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IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA EXTENSIVA ÀS EMPRESAS PÚBLICAS

BRASILEIRAS

Gabriela Ketzer Peralta


Aluna da Graduação em Direito da PUCRS

Nota introdutória

O presente artigo é fruto do trabalho de graduação de curso apresentado


pela autora à banca examinadora realizada pela Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul em 1º de novembro de 2006.
Compunham referida banca os professores Mestres Maria Eunice de Paula
(orientadora), Márcia Weber Cadore e Arthur Maria Ferreira Neto, aos quais a aluna
agradece pelas críticas construtivas e perguntas instigantes.

Na dada citada, a acadêmica obteve o grau dez e o convite para redigir o


presente artigo para a publicação no site da universidade. Feitas as necessárias
considerações, é com humildade e certeza de não ter esgotado o tema, que se
passa a apresentar o artigo extraído da monografia supra citada.

1 INTRODUÇÃO AO TEMA

A imunidade tributária, como gênero, é tema de suma importância para o


direito não só para o direito tributário, mas também para o constitucional e
administrativo, pois se trata de regra constante da seção das limitações ao poder de
tributar e tem fundamento na forma federal de Estado.
2

A maior parte da doutrina nacional conceitua a imunidade tributária como


uma limitação ao poder de tributar em função de seus efeitos, uma vez que esta
limita o campo de tributação em relação a certas pessoas, fatos ou situações,
determinando uma não-competência. O doutrinador que representada o conceito de
imunidade tributária defendido pela doutrina majoritária1 é Aliomar Balleiro, que a
conceitua da seguinte forma:

[...] é regra constitucional expressa (ou implicitamente necessária), que


estabelece a não-competência das pessoas políticas da federação para
tributar certos fatos e situações, de forma amplamente determinada,
delimitando negativamente, por meio de redução parcial, a norma de
atribuição de poder tributário. A imunidade é, portanto, regra de exceção e
de delimitação de competência, que atua, não de forma sucessiva no
tempo, mas concomitantemente. A redução que opera no âmbito de
abrangência da norma concessiva de poder tributário é tão só lógica, mas
2
não temporal .

É que a Constituição Federal, ao partilhar o poder tributário entre as


pessoas estatais que integram a Federação, se utiliza da técnica de
atribuição e de denegação (ou supressão parcial). De um lado,
encontramos atribuições de poder para instituir tributo, concedidas em
caráter positivo (arts. 145, 148, 149, 1453 e 156) e normas que reduzem,
diminuem, suprimem parcialmente a abrangência das primeiras, realizando
a enformação ou a modelagem da competência, constitucionalmente
delimitada. A imunidade é, portanto, regra de exceção, somente inteligível
se conjugada à outra, que concede o poder tributário, limitando-lhe a
3
extensão, de forma lógica e não sucessiva no tempo .

Para o renomado autor, as normas de competência para tributar resultam de


uma equação lógica, qual seja, norma de atribuição do poder de tributar menos as
imunidade. Sendo assim, as imunidades suprimem as normas que delegam poder
de tributar, amputando-lhes a abrangência4.

Paulo de Barros Carvalho critica severamente o conceito clássico defendido


pela doutrina majoritária. A principal crítica tecida pelo autor é a de que as
imunidade não podem ser vistas como supressão a qualquer poder que seja, sendo,
em realidade, normas de competência negativa. Na sua opinião, nunca surgiu poder
de tributar sobre os fatos, pessoas ou situações que a norma imunitória abrange,

1
No mesmo sentido: ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva,
2004; CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 21. ed. São Paulo:
Malheiros, 2005.
2
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 228.
3
Ibidem, p. 14.
4
Ibidem, p. 228-231.
3

sendo que esta nada suprime, mas auxilia na delimitação do campo em que o
Estado está autorizado a tributar os contribuintes. Sintetiza seu conceito da seguinte
forma:

Recordamos o conceito de imunidade tributária, única e exclusivamente,


com o auxílio de elementos jurídicos substanciais à sua natureza, pelo que
podemos exibi-la como a classe finita e imediatamente determinável de
normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, e que
estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de
direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos
5
que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas .

A imunidade tributária é gênero que se subdivide em espécies, como por


exemplo a imunidade tributária recíproca, imunidade dirigida às entidades de
assistência social , aos templos de qualquer culto, aos partidos políticos, conforme
as alíneas do art. 150, VI, da Constituição Federal. O presente trabalho atem-se ao
estudo apenas da imunidade tributário recíproca.

A imunidade tributária recíproca atualmente está prevista na Constituição de


1988 em seu art. 150, VI, ‘a’, entre outras limitações ao poder de tributar, e consiste
na intributabilidade entre as pessoas de direito público interno, conforme ensina
Ricardo Lobo Torres, sendo regra essencial à sobrevivência do regime federalista e
forma de afirmação da liberdade6. Sinala, ainda, que esta imunidade classifica-se
como uma imunidade subjetiva, pois estabelecida em razão da pessoa a ser
protegida dos efeitos da tributação7.

Tratando-se do aspecto subjetivo, ou seja, de quais as pessoas destinatárias


da imunidade tributária recíproca, reza a Constituição que são elas: a União, os
Estados, o Distrito Federal, Municípios e, por força do art. 150, VI, § 2º, da CF, isto

5
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p.
185.
6
TORRES, Ricardo Lobo. Os Direitos Humanos e a Tributação: imunidades e isonomia. Rio de
Janeiro: Renovar, 1995, p. 193.
7
NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 169-
170. Este autor classifica as imunidades, isenções e incidência em três categorias: “Subjetiva é a
incidência, isenção e imunidade prevista em razão da pessoa: ratione personae. Objetiva é a
incidência, isenção e imunidade prevista em razão do objeto: ratione materiae. Sujetiva-objetiva – na
aplitude casuística das situações, às vezes deparamos com disposições que levam em conta não só
aspectos objetivos mas, concomitantemente, subjetivos. Nem sempre é fácil destacar a
predominância ou maior carga de um desses dois aspectos. Se na vontade objetivada da lei ordinária
ou na Constituição transparecem ambos é porque esses aspectos estão consorciados”.
4

se aplica também às autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder


Público, desde que vinculadas às finalidades essenciais deste ou delas decorrentes.

O art. 150, VI, § 3º veda de forma expressa a aplicação desta imunidade às


pessoas de direito público em relação ao patrimônio, renda e serviços que estejam
relacionados com a exploração de atividades econômicas, atividades estas que
devem ser regidas pelas normas aplicáveis ao setor privado, em homenagem ao
princípio da livre concorrência; às atividades em relação às quais haja a
contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas; em situação que exonere o
promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel8.

Tratando-se do aspecto objetivo, ou seja, em relação a quais tributos


aquelas pessoas são imunes, a Constituição determina que a imunidade abrange os
impostos sobre patrimônio, renda e serviços. Em relação ao tema, ainda há
discussões acessas no próprio Supremo Tribunal Federal.

