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Homero Fraga Bandeira de Melo

Tópicos do
Ensinamento

2007
M485t Melo, Homero Fraga Bandeira
Tópicos do Ensinamento / Homero Fraga Bandeira de Melo - Rio de
Janeiro, RJ : (editora), 2007.
?p.

ISBN

1. Filosofia Moral. Ética. Filosofia prática. II. Doutrina e pontos de vistas


éticos.

CDU 17.03
I
Qual é a solução?
Existe solução?
A solução, se existisse, seria possível?

Devemos observar que a solução não está na auto-aniquilação, e nem


na morte lenta dos entorpecentes oficiais.

Devemos buscar o equilíbrio e este é muito mais válido diante das


adversidades. A verdadeira virtude só tem valor quando é provada.
Virtude que é virtude tem que ser provada.

Muitas vezes o Ego nos apresenta falsas soluções. Soluções essas que
só complicam os nossos atuais problemas.

Na medida em que procurarmos o caminho do correto agir, do correto


sentir e do correto falar, agiremos com retidão, sentiremos com certeza
e falaremos com determinação. O caminho correto nos fará ver qual é a
melhor medicina para a nossa alma, e consequentemente para o nosso
corpo.

O Ego nos apresenta o falso como verdadeiro, o errado como certo, o


distante como próximo. Sob o efeito do Ego nos sentimos injustiçados,
magoados, machucados, manchados, culpados. O Ego nos torna ferozes.
Na ausência do Ego obtemos paz, em sua presença ficamos confusos.
Quem quer o que você aparentemente quer? São muitas as vozes, e
muitas as vontades que gritam em sua cabeça?

Qual é a solução?

Vamos contar uma estória: um mestre Zen e o seu discípulo caminhavam


juntos por uma estrada. De repente um homem vem em sentido contrário,
e golpeia violentamente o mestre arriando-o no chão, e foge!
O discípulo preocupado com o mestre não tem tempo de lutar com o
agressor. Ele vai e acolhe o mestre. Entretanto, o mestre se recobra
quase que imediatamente do ocorrido, e se levanta como se nada tivesse
acontecido, e continua a sua caminhada.

O discípulo fica atordoado. Ele não entende o ocorrido, e pergunta ao


mestre: mas, porquê? O senhor não vai fazer nada? Aquele indivíduo
quase o matou! Ao que o mestre responde: Isso é problema dele, não
meu, e continua a sua caminhada.

O homem na ausência do Ego, torna-se não-mente. Ele continua a pensar,


mas somente o necessário. Ninguém pode irritar ou fazer mal ao homem
não-mente, pois este eliminou o mal em si mesmo. Não mais há parede
para os golpes da vida reverberarem. A parede é o Ego, os golpes da
vida são parte da universidade psicológica da vida.

Existe solução? O que existe? Sabemos que o mundo é mente, que a


matéria é mente, e que a energia conforma-se de acordo com a
vontade da mente. Hoje, grandes cientistas afirmam que as aparências
não aparecem, mas, sim, que as aparências existem para quem as
quer ver, e se mostram ao ser humano como este as quer ver. Os
físicos afirmam que os fótons parecem ondas a quem quer ver a luz
como onda, e partículas a quem quer ver a luz como partículas
fotônicas. A luz propaga-se em linha reta em pequenas dimensões,
mas em grandes dimensões ela faz curvas. O que é a realidade? É
um conceito ao qual a mente se apega. Somente a não-mente fica
longe do conceito. Somente a não-mente pode estar mais próxima
do que é a realidade.

A solução, se existisse, seria possível? Nada do que existe é possível.


As possibilidades dos existentes são limitadas diante das possibilidades
dos que existem e são. Somente aquele que é, e existe tem muitas
possibilidades. Você pode ter pratos descartáveis ou pratos permanentes.
Os primeiros existem durante um certo tempo como pratos, mas depois
você os joga fora, pois não servem mais como pratos. Servirão de outra
forma, mas, não mais como pratos. Os permanentes não, pois você os
lava com detergente, enxuga e guarda para uma próxima ocasião. Para
você os pratos permanentes existem e são. Os descartáveis só existem,
não são. Para os pratos descartáveis você não vê muitas possibilidades,
para os permanentes, sim.
Assim são as possibilidades da solução. Podemos definir os nossos
problemas e torna-los existentes, para que a solução seja permanente,
como podemos torna-los permanentes para que existam indefinidamente.
Destas duas formas levamos uma existência artificial.

As possibilidades são infinitas. Mas, as possibilidades de resolução


prática dos problemas não são. Temos que objetivar o que queremos.
Não devemos buscar problemas para obter soluções, e nem soluções
que geram problemas (o que dá no mesmo). Sabemos que soluções não
existem, não são, e que essas possibilidades práticas são limitadas.

Quais são os nossos verdadeiros problemas? Quem são esses que falam
por nós? A que viemos? De onde viemos? Para onde vamos? Quem
somos? Por que somos? Para que somos? Somos em função de um
outro? Abdicamos de nossa existência real, em prol de um simples
existir? Quais são os atributos em nós que subexistem? O que subexiste?

Logo acima há uma lista de problemas reais com que se preocupar.


Diante desta lista, você crê que aja algo mais importante, ou estes
bastam? Quer outros? Quer mais? Outros igualmente reais? Estes
bastam? Há mais de trinta séculos tentamos responder ao básico, ao
irrespondível. Hoje, como antes, e como na antigüidade, sabemos que
os verdadeiros problemas não tem solução. Você pode melhorar a sua
forma de perguntar. Pode apresentar uma melhor pergunta, pode se
ilustrar tão completamente, que parecerá um tenebroso ignorante
ilustrado, como há tantos em nossos dias. As pessoas que dizem saber,
são as que menos sabem. Você não quer isso para você. Você quer
melhorar a sua pergunta. Você deseja a busca. Ama o que busca a
verdade, questione quem diz que a encontrou diante de um caso
paradigmático. Eleve o seu nível de criticismo, e como Górgias você
afirmará: a verdade não existe, alguém a inventou! O problema não é o
que inventaram de você, mas o que você vai fazer com o que inventaram
de você. O invento já está feito, e você deve querer sair dele agora.
Comece a negar a si mesmo, ao Ego, e afirmará desta forma o Ser que
há em você, o Deus de seu coração!

Existem problemas reais. Talvez você ainda não tenha percebido o


quanto de irreal há em seu suposto pensar. Leibniz, o filósofo das
essências incontáveis, revelou-nos: o pensamento é uma força, e você
pode ter a mente, o intelecto, mas não o pensamento. O verdadeiro
pensamento reside na não-mente. Somente quando tomamos o lugar do
cavalo no guiar da carruagem, e não o contrário, é que teremos a
claridade, e a suficiência, para dirigir a nós mesmos.

Que problema é esse que você tem? Se ele não tiver realidade, descarte
o mesmo. Ele não serve para você. Fará você perder tempo. Fará você
perder a sua existência. O seu tempo é valioso, não o perca com falsos
questionamentos. Faça o melhor possível do que fizeram de você.

O que é a liberdade? A justiça, o bem, o indivíduo, a cura, o mal? Por


que tudo o que sabemos nos leva curiosamente a admissão de nosso
não-saber? Pois o conhecimento, como sabidamente disse Kant, é
possível.

Existem soluções? Queremos algo permanente ou descartável?


Queremos algo que existe, ou algo que é, e existe? Ou será que queremos
ir além do bem e do mal, ir além da mente? No estado de não-mente
não há mais possibilidades, tudo simplesmente é (e não há problemas,
nem soluções).

Você deve escolher o caminho. Existem muitos deles. Existe o caminho


da explicação, o do conhecimento, o da certeza, o da dúvida, o da
pergunta, o do falso saber, o da mente.... E existe também o da não-
mente. Existe o do não-saber, não-conhecer, não-ser, não-existir, não-
agir... O homem que é não-mente é o sábio. E o sábio age mais pelo
não-conhecer, é mais pelo não-ser, existe mais completamente pelo não-
existir. O sábio tem tudo, pois não tem nada. Tudo o que o homem não-
mente precisa lhe é dado, e não há nada que o homem não-mente precise
que não lhe seja dado. O grande oráculo de Apolo em Delfos assim
dizia: conhecerás a ti mesmo, e ao universo e aos Deuses.

A senda do fio da navalha não é para os fracassados, para os tolos, para


os que não acreditam em si mesmos, para os que amam a tragédia. A
tragédia, como bem diz Nietzsche, é a substituição do melhor pelo pior,
do paganismo pelo cristianismo, da democracia pela inquisição. O que
é que tu pensas que seja a verdade? Te perguntam os inquisidores
cristãos, até os dias de hoje. Onde está a tua liberdade? Em que Deus
crês? Em um de sangue, dor, morte? Quantos não morreram diante do
signo da cruz? Quantos não morreram porque a sua verdade era diferente
da verdade oficial, daqueles que dizem ter a verdade. Na Roma de Jesus
de Nazaré, aquele homem fora de seu tempo (anacrônico), todos
acreditavam no que queriam. As religiões egípcias, gregas, persas, e
outras conviviam igualmente. Ninguém se atrevia a se dizer ter a
verdade, mas um falso sábio apareceu, e disse que a tinha, e em seu
nome povos inteiros foram dizimados. Basta lembrar que até hoje a
Igreja Ortodoxa Grega não quer ouvir, nem de longe, falar dos Católicos
Romanos que tem a verdade. Você tem a verdade? O cristianismo a
tem? Onde está a verdade? Como disse Jacques Lacan: esta senhora, a
verdade, mente!

Sabemos que muitos são os Deuses, e que o evangelho morreu na cruz.


A senda do fio da navalha é para os despertos, para os sinceros de
coração, para os crêem no Deus de seu coração, para os que amam as
possibilidades de experiênciar, de errar e acertar. A senda do fio da
navalha é para os inocentes, para os puros de coração.

Gostaria de convidar-lhes a reflexão com a seguinte história: de certa


feita, um homem saudável disse: eu não tenho doença alguma, nunca
terei e nunca tive. Era isso o que tinha para si, em sua mente.

Mas, esse homem era cientista, e foi desafiado por outro que lhe disse:
isso não é a realidade, a realidade é: que mesmo aparentando saúde, em
algum ponto você está doente, mas a sua mente lhe oculta isso. Ao que
o homem saudável replicou: isso tudo é teoria, e não serve para mim,
só para os outros.

O outro cientista, então, chamou três médicos amigos dele e do cientista


em comum, e lhes disse: peço que quando encontrem o doutor fulano
no dia tal, digam a ele que a aparência dele está péssima e que ele
parece doente.

E assim foi. Em um belo dia (o dia tal), o doutor fulano saiu pontualmente
de casa ás 07:00h da manhã, e encontrou o médico um que lhe disse o
combinado. Às 09:45h já dentro do laboratório encontra o médico dois
que lhe diz o mesmo. Ao meio-dia, o médico três lhe diz o mesmo
combinado. Às 14:00h o doutor fulano diz a seu colega de sala: Creio
que eu não esteja bem. Ao que o outro replica: o que você é? Você é o
que os outros querem que você seja, ou é aquilo que você é? Para ser
aquilo que você é, você tem que deixar de ser. Tem que deixar a mente.
Existem várias mentes dentro de você, e agora você tem mais uma: a da
doença, pois agora você acredita nela, e ela existe para você! Deram a
você uma nova mente, inventaram algo dentro de você, que não é real,
e nem tampouco a situação anterior era a real. O real é a não-mente, o
indiscernível, o inqualificável.

O que você deseja? Uma nova mente? Ou o novo, que é não-mente?

II
Talvez um dos princípios gnósticos mais enfatizados seja o da Revolução
da Consciência, o tornar-se àquilo que se é, em conformidade com o
pensamento de Nietzsche. Mas, como tornar-se a si mesmo, se no próprio
ato de tornar-se já se é outra pessoa? Sabemos que a realidade não é o
fundamento; mas, sim, a consistência. Devemos buscar a consistência
nas essências vazias (equitas tantum equitas – Averróis), na inconstância
do movimento que pode ser percebido quando concentramo-nos no aqui
e agora.
No Livro XI das Confissões, Santo Agostinho propõe a questão do
tempo. Pergunta o Santo Doutor: Mas, o que é o tempo? O passado já
passou e dele resta apenas a memória fugaz, que não é certa. E pode se
alterar em minha referência ao lembrar-me; ou seja: o passado é apenas
o que Deleuze chama: efeito de sentido; um efeito de superfície
instaurado na imanência. O futuro ainda não veio, e muito embora eu
me dirija a ele, sempre me parece que ele esteja em uma trans-
historicidade inalcançável. O que resta? O presente!
As doutrinas orientais que os ocidentais rejeitam veementemente, pois
não buscam e não tem a verdade, instauram-se no silêncio e na
contemplação. Erroneamente, o Pensamento Ocidental crê, então, devido
a isto que tais doutrinas não tenham sentido (e não tem mesmo!), e
somente universidades ocidentais muito sérias, pelo regular inglesas as
estudam em seus programas de pós-graduação.
A melhor definição que talvez encontremos para os buscadores da
verdade, é a de que buscam aquilo que não tem, mas, que um dia, em
um futuro trans-histórico, continuarão a não ter, pois serão sábios, então,
serão a própria verdade.
Mas, há um ponto pacífico aí: amamos o que não temos, e amamos os
que buscam. Suspeitamos claramente de quem diz que encontrou algo
que não condiga com a nossa experiência, queremos ver a verdade por
nós mesmos, e, por fim, precisamos ser chamados à verdade dos fatos
(ou a verdade da ausência deles; dos efeitos sem causa!). Por isso,
ouvimos a todos e buscamos o caminho da comprovação, que é sempre
não-mente.
Nos parece que mesmo diante de toda a informação e de toda a
consideração intelectual, a única forma de efetivamente vermos ou
comprovarmos algo é justamente renunciando a todo o conhecimento.
Nossa prática diz que é assim, e, que, dessa forma, a consciência se
abre para o que realmente é, e que não pode ser traduzido pelo
pensamento e nem pela linguagem. Aquilo que realmente é, não pode
ser apreendido pela mente.
Nesta revisão em linguagem clara de nosso ensinamento, buscamos,
somente, apontar o caminho.
É necessário que vejamos por nós, sintamos por nós, experienciemos.
Nossa verdade não deve ser a do Contrato Social, a da Igreja ou a de
outra instituição qualquer. Esta não é a verdade! Verdade é como
liberdade e felicidade, elas não te forma dadas, mas, você passa toda a
sua vida tentando conquistá-las.

Gostaria de encerrar com uma estória (ou seria História? – depende de


que lado você está no espelho de Lewis Carroll):
Iam caminhando pela floresta, três personagens: o Ateu, o Religioso e
o Cientista (o Sábio aparece mais tarde):

Cientista: Caramba! Que borboleta linda! É da espécie X, gênero Y, nome


TAL, sub-espécie FULANA! Mas, que maravilha! É raro ver uma destas!

Ateu: Ora, vejam só! Pensei que você era cientista! Mas, estou vendo
que, possivelmente, você não aprendeu nada na universidade! Veja,
meu filho, estes livros aqui: O Capital de Karl Marx, e A Origem das
Espécies de Charles Darwin. Deveria ler isto, e passaria, então, a se
interessar pelo que realmente vale!

Cientista: Saiba você que as borboletas são muito importantes para o


ecossistema. Vejo que você entende mais de macacos que de ecologia!
Ateu: Me diga, Sr. Cientista: o senhor já leu Materialismo e
Empiriocriticismo de V.I. Lênin? Pois é, deveria! Desta forma, o Sr.
arrumaria uns problemas sérios com os quais se preocupar! Por um
acaso, o Sr. sabe que hoje sessenta milhões não consomem proteínas
necessárias? O Sr. sabe que computador nas escolas para pessoas
desnutridas de nada vale? Aonde o Sr. quer chegar com o seu estudo de
borboletas?

Religioso: Meus filhos! Ouçam! O que viemos fazer aqui? Por Deus
Nosso Senhor! Há tantas belezas naturais aqui! Observem os pássaros!
Que lindos! Voam! O Pai tudo lhes dá! Não pode ser possível que
tenhamos vindo aqui para discutir se estamos certos ou não! A questão
é: o que queremos? O que valorizamos? De acordo com o nosso objetivo
daremos mais valor a tais ou quais coisas. Não há certo ou errado na
questão.

Ateu: Sr. Religioso, estava mesmo esperando o Sr. falar. Sabe Sr. Religioso,
o senhor parece um disco quebrado da Bíblia. Será que o senhor só leu esse
livro? Tome fique com estes, é para o seu bem! É para o senhor ver tal
como David Hume, que Deus é apenas uma ficção forte!

Cientista: Mas, que estória é essa de que Deus não existe? Existe sim.
Foi ele quem criou a Natureza. Deus é Natura-Naturalis. O próprio
fundamento das Leis.

Ateu: Eu não disse! Este senhor passou quatorze anos na universidade


e conquistou um título de doutor; mas, não sabe nada! Por um acaso Sr.
Cientista, o Sr. já leu a Teoria do Universo Eterno e Imutável de Fred
Hoyle? Ou quem sabe: A Teoria da Relatividade Restrita de Albert
Einstein? Ou Linus-Pauling? Ou Werner Heisenberg? Não! O Sr.
Cientista prefere borboletas e ficções universitárias!

O Ateu é muito bem informado e não crê na Teoria do Universo Eterno


e Imutável. Ele sabe que o universo não é um modelo estático; que a
velocidade da luz não é constante, e que aumenta de tantos bilhões a
tantos bilhões de anos. Enfim, o Ateu sabe da Teoria das Cordas e de
física quântica. Parece-me que será difícil o diálogo com ele.

Religioso: Afinal de contas o que viemos fazer aqui? É sabido que a


história começa no Gênesis e termina no Apocalipse. Por um acaso já
leram Francis Fukuyama? Vamos parar com essas discussões inúteis, e
vamos apreciar esta bela paisagem que Deus nos deu.

A discussão para por uns momentos, e os bons homens adentram a


mata, quando se deparam com um homem meditando no meio da
floresta. Seus cabelos eram longos. A barba estava por fazer há anos.
As unhas crescidas. Estava lá, na posição da flor de lótus fazia muito
tempo, não se pode precisar. Seu rosto espelhava calma, contentamento
e paz. Mas, nossos amigos....

Ateu: Ora! Vejam só! Este aqui está aí porquê não leu Saddock e Kaplan,
e porquê não passou por aqui nenhum psicólogo reprogramador. Aliás,
o que este indivíduo precisa é de um psiquiatra, e de um bom hospício.
Vejam bem! O que leva alguém a ficar nesse estado?

Cientista: Respeite o homem! Não sabe história? Em 1789 foi feita


uma revolução, e muitos morreram na escuridão para que hoje tenhamos
luz. Pela Declaração dos Direitos do Homem, este homem tem o direito
de estar aqui.

Religioso: Isso mesmo, Cientista! Seja qual seja a crença deste homem,
devemos respeitá-lo. Vamos deixá-lo em paz, e que Deus o abençoe.

Ateu: Mas, isto é problema de saúde pública; de saúde física e mental.


Será que não entendem? Este homem precisa ver o psiquiatra, e
urgente!

Cientista: Se fôssemos pôr no hospício todos os que pensam diferente


de nós, poríamos toda a cidade de Nova Iorque dentro dele, e ficaríamos
sequiosos por pôr mais. Quem sabe não poríamos as gentes de São
Paulo, Buenos Aires, de Londres e Paris também. E o que dizer dos
islâmicos que pensam diferente de nós? Respeito é a chave! Se
respeitarmos a todos, teremos liberdade.

Religioso: Respeito é pouco, Cientista. Devemos buscar compreender.


Deus nos fez diferentes uns dos outros para que pudéssemos ensinar e
acrescentar uns aos outros. Para que possamos trocar conhecimentos e
nos enriquecer. Para que possamos aprender com todos, pois todo tem
algo a nos ensinar, e nós sempre temos algo a aprender. Essa é a vontade
de Deus.
Ateu: O Sr. Religioso lê muita ficção. Por um acaso já leu A Lógica
do Sentido de Gilles Deleuze? Ou An Enquiry Concerning Human
Understanding de David Hume? Ou algo de Duns Scott, Avicena ou
Guilherme de Ockham? Não. O senhor não leu. Deveria ler Germinal
de Émile Zola, ou o Manifesto do Partido Comunista. Sr. Religioso,
bem vindo ao mundo real. O mundo real é extremamente
problemático, cheio de inconstâncias e velocidades que nunca se
encontram. É feito de fluxos onde a matéria é vazia, e Deus toma a
forma de Dionísio e de Heliogábalo, e você não pode mais dizer o
que é, aquilo que você pensava ser agorinha há pouco! Sr. Religioso,
em nosso mundo real, lamento dizer, mas, os aviões costumam cair,
há tornados e nevascas por toda à parte; o mar só se aquieta para se
revoltar, e, as pessoas só saem para entrar, e entram para sair! Há
uma impossibilidade neste mundo, neste lado do espelho. O mundo
real é impossível por natureza!

No meio da discussão, o Sábio abre os olhos.

Ateu: .... Mas, é claro que tenho mesmo razão, Sr. Cientista. Não gastei
o meu precioso tempo estudando as formigas. Gastei sim, lendo Paul
Valéry, que me trás a tragicidade da existência. Ih! Olhem! O maluco, o
louco desvairado, acordou!

