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A CRISE AMBIENTAL E O PAPEL DAS NOVAS TECNOLOGIAS DA

INFORMAÇÃO: ALÉM DO DOMÍNIO DA TÉCNICA

Flávio Tayra

FSP/USP[1]

A crise ambiental e o papel das novas tecnologias da informação: além do domínio


da técnica (Resumo)

O domínio da técnica cresce a passos largos desde o início da Idade Moderna. Na


atualidade, convivemos com duas derivações desse contexto: as novas tecnologias de
informação e a crise ambiental. A busca pelo conhecimento que permitiu a tecnologia
da informação é a mesma que revolucionou os processos industriais geradores de
externalidades negativas. Simultaneamente ao fato de convivermos com a possibilidade
de um desastre ecológico, existe também a viabilidade de se aplicar e controlar os
avanços da ciência e da tecnologia para construir um mundo mais sustentável -
ambiental e sócio-economicamente -, pois as novas tecnologias de informação podem
desempenhar importante papel para mitigar os impactos ambientais da produção
industrial, ao estimular a produção de mais conhecimento e no desenvolvimento de
tecnologias mais apropriadas. A técnica não deve ser alvo apenas de críticas negativas,
mas de uma proposta positiva, que aborde critérios para fazer escolhas dentro do mundo
técnico.

Palavras-chave: Crise ambiental; papel da técnica; concepções de natureza;

The environmental crisis and the role of new information technologies: beyond the
domain of technique (Abstract)

The domain of technique grows strongly since the beginning of Modern Age.
Nowadays, we live with two derivations of that context: the new information
technologies and the environmental crisis. The search of knowledge that allowed the
explosion of information technologies is the same that revolutionized the industrial
processes that have a great capacity of producing negative externalities. Simultaneously
we live with the possibility of an ecological disaster and exists the viability of applying
and controlling the progresses of science and technology to build a more sustainable
world - environmental, social and economically -, because the new information
technologies can play an important role in mitigating the environmental impacts of
industrial production, stimulating more knowledge and developing of more appropriate
technologies. The technology should not be just an object of negative criticism, but of a
positive proposal, which it approaches criteria to do choices inside the technical world.

Key-words: Environmental crisis; role of technique; conceptions of nature.

Houve um tempo em que o homem convivia com toda sorte de dificuldades para
conseguir prover suas necessidades e sobreviver. Embora para muitos deles ainda hoje a
realidade não se apresente muito diferente, parece claro que na atualidade as condições
de vida de boa parte das pessoas são bem menos áridas tendo a luta pela sobrevivência
deixado de ser uma aventura diária.

A escalada da produção que tornou possível tal situação se encontra bem delimitada.
Devido a uma série de fatores, foi no início da Idade Moderna que a civilização
ocidental conseguiu equacionar as condições apropriadas para o grande salto. O grande
crescimento do conhecimento e da produção econômica verificada a partir deste
momento transformou a face do planeta e tornou realidade alguns sonhos antigos da
humanidade.

Os últimos desdobramentos deste processo iniciado séculos atrás mostram que não
existem limites para o crescimento do conhecimento e suas aplicações. O
desenvolvimento da microeletrônica e dos processos de informatização, a chamada III
Revolução Industrial que assistimos atualmente em curso (como a popularização da
internet e a automação de uma infinidade de processos propiciada por esse avanço) são
exemplos das suas possibilidades. Se o processo de aquisição de conhecimento parece
não encontrar limites em si, para alguns esse já começou a se manifestar na própria base
física do planeta, que precisou e ainda precisa sustentar uma grande demanda por seus
insumos, impulsionada por uma radical transformação ocorrida nos modos de vida e
padrão de consumo de seus habitantes. Essa pressão sobre os recursos naturais,
realizada em uma escala nunca antes vista e num nível temerário para sua própria
capacidade de regeneração é o que chamamos de crise ambiental.

