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Segregação Residencial e Relações de Vizinhança no Bairro de

Apipucos (Recife-PE).

SILVA, Luciana Souza da1, 2; PAULA, Eline Silva de1,2; SILVA, Katielle Susane do
Nascimento1,2; VALENÇA, Mariana Rabêlo1,2; BITOUN, Jan3.

1. Estudante de Graduação em Geografia – Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);


2. Bolsista do Programa de Educação Tutorial de Geografia - PET;
3. Orientador e co-autor. Professor Adjunto do Departamento de Ciências Geográficas -
UFPE.
Segregação Residencial e Relações de Vizinhança no Bairro de
Apipucos (Recife-PE).

Resumo

Este trabalho objetiva discutir a segregação residencial, num bairro tradicional da


periferia recifense, onde se constata a presença de moradias de diversos estratos
sociais em localidades muito próximas umas das outras. Após identificar essa
estrutura sócio-espacial compósita, com base em observação do habitat e nas
denominações dadas a essas localidades pelos moradores, levantou-se a hipótese
que essa estrutura sócio-espacial favoreceria contatos entre estratos sociais
diversos, o que permite, segundo a bibliografia consultada, maiores oportunidades
àqueles, majoritários no bairro constituídos por famílias de baixa renda. A aplicação
de questionários visando verificar se esses contatos ocorriam em especial em
algumas instituições e espaços públicos do bairro, levou ao resultado que eram
bastante limitados, decrescentes e mais freqüentes entre os jovens e entre os
idosos. Constatou-se que, de forma generalizada, havia uma naturalização da
diferença social, sabendo cada um o seu lugar, o que pode ser um limite à facilitação
da mobilidade social, tradicionalmente associada a bairros com estratos sociais
diversificados.

2
Introdução

As desigualdades sociais, na fase atual do modo de produção capitalista, se


apresentam de maneira contraditória trazendo reflexos na distribuição territorial da
sociedade, havendo assim, uma proximidade entre grupos que ocupam posições
antagônicas no espaço social. A homogeneização de grupos pertencentes à mesma
camada social distancia relações de contato que possa haver entre os diferentes
estratos da sociedade, acentuando desta forma a segregação residencial.

De acordo com a maioria das publicações dedicadas à questão urbanística e


sociológica atual, espera-se que a proximidade entre estratos sociais diferenciados,
o que remete aos efeitos de vizinhança, reafirme a hipótese de que a proximidade
geográfica entre estes, permita maiores possibilidades de ascensão social aos
menos favorecidos. Ao contrario: “Na medida em que a rede de relações sociais de
um indivíduo ou família contribui para seu acesso a empregos e a serviços públicos,
o isolamento social presente nas áreas segregadas tende a contribuir
significativamente para a redução das oportunidades das famílias residentes nesses
locais” (TORRES, 2004, p.43).

O tema segregação residencial conta com uma vasta literatura e Recife apresenta
interesse mais específico dentro do mesmo, em função desta cidade à priori, não
apresentar uma segregação geográfica marcante, mas distâncias sociais bem
acentuadas. Assim, busca-se discutir nesse trabalho, os efeitos da segregação
residencial e sua evolução a partir de estudos realizados no bairro de Apipucos,
localizado na região Noroeste da cidade do Recife, em Pernambuco, em que esse
fenômeno vem apresentando nas últimas décadas características peculiares, no
qual, o isolamento da população mais favorecida pode ser evidenciado em um único
condomínio fechado, apontando um quadro crescente de segregação, conquanto, no
mesmo bairro se mantêm vizinhas localidades, com padrões arquitetônicos mais
comuns, habitadas por estratos sociais diferentes.

Para compreender tal evolução, fez-se necessário o resgate histórico e social do


bairro, evidenciando então, as diferentes formas sociais de ocupação no mesmo.
Através de pesquisas bibliográficas, entrevistas, aplicações de questionários (de

3
caráter semi-estruturado e exploratório) que foram aplicados em instituições e em
áreas de lazer contemplando as diversas faixas etárias, juntamente com dados
obtidos no Atlas de Desenvolvimento Humano no Recife (uso de mapas viários e
imagem de satélite) e pesquisa de campo (obtenção de boa parte do material
iconográfico), desta forma, reuniu-se um corpus documental para elaboração deste
trabalho.

