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Jul./Set. 2004
Investigação
Investigação
INTRODUÇÃO
Debruçada sobre as necessidades sociais e educativas especiais das nossas
crianças, em estudos rigorosos, encontro noticiadas as tragédias do insucesso e
abandono escolar 1 – e verifico que este aparece contabilizável só a partir do 7.º ano
de escolaridade (João Ferrão, et al., 2000).2
Entretanto, há razões para afirmar que o problema do insucesso escolar se enraíza
nos primeiro e segundo anos de escolaridade obrigatória, nas dificuldades de
aprendizagem aí verificadas (entre outras coisas, também mascaradas pela
endémica desadaptação social de tantas crianças atingidas pela pobreza e os maus
tratos !) ... e é estrutural !
Resulta de uma estratégia incorrecta de encadeamento de actividades académicas a
que são submetidas crianças de seis a oito anos de idade que frequentam a primeira
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fase do 1.º Ciclo do ensino obrigatório - em que a pedagogia activa (centrada na
descodificação de experiências correntes, e/ou programadas, assim como o seu
registo em desenho e narrativa que estimulam o desenvolvimento linguístico) é
substituída por um ensino sistemático de letras e de números, desinserido das
actividades naturais da infância.
“Para a criança de mais de cinco anos de idade do nosso mundo pós-industrial, os
problemas de vida vêm a incluir a necessidade profundamente sentida de ir para a
escola e aprender a ler, escrever e contar... Infelizmente, ao fazer ingressar
«obrigatoriamente» no 1.º Ciclo do Ensino Básico crianças de seis anos de idade, o
legislador não ponderou o estilo de aprendizagem mecânica e repetitiva do alfabeto
e da numeracia que, em Portugal, os professores impõem aos seus pupilos nestas
1
Será que as medidas supletivas e correctivas agora encaradas, em boa hora, de nomear “Tutores” para obviar
ao insucesso, terão capacidade para promover a mudança, uma vez que a sugestão assenta na ideia que
implantou os professores de apoio - que se verificou não ter capacidade para mudar nada!
2
Ferrão, João (Coord.) e outros (2000). Saída prematura do sistema educativo: aspectos da situação, causas e
perspectivas em termos de emprego e formação. Observatório do Emprego e Segurança. Social. Estudos e
Análises, nº 36.
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...praticada na maioria dos jardins-de-infância...
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Cadernos de Educação de Infância
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Leal, M.R.M. (2004) Inclusão e escola activa - Investigar e reflectir a educação. ESEI/Maria Ulrich, p. 9.
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Investigação realizada em Fevereiro e Março, 2004, por Educadores da Infância, finalistas do “Curso de
Complemento de Formação Científica e Pedagógica”, com especialização em N.E.E., na ESEI/Maria Ulrich, no
âmbito da Unidade Curricular “Recursos e Apoios Familiares e Comunitários para Crianças em Risco”.
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Cadernos de Educação de Infância
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Investigação
HIPÓTESE
Utilizando indicadores do desenvolvimento mental, procurámos certificar-nos dos
efeitos da entrada no ensino obrigatório, na evolução da média das crianças que
frequentam os bancos da escola.
Comparámos dois blocos de crianças de 5 a 7 anos de idade, um congregando
crianças de jardim-de-infância, outro congregando alunos de escolas EB1.
Colocámos a hipótese:
a) Em termos de respostas a provas de desenvolvimento cognitivo e global
(considerado muito dependente de estímulos desenvolvimentistas), as
crianças que frequentam escolas EB1 não apresentam diferenças
significativas em relação às crianças de Jardim-de-Infância (em média com
menos um ano de idade);
b) entretanto, os alunos EB1 diferenciam-se das crianças de Jardim-de-
-Infância nas provas denotando a evolução genética, perceptivo-motora,
considerada menos dependente da acção pedagógica exercida.
