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NATUREZA
DESAFIO NATUREZA

650 mil famílias se declaram 'povos


tradicionais' no Brasil; conheça os kalungas,
do maior quilombo do país
Cruzamento de dados inédito feito pelo Ministério Público Federal mostra
localização de comunidades tradicionais em todo o Brasil. G1 visitou território
quilombola em Goiás que mantém modo de vida e saberes tradicionais.

Por Paula Paiva Paulo, G1


29/10/2019 05h01 · Atualizado há 2 meses

Kalunga, maior território quilombola do país, preserva o cerrado em Goiás


No quintal de sua casa de barro e telhado de palha, Neuza da Cunha, de 57 anos,
mostra pés de tingui, mangaba, baru, pequi, cagaita, sambaíba e sucupira. “São
nascidos por eles mesmos.” É assim que ela ensina que os produtos não precisam
de plantio e são naturais dali, do Cerrado. Deles, Neuza extrai o óleo, tira a polpa e
faz suco. Do mesmo jeito como fazia sua mãe e a mãe da sua mãe. Ela mora no Sítio
Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga, o maior território quilombola do Brasil,
no nordeste de Goiás.

Nesta série de reportagens do Desafio Natureza, o G1 mostra como povos


tradicionais ajudam a conservar o meio ambiente ao explorarem de maneira
sustentável o seu entorno.

Temas das próximas reportagens:

· Kalungas temem impacto de construção de hidrelétrica

· Quilombolas transformam plantas típicas do Cerrado em remédios,


alimentos e cosméticos

· Conheça a Romaria de Nossa Senhora da Abadia, festejo tradicional


kalunga

· Orçamento para regularização de terras quilombolas diminui 90% em 10


anos

· Perda de territórios indígenas ameaça segurança alimentar mundial

Os kalungas são exemplo da importância dos povos tradicionais para a


biodiversidade: após séculos de ocupação de um vale cercado por serras muito altas
e com cachoeiras cristalinas, o bioma local segue preservado.

"Os kalungas estão ali há 300 anos criando gado, produzindo


arroz, feijão, milho, mandioca, farinha, além do uso dos
produtos da biodiversidade", diz a ecóloga Isabel Figueiredo.
"E, ao olhar as imagens de satélite, você vê o quanto aquela
paisagem está íntegra".
Isabel é coordenadora do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN),
entidade voltada a fortalecer iniciativas que geram renda a partir da biodiversidade
e que atua na região.

Assim como os kalungas, um levantamento inédito do Ministério Público


Federal (MPF) ao qual o G1 teve acesso mostra que 650.234 famílias brasileiras se
declaram como povo ou comunidade tradicional. São núcleos que têm nos
territórios em que vivem e nos recursos naturais que utilizam a condição de sua
existência e de sua identificação como um grupo culturalmente diferenciado. Neste
mapeamento do MPF, estão localizados os indígenas, quilombolas, pescadores
artesanais, extrativistas, ribeirinhos, ciganos e pertencentes a comunidades de
terreiro.

Veja onde estão as mais de 650 mil famílias que se declaram como povo tradicional no país — Foto: Rodrigo
Sanches/G1

Para chegar a esse número, o MPF cruzou informações de cadastros


governamentais do Incra, Funai, ICMBIO, IBGE e CadÚnico – registro federal voltado
a famílias de baixa renda. O objetivo é criar um banco de dados digital público para
dar visibilidade a essas comunidades e orientar políticas públicas. O MPF espera
lançar essa plataforma digital em 2020.

