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AS ERAS DOS

ENCONTROS
(as ideologias e faces dos
encontros de estudantes
de arquitetura)

Daniel J. Mellado Paz


Salvador, 28 de Novembro de 2003
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Prolegômenos
Ao contrário dos outros textos que fiz, este tem um caráter mais pessoal. Vem de uma necessidade
que tenho de dar um sentido maior ao que vi, vivi e ouvi falar. Depois de um certo tempo, e de uma
distância razoável, acredito poder fazer isso.

O Encontro é um evento único, um patrimônio dos estudantes de Arquitetura e Urbanismo, uma


oportunidade única na vida de muita gente. Essa crença é a que move este depoimento.

Ao contrário dos outros textos que fiz, vou fundir funcionamento, ideologia, atividades e desenho
físico-espacial em uma coisa só. Aqui, não vale a pena separar em partes, analisar cartesianamente.
Aqui, vale entender os rumos das coisas.

Ao contrário dos outros textos que fiz, este é descaradamente tendencioso. Emito minha opinião.
Não quero ficar em cima do muro. Acho que minha opinião tem fundamento. Mas ainda é opinião.

Um apelo às Comissões Organizadoras é o de tentarem ver sua iniciativa – sempre interpretada no


plano pessoal (claro!, é um empreendimento que afeta toda a vida de uma pessoa) – como mais uma
de uma série de mais de 25 anos, 25 gerações de estudantes propondo e criando. Sem perceber, fará
parte de uma continuidade.

Trato de identificar as ideologias por traz da organização dos Encontros. Essas ideologias não são
tão claras, elas se confundem. Perpetuam-se de maneiras diferentes. Mais parece um emaranhado,
jardim de caminhos que se bifurcam e se re-encontram em todos os cantos. Uma mesma ideologia
pode voltar a manifestar-se alguns anos depois, em um outro canto da América Latina, sem relação
direta. E em um mesmo evento vão co-existir discursos, e trechos de discurso, diferentes, sem que
se perceba a contradição que existe a cada momento.

Uma ironia: todo modelo traz consigo a semente de sua antítese.

Isso vale para os grandes artistas, grandes pensadores, que já trazem na sua obra a semente de sua
superação, aquilo que lhe passou despercebido e que não teve visão ou coragem para desenvolver. E
isso vale também para os Encontros, como construções ideológicas e filosóficas.

E, por último, este documento é uma das faces mais recentes de uma postura que tenho desde que
entrei no movimento estudantil (postura que foi ficando mais madura, com o tempo, acho): é
preciso que as coisas mudem, sempre.

Mas não a mudança para qualquer lado, e sim para que evoluam.

Qual a melhor maneira de um projeto se perder? Como uma idéia se corrompe?

Copiando o projeto sem refletir, congelando a idéia. O espírito de uma idéia é sua contínua
melhoria, a resposta criativa a ele, sua apropriação crítica. Aí ele vai virando apêndice, coisa
vestigial, que está ali sem ter um porquê, que vira dogma. Pode ganhar outro papel, outra dimensão
(atenção para isso!). Mas pode ser um apêndice.

E vamos às Eras dos Encontros...


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A 1ª ERA
O Encontro como atividade política, ou
o ENCONTRO-MANIFESTO
Esta visão do Encontro eu construí com base em depoimentos soltos, e material escrito, da história
dos ENEAs e de outros Encontros de estudantes. Portanto, tem falhas que nem posso imaginar onde
estejam.

Os Encontros nasceram como são hoje – ou re-nasceram – no regime militar, no anos 70. Todo
espaço de reunião de livres pensadores virava fórum político, como aconteceu com os IABs, por
exemplo. Com os Encontros de Arquitetura, não foi diferente. A UNE tinha sido dissolvida, muitos
partidos estavam na clandestinidade.

Os temas eram coisas pertinentes à arquitetura, que estavam despontando: ensino, patrimônio
histórico, identidade cultural. E o que se fazia com elas? Ora, se discutia e se decidia! O Encontro
era o fórum máximo dos estudantes, e a idéia é que os estudantes, como categoria, precisava
manifestar-se perante a sociedade, como forma de mostrar que tinha voz ativa, e com isso
influenciar em algo o mundo. No final das contas, o objetivo é sempre salvar o mundo.