Note-se que o STF decidiu que a palavra “impostos” deve ser interpretada
de forma ampla, estendendo-se a todos os impostos, inclusive aqueles que não
incidam sobre o patrimônio, renda e serviços, a exemplo do ICMS e IPI.
Particularmente, em relação aos impostos indireitos acolheu a tese da repercussão
econômica do tributo, ou seja, será imune ao pagamento de imposto se o patrimônio
onerado pertencer a ente público9. No entanto, em relação às contribuições, o
Pretório Excelso optou por fazer uma interpretação restritiva, não protegendo as
pessoas abrangidas pela regra da imunidade da incidência de referidas
contribuições, muito embora estas onerem o patrimônio público de forma
significativa destes entes10.

8
Conforme o parágrafo 3º, do inciso VI, do art. 150, da Constituição Federal brasileira de 1988.
9
Nesse sentido: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade recíproca – ICMS. Recurso
Extraordinário n.º 203755/ES. Recorrente: Estado do Espírito Santo. Recorrido: Instituto de Ensino
Superior Professor Nelson Abel de Almeida. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 8 de novembro
de 1996. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 ago. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária - repercussão. Recurso Extraordinário n.º
281433/SP. Recorrente: Assistência Social Assembléia de Deus. Recorrido: Estado de São Paulo.
Relator: Ministro Moreira Alves. Brasília, 14 de dezembro de 2001. Disponível em
<http://www.stf.gov.br>. Acesso em 30 ago. 2006.
10
Nesse sentido: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade recíproca – contribuição. Agravo
regimental n.º 378144/PR. Agravante: Município de Londrina. Agravado: União. Relator: Ministro Eros
Grau. Brasília, 22 de abril de 2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 ago. 2006.
5

No entanto, tais polêmicas seguramente serão levadas novamente à


apreciação do Supremo Tribunal Federal, eis que surgem cada vez mais decisões
nas instâncias inferiores que se manifestaram de maneira diversa do
posicionamento adotado por aquele tribunal11.

A interpretação a ser dada à regra de imunidade tributária recíproca deve ser


a mais abrangente possível, visto que seu fundamento mais importante é a proteção
e manutenção da forma de Estado Federal, por isto sendo considerada cláusula
pétrea, nos termos do art. 60, §4º, IV, da Constituição Federal. Pertinente se faz a
transcrição de trecho da doutrina de Roque Antonio Carrazza, sobre o ponto:

Decorre do princípio federativo porque, se uma pessoa política pudesse


exigir impostos de outra, fatalmente acabaria por interferir em sua
autonomia. Sim, porque, cobrando-lhe impostos, poderia levá-la a situação
de grande dificuldade econômica, a ponto de impedi-la de realizar seus
objetivos institucionais. Ora, isto a Constituição absolutamente não tolera,
tanto que inscreveu nas cláusulas pétreas que não será sequer objeto de
deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir “a forma
12
federativa de Estado” (art. 60, §4º, I) .

Sendo assim, um dos meios de proteger a forma de Estado federal é


preservando a autonomia das pessoas políticas. Ainda que subsidiariamente, a
ausência de capacidade contributiva também seja considerada como fundamento da
imunidade em questão. Justamente por proteger a forma federada de Estado, a
imunidade recíproca deve ser tida como uma regra, uma cláusula pétrea e seu
fundamento deve ser levado em consideração pelos julgadores de todas as
instâncias, pela sua importância e hierarquia constitucional.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade recíproca – taxa. Recurso Extraordinário n.º
364202/RS. Recorrente: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Recorrido: Município de
Viamão. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 28 de outubro de 2004. Disponível em:
<http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 ago. 2006.
11
Exemplo disso é a decisão liminar proferida nos autos do Mandado de Segurança n.º
2006.71.00.030740-9 que tramita perante a Justiça Federal. Restou deferida liminar para sustar a
cobrança de contribuições sociais a ente imune.
12
CARRAZZA. Op. cit., 2005. p. 689-690.
6

2 APLICAÇÃO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA ÀS EMPRESAS


PÚBLICAS BRASILEIRAS

A imunidade tributária recíproca, conforme sucintamente exposto


anteriormente, tem como destinatários a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, estendendo-se às autarquias e fundações instituídas e mantidas pelos
entes que integram a administração pública direta em relação ao patrimônio, renda e
serviços vinculados a suas finalidades essenciais ou delas decorrentes. Em seguida,
através do art. 150, VI, parágrafo 3º, da CF, o legislador constituinte originário
inseriu, na Carta de 1988, vedação expressa da aplicação da imunidade recíproca
em relação ao patrimônio, renda e serviços relacionados com a exploração de
atividades econômicas, atividades estas que serão regidas pelas normas aplicáveis
a empreendimentos privados.

O texto constitucional, portanto, não determina sejam as empresas públicas


abrigadas pela regra da imunidade recíproca, muito embora, tal qual as autarquias e
fundações, elas façam parte da Administração Pública indireta.

A exploração de atividade econômica de forma direta pelo Estado constitui


exceção. Em regra, a atividade econômica deve ser praticada pela iniciativa privada.
Conforme sinalou Celso Antônio Bandeira de Mello, é justamente para a proteção do
setor privado que esta regra foi criada e para a efetividade dos princípios constantes
do art. 170, da CF, que referem-se mormente à livre iniciativa e à livre
concorrência13. Assim, reza o art. 173, da CF, que o Estado pode praticar atividade
econômica de forma direta, somente quando necessário aos imperativos da
segurança nacional ou quando presente relevante interesse coletivo. Ademais, as
empresas públicas e as sociedades de economia mista não podem gozar de

13
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 18ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2005. p. 175. “No que concerne a esta modalidade de interferência do Estado no domínio
econômico, isto é, sua atuação empresarial (por si mesmo ou por criatura sua), uma vez que poderia
ser danosa para a “liberdade de iniciativa” – que é um dos fundamentos expressos da ordem
econômica brasileira, consoante dispõe o art. 170, caput, da Constituição – e perigosa para a “livre
concorrência” – que é um dos princípios obrigatórios de nosso sistema (art. 170, IV) -, o art. 173
tratou de balizar estritamente as possibilidades de o Estado atuar como empresário”.
7

quaisquer privilégios fiscais que não forem extensivos ao setor privado, é o que
determina o parágrafo 2º, do art. 173, da CF.

Apesar de todas estas ponderações, muitos doutrinadores e algumas


decisões do Supremo Tribunal Federal têm manifestado posicionamento favorável à
aplicação da imunidade tributária recíproca também em relação às empresas
públicas. Reside justamente neste ponto o cerne desta pesquisa: a análise dos
argumentos da doutrina e a fundamentação das decisões do STF acerca desta
aplicação da imunidade. Antes, porém, de analisar as razões da doutrina e
jurisprudência, mister verificar-se o conceito de empresas públicas.

