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Abstract This article initially presents pro- Resumo Este artigo apresenta, inicialmente,
posed definitions for the expression Corporate definições propostas para o termo Globaliza-
Neoliberal Globalization or neoliberal global- ção Corporativa Neoliberal ou globalização
ization. Next it discusses the main problems neoliberal. Em seguida discute os principais
and impacts of the neoliberal globalization problemas e impactos da globalização neolibe-
identified by social movements and intelectu- ral identificados pelos movimentos sociais e in-
als who lay out alternatives to the global ne- telectuais que propõem alternativas ao mode-
oliberal model, known as anti-globalization lo neoliberal global, conhecido como movimen-
movement, “globalization from below” or “grass- to antiglobalização, “globalização por debai-
roots” globalization. These social movements xo” ou das bases (“grassroots” globalization).
have often organized themselves as global net- Esses movimentos sociais se organizam, com
works of social movements. To account for the freqüência, como redes de movimentos sociais
appearance of such networks, the article re- articulados globalmente. A abordagem acerca
views arguments put forth by scholars of the do surgimento dessas redes é feita a partir de
structures and dynamics of social networks. uma breve revisão das proposicões feitas por
The article concludes with suggestions for ele- estudiosos das estruturas e dinâmicas de redes
ments of an alternative program to global ne- sociais. O artigo é concluído com sugestões de
oliberalism. elementos para um programa alternativo ao
Key words Globalization, Neoliberalism, So- neoliberalismo global.
cial movements Palavras-chave Globalização, Neoliberalis-
mo, Movimentos sociais
1 Department of Work
Environment, University
of Massachusetts, Lowell.
One University Avenue,
Lowell, MA 01854 USA.
carlos_siqueira@uml.edu
2 Centro de Estudos
de Saúde do Trabalhador
e Ecologia Humana,
Cesteh/Ensp/Fiocruz.
Fundação Oswaldo Cruz,
Núcleo de Epidemiologia
3 Universidade Estadual
de Feira de Santana.
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logy, whose function is to reduce any resistance to tas no nível de largura (geográfica) e profundi-
the process by making it seem both highly benefi- dade, atingindo cada vez mais aspectos da vida
cent and unstoppable. humana, e na distinção entre dois aspectos di-
A suposta inevitabilidade da globalização ferentes do desenvolvimento das relações capi-
neoliberal decantada por Margaret Thatcher talistas pós-1970.
nos anos 80 levou a que se cunhasse esta ideo- Muitos analistas favoráveis à globalização
logia como TINA (abreviação para as iniciais (Friedman, 2000; Tabb, 2001) confundem fre-
de There Is No Alternative, em inglês). Santos qüentemente estes dois aspectos como se fos-
(2000) prefere denominá-la de globalitarismo, sem um só: o desenvolvimento de novas tecno-
a que define da seguinte maneira: logias e a concentração global do poder econô-
Entre os fatores constitutivos da globalização, mico. De fato os avanços nas tecnologias de in-
em seu caráter perverso atual, encontram-se a formação (microprocessadores), transporte (in-
forma como a informação é oferecida à humani- termodalidade entre meios de transporte), e te-
dade e a emergência do dinheiro em estado puro lecomunicações (satélites e fibras óticas), deri-
como motor da vida econômica e social. São duas vados da informatização da sociedade capita-
violências centrais, alicerces do sistema ideológi- lista, tornaram possíveis a automatização de ta-
co que justifica as ações hegemônicas e leva ao refas rotineiras e a flexibilização da produção,
império das fabulações, a percepções fragmenta- constituindo-se em elementos essenciais para o
das e ao discurso único do mundo, base dos no- crescimento substancial da concentração de
vos totalitarismos – isto é – dos globalitarismos a poder econômico.