O Estado do Pará reúne cerca de 20% dessas mais de 650 mil famílias, a maior
concentração entre as unidades da federação. É também o estado que lidera a
concentração de famílias ribeirinhas (50.314), extrativistas (11.826) e pescadores
artesanais (40.123). Já as famílias indígenas estão majoritariamente no Amazonas
(43.264) e os quilombolas, na Bahia (43.009).
Em cada grupo, veja os três estados com a maior concentração de famílias tradicionais. — Foto: Rodrigo Sanches/G1

Para o procurador Wilson de Assis, o levantamento é até hoje a melhor tentativa de


estimar o tamanho dessa população. Ainda assim, ele explica que o número de
famílias de povos tradicionais pode ser muito maior na realidade. A defasagem
ocorre porque os cadastros federais classificam apenas 7 das 29 categorias de
povos tradicionais reconhecidos pela União.

Estão de fora dessa conta, por exemplo, as quebradeiras de coco babaçu, os


apanhadores de flores sempre vivas, as raizeiras e os andirobeiros.
G1 visitou território Kalunga, em Goiás, para conhecer modo de vida e saberes tradicionais — Foto: Fábio Tito/G1

Segundo o coordenador da câmara temática do MPF dedicada ao tema, o


subprocurador-geral da República Antonio Bigonha, ainda persiste certa resistência
de órgãos de preservação ambiental com relação a esses povos. Para eles, as áreas
de conservação podem ser prejudicadas pela presença humana. Para Bigonha, a
lógica é exatamente oposta. "É um elemento poderoso de conservação e
desenvolvimento sustentável", defende. Segundo ele, o principal desafio dos
procuradores desta câmara é sensibilizar os órgãos ambientais neste sentido.

A antropóloga Katia Favilla explica que a criação de algumas áreas de preservação


mais restritivas, sem autorização para habitação humana, como as Unidades de
Conservação de Proteção Integral, por vezes ocorre em territórios de ocupação
tradicional. A pressão para a expulsão dos habitantes daquela região seria um
contrassenso.

"Muitas vezes a unidade está conservada justamente porque tem os povos


morando lá.” Katia é secretária-executiva da Rede Cerrado, composta por 55
entidades da sociedade civil que lutam pela conservação do Cerrado e de seus
povos.
Para a ecóloga Isabel Figueiredo, os povos tradicionais podem não só estar em
harmonia com a natureza como podem enriquecê-la.

“Hoje, o que o Cerrado é, o que a Amazônia é, o que a


Caatinga é, é também fruto da interação do ser humano com
o ambiente”, afirma.

"Isso não quer dizer que essas famílias não vão cortar uma árvore para fazer um
curral, mas elas vivem numa escala que propicia que, na mesma paisagem, se
tenham áreas de cultivo e áreas nativas em equilíbrio".

Kalungas ocupam território há cerca de 300 anos, e área segue conservada. — Foto: Fábio Tito/G1

Os especialistas na área reforçam ainda a importância econômica destes povos, já


que eles têm conhecimentos tradicionais em alimentos, cosméticos e fármacos que
são utilizados por várias indústrias.
O antropólogo Marco Paulo, também da câmara temática do MPF, usa como
exemplo o açaí, chamado de “ouro roxo” no Norte do país. Maior produtor de açaí
do Brasil, o Pará movimentou US$ 17 milhões nos últimos dois anos com o
fruto.

“Imagina a quantidade de produtos da biodiversidade que a Amazônia pode


oferecer se explorados racionalmente, com agregação de valores, em cadeias
produtivas sustentáveis.”

Ao mesmo tempo, preocupa perder esse conhecimento tradicional antes mesmo de


conhecê-lo, com o sumiço de alguns povos. “Diversos povos indígenas com seu
conhecimento milenar sobre determinadas regiões já desapareceram e levaram
consigo aquele conhecimento, e perdemos o acesso àquelas bibliotecas de
conhecimentos étnicos”, afirma o antropólogo.

Em capela no Vão de Almas, uma das comunidades do território Kalunga, moradores penduraram cartaz com informações
sobre decomposição de materiais. — Foto: Fábio Tito/G1

Quando um povo se reconhece como tradicional?


