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TARAIRIÚ – Revista eletrônica do Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da UEPB

A Pedra do Ingá sob uma perspectiva amerindiológica

Vandelerley de BRITO1

Campina Grande, Ano I – Vol. 1 - Número 01 – Setembro de 2010

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Historiador, especialista em História do Brasil, com estudos dedicados à cultura Itacoatiara; sócio fundador da
Sociedade Paraibana de Arqueologia. E-mail: vanderleydebrito@gmail.com .
TARAIRIÚ – Revista eletrônica do Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da UEPB

A PEDRA DO INGÁ SOB UMA PERSPECTIVA


AMERINDIOLÓGICA

RESUMO

A Pedra do Ingá é um monumento arqueológico marcado pelo estigma do fantástico e nesse


trabalho pretendemos mostrar quais os principais princípios teóricos que alegam idéias
difusionistas2 para este conjunto petróglifo, em refuto as opiniões de que tratar-se-ia de indústria
nativa. As teorias fantásticas sobre este notável testemunho arqueológico partem do pressuposto
de que nenhuma civilização é avançada se não demonstrar desenvolvimento material e, por isso
os, povos ameríndios seriam incapazes de entalhar tão magnífico complexo de signos em
superfície tão compacta sem auxílio tecnológico sofisticado e inteligência superior. Todavia, ao
passo que estas teorias conquistam o gosto popular e se cristalizam a Ciência cada vez mais vai
se tornando evasiva sobre este sítio arqueológico tão sedutor e, por conseguinte,
comprometedor. Portanto, para que possamos iniciar um estudo sensato sobre a Pedra do Ingá,
nas perspectivas científicas, é preciso primeiro despi-la destes adornos lendários.

PALAVRAS-CHAVE: Pedra do Ingá, Mitos e lendas, Amerindiologia

ABSTRACT

The Ingá Stone is an Archaeological monument marked by the stigma of the fantastic and in this
paper we intend to show what is the main theoretical principles that claim to diffusionists ideas for
this petroglyph set, in refute to the opinions that it would treat of the native industry. The fantastic
theories about this remarkable archaeological evidence comes from the assumption that no
civilization is advanced if it does not manifest material development and for this reason

Campina Grande, Ano I – Vol. 1 - Número 01 – Setembro de 2010


Amerindian people would be unable to carve such a magnificent complex of signs in such a
compact surface without sophisticated technological aid and superior intelligence. However, while
these theories gain popular adhesion and gets crystallized the science increasingly becomes
evasive on this archaeological site so seductive and therefore compromising. So for us to begin a
sensible study about the Ingá stone, on the scientific perspective, it is first necessary to put off its
legendary ornaments.

KEYWORDS :Ingá Stone, Myths and legends, Amerindiology

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Difusionismo é uma teoria arqueológica difundida a partir de fins do século XVIII, perdurando por todo o século
XIX, que credita a origem dos sítios e demais produtos da cultura material ameríndia às civilizações e lendas do
Velho Mundo
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A Pedra do Ingá é uma formação gnáissica aflorada em meio ao riacho Bacamarte, no


interior da Paraíba, repleta de curiosos sinais entalhados por uma cultura ainda incógnita. Feita
numa maestria sem par, os complexos petróglifos do Ingá, com sua composição harmoniosa,
causam um profundo impacto que acabam por incentivar as mais mirabolantes formulações
teóricas sobre sua origem. Porém, se fossemos esmiuçar o copioso arsenal de crendices, lendas
e mitos atribuídos a Pedra do Ingá - o que não é nosso propósito - teríamos que aumentar
consideravelmente este artigo. Pois a literatura fantástica sobre os desenhos da estrutura
gnáissica do Bacamarte divaga por alusões à presença de seres extraterrestres naquela ribeira,
a supostos povos remanescentes dos lendários continentes submersos, a presença do apóstolo
São Tomé por essas plagas, navegantes fenícios, sumérios, hititas e hebreus, sagas falofórias,
cosmogêneses, uranoscópicas, metafóricas, panegíricas e os tantos outros conceitos que a
proparoxitonia possa nomear os fantásticos excessos da imaginação.