2.1 A dicotomia entre empresas prestadoras de serviços públicos e as


exploradoras de atividade econômica

Celso Antônio Bandeira de Mello conceitua empresas públicas fixando-lhes


algumas características essenciais, a saber: são pessoas jurídicas dotadas de
personalidade de Direito Privado, mas por serem instrumentos de ação estatal ficam
adstritas à observância de regras especiais; são criadas por força de autorização
legal; podem ser constituídas sob qualquer forma em direito admitida; o capital deve
ser formado unicamente por recursos de pessoas da Administração Pública direta ou
de suas respectivas pessoas da Administração Pública indireta, devendo residir na
esfera federal a predominância acionária14.

Note-se que o autor não fixa como traço característico essencial a


exploração de atividade econômica. Isto se dá em razão do que ele convencionou
chamar de “disseptação estritamente jurídica” das empresas públicas em duas
espécies: as exploradoras de atividades econômicas e as prestadoras de serviços
públicos. Em relação a este segundo tipo, destaca que hoje há inúmeras e
importantes empresas que prestam serviços públicos, como é o caso da Empresa

14
MELLO. Op. cit., p. 173.
8

Brasileira de Correios Telégrafos, que presta o serviço postal de competência da


União, nos termos do art. 21, X15, da CF16.

Importante transcrever trecho da doutrina de Celso Antônio de Mello em


relação à existência de duas espécies de empresas públicas, conforme mencionado:

Há, portanto, dois tipos fundamentais de empresas públicas e sociedades


de economia mista: exploradoras de atividade econômica e prestadoras de
serviços públicos ou coordenadoras de obras públicas e demais atividades
públicas. Seus regimes jurídicos não são, nem podem ser, idênticos, como
procuraremos demonstrar em outra oportunidade.
No primeiro caso, é compreensível que o regime jurídico de tais pessoas
seja o máximo possível daquele aplicável à generalidade das pessoas de
Direito Privado. Seja pela natureza do objeto de sua ação, seja para
prevenir que desfrutem de situação vantajosa em relação às empresas
privadas -, compreendendo-se que estejam, em suas atuações, submetidas
a uma disciplina bastante avizinhada da que regula as entidades
particulares de fins empresariais. Daí haver o Texto Constitucional
estabelecido que em tais hipóteses regular-se-ão pelo regime próprio das
empresas privadas (art. 173, § 1º, II). Advirta-se, apenas, que há um
grande exagero nesta dicção da Lei Magna, pois ela mesma se encarrega
de desmentir-se em inúmeros outros artigos, como além será demonstrado.
No segundo caso, quando concebidas para prestar serviços públicos ou
desenvolver quaisquer atividades de índole pública propriamente (como
promover a realização de obras públicas), é natural que sofram o influxo
mais acentuado de princípios e regra do Direito Público, ajustados,
17
portanto, ao resguardo de interesses desta índole .

Hely Lopes Meirelles leciona no mesmo sentido, distinguindo dois tipos de


das empresas, conforme se depreende da citação que ora se transcreve:

Empresas públicas são pessoas jurídicas de Direito Privado, instituídas


pelo Poder Público mediante autorização de lei específica, com capital
exclusivamente público, para a prestação de serviço público ou a
realização de atividade econômica de relevante interesse coletivo, nos
moldes da iniciativa particular, podendo revestir qualquer forma e
18
organização empresarial .

Diante dessas considerações, é possível afirmar que autores de renome no


direito administrativo brasileiro classificam as empresas públicas em dois tipos: as
exploradoras de atividade econômica e as prestadoras de serviços essenciais. A

15
“Art. 21. Compete à União:
[...]
X – manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”.
16
MELLO. Op. cit., p. 177.
17
MELLO. Op. cit., p. 185-186.
18
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
p. 355-356.
9

compreensão desta distinção é de suma importância para o estudo e a aplicação da


imunidade tributária recíproca em relação às empresas públicas brasileiras. Em
relação ao primeiro tipo, é certo que se aplica o regime destinado às empresas
privadas, no entanto, em relação ao segundo tipo, há doutrinadores que sustentam a
aplicação das regras atinentes à Administração Pública.

2.2 Critérios doutrinários para aplicação da imunidade tributária recíproca às


empresas públicas brasileiras

A literalidade do texto da Constituição permite afirmar que, em princípio, a


imunidade tributária recíproca não se aplica às empresas públicas brasileiras. Note-
se que o parágrafo segundo do art. 150, da Constituição, estende a regra às
autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, não fazendo
referência às empresas públicas. Além disso, o parágrafo terceiro do mesmo artigo
determina que a imunidade recíproca não se aplica ao patrimônio, renda e serviços
relacionados à exploração de atividade econômica. Ocorre que o caput do artigo 173
da CF prevê a realização de atividades econômicas por empresas públicas, o que
conduz a regra do parágrafo terceiro, do mesmo artigo a ser aplicada de imediato,
conseqüentemente, vedando a aplicação da imunidade neste caso. Ademais, há
disposição expressa da sujeição das empresas públicas ao regime jurídico das
empresas privadas, inclusive em aspectos tributários, sendo vedado o gozo por elas
de qualquer privilégio fiscal não extensivo ao setor privado (art. 173, §1º, II e §2º, da
CF).

Apesar de todas as ponderações feitas em relação aos dispositivos


constitucionais atinentes à matéria, alguns doutrinadores têm formulado teses que
defendem a extensão da imunidade tributária às empresas públicas e reformulam
as interpretações feitas a priori em relação aos artigos citados. De sorte que, cumpre
analisar estes argumentos, já que a doutrina parece estar influenciando as decisões
proferidas pelo Pretório Excelso, conforme analisado posteriormente.
10

Atualmente, um dos doutrinadores que vem tratando do tema com maior


veemência é Roque Antonio Carrazza. Ele posiciona-se favorável à abrangência das
empresas públicas brasileiras pela imunidade tributária recíproca, desde que estas
prestem serviços públicos ou pratiquem atos de polícia.

Carrazza reconhece como incontroverso que o tratamento a ser dado às


empresas públicas que exerçam atividade atividades econômicas seja o mesmo
destinado às empresas privadas, inclusive no que diz respeito à tributação. Isto se
dá em razão da incidência da regra constitucional inserida no art. 173, caput, da
Constituição Federal, que deu preferência à iniciativa privada para a exploração de
atividades econômicas, vedando que as empresas públicas intervenham no mercado
desfrutando de privilégios fiscais, pois, caso estas empresas pudessem receber
benefícios desta natureza, certamente ocorreria concorrência desleal em relação às
empresas privadas. Resta claro que as empresas públicas não serão privilegiadas
quanto a tratamento tributário especial em detrimento das empresas privadas, por
força de disposição constitucional expressa19.

