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O HOMEM E A NATUREZA: A IMPORTÂNCIA DO MEIO AMBIENTE PARA

OS ESTUDOS HISTÓRICOS1.
WILLIANS ALVES DA SILVA2

RESUMO

O objetivo deste artigo é perceber a importância do Meio Ambiente para a História. Tendo em vista as
novas pesquisas e os intensos diálogos com outras disciplinas, percebemos o quanto a relação
homem/natureza enriquece as discussões no campo historiográfico. Diante disso, elencamos estudos em
História que articularam e perceberam tais nuances, corroborando para a defesa, ampliação e visibilidade,
cada vez mais necessárias, dos estudos de História e Meio Ambiente.

Palavras-chaves: História; meio ambiente; natureza; sujeitos históricos.

RESUME

The purpose of this article is to understand the importance of the Environment for History. In view of new
research and intense dialogues with other disciplines, we realize how much the relationship between man
and nature enriches discussions in the historiographic field. Therefore, we list studies in History that
articulated and perceived such nuances, corroborating the increasingly necessary defense, expansion and
visibility of History and Environment studies.

Keywords: History; environment; nature; historical subjects.

1. O CAMPO HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE


Quando Jacques Le Goff e Pierre Nora (1976) escreveram a trilogia Faire de
l'histoire (História: Novos Problemas, Novos Objetos e Novas Abordagens), no volume
três, Novos Objetos, que enriquece e modifica os setores tradicionais da história, bem
como estabelece novos campos epistemológicos, as conexões com a natureza e o meio
ambiente não deixaram de estar presentes. Da mesma forma, na conhecida obra
historiográfica Domínios da História, de Ciro Flamarion Cardoso e Ronaldo Vainfas
(1997), a História Agrária e a História das Paisagens estavam entre as muitas temáticas,
ganhando importância dentro dos novos campos de investigação e das novas linhas de
pesquisa.

Muito se tem falado a respeito da educação ambiental, do consumo


consciente, da reciclagem, ecologia, água potável, problemas climáticos – como
aquecimento global, aumento das inundações e do nível do mar – entre tantos outros

1
Artigo feito para a disciplina História e Meio Ambiente, ministrada pelo professor Agostinho Júnior
Holanda Coe. Turno: Noite, 2020.1.
2
Discente do curso de Licenciatura em História pela Universidade Federal do Piauí – UFPI.
2

temas cada vez mais urgentes e necessários. Estar consciente do espaço em que se vive,
das suas interrelações e conexões com as diversas manifestações da natureza/homem,
assim como estar atento aos seus recursos e, principalmente às formas de preservação e
manutenção, são projetos de conscientização que precisam de fomento e investimento
cada vez maiores, uma vez que o meio natural está em intenso diálogo com mais diversas
esferas e formas de vida; em outras palavras, o meio ambiente faz parte das conivências,
relações sociais, pessoais e culturais.

Para Circe Maria Fernandes Bittencourt (2003), as aproximações entre as


ciências da natureza e as sociedades humanas são recentes, “inserindo-se, entre outros
aspectos, no processo de transformações do campo epistemológico, na denominada “crise
da modernidade” e em suas formas de conceber e produzir conhecimento”3. Para ela, a
história ambiental foi se constituindo em torno de um objetivo, que é o de investigar como
os homens, em diferentes sociedades, foram afetados pelo meio ambiente, bem como este
foi afetado pelos homens.