O produto eram textos – e algumas vezes Atos Públicos, com todo o aparato que era devido, como
faixas, bonecos, etc. – e a conscientização dos estudantes.

Então, toda a estrutura do Encontro se volta para isso: painéis, mesas redondas, debates, grupos de
trabalho, palestras. Conscientizando os alunos sobre o assunto, trocando experiências, e avançando
em decisões. Opiniões assumiam o formato de “teses” (esse era o nome dado), que iam à Plenária.
Na Plenária, os estudantes, em assembléia, falando em nome dos estudantes de todo o Brasil,
votavam a favor ou contra as teses.

Ah... o formato era não somente assembleísta, mas todo calcado na representatividade. Só votavam
os Delegados das Escolas, que eram de Centros Acadêmicos ou nomeados por listas de assinatura.

É daí que vêm algumas coisas comuns a todos os Encontros de estudantes: credenciamento, mesas
redondas temáticas, e plenárias. Essa arquitetura existe em função do fim político do evento.

Claro, quem quisesse levar “moções” diversas à Plenária, tinha todo o direito. E votava-se que os
estudantes eram a favor de algo, e contra outras coisas. Isso virava “cartas abertas” à imprensa, e
encerrava-se por aí. O Encontro era uma caixa de ressonância dos militantes, que produzia
manifestos, em suas diversas faces.

Isto que falo pode estar enganado. Não vivi essa época. Mas isso é o que pude interpretar. Pode
haver mais idas e vindas. Fico à espera de que outros completem esse capítulo de nossa história.
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A 2ª ERA
O Encontro na cidade,
ou o ENCONTRO-SOLIDÁRIO

O marco definitivo foi o ano de 1995.

Em julho houve o XIX ENEA Santos, e em setembro, o V ELEA Valparaíso.

O que ambos diziam é: é preciso sair à cidade. Sair do formato tradicional, de ver e ouvir arquitetos,
em auditórios, e ir para as ruas, ver a cidade, ouvir a sociedade. Em ambos os Encontros, as
atividades ocorriam na cidade, interagindo com outros profissionais, lideranças locais, e outros.
Des-construiu-se o Encontro fechado em si mesmo, umbigo que tinha se tornado, falando uma
língua que ninguém entendia.

Esse foi o primeiro passo. O passo seguinte foi desenhar uma nova forma de ação, de salvar o
mundo.

Propôs-se nesse ano e se implantou no ano seguinte, no VI ELEA Montevideo, que se construísse
algo na cidade. Nesse ano foram objetos escultóricos e paisagísticos. No ano seguinte, junto com
comunidades carentes. E esse modo de interagir, a aproximação prévia com as comunidades, a
tecnologia construtiva, foi sendo aperfeiçoada ano após ano.

Essa evolução se deu com mais força nos ELEAs. Teve um diálogo com alguns Encontros
brasileiros – o XXII ENEA Rio de Janeiro e XIV EREA Campinas, em 1998 – que não seguiu
muito adiante.

Esse modo de agir e pensar o Encontro faz parte de uma visão mais ampla, que ganha clareza e um
rosto nos Ateliês de Ação Urbana. Mas, quais são seus pilares, suas crenças?

Uma delas é o incrementalismo: as mudanças se fazem com ações concretas e pontuais, aos poucos,
irradiando melhorias. A outra é a urgência: é preciso agir agora! Sim, há poucos dias no Encontro...
então, que se adapte a metodologia para isso, e que se introduza o estudante a uma realidade que ele
dará continuidade fora do evento.

A relação com a sociedade pára de ser via imprensa, via grandes manifestos, mas com projetos
concretos com comunidades. É uma nova cara para a militância.

Outras ênfases importantes são o uso da tecnologia intuitiva e da bio-arquitetura. Sim, influência
clara e direta do ITIBÁ – Instituto de Tecnologia Intuitiva e Bio-Arquitetura. Isso casou com a
viabilização específica de uma construção no curto tempo de um Encontro.