Religioso: Venho a exigir respeito para com este homem! Se não


crê em Deus, respeite a este homem como gostaria que o
respeitassem! Estando certo ou não, este homem merece respeito,
tolerância e compreensão. Vamos lá, meu bom homem, qual o seu
nome?

O Sábio nada respondeu. Ficou ali parado, observando as três figuras


oriundas da civilização tecnológica destes tempos últimos.

Cientista: Ele não deve compreender a nossa língua. Tentarei outras....

E lá foi o Cientista gastar a batelada de seus trinta e quatro idiomas....


Óbvio, que sem resposta. O Ateu intervém:

Ateu: Sr. Cientista, já lhe ocorreu que este homem pode ser surdo?
Vamos analisar os ouvidos dele. Sujo do jeito que está deve ter terra no
conduto auditivo dele.
O Sábio olha para o Ateu, e sorri.

Ateu: Vejam! O homem das cavernas sabe sorri!

Cientista: O riso é um reflexo primitivo de nossos ancestrais. Até aí


morreu Neves.

Religioso: Oh, Deus! Perdoai-nos! Pois ainda não aprendemos a


respeitar o nosso próximo!

Então, inesperadamente, irrompe o Sábio. Sua voz parecia o cantar de


um Rouxinol em bela tarde. Os pássaros acorrem a ouvir o Grande
Homem, e as feras da floresta se aquietam.

Sábio: O homem que não sabe o que quer, não sabe o que deve buscar,
pois ainda não sentiu o caminho dentro de si. Vocês ainda não são
homens. Eu os ouvi desde há muito. Desde que entraram aqui. Falam
demais! Do homens que muito falam, há sempre duas espécies: os
ignorantes (aqueles que não sabem que não sabem), e os que pensam
que sabem (pensam que sabem que sabem).

Ateu: Puxa vida! Até que o selvagem não é tão ruim assim! Vamos lá,
agora me diga o seu nome, sim?

Sábio: Eu não tenho nome. Mas, para que o quer saber? Seria muito melhor
que se preocupasse consigo próprio. Seria melhor que olhasse para dentro
de si mesmo, e procurasse por você aí dentro. Talvez ainda não tenha feito
isso. Talvez tenha, e, por isso, você se escondeu por detrás dos livros. Eles
não te levam a lugar algum, e é por isso que você os deseja. O homem que
conhece a si próprio é o único que pode dizer que é senhor de si mesmo,
pois a posse de si mesmo implica em liberdade. A posse de si mesmo implica
em ter todo o poder, e não precisar usar dele jamais. Ter a si mesmo, é ter
tudo e não ter nada com o que contar.

Ateu: É. O selvagem não tem nome.

Cientista: Respeita o moço, Ateu. Não vês que ele é gentil conosco.
Caro senhor, meu nome é Yevgeni Mahogany, a seu dispor! Cientista
do Instituto de Bromélias, Borboletas e Afins do Setor de Botânica da
Universidade Estatal desta Capital.
Religioso: Espero que nos desculpe. Perturbamos o seu sono. Já vamos
embora.

Sábio: Eu não estava dormindo.

Religioso: Mas, como? Pelo menos, parecia!

Sábio: O homem que se deixa levar pelas aparências é como o cavalo


que se torna senhor da carruagem. Onde o cavalo pode levar a
carruagem? Se não para o precipício, a lugar algum!

Religioso: Esta conversa está é muito enigmática. Do que está falando?

E o Sábio fecha os olhos. O Religioso o acompanha. O Ateu e o Cientista


entram em uma discussão feroz em busca de uma explicação para o que
está se havendo ali, e, percorrem Jung, Freud e as correntes psiquiátricas
mais modernas... Óbvio, que sempre invocando a razão para si mesmos,
e, desta forma, não chegando a nenhum consenso. Eles esquecem que
no mundo dos fenômenos as coisas são um contínuo não-ser....

Duas horas depois, o Sábio e o Religioso abrem os olhos.

Religioso: Obrigado.

Sábio: Agradeça a si mesmo. Você concedeu a si mesmo a força para


contemplar a verdade. Eu não fiz nada.

Ateu: Mas, que negócio é esse? Mais uma experiência dessas de


fundação de igreja? Teve um maluco que fundou uma há dois mil anos,
e deu no que deu! Hoje a medicina está atrasada mais de duzentos anos,
e devemos agradecer a quem?

Sábio: O homem que segue o seu caminho, ocupa-se com o que é digno.
O homem que se ocupa do que é digno, tem paz. O homem que tem paz,
tem liberdade. E, o homem que tem liberdade, tem força. Tudo o que o
homem que segue, o seu caminho digno, precisa, lhe é dado, pois o homem
que tem liberdade, tem força. O homem que tem força, tem tudo o que
precisa para caminhar no caminho, que dá sempre para outro caminho, que
por vezes leva a estradas amplas do conhecimento do inefável, que dá para
outras estradas até o infinitos dos tempos que estão por vir.
Nosso amigo Ateu ficou sem entender. O Cientista resolveu seguir a
sua vida estudando borboletas, e o Religioso tornou-se senhor de si
mesmo, e desistiu de tentar fazer com que os outros aceitassem a sua
verdade. Agora ele não tinha mais a verdade. Ele apenas, como Mestre
de si mesmo, apontava o caminho, e deixava ao livre-arbítrio das pessoas
seguirem ou não. As pessoas não mais o seguiam, pois ele, agora, estava
muito ocupado de si. Para aqueles que se iniciavam no caminho, o novo
Mestre ajudava, pois eles não mais o seguiam, seguiam no caminho da
dignidade, do amor e da comprovação por si próprios.

Somente a distância, é que enxergamos o detalhe. Somente diante do


detalhe, é que vemos o quando o universo é vasto e infinito.
A verdade está aí. Ela está bem dentro de seu coração. Porém, para
enxergá-la é preciso renunciar a si mesmo, zerar o conhecimento e
construir novas pontes. Se as pontes que você construir não servirem,
não tem problema! Construa outras! Aquele que se afirma na dignidade
da força, está com a Lei. A Lei olha pelos buscadores, por aqueles que
escolheram com coragem o seu lado no espelho de Lewis Carroll.

III
Em nossas análises, práticas e experiências passadas, e, particularmente
com as recentes começamos a notar que é muito tênue a fronteira que
separa o ensinamento dos demais conhecimentos esotéricos e exotéricos.
Nos parece que chegamos a síntese. Estamos claramente na fronteira.
Podemos aproveitar de todo o conhecimento e nos amalgamar com todo
(e em todo) ele. Podemos absorver as mais diversas formas de
ensinamento e compreender as mesmas. É de boa lembrança que todo o
ensinamento está alicerçado em quatro pilares, que são os quatro pilares
do templo: a filosofia, a mística, a música e a ciência.
Nos parece que no ensinamento revisado, ainda caibam dogmas, mas
não muitos. Os preconceitos devem ser extintos para dar forma ao nosso
novo conhecimento prático. Dos gnósticos de primeiro momento em
nossa atual era, foi legado o conhecimento das várias religiões e ordens
de mistério. Foi assim que se conseguiu a síntese. Portanto, resulta
infundada toda e qualquer forma de preconceito contra qualquer tipo
de crença, religião, filosofia ou ciência. Devemos nos aproximar das
várias formas de expressão de conhecimento humano como crianças que
detêm o conhecimento da serpente. Devemos ser inocentes e questionadores,
e, desta forma, não teremos porquê olhar para trás. O conhecimento da
síntese nos dá força, entretanto de nada vale sem práticas.
Abaixo os preconceitos em nosso ensinamento, que busquemos o
caminho com a tranqüilidade do elefante e a agudeza do olhar da águia.
Somente partindo dia após dia do ponto zero do conhecimento é que
permitiremos que o novo entre pela via da não-mente. Ser não-mente é
ser não-sendo, agir pela não-ação e com isso observar atentamente, e
em alerta sereno a nós mesmos como agentes de atividade de um mundo
que apenas passa diante de nós. O sábio age mais pelo agir necessário
que pelo agir enérgico que dispersa suas energias e o retira da postura
contemplativa de não-mente.
Sendo esse o último dos Tópicos do Ensinamento, gostaria de deixar
com vocês uma mensagem que faço minha e que foi musicada por meu
amigo e irmão espiritual Adriano Freire da Motta.
Que a Paz esteja com todos junto ao objetivo da Dignidade. Uma vida
que não tenha Objetivo Digno é um desperdício do tempo espiritual.

Reflexões do Adriano
Transcrição da Fita 1 – Música 2

Segunda Reflexão: O Objetivo da Força Como Caminho Para a


Comprovação da Verdade

Nós,
Devemos ver o mundo, não como um castigo, mas como um desafio.
Assim é que perante a vida, nós teremos a força e a coragem de um
tigre, para prosseguirmos adiante, em nossas conquistas.

Perante a vida, que tenhamos a astúcia e o objetivo de uma serpente,


para enfrentar as adversidades.

Que perante a vida, nós tenhamos tranqüilidade e paz, conforme


simboliza a pomba. E que a paz e a tranqüilidade possam ser nossas
conselheiras diante dos conflitos...
Que perante a vida, nós tenhamos a visão e a liberdade de uma águia,
para ir tão alto quanto se queira.

Que perante a vida, nós tenhamos a qualidade, sim, acompanhada de


um dragão. Pois o dragão, é a soma de todas as qualidades. É a sabedoria
expressada. Assim, nós teremos a todo o nosso alcance, o poder
verdadeiro. O poder verdadeiro é um ente tão poderoso, que o dinheiro
não tem poder sobre ele. É um poder onde o poder da palavra, não é
mais poder. O poder em si, é a própria beleza verdadeira, qualquer que
seja em reflexo sobre a terceira dimensão.

O poder verdadeiro está além de nossa mente. O poder verdadeiro


reflete-se na humildade. A humildade expressada é uma demonstração
de poder. Um poder que não damos valor em geral. Mas, sim! É um
poder! Pois, é ali, na humildade que se oculta o que não se pode ver.
São muitas coisas, justamente o que o sábio sabe, o que o sábio viveu.
O sábio através da humildade conquistada, conquista sempre algo mais.
Porque o sábio sabe silenciar a sua mente, e devido a isso, ele sabe o
momento de falar. Ele sabe o momento de não-falar. Ele sabe o que
falar. Ele sabe quando falar.

Para isso tudo é que o sábio, realmente, tem que comparecer ao mundo
físico. Para passar para toda a humanidade o que seja necessário. Bem
como, vários Mestres passaram o ensinamento. O sábio acima de tudo,
é um grande homem em missão. Para fazer com que cada planeta,
realmente, entre em seu próprio equilíbrio. O sábio faz com que o planeta
tenha força, para que seus habitantes busquem a transformação, a
mudança. O sábio transfere de si, para os outros, a sua continuidade de
propósitos e objetivos que, assim, desta forma, são cumpridos. Os
objetivos são cumpridos, se houver persistência, força interior adquirida
(e obtida por si e para si mesmo).

Assim é o homem com consciência, com sabedoria. A sabedoria do


homem auto-realizado, não se perde no tempo, e nem com o tempo; e,
nunca se perderá em outras existências. Pois esta, está embutida em seu
interior. Esta, faz parte de seu dia-a-dia. E assim sendo, sempre será um
homem consciente. Consciente de seus atos e capaz de tomar decisões
corretas para si mesmo. Porque acima de tudo, um grande homem se
inicia em uma grande liberdade, pois tem visão global de tudo o que
necessita. O grande homem é capaz de ver os outros como realmente
são, e, assim, compreender os outros e fazer deles uma parte com ele,
sem preconceito, sem (e com) o nada. Isto é o homem autêntico. O
homem autêntico está sempre em uma demonstração de carinho, de
amor para com os demais. A fraternidade é necessária. Portanto, o
grande homem conquista a fraternidade, também. E desta forma, cria
uma grande harmonia, que gera o equilíbrio expressado em sua relação
com os demais seres do universo. Isto é o que se pode dizer do grande
homem, do homem que não desiste, que não se limita com o tempo. O
grande homem está além do tempo. E, também, acima de tudo, não se
perde com os demais no sentido de buscar a ajuda necessária para o seu
interior. Desta forma, o homem sábio é um homem que caminha entre
os demais com passos firmes, sabendo a direção em que vai. O homem
sábio não perde o rumo do seu próprio trabalho interior.

E isto tudo. É um fato no momento em que se sente, no momento em


que se vê... Que se vê realmente. Que se vê não só com os sentidos
físicos, mas com os sentidos que estão além da mente. Isto sim, é o
único motivo de termos inquietude espiritual interior, de termos uma
busca, de termos uma força, de termos uma mudança, de termos uma
conquista, e, de termos, acima de tudo: Amor para com os demais....

IV
Voltamos a floresta, e nesta manhã de fevereiro estavam passeando os
nossos queridos amigos, que, creio, vocês já conheçam; a saber: o Ateu,
o Cientista e o Sábio. O passeio tinha apenas iniciado, e nós demos a
sorte de pegar a discussão ainda no início. Entretanto, como a nossa
viagem na companhia dos digníssimos amigos é longa, e mais à frente
vocês conhecerão mais dois interessantes personagens, (a saber: o
Agnóstico – Sr. Yehudan Chaim Scharovsky; e o Religioso: Sr. Ibrahim
Schon Wasser – da Universidade de Tel Aviv e doutor em Ciências da
Religião – creio que o diálogo com ele seja proveitoso!). Gostaria
também, eu, de lhes falar um pouco (não muito para não lhes tirar o
interesse), sobre os nossos amigos neste primeiro momento na floresta.
Como bem se lembram, o Cientista é o Sr. Yevgeny Mahogany, do
Instituto de Bromélias do Centro de Botânica da Faculdade de Biologia,
que fica na Universidade Estatal desta capital. É um homem muito
inteligente (por demais) e que passou quatorze anos de sua vida na
universidade, dedicando-se a seu estudo. Com excelentes dotes
lingüísticos, o cientista domina os rudimentos de trinta e quatro línguas
(dentre elas o sânscrito, o latim e o grego!), e possui vasta cultura geral.
Nosso amigo Ateu é o pensador de nossos tempos. Dono de cultura
enciclopédica, o Senhor Ateu leu desde as Obras Completas de Sigmund
Freud por James Strachey a American Psychology Encyclopedia e outras
ainda na mesma linha! Nosso amigo Ateu possui ainda enorme
background em todo tipo de ciência exata e discute d igual para igual
assuntos concernentes à química, física, relativística, matemática,
astronomia e astrofísica. Fora ainda, como notarão, que nosso amigo
Ateu leu quase todos os filósofos antigos e escolásticos e hoje presta
uma atenção concentrada na questão dos movimentos e das velocidades
em Bérgson e Deleuze. A questão do tempo em Deleuze preocupa muito
nosso amigo Ateu e ele agora anda com mais dois livros permanentes
debaixo do braço: Mil Platôs e a Lógica do Sentido, de Gilles Deleuze.
Fora ainda os já clássicos livros de nosso amigo ateu, que ele os leva
para onde for, a saber, são: An Enquiry Concerning Human
Understanding de David Hume, A Teoria da Evolução de Charles
Darwin, e O manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels. Como
vocês já sabem, a conversa com ele será difícil. A novidade é que nosso
amigo agora tem nome: Mordehay Svaltzman Waltz.
Bem, sobre o Sábio, não tenho muito a dizer, a não ser que ele está de
viagem pelo mundo e quase foi preso pela polícia política após ter
ministrado uma palestra sobre meditação no Instituto de Botânica da
capital. É estranho, mas a polícia considerou de cunho subversivo a
mensagem de paz de nosso amigo. Se o Sábio não fosse estrangeiro, e
portador de passaporte vermelho, creio que o nosso pacífico amigo já
não estivesse tão bem de saúde.
Por fim, o Agnóstico (Sr. Yehudan Chaim Scharovsky) é de Bratislava
e foi lá que ele e Mordehay (o Ateu) se conheceram. Yehudan é médico
geneticista da Universidade Estatal de Varsóvia, e o Ateu é professor
de história em Bratislava. É uma amizade interessante!
Fora o que eu já disse de nosso amigo Religioso, devo acrescentar que
também é médico, psiquiatra e psicanalista e que se especializou em
Ciências da Religião por necessidade de inserção em um contexto social
tão conturbado como este de aparente colapso do sistema planificado
de governo. Como podem notar, nem o Religioso e nem o Sábio são
daqui, pois o Sábio nasceu às margens do Ganges e o Religioso na
capital política e administrativa da única democracia do Oriente Médio.

Bem, me parece que já pegamos o diálogo em andamento:

Ateu: ... Pois observe, Sr. Cientista que a Teoria do Universo Eterno e
Imutável, apesar de sua evolução eventualmente ótima é improvável,
pois diante do aprofundamento da Ciência dos Quanta, observamos um
retorno da física ao Paradigma Filosófico. As observações feitas por
Hubble confirmam as perspectivas einstenianas de um crescimento
diário do universo da ordem de cem quilômetros diários. Se algo cresce,
é porque não é imutável. A matemática é só o instrumental que salva as
aparências da física. Você faz ela referendar qualquer coisa, mas isso
não quer dizer que haja verdade alguma!

Cientista: Os modelos matemáticos têm um funcionamento ideal, e


sendo esta a forma mais próxima de se explicar uma realidade, então,
creio explicar que tais modelos nos ofereçam explicações necessárias e
possíveis.

Ateu: Sim, necessárias e possíveis, pois muitos são os mundos possíveis


de acordo com Leibniz! Veja: não é pelo fato de os reatores nucleares
funcionarem que se pode dizer que se sabe algo de fissão ou fusão
nucleares. Para os atomistas gregos, o que interessava era tudo, menos
o átomo. A questão é sempre menos que o mínimo. Existe uma
impossibilidade no conhecimento, e nisto Kant não mentiu para nós.

Cientista: Concordo contigo, mas, se não fossem Aristóteles, Kant e


Hegel o que teríamos aqui?

Ateu: Concordo contigo neste quesito, mas, volto a insistir que não é
porque a política funciona, que se sistematizou a ciência moderna, e
que, ainda, se desenvolveu uma Teoria do Estado, que podemos dizer
que há alguma verdade aí. Pois a política, o conhecimento e o Estado
são construções datadas. Não há verdade aí.

Cientista: Mas, precisamos tentar uma explicação para as coisas. Como


disse Einstein nosso conhecimento está noventa e nove por cento errado,
mas é o que de mais valioso nós temos!
Ateu: É por isso mesmo, Cientista! Veja, Einstein, o Judeu Genial, era
um cientista dublê de filósofo. Ele dizia: isto é ciência, e os bobos
engoliam como se fosse! É a cultura do simulacro, nada mais. Jung,
Freud, Einstein diziam que o que faziam era ciência e as pessoas
acreditavam! Veja Cientista: há algo de mais filosófico que afirmar:
tudo é relativo? Será que a ciência faliu de uma tal forma que esteja
sendo forçada a voltar ao Paradigma Filosófico?

Cientista: Mesmo sabendo que o que sei está noventa e nove por cento
errado, é meu deve avançar, pois como disse Edward Tesla: a ciência é
uma branca luz que ilumina tudo por igual apartando de tudo as trevas
da ignorância e do preconceito, creio que ele tenha dito mais ou menos
assim, mas a idéia é esta.
Ateu: A ciência é uma tentativa necessária, mas ela tem que se vigiar
para não se tornar uma segunda religião...

A conversa prossegue, e, em um determinado momento, quinze minutos


após a nossa chegada (como não poderia deixar de ser!) nosso amigo
Ateu lembra do Sábio.

Ateu: E aí Sábio? O que tem a nos dizer sobre as nossas questões


cosmogônicas?

Sábio: Aquele que conhece a si mesmo, conhece o universo e os Deuses!


Como posso conhecer o Cosmos se não conheço a mim mesmo?

Cientista: Há um certo sentido nas palavras dele, Ateu. Todavia, não


consigo admitir por completo a opinião dele, pois bem como disse
Aristóteles: o mundo só pode ser conhecido por seus fenômenos. É no
externo que nos reconhecemos.

Ateu: Só perguntei por desencargo de consciência. Só se poderia ouvir


isso de um sujeito como esse! Tá faltando uma leiturinha aí, né? Sr.
Sábio, como todo o respeito, devo admitir que o senhor só está assim
porque o Estado não permite o advento da psicologia. Se o senhor
conhecesse um psicólogo reprogramador o senhor não ficava assim.
Eu prometo que ainda levo o senhor ao psiquiatra da universidade estatal,
pois tenho certeza que há um problema, se não dois ou mais em seu
cérebro, e no estágio atual de nossa ciência, devo admitir que o que não
tem cura, pelo menos tem tratamento, e o senhor após uns
antidepressivos e uns antipsicóticos vai se tornar outra pessoa, mais
racional, equilibrada e capaz de aprender uma grande gama de
informações. Não há nada em neuro-química hoje que nós aqui não
saibamos. Pode aguardar Sábio, que eu o Grande Ateu de Compaixão
do Mundo vai ajudar o senhor!

