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1. INTRODUÇÃO
Freud também teve um papel relevante por abrir espaço para que se expressasse os
sentimentos, aliviando traumas e recalques, que se não fossem expostos, podiam
tornar-se manifestos através de reações sintomáticas, modificando assim a forma de
ver e atuar dos profissionais de saúde psíquica.
Análise histórica
A repressão sexual era uma realidade nos séculos XVIII e XIX, não havia liberdade de
falar do corpo, das suas sensações e necessidades, o assunto sexualidade era
considerado imoral, principalmente no seio da família, a intimidade da mulher era
velada, a sociedade não admitia outro tipo de conduta, diz Perrot (2004).
Baseado nesta perspectiva é que Freud, no final do século XIX, inicia os seus estudos,
motivado pela realidade de repressão da sexualidade, principalmente a feminina,
que já desde a Idade Média, manifestavam as suas reações com características mais
explícitas, através da histeria e outras neurose, que na história da civilização teve o
seu papel relevante, por ser uma forma de expressão. Segundo Freud (1886), na
histeria pode haver uma combinação de sintomas, possibilitando que, por anos, a
pessoa afetada fosse considerada simuladora. Estes distúrbios tinham o caráter de
dissipar-se através de um contágio psíquico, pois esta psicopatologia era considerada
uma epidemia, e as pessoas atingidas por ela, relegadas a classificações espúrias
como possessas ou feiticeiras, sujeitas a depreciações, sem direito de observação ou
tratamento.
A partir dos seus estudos com Charcot e Breuer, Freud (1886) percebe que havia uma
importância prática no trabalho com histeria. Atuando com casos complexos foi
possível diferenciar esta patologia de outras, com caráter semelhante,
caracterizando uma sintomatologia e percebendo uma correlação entre a doença
histérica e a irritação genital.
Conceitos básicos
Tendo uma postura que ia de encontro à realidade de sua época, ele inicia um
processo de estudo e tratamento das doenças ligadas aos distúrbios da sexualidade,
especialmente da mulher. Para entender mais profundamente este assunto é
necessário iniciar com a concepção freudiana de alguns conceitos, que foram
desenvolvidos a partir dos seus estudos e que podem estar ligados ao
desenvolvimento de distúrbios emocionais a posteriori.
Também importante é como Freud (1901) caracterizava a libido, como uma energia
psíquica de caráter qualificativo, que exerce uma força quantitativa de forma
variável, podendo assim medir os processos e transformações que ocorrem no
aspecto de excitação sexual. Esta excitação é fornecida por todos os órgãos do corpo
e não apenas pelos órgãos sexuais. Esta libido pode ser direcionada para objetos ou
ter uma relação com o ego, tornando-se uma libido narcisista.
Para Freud (1886), o recalcamento está ligado a experiências sexuais que tenham
sido traumáticas ou prematuras, este recalcamento levará a despertar lembrança,
ocasionando o aparecimento de sintomas primários de neurose, o organismo entrará
em um estágio de defesa, por fim, as idéias recalcadas voltam ocorrendo um
confronto entre elas e o ego, que culminará na formação da patologia. A tendência
de defesa orgânica, quando direcionadas contra idéias que podem levar a desprazer,
como as idéias sexuais, que são contrárias às operações do ego, torna-se um fator
prejudicial.
Para Freud (1886), além de todo esse processo de recalcamento, fruto da visão
distorcida da sexualidade na época, que fazia com que se reprimisse desejos e
impulsos, ou fruto de experiências sexuais prematuras ou traumáticas, outros fatores
com determinantes causais sexuais, eram potencializadores do aparecimento das
neuroses, como a passividade sexual; também a angústia das virgens pelo princípio
da vida sexual, a angústia das abstinentes, entre elas mulheres que se tornavam
esquecidas pelo marido, não satisfeitas na vida sexual, até por impotência do
companheiro, a angústia pelo coito interrompido, por receio de engravidar ou por
ejaculação precoce, não levando a satisfação da tensão sexual. Todos estes fatos
tornavam as mulheres mais propensas ao aparecimento de neuroses, mas também
manifestava-se em homens.