Neste artigo discutiremos tal crise abordando dois aspectos que entre si estão
entrelaçados e que ajudam a compreender a complexidade do problema, analisando-o
sob uma perspectiva mais ampla: a concepção do homem em relação à natureza e o
papel da técnica. As diferentes formas de interpretação da natureza que o homem teve
no decorrer de sua história e a transição para a visão atual em que a natureza possui o
papel de provedora de insumos tem suas raízes em momento específico, no qual se
verifica paralelamente (e como decorrência) o grande estímulo à produção de
conhecimento, o desenvolvimento da racionalidade técnica.

Algumas análises, bastante características do pensamento do século XX (de crítica à


modernidade que para alguns, é diretamente associada ao capitalismo) tendem a
entender tal processo de avanço do papel da técnica como eminentemente danoso, cujos
maiores exemplos são a criação (e utilização) da bomba atômica e atualmente a da
manipulação da engenharia genética, além dos seus impactos negativos diretos sobre o
meio ambiente. Neste artigo, apesar do reconhecimento da mesma raiz de impulsão às
duas questões, buscaremos fazer algumas distinções que podem contribuir para um
melhor entendimento da crise ambiental, pois, entendemos, o conhecimento científico
em si não é perigoso, seria (ou deveria ser) mais um bem em si mesmo; o que se faz
dele, a forma de como e porque se transforma em externalidade negativa é que deve ser
alvo de análises.

O domínio sobre a natureza

A visão de domínio do homem sobre a natureza, vigente na atualidade, já teve


oponentes bem mais fortes em outras épocas. Glacken (1986) mostra que é possível
escrever uma história do homem desde a Antiguidade de acordo com o entendimento
que ele teve em relação à natureza no decorrer dos tempos; para este autor, o
pensamento ocidental, desde essa época até o final do século XVIII, foi dominado por
concepções de mundo que buscavam responder a três perguntas básicas:

· teria sido a Terra criada especificamente para a morada do homem, ou seja, feita
exclusivamente com esse propósito? ;

· teria sido possível que os climas, os relevos e a configuração dos continentes tenham
influenciado a natureza moral e social dos indivíduos e, com isso, moldado o caráter e a
natureza da cultura humana?;

· no decorrer de sua existência, como (ou quanto) a Terra terá se transformado, por meio
da ação do homem, desde sua hipotética condição original?

Glacken mostra que desde os gregos antigos até os tempos modernos foram dadas
diversas tentativas de respostas a essas perguntas, de modo tão freqüente e contínuo que
se pode estruturá-las em forma de idéias gerais que respondem às três questões
mencionadas: i) a idéia do desígnio, de terra criada para o homem; ii) a da influência do
meio ambiente, que molda as características do ser; e iii) a do homem como agente
geográfico, respectivamente. As duas primeiras foram bastante discutidas na
Antiguidade, a terceira, um pouco menos, embora estivesse presente em muitos
argumentos que reconheciam o fato evidente de que os homens, por meio de suas artes,
ciências e técnicas, haviam transformado o meio em que viviam.

Todas estas questões buscavam identificar exatamente as variáveis que incidiam sobre o
relacionamento do homem com o meio ambiente, desde uma concepção mais filosófica
(sobre o papel do homem e de sua morada) até o seu desempenho como transformador
do mundo, ou seja, o impacto de suas atividades práticas. No século XIX, no entanto, já
parecia evidente que a visão de supremacia sobre a natureza era a predominante.

No que nos importa aquí, uma sutil, mas importante transformação para uma mudança
na concepção do papel do homem frente a natureza, pôde ser verificada nos princípios
da era Moderna, quando a visão teológica e dos excertos das Sagradas Escrituras passou
a ser substituída pela visão científica, alterando sobremaneira tal relação. A então
emergente ciência, amparada na razão e no conhecimento, converteu-se no instrumento
que tornaria os seres humanos senhores de seu próprio destino. Desta forma, a fé na
ciência e em suas possibilidades provocou uma transformação na concepção acerca do
papel do homem no mundo, que veio a reboque de importantes transformações que
ocorriam na realidade e no pensamento ocidental.