Entretanto, com muito lucidez, o autor supracitado ressalva que, do mesmo


modo que o art. 170, da CF, reserva um campo à livre iniciativa (e o art. 173 dá
preferência a esta em detrimento do Estado), o art. 17520, da CF, reserva um campo
à atuação estatal21. Portanto, em regra, o setor privado deve praticar as atividades
econômicas, sendo excepcional a atuação do Estado nesta seara e, em regra, deve
o Estado prestar os serviços públicos, podendo o setor privado prestá-los,
excepcionalmente, na forma de concessão ou permissão.

Pode ocorrer que, excepcionalmente, o Estado, por meio das empresas


públicas ou de outras pessoas a ele vinculadas, exerça atividades que em regra não
sejam a ele reservadas. De sorte que, se o Estado atuar no campo reservado à
iniciativa privada, por meio das empresas públicas, estas têm de se submeter ao

19
CARRAZZA. Op. cit., 2005. p. 698.
20
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.
21
CARRAZZA, Roque Antonio. A Imunidade Tributária das Empresas Estatais Delegatárias de
Serviços Públicos: um estudo sobre a imunidade tributária da Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos – ECT. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 40.
11

regime jurídico aplicado às empresa privadas, conforme determina o art. 173,


parágrafo 2º, da Constituição. Isto por que estas empresas são consideradas
agentes empresariais, concorrendo no mercado com a iniciativa privada22.

Roque Antonio Carrazza está convicto, contudo, que, se as empresas


públicas forem delegatárias de serviços públicos, não concorrendo, portanto, com as
empresas privadas, não se submetem aos ditames de precitado art. 173, da Carta
Magna. Neste caso, são verdadeiros instrumentos do Estado e a ele se equiparam
em termos de privilégios fiscais. Desempenham, pois, atividades que as empresas
privadas jamais assumiriam, senão na forma de concessão ou permissão se pelo
próprio Estado fossem estas contratadas23, uma vez que o art. 175, da CF,
determina como regra a prestação de serviços públicos diretamente pelo Estado. Em
relação à prestação de serviços pelas empresas públicas conclui:

Podemos proclamar, pois, que, neste caso, as sociedades de economia


mista e as empresas públicas, pelas atribuições delegadas de Poder
Público que exercitam, são, tão-somente quanto à forma, pessoas de
Direito Privado. Quanto ao fundo, são instrumentos do Estado, para a
prestação de serviços públicos. Na medida em que criadas pela lei, com a
específica finalidade de levá-los adiante, acabam fazendo as vezes das
autarquias, embora – damo-nos pressa em proclamar – com elas não se
24
confundem .

Sinalou o autor que há atividades que só podem ser exploradas pelo Estado,
ou seja, pelos entes da Administração Pública direta, uma vez que a Constituição
“entendeu que elas são tão essenciais, ou dizem tão de perto com a soberania
nacional, que não convém naveguem ao sabor da livre concorrência”25. Estas
atividades são basicamente aquelas relacionadas nos arts. 21, 25, 30 e 32 da CF,
que referem-se às competências administrativas da União, Estados-membros,
Municípios e Distrito Federal, respectivamente. Logo, se uma empresa pública
prestar qualquer destes serviços ou atividades, cuja realização em princípio cabe a
um ente político, a ela devem ser extensivos os privilégios destinados àquele ente26.

22
CARRAZZA. Op. cit., 2004. p. 40.
23
Ibidem, p. 40.
24
Ibidem, p. 40-41.
25
Ibidem, p. 39.
26
Ibidem, p. 39.
12

Nesta condição, qual seja a de instrumento do Estado para a prestação de


serviços públicos, a empresa pública não é, portanto, sujeitada à tributação27, por
força da interpretação extensiva do art. 150, VI, a, da CF. A finalidade disto é
possibilitar que estas pessoas integrantes da Administração Pública indireta prestem
os serviços públicos a elas incumbidos de forma satisfatória e alcancem os objetivos
públicos propostos. Neste sentido:

Aprofundando o assunto, as empresas estatais, quando delegatárias de


serviços públicos ou de atos de polícia – e que, portanto, não exploram
atividades econômicas -, não se sujeitam à tributação por meio de
impostos, justamente porque são a longa manus das pessoas políticas que,
28
por meio de lei, as criam e lhes apontam os objetivos públicos a alcançar .

Embora seja a empresa pública considerada a extensão do próprio Estado,


com ele não se confunde. A imunidade tributária deve ser estendida a estas
empresas, porquanto não deve a tributação prejudicar a consecução do serviço
público a ser prestado e a intributabilidade se dá justamente por que estas
atividades são de competência do Estado. Assim, como estes serviços podem ser
prestados pelas empresas públicas, os benefícios destinados ao ente político
competente por sua realização a elas deve ser aplicado extensivamente29.
Elucidativos os seguintes trechos da doutrina de Roque Antonio Carrazza:

Neste sentido, enquanto atuam como se pessoas políticas fossem, as


empresas públicas e as sociedades de economia mista não podem ter
embaraçada ou anulada sua ação pública, por meio de impostos. Esta é a
conseqüência de uma interpretação sistemática do art. 150, VI, “a”, da CF.
Não se deve distinguir entre a empresa estatal e a pessoa política que a
instituiu, mas, simplesmente, se a hipótese de incidência (fato gerador in
abstrato) do imposto provém da prestação de serviços públicos, isto é, de
atividades de competência governamental. Em caso afirmativo são
30
alcançadas pelos benefícios do art. 150, VI, “a”, da CF .

O autor acrescenta às empresas públicas prestadoras de serviços aquelas


empresas que praticam atos de polícia, as quais também serão abrangidas pela
imunidade tributária. Ressalva ainda que, mesmo que haja cobrança de preço, tarifa
ou taxa do usuário, a despeito da vedação da imunidade para estes casos, por força
do parágrafo 3º do art. 150, VI, da CF, em relação às empresas públicas prestadoras

27
CARRAZZA. Op. Cit., 2004. p. 38.
28
CARRAZZA. Op. cit., 2005. p. 699.
29
CARRAZZA. Op. Cit., 2004. p. 41.
30
Ibidem, p. 41.
13

de serviços públicos ou que praticam atos de polícia, a imunidade é aplicável. Neste


sentido, leciona:

Vamos logo adiantando que, quando a empresa estatal presta um serviço


público ou pratica um ato de polícia, em seu favor incide o disposto no § 2º
do art. 150 da CF, sem as ressalvas do § 3º desse mesmo dispositivo.
Irrelevante, pois, para o desfrute da imunidade em pauta, que a delegatária
31
cobre preço, tarifa ou taxa do usuário .

