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SUMÁRIO

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s
I Sumário
II Editorial | Jorge Raposo
Arqueologia
III Dois Bronzes de Entidades IX A Faiança Portuguesa
Tutelares da cidade romana no Mosteiro de S. João de
de Bracara Augusta | Rui Morais Tarouca: metodologia e
resultados preliminares
IV Escavações Arqueológicas
| Luis Sebastian e Ana
no Quarteirão dos Antigos
Sampaio e Castro
CTT (Braga): resultados
preliminares | Luís Fontes et al. X Sepulturas Escavadas na
Rocha do Monte do Biscaia
V A Necrópole Romana da | Joana Valdez, Filipa Pinto
Qtª da Torrinha / Qtª de Stº e João Nisa
António: incursão ao universo
funerário, paleodemográfico e XI Pertinência da análise
morfométrico | Sandra Assis e bioantropológica em espólio
Rui Pedro Barbosa osteológico humano
descontextualizado: A
VI Levantamento Necrópole da Igreja Matriz
adenda electrónica Arqueológico do Concelho de Montalvão | António
de Tábua | Suzana Pombo Matias e Cláudia Costa
dos Santos
N.º 16 | Dezembro 2008 XII A Musalla do Hisn Turrus /
VII Uma Primeira Leitura da / Torrão: uma hipótese de
Carta Arqueológica de Avis trabalho | António Rafael
| Ana Ribeiro Carvalho
[http://www.almadan.publ.pt]
VIII A Faiança Portuguesa nas XIII Os Sítios do Paleolítico
Ilhas Britânicas: um projecto Médio na Margem Esquerda
de investigação | Tânia Manuel do Estuário do Tejo
Casimiro | Rui Miguel Correia
Opinião
XIV A Relação entre o Parque XVI A Ausência da Análise
Arqueológico do Vale do Etnográfica e Experimental
Côa e a População Local: no estudo da cerâmica
balanço da primeira década | pré-histórica em Portugal
António Batarda Fernandes et al. | Gonçalo de Carvalho Amaro
XV O Papel da Bioantropologia: XVII A Influência dos Modelos
violência interpessoal, ritual e de Importação de Cerâmica
guerra primitiva nos restos Fina nas produções
osteológicos humanos madeirenses do século XVII
| Luís Faria e Eunice Gomes | Élvio Duarte M. Sousa
Património
XVIII Um Passeio Geológico na Almada Oitocentista | José M. Brandão

XIX Livros
XX Notícias: eventos científicos
XXI Notícias: actividade arqueológica
al-madan
online
adenda
I electrónica
ficha técnica
EDITORIAL
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e
al-madan IIª Série, n.º 16, Dezembro 2008
al-madan online / adenda electrónica Capa Jorge Raposo
Propriedade
Centro de Arqueologia de Almada Vale do Côa e Quinta da Ervamoira.
Apartado 603 EC Pragal
Fotografia © António Martinho Baptista / PAVC
2801-601 Almada PORTUGAL
Tel. / Fax 212 766 975
E-mail secretariado@caa.org.pt
Registo de imprensa 108998
Http://www.almadan.publ.pt
ISSN 0871-066X Depósito Legal 92457/95
Director Jorge Raposo (director.almadan@clix.pt)

U
Conselho Científico Amílcar Guerra, António Nabais,
Luís Raposo, Carlos Marques da Silva e Carlos Tavares da Silva ma das consequências não despiciendas da extinção do Instituto
Redacção Rui Eduardo Botas, Ana Luísa Duarte, Português de Arqueologia (IPA), cujas atribuições e competências
Elisabete Gonçalves e Francisco Silva
foram remetidas para o actual Instituto de Gestão do Património
Colunistas Mário Varela Gomes, Amílcar Guerra, Víctor Mestre,
Luís Raposo, António Manuel Silva e Carlos Marques da Silva Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR), foi a redução do panorama editorial
Colaboram na edição em papel Ass. Prof. Arqueólogos, Mila da Arqueologia portuguesa, com os responsáveis da tutela a entenderem
Abreu, Alexandrina Afonso, Mª José Almeida, Miguel Almeida, “não prioritária” a manutenção da Revista Portuguesa de Arqueologia e da
Clementino Amaro, Thierry Aubry, A. Martinho Baptista, Patrícia
Bargão, Lília Basílio, José Bettencourt, Francisco Caramelo, série monográfica Trabalhos de Arqueologia. Ambas haviam sido lançadas ou
Guilherme Cardoso, António Chéney, Com. Org. 1º CPAE, Mónica retomadas pelo IPA, com a primeira a registar 19 edições (duas por ano entre
Corga, Dalila Correia, Miguel Correia, Virgílio H. Correia, Eugénia 1998 e 2006 e uma última em 2007) e a segunda a chegar ao número 50
Cunha, Lino T. Dias, Ana L. Duarte, José d’Encarnação, Carlos
Fabião, Luís Faria, A. Batarda Fernandes, Mª Teresa Ferreira, António (atingido com as quatro edições de 2007), materializando a aposta consequente
Fialho, Jorge Freire, Mauro Frota, Eunice A. Gomes, M. Varela Gomes, no fomento da publicação científica, uma das atribuições cometidas a esse
António Gonzalez, Raquel Granja, Amílcar Guerra, Martine Guindeira,
Rosa Jardim, António Jerónimo, Patrícia Jorge, Miguel Lago,
Instituto na respectiva Lei Orgânica. É verdade que documento equivalente
Alexandra C. Lima, Luís Luís, Isabel Luna, Ludovino Malhadas, também confere aos IGESPAR a missão de “coordenar, no âmbito do Ministério
Andrea Martins, Isabel Mateus, Simão Mateus, Henrique Mendes, da Cultura, a actividade de divulgação editorial e de promoção nas áreas do
Marta Mendes, Víctor Mestre, Mário Monteiro, Elena Móran, Nuno
Neto, César Neves, Mª João Neves, José Norton, Luiz Oosterbeek, património cultural arquitectónico e arqueológico”. Mas, assumidamente, o seu
Rui Parreira, Rodrigo M. Pereira, João Pimenta, Mª João Pina, Filipe exercício não é prioridade... pelo menos no que respeita à RPA e aos TA.
S. Pinto, J. Carlos Quaresma, Sara Ramos, Jorge Raposo, Luís
Sucede isto numa altura em que se agravam as condições de sobrevivência
Raposo, Paulo Rebelo, Aldina Regalo, Fabian Reicherdt, Anabela P. Sá,
Jorge D. Sampaio, André T. Santos, Raquel Santos, António M. Silva, para outros projectos editoriais de continuidade, sejam estes de natureza
Carlos M. da Silva, André Teixeira e António C. Valera estritamente científica ou de âmbito mais geral, direccionados para a divulgação
Colaboram na Adenda Electrónica Elisa Albuquerque, Miguel e promoção da cultura científica junto de públicos diversificados, enquanto
Almeida, Gonçalo C. Amaro, Sandra Assis, Thierry Aubry, Rui P.
Barbosa, Pedro Barros, Lília Basílio, Delfina Bazaréu, Cristina Vilas instrumentos de mediação, partilha e sociabilização do conhecimento
Boas, José Braga, José M. Brandão, António R. Carvalho, Com. Org. arqueológico e da sua interacção crescente com outras áreas do saber.
1º CPAE, J. Muralha Cardoso, Bárbara Carvalho, Tânia M. Casimiro, Face ao alheamento da administração pública central, à situação vão resistindo,
Ana Sampaio e Castro, Dalila Correia, Rui Miguel B. Correia,
Cláudia Costa, Eugénia Cunha, Fernando Dias, José d’Encarnação, melhor ou pior, revistas e seriados produzidos em contexto universitário,
Luís Faria, A. Batarda Fernandes, Mª Teresa Ferreira, Luís Fontes, com apoios da administração local ou resultantes de estratégias de afirmação
Eunice Gomes, Sérgio Gomes, Amílcar Guerra, Vítor O. Jorge,
Ângela Junqueiro, Mª Fernanda Lourenço, Luís Luís, Fernanda
empresarial. Porém, a resistência é mais difícil quando o suporte assenta em
Magalhães, Jaime J. Marques, Andrea Martins, Manuela Martins, estruturas organizativas independentes e de recursos económicos e financeiros
António Matias, Samuel Melro, Marta Mendes, Rui Morais, César mais frágeis.