Isso se entende hoje, que se tornou algo conhecido e aceitável, condição essencial para as ONGs e o
Terceiro Setor em geral. Mas quando surgiu essa idéia nos Encontros, a mudança era clara: parar de
falar e escrever, e começar a agir. E fora do lugar de sempre, mas na cidade real, com as outras
pessoas.

Por uma característica implícita em seu modo de ser, esse conhecimento não se escrevia. Não temos
muitos registros disso.
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No entanto, isso cheguei a ver, e conhecer as pessoas que propuseram essas mudanças, e portanto
sua visão do que era o Encontro. Esta é uma outra razão para este depoimento: suprir a falta de
registro que existe desses rumos ideológicos, e sua influência no que temos hoje.

Atenção! Direcionar o Encontro para a cidade não significa automaticamente no encontro


fragmentário, disperso na cidade. A relação da cidade não se dá somente e por conta da distribuição
espacial, mas sim de sua proposta e atividades concretas.

Os ELEAs, até hoje, são os melhores representantes do Encontro-ONG. Sua dinâmica oscila entre
dois pólos intensos, as saídas e a cidade-sede, que é uma “cidade” somente em faixas de horário
próprias, de permanência (noite e manhã).

Sua antítese surge em si próprio, com a Cidade-Encontro

A 3ª ERA
O Encontro vira uma cidade,
ou o ENCONTRO-UMBIGO
Sim, esta é uma crítica, e mesmo uma auto-crítica. O termo Encontro-Umbigo é pejorativo.

A idéia surge em 1996, na concepção do VI ELEA Montevideo. Imaginava-se juntar o que havia de
melhor no IV ELEA São Paulo (1993) e no V ELEA Valparaíso (1995), que era a concentração de
funções em um prédio (que foi na FAU-USP) e a dinâmica de workshops na cidade (que foi em
Valparaíso). Falaram em Encontrópolis, mas isso dentro da Comissão Organizadora.

O Encontro-Umbigo se constrói com clareza e salta como ideologia comum a todos a partir de
1999. Em julho houve o XXIII ENEA Goiânia, e em outubro o IX ELEA Salvador.

Com o XXIII ENEA Goiânia, a infra-estrutura dos Encontros alcançam uma qualidade única, que
marcou época. Principalmente a alimentação, os banheiros e chuveiros (pela primeira vez
impecáveis, limpos e sem problemas) e os alojamentos. Em belos edifícios da UCG, e com um
teatro de arena no meio, funcionando como área de concentração. Por limitações orçamentárias,
saídas com vagas bastante limitadas para outras cidades (visitas orientadas) e intervenções (os
PAC’s).

O contraponto foi o IX ELEA Salvador, que popularizou o espaço físico típico dos ELEAs, e usou
como peça de divulgação o termo Cidade ELEA.

Isso não quer dizer que a centralização de funções e atividades não existisse antes, mas não se tinha
elevado à condição de valor que se justifica a si mesmo. Ele, por si só, basta. Quando ocorre a
falência das atividades externas – por sua fragilidade ou pela ausência do público – o Encontro se
torna um umbigo, sem relacionar-se com a cidade e avançar em um sentido propositivo. Não foi
isso que aconteceu no XXIV ENEA Taubaté (2000) e XXV ENEA João Pessoa (2001)?
Principalmente em Taubaté, onde as pessoas não tinham o quê fazer e para onde ir durante o dia.

Parte do discurso original da Cidade-Encontro tem uma orientação de planejamento e ambiência:de


incorporar no lugar elementos inspirados na cidade (ex.: sinalização, caixa automático, lanchonetes
e praça de alimentação, áreas de exposição, lavanderia, revelação fotográfica, tudo isso já foi
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implantado em Encontros), aumentando sua auto-suficiência. Uma outra dimensão, presente nos
primeiros ideólogos dessa forma de cidade, desapareceu, que era o do formato de cidade como um
estímulo do exercício da cidadania dos Participantes, explorando formas de auto-gestão e de
relacionamento entre si.