Sustenta Carrazza que “a contraprestação econômica pelo serviço público


prestado ou pelo ato de polícia praticado nunca é adequada”32uma vez que esta não
determina livremente o valor desta contraprestação, mas ao contrário, o valor é
regulado por lei (taxas) ou por ato do Poder Executivo (preços e tarifas)33. Ademais,
a empresa pública não pode se negar a prestar o serviço ou a praticar um ato de
polícia ainda que lhe seja desvantajoso, pois o fim primordial a ser atingido é a
consecução do serviço e não o recebimento da contraprestação econômica.

Para Roque Antonio Carrazza, portanto, a imunidade tributária recíproca


deve ser aplica às empresas públicas prestadoras de serviços públicos ou
praticantes de atos de polícia. Ele sintetiza:

Em suma, a empresa estatal delegatária de serviço público juridicamente é


Administração Pública e tem os atributos (positivos e negativos) da
Administração Pública. Desfruta, pois, do regime protetor que a
Constituição Federal reservou aos bens e dinheiros públicos, inclusive no
34
pertinente à imunidade tributária .

Humberto Ávila defende que sejam as empresas públicas e sociedades de


economia mista também abrangidas pela imunidade tributária recíproca. Afirma que
a extensão feita pelo texto constitucional às autarquias e instituições mantidas pelo
Poder Público não pode ser interpretada de forma literal. Um dos principais
argumentos expostos é o de que as empresas públicas prestam serviços
qualificados como públicos dada a sua importância e, ao prestá-los, as empresas
são apenas instrumento do Poder Público. Neste sentido:

31
CARRAZZA. Op. cit., 2005. p. 694-695.
32
Ibidem, p. p. 695.
33
Ibidem, p. 695.
34
Ibidem, p. 709.
14

Algumas atividades e alguns serviços são qualificados como públicos em


razão da sua importância. A Constituição Brasileira atribuiu o caráter
público a alguns desses serviços, exigindo que eles sejam prestados pelo
Poder Público. Em função de razões operacionais, a realização desses
serviços é transferida para determinadas entidades. Essas entidades são
apenas instrumentos do Poder Público. É o Estado que presta o serviço por
meio de uma instrumentalidade sua. Com razão, afirma Bandeira de Mello
que empresas públicas e sociedades de economia mista são, acima de
tudo, instrumento do Estado para atingir uma finalidade pública. Se, em
razão do que foi dito, fica claro que as entidades públicas são apenas
instrumentos do Estado, não resta dúvida de que a imunidade recíproca
também abrange essas entidades que prestam serviços em nome do
Estado. Caso contrário, o Estado seria prejudicado, já que ele mesmo é
35
que presta, ainda que indiretamente, o serviço .

Os critérios que o autor propõe para aplicação da imunidade são os


seguintes: a) tratar-se de um serviço com caráter de serviço público e não privado;
b) a entidade que presta o serviço é um poder público em virtude de lei,
independente da sua forma jurídica; c) o ente público que preste o serviço não
persiga finalidade econômica36.

Ávila sustenta que somente quando as empresas prestam serviços públicos


podem obter os privilégios fiscais concedidos aos entes públicos com a imunidade
recíproca. Caso explorem atividades econômicas propriamente ditas, se sujeitarão à
regra do art. 173, parágrafos 1º, II e 2º, da Constituição Federal, ou seja, a elas
serão aplicadas as mesmas regras destinadas à iniciativa privada37.

Sacha Calmon Navarro Côelho corrobora a tese de aplicação da imunidade


tributária recíproca às empresas públicas brasileiras. O critério para aplicação é que
estas empresas prestem serviços públicos vinculados às finalidades essenciais ou
destas decorrentes em relação aos entes políticos, caso em que, a empresa pública
é considerada a longa manus do próprio Poder Público encarregado pela prestação
daquele serviço, atuando, pois, como órgão da Administração indireta38. Além disto,
as atividades desenvolvidas não devem se equiparar às atividades econômicas

35
ÁVILA. Op. cit., p. 214-215.
36
Ibidem, p. 214-215.
37
Ibidem, p. 219.
38
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2005a. p. 297.
15

próprias das empresas privadas39, caso em que às empresas públicas se aplicaria o


mesmo regime destinado ao setor privado.

O autor referido sinala que o artigo 175 da Constituição Federal dispõe que
incumbe ao Poder Público prestar os serviços públicos, sendo possível fazê-lo de
forma direta ou indireta, sob o regime da concessão ou permissão, através de
licitação. Logo, não havendo permissão ou concessão, o serviço deve ser prestado
diretamente pelo Poder Público, e a quem incumbir executar as atividades será
considerado a longa manus do Estado, neste sentido:

Se não houver concessionário ou permissionário, escolhido mediante


licitação, na forma da lei, o prestador do serviço público terá de entender-
se como o próprio Poder Público dele encarregado, sendo o órgão que o
execute mera longa manus daquele, ainda que se trate de empresa
40
pública .

A INFRAERO é citada como exemplo de empresa a ser abrangida pela


imunidade tributária recíproca. Esta empresa pública é responsável pela
administração dos aeroportos do país, cabendo-lhe operar com a estrutura e infra-
estrutura aeroportuária. Tal serviço público é de competência da União, nos termos
do art. 21, XII, c, da CF41, ele pode ser prestado diretamente por esta ou mediante
autorização, concessão ou permissão. Logo, se a União incumbiu o serviço a uma
empresa pública, esta deve ser considerada sua longa manus, gozando dos
mesmos privilégios dirigidos ao ente político que delegou a prestação do serviço de
sua competência. Claro está que esta empresa não exerce atividade econômica,
mas sim a prestação de um serviço que serve a toda a coletividade e em nome da
União. Sacha Calmon Navarro Coelho sintetiza seu posicionamento da seguinte
forma: “se uma empresa ou sociedade de economia mista preta um serviço público,
atua como órgão da Administração indireta, e não desenvolve atividade econômica
própria das empresas privadas”42.

39
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: sistema tributário. 9. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 324.
40
COÊLHO. Op. cit., 2005b. p. 324.
41
“Art. 21. Compete à União:
[...]
XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:
[...]
c ) a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária”
42
COÊLHO. Op. cit., 2005b. p. 326.
16

Ricardo Lobo Torres sinala que, em relação ao destinatário da imunidade, “o


fundamental é que a pessoa imune não concorra com os particulares no mercado
econômico”43.

Claro está que a doutrina favorável à aplicação da imunidade tributária


recíproca às empresas públicas fixa como traço essencial que estas empresas não
exerçam atividades econômicas, caso em que se deverá aplicar-lhes as regras
pertinentes ao setor privado. A imunidade é extensiva tão somente às prestadoras
de serviços públicos (à exceção de Carrazza, que estende a aplicação às empresas
que praticam ato de polícia), uma vez que estas empresas são consideradas
extensão do próprio Estado, ou melhor, do ente político delegatário do serviço.