Neves, Mª João Neves, Lurdes Nieuwendam, Susana Nunes, Filipa
Pinto, Pedro Pinto, João Nisa, Ana Ribeiro, Jorge Sampaio, É o caso da Al-Madan e do Centro de Arqueologia de Almada, que se
Constança G. Santos, Raquel Santos, Susana P. Santos, Luís debatem com uma evidente contradição. Por um lado, é crescente o número de
Sebastian, José Sendas, Francisco Silva, Élvio Duarte M. Sousa, Joana
autores que procuram a revista como meio de divulgação dos seus trabalhos,
Valdez, Ana M. Vale e Gonçalo Leite Velho
Publicidade Elisabete Gonçalves
quer na edição impressa quer na complementar Al-Madan Online - Adenda
Apoio administrativo Palmira Lourenço
Electrónica (http://www.almadan.publ.pt). Por outro, avolumam-se os
Resumos Jorge Raposo (português), Luisa Pinho (inglês) constrangimentos orçamentais decorrentes da subida dos custos de produção
e Maria Isabel dos Santos (francês) e da diminuição das receitas − reduzem-se as vendas, não porque a revista perca
Modelo gráfico Vera Almeida e Jorge Raposo interesse junto dos potenciais leitores, mas porque crescem as dificuldades de
Paginação electrónica Jorge Raposo distribuição, reduzem-se os postos de venda e aumenta o número dos que não
Tratamento de imagem e ilustração Jorge Raposo pagam a tempo os materiais facturados; diminuem as receitas de publicidade
Revisão M.ª Graziela Duarte, Fernanda Lourenço e Sónia Tchissole porque a crise afecta as instituições potencialmente interessadas; por fim,
Impressão A Triunfadora, Artes Gráficas Ld.ª com honrosa excepção dos municípios de Almada e do Seixal, diminuem
Distribuição CAA | http://www.almadan.publ.pt também os apoios institucionais que vêm contribuindo para o equilíbrio
Tiragem da edição em papel 1000 exemplares
sustentado do projecto.
Periodicidade Anual
Enfim... veremos o que o futuro nos reserva.
Apoios Câmara Municipal de Almada e Câmara Municipal do Seixal

Jorge Raposo
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adenda CENTRO DE ARQUEOLOGIA DE ALMADA
electrónica II al-madan online adenda electrónica ISSN 0871-066X | IIª Série (16) | Dezembro 2008
LIVROS
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l
A Herança Romana
em Portugal
com razão – ser esta “uma síntese tex-
um livro de Carlos Fabião tualmente eloquente e documental-
mente expressiva”, cabalmente integra-
da no espírito da colecção: “Promover
José d’Encarnação e divulgar os valores, a cultura, o patri-
mónio que são nossos, sensibilizando a
[versão condensada na Al-Madan 16: 149] comunidade para a sua salvaguarda e
valorização e estimulando o orgulho na
sua história”.

E
FABIÃO, Carlos (2006) – A Herança Romana em Portugal. Lisboa:
mbora apresentada a E estamos gratos pe- Clube do Coleccionador dos Correios. ISBN: 972-9127-99-9. Ressaltaria duas palavras: assimi-
22-06-2006, no Museu la divulgação! Vários mi- lação e orgulho – pela sua grande actua-
Nacional de Arqueolo- lhares, porventura mi- lidade.
gia, não virá a despropósito tecermos lhões de selos – pelo País e, sobretudo, apresentar um discurso corrido, con- A primeira, assimilação, do pon-
ainda algumas considerações acerca pelo estrangeiro! creto, lógico na sua coerência ideológ- to de vista cultural: Não “romaniza-
desta publicação levada a efeito pelos O autor, Carlos Fabião, professor ica. A ilustração é… ilustração! Por ção”. Recebemos e demos. Divindades
CTT, através da sua Direcção de Re- associado da Faculdade de Letras de conseguinte, este livro – embora de ca- indígenas. Desde há mais de 30 anos
lações Internacionais e de Filatelia. Lisboa, tem amiúde feito parceria com rácter científico, histórico – é também que chamo a atenção para este facto, um
Insere-se o volume numa tradição, Amílcar Guerra, nos domínios arqueo- um livro de beleza! dos mais sintomáticos da mente huma-
mui louvável, a que a empresa meteu lógico e da escrita, desde os tempos E ainda antes de nos debruçar- na – a sua relação com o divino. E que
ombros e tem dado continuidade. das escavações em Lomba do Canho 1. mos sobre como está dividido, diria vemos? Latinização dos teónimos. De-
Recordamos, por exemplo, o volume É conhecido o seu interesse pelo estu- que me ressaltou de imediato um facto: votos romanos a divindades indígenas;
Arquitectura Popular Portuguesa, do das ânforas romanas como fonte o papel do mar reencontrado! E esta devotos indígenas a divindades roma-
de 1989, texto do Arqº José Pedro para a história económica e, mais recen- observação vem, inclusive, na sequên- nas. Em plena convivência pacífica,
Martins Barata (que também traduziu temente, o empenho em levar a cabo cia de uma reunião que houve em Co- um exemplo notável para os dias de ho-
para inglês, é edição bilingue), com uma boa história da Arqueologia em imbra 4, onde – mesmo para a época je e que nunca é de mais salientar, pela
fotos – magníficas! – de Jorge Barros, Portugal 2, não descurando o projecto que nos prende, a romana – se verificou sua exemplaridade. Aliás, Carlos Fabião
a acompanhar a linda série filatélica de investigação, conservação e valo- que, afinal, o mar sempre ocupara papel di-lo expressamente (p. 12): “Uma uni-
de casas portuguesas, desenho de José rização do sítio arqueológico de Mesas relevante na História de Portugal: Bal- dade política e administrativa que con-
Luís Tinoco. Numa altura em que foi do Castelinho, Almodôvar, em que está sa, Ossonoba, Portus Hannibalis, Sa- servou no seu interior uma apreciável
necessário chamar a atenção para o envolvido desde 1988. Integra, por ou- lacia, Olisipo e a recém-descoberta diversidade cultural com variáveis
que era nosso, o invulgar tipicismo e ex- tro lado, a equipa que deu novo alento Eburobrittium, cujo importante papel graus de integração e autonomia, ge-
celente adaptação ao meio das nossas à pesquisa sobre o santuário a Endové- cada vez mais será devidamente realça- rando esse peculiar sentimento de co-
casas tradicionais, do Minho ao Algar- lico, em S. Miguel da Mota 3. do 5, assim como o de Peniche. munidade (que, de algum modo, a Uni-
ve. Lembramos Traineiras, de 1994, do Torna-se difícil conceber uma De facto, no início da nossa na- ão Europeia voltou a agrupar) sem
saudoso Octávio Lixa Filgueiras, nos- obra deste tipo: de que vou falar? Que cionalidade, viveu-se muito da(s) ter- todavia esbater as singularidades re-
so infatigável companheiro nestas lutas selecciono em função do público e… do ra(s); mas logo D. Dinis chamou o Al- gionais”.
pela defesa do Património, sobretudo editor? Sobretudo quando se sabe tan- mirante Pessanha; diz-se que, em tem-
naval – cuja memória saúdo e sentida- to e há tanto sobre que se escrever?!... pos de D. Afonso IV, já nossos barcos
mente evoco. Também bilingue. Fotos Convenha-se, desde logo, que es- aportaram às Canárias; por mar fomos,
1 Cf. FABIÃO, Carlos (1993) – “Lomba do
(magníficas igualmente!) de João Me- tamos perante um volume de prestí- no reinado de D. João I ao Norte de
néres. A série filatélica teve desenhos gio: uma obra de arte gráfica, com ex- África. E, depois, sempre o mar! E Canho (Arganil)”. In MEDINA, João (ed.).
(numa estilização linda!) de Armando celente design, ilustrações bem escolhi- talvez nunca nos tenhamos interrogado História de Portugal. Amadora. Vol. II,
pp. 190-192.