Mas isto se perdeu, como intenção, e o ideal da Cidade-Encontro limita-se a justificar uma escolha
logística (concentração de funções e atividades) na esperança de que isso já estabeleça interações
mais fortes.

Só que nem sempre isso acontece. E já se viu que essa interação pode acontecer em Encontros de
grande mobilidade, sem ter que privilegiar a inércia e a permanência na Cidade Encontro.

No Brasil, sem o contraponto da circulação pela cidade durante longos períodos, e sem um
propósito maior, as Cidades-Encontro se umbigaram.

INDEFINIÇÕES DA TRANSIÇÃO
Pequenas Ideologias que se Repetem
Nos últimos 10 anos, sem que tenham criado escola

O Encontro se apaixona por si mesmo,


ou o ENCONTRO-EM-SI
O XIX ENEA Santos (1995) foi o primeiro a reconhecer como objetivo oficial o ato de encontrar-
se. É uma verdade inegável que, por trás de todos os motivos que podem orientar a ação de um
Encontro, o primeiro ato, e o mais apaixonante, é a aventura de encontrar-se.

O que acontece é uma situação contraditória. Evidente que o importante é ter acontecido o evento,
já que é muito difícil montar o dito cujo, reunir gente para isso, e sair ileso da experiência. Porém, o
que tem acontecido é que o discurso do “encontrar-por-encontrar” tem justificado a ausência de um
sentido maior no Encontro, em um pra-quê se encontrar. Muitas vezes é usado quando o proposto
se diluiu, por motivos justos ou injustos.

A idéia do Encontro-Em-Si esvazia qualquer sentido propositivo que se pode ter, e impede uma
avaliação crítica e uma evolução.

A importância de se encontrar é uma das molas-mestras da vida. Mas acho que já se disse que mais
importante do que estar junto, é fazer algo juntos. Independente disso, o que eu vi até o momento
foi a fragilidade conceitual e operacional dos Encontros que e limitaram a essa filosofia.
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O Encontro como evento para a juventude,


ou o ENCONTRO-FESTIVAL
Essa é uma dimensão assustadora do mundo contemporâneo: a espetacularização da vida e do
mundo. E os Encontros seguiram isso. Os festejos noturnos começaram como uma pulsão natural.
Onde tem gente junto, se festeja, se dança, se canta, se bebe, se apaixona-se...

As Comissões Organizadoras começaram a estruturar as festas noturnas com uma boa intenção, de
brindar um divertimento a mais, após um dia cheio, e mesmo de mostrar valores locais. Quando isso
vira um encargo a mais, esperado e cobrado pelos Participantes, razão mesma deles irem ao
Encontro, algo está alterado.

Temos o Encontro-Festival, onde o estudante é espectador, e o que ele tem é a repetição dos
processos das casas-de-espetáculo no Encontro. A partir daí o público se auto-alimenta, e passa a
vir cada vez mais pessoas que têm isso como expectativa do Encontro, em um círculo-vicioso.

Nós sabemos que existem diversas formas de se divertir juntos à noite. Desde rodas-de-violão,
ENEMAs da vida, batucadas coletivas e “hoje-ninguém-dorme”, até shows com músicos locais, ou
mesmo famosos. É uma dimensão da vida, e da juventude, fundamental.

A pergunta é: o que acontece quando a festa é o único referencial do Encontro? Quando o sinônimo
de qualidade é uma infra-estrutura maior? Quando um Encontro pode ter atividades vazias, mas
deve garantir ainda a Festa? E quando a Festa passa a exigir uma infra-estrutura pesada,
praticamente autônoma em relação ao Encontro?

O Encontro como instância acadêmica


ou o ENCONTRO-CONGRESSO
É o “oposto” do Encontro-Festival, pelo menos na história dos debates sobre Encontros. Toda vez
que se diz que existe muita farra (bebida e libido) no Encontro, o oposto é o Encontro “sério”, que
significa que ele, para ter conteúdo e ser respeitado, tem que repetir o formato acadêmico.

Essa idéia raramente é levada até as últimas conseqüências. Tem a reação das pessoas, as
dificuldades financeiras e logísticas de sobrevivência, que acabam vindo antes (alojamento,
refeição, etc.), e a crença de que isso não faz parte (e não faz mesmo!) da cultura e condições do
Participante. Cá entre nós, o melhor lugar para se dormir em um Encontro é um auditório: tudo
escuro, confortável e refrigerado...