Pensando nessa ampla conexão e nesse assíduo intercâmbio entre o homem e


a natureza, é importante que se pondere, também, sobre suas junções, “interferências”, e
relações com a História. Para Marc Bloch (2001), “História é o estudo do homem no
tempo”4. Correto. Porém, se nos for permitido um detalhe, podemos acrescentar que
História (também) é o estudo do homem no tempo, no espaço e nas suas mais diversas
relações com o meio. José Augusto Drummond (1991) observa que a maneira mais
provocativa de colocar o significado da história ambiental é considerar o fator tempo. “O
tempo no qual se movem as sociedades humanas é uma construção cultural consciente”5.
José Augusto Pádua (2010) relata que a pesquisa histórica vem revelando que a
preocupação intelectual com os problemas “ambientais” esteve presente, “ao menos no
mundo de expressão europeia, desde o final do século XVIII, ocupando um lugar
relevante no processo de construção do pensamento moderno”6. Ele afirma que s saberes
acadêmicos foram, assim desafiados e estimulados por tal movimento. “Não é por acaso

3
BITTERNCOURT, Circe Maria Fernandes. Meio Ambiente e ensino de história. História & Ensino,
Londrina, v. 09, out. 2003, p. 38. Disponível em:
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/histensino/article/view/12076.
4
BLOCH, Marc. Apologia da história, ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
5
DRUMMOND, José Augusto. A história Ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Estudos
Históricos, Rio de Janeiro, vol. 4, n. 8, 1991, p. 01. Disponível em:
http://www.nuredam.com.br/files/divulgacao/artigos/Hist%F3ria%20Ambiental%20Drumond.pdf.
6
PÁDUA, José Augusto. As bases teóricas da história ambiental. Estudos avançados 24 (68), 2010, p.82.
Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ea/v24n68/09.pdf.
3

que nas últimas décadas organizaram-se iniciativas de ensino e pesquisa em economia


ecológica, direito ambiental, engenharia ambiental, sociologia ambiental etc.”7.

Muitas pesquisas têm abordado essa nova temática, trazendo à superfície


novas articulações que ajudam a entender como a natureza pode dialogar com a história
de inúmeras formas, enriquecendo novos debates e estudos. Os campos da história têm se
mostrado cada vez mais profícuos, sendo grande e diversos os mais variados temas de
pesquisadores que se debruçam sobre novos problemas; o número de campos temáticos
ilustram essa perspectiva. Uma matéria feita pelo site Café História, intitulada “História
Ambiental: historiografia comprometida com a vida”, sublinha a importância do campo
temático Meio Ambiente e História. É destacado que essa relação se constitui como um
campo híbrido8, sintetizando contribuições de diversas áreas do conhecimento “cuja
prática é inerentemente interdisciplinar”. A matéria feita por Gil Karlos Ferri (professor
licenciando em História e com pesquisa em História Ambiental na UFSC) afirma que o
campo temático vem mudando nossa forma de perceber a interação entre os seres
humanos e o ambiente. Ele discute:

Os estudos através da História Ambiental nos apresentam o ambiente como


agente ativo na história, visto que as pessoas organizam e reorganizam suas
vidas relacionando-se com o meio natural. Apesar de muitos estudos tratarem
da natureza desde os primórdios da escrita humana, foi apenas no século XX
que a historiografia desenvolveu uma atenção sistemática aos fatores
ambientais e suas conexões com a história humana.9
Gil Karlos Ferri ainda destaca que a História Ambiental procura refletir a
interações entre os sistemas sociais e naturais, considerando também as consequências
dessas interações ao longo do tempo. Sobre a importância do uso das fontes para os
historiadores, José Augusto Drummond (1991) nos ajuda a pensar nas suas variedades no
estudo das relações entre as sociedades e o seu ambiente. Ele sublinha:

Podem ser usadas as fontes tradicionais da história econômica e social, censos


populacionais, econômicos e sanitários, inventários de recursos naturais,
imprensa, leis e documentos governamentais, atas legislativas e judiciárias,
crônicas. Neles se encontrarão informações abundantes sobre os conceitos, os
usos, os valores atribuídos e a disponibilidade de recursos naturais10.