que estamos assistindo. Esta discutível terceira revolução técnico-
Fiori (1997) argumenta na mesma direção científica, baseada na microeletrônica e no mi-
de Santos e sugere a incorporação de outras di- croprocessamento, deu luz à globalização tec-
mensões ao termo ao postular que … a globali- nológica que estamos presenciando nas últimas
zação, apesar de ser um neologismo muito pouco décadas e forma a base material da sociedade
preciso, aponta para um processo de transforma- informacional analisada por Castells (1997):
ções cujas origens e conseqüências são muito …el término informacional indica el atributo de
mais complexas, por envolver inúmeras dimen- una forma específica de organización social en
sões não-econômicas num intrincado processo de que la generación, el procesamiento y la transmi-
decisões privadas e públicas tomadas na forma sión de información se convierten en las fuentes
de sucessivos e inacabados desafios e ajustes. fundamentales de la productividad y del poder,
Marcuse (2000), por outro lado, discute as debido a las nuevas condiciones tecnológicas que
diversas facetas do termo. Para ele um não- surgen en este período histórico. Porém, ainda
conceito na maioria dos usos, que mais lem- segundo Marcuse, a distinção entre os dois as-
bram um catálogo de tudo que parece diferente pectos nos levaria a pensar como estes avanços
desde 1970: avanços em tecnologias de infor- tecnológicos poderiam ser usados de forma di-
mática; uso disseminado de transporte de car- ferente, sem levar necessariamente à concen-
ga aérea; especulação em moedas, aumento dos tração de poder em mãos de uma minoria de
fluxos de capital além de fronteiras nacionais; países e indivíduos. E ainda nos permite inda-
efeito estufa; engenharia genética; poder das gar que outras possibilidades existiriam se es-
corporações multinacionais; nova divisão in- tes dois aspectos estivessem separados. Assim
ternacional do trabalho, mobilidade interna- como aqueles que discordavam do modelo so-
cional do trabalho; poder reduzido dos estados viético de socialismo criaram a expressão “so-
nacionais, pós-modernismo, ou pós-fordismo. cialismo real” para caracterizá-lo, caberia en-
Segundo o mesmo autor, a falta de clareza e tão, seguindo a mesma lógica, chamar a globa-
emprego vago do termo permite convertê-lo lização corporativa neoliberal de “globalização
em algo com vida própria e em uma força cuja real, ” que se opõe a uma possível globalização
existência transcende a vontade dos seres hu- alternativa.
manos, o que o torna inevitável e irresistível, Petras (2000), outro importante crítico da
questão também abordada por Druck (1999). globalização neoliberal, afirma que na verdade
A maior contribuição de Marcuse para explici- quanto mais forte é o poder imperialista, me-
tar o significado da globalização situa-se na ca- nos dele se fala, se escreve, ou até se menciona.
racterização da globalização não como algo Idéias vagas e amorfas de toda sorte circulam:
novo, mas como uma forma particular do ca- fala-se de neoliberalismo em vez de capitalis-
pitalismo, uma expansão das relações capitalis- mo ou imperialismo, globalização em vez de
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periféricos pelo capital financeiro transnacio- péia, para alargar e fortalecer o poder financei-
nal, seja indiretamente através de seus agentes ro e comercial das “suas multinacionais” na
institucionais como o Banco Mundial, o Fundo disputa por lucros e controle dos países depen-
Monetário Internacional e a Organização Mun- dentes e periféricos, eufemisticamente denomi-
dial do Comércio, entre outros, ou diretamente nados “em desenvolvimento.” É notório que,
através dos chamados technopols (elite tecno- neste processo, o papel dos Estados-nações em
crática neoliberal que administra o Executivo) prover o bem-estar social, o controle ambiental
e das chamadas elites ou núcleos transnacio- e o interesse democráticos dos povos, sem dú-
nais (Ahumada, 1996). vida alguma, diminuiu (Herman, 1999).
