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Vídeo-documentário de 43’:38”
Além daqueles que moram em área limítrofe à mineradora e sofrem mais diretamente os
problemas em questão, há também os depoimentos de um diretor da empresa, um
geólogo, um médico/cientista e um Procurador de Justiça Criminal pelo estado de
Goiás.
FICHA TÉCNICA
Direção de Fotografia
ALESSANDRO SILVEIRA
Direção de Arte
WALESCKA MARTINS
Edição e Finalização
DHIEGO SANTANA
Iluminação
ARCANJO DANIEL FONSECA
Produção
FÁBIO CASTRO RAMOS
ARCANJO DANIEL FONSECA
Trailer
MARCOS COSTA
Fotografia de Still
MOACIR GUERINO
Trilha Sonora
A Missa da Terra Sem Males
Concierto de Aranjuez – Adágio
Type Of Negative
Amorphis
Murro no Olho
Imagens Adicionais
The Corporation – documentário de Marck Achbar, Jennifer Abbot e Joel Bakan
Direção Geral
SANDRO NEIVA
OFF 02 – Tal como à época da coroa portuguesa, o ouro produzido em Paracatu ainda
vai parar em mãos estrangeiras. O que sobra para os paracatuenses são enormes feridas
abertas pelas lavras a céu aberto, rejeitos químicos depositados onde outrora havia belos
vales, venenos enterrados, poeira tóxica, trabalhadores enfermos e as lembranças de
córregos que foram ricos no passado.
CARMEN LOPES DOS REIS (vizinha da mineradora) – Eu não acho certo não! Eu
acho um horror. Eu fico olhando isso aqui, acho um horror eles terem feito um absurdo
desses aí. Uma coisa tão bonita igual era aqui. A gente sente muito, muito mesmo! As
belezas que nós já viu aqui nessa praia, pra hoje nós vê desse jeito!
CAPÍTULO “A ÁGUA”
CARMEN LOPES DOS REIS (vizinha da mineradora) – Se fosse nós, por exemplo,
que fizesse um absurdo desses aqui, o Incra de cima, Polícia Florestal tava de cima, não
sei o que é mais tava de cima. Agora olha aí, que bagaceira terrível! Manjem bem que
coisa mais horrorosa!
LEANDRO FRANCISCO (vizinho da mineradora) – Hoje, você sobe aqui, olha o que
se vê: é esse córrego todo assoreado, você não vê mais nascentes, a natureza nossa está
sendo acabada.
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – Além disso, tem o córrego São
Domingos, o córrego Santo Antônio, que foram praticamente destruídos pela mineração.
VALDIR LOPES DOS REIS (vizinho da mineradora) – Ali tem um tanque que derrama
pra cá, então na época da chuva eles vão alteando, alteando, que é pra água não vir
mesmo pra cá. E a água, o que cai, fica lá. E esses maquinários novos que eles
trouxeram, eles apanham a água até mil metros pro fundo, então a água fica só lá.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Esse córrego aqui, ele não tem mais
água. Esse córrego acabou. Aqui todo ano dava enchente nesse córrego. Ele ia até ali na
mangueira, hoje a água não passa da cerca. Para eles minerarem nessa parte da mina
deles aqui ao lado, eles vão ter que abaixa-la 100 metros. A partir do momento que eles
baixam ela 100 metros, o córrego vai embora. Então, eles têm que fazer a transposição
do córrego urgente.
CAPÍTULO “A LIBERDADE”
VALDIR LOPES DOS REIS (vizinho da mineradora) – A gente não pode nem
permanecer no terreno deles, porque eles não aceitam. Se você subir ali pra apanhar um
pequi, eles vão de cima pra saber o que é que tem naquelas vasilhas. E muitas vezes eles
pegam e jogam até fora, pensando que é alguma coisa lá da firma. Então, a liberdade
nossa aqui agora, acabou.
JOSÉ FERREIRA GOMES (vizinho da mineradora) – Isso não podia acontecer. A gente
mora num lugar e hoje é proibido, talvez, até de entrar.
VALDIR LOPES DOS REIS – Sendo que nós moramos aqui há muitos anos. Até lenha
eles já quiseram proibir a gente de apanhar, mas a gente não importou e foi continuando.
E o tempo passa, e cada dia que passa vai ficando pior. Eles aumentam os maquinários
deles, e nós mesmos vamos ficando.
OFF 04 – Nunca vai existir o suficiente. Nenhuma corporação nesse planeta negligencia
o interesse dos donos e seus fundamentos econômicos. O lucro acima de tudo, até do
interesse público. De fato, não é uma lei da natureza. É uma lei específica. A quem
devem lealdade?
VALDIR LOPES DOS REIS (vizinho da mineradora) – E se você falar que vende, eles
compram tudo. Só que se a gente vender pra eles não tem como criar os filhos da gente.