Sábio: Sr. Cientista, me diga o que conhece do conhecimento? O


conhecimento do senhor já o levou a algum lugar? Conhecer o mundo é
conhecer mediante um conjunto de regras que o senhor aprendeu e deu o
nome de ciência. É como enxergar um quadro branco com óculos de lentes
verdes! Aí o senhor dirá: este quadro é verde, e não branco! E como razão!
Pois, o que vê é a cor verde e não a cor branca! O que a sua ciência permite
é apenas uma coisa: conhecer o conhecimento, e como a mente não pode
conhecer o real, a maior parte dele o senhor ignora que ignora. Um fenômeno
é um fenômeno para outro fenômeno, pois a consciência que o senhor
tanto preza é só uma invenção, um órgão adaptativo. Não há nada que o
senhor possa conhecer antes de conhecer a si mesmo.

Ateu: Sr. Sábio, creio que estamos entrando em um ponto de tangência,


mas gostaria, mesmo assim de retornar a questão à superfície. O senhor
a deixou profunda demais.

Cientista: Mas, como? Embora, eu não concordo com esse negócio de


que o que eu conheço é só o conhecimento, não achei profunda a questão
dele.

Ateu: A questão, Sr, Cientista, não está no que se diz, mas do que se
desvia. A questão não é conhecer o mundo mediante um conjunto de
regras, e sim saber que as regras são ficções historicamente datadas.
Elas surgem do desejo, e necessidade de controle no início das
sociedades organizadas há dez mil anos aproximadamente. O conjunto
de regras, por ser fictivo é verossímil, pois como disse Platão no
Protágoras: a verdade não existe. Então, eu digo qualquer coisa e vocês
acreditam! A questão, então, não reside no conjunto de regras. Mas,
concordo com o Sábio em que ela reside no tipo de teoria que usamos
para tentar entender o mundo, aí a questão fica bem colocada, pois
dependendo do arcabouço teórico aplicado a tal ou qual fato (ou a
posição do observador) obteremos tal ou qual ficção, que daremos um
nome qualquer, (diremos: ciência) e que por ser falso, diremos que é
verossímil e portanto: verdadeiro.
Sábio: Sim, Ateu. Muito certo está ao dizer: as regras surgem do desejo,
pois o desejo é o problema. O homem que cultiva a vontade, pode
suplantar o desejo e aí a regra pode no se aplicar mais a ele, a não ser
por mera formalidade. Está certo, também, ao dizer que a verdade não
existe... Pois, a verdade, realmente, não existe.... Ela é. Existem coisas
que podem ser sem existir, e outras que existem e não são, outras existem
e são.

Cientista: Agora aprofundou.

Ateu: Sr. Sábio, me perdoe, mas o senhor parece confuso, religioso até.
O ser não existe, o que existe é só o movimento das essências vazias.
Não há substância, o que há é apenas superfície. Essa estória de
categorias é de um certo senhor chamado Aristóteles, mas este senhor
foi bem enterrado por Newton, Kepler, Galileu e Da Vinci.

Sábio: Conhecer é não saber. Ter informação é não saber. Viver no


mundo das antíteses é não saber. Saber é ir além, é não transcender. O
saber está logo ali, para o buscador de coração leve.

Ateu: Do jeito que a coisa vai, daqui a pouco vamos fazer um culto a
Osíris e outro a Hathor! O Sr. está egípcio demais hoje, Sábio! Sabia
que um certo senhor foi dar uma de faraó há uns dois mil anos e se deu
mal! Ele esqueceu a sua condição de escravo do império e morreu
acusado de crime contra o Estado. Cuidado, Sábio, certas posições
anacrônicas são perigosas! Mas, em contraposição e comentário ao
assunto, eu vejo que há uma impossibilidade em nossa conversa, pois o
senhor é um homem verídico e eu me ponho no lugar do ignorante.

Sábio: O verdadeiro ignorante é aquele que conhece a sua ignorância!

Após este guerrear de palavras uma pequena trégua se apoderou do


grupo. O Cientista catalogando as suas borboletas ficou e o Sábio e o
Ateu ficaram em silêncio.

Enquanto isso, duas pessoas iniciavam a caminhada na floresta naquele


exato momento. Era o Religioso e o Agnóstico. Vamos ouvir:

Religioso: Dizem que no final de semana algumas pessoas da


universidade costumam passear aqui.
Agnóstico: Há, sim! São Yevgeny Mahogany e Mordehay Svaltzman
Waltz. Conheci Mordehay em Bratislava e Yevgeny é daqui mesmo,
ele esteve em Varsóvia para a cerimônia do ano novo da ascensão de
Gorby ao poder após a morte de Chernenco.

Religioso: Interessante! Mas, não entendo como vocês podem ser amigos
de Mordehay. Ele é totalmente Ateu, não é?

Agnóstico: Mordehay leu muito. Os pais trouxeram para ele livros


editados em países livres, onde há democracia, lei e liberdade para todos.
Por isso, Mordehay conhece muitas coisas e é de boa valia em qualquer
questão.

Religioso: Me parece que o Cientista é amigo de um homem conhecido


como Sábio. Soube também que ele não professa qualquer religião
monoteísta. Me é difícil que alguém ainda professe uma crença diferente
da nossa após a ascensão das três grandes religiões.

Agnóstico: Da sua Religioso! Da Sua! Eu mesmo prefiro Deuses que


sejam parecidos comigo, que um Deus que por questão de economia
não tem sequer rosto para não gastar mármore. Talvez, o Sábio seja
assim, pois conforme sabemos a sabedoria não tem endereço certo.
Talvez seja assim também pois não teve nenhuma disciplina religiosa
ou atéia excessiva. Nos países livres há o predomínio das três grandes
religiões, e aqui do ateísmo, que não deixa de ser uma forma de religião.
Mas, de certa forma o governo está certo, aqui não precisamos de Deus,
precisamos de gente que pense, e de ciência.

Religioso: Você acabou de dizer que Mordehay leu livros de países


livres. Acha mesmo que as pessoas aqui pensam? O pensamento só
é possível com liberdade, e aqui há um jornal, uma agência de
notícias, dois canais de televisão! O que pensa que isto aqui é? Eu
lhe digo: isto não é liberdade! Não há criatividade em sua terra. Que
lugar é este? Que país é este que possui mísseis balísticos de longo
alcance que são capazes de varrer Washington D.C. (District of
Columbia) do mapa em quatro miseráveis minutos e raciona sabão e
pão? Há filas intermináveis aqui! Um operário ganha o mesmo que
um engenheiro que tem no mínimo dezesseis anos a mais de
instrução, e você vem me dizer que aqui há liberdade? Pelo amor de
Deus! Pense!
Agnóstico: As vezes penso que o Sábio não é produto de uma forte
disciplina religiosa como aqueles que professam o monoteísmo se
impõem a si mesmos. Não é pelo fato de crer ou não, de seguir princípios
rígidos que se obtém a sabedoria. A sabedoria não é uma fórmula pronta
que a gente compra na farmácia. Gostaria de fazer nesse assunto uma
analogia com Kant: não se pode ensinar a ser filósofo, o que se pode é
ensinar a filosofar. Nesse sentido não se ensina a sabedoria a alguém;
pois como disse Platão, e em analogia a ele: ou a pessoa nasce com
índole para o bem ou não. Isto se aplica ao fato de nascermos com uma
compleição à filosofia ou à sabedoria, ou à ciência ou ao trabalho braçal
e administrativo.

Religioso: Está querendo me dizer que acredita no mundo das idéias


platônico?

Agnóstico: Não em um sentido agostiniano, mas em um sentido mítico.


Veja esta questão da índole, creio que seja genética.

Religioso: Tal como a propensão à filosofia?

Agnóstico: Sim. Creio que seja adequada à teoria em questão na medida


em que não existe uma anima tantum, a alma é produto do corpo. Uma
criação necessária. Nada mais.

Religioso: Então, não crê nas essências? Nos substractos? Penso que
sem tal arcabouço teórico nos seja difícil e até impossível compreender
o homem. Creio que algo o preceda.

Agnóstico: Talvez o que preceda a essência, seja só a existência e fora


disso nada. Já leu Jean-Paul? Seria interessante! O Ser e o Nada é um
livro escrito por um ateu, que foi listado no Index Librorum
Prohibitorum, e, ao mesmo tempo é um dos livros que melhor fala de
Deus sem jamais usar o seu santo nome em vão. Quando não se pode
fazer arte, se faz filosofia, mas existem momentos em que a filosofia
tangencia com a arte.

Religioso: Heidegger foi o mestre, e um bom mestre por sinal. Vários


teólogos exploraram os argumentos de Heidegger, mas, sabe, Agnóstico?
Prefiro Gabriel Marcel, para mim é mais coerente. Dizem que Jean-
Paul leu muito Avicenna, Averróis e Santo Tomás, fora ainda o homem
de Oxford. Não há nada de novo entre o céu e a terra, mas sim a forma
de apresentarmos a nossa pergunta, nada mais.

Enquanto isto, mais adiante na floresta, não muito longe:

Ateu: ... Eu não te disse? Cientista, trazer este homem é um problema!


Veja o que ele deu para fazer agora!

O Sábio estava em uma posição incomum de meditação, muito usada


pelos homens santos da Índia. O Sábio estava abrindo o seu coração
para receber a força da natureza e por isso estava de cabeça para baixo,
apoiado em uma árvore, em uma prática de inversão da rotação dos
chackras com o intuito de revitalizá-los.

Cientista: ... Mas, ele disse que o podemos deixar aí, que depois ele
nos alcança. Deixa o homem aí, Ateu, eu acredito que o homem
possa se cuidar.

Ateu: Que se cuidar o quê? Caro Cientista, não vê que o homem é


lunático, estrangeiro, e produto de uma sociedade religiosa
estratificada? Hoje, lá reside a segunda maior população do mundo!
Setenta e cinco por cento da população tem renda de menos de um
dólar imperialista por dia! Eles não se revoltam, e, por quê? Porquê
disseram para eles que a vida no paraíso é autentica e esta: falsa!
Consegue entender? Se levarmos este homem ao centro de
neurociência do hospital de Berlim, veremos pelos exames de
ressonância magnética helicoidal, que só pode haver buracos no
cérebro deste homem! Um bom psiquiatra, como o da universidade,
não pensaria duas vezes antes de internar este homem.

Cientista: Trocamos uma inquisição por outra, mesmo após o Manifesto


pelos Direitos do Homem de 1789. As vezes penso que Rawls seja
impossível na mesma medida que Santo Tomás e Aristóteles também o
são! Quando aprenderemos a respeitar o próximo?

O Sábio abre os olhos, mas se mantém na mesma posição.


Sábio: Quando aprendermos a respeitar a nós mesmos! Conhece-te a ti
mesmo e conhecerás as Hierarquias, a Lei e o Tribunal, e serás Senhor
e não escravo das circunstâncias! O verdadeiro saber é humildade, que
é sempre não-mente.
Nossos amigos: Ateu, Cientista e Sábio, voltam a caminhar e quem
encontram na bifurcação da trilha?

Agnóstico: Mordehay, é você? Há quanto tempo? Soube que está


estudando os filósofos franceses! Gente boa!

O Ateu e o Agnóstico se abraçam efusivamente.

Religioso: Yevgeny! Que seja o Deus de Moisés contigo! Como


estás?

Mais abraços.

Cientista: Bem, diante dos olhos que tudo vêem, Santo Rabi!
Permita-me apresentar.... Este é o Sábio.

Religioso: Prazer. De que universidade o Amigo é?

Sábio: Da universidade da vida.

Ateu: Sr. Psiquiatra, graças a Sorte, o Senhor apareceu! Olhe para


isto! Não lhe parece que tem alguma disfunção sistêmica do temporal,
córtex e hipocampo que o conduz a um estado de fuga da realidade
por bloqueio eletroquímico no nível da recepção das sinapses?

Religioso: Olha Mordehay! Estou conhecendo este homem agora e


não posso me arriscar a dizer que ele é isto ou aquilo. Por favor,
deixe este homem em paz! Ele me parece muito pacífico!

Sábio: O Tempo é o Senhor da Razão!

Ateu: Eu não disse! É daí em diante! Cinco minutos conversando


com o Bhagavan aí, e você fica acéfalo!

Sábio: O homem que pensa que tem o pensamento, tem apenas mais
uma ilusão. O homem que sente que o pensamento é somente mais
um modo de ser não-sendo, pois é não-mente, não se preocupa em
qualificar isto ou aquilo, pois vive no presente, através de atitudes
dignas e serenas.
Religioso: Não vejo nada de mau nas palavras dele. Lembram-me as de
um grande judeu que fundou um movimento de massa há
aproximadamente 1988 anos gentios.

Ateu: Oh! Sim! E que em nome dele nós tratamos de destruir as


culturas Asteca, Inca, Chibcha e outras! Sim, me lembro! Tinha
também uns tais de Jesuítas (Soldados do Senhor) que apoiados no
nome de um Deus irado, vingativo e gay, resolveram que os homens
negros não tinham alma e por isso poderiam ser escravizados. Em
nome de Deus, católicos assassinaram protestantes na Noite de São
Bartolomeu no reinado de Carlos IX da França... Sim! Bem me
lembro! Temos ainda também que em nome de Deus, um certo senhor
alemão e esquizofrênico obteve do papa a benção para exterminar
seis milhões de seres humanos, incluindo aí: católicos, árabes,
deficientes físicos, e minorias étnicas, lingüísticas e raciais, e, ainda,
cidadãos alemães arianos que cometeram um grande crime: pensar!
Jóia! Esse maldito Deus seu! Ao inferno com ele!

Cientista: Não podemos julgar um movimento histórico unicamente


pelo erro...

Agnóstico: E também por isto, não podemos dizer que estamos certos.
A história é uma narrativa ficcional e ela sempre tem três versões: a dos
vencedores, a dos vencidos e a verdadeira.

Cientista: Vamos continuar! Venha Sábio! Não ligue para eles, pois
como disse Voltaire: não concordo com uma palavra do que dizes, mas
defenderei até a morte o direito que tens de o dizer.

Agnóstico: Estou contigo, Cientista! Vamos Bom Homem! Queremos


aprender contigo!

Sábio: Não tenho a ensinar, mas estou no caminho da vida, que é o


caminho do presente, do eterno que dá sempre para outro caminho;
onde as certezas não valem, só os movimentos e as velocidades.

Ateu: Leibniz e Deleuze: A Dobra e o Barroco. Sr. Sábio, o Sr. leu isso?

Sábio: Não li. Mas, observo o mundo com o coração, e isso me ensina
muito.
Ateu: É. Sempre começa bem; mas, tem que terminar mal! Vamos
Ibrahim, vamos conversar!

Religioso: Prefiro igualmente estar com este homem, pois ele não ensina,
e eu aprendo.

Ateu: Que coisa! O sujeito passa oito anos na faculdade de medicina,


três na especialização, outros três na escola de psicanálise e outros tantos
estudando filosofia, teologia e religião, para me dizer isso? Veja Ibrahim!
Este homem é anacrônico! Está no tempo errado! Desde o advento dos
Sofistas, não existe mais a verdade, o tempo dos sábios passou, tal como
o tempo dos mitos!

Religioso: Mordehay, a vida não é só o intelecto...

Nisso, nossos amigos: Agnóstico, Cientista e Sábio se desgarram


acidentalmente do grupo e pegam uma trilha que dá em uma
montanha que deveria ser escalada, para dar continuidade ao passeio.
E o Ateu e o Religioso começam a andar pela floresta a procura do
grupo.

Cientista: Bem, vamos fazer o seguinte: eu vou primeiro, pois tenho


experiência maior em escaladas, depois afixo uma corda lá em cima e
Bhagavan e você (Yehudan) sobem depois, está bom assim?

Sábio: O Mestre é sempre aquele que no momento tem mais experiência.


Agnóstico: Concordo com ele. Vá você. Enquanto isso, Sr. Sábio,
retornando a nossa questão: eu devo acreditar que exista uma verdade,
não é? Mas, pelo disencionamento de Eros com Alethéia...

E o Cientista começa a sua escalada. Enquanto isso perto dali:

Ateu: Esse negócio de ler Torá, Cabala, Talmude, Bíblia Bitoladora


de Bobos, é muito pobre, não acha? Veja o simulacro de falsidade
do cristianismo? Importaram todo um manancial platônico-
aristotélico para dar certa lógica ao que o tal judeu disse pelas
palavras dos evangelhos não-sentenciais. Se não fosse a Grécia, o
que seria de Roma? Se não fosse a Roma doutrinada na teoria da
contradição, o que seria do corpus romanum, sobre o qual o sangrento
e pavoroso cristianismo sionista surgiu?
Religioso: Olha Ateu, eu não tiro a sua razão do ponto de vista histórico-
filosófico. Nosso povo mesmo sofreu muito nas mãos dos reis católicos
e dos inquisidores cristãos. Há um erro aí em dizer que o cristianismo
seja um projeto sionista. Por que criaríamos um projeto de tamanha
intolerância e ódio contra nós mesmos e contra todos os cidadãos
decentes do mundo?

Perto dali, o Cientista lança a corda para baixo, após ter alcançado o
cume da montanha.

Cientista: Caramba! Que bonito! Que fantástico! Que maravilhoso! É


inacreditável!

Agnóstico: Diga, Cientista, o que vê aí de tão maravilhoso?

Cientista: É inexplicável! Vou me jogar!

E o Cientista se joga.

Agnóstico: Fique aqui, Sábio. Vou lá ver que negócio é esse, que é tão
maravilhoso. Mas, se algo me acontecer, chame o resgate. Que estranho!
Me parece algo hipnótico, transtornador.
Sábio: Não se deixe iludir pelo externo, pense que o que vê é só efeito
de superfície, efeito sem causa, nada mais. Isso poderia ajudar você,
quando chegar lá em cima.

Enquanto isto, nossos amigos: Religioso e Ateu tentam retornar a trilha


correta.

Religioso: É, Mordehay, nem sempre a cultura salva. Cultura, erudição,


e inteligência são inúteis, se não tivermos: perspicácia, sensibilidade e
criatividade, quando estamos perdidos.

Ateu: Ibrahim, veja. Aceite a situação: estamos perdidos, mas vamos


nos encontrar, pois de acordo com os meus cálculos, eles devem ter ido
mais ao norte. Estamos perto deles.

Religioso: Que o Deus de Isaac te ajude Mordehay. Estamos no inverno,


e eu não gostaria de congelar por aqui. Até que a universidade dê falta
de nós, deveremos estar mortos.
Ateu: Alegria, Ibrahim! A morte é apenas um dos muitos possíveis! Já
leu algo sobre universos paralelos e Teoria das Cordas?

Religioso: A ciência também é uma narrativa ficcional.... Veja,


Mordehay! Lá no alto! É Yehudan Scharovsky!

Ateu: E aquele ali, é Senhor Bhagavan Lunático Fugido do Hospício!

Religioso: Vocês ateus não respeitam ninguém!

Ateu: Não tenho culpa, se nasci para pensa!

Religioso: O pensamento sem a sensibilidade é muito pouco. Espero


em Deus que possa viver o suficiente para aprender a tolerar o próximo
e aceitar o mesmo com se fosse seu irmão.

Ateu: Veja! Scharovsky está gritando algo!

Agnóstico: Puxa! Que maravilha! Que beleza!

Sábio: Lembra, homem! Lembra do que te disse, não se iluda com as


aparências.

Neste momento, Mordehay e Ibrahim chegam onde o Sábio se encontra.

Ateu: O que ocorre aqui, lunático?

Sábio: Ocorre o que a sua visão limitada e ignorante pode ver, pois o
pior dos ignorantes é aquele que ignora que ignora.

Ateu: Há! Escondendo o jogo, né? Eu tinha certeza que você tinha lido
Platão escondido no banheiro lá em Nova Delhi. Bem, em Nova Delhi
tem banheiro, lunático?

Sábio: O homem deve conquistar a humildade. A verdadeira humildade


é conquistada, é como a verdadeira liberdade e verdadeira fraternidade.
São coisas que não te são dadas, pois tem que ser conquistadas. Eu sei
que nada sei, mas ainda falta muito para mim, pois diz Sócrates pela
boca de Platão, que as quatro etapas para a aquisição da verdade são:
conhecer a sua ignorância, ignorar a sua ignorância, conhecer a sua
sabedoria, ignorar a sua sabedoria.

Religioso: Vamos parar com a troca de elogios! O que há lá em cima?


Onde está Yevgeny?

Sábio: Os dois subiram.

Lá em cima:

Agnóstico: Vou me jogar! É lindo!

Ateu: Há algo ali! Talvez uma substância hipnótica, algo que os leve a
ter alucinações. Acho que devemos convencer ele a resgatar Yevgeny a
descer dali.

Religioso: E quem fará isso? Você? Com a sua fantástica intelectualidade


enciclopédica? Santo Anselmo deve estar orgulhoso de você! Mas, me
diga, Ateu, para que serve o retângulo lógico agora? Eu vou subir!
Bhagavan, peço que cuide dele. Daqui, o único equilibrado é você.
Caso, algo de mal nos aconteça, leve Mordehay de volta a Moscou e
avise as autoridades, sim?

Sábio: Homem! Não suba! Não sabes o que há lá! As vezes desconhecer
o desconhecido é melhor que desconhecer aquilo que se pode conhecer.

Religioso: Eu te entendo, Nobre Homem; mas, não posso te compre-


ender. Tenho que subir. Homem Santo, dá-me a tua benção!