Mas... bem, essa forma é a tradicional, a que sempre é feita na Academia. Por mais que se diga que
a Universidade seja uma vanguarda da sociedade, nós sabemos muito bem que ela tem seus ritos e
tradições tão engessados quanto qualquer outro setor da sociedade – em alguns casos, até mais. Nós
sabemos que a forma de ensino em sala de aula, a própria idéia de sala de aula, é algo que vem da
Idade Média, e os poucos professores que conseguem perceber isso não conseguem mudar a força
do hábito (nem neles mesmos!).

Então, no meu ver, o Encontro-Congresso ele sofre das deficiências crônicas da Universidade. Ele
se estrutura de modo ao estudante ser espectador. Dizer que em uma mesa redonda há debate, é
quase sempre uma inverdade. E se há debate, poucas vezes é com o estudante. Só o mais desbocado
consegue discutir com o expositor, ainda mais quando tem muita gente assistindo. O protagonista
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está no palco, o estudante é platéia. Temos aí dois componentes: a hierarquia do saber, e ritos
rígidos de comportamento. Ora, o próprio espaço de um auditório induz a parte desses ritos – nós,
arquitetos, melhor do que ninguém sabemos isso.

O Encontro-Congresso traz ainda um outro porém, que não tem a ver com seu formato, mas com o
que deixa de ser. Na maioria das vezes, os estudantes aceitam com mais facilidade e incentivam
novos assuntos (permacultura, acessibilidade e desenho universal, etc.) e novos meios didáticos, na
ânsia de explorar e conhecer mais. Coisas que na Academia, e com os profissionais de sempre, não
acontece. É difícil esperar dos profissionais (professores e arquitetos) de sempre algo realmente
diferente: eles já estão “catalogados” dentro da área, já se conhece o seu discurso, e seu teor
revolucionário já foi podado ou encaixado, ou nem mesmo existiu – o verdadeiro revolucionário
teria sido “eliminado” antes.

O Encontro-Congresso perde a chance de ser o que a Academia não pode ser: de vanguarda,
inovadora, em formatos e assuntos, livre, questionadora, efervescente. O próprio Encontro-Solidário
é bastante assim, ao pleitear assuntos que nas Escolas não se vêem: contato com comunidades,
arquitetura social e bio-construção, e o ato de construir.

O Encontro como reprodução do mundo


ou o ENCONTRO-PLURAL
Todo Encontro podia ser diferente. E toda opção são várias renúncias. É um fato delicado saber que
um formato de Encontro vai atender a um público e negligenciar outros. Qual a solução?

Esses dilemas aparecem a todo momento. Que gênero musical escolher? Colocar um pra todos os
gostos todos os dias, ou mais de um palco? Na alimentação, vai incluir o vegetariano? No
alojamento, vai dar espaço para quem tem e quem não tem barraca? Claro, além da boa intenção,
isso sempre esbarra na capacidade que se tem de fazer isso: gente, infra-estrutura e dinheiro.

Há o ideal do Encontro-Plural, ou mesmo Total, que tente abrigar o máximo de diferenças


possíveis, ao mesmo tempo. Que tenha sessões de cinema, atividades esportivas, lúdicas, etílicas,
etc. Infelizmente, quase sempre financiados pela Comissão Organizadora.

Ele sempre naufraga por conta da falta concreta de recursos (e de braço!). A outra questão é de
ordem filosófica. Ainda que reproduzisse a diversidade do mundo conhecido, ainda assim... quem
não está insatisfeito com o mundo? Se mesmo o que existe não contenta a todos, o que dirá de um
Encontro?