URUBATAN DOS SANTOS (vizinho da mineradora) – Mas só que ela quer pagar o
preço que ela quer.
URUBATAN DOS SANTOS (vizinho da mineradora) – Então tem que ter uma proposta
honesta, limpa, justa, honesta, da empresa com os moradores.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Aqui só ficou duas casas. Eles vieram e
compraram tudo. Só ficou Dª Nenzinha e Pelé com a mulher. Porque sabem que o que
estão fazendo com eles. Chegaram aí e impuseram um valor. Os dois foram os únicos
que não quiseram entregar.
NICOLAU ANTÔNIO DE OLIVEIRA (vizinho da mineradora) – Embora a gente é
daqui, nasceu e criou aqui, mas chega um ponto que a gente não consegue mais
conseguir viver.
ROBSON FERREIRA (vizinho da mineradora) – O meu avô morreu com 96 anos. Hoje
ta com 10 anos que ele faleceu. Então, meu avô criança já era “careta”. Foi herdado do
pai dele, do avô dele. Então é coisa de três séculos pra trás já tinha “caretada”. Muitos
dos que dançavam a “caretada”, hoje já não dançam a “caretada”. Muita gente quer
dançar a “caretada”, mas não tem como buscar aqueles enfeites, aquela máscara,
adequadamente do jeito que dançava.
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – São comunidades seculares que residem
ali e estão sendo desagregadas. Essas pessoas estão acostumadas a viver naquele
ambiente. Então são a vida, os sonhos delas que estão ali. Pra onde é que essas pessoas
irão?
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – O correto seria que a empresa custeasse
a remoção completa dessas populações pra locais saudáveis, pra que elas possam obter o
que elas tinham antes da chegada da Rio Paracatu Mineração.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Falar em barragem de terra segura aqui no
Brasil e em Minas Gerais, parece até piada. Porque não existe barragem de terra100%
segura.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Mesmo que o gerente geral da mina
colocasse sua família residindo abaixo da barragem, eu ainda não acreditaria que essa
barragem é 100% segura.
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – E ali sobre aquela barragem chove e a
erosão da água é muito eficiente pra destruir o que eles construíram.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – A minha família não moraria ali.
AUGUSTO TEIXEIRA (vizinho da barragem de rejeitos) – Eles falam que não tem
perigo. Não tem perigo é porque não é eles que moram aqui por baixo.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Eu não recomendaria ninguém morar ali a
jusante da barragem.
OFF 05 – Todo produto pode ser feito de maneira sustentável? Nem sempre. Você pode
extrair produtos de minas de maneira sustentável? Inacreditável.
CAPÍTULO “A POEIRA TÓXICA”
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – A falta de vegetação faz com que essa
áreas lavradas e mineradas funcionem como fábricas de poeira. E poeira tóxica, poeira
venenosa, que vai pra cidade.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Esse arsênio é um grande perigo na medida
em que não se sabe o que fazer com o arsênio.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Esse beneficiamento usa uma substância
extremamente tóxica chamada cianeto. O cianeto, ele é letal.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo) – Uma grande parte do cianeto que é usada
nesse processo de beneficiamento é estocado depois em tanques e guardado debaixo da
terra, coberto por terra. Isso joga para as gerações futuras o problema desse cianeto. Nós
estamos enterrando o problema.
LUIS ALBERTO ALVES (Diretor da RPM/Kinross) – Nós podemos ser punidos. Nós
somos os responsáveis. Ambientalmente nós somos os responsáveis. Qualquer
problema, nós teremos que responder por ele.
MÁRCIO JOSÉ DOS SANTOS (geólogo)– Quando essas substâncias são carreadas
pelas águas e precipitando também nos solos, se infiltrando nos solos, pela drenagem
ácida que existe naquele local, isso vai contaminar, às vezes, a muitos quilômetros de
distância.
OFF 06 – Para eles é legítimo criar tecnologias homicidas. O mais importante é o lucro,
de forma crescente, legal e sustentável, para os proprietários da empresa, às custas de
qualquer um.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Se você ver o povo, o tanto que o povo
aí sofria com doença, com tudo quanto é coisa, por causa dessa RPM.
VALDIR LOPES DOS REIS (vizinho da mineradora) – A Polícia Florestal veio e tomou
as bateias e levou tudo.
JOÃO ARAÚJO DE OLIVEIRA (ourives) – Não, aqui não. Aqui não pode. Aqui nós
temos uma firma, a RPM, que explora esse ouro, mas ela não vende ouro pra nós. Nos
anos 80 até 87, era fácil você adquirir um ouro porque tinha os garimpos democráticos.
Você tinha uma facilidade pra obeter o ouro pra trabalhar.
