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e o nitrogênio, translocando-os para as
BIOLOGIA DO SOLO
"Além das raízes":
o papel dos fungos micorrízicos
"Além das raízes" nos remete a um
O ano de 2009 coroa a lugar distante, longínquo e inexplorado,
micorrizologia no país que as plantas não conseguem
conquistar. Mas representa um dos
com o lançamento do habitats de maior diversidade biológica
no solo, onde, entre tantos outros
livro “Micorrizas: 30 organismos importantes para o
anos de pesquisa no funcionamento dos ecossistemas,
encontramos os fungos micorrízicos.
Brasil” e com a Eles estabelecem uma associação
denominada de micorrizas (mykes =
organização do ICOM6 fungo e rhiza = raízes), a qual
por pesquisadores representa a simbiose mutualista mais
comum entre raízes de plantas e
brasileiros. diversos fungos de solo, e justifica a
frase proferida por J.L. Harley: “Plantas
não têm raízes; plantas têm micorrizas”.
Esta frase de impacto alertou os
pesquisadores que trabalham com
plantas sobre o fato de que, em
condições naturais, a grande maioria
delas vive em simbiose micorrízica.
Plantas associadas a fungos micor-
rízicos, em geral, possuem maior
capacidade para aquisição de nutrientes
quando comparadas a plantas não
colonizadas.
A partir do conhecimento atual, é
possível afirmar que a contribuição das
micorrizas vai além da aquisição e
transferência de nutrientes para as
plantas. Considerando este aspecto, os
pesquisadores brasileiros escolheram
Além das raízes como o tema central
para o International Conference on
Mycorrhiza (ICOM 6), que será
realizado, em Belo Horizonte (MG), entre
os dias 9 e 14 de agosto deste ano, e que
contará com a participação de vários
especialistas nacionais e internacionais
(www.icom6.com.br).
As outras edições do ICOM foram
realizadas nos Estados Unidos, Suécia,
Austrália, Canadá e Espanha, e o
número de participantes vem crescendo
a cada evento. Os ICOMs representam o
fórum internacional de discussão sobre
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raízes, os quais são utilizados pelas
plantas nos seus processos fisiológicos.
Desta forma, os fungos micorrízicos são
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considerados um grupo-chave por
impactarem a nutrição vegetal, as
estruturas do solo e das comunidades
vegetais e servirem como elo entre o
sistema geoquímico e biológico nos
ecossistemas terrestres.
Entre os seis diferentes tipos de
Sidney Luiz Stürmer simbioses micorrízicas reconhecidas, a
Elke Jurandy Bran Nogueira Cardoso micorriza arbuscular (MA) é a
Francisco Adriano de Souza predominante em solos tropicais e
Maria Catarina Megumi Kasuya ocorre em membros da grande maioria
das famílias de plantas, dentre as quais,
grande parte dos vegetais cultivados. A
os mais recentes avanços na pesquisa e
desenvolvimento em micorrizas e têm
associação MA é formada pelos fungos
micorrízicos arbusculares (FMAs), que
sido uma ponte entre diversos
pertencem ao Filo Glomeromycota e são
pesquisadores que atuam na área
biológica, agronômica e florestal. A
caracterizados por formarem os
arbúsculos dentro das raízes das foto a
conferência permite aos participantes
apresentarem à comunidade suas
plantas, estrutura na qual se realiza a
troca de nutrientes entre a planta e o
pesquisas atuais, novas metodologias e
fungo. No Brasil, tem sido registrado um
processos, e possibilita ainda a
total de 80 espécies desses fungos das
participação de profissionais e
210 atualmente conhecidas, ocorrendo
estudantes em simpósios e workshops
relacionados à associação micorrízica.