Sábio: Sim, eu te dou estas palavras: o que vês é o que queres ver, nada
há além disso; pois a verdade tem que ser buscada dentro, e não fora.
Da mesma forma, que a linda ninfeta será destituída da beleza um dia
pela intersecção e intercessão do Senhor Tempo com tudo o que é falível;
então, desta forma, tudo o que a mente pode contemplar é o movimento
da velocidade na aparência. Se tiveres que ir, vá! Mas, não confia nas
trevas dos teus sentidos, pois eles mentem para ti! Transforma as
impressões, pois tal como uma mulher velha já foi bela um dia, o que
hoje é conhecimento, ontem, na irmandade com o ser, e
complementando-se divinamente com ele, foi parte da verdade
monádica. Que seja feita a vontade da Lei e de Seus Juízes!
Ateu: Opa! Esqueceram de convidar Anúbis e o Faraó para a festa!
Amenhotep onde estás tu? Olha, Sábio, assim que eu puder vou arrumar
um jeito de te dar um haloperidol, uma risperidona, viu? Assim você
não pode ficar, não!

Religioso: Bhagavan Asclóia, tenha paciência com ele! Imploro em


nome de meu Deus, e em nome da honra do que tu acreditas!

Sábio: Chame de vazio, o princípio de toda a Lei, pois o vazio torna


tudo cheio.

Ateu: Não falo mais contigo, Sábio. Vou ler David Hume, e quando
isto acabar, vou fazer questão de arrumar a tua deportação.

O Sábio olha com compaixão para o Ateu, e segura a corda para o


Religioso subir. O Religioso se atira junto com o Agnóstico em direção
ao que pensavam ver. Conforme o combinado, o Santo Homem do
Ganges e o Judeu Genial e enciclopédico, começam o caminho de volta
a cidade do czar e ao túmulo de Vladimir Ilitch Ulianov, mas aí, já é
outra estória...

V
O Ateu e o Sábio estão no mesmo lugar em que os deixamos na última
vez. Está anoitecendo e a fome começa a incomodar.

Ateu: Está anoitecendo e nós ainda estamos aqui. Creio que o quer que
haja lá em cima, não seja algo que possamos compreender. Talvez o
máximo que tenhamos aí, sejam conjecturas.

Sábio: Vamos procurar um lugar para passarmos a noite.


Ateu: Do jeito que a coisa vai, daqui a pouco vão achar que você me
levou para a Embaixada da Índia para pedir asilo (risos).

Sábio: Creio que a embaixada de meu país seja mau negócio. Se quiser
realmente sair daqui, tem que ir à Embaixada Americana (risos).

Ateu: Sabe, Sábio? Esquecendo as nossas diferenças, até que tu não és


má companhia.

Sábio: Como se diz no ocidente cristão: a oportunidade faz o monge!


(sorriso).

Os bons homens começam a andar em busca de um lugar mais


aprazível para passar a noite na densa floresta. O silêncio, a grande
companhia dos homens sábios, acompanhou por um bom tempo
ambos os homens na caminhada. Quando chegaram a um lugar
aberto, ali ficaram, pois as equipes de resgate, caso viessem,
poderiam vê-los. Eles teriam maiores chances de localização em
clareira aberta.

Em um dado momento, Mordehay (o Ateu), dono de mente inquieta,


reinicia o diálogo:

Ateu: Sábio, estou com fome e temos aqui uma barra de chocolate
apenas. Sugiro dividir a mesma entre eu e você igualmente.

Sábio: Guarde o chocolate para a sobremesa, Ateu, vamos jantar hoje.

Ateu: Como?

Sábio: Você verá.

Com o auxílio das lanternas remanescentes, e, do treino em artes


marciais, que desenvolveu à níveis de desperticidade as suas habilidades
motoras e perceptivas, o Sábio consegue dois coelhos e uma ave para o
jantar.

Sábio: Está aqui. Beba o sangue, é nutritivo.

Ateu: Mas, vamos comer cru, assim?


Sábio: Diante das situações, nós sempre temos escolhas por piores que
sejam. Veja as suas: 1 – você pode não comer e não tomar o sangue,
mas ficará fraco demais para reiniciarmos a caminhada amanhã; 2 –
pode fazer fogo, cozinhar o alimento e dar adeus a esta floresta, a sua
vida e a minha, e com certeza não precisará caminhar amanhã; 3 – pode
comer o chocolate e manter as suas reservas energéticas para a
caminhada de amanhã; 4 – pode desistir agora e nada mais fazer em
prol de si mesmo; 5 – pode fazer uma refeição completa e comer a sua
parte no chocolate, e desta forma garantir as suas condições de
sobrevivência de forma otimizada, ou seja: fará o melhor esforço pelo
melhor objetivo.

Ateu: Dá-me o sangue do coelho, e vamos comer!

Sábio: O homem não sabe que tem asas, na medida em que toma
consciência das asas, vê as idéias a grandes alturas e pode contemplar o
conhecimento, e desta forma não precisa mais olhar para trás, pois o
presente torna-se o seu maior aliado. Seus planos são os planos
necessários, e ele jamais vive em um futuro impossível. Ateu, quando
eu digo que um avião passará nos céus da estação de Baikonur amanhã
a tarde, onde está esse avião?

Ateu: No tempo.

Sábio: E o que é o tempo?

Ateu: Uma essência vazia.

Sábio: E, então, esse avião existe?

Ateu: Não, pois no momento é só uma ideação, algo apenas imaginário,


mas Spinoza diz que a imaginação pode criar, não é Sábio?

Sábio: A imaginação do homem de Leonardo da Vinci é autentica, mas


a imaginação do homem no Ego é tal qual um prato de plástico, um
carro Trabant ou como o sistema planificado de governo. São apenas
coisas permanentes. O que é permanente dura muito tempo, mas o que
é eterno é mais real, pois até mesmo a eternidade é finita, pois como
disse Nietzsche na linha de Spinoza: torna-te aquilo que és... e estarás
além da eternidade, no mundo monádico de Leibniz.
Ateu: Não entendi, homem! O que é esta imaginação que dizes ser a
mais real?

Sábio: Dos céus saem os demônios e os anjos. Dos céus sai o bem e o
mal. Dos céus sai o verdadeiro e o falso. Dos céus sai Lúcifer, o Príncipe
da Luz, e também Judas, o Grande Mestre. A verdadeira iluminação
resulta do descobrir-se a si mesmo, do trabalho na Forja de Vulcano e
na força iluminadora dos Arcanos treze e doze.

Ateu: Que explicação confusa, Sábio! Me traduz isso aí!?

Sábio: Não há qualquer empreendimento de maldade que não tenha


um pouco de bondade. Veja: nem todos os integrantes da Gestapo eram
anti-semitas e muitos integrantes das polícias políticas alemãs
estenderam a mão a seus irmãos judeus! Não há qualquer empresa boa,
onde não resida o mal, mesmo com a melhor das intenções podes dizer
a palavra que fere e destruíres uma amizade de anos! Imaginar é estar
além da mente, e estar além da mente é renunciar, nem que seja por
pouco tempo, ao processo raciocinativo; é ser apenas um com o que há
de Real em você mesmo!

Ateu: Eu não te entendo muito bem. Talvez o fato de eu ter sido produto
de estado ateu, e de tu teres vindo de um mundo espiritual, dite a
diferença natural de nossas mentalidades.

Sábio: A consciência, embora seja somente um órgão adaptativo,


(portanto datado), foi uma boa invenção; pois é tão permanente o quanto
te mantenhas no estado do Ego.

Ateu: Homem, vamos dormir. Tenho sono.

Sábio: Durma bem, Amigo.

Ateu: Obrigado por ter a mim como Amigo, mesmo após tudo o que eu
disse a ti.

Sábio: O homem que vive da ilusão é como um homem muito rico que
tem tudo, e não tem com quem contar. O homem que despertou para o
caminho é como um homem muitíssimo rico e que tem uma pessoa
muito importante com quem contar sempre.
Ateu: E quem é essa pessoa?

Sábio: Disse Nietzsche: Ecce Homo: Como Tornar-te Aquilo que És.

Ateu: Seria o contar consigo mesmo?

Sábio: Talvez.

Ateu: É, Sábio. O problema é a ocultação. Quando a gente pensa que


está chegando a uma conclusão, você mesmo trata de não concluir.

Sábio: Seria bom que você descansasse; amanhã teremos uma longa
caminhada. Mas, quero te deixar uma última: “o que é mais necessário:
uma grande conclusão ou uma grande busca?”

Ateu: Boa Noite!

Sábio: Use a manta, vai ficar frio. Boa Noite!

A noite transcorre bem, e o dia amanhece, e ao longe se ouve vozes:

Cientista: Deve ser por aqui. Mordehay, de certa forma me mandou


observar melhor o mundo; e o conselho dele parece me valer para algo.

Religioso: Falando do diabo, Yevgeny? Olha ele ali! E ainda por cima
com um Anjo ao lado!

Agnóstico: Deve ser uma miragem mazdeísta. O Grande Santo de


Hipona, pelo que vejo, não transformou em Bíblia as suas Confissões.

Cientista: Mordehay! Que Asmodeu o carregue, maldito homem! Como


é bom vê-lo!

Ateu: Tomara Yevgeny que isso seja mesmo verdade, pois odiaria ficar
num céu judeu cercado por homens puros, santos e incorruptíveis. No
inferno, pelo menos, faço negócio!

Religioso: Santo Homem! Estás bem?

Sábio: Estou, e tu? Como estás?


Religioso: Melhor agora ao ter ver com vida! E como lhe saiu a
companhia?

Sábio: Um bom aprendizado para ambos.

Ateu: Retiro o que eu disse, acerca deste homem! Eu errei com relação
a ele. Não é porque alguém seja muito diferente de nós, que temos o
direito de hostilizar. A necessidade nos torna irmãos. Ele passou por
cima das diferenças, e aqui estamos. O homem do Ganges agora é meu
amigo, muito embora Deus para mim, continue sendo apenas uma ficção
forte.

Sábio: Tens razão, Ateu. Deus não existe mesmo.

Cientista: Pena que o grande Voltaire não esteja aqui conosco. Ele
sorriria de bom grado!

Agnóstico: Muito bem, homens, alguém sabe como se sai daqui?

A caminhada reinicia, e tanto o Religioso, quanto o Cientista e o


Agnóstico não lembravam do que tinha acontecido. Para eles não havia
passado a noite, e pareciam apenas que algumas horas haviam passado
entre o encontro e o desencontro, mas a discussão no caminho de volta
foi produtiva e convém que ouçamos antes de nos ausentarmos.

Cientista: Temos que buscar unir forças entre diferentes, pois nem todos
são iguais e não o podem ser. Somente a força unida constrói.

Sábio: O homem que busca o que está além, encontra o que está próximo,
e este é o homem inteligente. O homem que busca o que está próximo,
encontra o distante, e este é o filósofo. O homem que busca a “si mesmo”,
mas não quer encontrar com sinceridade, que se perde tentando encontrar
em um quarto escuro, um objeto que não mais está lá, é o psicanalista.
Os cientistas, filósofos analíticos e psicanalistas só vêem problemas
onde é conveniente vê-los.

Cientista: Voltaire disse: não concordo com uma só palavra que este
homem diz, mas defenderei até a morte o direito dele as dizer. Não
creio que a ciência seja isso! Graças a ciência temos tomógrafos,
aceleradores de partículas, satélites e remédios para hipertensão e
depressão. Hoje um livro é impresso num conjunto de horas, e
estabilizantes conservam alimentos por cinco anos no mínimo. Sábio,
você tem que admitir que a ciência funciona!

Sábio: A ciência é só uma máquina de salvar as aparências, nada mais.


O fato de algo funcionar não lhe confere nenhuma autenticidade. A
vida no Ego é como as telas de cinema, depois que o filme acaba, fica
só a tela. Atrás de uma aparência há apenas outra. Muito prazer! Meu
nome é Heliogábalo, fui concebido em uma bacia de esperma, e tu jamais
dirás de mim o que eu sou! Só podes dizer a realidade pelo que ela não
é, e isso não é dizer a realidade! Isso é dizer de uma coisa, outra coisa
diversa! Se digo: que o Direito é o Direto, então estou certo, mesmo
que com isso eu não tenha uma definição do que seja Direito. Mas, se
digo: que o Direito é o conjunto de teorias e sistemas filosóficos criados
para juntamente com a Política prover o homem do que seja digno e
justo, aí eu já estou me enrolando, pois eu não sei o que é dignidade e
nem justiça. Quanto mais eu digo, mais eu deixo de dizer.

Ateu: Maravilha! Este Homem do Ganges está saindo melhor que a


encomenda! Olha, Homem, esquece esse negócio de psiquiatra, pois
estou vendo que és ateu!

Sábio: A crença e a “não-crença” são os dois lados contraditórios da


ignorância. O Homem Sábio não crê, e nem deixa de crer, pois como
disse Platão no Protágoras: a verdade não existe!

Religioso: Boa, essa, Sábio! E agora “Mordehay-Sabe-Tudo”? Sai


dessa! (risos)

Ateu: Gosto mais de Aristóteles que de Platão. (risos)

Sábio: Aprecio mais o aprendizado no presente da vida infinita, que


vastas bibliotecas cheias de informação. No final informação é
pouco, pois o tempo a consome. O saber é eterno, pois se reaviva
constantemente no presente do Sábio, que tem consciência de si
mesmo e deixa de ser expectador do mundo, pois passa a agente do
mundo. O Sábio compreende que o processo raciocinativo é só isso:
um processo.

Agnóstico: É um “Caso Paradigmático” (risos), fora de toda a dúvida.


Ateu: Tem volta, Sábio. Mas, a volta vai ser acompanhada de um bom
vinho que comprei de uma adega em Varsóvia no bairro judeu. Dizem
que um santo rabi abençoou a adega e por isso o vinho é tão bom. Bem,
um santo vinho a um Santo Sábio!

Todos riram alegremente. Nossos bons amigos já estavam na cidade


quando Mordehay (o Ateu) pronunciou a frase final e nós os
abandonamos, ao longe se vislumbrava o Palácio do Czar, e o túmulo a
céu aberto de Vladimir Ilitch Ulianov. Lênin olhava-os do fundo da
Praça Vermelha e... Opa! Piscou os olhos? Bem, isso é outra estória....
He, he, he....

VI
Na cidade do Czar tudo está eventualmente tranqüilo na data de
hoje. Mesmo com as péssimas noticias que se avizinham do lado
cinza de Berlim. Pressões internas e fugas em massa parecem que
vão redesenhar a História do Ocidente, Erich Honnecker, como se
sabe pôs um fantoche em seu lugar, o muro deve desabar em breve,
devido a pressões do lado ocidental. Mas, mesmo assim, duas figuras
caminham lentamente por uma das ruas nas proximidades da cidade
para sempre eterna, onde Lênin ensaiou os primeiros passos de um
novo tipo de sociedade.

V.M. Astaroth: A questão principal para mim é a mente. Na medida em


que demos à mente o seu devido lugar, me parece fácil à transcendência.

V.M. Chavajoth: E a questão teológica? Mesmo com as várias


invenções, dos cristãos, muita coisa verdadeira se encontra ali. Na
medida em que podemos enxergar com claridade, vemos as nossas
próprias verdades ali.

V.M. Astaroth: O que você pode ver? Se não o que quer ver? Durante
o transcurso do Ensinamento, que nos vem desde os Sumérios, Caldeus,
Babilônios e Egípcios de primeira hora, olvidamos as vozes do oriente.
Quisemos que o mundo e o outro mundo se conformassem as nossas
crenças. A partir da criação do Pensamento demos forma ao Inominável.
Agora, acreditamos que a nossa construção seja verdadeira. Até mesmo
a nossa construção é uma razão de verossimilhança com um modelo
falso, e, portanto, o que vemos é falso. Somente aquele que é não-
mente pode contemplar o absoluto nada.

V.M. Chavajoth: Os estudos do Instituto de Física desta capital apontam


para a comprovação de várias teorias fomentadas tanto pelos pré-
socráticos, como Heráclito e Demócrito, como por Aristóteles e os
escolásticos. Parece-me que há verdade aí.

V.M. Astaroth: A verdade é uma invenção apenas. Os Egípcios não


tinham nenhuma verdade, mas, a palavra egípcia era uma palavra eficaz.
Graças aos astrólogos e matemáticos do reino, foi possível desde muito
cedo prever os eclipses e então era informado ao povo que naquele dia
o Faraó faria o Sol se esconder. Puro efeito de superfície. Não havia o
advento da verdade. A verdade foi inventada pelos cristãos, e por ser
uma invenção, como o cristo o é, é puramente falsa. Uma razão de
verossimilhança.

V.M. Chavajoth: Mestre, mesmo no mais perfeito mundo do ateísmo,


me parece que no coração do homem ainda há uma faísca de Deus.
Será que os cristãos e os judeus são tão desligados assim da realidade?
Veja, Mestre, eles não nos conhecem, mas, diante de sua inocência
construíram o mais lindo dos céus.

V.M. Astaroth: Homem, você está a confundir o sagrado com o território


do sagrado. O sagrado é uma dimensão inerente ao homem que
contemplou a imanência. O território do sagrado é apenas uma invenção,
como deus, cristo e outras. São apenas imagens imanênticas. O sagrado
é diferente do território, pois o sagrado compõe com o Pensamento, e o
Pensamento é como o vento, que quanto mais ensurdecedor, mais audível
o é.

V.M. Chavajoth: A tal chama que vemos no coração do homem


inteligente é o que, se Deus não existe?

Os dois bons homens autênticos circulavam lentamente a Praça agora,


quando perceberam a aproximação de outro Grande Homem em missão.
V.M. Astaroth: Grande Andramelech! Benditas as forças geofísicas do
plasma imanêntico que aqui te trazem! Não estavas em Pequim?

Andramelech: Um Grande Homem não é aquele que vive no tempo e


nem para o tempo. O Grande Homem é Senhor do Tempo, pois é Senhor
de Si-Mesmo.

V.M. Chavajoth: Andramelech, poderia nos dizer acerca da chama que


repousa no coração do homem. Como poderíamos dizer desta chama?

Andramelech: Houve um tempo em que Deus era igual ao homem,


isto foi no advento da criação de Deus pelo homem. Era, então, Deus
perfeito. Entretanto, o homem criou Deus para se reportar ao há de
real em-si-mesmo. Ele resolveu se conhecer, e viu que seria mais
penoso se conhecer do que creditar a qualquer coisa sobrenatural as
suas dores. O homem torna-se, então, inteligente e passa a orientar
a sua mente rumo à externalidade. O homem tenebroso, inteligente
e covarde passa, também, a creditar as suas próprias conquistas à
um Deus derrotado pelos Romanos. O Deus eleito pelo homem
inteligente queria ser um Faraó em província romana, mas,
apresentou-se às autoridades destituído de Máquina de Guerra. A
chama que ainda crepita no coração do homem inteligente não é a
de um deus, muito menos é uma invenção, mas, provém do que há
de Real-Em-Si-Mesmo, é a Mônada, O Real Ser para sempre imortal,
o Real que está além da realidade, além da eternidade.

V.M. Chavajoth: Me parece confusa essa explicação. Se Deus não


existe, esse real, necessariamente, é falso. Pois a realidade sendo
superfície, e, não se podendo dizer de qualquer coisa aquilo que essa
coisa seja, a não ser por tautologia, que não é garantia alguma de verdade,
então, até o Real Ser é tão real como um sonho evanescente dos
autômatos que se dizem homens e se pretendem à inteligência.

V.M. Astaroth: Lembra-te, Venerável Mestre Chavajoth, que no inicio,


um dia no caminho da verdade, todos aqui éramos unos com a Dignidade
da Força. Quando resolvermos ir direto Rumo à Vitória, a nossa
dignidade com a Força passou a ser apenas o Despertar da Consciência
para as Leis Universais. Não lembramos mais do inicio. Mas, no inicio
o Real Ser está lá. Mas, agora, somos nós no caminho infindável da
busca, sós em busca da luz na Vitória Final e Garantida.
V.M. Chavajoth: A questão da Vitória me incomoda. Se somos
vitoriosos, por que não temos tudo e mais o mundo do inefável?

V.M. Astaroth: Chavajoth! Nós criamos o mundo do inefável no inicio


dos tempos! Há tanta realidade neste mundo quanto em uma tela de
cinema. Nada há! O que queremos? Criar? Então, criemos! Mas, que
não acreditemos que há qualquer verdade que não seja falsa!

Andramelech: Aprende que no caminho há apenas duas coisas: a estrada


e a experiência oriunda do caminhar! Os dois são dinâmicos! A estrada
nunca é a mesma e a experiência é sempre acrescida pelo novo caminhar.
Por isso, despertamos a consciência. O despertar da co...

VII
O Sonho no Mosteiro

Chego à imensa catedral. As torres sobem ao mais alto dos céus. Torres
sem fim de beleza esplendorosa. Adentro a formosa construção. Em
lugar de padres e seminaristas, em lugar da língua de Deus, encontro
com o vazio. A escuridão encobre a beleza. Não fui a este lugar para
rezar, pois não converso com secretários. Também não fui em busca de
um Deus martirizado pelos Romanos. Fui em busca daquele que é tão
lindo, tão ficcional que a ele os escolásticos reservam lugar de destaque
em sua filosofia. Impossível não falar dele. Impossível ficar sem falar
dele. Impossível ficar sem ele. Impossível ausentar-se de Sua Presença.
Impossível ficar em Sua Presença. Ele não tem nenhuma verdade. Ele
as cria! Ele é o Criador, um homem autêntico.