1. Segregação Residencial

A palavra segregação vem do latim segregatio, e significa colocar uma rés fora do
rebanho.
Segundo Roberto Lobato a segregação residencial é um processo que dá origem a
uma organização espacial formada por áreas de “forte homogeneidade social interna
e de forte disparidade social entre elas”. Para identificar a segregação residencial,
faz-se necessário reconhecer bem os diferentes estratos que residem numa
determinada região através da homogeneidade/heterogeneidade das características
(renda, status, ocupação da população, habitat) compartilhadas pelas famílias de um
dado estrato e que separam os diversos estratos.

Essa separação é uma tendência que vem se acentuando nas formas atuais de
segregação residencial: os condomínios fechados. A população mais abastada cria
seus próprios limites de moradia de forma que possa evidenciar e caracterizar sua
renda, status, prestígio e poder através do seu próprio reflexo: a residência. “À
medida que surgem bairros exclusivos das camadas superiores, ao mesmo tempo
em que as camadas médias e, eventualmente, as inferiores, em processo de
mobilidade social descendente, são deslocadas para outros bairros, diminuindo,
assim, o grau de mistura social das cidades” (RIBEIRO, 2003, p.01).

A redução ou a ausência do contato social entre as populações mais favorecida e


menos favorecida vem reorganizando delimitações sócio-espaciais dentro da
sociedade. Haveria uma integração cada vez mais forte entre aqueles que se
denominam iguais, e assim a formação de várias unidades internamente
homogêneas e com diferenças extraordinárias entre si.

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A localização e a forma da moradia refletem a situação de acessibilidade e conforto
que são desfrutadas pela população ali residente. Quanto à localização, existe uma
diferenciação em sua distribuição no que diz respeito ao conforto e qualidade, pois
as melhores áreas são ocupadas pela parcela da população de maior poder
aquisitivo, em função deste fator está atrelado ao preço da terra, que é uma
mercadoria disponível àqueles que são detentores de recursos. Assim a parcela da
população que detém pouco recurso ou apenas o suficiente para sobreviver ocupa
áreas menos favorecidas e menos dotadas de serviços, sendo identificadas à
condição sócio-econômica de seus moradores observando a forma e localização de
sua moradia. “O como e onde se fundem originando uma tendência à
homogeneização do conteúdo social dos bairros, a qual assume maior uniformidade
nos extremos, isto é, nos grupos de renda mais elevada e mais baixa” (CORRÊA,
2005, p.133).

1a. Efeito da Vizinhança

Diversos estudos evidenciam que crescer em bairros com alta concentração de


pobreza tem efeitos negativos relevantes em termos de avanço educacional,
emprego, gravidez na adolescência e atividade criminal (DURALAUF, 2001;
BRIGGS, 2001; CÁRDIA, 2000)1. A maneira como cada comunidade ou bairro está
organizado segundo a estrutura de estratificação social resulta para população
menos favorecida em maior ou menor facilidade de acesso aos recursos que
permitam o bem-estar da mesma.

O convívio social entre os diferentes estratos que compõem a sociedade moderna, é


defendido por muitos autores como um fator que proporciona maiores possibilidades
de ascensão às pessoas que estão inseridas no estrato social menos favorecido.
Devido à proximidade geográfica, acredita-se que uma cadeia de relações sociais
entre os diversos estratos, sejam eles comerciais, pessoais ou de trabalho, teria
maior probabilidade de ocorrer.

1. In: TORRES, Haroldo da Gama. Segregação Residencial e Políticas Públicas: São Paulo na
década de 1990, p.43. Disponível em: < http: www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v19n54/a03v1954.pdf>,
acesso em 26 jul. 2007.

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Outro reflexo da vizinhança diz respeito à infra-estrutura e a prestação de serviços
públicos, notadamente mais acessíveis nas áreas de maior valorização imobiliária, e
conseqüentemente desdenhados nas áreas carentes.

