanto o numerador quanto o denominador convergem para zero quando x → 0, pelo que se trata
de uma indeterminação do topo 0/0. Na realidade, o valor deste limite é bem conhecido, sendo
igual a 1, tal como se pode intuir da análise da Figura 1.19

1
y=(sin x )/x

−1 1

sin x
Figura 1.19: Gráfico da função expressa por f(x) = x .

Em geral, para o cálculo rigoroso de indeterminações do tipo 0/0 ou do tipo ∞/∞,


usamos a regra de Cauchy, também denominada por regra de L’Hôpital.

Teorema 6 (Regra de Cauchy) Sejam f e g funções diferenciáveis num intervalo contendo x0 e


tais que g 0 (x) 6= 0 próximo de x0 (excepto possivelmente em x0 ). Se

lim f(x) = lim g(x) = 0 ou lim f(x) = lim g(x) = ∞.


x→x0 x→x0 x→x0 x→x0
32 Funções reais de variável real

então

f(x) f 0 (x)
lim = lim 0 ,
x→x0 g(x) x→x0 g (x)

se o limite do lado direito estiver bem definido.

Observação: A regra de Cauchy afirma que, em certas condições, o limite do quociente


de duas funções é igual ao limite dos quocientes das suas derivadas. Para que a regra
possa ser aplicada, têm de ser verificadas as condições enunciadas no Teorema. Em
particular,

f 0 (x)
lim
x→x0 g 0 (x)

tem de estar bem definido, isto é, o limite tem de existir e ser finito, ou ser +∞ ou −∞.
A regra de Cauchy também é válida para limites laterais e para limites no infinito, isto
é, para limites em que x → x+
0 , x → x0 , x → +∞ ou x → −∞.

Incluimos de seguida dois exemplos em que recorremos à regra de Cauchy.

Exemplo 10 Calculemos alguns limites recorrendo à regra de Cauchy, se for possı́vel.

ln x
• limx→1 (x−1)3
Temos uma indeterminação do tipo 0/0. Como tanto o numerador como o denominador
são funções diferenciáveis, podemos tentar aplicar a regra de Cauchy. Para tal, derivamos
o numerador e o denominador e calculamos o limite:

ln x 1/x 1
lim 3
=(∗) lim 2
= + = +∞
x→1 (x − 1) x→1 3(x − 1) 0
Note-se que (∗) apenas é válido se de facto a regra de Cauchy puder ser aplicada. Como o
último limite está bem definido, concluimos que

ln x
lim = +∞.
x→1 (x − 1)3
cos x−1
• limx→0 x3
Temos de novo uma indeterminação do tipo 0/0. Como tanto o numerador como o de-
nominador são funções diferenciáveis, podemos tentar aplicar a regra de Cauchy. Para tal,
derivamos o numerador e o denominador e calculamos o limite:

cos x − 1 (∗) − sin x (∗∗) − cos x


lim = lim = lim .
x→0 x3 x→0 3x2 x→0 6x
1.3 Continuidade e Diferenciabilidade 33

De novo, a igualdade (∗) apenas é válida se de facto a regra de Cauchy puder ser aplicada.
Como obtemos de novo uma indeterminação do tipo 0/0, voltamos a tentar aplicar a regra
de Cauchy, tendo em atenção que esta poderá ainda não ser válida. Finalmente, como

− cos x
lim =∞
x→0 6x

não está definido, concluimos que a aplicação da regra de Cauchy não nos permite deter-
minar o valor do limite.

No exemplo seguinte, estudaremos a continuidade e a diferenciabilidade de uma função.

Exemplo 11 Considere a função expressa por:


sin x
f(x) = x , x 6= 0 .
1, x=0

Estudaremos a sua continuidade e de seguida a sua diferenciabilidade.

• Continuidade
Para x 6= 0, a função f é claramente uma função contı́nua, pois é definida como sendo a
razão de funções contı́nuas. Para x = 0, teremos de recorrer à definição. Assim, f será
contı́nua em 0 se

lim f(x) = f(0).


x→0

sin(x)
Como para x 6= 0 se tem f(x) = x , então

sin(x) (∗) cos(x)


lim f(x) = lim = lim = 1.
x→0 x→0 x x→0 1

Em (∗) usou-se a regra de Cauchy, pois tı́nhamos uma indeterminação do tipo 0/0.
Como f(0) = 1, a função f é contı́nua em 0.

• Diferenciabilidade
Para x 6= 0, a função f é claramente uma função diferenciável por ser definida como a razão
de funções diferenciáveis. Tal como no caso anterior teremos de recorrer à definição, agora
de derivada, em x = 0. A função f será diferenciável em 0 se existe o limite

f(h) − f(0)
lim .
h→0 h
sin(x)
Atendendo a que para x 6= 0 se tem f(x) = x e que f(0) = 1, tem-se
34 Funções reais de variável real

sin(h)
f(h) − f(0) −1 sin(h) − h (∗)
lim = lim h = lim =
h→0 h h→0 h h→0 h2
cos(h) − 1 (∗∗) − sin(h)
lim = lim = 0.
h→0 2h h→0 2

Conclui-se então que a função f é diferenciável em x = 0. Note-se que em (∗) e em (∗∗) se


aplicou a regra de Cauchy.

Resposta: A função f é contı́nua e diferenciável em R.

Note que se no último exemplo tivesse começado por estudar a diferenciabilidade da


função, concluiria que a mesma é diferenciável e como consequência, sem ter de fazer
mais contas, que é contı́nua.

1.4 Cálculo Integral

A partir da velocidade escalar de um automóvel, podemos calcular a sua aceleração,


derivando. Seria também desejável saber resolver o problema inverso, isto é, con-
hecendo a aceleração do automóvel, determinar a forma que terá a sua velocidade.
Como veremos nesta secção, é possı́vel obter informações acerca de uma função a partir
da sua derivada.

1.4.1 Primitivas

Uma primitiva, ou integral indefinido, de uma função f : Df → R é uma função difer-


enciável F : Df → R que verifica

F 0 (x) = f(x), ∀x ∈ Df .

A noção de primitiva surge em contraponto à noção de derivada. Aliás, em inglês,


enquanto a palavra para derivada é derivative, uma primitiva é designada por anti-
derivative.

A primitiva de f é denotada por

Z
P(f) = f(x)dx.
1.4 Cálculo Integral 35

À função f chamamos função integranda e a x variável de integração. Nem sempre existe


primitiva de uma função. Se existir, diz-se que a função é primitivável. As funções
contı́nuas são exemplos de funções primitiváveis, conforme enuncia o teorema seguinte.

Teorema 7 Seja f uma função real de variável real contı́nua. Então f é primitivável.

Para encontrarmos uma primitiva da função expressa por f(x) = 2x, temos de pensar
numa função F cuja derivada, em cada ponto x, é 2x. Por outras palavras, queremos
encontrar uma função F que verifique F 0 (x) = 2x. Facilmente se conclui que F(x) = x2
verifica a condição pretendida. Porém, também se poderia ter F(x) = x2 + 2 ou F(x) =
x2 − 12. Estas três funções e as demais translações verticais da função expressa por
F(x) = x2 são todas primitivas da função de expressão analı́tica f(x) = 2x, ou seja,

Z
2xdx = x2 + c, onde c ∈ R.

Em geral, a primitiva de uma função primitivável não é única. Todas as outras primiti-
vas da função poderão ser obtidas somando uma constante à função, conforme enunci-
ado na propriedade seguinte.