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Figura 1 – A Pedra do Ingá e sua paisagem

Embora também não seja nossa pretensão agir com acerbidade perante estas teorias,
ou desencorajar novas idéias, não podemos ser condescendente ao fantástico porque,
diferentemente da lendária muralha de Jericó, não será ao som de trombetas que se fará
desmoronar o muro que encobre o enigma da Pedra do Ingá. É preciso cientificismo.
De todo modo, o sensacionalismo não se restringe apenas à Pedra do Ingá, sempre
permeou à arqueologia. Podemos tomar de exemplo os cálculos matemáticos que se supõe
existir nas pirâmides egípcias ou a famosa “praga do faraó”, largamente divulgada nos meios
sensacionalistas como uma maldição que causou morte misteriosa aos profanadores da tumba
de Tutancâmon. Essa lenda teve sua origem com a notícia da morte prematura de Lorde
Carnavon, o milionário que financiou a busca arqueológica no Vale dos Reis que culminou com a
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descoberta da tumba deste faraó egípcio. Entretanto, a suposta praga é pura invencionice. Pois,
como assevera o eminente arqueólogo C. W. Ceram, não existe tal maldição registrada nos
hieróglifos desta tumba3.
Na Pedra do Ingá, se pensarmos com coerência, é difícil imaginar náufragos fenícios
gravando um pedido de resgate numa pedra tão distante do litoral - ainda por cima em escrita
desconhecida - ou cosmonautas extraterrenos, sem mostrar o que pretendem ou a que vieram,
sulcando naquele rochedo supostas fórmulas físicas e químicas que nenhum ser humano é
capaz de ler. Estes estudos amadores, com base na imaginação e cálculos místicos, embora
suscitantes, só exploram os pormenores da ambigüidade. É bem provável que se avaliássemos
as medidas e contagens dos desenhos e capsulares do Ingá, ou mesmo às pirâmides egípcias,
chegaríamos, com as convenientes operações matemáticas, as mais inesperadas comparações
com valores numéricos favoráveis a qualquer formulação teórica.
Na maioria dos textos fantásticos a Pedra do Ingá sempre figura associada às culturas
antigas ou lendárias do Velho Mundo, talvez porque a amerindiologia 34 seja pobre se
comparada, por exemplo, à egiptologia e a assiriologia. Na América do Sul não há templos
magníficos, pirâmides, zigurates ou mesmo dolmens. Como indicativos monumentais só
dispomos de rochedos e abrigos naturais que foram aproveitados como lousa para inscrições
rupestres e mausoléus para enterramentos coletivos. Além destes “monumentos”, os povos que
viveram no continente, ao longo dos milênios que antecedem a chegada dos colonizadores
europeus, só deixaram tênues e raros vestígios, que permitem apenas poucas probabilidades à
arqueologia.
No caso da Pedra do Ingá, em especial, a arqueologia não é de grande ajuda. O único

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dado acerca da cultura que gravou aqueles símbolos são os próprios entalhes. Pois, devido a
dinamicidade do ambiente fluvial, nenhuma escavação na área circundante ao rochedo traria
elementos seguramente relacionados aos autores dos registros rupestres. Com o passar dos
milênios, entre a época da execução da gravação e hoje, muitas enxurradas escavaram e
reviraram o solo modificando a topografia da região e o material arqueológico dos povos

3
“A morte tocará com suas asas aquele que desrespeitar o faraó”. Diz uma das numerosas versões da maldição
que supostamente estaria escrita no túmulo de Tutancâmon. Contudo, Lorde Carvavan morrera em conseqüência
duma picada de mosquito e as demais mortes que foram associadas a profanação da tumba se deveram, em parte,
a reações alérgicas e infecções respiratórias ocasionadas por fungos. Vale ressaltar que o arqueólogo Howard
Carter, principal responsável pela descoberta da tumba, só veio a morrer aos 64 anos de forma natural.
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[De amer(i)- + índio + -logia]; termo por nós sugerido para designar a Ciência que trata de tudo quanto se relaciona
as culturas nativas sul-americanas.
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gravadores às margens da calha fluvial foi transportado nos enxurros, ao passo que estes
mesmos também traziam materiais aleatórios, descontextualizados, não se sabe de onde.
Como diferenciar os materiais que foram ali depositados dos que pertenceram aos
gravadores ou mesmo daqueles que estariam testemunhando as muitas trocas, cultos, rituais e
combates de outros povos seminômades que por ali eventualmente passaram no decorrer dos
milênios?