A estrutura social heterogênea proposta para as relações de vizinhança se depara


com um terrível paradoxo, no qual, a presente sensação de insegurança vivida nas
ruas leva a uma segregação ainda maior dificultando o convívio entre os estratos e,
intensificando a tendência de homogeneização de grupos na vizinhança. Se num
primeiro momento a proximidade promete gerar oportunidades reais de ascensão
social aos menos favorecidos por meio do acesso à educação, emprego e prestação
de serviços na vizinhança mais abastada, vêem-se em xeque quando o nível de
relação entre ricos e pobres de uma mesma comunidade se limita à caridade e à
subserviência, sem um compromisso de responsabilidade social para com os
vizinhos menos favorecidos.

O caso de Recife, e mais especificamente o bairro de Apipucos vem comprovar que


a proximidade geográfica forte não é a única variável que deve ser levada em
consideração quando consideramos a importância da vizinhança. Pois, assim como,
as diferenças sociais, as distâncias de contato e de convívio em Apipucos são
também marcantes.

1b. Configuração Espacial do Recife

Localizada na foz dos rios Capibaribe e Beberibe, conhecida por ter inúmeros canais
e pontes que atravessam os rios, Recife (Figura 1) está situada na Região
Metropolitana, que recebe seu nome e, compõe também a região da Zona da Mata.

Constitui, além de uma dimensão institucional2, uma aglomeração urbana


fisicamente contínua em sua parte central, havendo deslocamentos pendulares dos
seus habitantes no cotidiano dos seus afazeres de trabalho, estudos, lazer e
consumo.

2. Informações institucionais ver CONDEPE/FIDEM;

6
Fonte: googleimages.com,
2007.

Fonte: Atlas de
Melhoramentos, 2006.

Figura 1 – Mapa de Recife (No detalhe bairro de Apipucos)


Fonte: Adaptado de Atlas de Desenvolvimento Humano no Recife, 2005.

Há, no entanto, na sua periferia, ao norte, sul e oeste, núcleos urbanos separados
da aglomeração contínua por áreas não edificadas e amplas áreas rurais, ocupadas
principalmente por canaviais3. É nesse contexto de ocupação que o bairro de
Apipucos, objeto de nosso estudo está inserido.

2. Apipucos: configuração sócio-espacial de um bairro recifense

Um aglomerado urbano, diante da dinâmica que caracteriza a ocupação do solo,


transforma-se a todo o momento e, o bairro em estudo não está longe disso. Situado
na Região Metropolitana do Recife, especificamente na Região Político
Administrativa (RPA) 3, o bairro de Apipucos (Figura 2), grosso modo, limita-se com
os seguintes bairros: Ao norte com o Córrego do Jenipapo e Macaxeira, ao sul com

3. Mais informações ver: BITOUN, Jan. O que revelam os índices de desenvolvimento humano. In:
Atlas do Desenvolvimento Humano no Recife.

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os bairros de Caxangá, Iputinga e Monteiro, ao leste com o Alto do Mandu e a
Macaxeira e a oeste com o de Dois Irmãos. Localiza-se na Várzea do Capibaribe, ao
norte do Recife. Inserido na história do Recife desde os seus primórdios
correspondendo às terras do Engenho Monteiro, originalmente, posteriormente
Engenho Apipucos, que significa do indígena Apé - puc, encruzilhada de caminhos.
Com uma área de 1,3 km2, possui uma população de aproximadamente 3.467
habitantes e densidade demográfica de 2.606,8 hab/km2, distribuídos em 867
domicílios. (Fonte: Atlas de Desenvolvimento Humano no Recife, 2005).

O bairro se apresenta como diz SANTOS (1994)4,


“Apipucos, bairro afastado do centro do Recife uns dez quilômetros,
é, também saída para o noroeste de Pernambuco. Sua entrada é
feita pela barragem do açude, que recebe seu nome. A beleza das
águas remansas, represadas pelo Apipucos comunica paz [...] As
residências, construídas nos dois altos, se bem que modesta, trazem
à memória a arquitetura árabe.”

Figura 2 - Localização do bairro de Apipucos - PE.


Fonte: Atlas de Desenvolvimento Humano no Recife.

4. SANTOS, Manuel Heleno R. dos. Recife. In: VERAS, Lúcia Maria de Siqueira Cavalcante. De Apé-
Puc a Apipucos – numa encruzilhada, a construção e permanência de um lugar urbano. Recife:
Bagaço, 199.p48.