Alves. das (o melhor que há). Portanto, um li- o suficiente sobre o antes e o antes é mar
2 Vejam-se FABIÃO, Carlos (1998) – “Viriato:
Edições sempre a acompanhar vro bonito! também: di-lo-ão, sem dúvida, o hori-
séries filatélicas particularmente sig- E, nesse aspecto, atente-se no por- zonte da “cultura” dita “campaniforme”, em torno da iconografia de um mito”. In Actas
dos IV Cursos Internacionais de Verão de Cascais.
nificativas – como, aliás, o são todas, e menor de serem longas as legendas das os Fenícios, os constantes contactos
Cascais, pp. 33-79; GUERRA, Amílcar e FABIÃO,
Portugal é, reconhecidamente, a nível ilustrações. Procuraríamos evitá-las com o Norte de África, ora cada vez Carlos (1992) – “Viriato: genealogia de um
internacional, um dos países que produz num livro normal, mas elas têm aqui mais realçados – e com inteira razão! mito”. Penélope. 8: 9-23.
as mais bonitas e eloquentes séries fi- pleno significado: é que, num livro Daí, neste livro, a capa com a so- 3 Cf. GUERRA, Amílcar; SCHATTNER, Tomás;
latélicas do Mundo. Uma tradição a com estas características, muitos serão berba representação do deus Oceano do FABIÃO, Carlos e ALMEIDA, R. (2003) –
manter, de que muito nos orgulhamos tentados a, pelo menos numa primeira mosaico de Faro e, no interior, a abun- “Novas Investigações no Santuário de
(na permuta que fazemos de selos com assentada, apenas verem as imagens!... dância dos vestígios marinhos: repre- Endovélico (S. Miguel da Mota, Alandroal):
colegas nossos estrangeiros) e por isso E, embora se saiba que uma imagem va- sentação de peixes, lulas…No rosto, as a campanha de 2002”. Revista Portuguesa de
nos cumpre louvar a Direcção de Fila- le mais que mil palavras, nada de fiar quatro estações do ano, como que para Arqueologia. 6 (2): 415-479.
telia dos CTT. e… vamos às palavras também! Até dizer que é um livro para todo o ano! 4 Cf. as respectivas actas: OLIVEIRA, Francisco
Por conseguinte, é para nós, ar- porque, numa obra destas, o “casamen- Escreve Luís Filipe Nazaré, presi- de; THIERCY, Pascal e VILAÇA, Raquel, coords.
queólogos, subida honra que também os to” entre o designer e o autor nem sem- dente do Conselho de Administração (2006) – Mar Greco-Latino. Coimbra:
vestígios romanos hajam sido consi- pre se consegue inteiramente “feliz” dos CTT, na apresentação, que se trata, Imprensa da Universidade de Coimbra.
derados tema susceptível de interessar (passe o adjectivo) e o designer gosta aqui, por opção, do “legado material 5 MOREIRA, José Beleza (2002) – A Cidade
o público. das coisas bonitas e o autor tem de palpável e visível”, acrescentando – e Romana de Eburobrittium - Óbidos. Porto.
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E é curioso que o assinale, a títu- – E aí vem o Oceano, curiosa- em que o designer se sobrepôs e pre- contexto, por assumir relevante papel de
lo de exemplo, em relação a algo a que mente para se falar de comunicações e feriu apresentar uma porção bonita do “alegoria”, pois pertenceria a uma des-
hoje somos particularmente sensíveis, de transportes. E, claro, de recursos monumento que poderia ganhar em aí sas estátuas monumentais, a figurarem,
como os desfiles de moda a que quase marinhos. figurar completo. Mas o que, na reali- imponentes, no fórum, a mostrar que,
diariamente assistimos através das re- – Finalmente, a religião – a ro- dade, aqui interessa realçar é o comen- “afinal, o poder não era assim uma rea-
portagens televisivas. E o último anún- mana e a passagem do politeísmo para tário patente na legenda e que traz logo, lidade abstracta e distante, mas antes
cio que vemos antes de entrar no avião o monoteísmo. em síntese, uma série de informações: um vulto tutelar”. “Resíduo”, sim, mas
é mui provavelmente o primeiro que ve- Tem o autor perfeito conhecimen- 1 – “A homenagem a um impera- “suficientemente expressivo e inteligí-
mos no aeroporto de destino ao descer: to das últimas descobertas e das pro- dor ou ao seu filho e sucessor, como é vel” é também a pata de cavalo de está-
“A transformação da indumentária blemáticas que perpassam pela inves- o caso, constituía uma prática habitu- tua equestre de Bracara Augusta, de
assume”, frisa C. Fabião, “um elevado tigação do mundo romano. al”. bronze dourado, de um imperador se-
valor simbólico”; “na plástica, o cor- Veja-se a dedicatória ao deus Mar- 2 – Trata-se de uma dedicatória guramente.
po revestido da toga constituía o emble- te 6, proveniente de uma villa romana, “oficial e institucional”, porque nela se O comentário feito a propósito
ma da condição de cidadão romano, a de Torre de Palma (Monforte) (p. 16). regista que foi feita “por decreto dos de- da muralha tardia de Conimbriga é
independentemente do local onde se Sim, é o deus da guerra, pelo menos está curiões” e com intervenção dos duún- igualmente de realçar, nomeadamente
encontrava” (p. 13). vestido como tal, mas… não estará, de viros. quando C. Fabião afirma ser tendência
A segunda palavra: orgulho. Situa- preferência associado à agricultura e – 3 – Pax Iulia foi instalada “no lo- actual da historiografia não ver nessas
-se no domínio político. Reproduz o eu- porque não? – se se tratar de um “acto cal onde existia já um povoado indíge- construções o “largar os anéis para sal-
ro português as “insígnias” de D. Afon- individual de devoção, sem qualquer na” (informação que não era admitida var os dedos”, ou seja, não um símbo-
so Henriques, para mostrar aos demais relação com os citados atributos”? até há muito pouco tempo). lo de dificuldade e de pressa, mas sim
da Europa que, antes de eles serem O templo romano de Évora. Havia 4 – “A denominação da cidade algo que se pensara, dentro dos parâ-
Nação, nós já o éramos e até cunháva- um espelho de água a rodeá-lo. Não é, enquadra-se no plano ideológico de metros de um urbanismo que, afinal, se
mos moeda própria! Os selos consti- claro, dedicado a Diana, mas não po- exaltação da pax, quer nas províncias, renova, atendendo aos novos circuns-
tuem, na verdade, outro veículo impor- derá deixar de ter servido para “cultos quer na própria sociedade romana, tancialismos e perspectivas: “Pelo in-
tante de propaganda, mesmo que não institucionais, talvez mesmo o culto do promovida por Octaviano, antes de re- vestimento que implica, tanto em termos
façamos colecção; mas temos sempre imperador divinizado”. ceber a consagração como Augusto”. humanos como financeiros constitui
amigos que fazem. Abra-se um pequeno parêntesis Difícil dizer mais em tão poucas uma prova evidente da vitalidade das
Mas… ainda que não queira – de para assinalar como – quando neces- palavras! E sintetizar, assim, os dados comunidades urbanas e da sua relevân-
jeito nenhum! – tirar ao leitor a supre- sário – Carlos Fabião é cauteloso nas mais relevantes da investigação em cia”. Uma ideia original a fixar, a de-
ma delícia de se maravilhar, permita-se- suas afirmações. Aqui, acrescenta um curso. senvolver e a testar com outros exem-
-me que dê uma olhadela, aqui e além, “talvez”, quando – de um modo geral Idêntico comentário poderíamos plos.
ao volume que ora nos é facultado. A – todos concordamos em que se trata de fazer em relação à imagem da p. 47, a E que dizer duma observação co-
ilustrar uma ou outra ideia. um templo ao culto imperial, datável, bem conhecida epígrafe sobre o ora- mo esta, a propósito das novas vias que
Cada capítulo, um animal mari- inclusive, do reinado de Augusto, dados rium oferecido à civitas Igaeditano- os Romanos traçaram: “Foram segura-
nho, real ou imaginário, retirado de os paralelos existentes, do ponto de rum 7. Temos, aqui, algumas divergên- mente estes novos circuitos que tor-
mosaicos. Portanto, o mar. E… os deu- vista arquitectónico, em Mérida (capi- cias de interpretação, que não vêm ao naram obsoletos velhos caminhos pré-
ses – patentes nos títulos dos capítulos: tal da Lusitânia) e mesmo em Tarrago- caso, agora 8, mas o importante é su- -romanos, condenando irremediavel-
– Sob o signo de Marte – a con- na, capital da outra importante provín- blinhar quanto significa a oferta e a re- mente os núcleos indígenas com eles
quista. cia, a Citerior. O mesmo sucede em cepção oficial de um relógio solar – co- associados” (p. 80)? Plena de actuali-
– Tem um ar um tudo-nada des- relação a Miróbriga, nome por que se mo que para pautar a vida da comu- dade, numa época de auto-estradas e de
confiado o peixe que ilustra a pax ro- conheceu a cidade romana sita ao lado nidade ao ritmo do todo que era o Im- estações de serviço…
mana – será mesmo uma “nova era”? – de Santiago de Cacém. Eu já pusera pério 9.