Nesse período, começavam a se evidenciar os canais que tornaram possíveis as


profundas transformações na natureza, que ganhariam ainda mais combustível a partir
da eclosão do industrialismo, este talvez o mais importante desdobramento de tal
lógica, com uma forma de relação com a natureza, que via na sua instrumentalização a
sua razão de ser.

A passagem para essa nova visão, porém, não se constituiu em um processo abrupto, em
que as novas idéias e concepções afloraram da noite para o dia. Para se atingir esse
estágio de ruptura foi necessária uma transformação anterior, um processo que se
iniciara alguns séculos antes, tendo o desenvolvimento da técnica nela desempenhado
um papel essencial.
Segundo o historiador norte-americano Lewis Mumford (1992), para se entender o
papel dominante desempenhado pela técnica na civilização ocidental moderna, é
necessário que seja mencionado o processo de preparação ideológica e social que o
acompanhou em seu desenvolvimento. Além de se buscar explicar essa nova fase pela
existência de novos instrumentos mecânicos, deve-se ser enfatizada principalmente a
cultura que estava disposta a utilizá-la e aproveitá-la de forma tão extensa e intensa,
pois, "a mecanização e a arregimentação não se constituíram em novos fenômenos na
história; o fato novo é o de que estas funções tenham sido projetadas e incorporadas em
formas organizadas que dominam cada aspecto de nossa existência. Outras civilizações
alcançaram um alto grau de aproveitamento técnico sem ter sido, pelo que se sabe,
profundamente influenciada pelos métodos e objetivos da técnica [...] (os outros povos)
possuíam máquinas; mas não desenvolveram a "máquina". Coube aos povos da Europa
Ocidental levar as ciências físicas e as artes exatas até um ponto em que nenhuma outra
cultura havia alcançado e, com isso, adaptar toda forma de vida de acordo com as
capacidades da máquina" (Mumford, 1992, p. 23).

Uma interpretação dada por Mumford para explicar o papel de vanguarda


desempenhado pela sociedade européia é por que nela as categorias de tempo e espaço
experimentaram uma transformação extraordinária que acabou por afetar todos os
aspectos da sua vida. A aplicação de métodos quantitativos de pensamento ao estudo da
natureza teve sua primeira manifestação na medida regular do tempo, assim como se
transformou também a concepção de espaço[2].

A popularização do registro do tempo foi essencial para a criação de um sistema bem


articulado de transporte e de produção. Ele passou a governar todo o dia desde o
amanhecer até a hora do descanso, e o tempo passou a ser considerado, a partir daí, não
como uma sucessão de experiências, mas como uma coleção de horas, minutos e
segundos, suscitando o aparecimento de hábitos como o de acrescentar e poupar o
tempo, elementos essenciais para o desenvolvimento econômico. O tempo abstrato se
converteu em um novo âmbito da existência. Nesse sentido, o tempo assumiu o caráter
de espaço fechado: podia ser dividido e preenchido, podia inclusive ser dilatado por
meio do invento de instrumentos que acabam por poupar o tempo (Mumford, 1992).

A transformação dos conceitos de tempo e espaço produziu uma mudança que começou
a transferir a interpretação da natureza, antes focada no mundo celestial para o mundo
físico. A partir daí, a natureza podia ser explorada, conquistada e entendida. Foi o
princípio de uma profunda transformação no processo de produção econômica e de
conhecimento.

Por meio da ciência, a modernidade rompeu a aliança entre homem e Natureza, baseada
na identificação de fato e valor - fundamento da visão antropocêntrica do mundo. A
cosmologia medieval realizava a coincidência plena de conhecimento da realidade e
compreensão do "sentido" da vida. Por mais de dois mil anos, a metafísica sustentou a
separação entre mundo terrestre e mundo celeste: em um nível, o reino do efêmero, do
nascer e do perecer; em outro, o reino do divino, da perfeição, do eterno. Essa imagem
foi rompida pela modernidade.