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2a. Configuração sócio-espacial de Apipucos: sua história

Das malhas territoriais e sociais do bairro de Apipucos, a das famílias tradicionais e


as ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) – neste trabalho será trabalhada a ZEIS
de Apipucos (Figura 3), são as mais marcantes.
O território referente, hoje a ZEIS Apipucos surgiu a partir do elo criado por boa
parte dos funcionários dos Maristas (União Norte Brasileira dos Irmãos Maristas – e
que hoje funciona a Faculdade Marista) que para ficarem mais próximos do trabalho
começaram a ocupar algumas áreas próximas ao açude, terras pertencentes, parte
aos Maristas e parte à família de Othon Bezerra de Melo (que deu origem ao nome
do loteamento das casas de alta classe).

A ocupação foi se adensando, fazendo surgir às primeiras intervenções, como: A


Rua dos Caetés, Rua Laura Gondim e a Serra Pelada (conjunto de casas
populares). Estas áreas, atualmente, caracterizam uma das zonas mais carentes de
ofertas básicas de infra-estrutura do bairro de Apipucos.

Na sua dissertação de mestrado Lúcia Veras (VERAS, 1999.) reconstituiu a


evolução urbana de Apipucos, no decorrer da qual as terras do engenho
foram sendo edificadas: o casario histórico, as mansões com amplos jardins, as
vilas e os assentamentos populares compõem um ambiente urbano de grande
diversidade arquitetônica e paisagística, parcialmente protegido por instrumentos
legais constando na Lei de Uso e Ocupação do Solo (Zona Especial de Proteção
Ambiental, em torno do açude, Zona Especial de Preservação do Patrimônio
Histórico - o casario).

2b.A configuração sócio-espacial na visão dos moradores

A configuração sócio-espacial é um retrato fundamentando a análise social do


território: consiste em apresentar a estratificação social espacialmente distribuída,
vista nos estudos contemporâneos como divisão social da cidade e expressão da
segregação residencial, tal como geralmente identificada pelo planejamento para
elaboração de políticas urbanas.

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No Brasil, as primeiras análises sociais do território para fins de planejamento
urbano foram realizadas no Rio de Janeiro, São Paulo e em Belo Horizonte sob o
comando da SAGMACS (Sociedade de Análise Gráfica Mecanográfica Aplicada aos
Contextos Sociais) e a ajuda do padre Lebret. Tal análise tinha o objetivo de
identificar os problemas do processo de urbanização e subsidiar a elaboração das
leis de uso e ocupação do solo urbano. Havia na época (e talvez ainda haja)
ausência ou deficiência de uma análise social sistemática, informações sociais
organizadas para fornecer aos gestores um monitoramento dos objetivos e efeitos
territoriais das intervenções públicas.

Os moradores de Apipucos indireta e inconscientemente fazem a análise social do


território ao “demarcarem” áreas segundo o poder aquisitivo de cada grupo. No
entanto, é percebido que essa subdivisão informal é feita como se cada grupo
tivesse seu lugar pré-definido, funciona como uma espécie de novo mapeamento
local utilizando a nova configuração para fins de localização no próprio bairro. Então,
para melhor entendimento sobre a(s) segregação(ões) apipuquense(s), além da
delimitação formal de bairro (feita pela Prefeitura da cidade do Recife), e da
incorporação das Zeis (Zona especial de interesse social) ali existentes no espaço
do bairro (Zeis Apipucos, Zeis Vilas Marcionila-Mussum e Zeis Vila São João)
levamos em consideração ainda a visão da população no que diz respeito à
configuração sócio-espacial da localidade.

Tanto na aplicação dos questionários quanto nas entrevistas a população remete


(Figura 3 e 4) às seguintes subdivisões:

1) “Alto da igreja” (É a parte do Sítio histórico do bairro);


2) “O pessoal da praça” (Fazem menção às residências localizadas na praça
do bairro e aos seus respectivos moradores);
3) “Ladeira do Colégio” (É a Rua Itatiaia - onde está localizado o Colégio
Conceição Marista);
4) “Ladeira dos Maristas” (É a Rua Jorge de Tarso Neto – onde era
localizada a unidade Norte-brasileira dos irmãos Maristas, hoje em dia,
Faculdade Marista);
5) “Mussú” (Vila que faz parte da Zeis Marcionila-Mussum);