Teorema 8 Seja F : Df → R uma primitiva de f : Df → R. Então, qualquer que seja c ∈ R,


a função G : Df → R expressa por G(x) = F(x) + c é também uma primitiva de f. Para além
disso, se H : Df → R for outra primitiva de f, então existe uma constante d ∈ R tal que

H(x) = F(x) + d.

É usual dizer-se que a primitiva de uma função, se existir, é única a menos de constante.
Recorde que o mesmo não pode ser afirmado relativamente à derivada de uma função,
que, se existir, é única. Vejamos de seguida alguns exemplos do cálculo de primitivas.

Exercı́cio 12 Determine as primitivas das funções reais de variável real expressas por:

1. f(x) = 1;
2. g(x) = x3 ;
3. h(x) = cos x;
4. i(x) = ex .

Solução: Note que as funções em questão são contı́nuas, logo são primitiváveis.

1. Procuramos uma função real de variável real F cuja derivada seja constante de valor 1,
ou seja, F 0 (x) = 1. Esta é fácil de encontrar: a função de expressão analı́tica F(x) = x
36 Funções reais de variável real

verifica a condição desejada. Como a primitiva de uma função, se existir, é única a menos
de constante, conclui-se que
Z
1dx = x + c, c ∈ R.

4
2. A função de expressão analı́tica F(x) = x4 é uma primitiva da função de expressão g(x) =
x3 . Logo,
Z
x4
x3 dx = + c, c ∈ R.
4

3. A função de expressão analı́tica F(x) = sin x é uma primitiva da função de expressão


h(x) = cos x. Logo, Z
cos xdx = sin x + c, c ∈ R.

4. A função de expressão analı́tica F(x) = ex é uma primitiva da função de expressão i(x) =


ex . Logo, Z
ex dx = ex + c, c ∈ R.

No exemplo anterior, lidámos com quatro funções que por serem contı́nuas concluı́mos
ser primitiváveis. Nem todas as funções são primitiváveis, como veremos no exemplo
seguinte.

Exemplo 12 Considere a função de Heaviside expressa por


0, x < 0
h(x) = .
1, x ≥ 0

Se existisse uma primitiva H de h, então no intervalo ]−∞, 0[, ter-se-ia H(x) = c1 , c1 ∈ R. Já
no intervalo ]0, +∞[, viria H(x) = x + c2 , c2 ∈ R. Deste modo, H seria uma função definida
por ramos, do modo seguinte:


 c1 , x<0
H(x) = x + c2 , x > 0 .

d, x=0

onde d ∈ R. Ora, facilmente se conclui que H teria um ponto anguloso em x = 0, pelo que
não se trataria de uma função diferenciável nesse ponto, não podendo assim ser uma primitiva.
Conclui-se deste modo que h não é primitivável.

Para calcular primitivas de funções, é essencial o conhecimento de várias propriedades.


Em particular, a primitiva da soma de duas funções primitiváveis é igual à soma das
1.4 Cálculo Integral 37

primitivas das funções. Mais ainda, a primitiva do produto de uma constante por uma
função primitivável é igual ao produto da constante pela primitiva da função. Estes
resultados de linearidade são enunciados no teorema seguinte.

Teorema 9 Sejam f e g duas funções primitiváveis e α ∈ R. Então f + g e αf são funções


primitiváveis e verificam-se as seguintes propriedades:

Z Z Z
f(x) + g(x)dx = f(x)dx + g(x)dx;
Z Z
αf(x)dx = α f(x)dx.

O resultado anterior é ilustrado no exercı́cio que se segue.

Exercı́cio 13 Determine, caso exista, a primitiva da função real de variável real expressa por:

f(x) = ex + 2 cos xdx.

Solução:

Note que a função f é contı́nua, logo é primitivável. Tem-se então

Z Z Z Z Z
(∗) x (∗∗) x
f(x)dx = e dx + 2 cos xdx = e dx + 2 cos xdx =
x
= e + 2 sin x + c, c ∈ R.

A igualdade (∗) é válida pois a primitiva da soma de funções primitiváveis é igual à soma das
primitivas das funções. A igualdade (∗∗) é válida pois a primitiva do produto de uma constante
por uma função primitivável é igual ao produto da constante pela primitiva da função.

Nos exemplos apresentados o cálculo da primitiva foi muito simples. Existe um grande
número de funções cujas primitivas se obtêm ainda muito simplesmente recorrendo
a uma tabela de primitivas, ou seja, uma tabela que se obtém invertendo uma tabela
de derivadas, ver a Tabela 2.3. Tais primitivas dizem-se primitivas imediatas. Para
as calcular, basta saber escolher a regra da tabela que deve ser aplicada e fazer uso
desta, bem como eventualmente também das propriedades de linearidade enunciadas
anteriormente.

Primitivas imediatas

As primitivas imediatas são aquelas que se podem resolver recorrendo à tabela 2.3. Por
um lado, e em princı́pio, as primitivas imediatas são bastante simples de calcular, uma
38 Funções reais de variável real

vez que basta conseguir identificar qual a regra da tabela a utilizar e aplicá-la. Por outro
lado, é necessário muito treino para se conseguir determinar primitivas em tempo útil.
Por esse motivo, no que se segue, exploramos as várias fórmulas presentes na tabela.
Comecemos por resolver os exercı́cios seguintes.

Exercı́cio 14 Recorrendo à fórmula

Z
fp+1
f 0 fp dx = + c, p ∈ R \ {−1},
p+1

que se encontra na linha 1) da tabela das primitivas, calcule

R
1. x4 dx;
R 1
2. x4
dx;
R√
5
3. 3xdx;
R
4. (3 + 4x)3 dx;
R x
5. (1+x2 )3
dx;
R
6. sin3 x cos xdx;
R 1
7. x dx;

Solução:

R
1. x4 dx = ? É necessário identificar f, f 0 e p. Neste caso, f(x) = x, f 0 (x) = 1 e p = 4.
Aplicando a fórmula vem

Z
x5
x4 dx = + c, c ∈ R.
5
R 1
2. x4
dx = ? Começamos por reescrever o integral indefinido:
Z Z
1
dx = x−4 dx.
x4

Assim temos f(x) = x, f 0 (x) = 1 e p = −4. Aplicando a fórmula vem

Z
1 x−3 1
4
dx = + c = − 3 + c, c ∈ R.
x −3 3x
1.4 Cálculo Integral 39

R√
5
3. 3xdx = ? Começamos por reescrever o integral indefinido:
Z√ Z√ √ Z
5 5 5
3xdx = 3x1/5 dx = 3 x1/5 dx.