Figura 2 – Detalhe do Painel Principal

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Mesmo que a paisagem, ainda que sumariamente, possa guardar restos das estruturas
materiais desta cultura, não se tem a menor idéia de onde poderia se encontrar a cobertura
deposicional que amortalha o lugar em que estaria o centro demográfico deste extraordinário
povo que, com requinte e precisão, registraram indelevelmente na rocha o que viria a ser um dos
maiores enigmas da arqueologia.
O princípio de que nenhuma civilização é avançada se não demonstrar desenvolvimento
material é o principal argumento de muitos para atribuir a antigos povos “civilizados” aquele
sofisticado e complexo sistema de signos encravados na Pedra do Ingá. Por isso, raríssimas são
as hipóteses que tentam enquadrar aquele fenômeno num todo orgânico de vastas regiões, que
levaria a conclusão óbvia de que a Pedra do Ingá é indústria nativa. Em geral, com raras
exceções, os pesquisadores do fantástico amadoristicamente preferem elaborar sofismas a partir
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de lendas e mitos, ao passo que rejeitam e omitem as evidências que podem entrar em colisão
com suas aliciadoras formulações.
A recusa em atribuir as inscrições do Ingá aos povos ameríndios até certo ponto é
compreensiva porque, se fossemos considerar, por exemplo, os pastores beduínos, de
fisionomias curtidas dos desertos egípcios, como autores das magníficas pirâmides, esfinges e
hieróglifos; ou que os miseráveis aborígines insulares da Ilha de Páscoa teriam erguido aquelas
intrigantes estátuas e elaborado complexos sistemas de escrita, estaríamos destoando da
realidade encontrada nestes locais. Todavia, ninguém duvida que estes fabulosos monumentos
são vestígios das antigas civilizações egípcias e pascoenses que sucumbiram ao tempo. Então
por que seria despropósito supor que os entalhes do Ingá são mudos registros de antigas
civilizações aborígines desaparecidas?
O passado ameríndio tem muito mais história do que é capaz de contar. Segundo as
pesquisas da arqueóloga norte-americana Anna Roosevelt, os nativos sul-americanos já foram
muito mais complexos do que se imagina, pois a região amazônica apresenta indícios
comprovando que os antepassados indígenas já faziam grandes alterações ecológicas,
possuíam aldeias com população estimada em 5 mil pessoas e eram regidos por um sistema
político de cacicado bem mais complexo do que os índios encontrados pelos europeus
seiscentistas. Há indícios, inclusive, de que a cultura indígena amazônica deu origem às
andinas.
De qualquer modo, os mitos e lendas são mais sedutores e por isso são os principais
responsáveis pelo interesse público pela arqueologia. As abordagens partem do princípio de que
as sociedades vão se aperfeiçoando em progressão contínua à medida que se sucedem no

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tempo. Contudo, este modelo teórico contradiz a realidade. A História vem demonstrando que as
sociedades evoluem e degeneram para se redesenvolver a partir do que restou. Nesse novo
processo evolutivo vão perdendo significados essenciais ao passo que assumem novos
conhecimentos. Em todo o Planeta há testemunhos de sociedades esplendorosas que há muito
deixaram de existir, enquanto àquelas que se refizeram sobre seus escombros demonstram ser
cultural e tecnologicamente muito inferior às primeiras.
Nem sempre a sequência da tese precede a síntese e antítese, especialmente na
amerindiologia. Dezenas de milhares de anos do passado indígena ainda estão por ser
revelados, e os indicativos que dispomos deste passado, a exemplo dos engenhosos relevos
dispostos na Pedra do Ingá, são indícios do quanto surpreendente a pré-história sul-americana
pode ser.
Referências
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