Com todo esse processo, para se proteger contra a ansiedade, o corpo também podia
desenvolver mecanismo de defesa, na busca de reduzir a tensão, ou distorcendo a
realidade de forma inconsciente, através de várias manifestações possíveis, como na
identificação, assumindo o caráter de outrem; na repressão, barrando as pulsões da
ansiedade; na sublimação, substituindo uma meta por outra socialmente aceitável;
na projeção, atribui a ansiedade a outrem; na formação reativa, oculta a pulsão
perturbadora substituindo ódio por amor ou por outros sentimentos; na fixação, onde
bloqueia o desenvolvimento, não passando a outro estágio; na agressão, leva a
reversão a um estágio de desenvolvimento anterior, onde sente maior segurança.
Sintomatologia
Com relação especificamente a histeria, palavra que significa útero, Freud (1886) diz
que tem um vínculo direto com as neuroses. Nesta patologia não se encontra
alteração do sistema nervoso, mas encontra-se modificações na condição de
excitação com relação às partes deste sistema, porém tem um quadro clínico bem
característico, sendo diagnosticada por sua sintomatologia, que na forma mais aguda,
especialmente na grande histeria, são diversos e graves. Mas, existem também
formas mais amenas de manifestação da patologia. Para desenvolver este assunto é 5
necessário iniciar com a caracterização da sintomatologia, a concepção freudiana de
histeria e a sua forma de atuação com relação ao problema.
Segundo Freud (1886), os sintomas que dão uma nítida característica à patologia são:
2. Zonas histerógenas, áreas com forte conexão com os ataques, e que são propensas
a desencadear um ataque histérico com apenas um leve estímulo, ou mesmo por uma
sensação que venha desta área. São situadas na pele ou órgãos, especialmente na
região abdominal do ovário e na infra-mamária nas mulheres, nos testículos e cordão
espermático nos homens. Podendo ser uni ou bilateral. Estas áreas também podem
exercer função inibidora sobre ataques convulsivos. Uma pressão nesta área provoca
uma sensação-aura.
Características
Há características gerais das manifestações histéricas, como serem exageradas -
dores intensas, contraturas de maior rotação etc., os sintomas podem ocorrer
isolados, e podem ocorrer só em áreas específicas, assim ao lado de uma área
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insensível pode haver outra normal. São passíveis de mudança de forma espontânea
ou influenciada, excluindo a possibilidade de lesão orgânica. Segundo Freud (1886) "é
especialmente característico da histeria sem um distúrbio, ao mesmo tempo
desenvolvido no mais alto grau e limitado de maneira nítida" (p. 84).
Também com exatidão Freud (1906) descreve outras características próprias do que
são os sintomas histéricos específicos, entre eles: são símbolos mnemônicos de
impressões e experiências traumáticas operativas; são substitutivos, produzidos por
"conversão", para o retorno associativo dessas experiências traumáticas; são
expressão da realização de um desejo; são a realização de uma fantasia inconsciente
que serve à realização de um desejo: estão a serviço da satisfação sexual e
representam uma parcela da vida sexual do sujeito; correspondem ao retorno a um
modo de satisfação sexual que era real na vida infantil e tem sido reprimido; surgem
como uma conciliação entre dois impulsos afetivos e instituais opostos, um dos quais
tenta expressar um instinto componente ou um inconsciente da constituição sexual,
enquanto o outro tenta suprimi-lo; podem assumir a representação de vários
impulsos inconscientes que não são sexuais, mas possuem sempre uma satisfação
sexual (P. 152/153)
Freud (1893) também relata que a capacidade de adquirir a histeria está ligada a
uma idiossincrasia da pessoa. As pessoas que se tornam histéricas são vivazes, dotada
intelectualmente e repletos de interesse antes de serem acometidos pela patologia.