Assim temos f(x) = x, f 0 (x) = 1 e p = 15 . Aplicando a fórmula vem

Z√ √

5 5 x6/5 5 5 3 6/5
3xdx = 3 +c= x + c, c ∈ R.
6/5 6
R
4. (3 + 4x)3 dx = ? Neste caso, f(x) = 3 + 4x, f 0 (x) = 4 e p = 3. Reescrevemos então o
integral
Z Z
1
(3 + 4x)3 dx = 4(3 + 4x)3 dx,
4

de onde vem

Z
1 (3 + 4x)4 (3 + 4x)4
(3 + 4x)3 dx = +c= + c, c ∈ R.
4 4 16
R x
5. (1+x2 )3
dx = ? Começamos por reescrever o integral indefinido:
Z Z
x
dx = x(1 + x2 )−3 dx.
(1 + x2 )3

Vem então f(x) = 1 + x2 , f 0 (x) = 2x e p = −3. Deste modo,


Z Z
x 1 1
dx = 2x(1 + x2 )−3 dx = − (1 + x2 )−2 + c, c ∈ R.
(1 + x2 )3 2 4
R
6. sin3 x cos xdx = ? Neste caso, f(x) = sin x, f 0 (x) = cos x e p = 3. Aplicando a
fórmula vem
Z
1
sin3 x cos xdx = sin4 x + c, c ∈ R.
4
R 1
7. x dx = ? Neste caso, poderı́amos pensar em reescrever o integral na forma
Z Z
1
dx = x−1 dx.
x

Note, porém, que a fórmula que pretendemos usar não é válida para p = −1. Teremos
assim de recorrer a outra fórmula para resolver esta primitiva (veja o exercı́cio seguinte).
40 Funções reais de variável real

Exercı́cio 15 Recorrendo à fórmula

Z
f0
dx = ln |f| + c,
f

que se encontra na linha 3) da tabela das primitivas, calcule

R 1
1. x dx;
R sin x
2. cos x dx;
R 1
3. 3−4x dx;

Solução:

R
1. 1
x dx = ? Facilmente se identifica f(x) = x e f 0 (x) = 1. Vem então
Z
1
dx = ln |x| + c, c ∈ R.
x
R sin x
2. cos x dx = ? Facilmente se identifica f(x) = cos x e f 0 (x) = − sin x. Vem então
Z Z
sin x − sin x
dx = − dx = − ln | cos x| + c, c ∈ R.
cos x cos x
R
3. 1
3−4x dx = ? Facilmente se identifica f(x) = 3 − 4x e f 0 (x) = −4. Vem então
Z Z
1 1 −4 1
dx = − dx = − ln |3 − 4x| + c, c ∈ R.
3 − 4x 4 3 − 4x 4

Exercı́cio 16 Recorrendo à fórmula

Z
af
f 0 af dx = + c,
ln a

que se encontra na linha 2) da tabela das primitivas, calcule

R
1. 3e2x dx;
R 4x +3x x
2. 3x dx;

Solução:
1.4 Cálculo Integral 41

R
1. 3e2x dx = ? Temos de identificar uma constante a elevada a uma função f e a respectiva
derivada f 0 . Claramente vem a = e e f(x) = 2x, pelo que f 0 (x) = 2. Assim, temos
Z Z Z
2x 3 2x 3 e2x 3
3e dx = 3 e dx = 2e2x dx = + c = e2x + c, c ∈ R.
2 2 ln e 2
Recorde que ln e = 1.
R x xx
2. 4 +3
3x dx = ? Comecemos por reescrever o integral:
Z Z Z  x Z
4x + 3x x 4x 4
dx = + xdx = dx + xdx.
3x 3x 3

Por aplicação da regra, vem


Z
4x + 3x x (4/3)x 1
x
dx = + x2 + c, c ∈ R.
3 ln(4/3) 2

No exercı́cio seguinte não é identificada a regra a utilizar em cada alı́nea. Deverá ser o
leitor a procurar a regra aplicável na tabela das primitivas imediatas. Para tal, muitas
vezes terá de usar exclusão por partes, ver quais as regras que fazem sentido e distrinçar
entre estas a que deve ser utilizada.

Exercı́cio 17 Calcule as seguintes primitivas:

R
1. 5 sin(3x)dx;
R
2. 3x cos(x2 )dx;
R 1
3. cos2 (3x)
dx;
R
4. tan(4x)dx;
R
5. cot( x3 )dx;
R
6. √ 2 dx;
1−x2
R
7. √ 1 dx;
1−4x2
R
8. √ x dx;
1−x4
R 1
9. 3+9x2
dx;
R 1
10. 4+x2
dx;
R ex
11. 1+e2x
dx.

Solução:
42 Funções reais de variável real

R
1. 5 sin(3x)dx = ?
Usamos a regra número 5. Aqui, f(x) = 3x e f 0 (x) = 3. Assim, vem
Z Z
5 5
5 sin(3x)dx = 3 sin(3x)dx = − cos(3x) + c, c ∈ R.
3 3
R
2. 3x cos(x2 )dx = ?
Usamos a regra número 4. Aqui, f(x) = x2 e f 0 (x) = 2x. Assim, vem
Z Z
3 3
3x cos(x2 )dx = 2x cos(x2 )dx = sin(x2 ) + c, c ∈ R.
2 2
R 1
3. cos2 (3x)
dx =?
Recorde que sec x = 1
cosx . Assim, usamos a regra número 6, onde f(x) = 3x e f 0 (x) = 3.
Vem então

Z Z Z
1 1 1
dx = sec2 (3x)dx = 3 sec2 (3x)dx = tan(3x) + c, c ∈ R.
cos2 (3x) 3 3
R
4. tan(4x)dx = ?
Usamos a regra número 12, com f(x) = 4x e f 0 (x) = 4. Vem assim
Z Z
1 1
tan(4x)dx = 4 tan(4x)dx = − ln | cos(4x)| + c, c ∈ R.
4 4
R
5. cot( x3 )dx = ?
Usamos a regra número 13, com f(x) = x
3 e f 0 (x) = 13 . Assim, vem
Z Z
x 1 x x
cot( )dx = 3 cot( )dx = 3 ln | sin( )| + c, c ∈ R.
3 3 3 3
R
6. √ 2 dx =?
1−x2
Usamos a regra número 10, com f(x) = x e f 0 (x) = 1. Assim, vem
Z Z
2 1
√ dx = 2 √ dx = 2 arcsin(x) + c, c ∈ R.
1 − x2 1 − x2
R
7. √ 1 dx =?
1−4x2

Observe que 4x2 = (2x)2 . Usamos então a regra número 10, com f(x) = 2x e f 0 (x) = 2.
Assim, vem
Z Z
1 1 2 1
√ dx = p dx = arcsin(2x) + c, c ∈ R.
1 − 4x2 2 1 − (2x)2 2
1.4 Cálculo Integral 43

R
8. √ x dx =?
1−x4

Observe que x4 = (x2 )2 . Usamos então a regra número 10, com f(x) = x2 e f 0 (x) = 2x.
Assim, vem
Z Z
x 1 2x 1
√ dx = p dx = arcsin(x2 ) + c, c ∈ R.
1−x 4 2 2
1 − (x )2 2
R 1
9. 3+9x2
dx =?
Começamos por reescrever o integral indefinido:
Z Z
1 1 1
dx = dx.
3 + 9x2 3 1 + 3x2
√ √ √
Observe que 3x2 = ( 3x)2 . Usamos então a regra 11, com f(x) = 3x e f 0 (x) = 3.
Vem assim

Z Z √ √

1 1 3 3
2
dx = √ √ dx = arctan( 3x) + c, c ∈ R.
3 + 9x 3 3 1 + ( 3x)2 9
R 1
10. 4+x2
dx =?
Começamos por reescrever o integral indefinido:
Z Z
1 1 1
dx = dx.
4+x 2 4 x 2

1+ 2

Usamos então a regra 11, com f(x) = x


2 e f 0 (x) = 21 . Vem assim
Z Z  x 2
1 1 1/2 1
dx = 2 dx = arctan + c, c ∈ R.
4 + x2 2 1+ x 2 2
2
R ex
11. 1+e2x
dx =?
2
Observe que e2x = (ex ) . Usamos então a regra 11, com f(x) = ex e f 0 (x) = ex . Vem
assim
Z
ex
dx = arctan(ex ) + c, c ∈ R.
1 + e2x

O cálculo de algumas primitivas, chamadas não imediatas, requer técnicas apropriadas.