Para completar as posições revistas acima
resta agora discutir brevemente o papel do es-
tado nacional no capitalismo globalizado. Com A globalização
relação a este aspecto, podemos identificar pelo dos movimentos sociais
menos duas posições distintas. Por um lado,
existem os que crêem que o Estado nacional já Os proponentes da “globalização por cima”
não cumpre papel importante no capitalismo prometem um mundo mais justo para todos e
atual por estar fraco e subordinado às gigantes- apregoam que a maré do desenvolvimento “le-
cas e poderosas corporações multinacionais e vantará todos os barcos,” isto é, todos os países
seus aliados mundiais. Esta parece ser a visão e classes sociais se beneficiarão com o cresci-
convencional da globalização e supõe que a mento da produtividade e da prosperidade do
tendência natural do desenvolvimento capita- capitalismo neoliberal (ICC, 2000). Porém,
lista, particularmente a sua internacionaliza- apesar desta permanente promessa, que já dura
ção, submerge o Estado-nação. Segundo este mais de vinte anos, não tardou muito, em ter-
ponto de vista quanto maior a internacionali- mos de tempo histórico, para que um pujante e
zação ou globalização do capital, mais restrito vibrante movimento social internacional sur-
o papel do Estado nacional. Por outro lado, gisse em resposta aos inúmeros impactos nega-
existem aqueles que discordam desta posição tivos da globalização corporativa neoliberal,
por entender que o Estado ainda é fundamen- como por exemplo (Brecher et al., 2000):
tal para a defesa dos interesses dos grupos do- 1) A crescente poluição da água, ar e solos,
minantes e corporações multinacionais, prin- fruto das chamadas externalidades da produ-
cipalmente nos países ditos desenvolvidos ou ção de químicos tóxicos sem controle ambien-
do Primeiro Mundo (Tanzer, 1995; Meiskins, tal e social.
1999). O efeito estufa e a redução da camada de
Chomsky (1999) utiliza a expressão really ozônio seriam as ameaças mais sérias da enor-
existing market capitalism (capitalismo de mer- me crise ecológica que afeta o planeta, cujos
cado realmente existente) para caracterizar as variados impactos afetam a biodiversidade (co-
doutrinas seguidas pelo governo Reagan e os mo o desaparecimento recorde de espécies ani-
ideólogos neoliberais nos anos 80, que glorifi- mais e vegetais), a sustentabilidade (por exces-
cavam as virtudes do mercado para os pobres, so de consumo de matérias-primas não reno-
enquanto se gabavam orgulhosamente para o váveis), e até a sobrevivência de cidades e “Es-
mundo dos negócios de que Reagan forneceu tados-ilhas,” como as ilhas do Pacífico Samoa e
mais subsídios à importação para a indústria Tuvalu (Mann, 2002). Ao mesmo tempo cresce
americana que qualquer outro de seus prede- “a corrida para baixo” nos padrões e leis de
cessores em mais de meio século. Carchedi controle da poluição ambiental e ocupacional,
(2002) e Duménil & Lévy (2002) argumentam visível por exemplo nas más condições de tra-
que o capitalismo do final do século 20 é o ca- balho e de ambiente das maquiladoras do nor-
pitalismo monopolista dominado pelo Estado te do México e das chamadas sweatshops da
imperialista americano – o “hegemon” global – Ásia e América Central.
por seus competidores organizados no bloco 2) Crescimento acelerado da pobreza e da de-
de estados dominantes da União Européia (Ale- sigualdade em quase todos os países do mundo,
manha, Inglaterra, França), e pelo Japão. Estes com exceção de casos raros como a China.
“Estados fortes” e não mínimos organizam De acordo com o Relatório de Desenvolvi-
seus blocos comerciais e acordos de livre co- mento Humano das Nações Unidas de 1999,
mércio, como o Tratado de Livre Comércio da mais de 80 países tinham renda per capita, em
América do Norte (TLCAN) e a União Euro- 1999, menor que na década anterior. Além dis-
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so, o mesmo relatório revela que a renda líqui- economias contra o domínio legal do grande
da dos 200 indivíduos mais ricos do mundo capital multinacional, disfarçado de “acordos de
aumentou de 440 bilhões de dólares para mais livre-comércio” regulamentados pela OMC,
de 1 trilhão de dólares entre 1994 e 1998. Weis- tem sofrido contínuo enfraquecimento. Um pe-
brot et al. (2000) avaliaram os efeitos da globa- queno número de pessoas tem tomado decisões
lização nos últimos 20 anos, com base em indi- que afetam bilhões de cidadãos mundo afora.