Todas as crianças de uma turma de 1.º Ano do ensino básico, em 50 escolas EB1
(turmas encontradas em escolas públicas e privadas, sedeadas em Lisboa e
arredores, abrangendo 912 sujeitos), foram comparadas com crianças que
ingressarão no ano lectivo próximo no 1.º Ciclo de ensino e frequentam salas de 50
Jardins-de-Infância (públicos e privados, sedeados em Lisboa e arredores,
abrangendo 547 sujeitos.6 A selecção das crianças incluídas na amostragem
resultou do acaso de se encontrarem nas localizações em que trabalham as 50
alunas de uma turma do CCFCP da ESEI/Maria Ulrich que participaram na pesquisa.
A todas as crianças designadas foi aplicada a prova «Eu». Cada documento
individual de resposta à prova «EU» foi avaliado de acordo com as respectivas
normas dos elementos da prova (ver ANEXO), sendo toda a informação transferida
6
O número menor de crianças apuradas no bloco Jardim-de-Infância (547 em contraste com a soma de 912 do
bloco EB1) resultou de, nas turmas respectivas apuradas, só serem contabilizados os dados referentes a crianças
que iriam ingressar no 1º Ciclo no ano lectivo próximo, segundo informação dos pais e dos educadores.
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A PROVA «EU»
A prova «EU» foi retirada da «Prova de Prontidão Habilitação Reabilitação» (1983)
construída no contexto de um estudo da “prontidão para a aprendizagem escolar no
início do 1.º Ciclo de Ensino Básico”. Incluía provas “papel-e-lápis” escolhidas pela
sua fidedignidade e simplicidade e possibilidade de aplicação em grupo.7 Composta
de cinco itens, incluía provas simples de linguagem e provas de atitude relacional e
de classificação de imagens, além de provas de coordenação psicomotora (cópia de
figuras geométricas e corte e colagem). Para o efeito do rastreio ora encarado,
pareceu apropriado retirar desta prova apenas dois dos seus componentes: a prova
de «Cópia de Figuras Geométricas», de comprovada consistência para assinalar o
desenvolvimento genético psicomotor nas idades em causa, e a «Classificação de
Figuras», esta muito dependente da elaboração reflexiva e de experiências de
discriminação cognitiva.
A estes dois elementos acrescentou-se o “Inventário de Elaboração de
Competências Cognitivas” (ICEC), questionário de aplicação indirecta, a ser
preenchido pelos professores/educadores de cada criança. Validado em 2002,8
fornece um somatório de indicadores dicotómicos (acerta/não acerta), para
caracterizar o nível de funcionamento cognitivo-social da criança individual. A versão
utilizada contém apenas os últimos 43 itens do ICEC, visto estarem em causa
apenas sujeitos de 5 a 6/7 anos de idade.
Assim, apresentou-se um documento simples, designado «Eu», que inclui três
provas objectivas, além de uma informação do professor ou do educador sobre a
“Adaptação” da criança visada (cx.bx. ANEXO).
7
O “Projecto de Estudo e Intervenção Psico-Educacional: Habilitação Reabilitação”, foi apoiado pela Fundação
Gulbenkian, 1984-85.
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Pelo Centro de Estatística da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, dirigido pela Professora
Doutora Helena Nicolau, a quem devemos profunda gratidão por esta colaboração.
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Cópia Classificação
Resumo das Conclusões ICEC
Círculo Quadrado Losango 1ª Pág. 2ª Pág.
Médias de Jardim-de-Infância
32,1 1,4 1,2 0,9 8 11,8
(547 cr.)
Médias de EB1 (912 cr.) 31,1 1,6 1,4 1,3 7,9 11,8
Cotação de: 0 a 43 0a2 0a2 0a2 0a 9 0 a 16
ANEXO
Cópia de Figuras. Trata-se de uma prova clássica, de validade bem estabelecida,
que indica um nível de desempenho, incluída em todos os testes de rastreio da
integridade de funcionamento neurológico e em alguns testes de nível geral de
funcionamento psicológico. Na sequência de estudos de Terman/Merril, previa-se
que uma criança que não tivesse cotação adequada, pelo menos ao nível da
realização do quadrado (nível cinco anos de idade), dificilmente venceria nas tarefas
do primeiro ano da primeira fase do ensino primário (Zazzo, René et al. “Nova
Escala Métrica de Inteligência” (NEMI), Aferição portuguesa, J. Bairrão Ruivo
(1976), Livros Horizonte). A realização de cada uma das cópias foi cotada de 0 a 2,
de acordo com as normas conhecidas.