Têm ânsias de sensações e atividade mental, possuem intolerância à monotonia.
Desta forma, mesmo em repouso liberam um excesso de excitação que necessita ser
reaproveitado, na puberdade isso é acrescido do despertar da sexualidade e
glândulas sexuais, há então uma energia nervosa excedente que podem gerar os
fenômenos patológicos. Contudo, para que estes fenômenos manifeste sintomas
histéricos é necessário outra idiossincrasia específica, por isso nem todos os ativos
tornam-se histéricos. Quando a pessoa com excedente de excitação, concentra a
atenção em uma parte do corpo, esta excitação é direcionada para esse local,
causando hiperalgesia. Desta forma, qualquer dor alcança o ápice e qualquer mal-
estar torna-se insuportável, esta quantidade será aumentada com o influxo de novas
excitações.
Etiologia
Freud (1901), por perceber que um alto grau de recalcamento sexual ou uma
resistência da pulsão sexual por moralidade ou vergonha, levava a que os
pensamentos retidos no inconsciente necessitassem expressar seu valor efetivo, como
uma descarga (transformações das aspirações libidinosas em sintomas), que era
manifestada na histeria, sendo estes sintomas um substituto das aspirações, desejos
e anseios da pulsação sexual recatada. Assim, ele inicialmente buscava eliminar estes
sintomas através da retransformação sistemática, onde ocorre uma transcrição
destes processos em representações afetivas conscientizadas, podendo averiguar a
natureza e origem destas transformações, chegando ao núcleo do problema para
resolvê-lo.
Freud (1886), diz que a histeria inicia-se na adolescência e até mesmo na infância,
sendo um sintoma do sistema nervoso, e sua manifestação esta ligada a "perversão
moral permanente". No sexo feminino é mais comum a neurose a partir dos 15 anos,
caso ocorra um casamento feliz haverá uma interrupção da doença, mas ela
reaparecera com o esfriamento do relacionamento conjugal e o nascimento dos
filhos. Este distúrbio também pode ocorrer em homens, despertando maior interesse
por interromper a atividade laborial. Esta patologia pode estar associada a outros
distúrbios neuróticos ou orgânicos, dificultando assim o processo de análise. O mais
comum é acompanhar a neurastenia, ocorrendo quando a disposição histérica está se
dissipando e inicia um quadro de neurastenia, desencadeando ambos,
simultaneamente. Essa combinação é mais comum em homens, por terem disposição
para as duas patologias. Em alguns casos femininos onde foi diagnosticada a histeria,
ocorre apenas neurastenia.
Para Freud (1886) a histeria é uma anomalia constitucional, com sinais iniciais
manifestados na adolescência. Os sintomas isolados podem desaparecer de forma
rápida, aparecendo outros, também transitórios. Os sintomas também podem ser
interrompidos e retornar na sua totalidade ou durar anos e desaparecer subitamente.
Contudo para o processo de evolução é necessário um período de latência, ocasião
em que a causa desencadeante estará agindo no inconsciente.
Freud (1886) não considera que a anormalidade no aparelho genital está ligada
diretamente à patologia, mas a atitude sexual seria uma das fortes condições, pois
para Freud esta função tinha especial significação, principalmente para o sexo
feminino. Outra condição seria um trauma, que pode incidir como causa de duas
maneiras: podendo manifestar uma disposição histérica ou porque a parte do corpo
afetada torna-se propensa a uma histeria local. Mas o recalcamento é o ponto chave
das neuroses tanto das hereditárias, como gera neuroses não hereditárias, ou seja,
adquiridas, e está sempre ligado a distúrbios na sexualidade.