cadores fornecidos pelo Banco Mundial, e con- Segundo um de seus burocratas, “a OMC é o lu-
cluíram que houve declínio nas taxas de cresci- gar onde governos fazem conchavos privados
mento econômico em quase todos os países do contra o interesse dos seus grupos de pressão
mundo; que o crescimento da expectativa de domésticos” (Brecher et al., 2000).
vida se reduziu em 4 dos 5 grupos de países es- Assim, o neoliberalismo agudiza problemas
tudados e que progressos na diminuição da existentes no desenvolvimento capitalista nos
mortalidade infantil e nas taxas de alfabetiza- anos 70 e 80, como os danos ambientais, que
ção e escolaridade tornaram-se mais lentos pa- no final do século 20 assumem proporções de
ra a maioria dos grupos de países estudados. E catástrofes mundiais, como Chernobyl e Bho-
mais, o desemprego mundial ronda a cifra de 1 pal. De acordo com Santos (2002) produz-se
bilhão de pessoas e os empregos se tornaram um efeito de entropia das empresas globais, na
temporários, inseguros, flexíveis e informais, medida em que, para melhor funcionarem, tais
acarretando graves conseqüências para a saúde empresas criam ordem para si mesmas e desor-
e bem-estar dos trabalhadores (Siqueira et al., dem para o resto. A tendência do capital de ul-
2003). trapassar fronteiras e territórios acaba por
Nas relações trabalhistas constata-se perda transpor barreiras, sem se dar conta que os seus
de direitos conquistados pelos trabalhadores no limites podem comprometer a própria sobrevi-
pós-guerra. De acordo com Atílio Boron (Seoa- vência humana. Justifica-se, assim, a agressão
ne, 2001), um relatório da OIT mostra que as- ao homem e ao meio ambiente rumo ao desen-
salariados da América Latina e Caribe traba- volvimento a qualquer preço. Sustentando esta
lharam em 2000 uma média de 2.100 horas, possibilidade, Hardt & Negri (2001) referem
enquanto assalariados europeus trabalharam que ...essa mudança torna perfeitamente claro e
1.500 horas, por um salário muito superior. possível o atual projeto capitalista de unir o po-
Outro dado importante relatado por Boron é der econômico ao poder político, para materiali-
que atualmente há mais crianças trabalhando zar, em outras palavras, uma ordem capitalista.
em condição de servidão em todo mundo do No Brasil, as diferenças no desenvolvimento
que escravos no apogeu da escravidão. regional, com elevada concentração de renda e
3) Volatilidade e instabilidade financeira cau- tecnologia na região Sudeste, funcionam como
sada pela desregulação financeira global defen- um campo fértil para possibilidades de investi-
dida pelo neoliberalismo. mentos industriais e agrícolas. Entretanto, a
Mais de 1,5 trilhões de dólares circulam pe- globalização neoliberal privilegia mercados ex-
lo mundo diariamente nos mercados financei- ternos e utiliza o território apenas como celeiro
ros, podendo entrar e fugir de países em ques- espoliativo, sem o necessário retorno de capital,
tão de dias e levar economias nacionais inteiras contribuindo ainda mais para aprofundar as di-
a recessões agudas, como as que ocorreram no ferenças regionais. Da mesma forma que a glo-
México, Brasil, Argentina, Coréia do Sul, Tai- balização acentua as diferenças mundiais, au-
lândia, Indonésia (estes três últimos vítimas da mentando a concentração de capital em poucos
chamada “crise asiática” do final dos anos 90), países, o mesmo acontece no Brasil com os ter-
Turquia, entre outros. ritórios. Implementação e crescimento desor-
4) Erosão da democracia pela enorme concen- denados, com implantação de modelos de de-
tração de poder nas mãos de pequeno número senvolvimento superados e não sustentáveis,
de indivíduos e corporações, fazendo com que são colocados como salvação em determinadas
os poderes públicos se tornem verdadeiras ca- áreas não privilegiadas, como o Nordeste. Tais
deias de transmissão destes interesses. modelos levaram à poluição do solo, do ar e das
Ao mesmo tempo diminui a possibilidade águas, deixando as populações expostas sem o
de que governos locais resistam às pressões de devido controle ambiental e atenção à saúde.
lobistas do grande capital contrárias a políticas Exemplo disto são as instalações de empre-
sociais de interesse dos povos. Conseqüente- sas, algumas reconhecidamente poluidoras nas
mente, o poder dos governos para proteger suas regiões de origem ou países de origem, sem
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Este novo modelo de movimento social e co internacional de drogas, cuja estrutura or-
“guerra de rede” tem as seguintes característi- ganizativa se assemelha a uma rede decentrali-
cas (Arquilla & Ronfeldt, 2001): zada e dinâmica de cartéis).