A partir de tal concepção é que se erigiram as bases da ciência natural contemporânea,


secular, cujo principal objetivo era o de detectar regularidades no curso da natureza,
gerando condições de previsão, ou mesmo a possibilidade de indução ou rejeição de
determinados efeitos visando o seu maior controle.

Algumas consequências da transformação

A partir de tal momento, a velocidade das transformações ocorridas não cessou de


aumentar. A forma de acumulação de conhecimento, as transformações no meio de
produção, a departamentalização do saber; todos estes fatores encadeados fizeram com
que se operasse uma profunda transformação na face da Terra.

Um momento crucial desta nova fase foi a eclosão da Revolução Industrial no século
XVIII, que aumentou a produtividade do trabalho humano em proporções nunca antes
vista; a geração de riquezas decorrente de tal revolução propiciou o amadurecimento do
capitalismo, ao qual passou a ser associado o desenvolvimento da técnica.

Como decorrência do grande crescimento da produção industrial e econômica já no


século XIX, começavam a se explicitar as primeiras conseqüências da nova forma de
relação do homem com a natureza. Naquele século começaram a aparecer as primeiras
provas que indicavam que o homem estava operando algumas transformações não
desejadas na natureza. Florestas eram derrubadas com rapidez nunca antes vista,
processo a que se seguia a erosão e perda de fertilidade dos solos; alguns autores, como
o alemão Von Liebig, já destacavam o papel do homem como transformador da
natureza e denunciavam os efeitos catastróficos do desflorestamento excessivo. O
processo de degradação promovido pela expansão econômica começava a deixar marcas
indeléveis no meio ambiente. Em seu livro “A situação da classe trabalhadora na
Inglaterra”, Engels (1988) já denunciava as precárias condições de vida dos
trabalhadores e o ar poluído pelas fábricas da cidade de Manchester, berço da revolução.

Na atualidade, após pouco mais de dois séculos de grande desenvolvimento econômico


promovido pela Revolução Industrial, o que se verifica é uma miríade de problemas
sócio-ambientais como: os processos de urbanização acelerada; o crescimento e a
desigual distribuição demográfica; a expansão do uso de energia nuclear; o consumo
excessivo de recursos não-renováveis; os fenômenos crescentes de perda e
desertificação do solo; a contaminação tóxica dos recursos naturais; o desflorestamento;
a redução da biodiversidade e da diversidade cultural; a geração do efeito estufa e a
redução da camada de ozônio e suas implicações sobre o equilíbrio climático global,
listando apenas os mais divulgados.

Nestes termos, a crise ambiental pode ser entendida como a crise de uma lógica de
produção, mas, mais do que isso, é, principalmente, a constatação da lógica de
transformação de recursos da natureza em objetos de consumo sendo levada ao
paroxismo. Com tal comportamento, o homem está se transformando cada vez mais no
principal causador de uma mudança ecológica, tanto em níveis globais quanto locais,
mudanças que põem em perigo a sua própria existência e, em particular, a das gerações
futuras.

Em algumas análises, costuma-se atribuir à explosão demográfica a principal causa


desse processo de exploração exagerada do meio ambiente. Esta foi a tese de
Malthus[3] (1996), no século XIX, retomada na década de 1970 pelo Relatório
Meadows (1978). Antes disso, mas claramente correlacionada à expansão demográfica,
a principal causa que podemos atribuir às mudanças ecológicas refere-se à forma de
exploração econômica propiciada pelo grande avanço dos meios de produção - que
possibilitaram uma utilização da natureza em um nível nunca antes alcançado - e,
conseqüentemente, pelo aprofundamento da exploração do trabalho e desenvolvimento
concomitante da técnica. O que não quer dizer que estes melhoramentos e conquistas
foram obtidos e planejados para a promoção da destruição da natureza.