2.3 Análise do caso da Empresa Pública de Correios e Telégrafos

A jurisprudência do Pretório Excelso não é farta em relação a casos que


tratem da possibilidade de aplicação da imunidade tributária recíproca à empresa
pública brasileira, sob a égide da Constituição de 1988. Entretanto, há importantes
decisões do Tribunal Pleno proferidas por provocação da Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos que versam sobre a matéria, constituindo precedentes
importantes em relação a futuras demandas.

O primeiro caso a ser citado refere-se ao julgamento conjunto de três


recursos extraordinários interpostos pela Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos. Através destes recursos, a empresa pleiteou o reconhecimento de sua
equiparação à Fazenda Pública sendo-lhe aplicada a regra do art. 100 e seus
parágrafos, da Constituição, que determina que o pagamento de débitos pela
Fazenda Pública oriundos de sentenças judiciais se farão por precatório. A
fundamentação baseou-se na questão de ser a empresa prestadora de serviço
público de alta relevância, assim como o Decreto-Lei n.º 509, de 20 de março de

43
TORRES. Op. cit., p. 198.
17

1969, que criou a ECT, em seu art. 1244 ter estendido a ela os privilégios
concernentes à Fazenda Pública, determinando a impenhorabilidade de seus bens.

As questões fundamentais enfrentadas foram: I – a possibilidade da ECT ser


equiparada à Fazenda Pública para que lhe fossem aplicados os privilégios dirigidos
ao Estado; II – o exame da recepção ou não do art. 12 do Decreto-Lei n.º 509, que
determina a impenhorabilidade dos bens da ECT, pela Constituição de 1998; III –em
vista dos questionamentos anteriores, se deveria, portanto, aplicar o art. 100, da CF,
em relação a ECT, determinando o pagamento das execuções movidas em face da
empresa por meio de precatório.

Os recursos extraordinários números 220.906, 225.011 e 229.696 que


tratam da matéria foram julgados conjuntamente na sessão Plenária de 16 de
novembro de 2000. Após muita discussão e votos-vista, os recursos foram
conhecidos e providos por maioria, restando assim ementados:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EMPRESA


BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. IMPENHORABILIDADE
DE SEUS BENS, RENDAS E SERVIÇOS. RECEPÇÃO DO ARTIGO 12
DO DECRETO-LEI Nº 509/69. EXECUÇÃO. OBSERVÂNCIA DO REGIME
DE PRECATÓRIO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. 1. À empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, pessoa
jurídica equiparada à Fazenda Pública, é aplicável o privilégio da
impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços. Recepção do artigo 12
do Decreto-lei nº 509/69 e não-incidência da restrição contida no artigo
173, § 1º, da Constituição Federal, que submete a empresa pública, a
sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade
econômica ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às
obrigações trabalhistas e tributárias. 2. Empresa pública que não exerce
atividade econômica e presta serviço público da competência da União
Federal e por ela mantido. Execução. Observância ao regime de precatório,
sob pena de vulneração do disposto no artigo 100 da Constituição Federal.
45
Recurso extraordinário conhecido e provido .

44
BRASIL. Decreto-lei n.º 509, de 20 de março de 1969. Dispõe sobre a transformação do
Departamento dos Correios e Telégrafos em empresa pública, e dá outras providências. Brasília, DF.
Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0509.htm>. Acesso em: 15 set.
2006. “Art. 12 - A ECT gozará de isenção de direitos de importação de materiais e equipamentos
destinados aos seus serviços, dos privilégios concedidos à Fazenda Pública, quer em relação a
imunidade tributária, direta ou indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, quer no
concernente a foro, prazos e custas processuais”.
45
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 220906/DF. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Ismar José da Costa. Relator: Ministro Maurício Corrêa. Brasília, 14 de novembro de 2002.
Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 20 set. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 225011/MG. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
18

O voto vencido, conduzido pelo Ministro Ilmar Galvão, aduz que as


empresas públicas se sujeitam ao regime jurídico das empresas privadas, por conta
do art. 173, §1º, II, da CF, sendo inquestionável que a sistemática de pagamento de
débitos por precatórios aplica-se tão somente às entidades de direito público. Logo,
sustenta que não poderia a ECT se beneficiar com os privilégios dirigidos às
pessoas que atuam sob o regime público, uma vez que ela exerce atividade
econômica. Transcreve-se o seguinte excerto:

Assim, conquanto se esteja, no caso, diante de empresa delegatária de


serviço cuja manutenção as Cartas de 67, 69 e 88 incumbiram à União (art.
21, X), é fora de dúvida que não se trata de serviço público inerente ao
Estado, mas de atividade econômica exercida em forma de monopólio
estatal, o que, como visto, não pode conferir à ECT posição privilegiada em
46
face das empresas privadas .

Termina por declarar a inconstitucionalidade da expressão


“impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços” constante do art. 12 do
Decreto-Lei n.º 509, justamente sob o argumento de que às empresas públicas se
aplica o mesmo regime das empresas privadas.

O voto vencedor foi conduzido pelo Ministro Maurício Corrêa. Fundamenta o


posicionamento favorável à extensão da imunidade em comento basicamente no
fato de a empresa prestar um serviço público de competência da União e não exerce
atividade econômica, não sendo-lhe aplicado o §1º do art. 173, ou seja, o tratamento
dado às empresas privadas. Do voto extraem-se os seguintes excertos:

A recorrente é empresa pública criada pelo Decreto-Lei n.º 509, de 10 de


março de 1969, com capital constituído integralmente pela União Federal
(art. 6º), gozando de privilégios equivalentes aos da Fazenda Pública.
[...]
No caso sub examine trata-se de pessoa jurídica equiparada à fazenda
Pública, que explora serviço de competência da União (CF, artigo 21, X).
[...]

Recorrido: Cláudio Rodrigues dos Santos. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 19 de dezembro
de 2002. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 20 set. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 229696/PE. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Edgar Henrique da Silva. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, 19 de dezembro de
2002. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 20 set. 2006; respectivamente.
46
Fundamentação dos Recursos Extraordinários 220.906, 225.011 e 229.696 anteriormente citados.
19

Assim, não se aplicam às empresas públicas, sociedades de economia


mista e a outras entidades estatais ou paraestatais que explorem serviços
públicos a restrição contida no artigo 173, §1º, da Constituição Federal, isto
é, a submissão ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive
quanto às obrigações trabalhistas e tributárias, nem a vedação do gozo de
privilégios fiscais não extensivos às do setor privado (CF, artigo 173, §2º).
[...]
Assim, a exploração de atividade econômica pela ECT – Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos não importa sujeição ao regime jurídico
das empresas privadas, pois sua participação neste cenário está
ressalvada pela primeira parte do artigo 173 da Constituição Federal
(“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição...”), por se tratar de
serviço público mantido pela União Federal, pois seu orçamento, elaborado
de acordo com as diretrizes fixadas pela Lei n.º 4.320/64 e com as normas
estabelecidas pela Lei n.º 9.673/97 (Lei de Diretrizes Orçamentárias), é
previamente aprovado pelo Ministério do Planejamento e Orçamento –
Secretaria de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, sendo sua
receita constituída de subsídio do Tesouro Nacional, conforme extrato do
Diário Oficial da União acostado à contra-capa destes autos. Logo, são
impenhoráveis seus bens por pertenceram à entidade estatal
47
mantenedora .