• Organiza-se de forma policêntrica (mui- Quanto a sua tipologia ou estrutura (Figura
tos líderes ou centros de liderança), segmentar 1), as redes podem classificar-se como redes
(composta de muitos diferentes grupos) e em “cadeias” (chain ou line networks), “estrelas” (star
rede ideologicamente integrada (segmentos e ou hub networks), ou “canal múltiplo” (all-chan-
líderes integrados em sistemas reticulares ou nel or full matrix networks). Cada nó da rede
redes através de conexões estruturais, indivi- pode incluir um indivíduo, uma organização
duais e ideológicas – a abreviação para tal com- (partido político, igreja ou sindicato), um gru-
binação de características em inglês é SPIN – po, parte de um grupo, ou até mesmo um Esta-
segmentary, polycentric and integrated network). do; os nós podem se ligar de maneira frouxa ou
Os líderes deste movimento tendem a ser caris- coesa, representar muita ou pouca gente, e ser
máticos ao invés de burocráticos, e inspiram inclusivos ou exclusivos. Pode ocorrer também
seus liderados principalmente pela sua capaci- híbridos que incluam redes e outras formas de
dade de influenciá-los e inspirá-los e não por organização hierárquicas, em que alguns dos nós
sua capacidade organizativa ou política.
• Tem flexibilidade, fluidez, e autonomia. Os
nós da rede estão em constante expansão e mo-
vimento e se comunicam pela Internet de for- Figura 1
ma horizontalizada, tornando muito difícil a Tipos básicos de redes.
identificação e repressão de lideranças ou insti-
tuições burocráticas responsáveis pelas ações
empreendidas e propostas políticas defendidas.
Os integrantes das redes estabelecem relações
não hierárquicas e compartilham suas identi-
dades, seu entendimento do inimigo, e suas
propostas para combatê-lo on-line. Por outro
lado, qualquer membro da rede é livre para as-
sociar-se ou dissociar-se dela e as redes podem
expandir-se e contrair-se rapidamente. Os par-
ticipantes das redes podem também construir
relações pessoais, de amizade, de vizinhança,
ou apenas se encontrar periodicamente em
eventos especiais como conferências, assem-
bléias ou manifestações de rua.
• Utiliza táticas de luta que incluem a blitz e a
guerrilha estilo “enxame de abelhas” (swar-
ming) sobre objetivos negociados e pré-deter-
minados e o ofuscamento da distinção entre
ofensiva e defensiva. Por exemplo, um ator so-
cial pode atacar em nome de sua autodefesa,
como foi o caso dos zapatistas.
• Desafia os limites e separações entre o Esta-
do e a sociedade, o nacional e o internacional,
o público e o privado, o legal e o ilegal, e tende
a criar confusão nas instituições do Estado na-
cional responsáveis pela lei e ordem, como a
polícia e a justiça. Burocracias governamentais
hierarquizadas e verticalizadas não têm facili-
dade nem agilidade para mobilizar recursos e
pessoal para enfrentar movimentos descentra-
lizados e em constante movimento (exemplo
claro desta questão é a dificuldade encontrada
pelos Estados nacionais para combater o tráfi-
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da rede seriam na verdade burocracias tradicio- uma praça sem dono que serve de ponto de
nais. Muitas configurações podem se formar encontro para os que queiram usá-la para al-
para operações táticas ou de longo prazo de gum tipo de interesse comum. Adotando a
acordo com as necessidades da rede. perspectiva de espaço, o Fórum não defende
Klein (2002) usa uma metáfora da Internet nenhuma estrutura piramidal de decisão ou
para caracterizar os movimentos antiglobali- hierarquia de poder entre os que dele partici-
zação não como uma teia (web) mas sim como pem. O Fórum se converteu, em curto prazo,
movimentos de núcleos e raios (hubs and spo- em um enorme espaço mundial de troca de ex-
kes), nos quais os núcleos constituem os centros periências, uma verdadeira incubadora mun-
de atividades e os raios os “grupos afins,” que se dial de movimentos e idéias, articulando gran-
ligam a outros grupos autônomos interligados. de variedade de iniciativas e lutas contra os
Uma pergunta fundamental que cabe res- mais variados aspectos do neoliberalismo, co-
ponder a esta altura é: O que faz com que uma mo sugere o slogan Um outro mundo é possível.