Na prática, quando se pretende determinar uma primitiva, começa-se sempre por veri-
ficar se esta é imediata. Apenas em caso negativo se deverá aplicar a técnica correspon-
dente.

Primitivas usando fórmulas trigonométricas


44 Funções reais de variável real

Para primitivar produtos de potências de funções trigonométricas, é útil ter em atenção


as fórmulas listadas na tabela 2.5. Distinguimos os seguintes casos.

Caso 1: Pretendemos determinar primitivas envolvendo potências ı́mpares de senos e


co-senos. Neste caso, destaca-se uma unidade à potência ı́mpar e o factor resultante
passa-se para a co-função.

Vejamos um exemplo de aplicação.

Exemplo 13 Pretendemos determinar

Z
(sin x)3 dx.

Escrevemos então

(sin x)3 = (sinx)2 sin x.

Usando a fórmula fundamental da trigonometria, vem

Z Z Z Z
3 2
(sin x) dx = (1 − (cos x) ) sin xdx = 1dx − (cos x)2 sin xdx
1
= x + (cos x)3 + c, c ∈ R.
3

Caso 2: Pretendemos determinar primitivas envolvendo potências pares de senos e co-


senos. Neste caso, passam-se as potências de funções trigonométricas para o corre-
spondente arco duplo empregando as fórmulas (sin x)2 = 21 (1 − cos 2x) e (cos x)2 =
1
2 (1 + cos 2x).

Vejamos um exemplo de aplicação.

Exemplo 14 Pretendemos determinar

Z
(sin x)2 dx.

Usando a fórmula (sin x)2 = 21 (1 − cos 2x), vem

Z Z
1 1 1
(sin x)2 dx = (1 − cos 2x)dx = (x − sin 2x) + c, c ∈ R.
2 2 2
1.4 Cálculo Integral 45

Caso 3: Pretendemos determinar primitivas envolvendo potências de tan ou cot. Neste


caso, destaca-se (tan x)2 ou (cot x)2 e aplica-se uma das fórmulas (tan x)2 = (sec x)2 − 1
ou (cot x)2 = (csc x)2 − 1.

Vejamos um exemplo de aplicação.

Exemplo 15 Pretendemos determinar

Z
(tan x)2 dx.

Usando a fórmula (tan x)2 = (sec x)2 − 1, vem

Z Z
(tan x)2 dx = (sec x)2 − 1dx = tan x − x + c, c ∈ R.

Caso 4: Pretendemos determinar primitivas envolvendo potências de sec ou csc. Neste


caso, destaca-se (sec x)2 ou (csc x)2 e ao factor resultante aplica-se uma das fórmulas
(tan x)2 = (sec x)2 − 1 ou (cot x)2 = (csc x)2 − 1.

Vejamos um exemplo de aplicação.

Exemplo 16 Pretendemos determinar

Z
(sec x)2 csc xdx.

Usando a fórmula (tan x)2 = (sec x)2 − 1, vem

Z Z Z Z
(sec x)2 csc xdx = ((tan x)2 + 1) csc xdx = (tan x)2 csc xdx + csc xdx
1
= (tan x)3 + ln | csc x − cot x| + c, c ∈ R.
3

Primitivas por partes

A técnica de primitivação por partes permite primitivar alguns produtos de duas funções
diferenciáveis u e v, ou seja, determinar

Z
u(x)v(x)dx.
46 Funções reais de variável real

Recorde a regra de derivação do produto de funções:

(uv) 0 = u 0 v + uv 0 .

Primitivando ambos os termos da equação, conclui-se que

Z Z
u vdx = uv − uv 0 dx,
0

ou, equivalentemente,

P(u 0 v) = uv − P(uv 0 ).

Observação: Na Robtenção da fórmula anterior (a regra de primitivação por partes), foi


usado o facto de (uv) 0 dx = uv+c, c ∈ R. RPorém, naRfórmula anterior não aparece nen-
huma constante c. Tal deve-se ao facto de u 0 vdx e uv 0 dx serem famı́lias de funções.
Quando se calcular estas duas primitivas, aparecerão as constantes respectivas. Por essa
razão, podemos escolher, sem perda de generalidade, c = 0.

Para aplicar a regra de primitivação por partes para calcular

Z
f(x)g(x)dx

deverá decidir-se qual é a correspondência entre as funções f e g e as funções u 0 e v. Por


outras palavras, deveremos escolher uma das funções f ou g para desempenhar o papel
de u 0 , tomando a sobrante o papel de v. A escolha é crucial. Note que na aplicação da
regra, u 0 será integrada, enquanto v será derivada. Pretende-se, com essas operações,
simplificar o problema original. No que se segue, veremos como deverá ser efectuada a
escolha.

Caso 1: Se pretendemos primitivar o produto de um polinómio por uma função expo-


nencial ou por uma função trigonométrica, deve-se escolher para desempenhar o papel
de v o polinómio.

A escolha é justificada pelo facto do polinómio se simplificar por derivação. Vejamos


um exemplo de aplicação da regra.

Exemplo 17 Pretendemos determinar

Z
x cos xdx.
1.4 Cálculo Integral 47

Note que estamos perante o produto de um polinómio por uma função trigonométrica. Assim,
tomaremos u 0 (x) = cos x e v(x) = x. Deste modo, pode-se escrever

Z Z
x cos xdx = (sin x) × x − (sin x) × (x) 0 dx.

Assim, conclui-se que

Z
x cos xdx = x sin x + cos x + c, c ∈ R.

Caso 2: Se pretendemos primitivar o produto de duas funções e apenas uma destas ad-
mite primitiva imediata, deve-se escolher-se a outra função para desempenhar o papel
de v.

Neste caso, a escolha é condicionada pelo facto de um dos factores não ter primitiva
imediata, não sendo por isso boa escolha para desempenhar o papel de u 0 . Vejamos um
exemplo de aplicação da regra.

Exemplo 18 Pretendemos determinar

Z

x − 1 ln(x − 1)dx.

Note que a função expressa por ln(x−1) não tem primitiva imediata. Assim, tomaremos u 0 (x) =

x − 1 e v(x) = ln(x − 1). Deste modo, vem

Z Z
√ 2 2 1
x − 1 ln(x − 1)dx = (x − 1)3/2 ln(x − 1) − (x − 1)3/2 dx.
3 3 x−1

Assim, conclui-se que

Z Z
√ 2 2
x − 1 ln(x − 1)dx = (x − 1)3/2 ln(x − 1) − (x − 1)1/2 dx
3 3
2 4
= (x − 1)3/2 ln(x − 1) − (x − 1)3/2 + c, c ∈ R.
3 9

Caso 3: Se pretendemos primitivar uma única função f cuja primitiva não é imediata,
consideramos o produto de f pela função constante de valor igual a 1. Devemos escolher
a função f para desempenhar o papel de v.
48 Funções reais de variável real

Neste caso, pretendemos primitivar uma única função f, cuja primitiva não é imediata.
Para poder aplicar a regra de primitivação por partes, necessitamos de um produto de
funções. Por esse motivo, escrevemos

Z Z
f(x)dx = f(x) × 1dx.

Naturalmente, não ganharemos nada em derivar a função constante, pelo que apenas
fará sentido escolher a função f para desempenhar o papel de v. Vejamos um exemplo
de aplicação da regra.

Exemplo 19 Pretendemos determinar

Z
ln xdx.