Portanto, foi dado provimento ao recurso, determinando que a execução


fosse feita por meio de precatório uma vez que impenhoráveis os bens, rendas e
serviços da empresa, restando recepcionado pela Constituição o art. 12, do Decreto-
Lei n.º 509/69.

Conquanto a problemática não dissesse respeito diretamente à imunidade


tributária recíproca, o precedente tornou-se fundamental em relação às demandas
posteriores, especificamente em relação ao caso apresentado a seguir, uma vez que
já havia se debatido sobre a extensão dos privilégios da Fazenda Pública em
relação às empresas públicas, mormente em matéria tributária, assim como a
diferença entre as empresas prestadoras de serviços e as que exercem atividades
econômicas.

O segundo caso diz respeito diretamente à imunidade tributária recíproca.


Através do recurso extraordinário n.º 407.099, julgado em 22 de junho de 2004, pela
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, a ECT alegara ofensa ao art. 150, VI,
a, da Constituição pois este se aplicaria a ela a despeito do disposto pelo § 3º do
mesmo art. 150. Nas razões do recurso, sustentou a recorrente que o art. 173, § 2º,
da CF aplica-se exclusivamente às empresas públicas que exploram atividade

47
Fundamentação dos Recursos Extraordinários 220.906, 225.011 e 229.696 anteriormente citados.
20

econômica em regime de concorrência com o setor privado, não incidindo essa regra
nas hipóteses em que a empresa pública se destinar à prestação de serviço público
reservado à União, como seria exatamente o caso da ECT.

O recurso foi conhecido na parte referente à aplicação da imunidade


tributária recíproca e, nessa parte, provido por unânime, tendo sido relator o Ministro
Calos Velloso. Restou assim ementado:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. EMPRESA BRASILEIRA DE


CORREIOS E TELÉGRAFOS: IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA:
C.F., art. 150, VI, a. EMPRESA PÚBLICA QUE EXERCE ATIVIDADE
ECONÔMICA E EMPRESA PÚBLICA PRESTADORA DE SERVIÇO
PÚBLICO: DISTINÇÃO. I. - As empresas públicas prestadoras de serviço
público distinguem-se das que exercem atividade econômica. A Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos é prestadora de serviço público de
prestação obrigatória e exclusiva do Estado, motivo por que está abrangida
pela imunidade tributária recíproca: C.F., art. 150, VI, a. II. - R.E. conhecido
48
em parte e, nessa parte, provido .

Da fundamentação consta a distinção feita entre as empresas públicas


prestadoras de serviços e as que exercem atividade econômica, sendo que as
primeiras tem natureza jurídica de autarquia, aplicando-se, portanto, o parágrafo 2º
do artigo 150, VI, a despeito do que dispõe o seu parágrafo terceiro. Segue trecho
do voto proferido:

É preciso distinguir as empresas públicas que exploram atividade


econômica, que se sujeitam ao regime jurídico próprio das empresas
privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias (C.F. ,
art. 173, §1º), daquelas empresas públicas prestadoras de serviços
públicos, cuja natureza é de autarquia, às quais não tem aplicação o
disposto no §1º do art. 173 da Constituição, sujeitando-se tais empresas
prestadoras de serviço público, inclusive, à responsabilidade objetiva (C.F.,
art. 37, §6º).
[...] fazendo-se a distinção entre empresa pública como instrumento da
participação do Estado na economia e empresa pública prestadora de
serviço público – não tenho dúvida em afirmar que a ECT está abrangida
pela imunidade tributária recíproca (CF, art. 150, VI, a), ainda mais se
considerarmos que presta ela serviço público de prestação obrigatória e
exclusiva do Estado, que é o serviço postal, CF, art. 21, X.
[...]
É que o §3º do art. 150 tem como destinatário entidade estatal que explore
atividade econômica regida pelas normas aplicáveis a empreendimentos
privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou

48
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 407099/RS. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Marcelo Guimarães da Silva e outro. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 6 de agosto
de 2004. Disponível em <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2006.
21

tarifas pelo usuário. No caso, tem aplicação a hipótese inscrita no §2º do


49
mesmo art. 150 .

Por fim, consta do voto que a questão fundamental é que a empresa pública
é imune, por força do artigo 150, VI, a, da CF, independentemente da discussão
acerca da recepção do Decreto-Lei n.º 509 pela Constituição Federal de 1988.

As decisões posteriores proferidas nos recursos extraordinários números


354.897, 424.227, 398.630 e 364.20250, julgados pela Segunda Turma do Pretório
Excelso, seguiram na mesma esteira da decisão supracitada. Recentemente, a
Primeira Turma do STF também se manifestou sobre a aplicação extensiva da
imunidade às empresas públicas, adotando com o entendimento que estava sendo
dado à matéria pela Segunda Turma. Neste sentido, segue transcrita a ementa do
agravo regimental no recurso extraordinário número 357.291:

RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Empresa Brasileira de


Correios e Telégrafos - ECT. Imunidade tributária de empresa pública
prestadora de serviços públicos. Jurisprudência assentada. Ausência de
razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se
provimento a agravo regimental tendente a impugnar, sem razões novas,
51
decisão fundada em jurisprudência assente na Corte .

Resta claro que o Pretório Excelso assentou jurisprudência favorável à


interpretação extensiva da imunidade tributária recíproca em relação à Empresa
Pública de Correios e Telégrafos. A partir dos precedentes supracitados, certamente
outras empresas públicas também intentarão em Juízo ações visando ao

49
Da mesma decisão da nota n.º 48.
50
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 354897/RS. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Município de Montenegro. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 3 de setembro de
2004. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 407099/SC. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Município de Imbituba. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 10 de setembro de 2004.
Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 398630/SP. Recorrente: Empresa Pública de Correios e Telégrafos - ECT.
Recorrido: Município de Estrela d”Oeste. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, 17 de setembro de
2004. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2006.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Recurso
Extraordinário n.º 364202; respectivamente.
51
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imunidade tributária recíproca – empresa pública. Agravo
regimental n.º 357291/PR. Agravante: Estado do Paraná. Agravado: Empresa Pública de Correios e
Telégrafos - ECT. Relator: Ministro Cezar Peluso. Brasília, 2 de junho de 2006. Disponível em:
<http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 set. 2006.
22

reconhecimento de sua imunidade tributária recíproca, ensejando, via recurso, o


exame da aplicação da imunidade estudada em relação a outras empresas que não
a ECT. Pelos fundamentos apontados parece bastante viável que a imunidade
recíproca seja extensiva também às empresas públicas que prestam serviços
diversos dos postais, desde que sejam serviços públicos e que as empresas não
concorram com a iniciativa privada.