7
PÁDUA, José Augusto. As bases teóricas da história ambiental. Estudos avançados 24 (68), 2010, p.82.
8
Esse termo usado nas Ciências Humanas é fruto do diálogo com as Ciências Naturais, sendo a palavra
“híbrido” ou “hibridismo” emprestada da botânica.
9
Café História, matéria História Ambiental: historiografia comprometida com a vida, por Gil Karlos
Ferri, em 05 de abril de 2017. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/historia-ambiental-
historiografia-comprometida-com-a-vida/.
10
DRUMMOND, José Augusto. A história Ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Estudos
Históricos, Rio de Janeiro, vol. 4, n. 8, 1991, p. 06.
4

Pesquisas importantes estão ganhando cada vez mais espaços. A eco-história,


por exemplo, é mais um modelo de investigação que ajuda a perceber a natureza não-
humana como mais um agente da história. Sobre as pesquisas nessa temática e suas
singularidades, Arthur Soffiati (2008) destaca:

O que distingue a eco-história das histórias das relações materiais e culturais


é a incorporação da natureza não-humana como agente de história. Para ela,
os domínios físico, químico e biológico têm um papel ativo na história, e não
mais são vistos como elemento passivo, inerte, inanimado ou, de outra parte,
como um carcereiro a assegurar a sujeição das antropossociedades ao meio. A
eco-história promove a interação dos mundos natural e cultural, seja de forma
relacional, dialética ou dialógica, o que pressupõe uma continuidade −
complexa, é certo − entre natureza e cultura11.
Assim, as mais diversas pesquisas enfatizam que a história do homem no
tempo é cheia desses amalgamas e envolvimentos com o meio natural e físico. Um bom
exemplo de como a história, muitas vezes, é um envolvimento entre homem-natureza, é
percebido pelos inúmeros trabalhos que, de forma direta ou indireta, relacionam os
acontecimentos ou eventos históricos em um profundo diálogo com as questões naturais.
Observemos agora como as relações com a natureza são imprescindíveis para entender
muitas pesquisas em História, refletindo, assim, muitas práticas e condutas do homem no
tempo.

2. HOMEM, NATUREZA E HISTÓRIA

Desde os fundamentos das primeiras civilizações, percebeu-se a natureza em


um acentuado envolvimento com o homem. Nascida entre grandes rios, a Mesopotâmia
(berço das civilizações), por exemplo, desenvolveu toda uma estrutura de vivência e
produção baseada na agricultura. Por estar inserida em localização fértil, entre os rios
Tigre e Eufrates, os sumérios, babilônicos, hititas, assírios e caldeus manifestaram
grandes habilidades com drenagens, irrigações e estratégias no uso de canalização da
água, aproveitamento do húmus etc. Foi ainda observando a natureza que esses povos
perceberam os diferentes climas, desenvolveram suas mitologias, calendários. Também
no nordeste da África, uma fascinante civilização, a egípcia, fortaleceu suas conexões
com o meio natural graças ao seu intenso envolvimento econômico, social e cultural com
o Rio Nilo. Considerado como uma dádiva, esse rio foi imprescindível para a evolução

11
SOFFIATI, Arthur. Algumas palavras sobre uma teoria da eco-história. Desenvolvimento e Meio
Ambiente, n. 18, jul./dez. 2008. Editora UFPR, p. 18. Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/made/article/view/13420/9046.
5

de culturas e dos mais diversos sistemas de relações. A historiadora Rosalie David (2011)
aponta a importância das inundações Nilo:

O Nilo e a inundação exerceram um efeito profundo sobre a história, a


organização política e a religião do Egito. Bem no início da sua história, as
comunidades espalhadas compreenderam que deveriam agir juntas e tomar
medidas que controlassem e regulassem a enchente12.
A autora ainda afirma que as características geográficas exerceram uma
influência profundamente prática sobre os costumes diários e as práticas funerárias das
comunidades. Na Idade Média, além dos feudos, que muito já nos diz sobre a relação
homem/terra, bem como as trocas de fidelidades, temos uma sociedade onde o meio
natural era quase indissociável das explicações para o mundo; mesmo os quatro
evangelhos bíblicos eram associados à natureza: Mateus à terra, Marcos tinha a ver com
a água, Lucas ao ar, e João estava ligado ao éter. Outro bom exemplo da influência da
natureza é a sua conexão com os sinais do tempo escatológico. Georges Duby (1967),
estudando o milenarismo, discute que um dos sinais do Ano Mil e da segunda vinda de
Cristo (a Parúsia) eram os tremores, cometas e eclipses. Ele também afirma que as chuvas
contínuas tinham embebido a terra inteira a ponto de durante três anos não se poder abrir
sulcos capazes de receber sementes: “no tempo da colheita , as ervas e o triste joio tinham
coberto toda a superfície dos campos”13.

Hoje, a problemática “homem, tempo e natureza” já é percebida como


fundamental na compreensão da história. Muitos estudos específicos, ou dirigidos a esse
diálogo, já promovem o avanço dessas pesquisas, como as obras História e Natureza, de
Regina Horta Duarte (2005) e História e Meio Ambiente, de Marcos Lobato Martins
(2007). No entanto, não se deixa de perceber a importância do meio natural em títulos e
estudos bem anteriores. Isso mostra, como foi dito, que o meio ambiente na história é um
diálogo profundamente necessário para compreender as relações humanas no tempo e nos
espaços. Elencamos abaixo algumas obras historiográficas que dão importância (ou
envolvem) à natureza, influenciando muitas de suas temáticas históricas.

12
DAVID, Rosalie. Religião e magia no Antigo Egito. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 31 e 31.
13
DUBY, Georges. O ano mil. Lisboa: Edições 70, 1967, p. 111.
6

Obras historiográficas que abordam a temática Meio Ambiente


Inferno Atlântico – Laura de M. e Souza (1993) História da Vida Privada no Brasil (orgs.) –
(1997)
Montaillou – Emmanuel Le Roy Ladurie (1975) O Ano Mil – Georges Duby (1967)
Religião e o declínio da magia – Keith Thomas O homem e o mundo natural – Keith Thomas
(1971) (2010)
O Mediterrâneo – Fernand Braudel (1949) História: Novos Objetos (orgs.). – (1976)
Domínios da História (orgs.). – (1997) Cidade Febril – Sidney Chalhoub (1996)
São Francisco de Assis – Jacques Le Goff (1998) Caminhos e Fronteiras – Sérgio Buarque de
Holanda (1957).
Nordeste – Gilberto Freyre (1937) Casa-grande e Senzala – Gilberto Freyre (1933)
Visão do Paraíso – Sérgio Buarque de Holanda Os Andarilhos do Bem – Carlo Ginzburg (1966)
(1959)
Religião e Magia no Antigo Egito – Rosalie Os Sertões – Euclides da Cunha (1902)14
David (2011)
Quadro 01: Conjunto de obras que relacionam a história ou os sujeitos históricos ao meio ambiente (o ano
corresponde a data de primeira publicação).

Percebe-se, assim, que o diálogo com a natureza se faz presente em muitas


pesquisas em História. O historiador Emmanuel Le Roy Ladurie (1976), por exemplo,
demonstra a importância do clima para as pesquisas históricas, estudando a história das
chuvas e do bom tempo15. Ele sublinha que o objetivo da história climática não é o de
explicar a história humana, nem o de inteirar-se, num estilo simplista, sobre tal ou qual
episódio grandioso; o objetivo, em primeira análise, consiste no estudo de uma “história
cosmológica da natureza”, que pode servir de “disciplina provisória a um projeto
inteiramente diverso e mais ambicioso, que vise, ele mesmo, à história humana”16. Para
entender o clima na história, Ladurie lançou mão de vários estudos, como séries
meteorológicas, dendrocronologia, a fenologia (ou estudo das datas) e o método
glaciológico.