Sob a lógica da dinâmica capitalista, em seu estágio inicial a natureza assumiu funções
bem específicas, passando a ser entendida simplesmente em termos de recursos, com o
objetivo de gerar e provisionar todos os materiais utilizados no processo produtivo;
além de ter como segunda função, a de absorver os resíduos, que retornam ao
ecossistema em forma de contaminantes, ou seja, de poluição. Esta lógica de
crescimento econômico, porém, encontra seus limites na medida em que compromete o
bem-estar das gerações futuras ao levar ao esgotamento de recursos relevantes (por
exemplo, recursos energéticos fósseis); e também por exigir dos ecossistemas um nível
acima de sua capacidade de regeneração e assimilação que provoca, em um horizonte
mais amplo, o surgimento de seqüelas problemáticas, como é o caso do aquecimento
global da atmosfera; ou seja, o problema não é mais apenas pontual e localizado, o que
tem modificado a abordagem do tema.

Com efeito, a partir, principalmente, da década de 1960, a deterioração ambiental e sua


relação com o estilo de crescimento econômico passaram a ser objeto de estudo e
preocupação sistemática em âmbito internacional. Na história recente, as discussões
sobre as questões ambientais têm se dividido entre as conseqüências negativas do
crescimento e/ou os fracassos na gestão do nosso ambiente. Nesse quase meio século de
debates, podem-se identificar três momentos marcantes que mostram a evolução no
tratamento e percepção do tema:

• a Reunião de Estocolmo em 1972 – a primeira grande conferência das Nações Unidas


sobre o meio ambiente, que se seguiu à publicação do relatório do Clube de Roma,
também chamado Relatório Meadows;

• o Relatório Brundtland, lançado em 1987 como resultado de uma comissão de estudos


que cunhou as bases e o conceito de Desenvolvimento Sustentável; e

• a "Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento" –


CNUMAD (mais conhecida por “Rio-92”), que buscou o consenso internacional para a
operacionalização do conceito do Desenvolvimento Sustentável.

Ao longo desses eventos, podemos identificar a evolução do debate sobre a interação do


homem em sociedade com o meio ambiente, e principalmente o aprofundamento das
discussões em variados contextos espaciais e temporais. Se na década de 1970, a
discussão principal era sobre a viabilidade ou não do crescimento - com os países
subdesenvolvidos clamando por crescimento a qualquer custo -, nos anos 1980 e 1990,
os problemas econômicos parecem ter se avolumado, e a discussão sobre crescer ou não
foi substituída pelas formas de como isso se sucedia, ou seja, com a análise dos custos
sociais que isto acarretava. Afinal, a única forma de se participar da lógica econômica
parece ser consumindo (ampliando a lógica de exploração dos recursos naturais) e
também produzindo, gerando mais trabalho, que é a forma de obtenção de renda,
fundamental para a participação no jogo do mercado. Num cenário de crise econômica e
de estagnação, o crescimento econômico parece ter se tornado imprescindível e a
proposta de crescimento zero, defendida por alguns ambientalistas, perdeu força, dada a
necessidade de geração de empregos, este um flagelo muito mais próximo e visível para
a maioria das pessoas.

Convivemos então com um cenário de crise econômica com baixa capacidade de


geração de postos de trabalho (o que gera previsíveis desequilíbrios sociais) e uma crise
ambiental que, a despeito de não sabermos precisamente em que estágio nos
encontramos, reúne cada vez mais provas de que é uma questão premente, o que tem
mobilizado diferentes atores sociais nos mais diferentes pontos do mundo.
Paralelamente à emergência de tais questões, outro fator de grande destaque na
atualidade é o desenvolvimento dos processos de informatização que tem trazido (e
ainda deverá trazer) muitas transformações no modo de vida das pessoas.

A essa conjuntura, o sociólogo catalão Manuel Castells (1999) chamou de “gênese de


um novo mundo”; Castells aponta 3 processos independentes que começaram a se
gestar a partir do final dos anos 1960: 1) a crise econômica do capitalismo (e também
do estatismo); 2) o florescimento de movimentos sociais e culturais (feminismo, defesa
dos direitos humanos e o ambientalismo) e 3) a revolução das tecnologias da
informação, que para o autor espanhol, tem importância igual ou maior que a Revolução
Industrial.