Ainda assim, a idéia do Encontro-Plural é motor de muitos estudantes. Que se manifesta em ações
esporádicas, como o ralf para skate do XXIV ENEA Taubaté (2000), ou o cinema do XXIII ENEA
Goiânia (1999), a exposição de fotos de outros Encontros no XI ELEA Montevideo (2001). Ou a
variedade desconcertante de atividades ao mesmo tempo do XXII ENEA Rio de Janeiro (1998)
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O Encontro como faça-o-que-tu-queres


ou o ENCONTRO-ABERTO
Essa é outra ideologia. Todas as ideologias existem no Encontro, como filosofia e como fato. Mas
convivem entre si. Esta é a idéia de que o Participante faz o que bem entende – e faz. E como ele
faz isso, deve fazer ainda mais. E deve ser responsabilidade fazer as coisas. Se virar. Correr atrás.
Ninguém é pai de ninguém. Todo mundo é adulto.

Claro, para inventar e fazer zoeira, argumenta-se, todos se mexem, conseguem dinheiro, se
descobrem na cidade. Por quê não para o resto? Verdade e mentira.

Sabemos que não é assim. Uma coisa é poder, a outra é querer, e outra é saber. As decisões tomadas
em prol de um Encontro-Aberto são válidas, mas raramente se lembram de avisar os Participantes.
Para que eles se preparem, física e espiritualmente.

Não adianta programar uma Festa, colocar no site e no folder, e na hora H avisar aos estudantes que
vai ter Festa à Fantasia. Não se deu a chance do sujeito trazer a fantasia, certo?

Não adianta chegar e dizer: o local do Refeitório fica a 2km daqui, você pega os ônibus tal e tal,
porque nego não vai (se é que não vão ficar fulos da vida) e, se vai, vai de muita má vontade. Sim,
isso aconteceu no XXII ENEA Rio de Janeiro (1998). Claro que ninguém entendeu a ideologia por
trás: acharam que foi descaso e preguiça, quando não uma tremenda sacanagem.

A idéia do Palco Livre, no V EREA Paraty (2002) foi nessa linha, com resultados melhores.

Agora, pontos mais filosóficos. Na terra do faça-o-que-tu-queres, há uma desonestidade... porque a


Comissão Organizadora abre espaços, e alguns casos complica o acesso a algumas coisas... mas o
bar está do lado (quem vai perder esse dinheiro?). Então, a bebida começa ganhando na corrida, por
conta dos próprios Organizadores. O Encontro não é tão aberto assim, afinal.

O Encontro-Aberto se vende como livre, como receptáculo para todos os estudantes. Não é verdade.
Tem muita gente que não vai ao Encontro porque ele é muito Aberto. Ah, esse pessoal é careta,
certo? Tudo bem... mas que não se diga que o Encontro-Aberto é democrático. Não, ele exige que
se tenha um Participante-Aberto, que curta construir sua situação a cada momento.

O Encontro-Aberto poderia exercitar formas de cidadania, mas não faz. Se não há destinos comuns,
o que existe é convívio pontual. Sem um prévio desenho desse exercício, de como se pode estimular
isso, o que se tem é a lei-do-mais-forte. Embore eu goste do “pode-dormir-pode-cochilar” e do
“hoje-ninguém-dorme”, e ache que seja a cara dos Encontros que vivi, não posso negar que são
brincadeiras autoritárias, a lei-do-mais-forte.

A lei-do-mais-forte tem aí uma faceta mais inocente, mais lúdica. Mas pode ter outras facetas
desagradáveis.

Sem um exercício mais pró-ativo da cidadania, sem rumos claros do que se pretende, de novo o
Encontro perde impulso, uma idéia propositiva.

É preciso, verdade inegável!, que haja momentos no evento de puro encontro, sem maiores
propostas. Do simples estar-junto, e de preferência com muita gente, para se ter uma noção dos
tantos que estão ali. Porém... no meu ver, o Encontro tem que ter ainda uma carga utópica,
representar um projeto de futuro.
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RUMO A UMA 4ª ERA


O Encontro como nexo,
ou o ENCONTRO-INCUBADORA

A partir daqui, o que é opinião pura e simples fica escancarado. E tento vender meu peixe! Quem
vai comprar, quem vai comprar?

Para começar, eu renego toda forma de ideologia que se satisfaz em ser como é o hoje. E renego
toda apropriação que não vise a contínua melhoria. Sempre se pode melhorar.

