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"JUSTITIA" tem a grata oportunidade de oferecer aos seus leitores o magnífico trabalho do prof. Tullio Ascarelli sob o
título "A Mensagem Jurídica de Dante". O prof. Tullio Ascarelli nasceu em Roma no ano de 1903, formado pela
Universidade de Roma. Aperfeiçoou seus estudos em Berlim e Genebra, conseguindo, em Roma, o prêmio do
Ministério da Educação e, em Berlim, o prêmio "Humboldt Stiftung". Em 1928, publicou um amplo volume intitulado
"A Teoria Jurídica do Dinheiro", que obteve menção honrosa do "Institut International de Cooperation Intellectuelle"
e, mais tarde, o "Curso de Direito Comercial que levantou celeuma em todo o mundo jurídico. São de grande
importância seus estudos sobre "O Negócio Indireto", que trouxeram um sentido dinâmico às questões de direito;
sobre Sociedades Mercantis e Títulos de crédito, que exerceram marcada influência na orientação da doutrina e
jurisprudência italiana sobre o contrato de Sociedades mercantis assembléias, dívidas em dinheiro, cláusula ouro e
títulos de crédito. Dada a repercussão de seus estudos foi chamado a ocupar a cadeira de Direito Comercial nas
Universidades de Pádua e Bolonha, tendo sido eleito membro da comissão italiana da Nova Lei Cambial e da
comissão de revisão do ante-projeto Ítalo-Francês das obrigações bem como das comissões de redação das leis
italianas sobre Sociedades de seguro, e sobre patentes e marcas.
DANTE
DANTE PROFETA
O poeta, ao mesmo tempo, profeta e "latore" de uma mensagem, qualifica a sua obra
como "'l poema sacro al quale ha posto mano, e cielo e terra". Poeta e profeta! Duas palavras que,
no fundo convergem. E os povos, nas horas mais graves da sua história a rebuscam na obra dos
próprios poetas ensinamentos e incentivos, pois os grandes poetas, desde a "Comédia"', de
Alighieri, ao gorthiano "Faust", procuram ensinar por intermédio da poesia as eternas verdades.
Através do canto da experiência pessoal, concedida para a sua própria salvação, Dante
quer anunciar uma mensagem. E, então, arvora-se em juiz e vingador de imperadores e pontífices,
de povos e reinos, castigando-os ou premiando-os, e a história da humanidade oprimida salta do
poema reorganizada e julgada. A mensagem é viva nas imagens do poema e, por isso, concreta real,
revelada, antes de ser argumentada.
Foi para seguir "virutute e conoscenza" que Ulisses se lançou para além dos limites das
colunas de Hércules, símbolo dessa ansiedade de descobertas, que o mundo grego nos transmitiu, e
sobre cujas bases se acimenta a civilização. E, nos versos do poeta, já no umbral do mundo
moderno, pasma-se ao sentir aquela impaciência, que, dois séculos mais tarde, impelia os
navegantes a desmantelar as muralhas do mundo antigo, e implantar o início de uma nova
civilização. Dante canta o fracasso do empreendimento de Ulisses, já predestinado pela vontade
divina: "e la prora ire in giù, com'altrui piacque, infino a che il mar fu supra noi richiuso". -
Fracasso eterno da eterna fraqueza da mentalidade humana, ansiosa sempre por novas verdades e
orgulhosa de suas conquistas e, no entanto, impotente para romper o véu do mistério e
constantemente humilhada em seu orgulho: "ché se potuto aveste saper tutto, mestier nou era
partorir Maria"... Busca eterna e gloriosa, eterno e imprescindível fracasso!... É o drama da
inteligência umana e do mistério insondável...
LIBERDADE E AUTORIDADE
À entrada do Purgatório, Dante colocou, como guarda, Catão, pagão, mas não danado,
acérrimo inimigo de Cesar, que ao poeta aparecia como fundador de um império providencial.
Suicida, e, todavia, não condenado nas selvas dos suicidas, mas salvo. E, ali, à porta do
Purgatório, Catão deverá permanecer até a consumação dos séculos e então, somente então, lhe será
franqueada a alegria do Paraíso, no momento em que "la sua veste sarà sovra le altre chiara". Catão
é o símbolo eterno do amor da liberdade, dessa mesma liberdade que o poeta procurava, segundo as
palavras de Virgilio: "Libertà va cercando ch'é si cara, - come sa chi per lei vita rifiuta!"