Continuo minha caminhada pela nave. Mesmo no escuro, meus pés


acostumados aquele divino chão, ornamentado pelos mais brilhantes
engenheiros, construtores, pintores e artistas, não erram. Nossa amada
Igreja, imbuída dos mais nobres intentos, e certa de servir e preservar
os bens do Senhor, pagou a peso de ouro com a ajuda do Rei os melhores
de até então e para todo o sempre. Eis que me deparo com a entrada.
Fechada. Que está acontecendo? A Universidade, a “Universitas
Scholarium” é logo atrás da divina construção. Ouço vozes distantes.
Deixo a nave. Retorno à rua e dou volta imensa, até que chego aos
jardins. O movimento de “disputas” (disputatio) e “questões” (quaestio)
está estancado. Sinto um clima opressivo no ar. Sinto que talvez este já
seja outro possível. Olho em direção ao magnífico relógio da torre, são
onze horas e quarenta e cinco minutos. Talvez. Talvez seja. Não estou
bem certo.

Ouço um estrondo! Ele vem dos céus! De repente escurece. Chove


grotescamente. Abrigo a mim junto a uma coluna. Que vozes foram
aquelas que ouvi? Está tudo tão deserto! Quem eram? O que eram?
Como? Será que há pessoas aqui? Não vi ninguém na rua.

Olho novamente em direção ao relógio da torre. São onze horas e


quarenta e cinco minutos. Que fissura se encontra neste fluxo de
duração?

Continuo andando. Atravesso com vagar os largos jardins. As torres.


Passo por cômodos. Chego ao jardim dos monges. Já é dia de novo. O
sol é agradável. Talvez seja primavera. Não estamos no inverno? Que
horas são? Ainda avisto a torre do relógio... a hora é a mesma. Osirac é
a primeira criatura que vejo desde que pensei que pensei que dormi e
acordei. Não estou bem certo disto. Se eu estiver sonhando? Se eu for
parte do sonho de outro? Será que Osirac está a sonhar o que eu sonho?
Apresso-me a seu encontro.

V.M. Astaroth: Venerável Mestre Osirac, me perdoa tirar a vossa pessoa


de tão sublime contemplação. Quero vos inquirir acerca de algo que
inquieta o meu espírito. Que aqui se passa?

Osirac permanecia em silêncio. Quase não falava. Apenas ouvia,


contemplava, meditava. Suas palavras eram como o mercúrio dos
iniciados. Eram poucas, porém de muita força. Parei para contemplar o
horizonte. Já é noite de novo. São onze e quarenta e cinco. Talvez.

Vozes ao longe.

Homens em passos rápidos. Olho para trás. É o monsenhor. Ele se faz


acompanhado do Sua Eminência e de duas Excelências. Um padre
inquisidor também vem junto. Um grande séqüito de clérigos vem ao
encontro. Seculares se misturam com os ordenados. Por que tantos
monges nesta diocese secular? Pode ser que a resposta esteja a caminho.
Pesada noite parece cair em nossos seres. Trevas parecem abrasar a
terra. O fogo sobe das colunas em direção ao céu. Fogueiras ardem...

O Monsenhor passa por nós. Ninguém nos vê. Parece que não estão
interessados em nós. Em meio a todos, vejo um rosto conhecido. O
ódio santo desses benditos que vem em nome do Senhor e de Sua
Santidade é de beleza descomunal. Quanto bem eles fazem em defender
a fé, as boas obras e os bens do Crucificado. Trata-se de homens com
lugar de tal forma reservado no paraíso que qualquer mal que venham
a cometer, se é que tais santos em vida cometam algum pecado, já está
perdoado de antemão pelo deus do trono romano. Trata-se de homens
prudentes, piedosos ao extremo. Exigentes trabalhadores são eles.

Dirijo a palavra a Osirac, muito tempo após do tempo, muito tempo


além do tempo:

V.M. Astaroth: Que querem os homens tão santos que seus pés sequer
tocam o chão?

Osirac: Há homens que se contentam com pouco, outros somente com


muito. Há homens que se contentam em saber, outros em conhecer. Há
homens que tem a verdade, outros afirmam que ela é com eles. Há
homens que buscam, outros ousam encontrar. Há muito poucos que são
atravessados pelo pensamento, que nada desejam e que tudo têm. Desses
poucos se pode tirar tudo, e eles permanecerão ricos. Pode-se lhes tirar
a vida e eles permanecerão no fluxo... Fogueiras ardem do lado de fora...

Ouço uma linda missa, mas não saio do lado de Osirac. Talvez não
adiante. Talvez eles voltem. Voltem para nos inquirir. Suplícios, dor,
pedidos de clemência encontram surdos ouvidos ao longe. Inicia-se o
órgão. Schutz está ao fundo. A beleza compõe com a agonia dos espíritos
suplicantes. A própria música em uma potência, em uma composição,
clama a Nosso Divino Salvador que tenha misericórdia de suas almas.
Aos monges piedosos nada mais resta a fazer.

São onze e quarenta cinco, embora muito tempo ainda tenha passado.
As ampulhetas parecem desafiar Aristóteles. Talvez o grande Averróis
observasse estupefato o movimento, talvez não. Ibn Arabi poderia
estar aqui conosco, ou não. Entro na Igreja novamente. A nave
banhada na escuridão. Forço a porta. Fechada. Dou a volta. Nenhum
rosto familiar ou humano. É dia. Adentro ao jardim. Colunas
formosas sobem aos céus. Chove. É noite. Adentro aos portões. Eis
que dirigindo-me pelo corredor, diviso entre as trevas a figura do
Monsenhor. Os livros de Raimundo Lúlio estão em seus braços.
Continuo andando. Os olhos do Inquisidor são divisados mais
adiante. Ele para diante de mim, e diz:

Inquisidor: Em nome de Deus, Nosso Senhor, Altíssimo, diga toda a


verdade que possais saber. Quem aqui esteve que nos roubou o
Pensamento?

V.M. Astaroth: Como pode isto, Padre? Somos afectados ou não pelo
pensamento, ou compomos com ele, ou somos atravessados por ele.
Sendo assim, como podem roubar algo que vós não tendes?

Monsenhor: Astaroth, tu estás de que lado? Queres a “participatio” ou


a “methéxis”? Há essência ou há a forma?

Penso. Em um piscar de olhos, os piedosos senhores sobre mim afinam


os ouvidos. Desejam ouvir toda a palavra que de mim vier.

V.M. Astaroth: O homem que deseja nada tem. O homem que almeja
não alcança. O homem que quer não pode. O homem que pode não
quer. Que sorte de homens é esta que crê que as coisas sejam como
são? Se isto não for um jogo, o que é então? Se isto não for o que é? O
que é o que não é? Como é que os senhores se tornaram no que pensam
do que pensaram acerca do que vocês poderiam ser?

Inquisidor: Vê! Ele nos roubou o Pensamento. Está na batina dele.

Monsenhor: Detenham o Pensamento. Ele foi por ali!

Os nobres homens nunca correram tanto quanto naquele momento. O


Pensamento era veloz. Compunha com velocidades leibnizianas na linha
atemporal da fissura, da dobra. Os Santos Homens sumiram na distância.
Continuo o meu caminho.
Termino de atravessar o corredor do mosteiro, onde questões e disputas
repousam no silêncio. Osirac está a meditar, contempla com olhos fixos
o horizonte. É dia. São onze horas e quarenta e cinco minutos. Talvez.

V.M. Astaroth: Osirac, que me perdoem os deuses por te tirar do


colóquio, mas o que está a acontecer?

Osirac: Venho meditar aqui. Te encontro muitas vezes ao dia. Olha o


que tu fazes logo ali. Gritas? Vieram roubar o Pensamento, mas tu o
escondestes! Tu o carregavas em tua batina o tempo todo! Pobres
homens, pobre de ti. Tu és agradável, um bom amigo. Ainda bem que
estás morto.

O tempo continua a sua marcha implacável em outro possível onde os


efeitos possam ser sentidos. Aqui não mais, pois forças descomunais
derrubam a torre do relógio. É hora dos nobres monges viverem. É
hora de zelar pelas ovelhas do Senhor. Exultai-vos, Ó Senhor! Pois
estavam a roubar as suas ovelhas e esses homens guardam as vossas
riquezas!

VIII
O Sonho na Universitas Scholarium

“Universidade Estatal da Capital – Centro Politécnico” é o que estava


escrito na entrada da faculdade de engenharia. Chegamos agora também,
mas a tempo de observar ao longe Anzelm Volker dirigir-se como de
hábito a escura sala. Os alunos vão tomando os respectivos lugares.
Tudo em silêncio na perfeita ordem imposta pelo sistema planificado
de governo. Entra o professor de “Noções de Física Quântica”, um certo
senhor aclamado pelo mundo como uma das mentes mais promissoras
nesse campo, o senhor Vizchvancherday Organy. A aula começa.
Gráficos e matemáticas complexas até para os engenheiros do sistema
presentes começam a encher o quadro negro. De vez em quando aparece
um operador matemático aqui, uma integral lá e tem horas que nem a
matemática se encontra como a que render tributo a Leibniz, o grande
matemático da corte onde em seu pensamento, em sua ficção, física e
filosófica, nada dava certo, pois somente Deus pode ser o autor perfeito
da realidade. A aula continua.

As aulas são nos moldes desse país próspero, rico e standardizado. Todos
os prédios são cinzas. As ruas são cinzas. Os carros cinzas. A marca de
sabão em pó é cinza. A impressão que se tem é que se vive a realidade
em tons de cinza, ou melhor: em preto e branco, com matizes de cinza.
Mas, este é o realismo do sistema de planificação, onde não importa se
os pregos que produzimos servem ou não para algo, mas sim que os
produzamos! Talvez não haja melhor lugar para as mentes ociosas que
odeiam o ócio contemplativo dos filósofos e das grandes mentes da
ciência e da literatura.

Anzelm Volker está dormindo na parte de “sistemas vetoriais de campo


de não se sabe mais o quê”, pois nem nós estamos muito a fim de
entender o que se passa na cabeça do cérebro físico do sistema. Ao seu
lado está Hrinda Vloskow aluna do mesmo ano de engenharia que
Anzelm. Hrinda é um cérebro na parte de matemática. Veio de Bratislava
para estudar aqui. Foi aceita com recomendações. Parece que ela tem
futuro por aqui. Mas, parece que por aqui ela também pode assistir os
canais de televisão cujas antenas são maciçamente dirigidas para
“contornar” os controles estatais. É sabido que quem assiste a tais canais
e for pego pela policia política é julgado como “inimigo do povo e do
Estado” e o seu destino é a prisão estatal da capital onde nem a Anistia
Internacional e coisas do gênero entram!
Anzelm agora nem vê o professor Vzchivancherday Organy deixar a
escura sala. Hrinda se levanta, vai até a janela para apreciar a paisagem
igualmente cinza que se descortina a sua frente, árvores cinzas (devido
ao escapamento dos automóveis “Trabant” – diz a propaganda estatal:
“você ainda vai ter um” – também pudera é o único carro a venda!),
fábricas cinzas, ônibus hidramáticos húngaros cinzas, pessoas cinzas.
Tudo é cinza, contrastando com a profusão de cores dos canais vindos
do ocidente que se finge cristão. Hrinda até que gostaria de acreditar
em Deus. Ela vê as gigantescas igrejas mostradas pela TV Vaticana que
tem as suas antenas apontadas para lá em Super Alta Freqüência. São
lindas! Deus é um grande ficcionista, se não o maior. Os livros de Artaud,
Deleuze, Lacan não entram no país. Lá só se estuda Marx, Lênin, Engels,
Stalin e outros. Pobre Marx, ele não sabia que seu livro serviria para
isso! Não sabia que um tal de Lênin iria inventar um tal de “Materialismo
Dialético” (mas, que pobreza de espírito!), e o que dizer do assassinato
brutal da dinastia Romanov? Gente sem coração, sem alma, por certo.

Hrinda lembra de ter lido na “Biblioteca Estatal da Capital” algo acerca


de Leibniz e Kant, devidamente censurado pelas mentes do sistema.
De toda forma havia nas prateleiras um exemplar muito antigo da
“Monadologia” de Leibniz. Hrinda leu a dedicatória, curta, ao Príncipe.
Ficou maravilhada! Que homem belo! Nele não há a menor prudência,
nenhum bom senso! Deus é pura extensividade! Beleza absoluta! Como
é falso! Algo tão belo só pode ser falso. Hrinda pensa mais alto: tal
como a verdade é produto do falso, pois só há o falso, se formos levar
em consideração as características de extensividade, então tudo é tão
verdadeiro, mas tão verdadeiro que no fim resulta em apenas uma razão
de verossimilhança. Nisto preservamos Deus em seu plano de falsidade,
de pura extensão. Como Deus é belo!

Ela continua na janela. Entrou há aproximadamente vinte minutos o


professor de “Cálculo X” (haja cálculo para manter vazias as mentes!).
Ele é alemão nascido ainda na época de Hindeburg antes da ascensão
do III Reich. Inicia a sua aula, mas nós não deixamos que veja Hrinda
na janela, pois seus pensamentos nos são caros (e muito caros, pois
como disse Plotino: “dá me duas coisas e eu criarei o mundo: a beleza
e o pensamento. Apenas duas.”). Hrinda olha para Anzelm que continua
a dormir. Ela continua lembrando de Leibniz e a questão dos possíveis.
Que estaria sonhando Anzelm agora? Seria possível compor com os
sonhos de Anzelm?
As torres sustentam-se como que no ar. Forte neblina toma conta da
cidade neste momento. É como se a Igreja se sustentasse por si mesma.
É um espetáculo. A cidade está acordando. São sete horas e os sinos
badalam. Comerciantes tomam as ruas. O dia recomeça. Anzelm anda
pelos floridos campos ao redor da grande basílica, o movimento de
“quaestio” e “disputatio” inicia-se. A segunda missa do dia vai tomando
corpo, o órgão está as alturas. É tudo muito lindo. Quadros de Tintoretto,
de Rembrandt, de Giotto inundam a nave secundária. De repente,
Anzelm sofre de um desejo súbito de deixar a nave. Desce as escadas.
Encontra-se com o patíbulo. Passa pela guarda suíça, que lhe presta
continência. Encontra as ruas. Seu desejo de encontrar as ruas é muito
forte! Asfixiante! Ele anda sem saber porque. Puxa um cigarro, para.
Acende. Puxa uma forte tragada. Logo a frente uma taverna. Anzelm,
um homem santo, adentra onde encontra muitos outros homens santos,
seculares, a beber. O ambiente é de pura santidade, devido a presença
de tão santos homens. Continuamos nossa caminhada ao lado de Anzelm.
A angústia cresce.

Anzelm Volker: Taverneiro! Um copo de vinho! Aqui!

Taverneiro: Por certo que sim!

Padre Secular: O que te traz aqui, ó monge santo? Não segues a uma
ordem? Não tens dinheiro que possa comprar a tua liberdade. Vamos
dizer de ti ao monsenhor e serás vítima de castigo cruel.

Todos da taverna riem efusivamente.

Anzelm Volker: Digno Padre, como seria bom para todos nós se nos
preocupássemos apenas com as nossas vidas. Temos tantos problemas
em nós mesmos, tanto trabalho a fazer, que o melhor seria que nos
déssemos a nós mesmos, e nos esquecêssemos dos outros se não fosse
para consolar as mentes aflitas ou para apor a calma necessária em
momento tão perdido. Taverneiro! Mais vinho!

Padre Secular: Amigos! Até o monge tem angústias! Vamos correndo


até o monsenhor! Vamos impor a este homem santo o “devido” castigo
devido aos santos!

A Taverna cai na gargalhada.

De súbito, movido por ódio incontrolável, Anzelm, o homem santo,


parte para cima do Padre Secular, igualmente santo. Anzelm saca de
uma faca e o perfura tão profundamente que o sangue quente de sua
vestimenta jorra. Os romanos ao redor vibram. César vai as lágrimas.
Júpiter Olímpico ao lado de Aquiles, o homem sem piedade, emocionam-
se. Até mesmo o deus dos cristãos volve o rosto pintado por
Michelangelo para contemplar a poesia da cena. A vida do Padre Secular
esvai-se lentamente. Alguém aparece para lhe transmitir a extrema
unção. O lugar do padre secular está para sempre garantido no paraíso,
pois morreu a serviço da dignidade da Igreja e a proteger os seus méritos.
Anzelm levanta-se. Taverna em silêncio. Ninguém mais está rindo. Mais
um copo de vinho é servido silenciosamente. Anzelm acende um cigarro.
Tragada profunda. O corpo é removido do Coliseu. Os Patrícios se
afastam. César está satisfeito. Somente o deus dos cristãos espera por
mais um lance, por mais uma jogada. Os dados estão lançados. Entra
Hrinda.

Hrinda: Anzelm! Que fazes em minha realidade?

Anzelm: Estava a matar aquele que me mata em meus sonhos.

Hrinda: Anzelm! Acorda! Estão a derrubar a vergonha que nos oprime!


Em breve seremos livres para assistir a televisão dos países livres!

Anzelm: Tu já rezaste hoje? Vem, vem comigo vamos terminar esta


bebida e vamos rezar.

Hrinda: Homem! Tu não entendes? Temos que voltar ao sonho! Não é


permitido que vivamos na realidade! Isso não é permitido. Vem. Acorda!

Anzelm corre até alcançar a Basílica. O Deus dos Cristãos está lá. Ele
olha, ele percebe a entrada de Anzelm na nave. De repente, as portas
fecham. Irá começar o julgamento. Deus se posta no melhor lugar, no
trono. Que honra ser julgado por Deus!

Deus: Este homem é culpado. Isto eu o digo.

Cardeal: Sim. Ele o é. Isto eu o digo.

Inquisidor: Eu não o vi cometer crime algum, por isso ele é culpado.

Notário: Por certo. Somente os inocentes são culpados neste tribunal.

Logógrafo: Senhores, gostaria de me incumbir da defesa deste culpado,


se é que me permitem. Não venho aqui apelar para a inocência dele,
mas tão somente para sua inconteste culpa.

O Padre Secular da taverna, morto minutos atrás, adentra ao recinto.


Sério, compenetrado, com a arrogância própria dos que sabem
estampada no rosto. Acena levemente para Anzelm.
Logógrafo: Senhores, e “Papa-Deus-dos-Cristãos” aqui presente. Por
certo, foi presenciado que Anzelm Volker é culpado do crime de pensar.
Crime este muito grave e que tem que ser severamente punido.
Entretanto, como todos sabem, quando se compõe com o Pensamento,
a individualidade se torna múltipla e, portanto, livre. Não há como matar
aquele que compõe com o Pensamento, pois este continua a fazer sentido
no jogo da multiplicidade, da extensividade, da superfície. Portanto, o
melhor a fazer é supliciar a este. Nada melhor que o suplicio, mas mesmo
assim, venho a advertir os presentes que mesmo supliciado pela
crueldade cristã piedosa da dor, o composto com o Pensamento
continuará a fazer sentido. De toda forma, poderemos combinar os seus
pedidos de clemência ao som do órgão da Igreja e obter um efeito
espetacular aos ouvidos que agradará até mesmo o Deus dos Cristãos
aqui presente!

Inquisidor: Logógrafo, cuidado com a tua língua. A língua afiada é a


que conduz os gentios a cova rasa. Como te atreves a dizer que este
homem tem algo que nós não temos? O Pensamento é propriedade
apenas de Deus, e ele está aqui presente em nossa amada Igreja. Eu
exulto ao Deus Todo Poderoso que lance fogo sobre aqueles que
desrespeitam os seus mandamentos!

Logo a nave da catedral abre em um estrondo jamais ouvido por qualquer


mortal. O próprio Marte enfurecido com as palavras do Inquisidor sobe do
Hades. O Inquisidor faz o sinal da cruz, talvez seja o dia do Juízo Final!

Marte: Quem és tu? Que clama pelo nome do falso deus dos cristãos
em vão? Quem és tu que diz o que ele deve fazer? Como és miserável!?
Eu não tenho pena de ti, ó homem de bom senso. Porém é, de certo, que
a morte é o melhor dos bens. Vou te deixar viver para que rastejes por
sobre a terra dos homens, para que sintas fome, para que desejes a
mulher do próximo sem poder ter da mulher que não seja a sua imagem.
Estás morto, Inquisidor, não é necessário matar-te.

Cardeal: Isto é uma blasfêmia. Guardas!

A guarda suíça comparece. Marte ri efusivamente. Heliogábalo e


Dionísio resolvem assistir o espetáculo. Júpiter Olímpico pega o melhor
assento. Aquiles, o querido de Homero, toma lugar privilegiado ao lado
do Cardeal.
Marte: Homens autênticos aqui presentes, que faço a estes?

Heliogábalo: Queremos sangue!

Dionísio: Quando é que vai começar a festa? Me dá esse vinho aqui


Inquisidor!

Júpiter: Que seja o massacre!

Aquiles: Sangue!

Marte: Olha deus dos cristãos, vê o que faço com a tua miserável
guarda...

Anzelm dormia de novo. O sangue do padre, a imagem de Hrinda, o


julgamento, o deus Marte, a imagem do Deus de Michelangelo, tudo se
esvanecia. Na aula de “Cálculo X” não haviam se passado mais de dez
minutos. O professor explicava uma das variantes da conhecida “Soma
de Riemann”. A tese dele é sobre uma das variações. A explicação era
efusiva e prolongada. Anzelm vê Hrinda ainda na janela. Como são
possíveis tantos “possíveis”? Que dobra violenta! Mas, que fissura
temporal! A aula segue, juntamente com uma série de realidades
possíveis, onde o sonho não pode entrar.