Existem segundo Freud (1886), diversos outros fatores que podem ser próprios para o
desenvolvimento de uma disposição histérica, como excesso de mimo, excitamentos
freqüentes e violentos. Para irromper um estado agudo pode colaborar um trauma ou
uma emoção compulsiva. Esta doença acomete mais as mulheres, ocorrendo
raramente com todas as características em homens. Mas também existe a histeria
infantil, mais comum em crianças precoces e com altas habilidades. Também
colabora o fato da pessoa ter outras patologias como encefalopatia e processo inicial
de sífilis.
Mas a forma mais eficaz de chegar a etiologia, segundo Freud (1893), é fazer o
paciente retroagir a partir do sintoma até a experiência na qual e pela qual o
sintoma surgiu, promovendo com a reprodução da cena traumática, uma correção do
curso psíquico dos acontecimentos, eliminando os sintomas. Buscando as causas da
histeria pode-se assim descobrir, partindo das cenas traumáticas, quais as influências
produzem sintomas histéricos e como fazem, mas o percurso é difícil, pois é
necessário chegar a essa derivação tendo adequação como determinante, por
exemplo, quando um susto ou acidente causa um sintoma histérico de vômito, é 10
indispensável descobrir porque o susto levou a este sintoma específico.
Tratamento
Para tratamento Freud (1886) relacionava três etapas, que seria um tratamento
profilático, atuando nas disposições histéricas, prevenindo o aparecimento ou
atenuando os sintomas leves; o tratamento da histeria aguda, ou os ataques
histéricos, onde deve-se tomar as medidas para evitar toda a excitação emocional ou
condições habituais que venham a contribuir para a manifestação; por fim o
tratamento dos sintomas histéricos isolados ou histeria local, persistirão enquanto
houver histeria aguda, pode-se atuar com modificação local, remoção da fonte de
estímulos e levar o paciente a negligenciar o problema, influenciando o sistema
nervoso com terapias alternativas. É importante também, para eliminar a disposição,
no tratamento profilático, tomar atitudes simples como, não sobrecarregar o sistema
nervoso, dedicar tempo aos exercícios e higiene, não se manter de forma exaustiva
no trabalho intelectual. Ocorrendo ataque é importante que a pessoa possa sair do
ambiente onde ocorreu, evitando pressões familiares, e excitação emocional.
Também para Freud (1893) uma forma de reação normal que pode suavizar a
excitação é comunicá-las pela fala. Falar as coisas é uma forma de aliviar-se. Não
tendo essa saída de excitação, ela pode se converter em um fenômeno somático,
originando os fenômenos histéricos de retenção. Este fator mostra a importância do
uso da associação livre no tratamento.
Contribuição social
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Freud (1896), refuta a idéia de que é impossível uma investigação sexual por
escrúpulos dos pacientes, pois mesmo ocorrendo uma hesitação inicial, eles
adaptam-se à nova situação. Esta abertura é uma válvula de escape, principalmente
para a mulher, que pelas concepções sociais passavam a vida sentindo a dificuldade
de ocultar seus sentimentos e apelos sexuais, ao saber que com o médico podia se
comportar de forma humana, no que concerne assuntos sexuais, levava a sentir-se
assim aliviadas ao exporem suas considerações.
Freud (1896) esclarece que a fato de todos terem suas fraquezas na área da
sexualidade, deve levar a uma tolerância relacionada às questões sexuais, deixando a
visão moralista, e percebendo o beneficio para a moral sexual, a necessidade de
abandonar o sigilo nesta área, buscando alívio para os sofrimentos gerados, pois
percebe-se uma relação causal entre a sexualidade e as neuroses. Mas alerta para a
contradição de que, apesar de todo o esclarecimento até então possível, haver ainda
uma descrença social sobre a ciência sexual, dificultando o acesso ao tratamento. É
preciso que se esclarecer às donas-de-casa, que o motivo de adoecerem não são as
dificuldades das tarefas domésticas cotidianas, mas por negligenciarem e
prejudicarem, por muito tempo, a vida sexual.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREUD, Sigmund. Primeiras publicações psicanalíticas. Vol. III. Rio de Janeiro: Imago,
1969
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