parece perguntar… alguma dúvida em 1984 quanto à de- Aliás, nesse sentido apontam tam-
– Depois, Ceres, o mundo rural, signação; Carlos Fabião sublinha, por bém – e Carlos Fabião sublinha-o – as
que não podemos esquecer as nossas mais do que uma vez, com a expressão estátuas de grandes proporções dos
raízes agrícolas. É a terra-mãe, o ventre “se presume ser”. Na verdade, não há imperadores, a funcionarem como big
6 Cf. ENCARNAÇÃO, José d’ (1984) –
donde, afinal, tudo se gera! prova cabal de que a cidade se tenha cha- brothers vigilantes por todo o vasto
Inscrições Romanas do Conventus Pacensis
– Vulcano e a sua forja, de rosto mado assim, por mais que D. Fernando Império, como eram iguais as escolas
(= IRCP). Coimbra, inscrição n.º 568.
suado. Mãos calejadas, o sacrifício, uf! de Almeida, nosso saudoso mestre, o primárias no tempo do Antigo Regime, 7 Cf. SÁ, Ana Marques de (2007) – Civitas
Que calor! São os recursos mineiros e haja proclamado. E também dirá: “o com o crucifixo e as fotografias; como
Igaeditanorum: os Deuses e os Homens.
geológicos. presumível aqueduto de abastecimen- o euro pretende (ainda que não consiga
Município de Idanha-a-Nova, p. 61;
to da cidade de Felicitas Iulia Olisi- – por via do reverso) uniformizar euro- MANTAS, Vasco Gil (1988) – “Orarium donauit
po”… (p. 68), apesar de Francisco da peus... Igaeditanis: epigrafia e funções urbanas numa
Holanda. E se, por outro lado, se gera entre capital regional lusitana”. In Actas del I
Estamos, pois, perante uma obra nós, ao falarmos dos Romanos e do Congreso de Historia Antigua Peninsular
densa – daí, repito, a importância das que deles hoje ainda subsiste em ter- (Santiago de Compostela. 1986).
legendas grandes, a cuja leitura se não ritório nacional, uma “estranha fami- Santiago de Compostela. Vol. II, pp. 415-439;
resiste. Permitam-se-me, a concluir, liaridade” – como escreve o Autor –, AE 1992 951.
dois ou três comentários mais, de ape- não é menos verdade que, por vezes, tal 8 Cf. ENCARNAÇÃO, José d’ (1991) –
ritivo. familiaridade nos pode impedir de in Conimbriga. 30: 180-181.
Na p. 38: a placa com a inscrição realçar a importância do que, à primeira 9 ÉTIENNE, R. (1992) – “L’Horloge de la Civitas
dedicada ao imperador Lúcio Vero, no vista, poderiam ser simples porme- Igaeditanorum et la Création de la Province de
período que medeia entre os anos 139 nores. O fragmento de “pé de estátua Lusitanie”. Revue des Études Anciennes.
e 161 (IRCP 291). Cá está um dos casos thoracata” de Conimbriga acaba, neste 94 (3-4): 355-362.
al-madan
online XIX
adenda CENTRO DE ARQUEOLOGIA DE ALMADA
electrónica 2 al-madan online adenda electrónica ISSN 0871-066X | IIª Série (16) | Dezembro 2008
Balsa
uma cidade perdida? até à época visigótica. Trata o Cap. VII
das gentes que as inscrições documen-
José d’Encarnação tam em Balsa: os “55 Balsenses” lhes
chama Luís Fraga da Silva, deveras
sugestivo estudo da onomástica patente
[versão condensada na Al-Madan 16: 150] nas epígrafes.
Como atrás se disse, é segura-
mente o Cap. VIII, sobre o urbanismo,
aquele que maiores inovações apre-
senta, pois aí se propõe uma visão pa-

M
ais ou menos sob esse Fraga da Silva, vamos norâmica da cidade, se formulam hipó-
título deu à estampa o por aí, na emoção da des- teses sobre as quatro fases da sua evo-
Dr. Luís Fraga da Sil- coberta. lução urbanística, e se estabelece com-
va, entusiasta pelas descobertas arqueo- Depois das palavras SILVA, Luís Fraga da (2007) – Balsa, Cidade Perdida: a capital do paração entre Balsa e outras cidades
Algarve Oriental na Época Romana. Tavira: Campo Arqueológico
lógicas romanas nos arredores de Tavira de ocasião do Presidente romanas do mundo hispânico. Comple-
de Tavira / C. Municipal de Tavira. ISBN: 978-972-97648-9-9.
e seu grande dinamizador, uma obra de da edilidade, a apresen- ta-se este capítulo com o IX (pp. 108-
consulta obrigatória, precisamente pe- tação da Presidente da -124), a que o Autor modestamente
las inúmeras e actualizadas informa- Direcção do Campo Ar- chama de “apêndice”: aborda aí “um te-
ções que carreia para o estudo de uma queológico, Dra. Maria Garcia Pereira Não hesita em considerar que a sua ma quase desconhecido”, mas “de ine-
cidade – como é a de Balsa – plena de Maia, que sublinha ser este “um livro de é uma “visão inovadora sobre a histó- gável interesse”, pois elucida “aspec-
mistério para o homem comum 1. divulgação, destinado ao grande públi- ria territorial e o urbanismo balsenses”, tos técnicos pertinentes do urbanismo
Rezam epígrafes que teve circo, co e que pretende, acima de tudo, não baseado este último aspecto no “traba- balsense” e aí se aduzem as justifica-
para corrida de cavalos 2; explicita-se deixar cair no esquecimento esta jazi- lho original do autor sobre a morfolo- ções para as reconstituições e as inter-
noutra (IRCP 78) que, na euforia de ter da arqueológica que teve pouca sorte”, gia urbana e o território da cidade”. pretações propostas, consubstanciadas
sido eleito para as enobrecedoras fun- pois não foi – estamos de acordo – Cada capítulo, para melhor com- em plantas elucidativas. O Cap. X (pp.
ções de sêxviro, interlocutor privile- uma “cidade romana pequenina e mi- preensão do que nele se inclui, é pre- 124-137), esse sim, é, deveras, um
giado entre os deuses e o imperador que mada”. Maria Maia sublinha a “sólida cedido de resumo. Assim, o I trata da apêndice, de grande utilidade para os
venerava, o liberto Ânio Primitivo gas- base de documentação, muita leitura e história da cidade (origem do topónimo, menos familiarizados com as cidades
tou dinheiro a rodos para, numa home- muito estudo” que subjaz ao livro, ain- origens do aglomerado urbano, desen- romanas, dado que fornece breve mas
nagem à deusa Fortuna que sempre o da que reconheça “a sua aparente he- volvimento e apogeu, declínio e desa- esclarecedor panorama acerca do que
protegera nos negócios, organizar com- terodoxia” e a “a ousadia de algumas parecimento, redescoberta e 2ª destrui- elas eram nos seus aspectos funda-
bates de gladiadores e uma batalha na- das teses” nele defendidas. ção), terminando (p. 37) com a pergun- mentais.
val (edito barcarum certamine et pugi- É o autor quem prefacia o volu- ta “Há um futuro para Balsa?”. À
lum) para gáudio da população; na cir- me, a agradecer as colaborações havi- questão não responde directamente,
cunstância, foi igualmente um mãos- das e a dar conta dos objectivos a atin- pois afirma: “Apesar da violência das
largas, obsequiando os cidadãos com gir: “Revelar o que estava escondido ou destruições, Balsa mantém o interesse 1 O livro foi editado, em Maio de 2007,
benesses: sportulis etiam civibus datis. já desapareceu da antiga cidade de de ser a única cidade romana do Algar- pelo Campo Arqueológico e pela Câmara
Há famílias que são manifesta- Balsa, descobrindo um pouco do espes- ve que não teve uma continuidade ur- Municipal de Tavira, com o apoio de
mente “burguesas”, com todo o con- so véu de mistério que a cobre, apesar bana” e que, por isso, “guarda ainda organismos locais.
teúdo hoje atribuído a esse adjectivo, do muito que ainda permanece desco- inúmeros vestígios da sua ocupação 2 Cf. ENCARNAÇÃO, José d’ (1984) – Inscrições
por deterem poder económico e políti- nhecido ou hipotético”. Refere Luís original”. Confessa, porém, “com tris- Romanas do Conventus Pacensis (= IRCP).
co de que se fazem gala: Mânlia Faus- Fraga da Silva as destruições que “tra- teza”, que este “raro tesouro patrimo- Coimbra, inscrições n.ºs 76 e 77.
tina, por exemplo, com autorização dos balhos agrícolas e urbanizações” aí nial” se encontra “em risco iminente de 3 Cf. Encarnação, José d’ (2003) – “Quão
decuriões, manda erguer um cipo para levaram a efeito, de tal modo que quase uma liquidação definitiva”. importantes eram as gentes!…”. In Tavira.
colocar no fórum, dedicado ao irmão se pode dizer que o tema aqui tratado é Apresenta o Cap. II uma sugesti- Território e Poder. Lisboa: Museu Nacional de
falecido, Tito Mânlio Faustino de seu mais uma “questão imobiliária”, pois, va tabela cronológica para melhor en- Arqueologia, pp. 95-104.
nome, “modelo de piedade, duúnviro “embora se encontre em zona arqueo- quadramento dos dados. “Testemu- 4 Cf. as conclusões a que, através do estudo
por duas vezes” e, em sua honra, não lógica classificada e no Parque Natu- nhos” antigos sobre a cidade ocupam o das cerâmicas e dos vidros, chegou a Dra.
hesita em também oferecer um ban- ral da Ria Formosa, […] o que resta Cap. III. O IV (pp. 44-59) trata, em Jeannette U. Smit Nolen (Cerâmicas e Vidros
quete (IRCP 79) 3. está em perigo […] devido aos apetites síntese, dos dados arqueológicos: mo- de Torre de Ares – Balsa, Lisboa, 1994).