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6) “Laura Gondim” (Rua que faz parte da Zeis Apipucos);
7) “Caetés” (Onde está localizado o conselho de moradores, é uma das ruas
mais habitadas do bairro, compõe a Zeis Apipucos);
8) “Serra Pelada” (“Conjunto” de assentamentos populares que juntamente
com a Rua dos Caetés e a Rua Laura Gondim formam a Zeis
Apipucos);
9) “Areial” (Comunidade às margens do Rio Capibaribe);
10) “Do outro lado do açude” (Loteamento de residências de alto padrão social
localizado na margem do açude de Apipucos que é oposta à Ruas dos
Caetés e Rua Laura Gondim.

1b
2f

2g

1a 3a

3d
2a
3e 2e 1a
3f 2b 3b
3c
2c
1c 2d

1d

LEGENDA 2

Assentamentos populares Espaços residenciais de classe Espaços estudados (lugares e


média/alta instituições de encontro)
1a - ZEIS Apipucos (R. dos Caetés
e R. Laura Gondim). 2a - R Jorge T. Neto 3a - Açude de Apipucos
1b – ZEIS Apipucos (Comunidade 2b - Vila Soberana 3b - Igreja Católica
de Serra Pelada) 2c - Vila Carolina 3c - Praça pública
1c – ZEIS Vila Macionila/Mussum 2d - R. Aliança 3d - Colégio Conceição Marista
1d – Comunidade do Areial 2e - R. Itatiaia 3e - Fundação Joaquim Nabuco
2f e 2g - Loteamento Othon Bezerra 3f - Fundação Gilberto Freyre

Figura 3 - Mapa de Apipucos (ZEIS Apipucos)


Fonte: Adaptado de Atlas de Desenvolvimento Humano no Recife, 2005.

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Figura 4 – Da esquerda p/ direita
Residências de classe média/alta, assentamentos populares e instituições no
bairro.
Autor: L. Silva, 2007.

3. A convivência dos estratos sociais em Apipucos: Existem


encontros?

O convívio entre as diferentes camadas sociais residentes em Apipucos vem


declinando. No entanto, mesmo havendo uma redução significativa das relações
sociais, o bairro permanece peculiar em comparação a outras localidades recifenses
mais fortemente segregadas (SILVA, 2007, p. 25). A redução paulatina das relações
de convívio não pode ser simplesmente explicada pelas tendências das cidades
modernas ao aumento da distância espacial entre estratos sociais diferenciados
provocando a redução da probabilidade de um possível encontro entre ricos e
pobres.

Através de relatos recolhidos em pesquisa de campo para o presente trabalho, foi


verificado que houve maior interação social entre os grupos no passado e, ao nos
referirmos ao Loteamento Othon Bezerra (Condomínio de residências de alto padrão
da década de 80 e que se mantém fechado) as camadas populares se mostram um

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pouco retraídas e reclamam no geral de discriminação por parte desses novos
vizinhos, moradores daquele loteamento.

Em se tratando de segregação em território apipuquense, podemos dizer que está


em processo de transição. Enquanto por parte das famílias tradicionais e abastadas
há ainda um convívio com classes populares (mesmo em menor ocorrência), isso
não ocorre com a outra parte do grupo de alto poder aquisitivo (o loteamento Othon
Bezerra) que vem seguindo a tendência acima exposta: segregar-se.

3a. Os espaços e instituições de encontro

A análise de alguns micro-espaços existentes em Apipucos merece destaque para


se entender como, a partir deles, muitos habitantes identificam o bairro; através
dessa identificação, é então criado um elo que, por ser comum a todos, poderia
juntar indivíduos de diversos estratos sociais. Os ditos micro-espaços são
representados pela praça do bairro (que serve como lazer e local de encontros), o
açude (que funciona através da pesca como trabalho e também como lazer com a
apreciação da paisagem e de banhos), a igreja católica (que “reúne” os grupos
sociais antagônicos para fins religiosos), o colégio Conceição Marista (como
formação educacional de boa parte das crianças e jovens do bairro e ainda como
lazer através das festas oferecidas pelo mesmo na qual a comunidade pode
participar) e as fundações, centro culturais e de pesquisa, Gilberto Freyre e Joaquim
Nabuco (como fonte de pesquisa para os jovens que realizam estudos, lazer – no
caso particular da fundação Gilberto Freyre, que apóia o grupo de idosos do bairro,
proporcionando-lhes lazer).