Outros historiadores usaram dessas formas de “combinação” do meio natural


para entender o homem no seu tempo. O estudo dos mares provou ser demasiadamente
necessário para compreender muitas dinâmicas históricas. Jean Delumeau (2009) analisa
o mar variável como o lugar “onde o temor abunda”. Ele afirma que “no final da Idade
Média, o homem do Ocidente continua prevenido contra o mar não apenas pela sabedoria

14
A obra Os Sertões, de Euclides da Cunha, foi mencionada devido a sua grande importância histórica
nos estudos sobre o Brasil.
15
Vale lembrar que muitas dessas discussões - as novas perspectivas de estudos e abordagens, na História
- foram possíveis pela revista historiográfica dos Annales (1929), que ampliou os novos métodos e fontes
do fazer historiográfico.
16
LADURIE, Emmanuel Le Roy. O clima: a história da chuva e do bom tempo. In: LE GOFF, Jacques.
NORA, Pierre (orgs.). História: novos objetos. Rio de Janeiro: F. Alves, 1976, p. 13.
7

dos provérbios, mas também por duas advertências paralelas”17; estas podem ser
sinalizadas como uma expressão do discurso poético e pelos relatos das viagens.

Pensando em uma geo-história, ou na relação espaço, natureza, tempo e


história, nota-se que as relações interdisciplinares entre História e Geografia também são
especialmente importantes. Fernand Braudel (2016) ilustra essa significação. Na sua obra
mais conhecida, O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Filipe II, a
pesquisa histórica é composta de narrativas fragmentárias, reconstituição de eventos,
paisagens, interpretação de dados econômicos e descrições geográficas. Na primeira parte
de seu estudo são analisados (e entendidos) as partes do meio, a saber as montanhas,
planaltos, encostas, colinas, planícies, transumância ou nomadismo, planícies líquidas,
bordas continentais, ilhas, deserto, o Oceano Atlântico, a unidade climática, as estações,
navegações etc. Circe Maria Fernandes Bittencourt (2003) afirma que, em O
Mediterrâneo, Braudel recuperou a história dos povos do século XVI em torno do Mar,
transformando- o, com suas “paisagens, suas especificidades climáticas, em personagem
fundamental para a compreensão das relações de poder econômico e político do
período”18. No prefácio à edição brasileira da obra, Lincoln Secco e Marisa Midori
Deaecto (2016) nos informa:

Há em Braudel uma estrutura física de conjuntos solidários. A base geográfica


divide-se em quatro complexos: atmosférico, terrestre, hidrográfico e
biogeográfico. Neles encontramos unidades menores: clima, pressão
atmosférica, ventos, relevo, a fauna e flora, as culturas etc. Os dois
mediterrâneos (Oriental e Ocidental) de Braudel são uma unidade humana. E
uma unidade climática, agrícola (mas não política)19.
Os autores afirmam, ainda, que a pesquisa de Braudel não pode ser encerrada
nos limites do mar, e que é preciso ver o oceano aberto além das Colunas de Hércules,
bordejar Portugal, ir às ilhas atlânticas (Madeira, Açores, Canárias), subir ao mar do
Norte, Chegar à Holanda e à Alemanha.

Nos trópicos, a natureza exuberante e virgem do Brasil atraiu colonizadores


às nossas terras. Os europeus foram, da forma mais negativa, seduzidos por nossos
gêneros naturais. Pau Brasil. Açúcar. Ouro. Café. Esses foram os principais produtos da

17
DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente 1300-1800: uma cidade sitiada. São Paulo:
Companhia das Letras, 2009, p. 55.
18
BITTERNCOURT, Circe Maria Fernandes. Meio Ambiente e ensino de história. História & Ensino,
Londrina, v. 09, out. 2003, p. 43.
19
BRAUDEL, Fernand; O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Filipe II. Vol. 01, São
Paulo: EDUSP, 2016, p. 32.
8

natureza que os colonizadores extraíram de nossas terras, sem dó. Toda uma estrutura de
extração e comércio, além de inúmeras relações conectadas a essas camadas e texturas,
foram desenvolvidas com base nessa relação de exploração com o meio natural. José
Augusto Drummond (2002), no seu ensaio temático “Por que estudar a história do
Brasil”, elenca sete razões para incluir história e meio ambiente nos estudos brasileiros,
afirmando ser o Brasil um objeto privilegiado para a história ambiental; as razões são:
grandeza territorial, tropicalidade, variedade de biomas e ecossistemas, pré-história curta,
a longa experiência da comunidade primitiva, a colonização mista e “imperialismo
ecológico” e os tesouros naturais do Brasil20.