Outros dados – arqueológicos, nu- que a sua situação privilegiada des- numentos epigráficos, esculturas, a pla- 5 Diga-se, em abono da verdade, que tem
mismáticos, documentais – se pode- perta” 5. ca dionisíaca, objectos pessoais e fune- sido intensa a actividade desenvolvida pelo
riam aduzir para mostrar que, pelos A “advertência ao leitor” dá, de rários, moedas (indígenas e romanas), Campo Arqueológico de Tavira, liderado por
séculos afora, designadamente decerto certo modo, a opinião do Autor sobre o lucernas, estruturas balneárias, espaços Maria e Manuel Maia, numa tentativa de
refrear ímpetos urbanísticos em terrenos
no III e no IV 4, Balsa se arvorou em livro que escreve: “denso, rico em tex- e estruturas funerárias. No Cap. V (Eco-
onde já se sabe existirem ruínas, e
grandioso empório marítimo, a rivalizar to, ilustrações e mapas geográficos, nomia, pp. 50-69): conservas de peixe,
procurando levar a efeito sondagens e mesmo
com a vizinha Ossonoba. tendo-se dedicado um cuidado especial ânforas, garum, cerâmica importada… escavações arqueológicas onde se considere
Por consequência, mais do que ao seu aspecto visual”; dedicado “ao Sob o título Geografia (Cap. VI, pp. 70- fundamental. Dos resultados dessas pesquisas
diante de uma cidade romana “perdida”, público culto, requerendo conheci- -83), um assaz interessante enquadra- se têm feito eco em reuniões científicas.
eu creio que estamos perante uma ci- mentos básicos de história e cultura mento da cidade na estrutura territorial, Uma consulta à página www.arqueotavira.com
dade reencontrada e, guiados por Luís clássica e de geografia regional”. envolvente desde o período pré-romano também resultará deveras proveitosa.
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Chamei, em tempos, a Balsa uma Fruto de toda uma azáfama de es- põe, seduzidos pela beleza das ima- gazarra das corridas, saudamos o Sr. Tus-
cidade “intrigante e esplendorosa” 6, cavações, de miúda observação dos gens… ciliano que passa com séquito de servi-
dado que, como comecei por afirmar, se terrenos e dos vestígios, este é, deveras, E que bem sentimos, ao observar dores… 7 e votamos, alfim, em plena
os monumentos epigráficos nos falam um livro aliciante, na sua aparente sim- o rol das moedas com toda a sua deco- consciência de cidadãos: queremos, se-
de esplendor, os achados arqueológicos plicidade. Vejam-se, a título de exem- ração, como – também aí – nada era dei- nhores, esta cidade de volta! Depres-
– sucessivamente destruídos, como o plo, os desenhos das lucernas, pressu- xado ao acaso: a mensagem pretendia- sa!
Autor explicita – encaminham-nos pondo amplo e demorado trabalho de -se clara, os atuns (principal fonte de ri-
mais, fascinados pelo mistério, em laboratório. E as marcas dos oleiros? Va- queza), os barcos com seus rostra (a ex-
direcção a uma cidade-fantasma. Cadê mos ainda ter que estudá-las melhor, pa- plicarem que preparados estavam para
o circo, senhores? E o fórum? E o tem- ra identificarmos nomes e possíveis a luta a defender os seus interesses)… 6 Cf. ENCARNAÇÃO, José d’ (2000) – “Balsa
plo ao culto imperial? E o teatro?… proveniências dos fabricos: seria ali- Pela mão de Luís Fraga da Silva, Intrigante e Esplendorosa”. Stilus. Revista de
Termas diz Fraga da Silva que tam- ciante, por exemplo, ver em OLYNT a quase nos apaixonamos tanto como ele Cultura Regional. Faro. 2: 105-110.
bém teria; eu acho que até nem seriam abreviatura de um OLYNTHIVS, al- por esta cidade que, ao longo de sécu- 7 Uma solene inscrição (IRCP 80) foi dedicada
precisas, que os braços do mar poderi- guém que veio de Olinto, cidade gre- los, a incúria e a “vã cobiça” dos ho- a Tito Rutílio Tusciliano, identificando-o
am deter essa função – águas tépidas, ga… Apetece-nos ir nessa descoberta, mens foram deixando perder. como filho de Quinto Rutílio Rusticino e neto
límpidas, bonançosas… a identificar estruturas, a reconstituí-las Com ele percorremos vielas, admi- de Tito Mânlio Marcial, por um grupo dos
Oscilou muito a costa por aí. Se com os parcos elementos de que se dis- ramos o porto, sentimos o circo e a al- seus libertos fiéis…
calhar, em vez de apenas uma cidade de
pedra, teríamos também uma de ma-
deira: armazéns para o comércio, bar- Apoiado num im-
racas para os pescadores…
Imaginamos, de resto, duas popu-
A Torre de portante acervo docu-
mental de fontes manus-
lações:
– A do mar: “Vamos mariscar ho-
S. Sebastião critas e impressas, car-
tográficas e iconográfi-
je, aproveitamos a maré e de volta pes- CID, Pedro de cas, o livro apresenta ain-
camos uns besuguinhos ou apanhamos Aboim Inglez e a Arquitectura militar da um levantamento fo-
umas lamejinhas pró almoço!”… (2007) – A Torre tográfico das estruturas
– A das administrações, que vive- de S. Sebastião edificadas, um inventário
de Caparica, e a Arquitectura Militar do Tempo de Francisco Silva
ria mais para o interior, fiscalizadora, das marcas de canteiro
fria, senhora do seu nariz… D. João II. Lisboa: Edições Colibri. 414 p. il. (gliptográfico) identifi-
Quando dei a conhecer a Luís cadas nas estruturas, e

A
Fraga da Silva esta opinião – inspirada, Torre de S. Sebastião de enquanto precursora de sistemas de ainda plantas, alçados e reconstituições
por exemplo, numa Mira, em que tí- Caparica, também co- fortificação costeira adaptados ao tiro de realizadas no âmbito da investigação.
nhamos a Praia com suas construções nhecida como “Torre artilharia. Enquanto abordagem científica
de carácter quase efémero e o centro Velha” localiza-se na arriba sobre a Nesta obra, o autor relaciona o de um tema de evidente interesse his-
administrativo se situa já fora das dunas, margem esquerda do estuário do Tejo, pioneirismo da construção com a acção tórico e patrimonial, esta edição reves-
da Barrinha, dos terrenos alagadiços… em frente à Torre de Belém. A tese de governativa do Rei D. João II, e salien- te-se de grande importância para o co-
–, a sua reacção foi, para mim, inespe- mestrado da autoria de Pedro de Aboim ta a importância da construção da Torre nhecimento de uma fortaleza que tem
rada: “Equiparar Balsa a um cabanal Inglez Cid, agora publicada, faz o en- no plano de defesa da cidade e do por- permanecido ao abandono e em ruína,
de pescadores, mais ou menos boçais quadramento histórico desta fortaleza to de Lisboa, na sequência do qual foi apesar da proximidade e da relação
que tomavam banho nos charcos da ria, no contexto da arquitectura militar qua- posteriormente erigida a Torre de Be- directa com a sua congénere da mar-
parece-me uma estrondosa falsidade” trocentista, revelando a sua importância lém. gem oposta.
(e-mail de 29-10-2005).
Não quisera eu – jamais! – deslus-
trar uma cidade e – muito menos! – a
pesquisa aí levada a efeito durante tan-
tos anos e com tão bons resultados! É
Os Mosaicos Romanos LANCHA, J., coord. (2008) – A Rota do Mosaico
Romano. O Sul da Hispânia (Andaluzia e Algarve):
cidades e villae notáveis da Bética e Lusitânia
que, na verdade, cidades piscatórias
com as características de Balsa não ve-
no Sul da Hispânia romanas. Edição Equipa MOSUDHIS, 144 p. il.