Não vejo sentido em um evento de estudantes se ele não estiver pulsando de vitalidade e de sonho.
Se ele não estiver disposto a propôr novas formas de ver o mundo, de se trocar idéias, e novas
idéias. O estudante não pode ser um arquiteto-tradicional-mirim, mas a semente para um arquiteto
diferente. O filho (estudante) é o pai do homem (arquiteto). O Encontro de Estudantes, se não for
utópico, não diz para que veio. E o estudante que não tem aspirações já está velho.

O Encontro ele tem que ter utopia em cada momento seu. Tem que ser um território novo, diferente,
um balão de ensaio. Nele as pessoas trocam idéias, sem preconceitos, ou disciplinas fechadas e
muradas, como acontece na Academia. Nele as pessoas convivem em diferentes momentos do
cotidiano, e vão se conhecendo como ser humano. Ele é diferente, e tem que explorar essa
diferença, em vez de se render a outros formatos e perder o seu potencial.

Qual o nosso futuro? Qual deveria ser a nossa 4ª Era dos Encontros?

O último ENEA, o XXVII ENEA Ouro Preto (2003), foi um autêntico Encontro-Congresso, o mais
fiel representante (talvez o único) dessa ideologia. Sua estrutura comportava simpósios com temas
distintos e abrangentes, e dentro deles formatos como mesas-redondas, oficinas e palestras. Seu
modo de pagamento era por composição de pacotes. Justiça seja feita: muito do des-encontro se deu
pela pulverização dos estudantes em Ouro Preto, e não pela forma de Encontro-Congresso.

Mas, nesse ENEA estavam lançadas as sementes de seu oposto.

Destaco: o Conselho de Gestão, as reuniões dos EMAUs (mais a Oficina de Extensão como
Comunicação) e o CICAU (em sua terceira edição).

O que eles têm de especial?


Que os participantes são e podem ser os protagonistas. Há um intercâmbio mais eficiente. Criam-se
laços que perduram para mais além da semana do evento (o que está havendo entre os EMAUs é
exemplo e prova disso). Porque são experiências de auto-gestão dos encontristas, administrando
atividades dentro do ENEA.

Ainda é marginal, à parte... mas por quê não pode ser maior?

A visão que hoje defendo parte de coisas que já existem... é tomá-las como sementes para uma face
do Encontro diferente.

Que incentive a gestão partilhada por grupos interessados. Que abra espaços, incubadoras, para as
iniciativas dos estudantes... já existem estes “úteros”, ainda no seu estágio inicial, para a pesquisa
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científica (CICAU), para uma forma específica de extensão universitária (EMAUs), e para as
“lideranças” estudantis (Conselho de Gestão). Existem outras dimensões... outras formas de
extensão, a produção artístico-literária, a produção acadêmica, a questão dos estágios, etc.

Hoje em dia, o estudante já entra em contato com muito desses outros “mundos” via Encontros...
esse modelo novo tornaria isso ainda mais intenso. Permitira que se criassem mais contatos, e
multiplicaria o número de pessoas interessadas em auto-gerir o Encontro e em fazer movimento
estudantil.

Nas primeiras versões, alguns destes espaços não andariam bem das pernas...mas delegar
responsabilidades é isso.

Ora, esse Encontro-Incubadora seria heterogêneo. Mas... será que é um objetivo o Encontro-
unidade, onde tudo remete ao tema? Como o tema em si interessa apenas a um punhado de
estudantes... será que essa é a melhor forma de atingir os estudantes, e de reconhecer seu potencial e
produção? Ou é um vício de formação do arquiteto, como autor da obra de arte total?

E isso pode ir mais além... pode incorporar formas de auto-gestão nos espaços, além de nas
Atividades. Indo mais além apenas da limpeza do alojamento.

Claro, houve iniciativas várias nesse sentido: no XXI ENEA Porto Alegre (1997) estimulava-se a
que as Delegações trouxessem bandas de estudantes para tocar nas noites, e teve exposições de
trabalhos acadêmicos. Mas tem sido iniciativas isoladas, e não algo estrutural do Encontro.