IX
Vi uma certa necessidade em escrever o Tópico 9, tendo em vista a
comunidade da Ordem Gnóstica e todos os nossos irmãos de outras
ordens e que fazem parte da Fraternidade e Grande Loja.

No dia 23 de janeiro, na qualidade de V.M. dei pôr encerrado o Capítulo


concernente ao Governo de Nossa Ordem. A Supra-Ordem, assim
concede a todos os seus membros direitos e deveres para com todas as
Ordens as quais poderão adentrar. A V. Ordem Gnóstica e respectiva
Igreja, já sem sede física não mais existem. De toda forma, eu, V.M.
Astaroth e o V.M. Marruk continuamos a esclarecer dúvidas de
quaisquer iniciados, neófitos, imediatos e buscadores em geral que
queiram adentrar aos Mistérios Gnósticos e não desampararemos os
que se encontram no caminho da busca.

Sendo assim, estou me despedindo do cargo de V.M. e desautorizando


qualquer um que venha a reivindicar o mesmo, pois ainda estou na
jornada. Gnósticos deste Capítulo estão, bem como eu, a buscarem outras
egrégoras e conhecimentos a fim de continuarem o seu trabalho.

O Gnosticismo foi trazido de volta ao séc. XX pôr V.M. Samael Aun


Weor. Os membros da Igreja Gnóstica apreciam o seu elevado
ensinamento, e, por certo, o carregarão ao coração em sua nova busca.
Eu, por mim, reservo-me na qualidade de Teólogo do Ensinamento a
seis meses de certo silêncio, e apreciarei os convites de minhas ordens
irmãs a fim de continuar o meu trabalho.

Gostaria apenas de deixar uma reflexão na forma de estória acerca da


busca da verdade, e de como a instauração do ser no caminho torna
nossos espíritos mais livres e nossas almas mais ditosas.

A ante-sala da câmara estava preparada. Nela Chavajoth, tecia agradável


conversa com iniciados e neófitos que tinha ido àquela região do inefável
com sede de conhecimento.

Frater Stevenson: Diz-nos, ó Chavajoth, que é o caminho?

Chavajoth: O caminho é e não é, é tudo e nada é, não é reconhecido


pelos animais intelectuais, mas somente por aqueles que insuflados por
potências em suas almas podem dizer o que não é e o que é sem existir.

Anzelm Volker: Quem é Deus?

Chavajoth: Deus é o princípio imovente que se instaura na poesia dos


possíveis. Deus é o pássaro que canta pela manhã trazendo vida e o
pesadelo dos que seguem o caminho da perdição. O caminho dos
buscadores é difícil, mas, se somos escolhidos pela mônada e não a
seguimos, por mais brilhante que pareça ser o caminho, no fim se cai
no abismo.
Andramelech e Baal adentram a câmara.

Baal: Desde o início dos tempos vimos advertindo o homem acerca do


caminho. No Egito o Grande Deus Íbis de Thoth já conclamava o
homem, e muitos afundaram no abismo, por não o terem ouvido. Digo-
vos mais, que o caminho da mão direita é o mesmo da esquerda.

Frater Johanson: Como assim? O da esquerda não é um e o da direita


não é outro?

Andramelech: Quantas mãos tens? Duas? Não seriam partes de um


mesmo corpo? Não se conhece o bem sem conhecer o mal. Da mesma
forma não conhecemos o doce sem o amargo? Buscai o centro e o que
diz teu coração e teu mestre.

O V.M. Astaroth, no mundo do inefável, chega a frente do Palácio para


a grande ceia junto com os outros mestres e saúda as colunas do Templo.

Coluna Esquerda: Quem és?

V.M. Astaroth: Eu sou o que sou na univocidade da multiplicidade de


muitos possíveis. Sou o que é; e também não sendo, sou.

Coluna Direita: Qual o teu grau?

V.M. Astaroth: Sou dos menores; e, humilde espelho-me em meu mestre


e só ele em meus mundos internos pode me conferir algum grau. Se o
tenho, ainda não me foi dado saber. Pois como ignorante e miserável,
visto as roupas de meu Bem Amado.

Coluna Esquerda: Tens cuidado bem de teu trabalho?

V.M. Astaroth: Meu trabalho é trabalho de muitos e me perco diante


da grandiosidade das potências e hierarquias que o tornam possível.

Coluna Direita: Teu Bem Amado está aqui entre nós e tu na presença
dele és indigno de aqui adentrar, que dizes?

V.M. Astaroth: Ao homem no caminho, ao homem que busca, nada é


empecilho. Meu merecimento é infinitesimal, mas se sou o que sou na
glória de meu Mestre e ele não me autoriza a cear com os inefáveis,
então, devo me retirar, pois do ego ainda não destrui a raiz.

Do alto vem uma voz.

Voz: V.M. Astaroth, o julgamento à porta do Templo terminou. A beleza


é para aqueles que sabem dela e não para os que com desdém dizem
dela o que ela é. O caminho da contemplação é para os serenos de
espirito que nada querem e que tudo dão de si. Jachim Boaz, V.M.
Astaroth.

V.M. Astaroth: Jachim Boaz.

Andramelech: Seja bem vindo, V.M., estamos com vários dos teus
aqui para a despedida, e eles tem sede de vossas palavras.

A Voz caminha junto.

Voz: O que podes dizer, V.M. Astaroth, é somente aquilo que teu mestre
autoriza em teu coração. O que vem da mente ou de tua vontade, não o
deves dizer. Por isso, dá o suficiente a teus Bem Amados, pois é sabido
que o Conhecimento é como a água, que mata a sede e tira a vida em se
afogando nela.

Andramelech: Homem, tu não estás perdendo e nem terminando nada.


Os anos em teu orbe são segundos para nós, tuas eras apenas horas,
teus milênios apenas dias. Olha a tua volta, V.M., os pedidos vem dos
mais diversos lugares, esteja atento. E agora, entra.

V.M. Astaroth adentra a câmara.

Chavajoth: Se a matemática fosse exata, ela seria perfeita para tua


física. Mas, sendo tua matemática linguagem, como uma pode servir a
outra? Como podes dizer o que é? Como podes nomear? Me parece
que há confusão no espirito do homem que se entrega a mente.

Anzelm Volker: Onde está o caminho?

Baal: Onde teus olhos pousam e instauram o teu espirito, aí está o


caminho. Ele está onde está na plenitude do amanhecer de tua vida para
o Ensinamento, e também no escuro da noite que te leva a reflexão e
meditação trans-mundanas.

V.M. Astaroth: Observem a noite! O cintilar das estrelas! Podem ver o


Sagrado Sol Absoluto? Sigam o Sagrado Sol. Os Arcanos 9, 11 e 13
são a chave, a fechadura está no 10 e no 12. Somente aquele que é
capaz de derrotar o “si-mesmo” e o “mim-mesmo” é que pode alçar
vôo em direção a Grande Loja Interior.

Frater Stevenson: É verdade que o Sr., V.M. Astaroth, está a esperar a


Grande Nau?

V.M. Astaroth: Querido, o que é o corpo? Quantos já tivestes? Que é o


nome? Quantos te deram? A tristeza só se abate no espirito do homem
que não sabe que não sabe; porém, aquele que deu o primeiro passo em
direção ao Caminho da sabedoria não se abate, pois sempre nos
reencontramos, sempre.

Frater Johanson: Quando a Nau chegar terás que partir, mas antes
fala-nos do Caminho da Vida.

V.M. Astaroth: Khrishna estava ao lado de Arjuna na Grande Batalha,


da mesma forma o Mestre, que está em secreto, concorre junto ao Anjo
Anael, a Metrathon e as Hierarquias por você e por mim. O tempo é
apenas instauração, apenas fluxo. O que você faz dele é que vale a
pena. Quantos amigos visitou? Dormistes nas escadas do Templo?
Quantas palavras ofertou? Cuidastes bem daqueles que bateram a porta
de tua casa? Teus escritos chegaram a mente ou ao coração das pessoas?

Andramelech: Quantas voltas tem uma espiral? Quantas oitavas podes


dar? Quando a Nau chega temos que nela embarcar, pois nossos corpos
cansados não agüentam mais a voltagem do Espirito altivo.

Frater Stevenson: Se é chegada a hora, V.M. Astaroth, deixa-nos uma


reflexão acerca do Caminho da Verdade.

V.M. Astaroth: O caminho dos homens inteligentes é reto e plano. O


caminho do Sábio é o Objetivo. O caminho dos homens inteligentes é o
conhecimento. O do Sábio é a Vida. Os homens inteligentes querem
viver. O Sábio quer morrer em si-mesmo, no mim-mesmo. Enquanto os
homens inteligentes nomeam a tudo, o Sábio tudo contempla sem
nomear. Enquanto os homens inteligentes querem ter o caminho, o Sábio
se investe dele.

O Sábio nada quer e tudo têm. O Sábio aprecia a beleza, mas não
coleciona as obras. A vida do Sábio no Caminho conflui, é pura
compossividade. A vida do homem inteligente é reta e seus objetivos
são pequenos diante do Caminho do Arcano 9, o Grande Arcano A.Z.F..

Chavajoth: O Sábio somente adentra o Templo com o coração, o homem


inteligente não adentra por não ser não-mente. Olhem ali, mais a frente!
Há uma bifurcação no Caminho da Verdade.

Anzelm Volker: E qual dos lados é o melhor?

Baal: Quantas são as colunas de entrada do Palácio? Duas. Então, tanto


o caminho da mão direita quanto o da esquerda são válidos. O que interessa
a nosso mestre que está em secreto é a experiência e nada mais.

A nau chega e V.M. Astaroth é convidado a embarcar:

Chavajoth: Eis que o fim é apenas um possível na multiplicidade. O


fim é apenas uma instauração que se dá no caminho, neste sentido o
fim liga-se ao todo da experiência de nosso mestre.

Andramelech: Deixa-nos uma reflexão sobre a mente, V.M. Astaroth.

V.M. Astaroth: A mente do homem inteligente é voltada para resultados


objetivos. A do Sábio volta-se para o Objetivo. Os homens inteligentes
sempre seguem um homem inteligente. O Sábio segue a si mesmo. A
mente do Sábio está ordenada ao melhor. A mente do homem inteligente
ordena-se a seus interesses particulares. Enquanto, o Sábio busca
diretamente da mente o que ela pode oferecer, então, ele busca o
necessário; pois a mente é como o cachorro que se bem cuidado serve
a casa, mas, se não incorre contra o dono. Na verdade, o reino dos
homens inteligentes é fraco, pois é efeito do conhecimento. O reino do
Sábio reside no Ensinamento e este não segue a ordem da linguagem,
mas do que está mais além do ser.

Andramelech: Reza a missa antes de partir, V.M. Astaroth?


V.M. Astaroth: Da missa digo que o Mistério é o que nos conduz ao
reino do inefável. É ele que ordena a luz e diz quando o sol nasce. O
Mistério está em tudo e é com o homem de pensamento livre. O Mistério
é com todos os que buscam e alimenta o espírito no caminho.

Frater Stevenson: Oferta-nos uma reflexão sobre o nada?

V.M. Astaroth: “Nada” é o ponto de partida e o ponto de chegada. O


“nada” é e nada é. O nada está em tudo e no nada ao mesmo tempo.
Somente o homem que reconhece que nada é, é que pode realizar-se no
vitriol da Grande Obra.

Voz: V.M. Astaroth teu navio o espera. O timoneiro e o marinheiro são


à postos. Não deves mais demorar. Parte com as bênçãos do V.M. Samael
e de teu Mestre Interior para a tua nova jornada. Já deixastes ao Espírito
alimento e reflexões que engrandecem a alma. Porém, o mar é calmo e
as condições de navegação são propícias. Parte sem deixar a tristeza,
porém leva a dor dos homens contigo, para que não a esqueças, para
que a domines.

Timoneiro: Vem, V.M., o tempo termina.

V.M. Astaroth: Façam do caminho o seu caminhar, o objetivo. Do


objetivo, força. Da força, a verdade, e da verdade apenas contemplação.
Paz Inverencial!

V.M. Astaroth embarca e nossos amigos ceiam alegremente. A mesa no


lugar reservado a V.M. Astaroth está o seu Bem Amado, para sempre
imortal nas estâncias do inefável.

X
São as Leis Gnósticas dotadas de vários dos preceitos da Lei Mosaica.
No Panteão dos Deuses há lugar para o amálgama das Leis. As Leis
devem ser seguidas para que o Iniciado adentre ao Caminho. V.M.
Astaroth e seu mestre, após longa viagem na nau, chegaram ao Palácio
do Kharma onde deverão obter julgamento por suas ações.

Coluna Direita: Salve! V.M. Astaroth! Salve o Bem Amado que trazes
contigo!

Coluna Esquerda: Queira adentrar ao Templo, onde já és esperado.

V.M. Astaroth: Sou indigno de aqui estar, mas as graças e perdão do Mise-
ricordioso permitem que eu esteja. Com a licença devida, adentrarei.

Dentro do majestoso templo, viam-se Anúbis, Isis, Hathor, o Grande


Deus Íbis de Thoth, o Anjo Anael, o Arcanjo Miguel, o V.M. Samael e
o V.M. Rabolú.

Voz: Eis que conosco se encontra o V.M. Astaroth!

Soam as trombetas, os guardas perfilam-se.

V.M. Astaroth: Oh! Voz dos Tempos! Que se dignais a acolher este humilde
e ignorante ser em vossa majestosa casa. Sei que não tenho merecimento e
que meu trabalho, pequeno e humílimo não merece sequer um olhar das
Hierarquias. Entretanto, os corações bondosos me permitem a entrada e eu
fico honroso e ainda mais tenro com vossas graças.

V.M. Samael: Que a Força seja contigo!

Voz: OM SEJA FORÇA!

Todos os Mestres: OM SEJA FORÇA!

Anúbis: Tenho apreciado o teu trabalho desde a aurora dos tempos e


tenho visto júbilo e Força em tua Obra. Vimos as Colunas de teu Templo
ruírem e por isso a ti chamamos para que instaures nova ordem, de
acordo com o Liber e os Arcanos 9 e 13.

V.M. Samael: A compaixão e o Trabalho são os bens do Sábio.


Entretanto, resta domar os últimos traços do ego, para isso há que formar
nova Ordem.
Isis: Oh! Bem Amado dos Deuses! Estás cansado? Vem e te refresca
com o vinho da vida, come o pão do Faraó Deus, anda nas belezas de
Roma. Que mais queres que seja descanso na beleza?

V.M. Astaroth: Meu merecimento e obra são pequenos e creio não ter
chegado ao coração dos homens como eu pretendia, como eu posso
descansar, diante da Grande Obra?

V.M. Rabolú: Pois eu digo que és digno, que és amado e que tua
mensagem a seu tempo encherá o coração dos novos membros de tua
confraria.

Hathor: Eis que assim é. Os Iniciados devem descansar na noite grande


do ensinamento, pois não só de dia é o firmamento. O Ensinamento
chega à hora apropriada ao coração dos Buscadores.

Anjo Anael: É hora, V.M. Astaroth, dos novos Ensinamentos para a


Nova Ordem da Nova Loja. É hora de ver o novo caminho, a nova
bifurcação da espiral que leva a verdade.

V.M. Astaroth: Pois que assim seja.

Os céus abrem e neles se inicia uma projeção holográfica:

Voz: Os tempos são ficção de tua alma, necessidade de teu espirito,


instauração do Pensamento sob a Vontade. Os tempos não existem, pois
estão contraídos na eternidade que tudo abarca. Aqui verás dois
caminhos e teu Mestre te apontará um deles.

Primeiro Caminho (Força): Sem Força, não há Caminho. Sem Força,


não há o Ser. Sem Força, não há o existir. Antes do Pensamento, há a
Força e antes da Força há o Nada. O Homem Autêntico busca na Força
a Transcendência, busca na Transcendência, o Objetivo; busca no
Objetivo, a Verdade.

Segundo Caminho (Vontade): Somente os Homens Autênticos têm


Vontade, pois somente eles perseveram no Caminho, apesar das
dificuldades. A Vontade tem ser conquistada, pois o Espírito que ainda
não trabalhou o suficiente não a têm.
Mestre: V.M. Astaroth irá pelo caminho da Vontade, pois Força ele já
tem, pois está de acordo com o Raio.

V.M. Astaroth: Eu aceito, então, o caminho da Vontade.

Neste mesmo instante os céus plasmam a figura de Lilith, a soberana


do coração dos homens fracos, e esta, desnuda, sorri para V.M. Astaroth.

Arcanjo Miguel: Queremos te dizer, V.M. Astaroth, que terás que vencer
Lilith pelo Pensamento e não poderás usar da espada de fogo puro de
teu Mestre!

Lilith: Até onde pode ir tua vontade, V.M. Astaroth?

V.M. Astaroth: Vontade que é vontade tem que ser provada, por isso
aqui estou.

Lilith: Leio os teus pensamentos, se pudesses estaria em meus braços.


São apenas teus juízos de moral gnóstica que o impedem. Tu não és
quem pensa ser.

V.M. Astaroth: Eu não sou o que penso, sou o que sou desde tempos
imortais. Eu sou em meu Mestre, que está em secreto e que alimenta o
meu espírito.

Lilith: Tu não tens vontade, Oh, V.M. Astaroth, pois a luxúria ainda te
derrota. Tu não tens vontade. Larga a tua espada e vens lutar!

V.M. Astaroth: Pela intercessão dos Elohim Gibor e pela graça do Anjo
Anael, sou eu ao combate.

Inicia-se a luta. Durante anos a fio, Lilith tenta Astaroth com toda a gama
de sortilégios e magias possíveis. Ao fim de sete anos, vem o veredicto.

Anúbis: V.M. Astaroth, venceste a Lilith em combate justo. Toma tua


espada de volta. Que tens a dizer da Vontade, agora como atributo de
teu Mestre?

V.M. Astaroth: Eis que em verdade eu digo que a Vontade é imperativa


da Força que vem do Nada. Nada é vontade se o Espirito não está
preparado para dar saltos evolutivos. Digo, que as provas são úteis ao
Espirito que vem em verdade e que está na busca, sem jamais a ter.

O julgamento termina e o Grande “Ser-Sem-Nome” se aproxima de


V.M. Astaroth.

Ser-Sem-Nome: Eu te dou a arma do amor, para que em nome da


Fraternidade possas vencer em teu retorno a incompreensão dos que
não querem o caminho. Eles tentarão te prender, mas tu os vencerás
com minha Força. Olha o teu caminho, meu filho e quando ele se tornar
tortuoso, pensa em meus dizeres. Eu estarei contigo e falarei por ti aos
meus queridos iniciados.

A Grande Nau parte, levando novamente V.M. Astaroth a seu Templo.


Onde após longo tempo de espera e ausência estão Andramelech,
Chavajoth, Baal, Frater Johanson e Frater Stevenson para iniciar com
ele a reconstrução da Nova Loja no seio da Nova Ordem.

XI
Clamo aos homens inteligentes para que me digam o que não podem
dizer. Resulta óbvio que aquele que diz o que não pode ser dito não é
inteligente, mas outra sorte de homem que não o mundano.
Homens da Universidade dos Espelhos? Há homens em tal universi-
dade? Vejo poucos Centauros e uma pequena cópia forçada de homem.
Que me dirão de mim? Compus estórias ou histórias? Rótulos não
interessam, pois tal como Avicenna me pergunto: “terei eu chegado ao
coração dos homens?”

Novamente na floresta encontram-se nossos personagens: a Ateu, o


Cientista, o Religioso e o Sábio. Foram convidados pela Universidade
dos Espelhos para uma série de conferências sobre Tempo e
Relatividade. Mas, não poderiam deixar de entrar em uma das maiores
florestas urbanas do mundo, na cidade mais bonita do orbe.
Chegamos a tempo de pegar o início do diálogo. O V.M. Astaroth e
Fernando são os guias desta expedição.

Cientista: Me parece que o tempo exista, pois temos uma evidência


teórica completa. O tempo seria o chrono, uma das partículas formadoras
do átomo.

Religioso: Quanto “falso-problema” Cientista! Agostinho nos diz no


Livro XI das Confissões ser o tempo eterno, pois sempre existiu na
mente de Deus.

V.M. Astaroth: Na confluência entre o ser e o não-ser fico na


intercessão, e me plasmo no nada que é imanência.

Ateu: Oh! Seu Astaroth! Alto lá! Que negócio mais metafísico é esse?
O senhor sabia que hoje temos quase certeza ser o tempo físico e que a
mente do homem está instaurada no meio-ambiente? Nada há além!
Vamos parar de metafísica!

Fernando: Sr. Ateu, qual seria o fundamento das leis? Há aí alguma


coisa? Há alguma compossividade?

Ateu: Mais metafísica de novo! Será que não vêem? Nada há além! Há
isto e basta. Estou mais com o Cientista que se instaura em uma ficção
chamada ciência!

Sábio: O homem que busca, transcende a ficção.

V.M. Astaroth: O homem que busca têm o caminho e este é sempre


mais além, sempre compossível.

Ateu: O que vocês querem com tanta metafísica? Onde desejam chegar?
Cientista, por favor, ensine algo a esses homens que vivem no espaço sideral!