A revolução da tecnologia da informação e os críticos da técnica

A ênfase que Castells dá à tecnologia da informação se deve ao fato de que ela está se
convertendo em ferramenta indispensável na geração de riqueza, no exercício do poder
e na criação de códigos culturais, transformando domínios da vida social e econômica.
Em sua acepção, as redes interativas de informação tornaram-se tanto os componentes
da estrutura social, quanto os agentes de transformação social.

A primeira onda de informatização, que começou a partir dos anos 1960, teve como
pano de fundo a sociedade industrial. Com o uso dos computadores em aplicações
comerciais, grandes sistemas iam sendo construídos. No início, não houve uma
alteração acentuada na forma como as tarefas eram desempenhadas; apenas a
automatização dos procedimentos. A grande ênfase dos sistemas desenvolvidos nessa
época era no controle das atividades. O trabalho era feito de forma mais rápida, segura e
limpa, mas ainda não estava sendo muito alterada a estrutura de produção e de
gerenciamento.

No processo de informatização da sociedade, fortemente articulado com todos os


sistemas de comunicação, os computadores, a Internet e, de forma geral, a multimídia
passou a fazer parte do cotidiano das pessoas e instituições. Para Castells, a partir do
final dos anos 1960, passou a ocorrer uma redefinição histórica das relações de
produção, poder e de experiência (individual e social) que estão construindo uma nova
estrutura, um passo adiante ao verificado na primeira onda. Na nova configuração
(“informacional”) baseada na microeletrônica e engenharia genética estão sendo
delineadas novas formas de organização econômica e de interação social através das
redes eletrônicas de informação. Trata-se de um processo ainda em curso, mas que
aponta para um novo paradigma tecnológico, no sentido dado por Thomas Kuhn (1990)
às revoluções científicas, um intervalo de profundas transformações caracterizado por
um padrão de descontinuidade.

Esse emaranhado de novas situações e perspectivas, por outro lado, inspira também
manifestações contra a ciência e a tecnologia, no qual o alvo é o vertiginoso processo de
informatização, num processo de rejeição das tecnologias. Nesse contexto, o mal-estar
assume novas – e até violentas – formas. Esse foi o caso do Unabomber, nos EUA, que
enviava cartas-bombas para cientistas e universidades e elegia como inimiga a
"sociedade industrial", que ele considera "um desastre para a espécie humana" e contra
a qual propõe uma "revolução" no qual aponta como uma única saída a dispensar do
sistema tecnológico inteiro. Seu temor são as "máquinas inteligentes", que acabarão por
decidir no lugar da humanidade. (Folha de S. Paulo, 20/09/95). Outra ordem de visão
crítica é a dos neoludistas, que vêem nos novos computadores, mais um instrumento de
retirada do homem do processo econômico. Para os neoludistas, o desemprego decorre
diretamente do progresso técnico, ou seja, a tecnologia informacional - fundada na
microeletrônica e na tecnologia de informação - substitui o capital humano com tal
intensidade que hoje é impossível gerar empregos para todos.

Com efeito, a avaliação da técnica, nas últimas décadas, foi predominantemente


negativa, anulando as diferenças entre uma técnica e outra; atribuiu-se a ela uma
finalidade, um sentido intrínseco, que a guiaria do início ao fim, uma racionalidade
própria. Um bom número de filósofos, particularmente, representaram a técnica de
cinco maneiras distintas: como autônoma em relação ao homem; como domínio, uma
característica da própria modernidade (visão comum na cultura contemporânea); como
oposta ao pensamento; e como totalitarismo. Hans Jonas, Ernst Jünger, Günther Anders,
Oswald Spengler, Karl Jaspers, Martin Heidegger, Theodor Adorno e Max Horkheimer
são alguns dos pensadores que expressam essas tendências. Para Heidegger, por
exemplo, a essência da técnica é a imposição. Mais que fazer ou usar a técnica, o
homem está no âmbito dessa imposição, sendo por ela dominado.