JOÃO ARAÚJO DE OLIVEIRA (ourives) – Olha, minha opinião é de que deveria ser
feito alguma coisa pra que nós pudéssemos usar o que nós temos aqui, o ouro nosso.
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – Apesar dela ser uma grande
empregadora individualmente, o município é diversificado o suficiente pra ser auto-
suficiente. E havia auto-suficiência antes da chegada da Rio Paracatu Mineração.
JOÃO ARAÚJO DE OLIVEIRA (ourives) – Tira o jeito da gente trabalhar. Impede que
você faça alguma coisa dentro dessa profissão. Aqui não é só eu não. São vários.
SÉRGIO ULHOA DANI (médico e cientista) – Agora ainda existe o risco muito sério
de que as três grandes nascentes, as nascentes principais do Ribeirão Santa Rita sejam
completamente destruídas por uma segunda barragem de rejeitos, que vai ter 11
quilômetros de extensão. A barragem atual já tem cerca de mil hectares de superfície e a
outra deve ser um pouco maior que isso.
URUBATAN DOS SANTOS (vizinho da mineradora) – Tudo isso aqui vai ser
inundado.
LUIS ALBERTO ALVES (diretor da RPM/Kiross) – Nós até já paramos de usar o termo
“garimpeiro”, que é até um pouco injusto da forma como está hoje. Estamos usando o
termo “invasores”.
URUBATAN DOS SANTOS (vizinho da mineradora) – Quer dizer, rejeito é uma sobra
de comida, rejeição. Aquilo que termina vira rejeito, é sobra.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Se você for aqui no morro, muitos que
morreram por aí atirados por eles.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Eles proíbem uma coisa, dois pesos e
duas medidas, e deixam o que a mineradora está fazendo aí na cidade, destruindo tudo.
MÁRCIA LOPES OLIVEIRA (viúva de garimpeiro) – Eu fiquei com cinco filhos, todos
de menor, e sofrendo. Até hoje vivo pelejando com minha vida sozinha.
LUIS ALBERTO ALVES (diretor da RPM/Kinross) – É pra não recuar. A única arma
que eu tenho hoje é pra não recuar.
ANA LOPES DE MORAES (mãe de garimpeiros mortos) – Eu não. Não entrei não.
Disse que não tinha jeito de entrar.
ANA LOPES DE MORAES (mãe de garimpeiros mortos) – Nunca recebi nada, nada.
MÁRCIA LOPES OLIVEIRA (viúva de garimpeiro) – Eles não merecia terem matado
ele do tipo que eles matou não. Eu achava assim, na minha opinião, eles podiam até
prender ele, mas matar não. Podia prender ele, dar a ele uns anos de cadeia.
LUIS ALBERTO ALVES (diretor da RPM/Kinross) – Nós não temos como fazer isso.
Nós somos sete guardas, oito guardas, para trinta invasores. Se fizer isso, vai acontecer
o que aconteceu, vai ter morte!
MÁRCIA LOPES OLIVEIRA (viúva de garimpeiro) – Eu achava que essa firma tinha
que vir até mim. Nunca me procuraram, agora já vai fazer 10 anos já, agora que ela não
vai me procurar mesmo. E você sabe com o que eu vivo? Vivo com sessenta e seis reais
de bolsa escola.
ERIS RIBEIRO PEREIRA (primo de garimpeiro morto) – Nós fomos lá uma turma de
cinco. Nós estávamos trabalhando e aí já veio o pessoal lá no barranco, tentando cercar
nós e dando tiro. Um companheiro meu, que era primo meu, sobrou. Eles pegaram ele e
bateram nele muito e atirou nele. Atirou nas costas dele e matou ele. Se fosse numa reta,
tinha pegado nas minhas costas o tiro, mas como eu pulei o barranco “rapidão”, o tiro
pegou no pé. O processo que deu pra eles é que o cara que matou pegou um ano semi-
aberto. Pra mim ainda tem um processo ainda pra correr. Estou esperando pra ver o que
vai dar.
LUIS ALBERTO ALVES (diretor da RPM/Kinross) – Então essas medidas todas foram
intimidadoras, conseguimos acalmar a situação.
MARCIANO DA CRUZ DOS REIS (vizinho da mineradora) – Agora aqui não! Chega
todo mundo de fora, mete a cara, arranja a vida e vai embora. Cadê os prefeito, cadê...
os tal dos povo que manda. Eu acho que eles dá é na meia.
RÔNIA MARIANO (vizinha da mineradora) – Eles não estão preocupados com o povo.
Eles estão preocupados com o bolso deles. Infelizmente essa é a política nacional e é
municipal também.
LEANDRO FRANCISCO (vizinho da mineradora) – Eu não sei nem o que pode ser dos
meus netos e dos meus filhos na próxima geração.