É importante dizer que a natureza não determina ações ou comportamentos


na história, mas condiciona muitas de suas práticas. Ely Bergo de Carvalho (2004) afirma
que devemos levar em conta os “sujeitos da história” e os “elementos naturais” , que têm
a capacidade de condicionar significativamente a sociedade. Ele destaca que não devemos
mais estudar essas relações em busca de explicar apenas os fatos sociais, como fazia o
sociólogo Émile Durkheim, mas procurar entender a interação entre ambos (homem e
natureza), que gera a sociedade e a "natureza" tal como se conhece. Sobre esse ponto de
vista ele destaca:

Isto não significa cairmos nos determinismos geográfico e biológico, que


ainda figuravam nas explicações científicas até meados do século passado. De
forma alguma se reiteram as teorias que já afirmaram que "o brasileiro é
indolente devido ao clima tropical". A cultura humana age sobre o meio físico-
material, propiciando significados e usos complexos dos seus elementos21.
Assim, as lentes de estudo sobre o homem e a natureza devem estar atentas
às causas, como aponta Marc Bloch (2001) e às condições; nunca aos determinismos.
Ainda dentro dos campos de estudos historiográficos, os trabalhos de Gilberto Freyre
(2006), em Casa-grande e Senzala (2006) e Nordeste (2004), ilustram bem como a
natureza se relaciona com o homem. Entre suas tematizações está a preocupação com a
ecologia, o meio ambiente, as configurações espaciais cidade-campo etc. Seus estudos
pioneiros, na perspectiva ecológica/ambiental, denotam cuidados que só vieram a ganhar

20
DRUMMOND, José Augusto. Por que estudar a história ambiental no Brasil? Varia História, nº 26,
2002, p. 16-18. Disponível em:
https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/572b555f4c2f8564c3833c55/146245
7695947/01_Drummond%2C+Jose+Augusto.pdf.
21
DE CARAVALHO, Ely Bergo. A história natural e a “crise ambiental” contemporânea: um desafio
político para o historiador. Revista Esboço, v.11 n.11, UFSC, 2004, p. 106. Disponível em:
https://www.researchgate.net/publication/309233179_Historia_Ambiental_e_a_crise_ambiental_contemp
oranea_um_desafio_politico_para_o_historiador.
9

destaque, enquanto “campo disciplinar”, na década de 197022. Sidney Chalhoub (2017)


em Cidade Febril, cortiços e epidemias na corte imperial, estuda, também, as relações
do homem com o meio, influenciando doenças infeciosas que acometeram o Brasil na
virada do século XIX para o século XX. Na sua teoria do surgimento da “ideologia da
higiene”, ele aponta duas formas explicativas, que povoaram o imaginário da população:
a teoria do contágio e a teoria dos miasmas. Esta última estava ligada às moradias dos
pobres, com precário saneamento básico, esgotos a céu aberto e terrenos férteis à
propagação de doenças de todos os tipos.