Note que a função expressa por ln x não tem primitiva imediata. Assim, escreveremos

Z
ln x × 1dx.

e tomaremos u 0 (x) = 1 e v(x) = ln x. Deste modo, vem

Z Z
1
ln x × 1dx = x ln x − x dx = x ln x − x + c, c ∈ R.
x

Caso 4: Se pretendemos primitivar um produto de funções em que ambos os factores


têm primitivas imediatas mas nenhum destes se simplifica por derivação, teremos de
aplicar sucessivamente a regra de primitivação por partes. Devemos escolher uma das
funções para desempenhar o papel de v e outra o de u 0 , mantendo os papéis da segunda
vez que aplicarmos a regra.

Neste caso, não há à partida vantagem em escolher qualquer das funções para desem-
penhar o papel de u 0 ou de v. Porém, aplicando sucessivamente a regra de integração
por partes poderá aparecer no membro à direita da igualdade uma primitiva igual à que
se pretende calcular. Deverá então tratar-se a igualdade como uma equação em que a
incógnita é a primitiva. Vejamos um exemplo de aplicação da regra.

Exemplo 20 Pretendemos determinar

Z
ex cos xdx.
1.4 Cálculo Integral 49

Note que tanto a exponencial como a função trigonométrica presentes na primitiva têm primitiva
imediata. Contudo, nenhuma destas se simplifica por derivação. Assim, escolhemos u 0 (x) = ex
e v(x) = cos x. Esta escolha é arbitrária. Aplicando a regra de primitivação por partes, vem

Z Z Z
e cos xdx = e cos x − e (− sin x)dx = e cos x + ex sin xdx.
x x x x

Voltamos agora a aplicar a regra de primitivação por partes. Desta vez, escolhemos u 0 (x) = ex e
v(x) = sin x. É importante que esta escolha seja consistente com a que foi efectuada na primeira
aplicação da regra. Podemos assim escrever

Z Z
ex cos xdx = ex cos x + ex sin x − ex cos xdx
Z
= ex (cos x + sin x) − ex cos xdx.

R
Repare que o factor ex cos xdx, a primitiva que pretendemos determinar, aparece em ambos os
membros da igualdade. Isolando a primitiva no lado esquerdo da igualdade, obtemos

Z
2 ex cos xdx = ex (cos x + sin x) + c, c ∈ R,

logo podemos concluir

Z
1 x
ex cos xdx = e (cos x + sin x) + c, c ∈ R.
2

Primitivas por substituição

Muitas vezes há substituições de variáveis que simplificam grandemente a função a


primitivar. O resultado seguinte indica-nos como podemos efectuar substituições no
cálculo de primitivas.

Teorema 10 (Primitivação por substituição)

Seja f : I ⊆ R → R uma função primitivável no intervalo I e ϕ : J ⊆ R → R uma função


primitivável em J, tal que a função x = ϕ(t) é invertı́vel. Então, efectuando a substituição
x = ϕ(t), vem
50 Funções reais de variável real

Z
f(x)dx = (1.1)
Z Z
dx
= f(ϕ(t)) dt = f(ϕ(t))ϕ 0 (t)dt. (1.2)
dt

Note que o resultado anterior afirma que para utilizarmos a substituição x = ϕ(t) num
integral temos de substituir, dentro do integral

• x por ϕ(t);
dx
• dx por dt dt.

Em muitos casos, são bem conhecidas as substituições adequadas para facilitar o cálculo
das primitivas. Na tabela 2.4 encontram-se sugestões de algumas substituições. É im-
portante sabermos interpretar a tabela. A notação R designa uma função racional. As-
sim, R(x1 , x2 , . . . , xn ) representará uma função racional com argumentos x1 , x2 , . . . , xn .
Tanto no numerador como no denominador da expressão analı́tica desta função encon-
traremos somas, diferenças, produtos e quocientes dos argumentos. Vejamos exemplos
de funções racionais.
√ √
Exemplo 21 Funções denotadas por R(x, x, a − x) são funções racionais em que no numer-

ador
√ e denominador encontramos somas, diferenças, produtos e quocientes dos factores x, x e
a − x, onde a é uma constante real. Exemplos de funções assim são

√ √
• R1 (x, x, a − x) = x1 ;
√ √ √
• R2 (x, x, a − x) = √ x ;
2−x
√ √ √
x+4 √5−x
• R3 (x, x, a − x) = 3x+ x
.

Uma vez identificado o tipo de função racional que pretendemos primitivar, podemos
proceder à substituição. Incluimos de seguida um algoritmo para calcular primitivas
por substituição usando a tabela de substituições.

Algoritmo 2 (para calcular primitivas por substituição)

• Consulte a tabela 2.4 e identifique qual a substituição x = ϕ(t) a empregar;


• Determine o domı́nio a que deve pertencer t, garantindo que a função ϕ seja invertı́vel
nesse domı́nio. Podemos então escrever x = ϕ(t) ⇔ t = ϕ−1 (x);
• Substitua x por ϕ(t) e dx por dx
dt dt = ϕ 0 (t)dt.
1.4 Cálculo Integral 51

• Resolva a primitiva.
• Substitua t por ϕ−1 (x), de modo a poder exprimir a primitiva como um função de x.

Incluimos de seguida alguns exercı́cios.

Exercı́cio 18 Recorrendo a uma substituição adequada, calcule a primitiva da função real de


variável real expressa por:

x
f(x) = √ .
1 − x2

Solução:

A substituição a usar é x = ϕ(t) = sin t. Para que a função ϕ seja invertı́vel, usamos a restrição
natural do seno, impondo t ∈ [ −π π
2 , 2 ]. Temos assim que t = arcsin x. Deste modo, efectuando
a substituição,

Z Z
x sin t
√ = cos tdt. (1.3)
1 − x2 | cos t|

Como t ∈ [ −π π
2 , 2 ], então cos t ≥ 0 e o coseno em denominador pode cortar com o coseno em
numerador e vem

Z Z
x
√ = sin tdt = − cos t + c. (1.4)
1 − x2

Exercı́cio 19 Recorrendo a substituições adequadas, calcule as primitivas das funções reais de


variável real expressas por:

ex
• g(x) = e2x +1
;
e3x
• h(x) = e2x+1
;

• i(x) = √ 1 ;
9+x2

Primitivas de funções racionais

P(x)
Recorde que uma função racional é uma função do tipo Q(x) , quociente de dois polinómios.
Há alguns exemplos mais simples de funções racionais cuja primitiva é imediata (basta,
52 Funções reais de variável real

por exemplo, considerar o caso particular em que Q(x) = 1). Quando não é este o caso,
para integrar uma função racional começamos por comparar os graus dos polinómios
em numerador e em denominador. No que se segue, veremos como devemos proceder
nalgumas situações mais comuns.

Caso 1: Pretendemos calcular

Z
P(x)
dx,
Q(x)

onde grau (P) ≥ grau(Q). Neste caso, devemos efectuar a divisão inteira de polinómios,
obtendo assim

P(x) R(x)
= I(x) + ,
Q(x) Q(x)

com grau (R) < grau(Q). Na igualdade anterior, I e R são respectivamente a parte inteira
e o resto da divisão. Deste modo, podemos escrever

Z Z Z
P(x) R(x)
dx = I(x)dx + dx,
Q(x) Q(x)

bastando assim calcular as primitivas presentes no termo direito da igualdade.

Vejamos de seguida um exemplo de aplicação desta técnica.