jo desdém algum em que possam ter


dois aglomerados populacionais em Fernanda Lourenço Dos mosaicos da Baetica romana
pacífica convivência. Quem se passeia são apresentados os de Écija (Colónia
por Génova junto ao porto reconhece- Augusta Firma Astigi), de Niebla (Ilipla)
-se numa cidade bem diferente da urbe e de Tejada la Nueva (Ituci). Da Lusi-

C
das ruas sobranceiras pejadas de palá- om o apoio do Departa- integra investigadores das universi- tânia, os de Faro (Ossonoba), Milreu e
cios senhoriais… E tenho a certeza de mento de História, Ar- dades do Algarve e Huelva, do Museu Cerro da Vila.
que essa primeira reacção do Autor queologia e Património Histórico Municipal de Écija e da equi- Neste guia, as descrições e inter-
terá sido ultrapassada e não resisto, por da Universidade do Algarve, foi lança- pa luso-francesa dos mosaicos do Sul de pretações pormenorizadas dos mosaicos
tal motivo, a concluir essas breves linhas do em 2008 o livro A Rota do Mosaico Portugal, a obra reúne, em português e são acompanhadas por desenhos e fotos
com os parágrafos finais do que se Romano. O Sul da Hispânia (Andaluzia castelhano, informação dispersa sobre a cor. É completado com um glossário
chegou a pensar como prefácio para a e Algarve). o tema. de termos técnicos e nomes, índices de
obra com que Luís Fraga da Silva labo- Da autoria da equipa MOSUDHIS – A introdução refere-se ao contex- lugares e bibliografia.
riosamente nos brindou. Mosaicos Romanos do Sudoeste da to regional dos mosaicos e aos métodos Está disponível online em www.
Hispânia: Andaluzia e Algarve, que e fases da sua realização. cepha.ualg.pt/mosudhis/rota.pdf.
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A World History of the
Nineteenth-Century Archaeology
recensão crítica
Sérgio Gomes [Bolseiro FCT, sergioalexandregomes@gmail.com]

World History of the poleónicas e de Mamluk; porém, como Mais uma vez, a auto-

A Nine teenth-Century
Archaeology – National-
ism, Colonialism, and the Past é uma
nos alerta a presença de pirâmides no
horizonte, esta batalha não é apenas
uma arena de interesses políticos e eco-
ra permanece numa atitude
de síntese entre as distintas
escalas de análise presentes
DÍAZ-ANDREU, Margarita (2007) − A World History of the Nine-
teenth-Century Archaeology: Nationalism, Colonialism, and the Past.
obra acerca do modo como a Arqueo- nómicos, as pirâmides assistem a um no estudo: por um lado, ten- Oxford: Oxford University Press, 486 pp. ISBN 978-0-19-
logia, durante o século XIX, se instituiu confronto de esquemas de significação ta conciliar as periodiza- -921717-5.
disciplina científica e contribuiu para a de onde saiu vencedor o Ocidental e, ções que lhe são sugeridas
consolidação de um discurso hegemó- com ele, um regime de indexibilidade pelos enfoques internalista
nico produzido pelo mundo ocidental. que definiria o lugar das pirâmides na e externalista; por outro lado, procura Com efeito, os impérios europeus
Neste sentido, Margarita Díaz-Andreu sua(s) história(s) e da Arqueologia que criar interfaces em que se torne explí- e otomano, no sentido de se apresen-
não se limita a um exercício historio- nele se pratica. cita a tensão entre o local e o global e os tarem como égides civilizacionais, con-
gráfico de compilação de dados à escala Neste trabalho é salientado o mo- processos de inscrição daí decorrentes. tribuíram para o estudo das civiliza-
mundial, nem faz da sua análise um do como Nacionalismo, Colonialismo, O livro encontra-se dividido em ções egípcia, grega e romana, promo-
enfoque internalista dirigido ao desen- Imperialismo e Arqueologia se entre- quatro partes, sendo que os temas, as vendo uma visão do Passado baseada
volvimento de teorias, métodos e mo- cruzam a várias escalas, sendo desta- cronologias e as regiões que são anali- numa sucessão de etapas relacionadas
delos explicativos; pelo contrário, o cado o modo como as circunstâncias sadas em cada uma delas correspon- com o progresso dos seus princípios
que nos é proposto é uma problemati- conjunturais em que os agentes se in- dem a uma tentativa de articular contex- morais e desenvolvimento tecnológico
zação acerca da relação entre a Arque- serem potenciaram o constante refazer tos políticos e práticas arqueológicas. (capítulo 5). É também neste contexto
ologia e o contexto social e político dessas relações. Este é o grande desafio Na parte I, “The Early Archaeo- que se desenvolvem os estudos bíblicos,
em que se insere. da obra, dado que, tratando-se de uma logy of the Great Civilizations”, são alargando a influência a áreas como
Na leitura deste livro, o que so- História da Arqueologia a uma escala apresentados distintos cenários, onde é Iraque, o Irão e a Palestina (capítulo 6).
bressai, é a complexa rede de relações mundial, os arqueólogos e a Arqueo- discutido o modo como a ideologia li- Porém, os movimentos políticos destas
que caracteriza o processo de institu- logia não são apresentados de forma beral nacionalista se apropria da tradi- áreas acabariam por se apropriar des-
cionalização da actividade arqueológi- abstracta, mas enquanto agentes sociais ção do estudo das grandes civilizações ses estudos no sentido de criarem um
ca e a afirmação dos arqueólogos en- e prática científica inseridos em histó- (apresentado no capítulo 2) e a usa co- discurso nacionalista de reivindicação
quanto agentes autorizados para a pro- rias locais, perspectivas teóricas, expec- mo modo de legitimação de projectos à independência.
dução de um discurso sobre o Passado. tativas sociais e políticas 1. políticos distintos, seja o imperialismo No espaço extra-europeu, a auto-
Assim, o livro acaba por ser uma pers- Este exercício de escalas singula- francês revolucionário (capítulo 3) ou a ra apresenta o caso da América Latina,
pectiva acerca do contexto de produção riza a obra no contexto da literatura independência da Grécia e dos países da do Japão e da China (capítulo 7), enfa-
de conhecimento, realçando o cruza- historiográfica e epistemológica acerca América Latina (capítulo 4). No caso tizando o modo como a apropriação do
mento de agendas científicas, políti- da emergência e consolidação da práti- francês, o estudo e a apropriação das ci- discurso arqueológico foi usado como
cas, económicas e sociais na forma co- ca arqueológica. Com efeito, contra vi- vilizações grega, romana e egípcia per- elemento constituinte de um movi-
mo uma prática institucionaliza e reser- sões unidireccionais, Díaz-Andreu pro- mitem a criação de uma metanarrativa mento político contrário ao imperialis-
va para si o discurso sobre uma deter- põe uma leitura a diferentes escalas de acerca do progresso, da soberania polí- mo europeu. A Arqueologia dos impé-
minada realidade. análise e em diferentes pontos do globo, tica e da liberdade que a coloca no topo rios informais encerra em si um movi-
Simultaneamente, a escala mundi- demonstrando como a representação de um processo civilizacional, servin- mento ambivalente porque se, por um
al usada pela autora permite também a do Passado se insere numa rede de in- do o Passado como elemento de legiti- lado, faz parte de uma estratégia geo-
análise da forma como a Arqueologia se teresses onde os percursos de arqueólo- mação ao seu projecto de “salvação política que permitiu a consolidação
inscreve no processo de ocidentaliza- gos, teorias e instituições apresentam dos povos”. No caso grego e das nações pacífica dos poderes imperiais, por ou-
ção, isto é, o modo como a construção desenvolvimentos díspares, e por vezes latino-americanas, a ligação entre a
do Passado se torna uma tarefa neces- contraditórios, que fazem do processo antiguidade e actualidade não é feita
sária à produção de identidades locais, de institucionalização da Arqueologia pelo recurso à história de valores, como
1 A propósito da multiplicidade de “actores”
tornadas elementos de resistência aos uma narrativa complexa e diversifica- no caso francês, mas em nome de uma
projectos hegemónicos que animam o da. continuidade cultural que investe as e “palcos” que são abordados neste estudo,
é de referir a apresentação de um extenso
século XIX. Porém, se a análise das relações populações do direito à reivindicação da
índex de grande utilidade na sua consulta,
A imagem da capa, o óleo nove- entre estas quatro práticas remete para sua independência.
sendo de destacar a sua subdivisão em
centista A Batalha das Pirâmides, do a multiplicidade de contextos em que a Na parte II, “The Archaeology of entradas de carácter geral, outra de carácter
pintor francês Louis-François Lejeune, arqueologia se desenvolveu no século Informal Imperialism”, a Arqueologia institucional e uma terceira relativa a nomes
remete-nos para este processo de oci- XIX, a estrutura do livro espelha uma é apresentada como produtora de um de arqueólogos. São também apresentados
dentalização. No primeiro plano, visua- tentativa de superar o enfoque local discurso que legitimou a superioridade cinco mapas relativos à geografia política
liza-se o confronto entre as forças na- que decorreria deste aspecto. civilizacional Ocidental. do século XIX.