V.M. Astaroth: A questão, Ateu, está mal formulada. É assim: “o que a


metafísica instaurada no espírito nos faz ver?” Um homem sem
comprovação é apenas mais um miserável diante dos deuses.

Cientista: Mas, a questão não é o tempo? O “chronos”? Como fomos


parar nisso?
Religioso: Que Deus nos perdoe por termos pensamentos tão estranhos!

A caminhada segue logo chegam a “Cascatinha” onde param para


descansar. Mas, algo estranho acontece. Os céus abrem e uma estranha
luz roxa aparece. Dela vem uma voz.

Voz: Oh! Miseráveis! Quem sois?

Ateu: Caramba! Essa nem Jung explica! Por favor, chamem o psiquiatra!

Voz: Oh! Miserável! Aquieta a tua mente e contempla!

Cientista: Você vê o mesmo que eu vejo, Ateu? Acho que é alguma


esquizofrenia coletiva causada por algum gás nas proximidades ou efeito
do inconsciente coletivo.

Voz: Quanta miserabilidade, Oh, homens inteligentes. Que homens


kantianos que a tudo querem nomear. O tempo tragará cada um de vocês
e vocês não terão vivido. Tenho pena de vocês, homens inteligentes.
Desde o início dos tempos eu os observo com as mais esdrúxulas teorias
matemáticas a querer dizer das coisas o que são. Por que não
compossivem? Por que não sentem? Seus corações afundariam a balança
de Anúbis. Seus espíritos não encontram descanso. O caminho para
vocês é morte e a água sempre salgada.

Religioso: Em nome de Deus Todo-Poderoso. Eu te conjuro, Oh, criatura


do mal. Deixa-nos!

V.M. Astaroth: Há uma certa sorte de homens que não deseja


compreender. Os religiosos são desses tipos. Em nome de uma certa
religião muitos morreram torturados. Atrasou-se a química em trezentos
anos, a medicina em duzentos, coibiu-se a liberdade de expressão. Se
hoje temos um Estado laico, é porque muitos morreram no escuro.

Voz: Tudo é um processo. Tudo é necessidade. Os processos são necessários,


mas não são todos “ecceitas”. Todos se dão na “flutuatio”. Mas, não há
fundamento, nem permanência, só multiplicidade, só consistência.

A Voz se desvanece e some com o seu raio roxo na imensidão dos céus.
A caminhada, então, continua.
Ateu: Vejamos, Cientista, há então uma fonte de gás esquizofrenizante
nas imediações que cause estados alterados de consciência?

Cientista: É a causa mais provável para o fenômeno. Podemos ainda


jogar com constantes de espaço-tempo, e, de acordo com um físico de
Roma, o que podemos ter visto é uma projeção holográfica proveniente
de um tempo que não é presente. Sabemos que um cinturão magnético
guarda todos os nossos movimentos como em um filme. Isso é possível.
Pode ser também que uma fissura nas leis de espaço-tempo possa ter
violado leis de relatividade causando uma curvatura anômala e resultado
no fenômeno.

Ateu: Pelo menos há explicação. Isso é bom.

Fernando: Que pobreza parar aí! E a sobremesa? Poderia ser um mestre


que se comunicou conosco!

Ateu: O Sr. já foi ao psiquiatra, Fernando? Nada que um haloperidol e


uma risperidona não dêem um jeito!

V.M. Astaroth: Mais respeito, Ateu. O Estado é laico e tias casas de


seqüestro já são coisa do passado.

No meio do caminho para a grande pedra, nossos amigos encontram


uma pessoa paramentada de oficial de uma grande espaçonave do
futuro (na verdade Mestre da Grande Loja – entidade de outro
possível).

Ateu: Hoje está demais! Mas, que diabos está acontecendo? Deve ser a
esquizofrenia coletiva! Nada que uma injeção de thorazine e lítio não
resolva. Não vou falar comigo mesmo de novo. Isso é criação de nossas
mentes!

Cientista: Em parapsicologia há uma teoria em que dado indivíduo


possa plasmar tais realidades e fazer com que outros a vejam. Se
descobrirmos o tal indivíduo podemos faze-lo parar.

V.M. Astaroth: Um homem pobre não é o que não tem bens, mas o que
não se abre ao novo. Por que não contemplam simplesmente?
Sábio: Oh! Seguidores do materialismo, abram os olhos e vejam, abram
os ouvidos e ouçam. Sejam como as crianças!
Andramelech (o Mestre): Salve V.M. Astaroth! Salve Sábio!

Cientista: Suspeito que esses três, Fernando, V.M. Astaroth e o Sábio


estão a produzir esses fenômenos!

Andramelech (sorri): Homens do intelecto, sempre a produzir


explicações. Digam, V.M. Astaroth e Fernando, o que motivou a
expedição?

Fernando: O contato com “Nosso Pessoal” é sempre proveitoso e


sabíamos que junto ao Sábio e a V.M. poderíamos canalizar as forças
rumo a um encontro.

A caminhada ao lado de Andramelech segue. O Cientista e o Ateu


desnorteados, o Religioso a gritar imprecações. Chegam a grande pedra.
Depois retornam pelo caminho e quando chegam a Universidade dos
Espelhos sentam-se à “mesa virtual do nono andar virtual” e no meio a
cafés, balas e cigarros recomeçam com a infindável conversa onde os
“homens do sentido” ficarão eternamente a rir dos “homens do
conhecimento”. Ainda estamos a rir.

XII
Acordem homens inteligentes, pois o dia é chegado! Que querem da
ciência, da filosofia e das leis? Homens do ontem que não conseguem
ver que hoje é um instante apenas. O tempo há de nos tragar. Nele há a
razão.
Homens enciclopédicos, prolixos, explicativos! Que faremos com tantas
explicações? As explicações só servem para obscurecer nossa
ignorância. Que mais queremos, se não continuar profundos ignorantes?
De que valem explicações?
Indivíduos da Universidade dos Espelhos? Vejo uma multitude onde
nada há. Vejo homens a construir e, principalmente, a repetir conceitos.
Não conhecem o vinho, muito menos a vida.
Que quero eu? Selvagem, tragado pelo tempo. Não me reconheço. Nem
sei onde estou. Como um Diógenes redivivo estou a gritar aos homens
do conhecimento, pois vejo o orgulho em saber transpirando por suas
vestes.
Os homens inteligentes sabem muito.
O Sábio nada sabe.
Os homens inteligentes vivem do tempo.
O Sábio vive sem tempo.
Os homens inteligentes, tenebrosos do mundo do ego, são capazes de tudo.
O Sábio reside na “não-ação”, por ser “não-mente”.
Qual é a força por trás do homem sábio? A mesma que move os
inteligentes.
Quem sou eu? Não me conheço. Cristão ou bárbaro? Abram o Coliseu!

V.M. Astaroth chega a Universidade dos Espelhos e se dirige à mesa


virtual do nono andar virtual. Pega um café, senta-se. Lê calmamente,
mais uma vez, o Tratado da Monadologia de Leibniz. V.M. Astaroth
está sempre em busca, feliz por encontrar sempre a multiplicidade dos
possíveis. Chega Gisela.

Gisela: Está a haver uma revolução. Muita gente está mobilizada no


“Instituto de Teologia e Ciências Afins”. Não vai participar?

V.M. Astaroth: Do que se trata?

Gisela: Não sei, mas estão todos a gritar palavras de ordem. Acho que
a frase é mais ou menos esta: “ou as coisas são ou não são”.

V.M. Astaroth: As coisas são?

Gisela: Não sei. Mas, podem ser, como podem não ser.

V.M. Astaroth: Não acha que encontrou aí uma intercessão? Explico:


as coisas não precisam ser, elas podem simplesmente repousar na
imanência.

Chegam Frater Lúcifer e Vloid Vad Tepes III.


Frater Lúcifer: Está a ocorrer uma revolução. Os partidários do ser
declararam a universidade como sendo alguma coisa que é.

Vloid Vad Tepes III: A situação é pior ainda, eles dizem que o “que é,
é o que é”, e que “o que não é, é o que o não é”. Eu pensei que “o que
não é” fosse sempre alguma coisa.

V.M. Astaroth: O “não ser” é sempre mais poderoso que o ser. Pois é
do “não ser” que vêm à existência o que é.

Frater Lúcifer: O que vamos fazer a respeito? A revolução está a


caminho. Os que pensam diferente serão postos para fora!

V.M. Astaroth: Nós não seremos postos para fora. Nós já estamos fora.
Na medida em que nos instauramos no movimento e que abdicamos
das categorias para fundarmo-nos na consistência, nós deixamos de
estar inclusos. Compreende? Ninguém pode nos tirar do “não lugar”.

Gisela: Então, a revolução nada tem conosco?

Vloid Vad Tepes III: É aí que ela tem tudo a ver conosco. Podemos
afirmar diante do pessoal do ser a nossa maneira de pensar o diferente.

Frater Lúcifer: É isso aí. Vloid!

Chegam a mesa V.M. Baalbaki e Frater Adratsom.

V.M. Baalbaki: Estão aplaudindo Seuquram lá embaixo. Dizem que


tornarão a universidade livre o pensamento.

Frater Adratsom: V.M. Astaroth, que acha disso?

V.M. Astaroth: O lugar da filosofia não é dentro da universidade. O


lugar da filosofia é sempre um “não lugar”, Nietzsche disse que ninguém
o seguiria e, hoje, temos pessoas que se intitulam nietzschinianos. A
universidade é uma vergonha diante da potência do pensamento.

Frater Lúcifer: Acho que seria bom darmos uma olhada na tal revolução.

Gisela: É sim. Seria interessante vermos a “revolução do ser”.


Nossos amigos chegam ao teatro, lugar da “revolução”.

Seuquram: Amigos do III Reich. Hoje é um grande dia para nós. Através
deste decreto declaro a universidade livre do pensamento!

Os nazistas, todos com a braçadeira do Reich de Mil Anos aplaudem


em peso.

Seuquram: A partir de hoje vamos estudar apenas: Aristóteles, Kant,


Hegel e Heidegger.

Ex-padre: E também Hitler, “Minha Luta”, Goebels e Heydrich!


Defensores da raça ariana e da humanidade!

Muito atrás, nossos amigos observam estupefatos o ressurgimento da


nova “Alemanha universitária”.

V.M. Astaroth: Isso está parecendo Nuremberg, logo vamos ter uma
“cristalnacht” para tornar a universidade “judenfrei”, ou seja, livre de
inquietações metafísicas. Temos que descobrir um meio legal de parar
esse movimento nefasto.

Frater Lúcifer: Vamos falar a eles. Vamos impor o nosso pensamento,


a nossa ficção.

Vloid Vad Tepes III: O problema é que para eles o pensamento não é
ficção no sentido forte, mas sim no sentido fraco de realidade.

V.M. Astaroth: Eles são muitos. Não devemos falar. Eles podem
começar a tornar a universidade “judenfrei” por nós, tal como Mussolini
e Victorio Emmanuel o fizeram. Lembram-se? Os diplomas não tinham
validade. Podemos ser mortos pela nazistada enfurecida.

Ouve-se o hino do III Reich. A bandeira com a suástica é hasteada.

Frater Adratsom: Vejam! É a bandeira do movimento antipensamento.


Isso deve estar sendo orquestrado pelo laboratório dos homens do
conhecimento.

Gisela: Sem dúvida. Pegamos o plano em fase terminal. Que vamos fazer?
V.M. Astaroth: Vloid, ligue ao Filósofo. Vou falar.

V.M. Astaroth e o Filósofo conversam por minutos.

Vloid Vad Tepes III: E aí? O que ele disse?

V.M. Astaroth: Disse que vai impetrar mandado de segurança para


defender a democracia na universidade. Creio que “nossos amigos” do
Reich se deram mal.

Algum tempo após, na mesa virtual do nono andar virtual.

Professor James: Os nazistas foram longe demais. Que revolução mais


sem sentido!

V.M. Baalbaki: O que foi feito, então?

Professor James: Foram intimados, junto com os alunos nazistas, a


darem explicações. O Poder Público se manifestou. Mas eles ainda dizem
que foi pelo “bem comum” da universidade. Vão responder pelo crime
de propaganda nazista.

V.M. Astaroth: Isso é pouco diante do mal que já praticaram.

Frater Adratsom: Deveriam ser presos. V.M. Astaroth, não acha que é
hora de compormos uma nova loja ou capítulo para enfrentarmos
corporativamente essa ameaça a liberdade de pensamento?

V.M. Astaroth: Não é necessário, Frater. Aqui quase todos são iniciados
nos mistérios. Nós já somos a nova loja. Convém que continuemos no
caminho do pensamento e a cada nova investida reagiremos
convenientemente.

V.M. Baalbaki: Então, vamos uniformizar o Ensinamento. Todos aqui


o têm. É necessário a uniformidade.

V.M. Astaroth: Não diria uniformidade, mas consistência; talvez,


fundamento. “Fundamento” é a palavra usada pelos escolásticos até os
séculos XIII e XIV.
O Filósofo liga a Vloid Vad Tepes III.

Vloid Vad Tepes III: O recurso foi aceito. A Polícia Federal está vindo
à universidade apreender o material de propaganda nazista.

V.M. Baalbaki: Ganhamos esta batalha.

V.M. Astaroth: Mas, não a guerra! Devemos ficar de olhos abertos


com relação a revolução do ser. Se passarmos a entender ou a deixar
que se entenda o ser como apartado do fenômeno vamos ter que ler
ainda muito Parágrafo 31 de “Ser e Tempo” e outras coisas mais.

Frater Lúcifer: Bem, está encerrado por enquanto.

O relógio da torre marca 16:45. Os monges dirigem-se a suas celas. O


tempo imóvel toma os “homens do sentido” que contemplam pela
abertura espaço-temporal a dimensão onde o pensamento se tornou um
dos possíveis. O vinho é servido em meio a livros de Platão, Aristóteles,
Plotino e Boécio.

XIII
V.M. Astaroth: Vejam amigos, se não é Marat, morto na banheira!

V.M. Chavajoth: Logo ali está Danton conversando com Robespierre.

Frater Lúcifer: A história é pura descontinuidade, pura ficção!

V.M. Chavajoth: A história é a “estória da queda do homem”. Nada há


nela, se não projeções do presente. Ela é o que queremos que seja.

V.M. Astaroth: Onde resta buscar a verdade? Vejo ficções por todos os
lados!
Frater Johanson: Não seria a ficção a única a ser buscada?

V.M. Chavajoth: Me parece que a ficção é que há, pois se houver um


Deus, me parece que ele reservou a verdade para si e para nós deu a ficção.

Frater Stevenson: Sou um homem que caminha no escuro, tenho medo


da escuridão que eu não conheça.

V.M. Astaroth: Nossa própria escuridão é sempre mais agradável, pois


é nossa.

Frater Adratsom: Vejam! O fim da história é sempre nebuloso, é


inapreensível!

Frater Stevenson: Me parece que diante de tamanha descontinuidade haja


uma ficção maior, a de chamarmos a história de realidade! É como se dentro
de um “possível” houvesse outros possíveis com igual força fictiva.

V.M. Chavajoth: São muitos os possíveis, sempre múltiplos, e cada


um é unívoco.

V.M. Astaroth: Vejam mais ali, se não é Sócrates conversando com os


geômetras!

Frater Lúcifer: Mas não se ouve nada! É só imagem!

V.M. Astaroth: É verdade. Teria a história o sentido de contemplação,


apenas?

V.M. Chavajoth: Toda ficção é contemplativa. A história é para quem


tem gosto pelo fictivo. Enquanto mentira, é contemplação.

Frater Adratsom: Vejam mais ali. Gente da Universidade dos Espelhos.


Parecem mortos. Fictivos!

Frater Stevenson: O que fazem esses mortos aqui?

V.M. Chavajoth: São mortos enterrando outros mortos. A história é


feita de mortos.
V.M. Astaroth: Não seria aí um indício de que devamos morrer em nós
mesmos?

V.M. Chavajoth: Não temos lugar na história. Estamos fora dela. Fora
do fluxo. A posição do contemplar nos tira do fluxo.

V.M. Astaroth: O mundo é pura aparência. Puro aparecer. Só o sábio


sabe o caminho da verdade. Nós não sabemos.

Frater Lúcifer: Mas estamos na busca, não?

V.M. Chavajoth: Estamos na busca da queda, apenas isto. Todos os


mistérios estão logo ali, apenas isto. Não há nada para conhecer.

V.M. Astaroth: Vejam! Logo ali! O Concílio de Nicéia!

V.M. Chavajoth: E logo ali, os castelos medievais, as cruzadas.

Frater Stevenson: Como a história é estranha. As cenas vêm e vão. Só


tem fundamento, nenhuma consistência.

V.M. Chavajoth: É o pensamento que faz com que as coisas consistam.


Tantas idéias! Mas, até elas mesmas passam. O fluxo inexorável do
tempo, tudo traga. Não resta muita coisa. Até mesmo o pensamento é
ficção.

V.M. Astaroth: Nada há, se não movimentos fictivos do pensamento.


Irmãos, onde devemos buscar o caminho da verdade? Não seria
necessário transcender a ficção? Mas, como? Se tudo é ficção?

V.M. Chavajoth: Pois que busquemos a ficção. É o que resta.

Frater Stevenson: Parece não restar saída, pois que a verdade está em
lugar algum.

V.M. Chavajoth: E não há saída mesmo. Os mistérios estão revelados,


mas a verdade está em lugar algum.

V.M. Astaroth: Não seria aí o caso da busca? Do buscar esse “não


lugar”?
Frater Adratsom: “Não lugar” é o lugar da busca. Na história nada
encontraremos. Mas, não seria a transcendência o lugar de outra ficção?
V.M. Astaroth: Só o experiênciar nos mostraria. As práticas, o estado
de alerta, a identificação do ego.

V.M. Chavajoth: Me parece que esse caminho conduz a ficções mais sutis.

V.M. Astaroth: Mas, é uma tentativa. Quanto melhor for nossa ficção,
melhor será o nosso possível. Podemos ver até que ponto chegamos.

Frater Lúcifer: Nesta viagem uma coisa é certa: o fenômeno dito “história”
é obscuro como o tempo. Têm uma existência obscura, uma parte é visível
e outra não o é. Talvez, a história seja um “falso-problema”.

V.M. Chavajoth: E a história o é! Não há nada nela que não seja


interpretação. As coisas se dão por “testemunhas oculares”. Ninguém
garante que dizem como as coisas ocorreram.

Frater Stevenson: Isto posto, então os diversos relatos não passam de


crônicas.

V.M. Chavajoth: Por isso não há como acreditar nos historiadores. O


que você pensa que sabe é que pensa saber. Somente isso.

V.M. Astaroth: Por isso penso que devamos transcender a mente. É aí


que está o problema. Ser “não-mente” é apenas contemplar sem emitir
juízos. Assim, a história ocupa o seu lugar. Não é mais nossa história,
mas apenas uma estória. Ela perde o valor.

XIV
Os dias tornaram-se lentos. O fim aproxima-se cada vez mais. A sofreguidão
dos dias me força a tomar de meus últimos ímpetos e escrever este que
segue. É bom que se saiba que muito os amo, e a dor da partida é grande.
Mas outra Nau se aproxima. Em forma de estória deixo-lhes meu último
alento, após isso, derrotado, peço que me esqueçam, pois talvez eu seja
indigno de ter estado entre vocês. Sei do amor que me devotaram, procurei
e procuro retribuir a atenção à minha pessoa e a meus parcos escritos.

A Nova Loja está reunida. Dentro da grande capela, cuja negritude se


estende aos altos dos céus, estão reunidos V.M. Chavajoth, V.M.
Baalbaki, V.M. Astaroth. Eles estão a saudar o mais novo membro
empossado da Nova Loja: V.M. Zein.

As portas da capela se abrem. Um corredor de setenta altos-iniciados


perfilam-se. Entra V.M. Zein.

V.M. Zein: Vim aqui por mim, para mim, buscando retomar o que é
meu por direito e por merecimento.

Frater Stevenson: Eu, o secretário, digo, que se saúde V.M. Zein e que
este entre.

Passa V.M. Zein em reconhecimento aos setenta altos-iniciados. Ao


final um dos Embaixadores da Loja, lhe dirige a palavra:

Embaixador: És bem vindo, V.M. Zein, apresenta-te para tomar o trono.


Os V.M. presentes tem perguntas a fazer.

V.M. Baalbaki: Eu o saúdo, V.M. Zein, temos honra em desfrutar


contigo os altos escalões da Nova Loja, mas diz: a que vieste?

V.M. Zein: Vim para minha morada, para minha casa eterna, para
aprender com todos e ensinar o que sei de forma humilde.

V.M. Chavajoth: OM SEJA THELEMA!

V.M. Astaroth: OM SEJA THELEMA!

Loja em coro: OM SEJA THELEMA!

V.M. Astaroth: A sua vontade é forte. A vontade é uma grande qualidade


do guerreiro. Você já provou o que tinha que provar. Adianta-se agora
ao caminho conosco?
V.M. Zein: Adianto-me com honra.

V.M. Astaroth: Senhores, o cavalheiro aqui presente tomará o seu trono,


venerem-no e respeitem-no como se faz com todos os V.M.. Eis o inicio
da nova caminhada. Eis o caminho das possibilidades.

Loja em coro: OM SEJA FORÇA.