Sobre a História Agrária, Maria Yedda Linhares (1997) discute que esse
campo de estudo é um encontro feliz com a geografia humana, tendo, de um lado, o
historiador – “preocupado em explicar as mudanças operadas pela ação do homem através
dos tempos – e do outro, o geógrafo – dedicado ao estudo da relação do homem com seu
meio físico”23. Donald Worster (2003) afirma que esta nova história (a história
ambiental) rejeita a suposição comum de que a experiência humana tem sido isenta de
constrangimentos naturais, que as pessoas são uma espécie separada e singularmente
especial e que as consequências ecológicas de nossos feitos passados podem ser
ignoradas24. Reafirmando, rejeita. As relações entre o homem e o seu meio estão
desenvolvendo pesquisas cada vez mais profícuas, elaborando muitos estudos que
comprovam a importância de tais associações. História Agrária, Eco-História, relações
climáticas, o meio ambiente e as doenças, o estudo do meio ambiente nas salas de aulas,
etc. O campo temático tem ganhado cada vez mais espaços, sublinhando, mais uma vez,
que a História é o estudo do homem no tempo, no espaço e nas suas significativas relações
com o meio.

3. CONCLUSÃO

Para Donald Worster (1991), a história ambiental é, em resumo, parte de um


esforço revisionista para tornar a disciplina da história muito mais inclusiva nas suas
narrativas do que ela tem tradicionalmente sido25. Desse ponto de vista, podemos afirmar

22
FROEHLICH, José Marcos. Gilberto Freyre, a história ambiental e a ‘rurbanização’. História, ciência
e saúde. Manguinhos vol.7 no.2 Rio de Janeiro July/out. 2000.
23
LINHARES, Maria Yedda. História agrária. In: CARDOSO, Ciro Flamarion. VAINFAS, Ronaldo.
(orgs.). Domínios da história: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997, p. 165.
24
WORSTER, Donald. Transformações da terra: para uma perspectiva agroecológica na história.
Ambiente & Sociedade - Vol. V - no 2 - ago./dez. 2002 - Vol. VI - no 1 - jan./jul. 2003, p. 24. Disponível
em: https://orgprints.org/20347/1/Worster_transforma%C3%A7%C3%B5es.pdf.
25
WORSTER, Donald. Para fazer história ambiental. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 4, n. 8,
1991, p. 02. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2324/1463.
10

que a História ganhou, e muito, quando entendeu que a natureza e o meio ambiente são
partes fundamentais na compreensão dos sujeitos históricos e das suas inúmeras práticas.
Como foi visto, a História respondeu, ainda que muitas vezes de forma indireta, a esses
novos problemas, sendo muito os trabalhos e pesquisas que se inclinam às temáticas
homem/meio/natureza. A história ambiental é fruto de diferentes diálogos e muitas
pesquisas sérias. Percebeu-se o quanto muitas flutuações e encontros são possíveis e
ricos; a interdisciplinaridade e os empréstimos a outras ciências, por exemplo, têm dado
ao campo historiográfico novas chaves de análises, assim como diferentes articulações
sobre muitas temáticas históricas. História e Meio Ambiente é necessária, é importante e
precisa ganhar cada vez mais novos espaços. História é isso. É diálogo e encontros; o
homem está no tempo, nos lugares, no meio. Perceber a importância da natureza na
explicação de muitos contextos só prova que os pesquisadores, felizmente, seguem o
conselho de Marc Bloch (2001), quando afirma que é preciso farejar a carne humana.
Continuemos, assim, sendo esse ogro que busca o homem, seja onde ele estiver.

REFERÊNCIAS

BLOCH, Marc. Apologia da história, ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar,


2001.
BRAUDEL, Fernand; O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Filipe II.
Vol. 01, São Paulo: EDUSP, 2016.
CARDOSO, Ciro Flamarion. VAINFAS, Ronaldo. (orgs.). Domínios da história: ensaios
de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997.
DAVID, Rosalie. Religião e magia no Antigo Egito. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2001.
DELUMEAU, Jean. História do medo no ocidente 1300-1800: uma cidade sitiada. São
Paulo: Companhia das Letras, 2009.
DUBY, Georges. O ano mil. Lisboa: Edições 70, 1967.
LE GOFF, Jacques. NORA, Pierre (orgs.). História: novos objetos. Rio de Janeiro: F.
Alves, 1976.

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