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tro lado, a sua apropriação nos distintos des primitivas” é posta ao serviço de um nâmicas sociais que promovem e a ordem social, onde se destaca a actua-
contextos políticos e sociais do globo discurso hegemónico que autoriza a crescente consolidação de uma cons- ção de classes burguesas que, desde o
contribuiu para a emergência de movi- política colonialista. Neste processo ciência colectiva de Passado, permitem século XVIII, com a Revolução Fran-
mentos de resistência. Assim, neste são criadas uma série de ligações entre que a Arqueologia se complexifique cesa, contribuem para o desmantela-
capítulo, a Arqueologia é apresentada elementos raciais, morais, tecnológi- enquanto discurso e prática científicas. mento da sociedade de ordens tradi-
tanto como produtora de discursos de cos, que distinguem e hierarquizam Se nos capítulos anteriores a aborda- cional, procurando estabelecer novas
legitimação que defendem a suprema- grupos humanos, num esquema evolu- gem privilegiada é de ordem política e vias de ascensão ou afirmação social.
cia da civilização europeia e como um cionista que reforça a superioridade ci- social, o capítulo 13 propõe a análise do Nesta nova dinâmica, o elemento
elemento de ocidentalização cuja aqui- vilizacional do mundo ocidental. modo como a Arqueologia se inscreve de mobilidade social por excelência é o
sição é simultânea da mundialização da A síntese da experiência colonial no contexto filosófico novecentista, mérito pessoal, alcançado pelo traba-
ideologia nacionalista. e imperialista, a constituição do(s) privilegiando os interfaces existentes lho ou instrução, substituindo a ligação
Esta mundialização de práticas e Outro(s) nas outras partes do mundo entre Arqueologia, Evolucionismo e ou relação com a família real como
ideologias é sintomática da consolida- tem uma série de repercussões no modo Positivismo. elemento constituinte da elite. Conse-
ção de um discurso sobre o Passado tipi- como o continente europeu representa São discutidos os meios pelos quentemente, a multiplicação dos
camente ocidental, uma narrativa linear o(s) seu(s) Outro(s). Este tema foi abor- quais a Arqueologia actualiza as teorias meios de ascensão social multiplica
sistematizada em períodos que permi- dado nos capítulo 5 e 10; porém, na evolucionistas, no quadro particularis- também o número de elites, isto é, de
tem uma melhor compreensão do pre- Parte IV, “National Archaeology in ta decorrente da agenda nacionalista grupos de indivíduos cujos interesses
sente e uma projecção do futuro; com Europe”, é retomado e inserido no mo- que anima os arqueólogos e responde ao em comum permitem a sua organiza-
esta representação do Passado, esta- do como os distintos países reciclam modelo de ciência proposto pelo Posi- ção, formal ou informal, no sentido de
belecem-se também os dispositivos esse conhecimento e o modo como a tivismo. É nesta dinâmica que a Ar- reservar para si uma determinada activi-
que regulam a sua produção e difusão, utilização da ideologia nacionalista por queologia se constitui um ramo do sa- dade, actuando também no sentido de
como é o caso da Universidade e do parte de projectos políticos conserva- ber com um objecto de estudo, mode- a promover num quadro de utilidade pú-
Museu. O Passado torna-se uma arena dores promove uma representação do los explicativos e métodos de pesquisa blica e, consequentemente, fonte de
onde são disputados elementos de legi- Passado cada vez menos centrado definidos. Esta circunscrição não é ape- mérito social.
timação dos distintos projectos políticos numa história universal e, progressi- nas uma consequência do contexto em É neste contexto de grande mobi-
e a Arqueologia uma ferramenta de es- vamente, constrói um Passado centrado que a prática da Arqueologia se insere lidade social que o processo de institu-
crutínio na construção e consolidação da num unidade política: o Estado-Nação. no século XIX, mas um elemento de cionalização da Arqueologia é pers-
imagens do Europeu e do(s) Outro(s). O capítulo 11 incide especifica- institucionalização da própria pesquisa pectivado, respondendo desta forma à
A parte III, “Colonial Archaeo- mente sobre este aspecto, analisando o arqueológica. Se a Arqueologia se pode tensão entre os enfoques internalista e
logy”, completa a extensa lista de con- período correspondente ao intervalo definir enquanto modo de conheci- externalista que caracteriza este estudo.
textos em que se processou alguns dos entre a Revolução Francesa e 1820. É mento, a sua prática requer o domínio Assim, a produção do conhecimento
aspectos referidos na parte II; porém, também destacado o modo como a ten- de técnicas e conhecimentos que nem arqueológico é apresentada na sua rede
trata de regiões onde se processou uma são entre Iluminismo e Romantismo en- todos os agentes possuem e, nesse sen- de relações sociais, políticas e económi-
política colonial efectiva, traduzida pela cerra uma tensão entre Universalismo tido, emerge o arqueólogo enquanto o cas, sendo a Arqueologia e os arqueó-
integração dessas regiões no território e Particularismo, cuja tradução em ter- agente técnico, ou o profissional, auto- logos apresentados como uma criação
nacional das potências e pela imposição mos de construção do Passado se re- rizado para este domínio. novecentista decorrente das sociabili-
de modelos culturais europeus. Assim, flecte na ideia da busca de uma essên- Nas considerações finais, capítu- dades que caracterizam este período.
o capítulo 8 incide sobre o caso do Sul cia que singulariza a Nação e anima a lo 14, é salientado o papel da importân- Porém, esta relação não é unidi-
e Sudeste asiático e o processo de oci- produção de histórias nacionais. Esta cia das ideologias nacionalistas e das reccional; os arqueólogos como pro-
dentalização destas regiões, destacando tensão é gerida de forma distinta pelos práticas colonialista e imperialista bem dutores de Passados, cuja relevância é
a forma como o mundo ocidental pen- países europeus, sendo que a sua reso- como o papel dos agentes na actualiza- significativa no âmbito da ideologia
sa o Passado e se consolida substituin- lução apresenta consequências acerca ção da ideia de Nação, colónia ou Im- nacionalista, contribuem para o refazer
do as inteligibilidades locais, bem como do modo como a prática arqueológica pério. A Arqueologia, neste contexto, dessas sociabilidades, na medida em
essa visão do Passado é apropriada por é inserida nas dinâmicas de complexi- participa activamente na construção que tanto podem contribuir para a con-
projectos nacionalistas regionais. ficação estatal. destes projectos e apresenta uma ima- solidação de um poder instituído ou
No capítulo 9, a comparação entre Neste processo de interacção entre gem rizomática quanto ao seu proces- fornecer elementos de reivindicação a
o Império Russo e o Império Francês no Estado e Ciência, a autora destaca a so de institucionalização. Esta multi- focos de contra-poder, animando deste
Norte de África, equaciona as relações produção das Identidades Nacionais plicidade de caminhos prende-se com modo a conjuntura em que se inserem
entre grupos religiosos, movimentos como campo privilegiado da interacção a natureza da construção do Passado e, consequentemente, instituindo-se co-
políticos e a prática da Arqueologia, entre política e conhecimento, sendo que, longe de ser um processo mecani- mo forma de conhecimento legitimo.
destacando o modo como o discurso so- que no capítulo 12, correspondente ao cista, é um assunto socialmente situado Veja-se, por exemplo, o caso da
bre o Passado é reapropriado por pode- período das Revoluções Liberais, é e decorrente da interacção dos interesses transformação do Nacionalismo e as
res religiosos no sentido de legitimar analisada a importância de conceitos dos distintos agentes envolvidos e, por suas consequências na valorização de
unidades políticas com base numa iden- como Nação, Raça e Língua no estudo eles, negociado e contestado. determinados narrativas históricas e,
tidade religiosa. O capítulo 10 apresen- do Passado europeu. Durante este pe- Desta forma, no estudo que Díaz- subsequente, a actualização por parte
ta um enfoque distinto dos anteriores; a ríodo assiste-se a um maior protagonis- -Andreu nos apresenta, sendo enfati- dos arqueólogos dessas transformações.