Esses micro-espaços são utilizados principalmente por jovens dos diferentes


estratos sociais, pela facilidade de se relacionar com os indivíduos de mesma faixa
etária surgindo novas amizades através de interesses em comum, e pelos idosos,
pelo fato de terem tido a mais tempo maior contato e por conta da prática religiosa.

Quanto à freqüência da utilização desses micro-espaços, nos dias de hoje, grosso


modo é significativa. Tais micro-espaços, pela importância que assumem na

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identidade do bairro, como foi então descrito acima proporcionam ainda, mesmo que
de forma parcial, encontros entre os diferentes grupos sociais residentes nas suas
localidades (com exceção do grupo que se mantém isolado no loteamento Othon
Bezerra) permitindo assim algum convívio ou interação entre os estratos sociais,
(mesmo esses “laços” tendo sido mais estreitos em outras épocas), evidências
essas comprovadas nos questionários aplicados (Figura 5).

Figura 5 - Gráfico da análise das influências dos micro-espaços na


interação dos grupos sociais no bairro.
Autor: L. Silva, 2007.

3b. A naturalização das diferenciações sociais

O Estado democrático, fundamentado na igualdade dos cidadãos perante a lei,


pressupõe a mobilidade social e necessita que todos os indivíduos mantenham certa
crença de que essa seja a regra geral para o perfeito encadeamento das relações
sociais. No caso de um bairro, alguns elementos apresentam relevância fundamental
para a manutenção do bem-estar coletivo e, de seu compartilhamento, poderiam
surgir relações mais contínuas entre indivíduos de estratos sociais diferentes. No
entanto, intensos níveis de segregação dentro do mesmo bairro podem dificultar
esses contatos entre os moradores com faixas de renda acentuadamente distintas.
A apropriação dos recursos educacionais, econômicos e políticos pela população de
maior renda, a perpetuação desta em uma condição privilegiada por gerações, abala
as expectativas dos vizinhos “pobres” com relação à sua própria ascensão; mas,

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contraditoriamente, nota-se também que exemplos de indivíduos que obtiveram
sucesso profissional em tal vizinhança, suscitam a esperança nos demais.

O fato é que, com a modernidade, tem-se mostrado cada vez mais difícil o convívio
entre vizinhos de estratos sociais diferentes; o processo de segregação residencial
cresce, ao passo que as relações cotidianas envolvendo vários estratos sociais vão
se perdendo e tornam-se homogeneizadas no seio de cada estrato.

Essa homogeneidade interna gera um sentido de identidade entre as pessoas e seu


lugar de convívio. Desta forma o contato entre as pessoas pertencentes a estratos
diferentes torna-se tão crítico que a realidade do outro aparece inalcançável. Tal
condição de impossibilidade de contato começa a se naturalizar, à medida que o
estrato menos favorecido passa a aceitar incondicionalmente essa realidade.

No bairro de Apipucos, as respostas aos questionários permitiram identificar que, de


uma maneira geral, o limitado convívio entre a população pobre e a de maior poder
aquisitivo é tido como um fato natural, uma vez que é aceita (naturalmente) a idéia
que cada estrato, apesar de dividir o mesmo espaço geográfico, o bairro, não se
dispõe à convivência social. “Os ricos não querem conversa com os pobres, e se eu
fosse rica faria o mesmo, estaria fechada a sete chaves”, relata a dona de casa de
69 anos (moradora do bairro).

A percepção da alteridade nas relações entre vizinhos de estratos diferenciados é,


sobremodo, comprometida com a aceitação acrítica da segregação (naturalização),
ao passo que tal circunstância se perpetua, o “outro” transmuta-se numa contradição
do “eu”. A visão tida do outro como um ser naturalmente fadado ao sucesso em
oposição ao “eu”, talvez venha elucidar o lado perverso do fenômeno da
naturalização; invertendo-se o foco pode haver acomodação quando se tem o outro
numa posição de subserviência ou meramente ignorado, o que se constata nas
entrevistas dos indivíduos do estrato favorecido.