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Anos 6 7 8 9 10
Quadrado 88,2 % 93% 94,8% 100%
Losango 51 % 68,4% 70,7 % 90,6% 97,7%
CONSIDERAÇÕES GERAIS
Recentemente, Andreia Sanches com Pedro Inácio escreveram sobre o escândalo
de a educação de adultos nunca ter sido uma aposta em Portugal.9 Aduziam os
respectivos números estatísticos: 6% a 20% de analfabetos adultos no nosso país (o
mapa mostrava as conhecidas circunstâncias da “interioridade”: Alentejo Litoral,
Baixo Alentejo, Alto Alentejo, Beira Interior). Recolheram, ainda, o testemunho de
Ana Benavente (ex-governante) e colaboradores de existirem apenas 20% dos
portugueses adultos a dominarem com algum à-vontade os códigos escritos do ler,
escrever e contar.
Entretanto, não manifestaram espantar-se com que, estando a legislação sobre a
escolaridade obrigatória a ser cumprida já há dezenas de anos, 80% dos
portugueses continuem sem um nível de literacia e numeracia adequados ao que se
poderia exigir ao nível do 3.º ano de escolaridade obrigatória (ler e entender o que
se lê, usar os números nas actividades do dia-a-dia...).
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Público, de 15 de Dezembro, 2003.
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Por essa ocasião, a investigadora Ana Benavente respondera aos jornalistas que o
Governo a que ela pertenceu privilegiou o fomento da educação pré-escolar em
detrimento do ensino básico de adultos...
Será então, agora, o momento de os governantes se preocuparem com o “ensino
primário” dos portugueses (como manifestam preocupar-se com o ensino
profissional, finalmente, em Abril de 2004)...
Desde muito pequenas, por volta dos 3 anos de idade, as crianças (vivendo num
meio em que no dia-a-dia contactam com a linguagem escrita em casa e/ou no
jardim-de-infância) sabem distinguir a escrita do desenho. Mais tarde, sabem
também que uma série de letras iguais não formam uma palavra. Começam, então,
a tentar imitar a escrita e reproduzir os formatos do texto escrito (direccionais).
Porque não colocar a aprendizagem do 1.º Ano da Escola Básica na sequência
deste movimento natural, vivencial, de construção de cultura? Todos os estudiosos
da pedagogia rejeitam os exercícios repetitivos da chamada «alfabetização» e
apostam na expressividade natural, na necessidade de comunicação, na curiosidade
e desejo de descoberta das realidades do seu mundo.10 Assim se introduzem os
códigos «letrados» como elementos de experiência, no caso, a experiência típica da
sociedade dos supermercados, da TV, de todos os meios audiovisuais de
comunicação e da informática...
Ao encarar os problemas de cada coorte dos seis para sete anos dos alunos que
ingressam no ensino dito «básico» deve-se conhecer como se processa na mente
infantil a apreensão do real e da tarefa escolar, ou seja, como se processa o
desenvolvimento estrutural, cerebral, que, ao correr dos anos, assegura o acesso à
«literacia», acesso a significados escritos e lidos e à lógica da numeracia,
conduzindo a uma contínua codificação/descodificação dos significados abstractos
da experiência. A ciência intitulada psiconeurobiologia deu passos largos nos últimos
vinte anos. Nela se enquadra também o estudo da regulação cerebral que subserve
a aprendizagem e a construção dos significados da experiência interpessoal
sociocognitiva - e se realçam sempre de novo os aspectos globais, integrativos da
construção do «Eu», como «sujeito» e origem de intercâmbios que impelem o
desenvolvimento.