autora apresenta uma série de regiões mo de temas que permitissem a nuclea- zados os aspectos políticos na consti- Se, com a Revolução Francesa, o abso-
dos continentes americano, asiático e rização do espaço europeu, tais como a tuição da Arqueologia, é também sa- lutismo régio e, consequentemente, o
africano onde se desenvolve uma Ar- Pré-História e a Época Medieval, no lientado o processo de tecnocratização reino, já não servem de unidade políti-
queologia de contextos não-monumen- sentido da criação de elementos de dis- e burocratização da relação dos agentes ca às novas dinâmicas sociais, o Nacio-
tais, destacando a sua interacção com os curso que legitimassem os projectos (especialmente na IV Parte), ou das nalismo e a Nação surgem como alter-
estudos da Pré-História europeia. É de- nacionalistas em confronto. comunidades que constituem, com a nativas a serem usadas pelos grupos
monstrado o modo como a cartografia A multiplicidade de temas estu- ideia de Passado. Este processo situa-se sociais que lideram este processo. O
espaço-temporal da ideia de “socieda- dados, a sua importância política, as di- socialmente na construção de uma nova sangue, a linhagem real, já não serve
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electrónica 6 al-madan online adenda electrónica ISSN 0871-066X | IIª Série (16) | Dezembro 2008
enquanto elemento de coesão política e tro lado, os arqueólogos, enquanto pro- Este aspecto deve ser enfatizado minante, através de um jogo de violên-
social; à vassalagem sucede uma orga- tagonistas dessa produção, reservam quando se tem em consideração a falên- cia simbólica consegue homogeneizar
nização fundada juridicamente e geri- para si o prestígio da sua enunciação, cia dos modelos providencialistas asso- comportamentos e interesses que per-
da de forma legislativa em função de aliando-se estrategicamente a outros ciados às formas de governo monár- mitem a consolidação de um poder ins-
direitos e deveres. agentes sociais (políticos e comercian- quicas enquanto formas de sustentação tituído.
Esta juridificação das dinâmicas tes, por exemplo) no de sentido institu- das unidades políticas, dado que a nova Neste contexto, se por um lado, a
sociais, se inicialmente operacionaliza cionalizar a sua prática. Simultanea- ordem social investe o Passado nacional Arqueologia pode ser entendida como
os propósitos de um Nacionalismo de mente, a complexificação estatal, de- enquanto um dos elementos de unidade um modo de dominação, na medida
esquerda que visa a universalização da corrente da ideologia liberal e naciona- que explica a legitimidade de um deter- em que corresponde a uma prática for-
revolução, posteriormente, seria ade- lista, promove a criação de uma série de minado político. O Passado torna-se malizada e regulada pelo Estado, sendo
quada a um Nacionalismo de direita e serviços e responsabilidades que reno- elemento integrante da Identidade Na- os arqueólogos os mediadores, ou os
conservador, voltado para o interior da vam as modalidades de relação entre o cional, explicando e legitimando o pre- agentes legitimados, que definem os
Nação. No primeiro momento, o sangue Estado e o Passado; criam-se serviços sente e futuro da nação. moldes da relação com os vestígios
real é substituído pela síntese da História estatais e legislação que requerem téc- A consolidação desta representa- materiais do Passado; por sua vez, a
universal, baseada no progresso e sis- nicos progressivamente mais especia- ção do Passado faz deste um recurso importância e conceptualização destes
tematizada em civilizações, e do pro- lizados e que contribuem para a conso- valioso cuja dominação é necessária vestígios do Passado não correspon-
jecto de salvação dos povos enquanto lidação de novos profissionais. Estas so- de forma a regular as dinâmicas geradas dem a imposições vindas de fora, cria-
retórica de legitimação dos projectos licitações do mercado de trabalho aca- em seu redor. É o valor do Passado das por instituições do poder, enuncia-
políticos; com a ascensão dos projectos bariam por pressionar as instituições que confere mérito aos arqueólogos das por técnicos especializados e incul-
nacionalistas de direita, a História uni- académicas no sentido de recriarem os que o produzem ou aos cidadãos que o cadas nas massas; pelo contrário, são
versal, enquanto móbil de legitimação, seus currículos e regular a situação. conhecem, sendo nesta dinâmica que se elementos participantes de uma cons-
é substituída por um discurso particu- Assim, a emergência da Arqueo- consolidam os processos de burocrati- ciência colectiva e emergentes das dis-
larista, que visa a revelação da essência logia inscreve-se num processo mais zação e tecnocratização inerentes à ins- tintas experiências culturais, sociais e
da Nação e a sua inscrição na univer- amplo de “disciplinarização da relação titucionalização da disciplina. Se é no políticas e geradoras de novas sociabi-
salidade. entre agentes e o passado”, cabendo ao regime de significações criado pelos lidades.
Neste processo, a Arqueologia e os Estado-Nação, instituído ou em forma- nacionalismos conservadores que o No livro de Margarita Díaz-An-
seus actores, quase todos cristãos e pro- ção, o papel de mediar essa relação, sen- Passado nacional é instituído de valor e dreu, o conhecimento do Passado é
venientes de classes sociais favorecidas do que, aos arqueólogos compete uma utilidade pública, é na complexificação apresentado enquanto forma de saber e,
à procura de prestígio e sinais de legi- actividade de actualização científica burocrática e tecnocrática decorrente da enquanto tal, é também uma forma de
timidade do seu protagonismo, desen- dessa relação, isto é, cristalizando um consolidação do Estado-Nação que poder, daí que na sua análise é neces-
volvem um processo de interacção com Passado de utilidade aos distintos pro- emerge a figura do arqueólogo(a) en- sário perceber “primeiro a multiplici-
os restantes actores e projectos, tornan- jectos políticos em cena durante o sécu- quanto técnico(a) responsável e auto- dade de relações de força que são ima-
do a Arqueologia num discurso sobre lo XIX. rizado para o estudo dos vestígios mate- nentes ao domínio e são constitutivas da
o(s) Passado(s), passível de fazer parte É no fenómeno de disciplinariza- riais do Passado. sua organização; o jogo que, por via
de uma agenda social e política. É neste ção que se assiste a uma ruptura entre a Neste sentido, o processo de insti- das lutas e afrontamentos incessantes,
quadro de relação entre poder, conhe- tradicional actividade dos antiquários e tucionalização da Arqueologia reproduz as transforma, as reforça, as inverte; os
cimento e verdade, que Margarita Dìaz- uma nova forma de ordenamento e de de diferentes formas o processo de ins- apoios que essas relações de força en-
Andreu problematiza a institucionali- discurso acerca dos vestígios materiais titucionalização do Estado-Nação, sen- contram umas nas outras, de forma a
zação da Arqueologia enquanto disci- do Passado que potencia e afirma a Ar- do que se a nação emerge enquanto constituir uma cadeia ou sistema, ou, ao
plina produtora de um discurso auto- queologia enquanto ramo do saber. unidade usada na reivindicação à inde- contrário, os deslocamentos, as condi-
rizado. Neste sentido, é de salientar o papel dos pendência de uma determinada comu- ções que as isolam umas das outras;
A leitura do livro sugere, deste museus, das academias e das univer- nidade, ou grupo dentro dessa comu- por fim, as estratégias nas quais se
modo, uma íntima relação entre a ideo- sidades enquanto dispositivos de poder nidade, o Estado constitui a forma de re- efectivam e cujo desenho geral ou cris-
logia política liberal e nacionalista, as (estatal ou comunitário), como platafor- gular os elementos que compõem essa talização institucional toma corpo nos
estratégias de afirmação da burguesia do mas onde se encontram os interesses co- nova unidade. aparelhos de estado, na formulação
século XIX e a Arqueologia. muns de arqueólogos e políticos. Estes Nesta tensão entre emancipação e da lei, nas hegemonias sociais” (FOU-
Com efeito, se por um lado, a Ar- dispositivos funcionam enquanto ele- regulação, o Passado é um instrumen- CAULT, 1994 [1971], História da Sexua-
queologia fornece enunciados que per- mentos de regulação das comunidades, to de retórica que visa a mobilização de lidade – A Vontade de Saber, Lisboa:
mitem a construção de um quadro de oferecendo discursos, modelos de con- interesses porque se, enquanto forma de Relógio D’Água, pp. 95-96).
referências alternativo à sociedade de duta, quadros de referência que alteram contestação do direito à soberania, pro-
ordens e ao absolutismo régio, por ou- o modo como o Passado é representado. duz um discurso contrário ao poder do-

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