Exercı́cio 20 Determine a primitiva da função real de variável real expressa por

x3
f(x) = .
x−1

Solução: Como grau(P) = 3 > grau(Q) = 1, dividimos os polinómios e obtemos

x3 1
= x2 + x + 1 + .
x−1 x−1

Deste modo, como a primitiva da soma é igual à soma das primitivas (se estas existirem), temos

Z Z Z Z Z
x3 1
dx = x2 dx + xdx + 1dx + dx.
x−1 x−1
1.4 Cálculo Integral 53

Todas as primitivas do lado direito da igualdade são imediatas. Concluimos que

Z
x3 x3 x2
dx = + + x + ln |x − 1| + c, c ∈ R.
x−1 3 2

Caso 2: Pretendemos calcular

Z
P(x)
,
Q(x)

onde grau (P) < grau(Q), a primitiva não é imediata e o polinómio Q(x) = a0 xn +
a1 xn−1 + . . . + an tem raizes simples reais α1 , α2 , . . . , αn . Neste caso, começamos por
fazer a decomposição de Q em factores simples, escrevendo

Q(x) = a(x − α1 )(x − α2 ) . . . (x − αn ).

É fácil de provar que existem constantes A1 , A2 , . . . , An tais que

P(x) A1 A2 An
= + + ... + .
Q(x) x − α1 x − α2 x − αn

As constantes A1 , A2 , . . . , An podem ser calculadas pelo método dos coeficientes in-


determinados ou, em alternativa, pela regra do tapa:

 
P(x)
Ai = .
Q(x)/(x − αi ) x=αi

Uma vez conhecidas as constantes, bastará então calcular as primitivas presentes no


termo direito da igualdade

Z Z Z Z
P(x) A1 A2 An
dx = dx + dx + . . . + dx.
Q(x) x − α1 x − α2 x − αn

No exercı́cio seguinte, fazemos uso da técnica agora explanada para calcular um integral
indefinido.

Exercı́cio 21 Determine a primitiva da função real de variável real expressa por:

4−x
h(x) = .
x2 − 5x + 6
54 Funções reais de variável real

Solução: Para integrar a função h começamos por notar que o grau do numerador é menor que
o grau do denominador e não se trata de uma primitiva imediata. Para além disso, é fácil de ver
que x2 − 5x + 6 = 0 ⇔ x = 2 ∨ x = 3. Então temos

Z Z Z
4−x A1 A2
dx = dx + dx
x2 − 5x + 6 x−2 x−3

onde A1 e A2 são duas constantes reais que podemos calcular, usando a “regra do tapa”, da
seguinte forma

   
4−x 4−x
A1 = = −2, A2 = = 1.
x−3 x=2 x−2 x=3

Assim, concluimos que

Z Z Z
2−x −2 1
dx = dx + dx = −2 ln |x − 2| + ln |x − 3| + c, c ∈ R.
x2 − 5x + 6 x−2 x−3

Por vezes, pretendemos primitivar funções racionais em que o grau do numerador é


inferior ao do denominador mas o polinómio em denominador não tem raizes reais
simples. Nesse caso, não podemos aplicar as técnicas anteriores aqui apresentadas para
funções racionais. Vejamos um exemplo.

Exercı́cio 22 Determine a primitiva da função real de variável real expressa por:

1
i(x) = .
x2 + 2x + 2

Solução: O grau do denominador da função racional i é maior que o grau do numerador da


mesma. Porém, não se pode usar a “regra do tapa”, pois o polinómio Q(x) = x2 + 2x + 2 não
tem raizes. Na realidade, estamos perante uma primitiva imediata. Para a resolver é necessário
observar que Q(x) = x2 + 2x + 2 = (x + 1)2 + 1 e portanto

Z Z
1 1
2
dx = dx = arctan(x + 1) + c, c ∈ R.
x + 2x + 2 (x + 1)2 + 1

1.4.2 Integrais Definidos

Sabemos determinar áreas de algumas figuras planas, nomeadamente quadrados, triângulos,


cı́rculos, entre outras. Para o cálculo de áreas de regiões mais complexas, delimitadas
por funções, é útil o conceito de integral definido.
1.4 Cálculo Integral 55

y=f(x)
f(b)

f(a)

a b x

Figura 1.20: Região delimitada por x = a, x = b, y = 0 e y = f(x).

Consideremos a figura 1.20, delimitada por x = a, x = b, y = 0 e y = f(x). A área A


da figura sombreada a cinzento claro pode ser aproximada pela quantidade f(a)(b − a).
Ao escrevermos

A ' f(a)(b − a)

estamos a aproximar a área A pela área de um rectângulo de altura constante f(a) e


de base b − a. Deste modo, negligenciamos o facto da altura da função expressa por
y = f(x) variar ao longo do intervalo [a, b]. Trata-se, em geral, de uma aproximação
algo grosseira.

Consideremos de seguida x1 = a+b 2 e os dois rectângulos representados na figura 1.21


(esquerda) e definidos por [a, x1 ] × [0, f(a)] e [x1 , b] × [0, f(x1 )], de áreas respectivamente
A1 e A2 . Espera-se que a aproximação expressa por

A ' A1 + A2 = f(a)

seja mais precisa que a anterior, pois toma em consideração mais pontos do gráfico da
função f.

Para obtermos mais precisão, podemos generalisar este procedimento aproximando a


área A pela soma das áreas de n rectângulos, como representado na Figura 1.21 (direita).
Mais formalmente, consideramos uma partição do intervalo [a, b], isto é, um conjunto
de pontos P = {a = x0 , x1 , x2 , . . . , xn = b} que verificam

a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn = b.


56 Funções reais de variável real

y y

y=f(x) y=f(x)
f(b) f(b)

f(a) f(a)

a x1 b x a=x0 x1 x2 ... xn-1 b=xn x

Figura 1.21: Aproximação da área da região usando 2 rectângulos (esquerda) e n


rectângulos (direita).

Aproximaremos então A pela soma de Riemann de f em relação à partição P, isto é

X
n
A' f(wi )(xi − xi−1 ),
i=1

onde wi é um número qualquer no intervalo [xi−1 , xi ], para i = 1, . . . , n. Intuiti-


vamente, esperamos que quando |P| → 0, isto é, quando maxi=1, ..., n dxi → 0, onde
dxi = |xi − xi−1 |, o limite da soma de Riemann coincida com o valor exacto da área
procurada. A esse limite, se existir, chamamos integral definido de f entre a e b, que
denotamos por

Zb
f(x)dx := lim f(wi )dxi .
a |P|→0

Quando o limite existe, dizemos que f é integrável no invervalo [a, b]. A a e b chamamos
limites de integração (respectivamente limite inferior do integral e limite superior do integral)
e a x variável de integração. As funções contı́nuas são um exemplo de funções integráveis,
conforme enunciado no teorema seguinte.

Teorema 11 Seja f uma função contı́nua no intervalo [a, b]. Então, f é integrável nesse inter-
valo.

Na definição anterior de integral, pressupõe-se que o limite superior do integral é maior


que o limite inferior do integral. A definição pode ser estendida ao caso em que a > b
do seguinte modo:
1.4 Cálculo Integral 57

Zb Za
f(x)dx := − f(x)dx.
a b

Como consequência, conclui-se que

Za
f(x)dx = 0
a

Destacamos de seguida algumas propriedades de linearidade do integral definido.