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... o que não impede a inserção do treino necessário das perícias, de comportamentos circunscritos e pontuais.
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... Por isso, no insucesso escolar não se trata de um problema de memória estreita ou de raciocínio lento, mas
de presença... de motivação...
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Educação Básica
ROLDÃO, M. C. [et al.]
Relatório do projecto "Reflexão participada sobre os currículos do Ensino Básico"
Lisboa: DEB, 1997
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB e em http://www.deb.min-
edu.pt/newforum/pdf/relat.pdf.
Debate sobre o currículo, as finalidades e a gestão da educação básica.
ABRANTES, P.
Reorganização Curricular do ensino básico: princípios, medidas e implicações -
Decreto-Lei: 6/2001
Lisboa: DEB, 2001
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB e em http://www.deb.min-
edu.pt/newforum/reorganizacao-curricular-EB.htm.
Primeira brochura de uma série destinada a apoiar o processo de reorganização
curricular do Ensino Básico. Transcreve na íntegra o Decreto-Lei: 6/2001, de 18 de
Janeiro, publica versões actualizadas de secções já existentes na "proposta de
reorganização curricular do Ensino Básico", apresentada em Março de 2000 e
discute algumas aplicações imediatas do referido diploma.
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MENDES, M. L. S. (coord.)
Forum "Escola, Diversidade e Currículo"
Lisboa: DEB, 1999
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB.
Actas das intervenções no forum nacional realizado em Santa Maria da Feira, em
1998, sobre o currículo do Ensino Básico.
ABRANTES, P.(coord.)
Educação básica: medidas para o sucesso: educação; integração; cidadania
Lisboa: DEB/IIE, 1999
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB.
Divulgação dos objectivos e das medidas para se alcançar uma educação básica de
qualidade e bem sucedida para todos.
SEGURADO, M. G.
A unidade da educação básica em análise: relatório
Lisboa: DEB, 1998
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB e em http://www.deb.min-
edu.pt/newforum/pdf/unieduc.pdf.
Produto das reflexões e discussões desenvolvidas por um conjunto de escolas pólo
que equacionaram os pontos críticos da educação básica e, em particular, da gestão
curricular.
ROLDÃO, M. C.
Gestão curricular: fundamentos e práticas
Lisboa: DEB, 1999
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FÉLIX, Noémia
A história na educação básica
Lisboa: DEB, 1998
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Disponível no Centro de Documentação do DEB e em http://www.deb.min-
edu.pt/newforum/pdf/enshist.pdf.
Aborda as questões e dilemas relacionados com o ensino da História no currículo da
educação básica.
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Cadernos de Educação de Infância
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Investigação
NOESIS, Nº 41
Lisboa: IIE, 1997
ISSN: 0871-6714
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Venda nas livrarias e no IIE. Preço: 2,19 .
Distribuída a escolas do EB 2, EB 2,3 e do Secundário. Dossier temático deste
número: Revisão participada do currículo do Ensino Básico.
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Cadernos de Educação de Infância
Jul./Set. 2004
Investigação
NOESIS, Nº 58
Lisboa: IIE, 2001
ISSN: 0871-6714
Disponível no Centro de Documentação do IIE.
Venda nas livrarias e no IIE. Preço: 2,99 .
Distribuída a escolas do EB 2, EB 2,3 e do Secundário. Dossier temático deste
número: Reorganização curricular no Ensino Básico.
Obras Gerais
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Investigação
turma turma.
Lisboa: IIE, 1997
ISBN 972-8353-29-4
Disponível no Centro de
Documentação do IIE e em
http://www.iie.min-
edu.pt/biblioteca/cce16/index.htm.
Venda nas livrarias e no IIE. Preço:
15,71 .
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2,61 .
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http://www.iie.min- processo.
edu.pt/biblioteca/ccoge07/index.htm.
Venda nas livrarias e no IIE. Preço:
2,61 .
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