Entre os contemporâneos, Serge Latouche (1994) é um dos que se contrapõem


hostilmente à cultura tecno-científica. Para o intelectual francês, o domínio da natureza,
através da ciência e da tecnologia, é um projeto totalitário, sendo a técnica "um
instrumento poderoso na colonização de corpos e espíritos", de "padronização do
imaginário". Para ele, a técnica é a própria cultura do Ocidente: "O empreendimento
colonial participa também do projeto de total domínio da natureza. À exploração
marítima do século XVI sucede a exploração científica do século XVIII. Ao confisco
das riquezas e das almas, segue-se o inventário enciclopédico do Cosmo". O que leva
Latouche a concluir que a técnica "tornou-se um artigo de fé universal, a conseqüência
concreta e a presença visível da nova divindade: a ciência". À condenação da técnica,
em geral, acompanha a condenação da ciência. Raramente elas são vistas como
distintas.

Para algumas correntes críticas da modernidade, como Marcuse, ciência e capitalismo


são uma só coisa. Em outras palavras, ciência (conhecimento racional e objetivo) e
ideologia (concepção de mundo) se confundem. Desaparece o valor objetivo do
conhecimento científico. Nesse sentido, a crítica da "razão instrumental", "razão
unidimensional", ou "razão técnica" encerra, no fundo, uma crítica da própria
civilização. Daí o ataque à "sociedade industrial" ou "tecnológica", justamente a
sociedade moderna baseada na ciência e na tecnologia.
A associação com o capitalismo decorre do fato de que o desenvolvimento dos meios de
produção e obtenção dos recursos, a técnica, desencadeou o processo de grande
crescimento econômico dos últimos séculos. Deve-se salientar, no entanto, que, apesar
dos tropeços de ordem social e ambiental, tal crescimento econômico trouxe também
benefícios e facilidades que nos períodos anteriores seriam quase inimagináveis. Essas
facilidades, por certo, deviam ser almejadas e aspiradas pelos homens. Não foi a
técnica, no entanto, que desencadeou a série de infortúnios ambientais e sociais dos
séculos seguintes. Para Mumford, "...por mais que a técnica descanse nos
procedimentos objetivos das ciências, não forma um sistema independente, como o do
universo. Ela existe como um elemento da cultura humana, que promove o bem ou o
mal, segundo os que a exploram programem. A máquina em si não tem exigências ou
fins. É o espírito humano que possui exigências e estabelece as suas finalidades. Para
reconquistar a máquina e submetê-la aos fins humanos, é necessário primeiro entendê-la
e assimilá-la. Até o momento, o que temos feito é adotá-la sem entendê-la por completo,
ou por outro lado, como os mais pobres românticos, temos rechaçado a máquina sem
perceber que ela pode ser assimilada de forma inteligente" (Mumford, 1992, ps. 23-24).
A associação feita entre técnica, ciência e capitalismo conduz a algumas imprecisões
que tendem a ver o conhecimento como uma coisa perigosa, o que não é
necessariamente uma verdade. A tecnologia, pode ser tanto boa quanto má. Existem
processos tecnológicos estritamente danosos (como a fabricação de instrumentos de
tortura; armas bacteriológicas; minas utilizadas em guerras que continuam ativas,
mesmo após muitos anos...); mas isso não é necessariamente consequência de sua
existência, e sim de seu mau uso, o que pode se suceder com o mau uso de qualquer
instrumento com algum grau (ou não) de tecnologia embutida.

O problema atual de degradação ambiental é fruto da forma de exploração da natureza


implementada nos últimos séculos. As sequelas de um crescimento obtido às custas de
uma não observância da possibilidade de escassez de recursos ou incapacidade de
assimilação dos dejetos se tornaram visíveis nas últimas décadas; o esforço (em nível
internacional) a partir desta constatação já fez com que fossem adaptadas tecnologias
que permitem a verificação, na maior parte dos casos, de um crescimento decrescente
nas formas de emissão de poluentes e utilização de recursos[4]. Ainda assim, isso
parece insuficiente para a resolução dos problemas ambientais da atualidade, dada sua
magnitude. Nesse sentido, o desenvolvimento de tecnologias mais apropriadas é uma
necessidade para a obtenção de melhores índices ambientais.