Propriedade 1 Sejam f e g funções integráveis no intervalos [a, b] e k ∈ R. Então, as funções


f + g e kf são integráveis em [a, b] e tem-se
Zb Zb
kf(x)dx = k f(x)dx;
a a

Zb Zb Zb
(f(x) + g(x))dx = f(x)dx + g(x)dx.
a a a

Para além disso, como o valor do integral definido de uma função não-negativa corre-
sponde à área da região delimitada superiormente pelo gráfico da função, tem de ser
positivo. É então fácil concluir os resultados enunciados nas propriedades seguintes.

Propriedade 2 Seja f uma função integrável no intervalo [a, b] que verifica f(x) ≥ 0, ∀x ∈
[a, b]. Então,
Zb
f(x)dx ≥ 0.
a

Propriedade 3 Sejam f e g funções integráveis no intervalos [a, b] tais que f(x) ≥ g(x), ∀x ∈
[a, b]. Então,
Zb Zb
f(x)dx ≥ g(x)dx.
a a

Finalmente, é bem sabido que se subdividirmos uma figura em duas partes, a área dessa
figura é igual à soma das áreas das subfiguras. É então fácil concluir que

Propriedade 4 Sejam a < c < b e suponhamos que f é integrável nos intervalos [a, c] e [c, b].
Então, a função é integrável em [a, b] e tem-se
Zb Zc Zb
f(x)dx = f(x)dx + f(x)dx.
a a c
58 Funções reais de variável real

O resultado anterior pode ser generalizado, não sendo necessário que se verifique a <
b < c. Até agora, introduzimos a noção de integral definido de uma função e listámos
várias propriedades do mesmo. O passo seguinte consiste no cálculo de integrais definidos
de funções contı́nuas. Para tal, é essencial o Teorema Fundamental do Cálculo. Este
permite-nos calcular o integral definido, uma vez conhecida a primitiva da funcão inte-
granda, sem necessitar de recorrer a limites de somas de Riemann.

Teorema 12 (Teorema Fundamental do Cálculo) Seja f uma função real de variável real,
contı́nua e definida em [a, b]. Se F é uma primitiva de f, então

Zb
f(x)dx = F(b) − F(a).
a

Note que F 0 (x) = f(x). Por essa razão, ao relacionar uma função com a sua primitiva
(e, conversamente, uma função com a sua derivada), o teorema anterior estabelece uma
conexão entre os dois ramos do cálculo: o cálculo diferencial e o cálculo integral. Ve-
jamos de seguida alguns exemplos de aplicação do teorema anterior e das propriedades
do integral definido.

Exercı́cio 23 Determine os seguintes integrais definidos:

Rπ/4
• 0
sin xdx;
Rπ/3
• π/6
x cos(x)dx;

Solução: Note que as funções integrandas em questão são contı́nuas, logo são integráveis nos
intervalos de integração respectivos.

• Como
Z
P(sin x) = sin xdx = − cos x + c,

então (como é indiferente a primitiva que usamos, escolhemos c = 0), aplicando o Teorema
Fundamental do Cálculo, vem

Z π/4 √
π/4 π/4 π 2
sin xdx = [− cos x]0 = −[cos x]0 = −cos( ) + cos 0 = − + 1.
0 4 2

• Usando integração por partes, vem


Z Z
P(x cos x) = x cos xdx = (sin x) × x − (sin x) × (x) 0 dx.
1.4 Cálculo Integral 59

Assim, do teorema fundamental do cálculo conclui-se que

Z π/3 Z
π/3
x cos xdx = [x sin x − sin xdx]π/6 =
π/6
π/3
= [x sin x + cos x]π/6
π π π π π π
= sin( ) + cos( ) − sin( ) − cos( )
3 √ 3 3 √ 6 6 6
π(2 3 − 1) 1 − 3
= + .
12 2

1.4.3 Aplicações

Neste parágrafo estudamos algumas aplicações do cálculo integral.

Cálculo de áreas

Começamos por examinar o cálculo de áreas de regiões planas. Destacamos os casos


seguintes.

Caso 1: Pretendemos determinar a área A da região plana limitada por y = 0, x = a,


x = b e pelo gráfico de uma função f contı́nua em [a, b], ver a Figura 1.22.

Distinguimos duas situações.

Quando a função f é não negativa, ou seja, f(x) ≥ 0, ∀x ∈ [a, b], vem

Zb
A= f(x)dx.
a

Quando a função f é não positiva, ou seja, f(x) ≤ 0, ∀x ∈ [a, b], vem

Zb
A=− f(x)dx.
a

Caso 2: Pretendemos determinar a área A da região plana limitada por x = a, x = b


e pelos gráficos das funções f = f(x) e g = g(x), contı́nuas em [a, b] e satisfazendo
f(x) ≥ g(x), ∀x ∈ [a, b], ver Figura 1.23 (esquerda).

Então, independentemente dos sinais das funções f e g, vem


60 Funções reais de variável real

Zb
A= f(x) − g(x)dx.
a

Caso 3: Pretendemos determinar a área A da região plana limitada por y = c, y = d


e pelos gráficos das funções f = f(y) e g = g(y), contı́nuas em [a, b] e satisfazendo
f(y) ≥ g(y), ∀y ∈ [c, d], ver Figura 1.23 (direita).

Então, independentemente dos sinais das funções f e g, vem

Zd
A= f(y) − g(y)dy.
c

y y

y=f(x)
f(b)
a b

f(a) f(a)

y=f(x)
f(b)
a b x

Figura 1.22: Áreas de regiões delimitadas por uma função não negativa (esquerda) e
uma função não positiva (direita).

y y

d
y=f(x)
f(b)

x=f(y)
x=g(y)
g(b)
f(a) y=g(x)

g(a) c

a b x g(d) f(d) g(c) f(c) x

Figura 1.23: Áreas de regiões delimitadas por duas funções f = f(x) e g = g(x) (es-
querda) e por duas funções f = f(y) e g = g(y) (direita).
1.4 Cálculo Integral 61

Exercı́cio 24 Calcule as áreas das regiões seguintes:

• a região D definida por:



1 1
D = (x, y) ∈ IR : x ≥ 0 ∧ ≤ y ≤
2
.
4 x+1
• a região compreendida entre as curvas x = y2 e x = 12 y2 + 1.

Cálculo de volumes

O integral definido permite também calcular o volume de sólidos, em particular de


sólidos de revolução. Um sólido de revolução é aquele que se obtém rodando uma região
plana em torno de uma recta do plano. A recta em torno da qual se processa a revolução
é chamada eixo de revolução. Destacamos os casos seguintes.

Caso 1: Pretendemos determinar o volume R do sólido de revolução obtido pela rotação,


em torno de y = 0, de uma região plana limitada por x = a, x = b, y = 0 e pelo gráfico
de uma função f = f(x), contı́nua em [a, b], ver a Figura 1.24.

Então, independentemente do sinal da função f, vem

Zb
V=π [f(x)]2 dx.
a

Caso 2: Pretendemos determinar o volume R do sólido de revolução obtido pela rotação,


em torno de x = 0, de uma região plana limitada por y = c, y = d, x = 0 e pelo gráfico
de uma função g = g(y), contı́nua em [c, d], ver a Figura 1.25.

Então, independentemente do sinal da função g, vem

Zd
V=π [g(y)]2 dy.
c

Caso 3: Pretendemos determinar o volume R do sólido de revolução obtido pela rotação,


em torno de y = 0, da região plana limitada por x = a, x = b, e pelos gráficos das
funções f = f(x) e g = g(x), contı́nuas em [a, b] e tais que f(x) ≥ g(x), ∀x ∈ [a, b]. A
região plana encontra-se representada na figura 1.23 (esquerda).