O Encontro seria um nexo entre vários fluxos diferentes, um momento de intercâmbio, de renovar
as energias, de expôr-se o trabalho que vem sendo feito para todo o Brasil, de seduzir outras
pessoas, de influenciar e deixar-se influenciar. Isso já acontece. Mas pode ser melhor.

Eu defendo as mudanças? Mas também defendo as continuidades e resgates... Uma coisa muito
difícil no movimento de área é criar Atividades e espaços únicos, que lidem com a essência de seu
curso. Os Ateliês de Ação Urbana (ou PACs, ou Oficinas Construtivas na cidade, não importa o
nome) são uma delas. Pode e merece ser evoluído, ir mais além.

O CICAU é uma conquista inegável.

Essa 4ª Era que defendo não é uma invenção do nada. É uma percepção de algumas conquistas que
conseguimos, com muito custo, dedicação e ousadia. Caramba!: o material de referência do Ateliê
de Ação Urbana do XI ELEA Montevideo (2002) é feito com uma qualidade que muito profissional
não alcança!

Trata-se de perceber as sementes que já existem, e dar espaço para elas crescerem. E aprender a
lição que elas nos dão. Não tenham dúvida: as sementes da 4ª Era, seja ela qual for, já estão aí. O
futuro se enraíza no presente.

“Para quem souber ver as sementes do tempo, e saber qual irá germinar, e qual não.”
Fredric Jameson, As Sementes do Tempo

Com a diferença que está nas mãos de vocês decidir em quais sementes apostar, e em quais não. São
mais do que espectadores, ou personagens secundários, mas sim os heróis da história.
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Qual, então, seria a meta de cada Encontro em si? Não deixar essas petecas caírem, melhorarem,
deixando-as mais leves, mais aerodinâmicas, até o dia que elas mesmas tenham vôo próprio, e
sirvam como gestoras de seus espaços nos Encontros. E lançar novas bolas ao ar, na esperança de
que voem também.

O exemplo que eu dou é o que eu vivi no IX ELEA Salvador (1999) – descontando o que houve de
bom e ruim, os risos e choros, depois de alguns anos... Os méritos são dois: ter mantido e
melhorado (um pouquinho) a idéia dos Ateliês (e visto que nos anos seguintes se evoluiu ainda
mais) e ter lançado no ar a idéia (que não aproveitamos, e não se aproveitou ainda) da Cidade-
Encontro, do Encontro como lugar de exercício da cidadania e de outras formas de viver mais
justas.

O XXVII ENEA Ouro Preto (2003) cantou outras pedras: teve o Conselho de Gestão, os EMAUs
tiveram mais espaço, consolidou o CICAU, lançou a idéia (que foi viável) da Maratona de Projetos
(que deve ser evoluída, aperfeiçoada, adaptada).

E por aí vai.

Qual o papel que o próximo Encontro (seja lá se Regional, Nacional ou Latino-Americano) vai ter?
Como ele se encaixa no trabalho coletivo das gerações? Um Encontro é uma construção coletiva: no
agora e nos anos.

Um alerta! Achar que se é único e individual, que se vai partir do zero (como infelizmente acontece
de quando em quando), é cometer dois erros: o de pre-potência (“vou fazer o que os outros não
conseguiram fazer”) e o de ingenuidade (“tenho idéias novas e exclusivas”, quando não são nem
uma nem outra).

Cada geração tem o direito e a missão de inventar sua parte, de levar a tocha adiante. Mas, tem o
dever de deixar algo para os outros. Começando pelo repasse financeiro, e indo muito mais além:
não concebo continuidade sem que os ex-membros de Comissão Organizadora não compareçam
depois para dar uma mão aos seus sucessores. E tem o compromisso de fazer valer o esforço de
tantos outros que vieram antes – pelo espírito da idéia, que é a evolução.

“A vida inventa! A gente principia as coisas, no não saber por que, e desde aí perde o poder de
continuação - porque a vida é mutirão de todos, por todos remexida e temperada.”
Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas, pp. 293.

Vão tomar as idéias dos outros e brincar com elas. E vão brincar com as suas idéias. Remexê-las e
temperá-las. Mutirão de todos.

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