em agrossistemas, áreas degradadas e
ecossistemas naturais, como florestas,
O primeiro curso sobre micorrizas
dunas e cerrado. O potencial de uso
no Brasil foi realizado, em 1978, no
biotecnológico dos FMAs é enorme,
Instituto Agronômico de Campinas, e
principalmente quando considerado o
contou com a presença dos pesquisaores
papel desses fungos em aumentar a
Barbara Mosse e David Hayman, da
absorção de nutrientes "imóveis" no
Estação Experimental de Rothamstead,
solo, como é o caso do fósforo. Pesquisas
na Inglaterra. Esse curso é considerado
têm sido direcionadas a entender os
o marco referencial da pesquisa
mecanismos que regulam a simbiose e a
brasileira em micorrizologia, por terem
utilizar o conhecimento para melhorar a
participado pesquisadores que se
eficiência na aquisição de fósforo por
tornaram líderes na área e contribuíram,
plantas micorrízicas.
direta ou indiretamente, para a
O tema é estratégico para o
formação da maioria dos pesquisadores
agronegócio, principalmente no Brasil,
atuantes no país, principalmente em
devido ao alto custo e à baixa eficiência
micorrizas arbusculares. Para celebrar
de utilização dos fertilizantes à base de
os 30 anos deste evento, que foi o marco
fósforo nos solos brasileiros. Metabólitos
inicial nos programas de pesquisa com
micorriza no país, os pesquisadores da
secundários que atuam na sinalização foto b
entre planta e fungo têm sido
área estão compilando os resultados
caracterizados e isolados, os quais são a) Arbúsculos de FMAs nativos em pinhão-manso, b) Pelotons intactos (pi) e degradados (pd) em
obtidos no Brasil até agora, os quais
potencializadores da micorrização. Tais células do protocórmio da orquídea Epidendrum secundum.
serão apresentados em livro com
aspectos, quando considerados em
lançamento previsto para o ICOM6.
conjunto com uma estratégia comercial,
Mas, afinal, qual a importância das
podem ser utilizados para a produção de restritas em sua ocorrência comparati- ecossistemas florestais, os fungos
Micorrizas ou das Associações Micor-
inoculantes microbianos com FMAs. Do vamente às MA e estão presentes em ectomicorrízicos têm a capacidade de
rízicas?
ponto de vista ecológico, os FMAs apenas 3 % das fanerógamas, mas são mineralizar formas orgânicas de
Os fungos que estabelecem esta
influenciam na estrutura, diversificação as associações dominantes em espécies nutrientes e solubilizar minerais, por
associação compartilham a caracterís-
e produtividade de comunidades de florestais de regiões temperadas. No meio da produção de diversos ácidos
tica de formarem estruturas especializa-
plantas. No Brasil, as pesquisas têm Brasil, dois exemplos de grande orgânicos.
das dentro do córtex radicular das
resultado na seleção de alguns isolados importância econômica são o Pinus e o As ECM são caracterizadas pela
plantas e crescerem além da superfície
fúngicos que poderiam ser utilizados em Eucalyptus. Há aproximadamente seis alteração morfológica do sistema
das raízes, diferenciando hifas, micélio e
inoculantes para o desenvolvimento de mil espécies de fungos ectomicorrízicos radicular e pela presença de um manto
esporos no solo rizosférico. Essas hifas
plantas de interesse agrícola e de pertencentes aos Filos Basidiomycota, fúngico e da rede de Hartig. O manto é
capturam diversos nutrientes minerais
espécies arbóreas para a recuperação de Ascomycota e Zygomycota. Além de formado por hifas fúngicas que cobre as
importantes para o desenvolvimento e
áreas degradadas. desempenharem papéis importantes células da epiderme radicular. Já a rede
crescimento das plantas, como o fósforo
As ectomicorrizas (ECM) já são mais nos ciclos do nitrogênio e fósforo em de Hartig pode ser visualizada como um
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labirinto de hifas crescendo nos espaços
intercelulares da epiderme e do córtex
radicular. Além da superfície das raízes,
os fungos formam estruturas externas
como as hifas e os rizomorfos, essenciais
para a conexão entre as micorrizas e o
s o l o. C o n s e q u e n t e m e n t e , são
importantes também para a absorção e
transporte de nutrientes, bem como
para a formação de corpos de
frutificação dos fungos formadores de
ectomicorrizas. Uma das aplicações
biotecnológicas das ECMs é a utilização
de inoculante ectomicorrízico no sistema
de produção de mudas florestais para
que elas cresçam com maior vigor e
resistam às condições de estresse,
quando transplantadas para o campo.