Existentes há séculos, os povos tradicionais do país são frutos da antiga
miscigenação de indígenas, negros e europeus que formam o povo brasileiro. A
formação de cada um deles se desenhou de acordo com o contexto histórico e
geográfico em que viviam.

Por muito tempo, o reconhecimento da identidade como comunidade tradicional


não foi uma questão para esses povos. Segundo a antropóloga Katia Favilla, com o
avanço das fronteiras agrícolas, criação de hidrelétricas, rodovias ou projetos de
mineração, passou a existir no país uma corrida por reconhecimento. A lógica era a
da mais pura sobrevivência.

"A partir do momento em que eles se sentem ameaçados na sua forma de


existência, eles falam para o mundo, 'olha, a gente está aqui, a gente existe', explica
ela, que defendeu sua dissertação de mestrado na UNB sobre este processo
histórico.

Casas do território Kalunga, no nordeste de Goiás, são de barro e telhado de palha — Foto: Fábio Tito/G1
O precursor dessa busca por reconhecimento foi o seringueiro e ambientalista
Chico Mendes, morto a tiros em 1988, no Acre. A partir dele, o Estado começa a
perceber que povos tradicionais não são apenas indígenas e quilombolas, mas
também diversas comunidades que dependem diretamente da preservação do
meio ambiente para sobreviverem.

As reivindicações dos seringueiros resultaram na criação das Reservas Extrativistas,


e influenciaram na formação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação,
que, além de prever as áreas de Proteção Integral (sem presença de humanos),
criou também a de Uso Sustentável. "O Estado reconheceu que existe a
possibilidade de uma Unidade de Conservação com pessoas morando dentro e
preservando, porque eles sempre conservaram", disse Favilla.

Capela do Vão de Almas, uma das comunidades do território Kalunga, maior remanescente de quilombo do Brasil — Foto: Fábio
Tito/G1

O que a lei brasileira diz sobre eles?


A Constituição de 1988 reconhece os direitos dos indígenas e quilombolas. No
entanto, para os demais povos, a legislação brasileira passou a estabelecer regras e
regulamentações nos últimos 20 anos. Veja os principais marcos:

· 1998: Brasil ratifica por meio de decreto federal a Convenção da Diversidade


Biológica, criada durante a Eco-92. A convenção é um tratado da Organização das
Nações Unidas que reconhece que comunidades tradicionais têm práticas
relevantes para a conservação da diversidade biológica.

· 2004: Brasil ratifica por meio de decreto federal a Convenção no 169 da


Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais. Ela
define, por exemplo, a obrigatoriedade do direito de consulta. Qualquer ação do
estado que vá impactar um modo de vida tradicional, os afetados devem ser
consultados previamente.

· 2000: Lei 9985, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Foi
criada a modalidade Unidade de Conservação de Uso Sustentável, que prevê a
ocupação de povos tradicionais.

· 2007: Criação da Política Nacional para o Desenvolvimento Sustentável de Povos


e Comunidades Tradicionais

· 2010: São criados os Termos de Autorização de Uso Sustentável (TAUS),


instrumento que regulamenta a utilização de áreas federais, como várzeas,
mangues e praias para o "uso racional e sustentável dos recursos naturais
disponíveis" por povos tradicionais.

· 2015: Lei 13123 regula o acesso ao patrimônio genético do país. Patrimônio


genético é qualquer tipo de ser vivo (em geral, plantas) que seja manipulado por
comunidades tradicionais e tenha uma aplicação na vida dessas comunidades,
assim como potencial comercial e industrial. O acesso era regido por uma
Medida Provisória, que foi revogada na criação da lei.

· 2016: Decreto do governo federal institui o Conselho Nacional dos Povos e


Comunidades Tradicionais, e reconhece 29 categorias de povos tradicionais no
Brasil.
Mulheres kalungas no Vão de Almas, no nordeste de Goiás — Foto: Fábio Tito/G1

DESAFIO NATUREZA - POVOS TRADICIONAIS

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