rede alcance sucesso e êxito, funcione efetiva- Em síntese, o Fórum Social adotou a estrutura
mente, se fortaleça e permaneça unificada? Ar- de “rede de redes” como alternativa ao modelo
quilla e Ronfeldt (2001) propõem cinco níveis neoliberal centralizador e concentrador de po-
de análise para avaliar uma rede: nível organi- der anualmente avaliado e refinado em Davos,
zativo (o desenho organizativo); nível narrati- Suíça, e como instrumento de aglutinação de
vo (a história que se conta); nível doutrinário movimentos sem constituir-se em movimento
(as estratégias colaborativas e métodos); o ní- ou em “movimento dos movimentos.” Ainda é
vel tecnológico (sistemas de informação); e o cedo, no entanto, para avaliar até que ponto
nível social (os laços pessoais que asseguram esta praça permitirá a construção de platafor-
lealdade e confiança mútua). As redes mais for- mas comuns de luta e unidade entre setores
tes correspondem àquelas que funcionam bem sociais e grupos políticos com propostas polí-
nestes cinco níveis. Nas redes exitosas o dese- tico-ideológicas distintas e muitas vezes diver-
nho organizativo se sustenta por uma história gentes.
vencedora e uma doutrina bem definida; todos Este novo movimento antiglobalização or-
os níveis se sobrepõem a sistemas comunicati- ganizado pela freqüentemente denominada
vos avançados e descansam sobre laços pessoais “sociedade civil global” já alcançou vitórias ex-
e sociais fortes nas bases. Cada nível e o dese- pressivas. Capra (2002) relata que, em 1997,
nho geral da rede devem se beneficiar da re- ativistas da ONG americana Public Citizen,
dundância e diversidade, porque as caracterís- fundada pelo líder do movimento dos direitos
ticas de cada nível provavelmente afetam as do consumidor americano Ralph Nader, reve-
dos outros níveis. laram publicamente na Internet o conteúdo,
Talvez o maior exemplo da nova configura- até então secreto, de um rascunho do Acordo
ção dos movimentos sociais antiglobalização Multilateral de Investimento (AMI). A denún-
como redes contra-hegemônicas ou contrapo- cia do texto do acordo elaborado sigilosamente
deres tem ocorrido no Brasil, onde se realiza- por delegados dos países ricos originou uma
ram três fóruns sociais mundiais em Porto Ale- campanha mundial contra o AMI. A pressão
gre. A Carta de Princípios do Fórum Social o si- internacional exercida sobre os governos mem-
tua como ...espaço aberto de encontro para o bros da Organização para o Comércio e Desen-
aprofundamento da reflexão, o debate democráti- volvimento Econômico (OCDE), desencadea-
co de idéias, a formulação de propostas, a troca li- da por essa campanha, fez com que o acordo
vre de experiências e a articulação para ações efi- fosse abortado. Outra vitória importante foi a
cazes, de entidades e movimentos da sociedade ci- proibição, em 1999, da importação de alimen-
vil que se opõem ao neoliberalismo e ao domínio tos transgênicos, produzidos por grupos multi-
do mundo pelo capital e por qualquer forma de nacionais, em grande parte da Europa, após
imperialismo, e estão empenhadas na construção boicotes e protestos que envolveram agriculto-
de uma sociedade planetária orientada a uma re- res hindus, ingleses, irlandeses, franceses e ale-
lação fecunda entre os seres humanos e destes com mães, além de consumidores europeus e ame-
a Terra (Fórum Social Mundial, 2001). ricanos. Governos vetaram a importação de
Segundo Whitaker (2003), espaço e movi- alimentos transgênicos e empresas produtoras
mento constituem conceitos diferenciados. de alimentos e bebidas comprometeram-se a
Espaço diferencia-se de movimento vez que eliminar o uso de transgênicos em 1999, tanto
não tem líderes, é horizontal e funcional como na Europa como na Ásia e América Latina.