Algumas formulações de inoculantes
incluem o uso de solo ou serapilheira
contendo propágulos fúngicos, plantas
micorrizadas naturalmente, esporos de
fungos ectomicorrízicos e o micélio
vegetativo, os quais permitem a
aplicação direta no substrato de plantio
das mudas ou em raízes nuas.
Um terceiro tipo de associação
micorrízica é aquela formada entre
fungos do Filo Basidiomycota e espécies
de orquídeas. A associação simbiótica
micorrízica em orquídeas é caracteriza-
da pela formação de uma estrutura
intracelular, que se assemelha a um
novelo de lã, comumente chamado de
peloton. O peloton é formado logo após a
infecção pelo fungo micorrízico e é
usualmente observado nas células do
córtex de raízes de orquídeas na
natureza. Depois de formado, o peloton
é digerido pela orquídea e os produtos
foto c
c) Raízes com ectomicorrizas, d) Basidiomas do fungo ectomicorrízico Scleroderma sp.
advindos dessa digestão são utilizados
pela planta para acréscimo de biomassa.
Após a germinação da semente e antes
do estabelecimento da planta adulta
autotrófica, a orquídea passa por uma
etapa heterotrófica, na qual utiliza a
digestão do fungo micorrízico para o seu
desenvolvimento, fenômeno conhecido
por micoheterotrofismo.
A associação micorrízica em
orquídeas é essencial em condições
naturais para que a planta possa
completar o seu ciclo de vida. Assim, o
isolamento de fungos micorrízicos de
orquídeas, principalmente de espécies
ameaçadas de extinção, tem ganhado
maior atenção nos dias de hoje, visando
à sua utilização em programas de
reintrodução de orquídeas na natureza,
por meio do cultivo simbiótico das
sementes.
No Brasil, alguns autores conside-
ram o cultivo simbiótico como de baixa
eficiência, mas o processo comumente
relatado é bastante rústico, resumindo-
se à maceração de raízes da planta-mãe
- que pode nem estar micorrizada! -,
com suco de tomate e água destilada, e
misturados às sementes e espalhados
sob uma superfície de cultivo ou estopa.
Esse método favorece o crescimento de
fungos saprofíticos ou até mesmo
fitopatogênicos. No entanto, em alguns
sistemas em que se utilizam fungos e
condições adequadas, podem-se obter
mudas saudáveis em curto período de
tempo. A organização de programas de
conservação, manejo e reintrodução de
espécies de orquídeas ameaçadas de
extinção requer também o conhecimen-
foto d
to de fungos micorrízicos que, durante
milhares de anos, coevoluíram com seus
hospedeiros na natureza.
O ano de 2009 vem coroar a
micorrizologia no país, com o lançamen-
to do livro Micorrizas: 30 anos de
pesquisa no Brasil e com a organização
do ICOM6 por pesquisadores brasileiros.
Esses fatos, sem dúvida, demonstram o
reconhecimento internacional das
pesquisas brasileiras nesta área da
microbiologia do solo.
As micorrizas representam uma
associação extremamente importante
para a produção vegetal baseada em
técnicas biotecnológicas alternativas,
para a conservação de espécies vegetais
ameaçadas de extinção e para a
manutenção da qualidade do solo. Além
disto, a sua alta diversidade em
ecossistemas brasileiros - aliado às
funções na nutrição vegetal e na
estrutura do solo - torna os fungos
micorrízicos parte essencial de qualquer
programa de preservação da biodiversi-
dade visando à conservação e ao manejo
sustentável da microbiota do solo.
Sidney Luiz Stürmer é professor e
pesquisador da Universidade Regional de
Blumenau (FURB), Elke Jurandy Bran
Nogueira Cardoso é professora e
pesquisadora da Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ) e bolsista
de produtividade do CNPq, Francisco
Adriano de Souza é pesquisador da Embrapa
Agrobiologia, Maria Catarina Megumi
Kasuya é professora e pesquisadora da
Universidade Federal de Viçosa (UFV) e
bolsista de produtividade do CNPq.