Na conjuntura atual, a negação do processo de crescimento econômico (com todos os


seus acessórios) parece não ser uma alternativa. Vivemos numa sociedade baseada na
ciência e na técnica, cuja estrutura foi montada sob tal égide. A grande profusão de
problemas modernos parece ter suas raízes no entendimento apenas parcial que os
homens tiveram no decorrer do processo. Atualmente, o conhecimento sobre tais
limitações tem se mostrado mais amplo, assim como a sua constatação, o que pode
suscitar a reversão de algumas fortes tendências verificadas no período anterior. A
situação de insustentabilidade ambiental e sócio-econômica verificada em vários locais
(com maior ou menor grau no peso das variáveis, conforme o caso) com a comunicação
em níveis globais, tem trazido a tona a percepção de que tais questões devem ser
abordadas de forma coordenada, tornando-se cada vez mais seriamente objetos de
reflexão e ação.
Em meio a esse processo, a revolução tecnológica pode contribuir para mitigar tal
situação, ao invés de aprofundá-lo, como pode parecer em primeira instância. A
interligação de uma mesma rede global pode favorecer a disseminação de uma cultura
que privilegie novas formas de conduta e entendimento em relação à natureza e aos
homens entre si, abrindo espaço para uma nova forma de conscientização. Pode também
ser usado com objetivo extremamente oposto; mas isso, evidentemente não depende de
uma lógica de coerência interna, pois assim como as demais técnicas, ela não a possui.
Assim como no período anterior, o conhecimento deve (ou deveria ter sido) ser
utilizado para a obtenção de melhores condições e situações de vida; o que não significa
a internalização pessoal dos seus benefícios por alguns poucos indivíduos. Se tal
percepção não foi possível no passado, a profundidade da crise atual parece mostrar, e
ainda dá chances e condições para uma nova forma de pensar e agir, novamente
integrando homem e natureza e com um pouco mais de clareza conquanto a seus
objetivos como sociedade.

Conclusões

O entendimento fragmentado da realidade em geral, e da crise ambiental, em particular,


pode levar muitos a um sentimento de rejeição em relação aos resultados do
desenvolvimento econômico dos últimos séculos. O problema decorrente de tal
processo é que ao subsidiar uma lógica de exploração do trabalho fortemente
demandante de insumos naturais e energéticos pode levar a capacidade de carga do
planeta aos seus limites. Apesar do sinal de alarme já ter disparado, parece difícil
vislumbrar uma outra alternativa de organização sócio-econômica.

A crise do capitalismo, manifesta na sua incapacidade de geração de postos de trabalho


(a despeito da grande acumulação financeira realizada por alguns poucos), mostra a
necessidade de obtenção de maiores taxas de crescimento econômico nas mais variadas
regiões do planeta, em mais uma flexão do processo em círculo que se tornou o
capitalismo. Como visto, essa situação foi para muitos agravada pela revolução da
microeletrônica, que alijou mais alguns milhões de postos de trabalho. Se a aquisição de
mais conhecimento e tecnologia adquirem o caráter de efeito propagador de efeitos
danosos ao homem e à sociedade, é porque algo está muito errado. Talvez uma
explicação para tal paradoxo, é o fato de que o homem, no afã de conquistar maior
controle sobre a natureza e os meios de produção acabou perdendo conexão com seus
objetivos e propósitos iniciais que o impeliram a empreender a busca realizada: maior
comodidade e conforto; o que logicamente não pode ser obtido na iminência de um
desastre ecológico ou uma convulsão social provocada por sérios desequilíbrios
econômicos. A ciência e a técnica devem ser redelineadas, não para se aprimorar como
instrumento de dominação, mas sim para se reconverterem ao seu papel emancipatório
inicial pretendido. A nova revolução tecnológica em curso pode contribuir para um
retorno a essa mentalidade.

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