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Redes ecológicas mundiais conseguiram Brecher et al. (2000) propõem uma síntese
pressionar numerosos governos a assinar o Tra- inicial do que os movimentos pela globalização
tado de Kyoto contra Gases Poluentes da At- por debaixo defendem, baseando-se em sete
mosfera (greenhouse gases), a eliminar o uso de princípios gerais orientadores:
Químicos Orgânicos Persistentes (persistent or- 1) Nivelamento “por cima” de direitos huma-
ganic pollutants ou POPs) e o uso de amianto nos, ambientais, e sociais para impedir a “cor-
na Europa (Ban Asbestos Network). Redes de di- rida para baixo” das leis, direitos e proteção
reitos humanos conseguiram aprovar a Con- social.
venção Internacional pelo Banimento de Mi- Este nivelamento para cima pode ocorrer
nas de Terra (International Convention to Ban através de campanhas por salários dignos, da
Landmines – ICBL) e recentemente mobiliza- pressão sobre multinacionais para que respei-
ram milhões no mundo inteiro pela paz e con- tem padrões globais mínimos de direitos tra-
tra a invasão do Iraque. Entretanto, muito ain- balhistas e proteção ambiental, da incorpora-
da resta a fazer. ção de um piso mínimo para direitos trabalhis-
O movimento mundial contra os Acordos tas e ambientais nos acordos de livre-comércio,
de Livre Comércio patrocinados pela OMC, co- e da inclusão de leis e regulamentos globais nas
mo o General Agreement on Trade in Services legislações nacionais.
(GATS), conseguiu retardar por alguns anos a 2) Democratização das instituições desde o
iniciativa do governo americano em colocar na nível local até o global pelo estabelecimento de
pauta deste acordo a privatização de serviços diálogo e negociação transparente sobre o fu-
públicos essenciais como saúde, educação, for- turo da economia global, da democratização
necimento e tratamento de água e esgoto. Con- das instituições financeiras e de comércio in-
tudo, ainda não está claro qual será o desfecho ternacionais, do estabelecimento de códigos de
deste processo. Situação semelhante parece es- conduta para as corporações multinacionais,
tar ocorrendo com o Acordo de Livre Comér- da participação cidadã nas decisões sobre polí-
cio das Américas (Alca) comentado em detalhe tica econômica, da punição dos crimes am-
por Druck e Franco neste número. De um lado, bientais corporativos, e da eliminação do do-
o governo americano e alguns poucos aliados mínio do dinheiro sobre as eleições e parla-
nas Américas tratando de acelerar a “anexação” mentos.
das Américas ao seu mercado, como afirmou o 3) Construção de processo de tomada de deci-
presidente Lula recentemente, sob a égide do sões o mais próximo possível dos indivíduos
“livre mercado”. De outro, a crescente resistên- afetados por elas, através da expansão da eco-
cia nacional e popular ao Alca, particularmente nomia solidária, do controle local das corpora-
na Venezuela, Argentina, Brasil e Equador (Ju- ções multinacionais, da proteção da capacida-
bileu Sul Brasil, 2003). de de desenvolvimento econômico nacional e
local, e do estabelecimento de pactos contra a
competição predatória entre cidades, regiões e
A construção de um países.