3 CONCLUSÃO

A imunidade tributária é conceituada, por alguns doutrinadores, como uma


supressão ao poder de tributar e, por outros, como norma de competência negativa.
Seja como for, deve ser sempre entendida como uma norma constitucional
expressa, que determina a intributabilidade de uma pessoa, fato ou situação, não se
confundindo com os princípios, isenções e não incidência.

A imunidade tributária recíproca é norma de hierarquia constitucional que


determina a veda da tributação entre os entes de direito público interno, nos termos
do art. 150, VI, a, da Constituição Federal de 1988. O fundamento de tal imunidade
encontra-se na preservação da forma de Estado federal. por conta disso, é possível
sustentar ser esta imunidade cláusula pétrea, porquanto a forma federativa de
Estado não pode ser alterada sequer através de Emenda Constitucional, conforme
determina o art. 60, § 4º, I, da Carta Magna.

Em princípio, as pessoas protegidas pela imunidade recíproca são a União,


os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as autarquias e fundações instituídas
e mantidas por aqueles entes políticos. Objetivamente, a regra determina a
intributabilidade em relação aos impostos sobre patrimônio, renda e serviços. Esta
determinação constitucional gerou bastante polêmica entre os doutrinadores e,
ressalvado o debate ainda existente nesta seara, cumpre sinalar que o Supremo
Tribunal Federal fixou que esta imunidade refere-se tão somente aos impostos, de
modo que, privilegiando a interpretação literal do dispositivos, afastou qualquer
interpretação que se fizesse no sentido de estender a imunidade a outras espécies
23

de tributos. No entanto, a aplicação da imunidade recíproca não se restringe apenas


aos impostos incidentes sobre patrimônio, renda e serviços, mas se estende a
quaisquer outros impostos não classificáveis entre estes pela legislação
infraconstitucionais, incluindo os impostos indiretos, com clara adoção da teoria da
repercussão econômica explicada por Aliomar Baleeiro. Ou seja, sempre que o
encargo econômico causado pelo recolhimento do imposto recair sobre o patrimônio
de ente imune, se aplicará a regra da imunidade. No entanto, se o encargo recair
sobre patrimônio privado a imunidade não deverá ser aplicada.

Em relação ao critério subjetivo é possível afirmar, com base nas atuais


doutrina e jurisprudência pátrias, que a imunidade tributária recíproca deve abranger
também as empresa públicas, dependendo das atividades que estas pratiquem. A
doutrina classifica as empresas públicas segundo seu tipo de atividade, em duas
espécies: empresas públicas que exercem atividade econômica e empresas públicas
que prestam serviços públicos. Em relação à primeira espécie, a Constituição
consignou, em seu art. 173, caput e § 2º, que as empresas públicas só podem
exercer atividade econômica em casos excepcionais e, nestes casos, em relação a
elas fica vedado o gozo de privilégios fiscais não extensivos ao setor privado. No
entanto, a tese de extensão da imunidade às empresas públicas apresenta-se
viável em relação àquelas empresas que não exercem atividade econômica, mas
prestação de serviços públicos. Deste modo, ao aplicar a imunidade tão somente às
empresas públicas prestadoras de serviços públicos não se estará a ferir a regra do
art. 173, da Carta Magna.

Ressalta-se, ainda, que, em regra, cabe ao Estado a prestação de serviços


públicos, conforme se depreende do art. 175, da Constituição, podendo este delegar
a atividade por meio de concessão, permissão ou autorização ao setor privado,
cabendo-lhe fiscalizar a prestação do serviço que lhe compete ou delegar a algum
ente da própria Administração Pública, na forma da lei, inclusive às empresas
públicas. Se o serviço público for prestado por empresas públicas, estas devem ser
consideradas como longa manus do próprio Estado, sendo-lhes aplicados os
benefícios relativos a ele.
24

Evidentemente que a aplicação da imunidade está condicionada à


verificação de que as empresas públicas a serem protegidas da tributação não se
encontram em concorrência com as empresas privadas no mercado, sob pena de se
incentivar a concorrência desleal, em clara afronta ao art. 170, da Constituição, o
qual determina a valorização da livre concorrência e o incentivo à iniciativa privada.
Nesta esteira, quando da análise de caso concreto, restar assentado que se a
empresa pública pratica atividade econômica ou concorre no mercado com a
iniciativa privada, a ela deve ser aplicado o regime jurídico próprio das empresas
privadas, em obediência ao art. 173, § 1º, II, da Carta Magna.

Em princípio, as atividades que devem ser praticadas pelos entes políticos


são aquelas constantes dos artigos 21, 25, 30 e 32, do texto constitucional, que se
referem às competências administrativas da União, dos Estados-membros, dos
Municípios e do Distrito Federal, respectivamente. Quando as empresas públicas
prestam estes serviços estão atuando como instrumentos do Estado, devendo
aproveitar os privilégios concernentes ao respectivo ente que delegou a prestação
do serviço público de sua competência.

A empresa pública prestadora do serviço não pode perseguir finalidade


econômica para que seja abrangida pela imunidade recíproca. Observe-se que o
recebimento de contraprestação pelo serviço prestado não determina de forma
imediata que a empresa esteja perseguindo finalidade de ordem econômica, pois a
contraprestação nem sempre é proporcional ao serviço, não constituindo o
recebimento deste valor o fim primordial a ser atingido, mas sim a própria prestação
do serviço público.

A tese da aplicação da imunidade tributária recíproca foi apreciada e


acolhida pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a abrangência dela em
relação à Empresa Pública de Correios e Telégrafos – ECT. Fundamentalmente, a
interpretação extensiva da imunidade destinada às autarquias em relação à
empresas pública anteriormente citada, em razão desta prestar serviço público de
competência da União, nos termos do art. 21, X, da Constituição, e de ter restado
claro que a empresa não exercia atividade econômica e sim prestação de serviço
público.
25

Ao analisar o fundamento do posicionamento do Pretório Excelso em favor


da extensão da imunidade recíproca à ECT e ao considerar os argumentos
apresentados pela doutrina, é possível afirmar ser bastante viável a aplicação da
tese a outras empresas públicas que prestam outros serviços públicos diversos do
serviço postal, desde que elas se enquadrem nos requisitos fixados pela doutrina e
jurisprudência para a abrangência das empresas públicas pela imunidade tributária
recíproca.

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