Então, independentemente dos sinais das funções f e g, vem

Zb
V=π ([f(x)]2 − [g(x)]2 )dx.
a
62 Funções reais de variável real

Caso 4: Pretendemos determinar o volume R do sólido de revolução obtido pela rotação,


em torno de x = 0, da região plana limitada por y = c, y = d, x = 0 e pelos gráficos das
funções f = f(y) e g = g(y), contı́nuas em [c, d] e tais que f(y) ≥ g(y), ∀y ∈ [c, d]. A
região plana encontra-se representada na figura 1.23 (direita).

Então, independentemente dos sinais das funções f e g, vem

Zd
V=π ([f(y)]2 − [g(y)]2 )dy.
c

y y

y=f(x) y=f(x)

a b x a b x

Figura 1.24: Sólido de revolução obtido pela rotação, em torno de y = 0, de uma região
plana limitada por x = a, x = b, y = 0 e pelo gráfico de uma função f, contı́nua em
[a, b].

Resolva agora o exercı́cio seguinte.

Exercı́cio 25 Considere a região D delimitada pela recta de equação y = 0 e pelas curvas


definidas por y = sin x e y = cos x, com x ∈ [0, π2 ].

1. Esboce a região D.

2. Calcule a área dessa região.

3. Calcule o volume do sólido obtido por rotação da região D em torno do eixo dos xx.

4. Indique uma expressão, usando integrais, que permita calcular o volume do sólido obtido
por rotação da região D em torno do eixo dos yy.
1.5 Equações Diferenciais Ordinárias 63

y y

d d

x=g(y) x=g(y)

c c

x x

Figura 1.25: Sólido de revolução obtido pela rotação, em torno de x = 0, de uma região
plana limitada por y = c, y = d, y = 0 e pelo gráfico de uma função f, contı́nua em
[a, b].

1.5 Equações Diferenciais Ordinárias

...
Capı́tulo 2

Anexos

2.1 Regras de Derivação

Sejam u e v funções reais de variável real diferenciáveis, k ∈ R e a ∈ R+ .

Tabela 2.1: Tabela de derivadas (parte 1).

Função Derivada
u+v u0 + v0
u−v u0 − v0
uv u0 v + uv0
u u0 v − uv0
v v2
(v ◦ u) (x) v0 [u (x)] u0 (x)
 1
u−1 [u (x)]
u0 (x)

uk kuk−1 u0
au u0 au ln a
66 Anexos

Tabela 2.2: Tabela de derivadas (parte 2).

u0
loga u
u ln a
sin (u) u0 cos (u)

cos (u) −u0 sin (u)

tan (u) u0 sec2 (u)

cotg (u) −u0 csc2 (u)

sec (u) u0 sec (u) tan (u)

csc (u) −u0 csc (u) cotg (u)

u0
arcsin (u) √
1 − u2
−u0
arccos (u) √
1 − u2
u0
arctan (u)
1 + u2
−u0
arccotg (u)
1 + u2

s
2.2 Tabelas de Primitivas 67

2.2 Tabelas de Primitivas

Primitivas quase imediatas

Seja f uma função real de variável real diferenciável e seja C uma constante real ar-
bitrária.

Tabela 2.3: Tabela de primitivas quase imediatas.

Função Primitiva
fP+1
1) fP f0 + C, P ∈ R\ {−1}
P+1
af
2) af f0 + C, a ∈ ]0, +∞[ \ {1}
ln a
f0
3) ln |f| + C
f
4) f0 cos f sin f + C

5) f0 sin f − cos f + C

6) f0 sec2 f tg f + C

7) f0 csc2 f − cotg f + C

8) f0 sec f tg f sec f + C

9) f0 csc f cotg f − csc f + C

f0
10) √ arcsin f + C ou − arccos f + C
1 − f2
f0
11) arctg f + C ou − arccotg f + C
1 + f2
12) f0 tg f − ln |cos f| + C

13) f0 cotg f ln |sin f| + C


 
f π
ln |sec f + tg f| + C ou ln tg
0

14) f sec f + +C
2 4

f
15) f0 csc f ln |csc f − cotg f| + C ou ln tg + C
2
68 Anexos

Primitivas por substituição

Sejam a, m, r, s constantes reais positivas. A notação R(...) indica que se trata de uma
função racional (envolvendo apenas somas, diferenças, produtos e quocientes) do que
se encontra entre parêntesis.

Tabela 2.4: Tabela de substituições.

Tipo de função Substituição

1) R(arx , asx , ...) amx = t onde m = máx.div.comum(r, s, ...)



2) R(x, a2 − x2 ) x = a sin t ou x = a cos t

3) R(x, a2 + x2 ) x = a tg t

4) R(x, x2 − a2 ) x = a sec t
√ √
5) R(x, x, a − x) x = a sin2 t ou x = a cos2 t
√ √
6) R(x, x, a + x) x = a tg2 t
√ √
7) R(x, x, x − a) x = a sec2 t

Primitivas usando fórmulas trigonométricas

Tabela 2.5: Fórmulas trigonométricas.

sin2 x + cos2 x = 1 tg2 x + 1 = sec2 x 1 + cotg2 x = cosec2 x

1 1
sin2 x = (1 − cos(2x)) cos2 x = (1 + cos(2x)) sin(2x) = 2 sin x cos x
2 2
Índice

arco co-seno, 18 inversa, 7


arco seno, 17 derivada, 29
arco tangente, 18 invertı́vel, 7
limitada, 6
co-seno, 14 inferiormente, 6
co-tangente, 15 superiormente, 5
coseno logarı́tmica, 12
restriçãi principal, 18 logarı́tmica natural, 12
módulo, 12
derivada, 27 monótona
função composta, 29 crescente em sentido lato, 5
função inversa, 29 descrescente em sentido lato, 5
em sentido lato, 5
eixo de revolução, 61 estritamente, 5
exponencial, 11 estritamente crescente, 5
estritamente descrescente, 5
função, 1 par, 4
ı́mpar, 4 periódica, 5
bijectiva, 5 potência, 6, 8
caracterizar, 3 primitivável, 35
composta, 6 produto, 6
derivada, 29 quociente, 6
conjunto chegada, 1 racional, 10, 51
contı́nua, 21 raiz, 6, 9
contı́nua à direita, 22 recı́proca, 9
contı́nua à esquerda, 22 sobrejectiva, 5
contradomı́nio, 2 soma, 6
derivada, 27 trigonométrica, 14
diferença, 6
diferenciável, 27 gráfico, 3
domı́nio, 1
exponencial, 11 imagem, 1
exponencial natural, 11 indeterminação, 31
expressão analı́tica, 1 integração
imagem, 2 limite inferior, 56
injectiva, 4 limite superior, 56
integrável, 56 limites, 56
integranda, 35 variável, 35, 56
70 Index

integral definido, 56
integral indefinido, 34

linearidade, 37, 57
logaritmo, 12

módulo, 12

objecto, 1

polinómio, 9
potência, 8
primitiva, 34
imediata, 37
não imediata, 43
por substituição, 49

racional, 10
raiz, 9
recı́proca, 9
recta tangente, 27
Regra da cadeia, 29
regra de Cauchy, 31
regra de L’Hôpital, 31
regra do tapa, 53
Riemann (soma de), 56

sólido de revolução, 61
seno, 14
restrição principal, 17

tangente, 15
restrição principal, 18
taxa de variação média, 26
Teorema
Fundamental do Cálculo, 58

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