programa alternativo 4) Eqüidade nas relações de poder e riqueza
globais através de investimento e consumo ba-
As redes mundiais de movimentos sociais têm seados em critérios éticos, que apóiem o co-
explicitado claramente sua oposição ao neoli- mércio justo e a melhoria das condições de vi-
beralismo por motivos ecológicos, éticos, reli- da dos trabalhadores e das minorias, e do meio
giosos, ideológicos, políticos, econômicos e ambiente. Aqui cabe reconstruir o diálogo Nor-
culturais. Não parece haver dúvidas sobre as te-Sul no sentido de estabelecer uma Nova Or-
questões concretas que mobilizaram os partici- dem Econômica Internacional justa, que res-
pantes destes movimentos, mesmo que exista peite a soberania e autodeterminação dos po-
uma cacofonia de vozes e reivindicações nas vos e apóie o desenvolvimento econômico do
passeatas, plebiscitos, greves, e manifestações Terceiro Mundo. Há também que se investir no
de rua organizadas nos últimos anos. Mais di- desenvolvimento sustentável, permitir que paí-
fícil, porém, se coloca a caracterização e visua- ses em desenvolvimento tenham acesso ao co-
lização de programa alternativo à globalização nhecimento técnico, acabar com a escravidão
corporativa neoliberal, ou em outros termos, a global das dívidas externas e fazer com que os
favor de que se mobilizam estas redes e movi- mercados globais favoreçam as economias dos
mentos? países em desenvolvimento.
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5) Conversão da economia global para susten- líticas, sociais, ambientais e econômicas vividas
tabilidade ecológica pela transformação dos por grande parte dos povos do mundo, consi-
padrões de produção e consumo dos países “er- deramos que se trata de importante síntese e
radamente desenvolvidos” (wrongly developed resumo do que seria um programa alternativo
countries), do cumprimento de acordos ecoló- ao implementado pelos “de cima.”
gicos internacionais, e do fim da destruição dos
recursos naturais promovida pelo Banco Mun-
dial e FMI. Conclusão
6) Criação de prosperidade pela satisfação das
necessidades humanas e ambientais através do Amin (2001) sugere que os novos movimentos
encorajamento do desenvolvimento econômi- sociais, como o Movimento dos Sem Terra no
co – não da austeridade – da promoção da pro- Brasil ou a luta de assalariados e desemprega-
dução agrícola voltada para as necessidades lo- dos em alguns países europeus, representam a
cais, da utilização de técnicas de planejamento nova fase da luta social, marcada por uma plu-
do desenvolvimento, de investimentos a longo ralidade de movimentos sindicais, ecológicos,
prazo, e do reestabelecimento de políticas de de movimentos de mulheres e pela democracia.
pleno emprego. Se esta caracterização de Amin estiver correta,
7) Proteção contra a volatilidade global gerada então também nos parece correto o que ele
por expansão demasiada seguida de recessão aponta como a questão central deste novo mo-
através do controle do fluxo de capitais pelo es- mento pós-Seattle e Fóruns Sociais Mundiais:
tabelecimento de impostos sobre investimentos definir qual será a relação entre os vários confli-
especulativos de curto prazo como o “imposto tos entre as diversas classes dominantes e seus
Tobin.” Ademais, faz-se necessária a coordena- Estados e os conflitos sociais por elas gerados.
ção da demanda nas maiores economias, a ga- Se por um lado a invasão do Iraque pelo
rantia de liquidez global por Direitos Especiais exército americano aponta na direção de um
de Saque durante períodos em que países en- futuro cinzento, violento, polarizado entre os
frentem crise econômica aguda, a estabilização desejos de grupos dominantes nos Estados Uni-
das taxas de câmbio internacionais, a penaliza- dos e seus aliados na Europa, e a grande maio-
ção dos especuladores quando sofrerem perdas ria dos povos do mundo; por outro, está sur-
derivadas de especulação com ativos financei- gindo um novo “superpoder” global que cres-
ros, o estabelecimento de mecanismos perma- centemente demonstra sua capacidade e força
nentes de resposta à insolvência de países endi- para propor alternativas de paz, desenvolvi-
vidados, e o desenvolvimento de regulamenta- mento, e democracia em todo o mundo. Para
ção do sistema monetário internacional. que lado a humanidade caminhará nas próxi-
Embora os pontos acima, de forma alguma, mas décadas dependerá fundamentalmente do
esgotem o conjunto de propostas debatidas em resultado do embate entre esses dois grandes
nível internacional para enfrentar as crises po- blocos de forças.
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Modificado de Arquilla and Arenfeldt 2001