V.M. Baalbaki: Senta. Agora o Santo Quatro está formado. A Força é


apenas uma.

Os frateres da loja se aproximam e dão as honras a V.M. Zein, depois os


Embaixadores e depois os altos-iniciados.
Entra o Sábio.

V.M. Astaroth: A que tu vieste?

Sábio: Vim aprender.

V.M. Astaroth: Quem és?

Sábio: Sou o que sou na potência daquele que há em mim. Sou não-
sendo, sendo não-mente. Queres saber se há algo em mim? Sou sempre
não-sendo.

V.M. Astaroth: Qual o teu propósito?

Sábio: Vim aprender. Já disse.

V.M. Astaroth: Alguma pergunta?

V.M. Chavajoth: O Sábio veio inquirir V.M. Zein. Deixemos que o


fato se desenvolva.

V.M. Astaroth: Pode dirigir suas perguntas a V.M. Zein.

Sábio: Vejo em ti a potência, mas se és V.M. não serias tu o acto perfeito?

V.M. Zein: Há a perfeição em mim, em ti e em todos. No final acto e


potência são apenas um.
V.M. Chavajoth: Se sou acto e potência em mim mesmo então sou um
deus. Afinal, Sábio, acto e potência não residem na não-mente?

Sábio: O homem que busca, busca sempre um caminho. No caminho


há os possíveis, nos possíveis há a força. Pela unificação da força há a
vontade, e na vontade há a confluência do acto com a potência.

V.M. Zein: Tal como todos, sou em mim em virtude do mais elevado,
sou mais elevado em virtude do que há para além de mim.

Sábio: Vim para aprender contigo, V.M. Zein, e com todos. O que há
além de ti que não esteja em ti?

V.M. Astaroth: Sábio, gostaria de lhe voltar esta pergunta.

Sábio: O que há em mim? Há a confluência, a univocidade, a


plurivocidade, tal como em ti. No momento em que a vontade fraqueja
tu te tornas menos do que é. Menos acto e mais potência.

V.M. Zein: Sei das dificuldades que o boddhisattwa de V.M. Astaroth


atravessa. Mas, estas em vez de torná-lo arrogante refinam o seu
espírito.

Embaixador da Loja: Tu me pareces ter mais vontade que teu mestre.


Talvez tenhas uma explicação para o fato.

V.M. Zein: A falta física nada prova aqui. Aqui Astaroth é, e isso é o
que me importa.

V.M. Chavajoth: Onde está a tua “verdade”, tuas dialécticas, Oh! Sábio?
Parece-me que em vez de testar, testado está sendo.

Sábio: Como posso ser, se não-sou? Tu és?

V.M. Chavajoth: Seria a existência um aspecto do “ser”?

V.M. Zein: Há aqueles que existem e são. Há os que existem e não-são,


há os que são sem existir, por sua própria potência.

Sábio: Então, se é de alguma forma?


V.M. Zein: Só se pode ser não-sendo. Tu mesmo o dizes.

V.M. Astaroth: Homens do amanhã! Que amanhã é este que não chega?
Homens do ontem! Que ontem é este que não mais existe? Homens do
instante, são por vocês em vocês ou por outro além?

Sábio: Que é o tempo, V.M. Zein?

V.M. Zein: Dentro do cristal há o tempo que os homens criaram, fora


dele, como aqui, há a multitudo. Tu te reconheces, Oh! Sábio aqui?

Sábio: O que sou?

V.M. Astaroth: Me parece, Sábio, que há mais força em ti e menos


vontade.

Sábio: Me parece que tua arrogância suplanta a tua vontade. Onde está
tua bem-amada? Contigo não está. Isso fissurou o teu posicionamento.
Aguardaste por toda uma vida e agora estás prestes a abandonar o trono
e a tentar o novo V.M. que virá após. Tuas existências fracassaram.

V.M. Astaroth: Não pretendo a vitória. Já a tenho.

Sábio: Tua arrogância se vê em tuas palavras. Tu fracassaste e isto é


tudo.

V.M. Chavajoth: Vejo nesse tipo de fracasso a grande vitória. O teatro


é mais importante que a conquista. Se esta chega forma-se novo teatro,
e se tudo é teatro, o trono de Astaroth é par semper aeternum.

Sábio: V.M. Zein, diga, não te sentes incomodado com a arrogância


desmedida de teu mestre?

V.M. Zein: Em breve a nova nau chegará. Está nas mãos dele tomar ou
não a nau. Ele é o que é, e tu que se dizes não-mente e refletes a
arrogância em teus lábios?

V.M. Astaroth: Mestres! A nova nau se aproxima, para tanto a Nova


Loja não deve mais ser governada por um, mas por uma junta de V.M..
V.M. Chavajoth e V.M. Zein procederão à eleição.
XV
Frater Lúcifer anda de um lado para o outro no nono andar virtual da
Cidade dos Espelhos. Preocupado. Anzelm Volker sumira
repentinamente. Por onde estaria? Voievod Vad Tepes III chega.

Voievod Vad: Salve, Frater Lúcifer!

Frater Lúcifer: Ora, Ora, Salve, Salve!

Voievod Vad: Estou preocupado com o sumiço de Anzelm Volker.

Frater Lúcifer: Astaroth com suas magias deve ter enviado ele em
missão para algum confim do universo.

Voievod Vad: Veja se não é Chavajoth quem chega!

Frater Lúcifer: Salve Chavajoth! OM SEJA THELEMA!

V.M. Chavajoth: Desterrado que sou. O mundo é indigno de mim.


Dilacerado. Meu espírito cantante perde-se nas infinitas rimas de um
possível incompossível.

Voievod Vad: Viste Anzelm Volker?

V.M. Chavajoth: Não sou capaz de ver a mim mesmo. Como contemplar
o outro? Puro incompossível!

Chega V.M. Baalbaki.

V.M. Baalbaki: Alguém tem notícias de Anzelm Volker?

V.M. Chavajoth: A vida se dá em mundos paralelos.

Frater Lúcifer: Alguém sabe se Astaroth morreu ou não?


V.M. Chavajoth: Que importa se Astaroth morreu ou não. A vida, meu
querido, se dá em mundos paralelos até o momento em que o possível
encontra o incompossível! Morte? Olha a beleza deste gesto!

Frater Lúcifer: Que seria do nono andar virtual sem Astaroth? E Anzelm
Volker só pode viver se Astaroth viver!

V.M. Chavajoth: Que vida é essa? A vida se dá em um esgotamento.


No momento em que se esgota, nada mais há. Não há mais para Astaroth.
Astaroth já está morto, ninguém pode matá-lo, nem ele mesmo. A morte
chegou. Foi silente e calma. O espírito apresentou-se as trevas de Daath!

Frater Lúcifer: Mas, Astaroth não deseja chegar a Binah, esse é o


problema. Os mortos não vão a lugar algum!

Voievod Vad: A grande questão da morte de Astaroth reside no fato de


ele ter morrido em si mesmo. Por isso nada mais resta a morrer. Quem
de nós pode dizer que morreu?

Frater Lúcifer: Eu ainda desejo a vida.

V.M. Chavajoth: Aqueles que desejam a vida, morrem inexoravel-


mente! É necessário desprendimento. Anseie a mendicância, meu
querido.

V.M. Baalbaki: Aqueles que querem viver, morrerão; mas, somente os


que querem morrer, viverão. Alguém já disse isso em Tópicos anteriores
ou em Cidade dos Espelhos, mas o contexto clama por isso novamente.

V.M. Astaroth chega.

V.M. Astaroth: Ora, Ora! Salve, Salve! O que discutem?

Frater Lúcifer: Queremos saber para onde você baniu Anzelm Volker?
Aliás, você é Anzelm Volker, não é mesmo?

V.M. Astaroth: Frater Lúcifer, quantos possíveis existem? Dentro dos


possíveis quantos podem ser dados a existência?

Frater Lúcifer: A questão é: onde está Anzelm Volker?


V.M. Chavajoth: Mas, que rapaz apressado! Tenha mais vagar. A vida
é muito lenta, meu querido, quando se encontram as potências já é tarde
demais, ou muito cedo. Não há nada que aconteça na hora. A mim não
interessa o “por que” de Anzelm Volker, se Astaroth baniu ou deixou de
banir. Quero saber como Anzelm Volker foi possível? Estou muito
interessado em ficção.

V.M. Astaroth: Onde está Anzelm Volker? Como Anzelm Volker foi
possível? Muito está claro que as coisas que não são podem ser o que
são, e o que é pode ser o que não é.

Frater Lúcifer: Chega de retórica, Astaroth, para onde você baniu


Anzelm Volker?

V.M. Chavajoth: A pergunta certa é: quão dilacerado no tempo o ente


se imiscuiu de sua essência?

Frater Lúcifer: Mas, vocês não falam coisa com coisa!

Voievod Vad: Talvez, porque na falta do silêncio o que possa haver são
somente direções.

Frater Lúcifer: Que direções? Conceitue.

Voievod Vad: Que se quer com os conceitos, meu querido? Onde se


quer chegar com eles. Não me diga que são necessários ao pensamento?

V.M. Astaroth: Quantos caminhos são possíveis?

V.M. Chavajoth: E quantos incompossíveis?

V.M. Baalbaki: Na vida há muitos caminhos, uns possíveis, outros


incompossíveis, outros são a confluência, a dobra, a intersecção.

Frater Lúcifer: Então, vou tirar minhas conclusões: Anzelm Volker


foi banido por Astaroth para algum confim do universo e não se fala
mais nisso.

V.M. Astaroth: A pior saída é a saída sem fé na palavra. A palavra é o


falso, então há uma razão de verossimilhança entre ela e o discurso.
Isto posto, então a verdade só pode estar no discurso, enquanto a mesma
é a apenas construção, simulacro de um modelo falso.

Frater Lúcifer: Acredite, Astaroth, suas saídas políticas são muito


engenhosas. Você diz muitas palavras sem dizer nada.

V.M. Chavajoth: Isso é que é lindo, dizer, dizer, dizer, sem nada
comunicar. Só ruídos. Só verdades-verdadeiras, produtos do falso.

Chega Frater Adratsom.

Frater Adratsom: Alguém viu Anzelm Volker por aí?

V.M. Astaroth: Devemos primeiro procurar ver com os olhos da alma,


para depois buscarmos no externo uma possível-possibilidade.

Frater Lúcifer: Veja, Adratsom, estamos no meio de loucos! Eles não


dizem coisa com coisa!

Frater Adratsom: Há muita lógica do sentido no que Astaroth disse. A


questão foi por mim mal formulada. Deveria ter perguntado: Anzelm
Volker está ainda nas possibilidades?

Chega Anzelm Volker.

Frater Lúcifer: Rapaz, por onde você esteve?


Anzelm Volker: Estive sempre aqui, sempre lá, sempre acolá. Sou um
pássaro e posso voar.

V.M. Astaroth: Tem uma beleza aí!

V.M. Chavajoth: Que compossibilidade pluriunívoca.

Anzelm Volker: Agora é hora de eu ir. Vou para a aula de Lady Azor, a
dama negra do inferno.

Frater Lúcifer: Espera aí! A gente aqui preocupado se você tinha


morrido com Astaroth, que já está morto mesmo, e você sai assim para
a aula de Lady Azor? Nem um esclarecimento?
V.M. Chavajoth: Para que servem os esclarecimentos? Se alguém quiser
me dar um eu saio correndo.

O grupo continua reunido, apreciando as várias filosofias. Anzelm Volker


vai para a aula de Lady Azor. O sumiço de Anzelm Volker pode ter ocorrido
ou não, mas o que vale é que a discussão suscitada talvez tenha sido um
possível dentre vários que poderiam ter ocorrido. Onde está a verdade?

XVI
Uma Viagem a Outra Dimensão

Estavam reunidos na casa sombria V.M. Astaroth, V.M. Chavajoth, V.M.


Zein e Frater Nihil. Havia um outro membro junto com o grupo Oicram
Ynor, tipo de mente cética que não acredita nem no que vê. Começa a
incursão de nossos amigos pela casa envolta em mistérios.

Uma porta da casa chama a atenção de nossos amigos. Trancada. Dela


vem um sinal do tipo de máquina de escrever antiga. O sinal é nítido.
Parece um datilógrafo catando as teclas sem destreza. Nossos amigos
se detêm na porta estranha.

V.M. Astaroth: Que coisa mais estranha! De onde vem o barulho? Não
há nada nessa sala fora um armário e uma xícara!

Frater Nihil: O barulho, Senhores, não é físico, mas sim produzido


por alguma entidade que não se encontra em nosso plano.

V.M. Chavajoth: É certo que isso é muito estranho.

Oicram Ynor: Trata-se de barulho gerado pelo ar-condicionado.

V.M. Zein: Você vê algum ar-condicionado ali? Não há nada, só a


caixa vazia.
Oicram Ynor: O barulho é provocado por uma goteira acima do ar-
condicionado.

V.M. Zein: Você vê alguma goteira acima da caixa? Se estivesse, haveria


um vazamento por sobre a caixa e nós perceberíamos.
V.M. Astaroth: Não vejo nada de anormal. Mas, o barulho é nítido.
Creio, sinceramente, que algo que não conhecemos produz o barulho.

V.M. Chavajoth: Vamos fazer um banimento aqui para ver o que


acontece.

Começa o ritual de banimento. A presença para de teclar a imaginária


máquina.

Oicram Ynor: Como disse havia uma goteira nesta sala, e a goteira
parou.

Frater Nihil: Estranho a goteira ter parado justamente após o ritual de


banimento. Será que não foi o ritual a expulsar a presença estranha?

V.M. Chavajoth: O ritual mexeu com forças físicas, e essas forças


interferiram no processo igualmente físico que produzia o barulho e o
paralisou. Um ritual é algo que mexe com o inconsciente e que libera
forças. Apenas isso, nada mais.

Nossos amigos continuam andando pela casa envolta em mistérios. Um


portal é encontrado. Trata-se de uma escada que dá sempre para o mesmo
lugar.

Frater Nihil: Que estranho! Por mais que subamos ou desçamos essa
escada acabamos sempre no mesmo lugar. Trata-se de uma escada
mágica!

V.M. Chavajoth: Trata-se de um portal. Para onde leva não sei, mas,
com certeza leva a algum lugar extrafísico tenebroso. Essa casa se move,
parece um cubo.

Frater Nihil: Vou tentar atravessar o portal.

Frater Nihil parte e atravessa o portal.


V.M. Zein: Convém que atravessemos o portal, Chavajoth. Não sabemos
o que há dentro dele!

V.M. Zein e V.M. Chavajoth atravessam o portal. Dão em um canteiro


de obras. Frater Nihil está tentando encontrar a saída.

Frater Nihil: Não há saída daqui!

V.M. Chavajoth: Calma, rapaz! Você tem muito o que aprender ainda!
É claro que existe uma saída mágica daqui. Da mesma forma que a
entrada foi mágica, a saída é mágica também. Acalme-se.

V.M. Zein: Muito estranho isso aqui. Parece que estamos em outro lugar.

V.M. Chavajoth: E estamos! Estamos em outra instância da casa. Em


um limbo para ser mais exato.

Frater Nihil: Veja ali! Montes de terra, tijolos para construção. Vai se
construir o que aqui?

V.M. Zein: São materiais para a construção do inferno. O inferno da


casa que por enquanto é limbo apenas.

Frater Nihil: Por que se construiria um inferno aqui?

V.M. Chavajoth: Não seja tolo, meu querido. Todos gostam de ter o
seu inferno particular.

XVII
A sala está repleta. Muitos homens, exatamente setenta e uma mulher, a
V.M. Astarteh, estão presentes. A ordem está fundando a Nova Loja.
Dimitri Yalovitch toma seu lugar a mesa ao lado de V.M. Astarteh. O
Dr. Zandor Etchevin senta-se ao lado de Dimitri. Astaroth fala.
V.M. Astaroth: É bem sabido que diante do homem existem
possibilidades. Sempre há um possível diante de alguma situação. Neste
momento, a Capela está atuando em algumas frentes: a guerra espiritual
contra os adoradores da lei, as incursões ao prédio da Universidade dos
Espelhos, a guarda de nossos interesses junto a espíritos prisioneiros, a
decretação de uma nova ordem e ainda os costumeiros. A guerra sempre
foi inevitável. Os Lords aqui presentes bem o sabem. Porém a fundação
da Nova Loja neste plano deve ser feita a fim de que possamos dotar a
mesma de egrégora.

Estão presentes a esta reunião: V.M. Zein, V.M. Chavajoth, V.M.


Baalbaki, Frater Nihil e Ynor Oicram. Dimitri Yalovitch pede a palavra.

Dimitri Yalovitch: Que esta fundação se dê rapidamente, pois sei que


não tenho tempo.

V.M. Chavajoth: Tens todo o tempo. Aqui ninguém nasceu, ninguém


morreu. Temos todo o tempo do mundo, como tu não o tens?

Dimitri Yalovitch: Não pretendo permanecer neste possível convosco


por mais tempo. Meu tempo neste possível se esgota lentamente.

V.M. Astaroth: Compreendo a razão de tua aflição, mas o caminho


que pretendes se estampa diante de nossos olhos, e, posso dizer que se
trata de um falso possível.
Dr. Zandor: Quando estamos em uma encruzilhada sempre nos restam
três caminhos alternativos a seguir. Para você existem mais ainda, pois
a encruzilhada em que você se encontra se chama vida. Enquanto há
vida, há possíveis a se realizar.

V.M. Chavajoth: A vida é um dos possíveis e ela abre outros possíveis,


podemos dizer então ser a vida um possível que gera outros possíveis.
Sejamos amigos do lento. A vida é lenta. Deve ser vista desta forma.
Viva sem pressa. Aprecie os movimentos, lépidamente por teus poros.
Acerca das incursões contra os adoradores da lei devo dizer que meus
exércitos se retiraram com honra diante das frentes inimigas. Fizemos,
por certo, inúmeras baixas. Os adoradores da lei são poderosos, bons
inimigos, porém sucumbirão diante dos esforços da Capela. Por isso,
digo, enquanto houver um inimigo teremos vida, pois teremos contra
quem lutar. O maior inimigo é o homem contra si mesmo. Ele se debate.
Enquanto ele não vencer suas próprias trevas, não estará pronto para o
combate. Que se proceda a fundação da Nova Loja.

V.M. Astaroth: In nomine Satanis ex infernus, Nova Draculea Loja


est, in nomine et Domine, fundatione Loja est perfecta.

A Loja repete em peso.

V.M. Astaroth: In nomine et Domine Luciferis in excelsius, fundatione


Loja est perfecta.

A Loja repete em peso.

V.M. Zein: Está fundada a Nova Força contra os adoradores da lei.


V.M. Astaroth, nossos exércitos se encontram estacionados nos limites
do templo dos adoradores. Iniciamos as incursões em território inimigo
e já obtivemos vitórias significativas. Nos resta agora congregar forças
para atingir o Santuário. Creio que V.M. Astaroth, V.M. Astarteh, V.M.
Chavajoth devam se juntar a mim no campo de batalha a fim de fazer
cadeia de força contra os inimigos e vencer os mesmos. Desta forma,
fortalecidos, entraremos no Santuário. Outra coisa, V.M. Astaroth, o
caso de Dimitri Yalovitch me preocupa. Devemos dar objetivos a ele,
pois um homem sem objetivos enfraquece e passa a ter idéias confusas.
Conclamamos Dimitri ao palco de guerra.

V.M. Chavajoth: Juntarei o mais brevemente o possível meus exércitos


aos de V.M. Zein e peço a invocação da cadeia para que atinjamos o
fim previsto. Lembro que o inimigo é bom de luta, mas a vitória é certa.
Força e honra, senhores!

V.M. Astaroth: Temos ainda nossos interesses na Universidade dos


Espelhos. Forças estão sendo debeladas lá. A caixa está sendo aberta e
logo passaremos pelo Portal dos Antigos em busca do inimigo. Quero
saber, agora, acerca dos prisioneiros e dos inocentes, devemos libertar
a todos?

V.M. Astarteh: Venho pedir clemência para com os inocentes. Os


mesmos devem ser levados a seus locais de origem e deve lhes ser dada
nova oportunidade. Quanto aos prisioneiros exijo julgamento justo
quanto às suas faltas. Não devem ser enviados sem mais para as
tormentas eternas. Quanto ao caso de Dimitri que se me permita um
conselho: nascer, aparecer, é um bem, a vida é um bem. Desta forma, o
auto-aniquilamento é sinal de covardia diante desse bem. Tudo fica
bem para quem morre, pois este retorna a vida dos atos, mas, e para
quem fica? Resta a desolação. Nada pode substituir um grande espírito.
Os grandes espíritos são como bibliotecas quem contém livros raros:
uma vez extintas não se tem mais acesso aos livros. Por isso, recomendo
a presença de Dimitri na frente de guerra.

V.M. Chavajoth: Que fique acordado então que os culpados, após


julgamento, entrem em minha jurisdição para os tormentos eternos. A
geena precisa de sangue fresco sempre.

V.M. Astaroth: E quanto aos prisioneiros que já temos trabalhando


para nós? Prometi liberdade aos mesmos após cumprirem a missão. O
que quero saber é: a Capela é concorde?

V.M. Chavajoth: Empenhaste tua palavra, meu caro. Entretanto, e se


tais espíritos não cumprirem com suas missões? Já disse: o inferno
precisa de carne nova.
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