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Considerações Finais

A configuração sócio-espacial de Apipucos apresenta uma grande diversidade em


uma área pequena. Verifica-se a presença de dois tipos de segregação residencial:
a primeira radical e moderna com condomínio fechado (autosegregação), a segunda
mais sutil entre tradição e modernidade envolvendo as formas mais antigas de morar
(casarões, vilas, assentamentos populares), segundo a descrição dos lugares pelos
moradores. Esta última, não deixa de ser segregação, sobretudo com base na
naturalização da diferença social expressa de forma clara pelos estratos pobres e
pela indiferença ou atitude caritativa dos estratos favorecidos, delimitando a
funcionalidade de lugares e instituições que poderiam ser de encontros e que o são
parcial e esporadicamente, sobretudo para os mais jovens, no Colégio Conceição
Marista e para os idosos, na igreja.

Para os adultos inseridos no mercado de trabalho, uma hipótese para a pouca


freqüência dos encontros poderia ser formulada para guiar desdobramentos ou
aprofundamentos futuros dessa pesquisa: haveria uma experiência extra-residencial
que reforçaria a diferença social e realimentaria a naturalização desta, fechando um
círculo vicioso e limitando relações entre estratos, que ainda, como foi visto, ocorrem
entre idosos e entre jovens. Para verificar essa hipótese, seria necessária a
elaboração de uma pesquisa acerca das inserções profissionais dos moradores. Já,
para os jovens, caberia identificar se as oportunidades existentes no período de
formação, decorrentes das possibilidades oferecidas em um bairro socialmente
heterogêneo, são plenamente aproveitadas, podendo levar a uma mobilidade social
ascendente ou se há limites decorrentes das situações familiares e das condições
habitacionais (ambiente e infra-estrutura para estudar) e se, também, ao passar na
idade adulta, se deparam com as poucas oportunidades do mercado de trabalho
recifense.

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Referências Bibliográficas

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do Desenvolvimento Humano no Recife, 2005.
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Políticas Públicas: São Paulo na década de 1990. Disponível em: < http:
www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v19n54/a03v1954.pdf>, acesso em 26 jul. 2007.
CÁRDIA, Nancy das Graças. In: TORRES, Haroldo da Gama. Segregação
Residencial e Políticas Públicas: São Paulo na década de 1990. Disponível em: <
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Bógus. (Org.). Saúde nos aglomerados urbanos: uma visão integrada - (Série
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VERAS, Lúcia Maria de Siqueira Cavalcante. De Apé-Puc a Apipucos – numa
encruzilhada, a construção e permanência de um lugar urbano. Recife: Bagaço,
1999.

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Anexo I
Modelo de Questionário
QUESTIONÁRIO

IDENTIFICAÇÃO:
H( )M( )
Faixa Etária: até 14 anos ( ), de 14 a 30 ( ) de 30 a 45 ( ) de 45 a 60 ( ) 60 e
mais ( )
Profissão / Ocupação: ___________________________

1) Dentre os vários espaços existentes no bairro de Apipucos, assinale aquele(s)


que você utiliza:
( ) Açude ( ) Praça do bairro ( ) Igreja Católica ( )Colégio Conceição
Marista

( ) Fundação Gilberto Freyre ( ) Fundação Joaquim Nabuco

2) Com que freqüência você utiliza os espaços acima citados?


( ) Diariamente ( ) Semanalmente ( ) Mensalmente ( ) Esporadicamente

3) Para qual finalidade você utiliza os espaços em questão?


( ) Lazer ( ) Estudo ( ) Pesquisa ( ) Trabalho ( )Oração ( ) Outro

4) Os espaços tratados pela pesquisa fazem parte da identidade do bairro de


Apipucos?
( ) Sim ( ) Não
Existem outros que você destacaria? __________________________

5) Na sua opinião, há uma interação entre as classes sociais existentes em


Apipucos?
( ) Sim ( ) Não
Se sim:
De que natureza: ( ) trabalho ( ) Lazer ( ) Estudo ( ) Outro
__________________

18
Interação: ( )permanente ( )esporádica
A interação foi maior no passado? ( ) Sim ( ) Não ( )Igual
Se não há interação, por quê? ______________________________

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