Liberdade e paz! - Eterna aspiração dos homens, que vivem em "quest'aiuola che ci fa
tanto feroci". E, ao encerrar o seu estudo sobre a "Monarquia", Dante, o filósofo, concluiu com esta
frase, que é o mais profundo anseio do homem e de toda a humanidade: che a ció deve
massimamente tendere, cioé che in questa piccola zolla dei mortali si viva liberi e in pace".
O poema deseja ser, também, uma mensagem de salvação para aquela sociedade
corrompida, da qual, cheio de indignação, o Poeta se afasta, desbravando o seu próprio caminho,
porque, no tumulto das paixões partidárias, "forte (é) a veder chi più si falli". Se ousa falar e
escrever, é porque o desmantelamento moral e intelectual já atingira as raízes da corrupção e, na sua
célebre epístola, dirige-se, altivamente, a reis, povos e autoridades, além de escrever tratados,
destinados, como se lê no preambulo de "Monarquia", a fazer triunfar, entre as malhas fortes da
lógica, uma verdade nunca dantes conhecida.
Não se iludia e muito menos se vangloriava o pensador, porque de fato a crise, que
revolvia a Europa do século XVI, e devia originar a criação do estado moderno, banidas as formas
da sociedade medieval, era crise moral e intelectual, da qual, como sói acontecer, se sucediam as
lutas armadas, mais como sintomas do que como causa, pois se lutava e se resolvia tanto nos
campos de batalha, como no recesso das consciências. Esta crise exteriorizava-se, por sua vez,
contraditória e extenuantemente nessa vasta literatura filosófica, que defendia e superava a herança
intelectual da era medieval.
Desde a posição moderada do "De Regime Principum", escrito, em parte, por S. Tomás;
até ao opúsculo com o mesmo título de Egídio Romano, reivindicando a "plenitudo potestais" do
Sumo Pontífice, segundo os princípios da bula do Papa Bonifácio; até aos tratados dos juristas
franceses, que teorizavam a plena soberania do Rei de França, pois eram intérpretes das exigências
daquela burguesia, aliada ao poder real; até as reafirmações curiais dos decretalistas, quer
dominicanos, quer agostinianos; até ao "Defensor Pacis" de Marcilio de Pádua, em que o
contratualismo medieval abre campo para o conceito moderno da soberania popular, - é tudo uma
vastíssima literatura política e jurídica. Essa literatura era arma de propaganda nas lutas de Felipe, o
Belo, e de Ludovico, o Bavaro, mas, também, não deixa de ser o documento, - e bastaria apenas o
"Defensor Pacis", de Marcilio, - de um movimento mais profundo dos espíritos, que, partindo dos
esquemas da polêmica política, geração de séculos anteriores, se encaminha para aelaboração de
novos conceitos.
A CRISE DO SÉCULO XIV
A luta assume, então, um caráter trágico e íntimo de guerra civil, a desencadear-se entre
irmãos e dentre, de cada alma. O futuro surge negro e angustioso aos homens, que parecem
abandonados por Deus.
Diante do trabalho, que forjava uma nova civilização, Dante se alenta na tradição do
pensamento antigo e medieval e apanha-lhe e recompõe-lhe os motivos. À Florença do século XIV,
que, logo depois, surgiria na humana comédia do "Decameron", de Boccacio, o Poeta opõe a sua
visão dos reinos de além-túmulo. A vida política moderna, que surgia dos escombros da Europa
medieval, o filósofo ajusta a tradição já morta de um Império, que Arrigo VII, de Luxemburgo, não
podia, por certo, fazer renascer. Mas é essa inatualidade de Dante em relação à sua idade, que nos
permite verificar a eternidade de sua mensagem, pois terá sempre esse cunho, porquanto não
constitui banal panacéia e dá ao seu caráter, tido como utópico, um valor constante.
Foi condenado, como herege, pelo cardial Bertrando del Poggetto, no meio de lutas, nas
quais o poeta como homem e homem político, tomará parte. A sua teoria político-jurídica invocada
por católicos e protestantes, por liberais e ditadores, é um símbolo sempre vivo, porque utópica e a
sua mensagem é eterna justamente porque, mau grado escrita diante de acontecimentos
historicamente prefixados, pode transcender as contingências históricas e pode avançar com toda a
sua veemência pelo mundo das idéias, ainda que madrasta lhe tenha sido a sorte nos programas
políticos do século XIV. Mortos eram os sonhos, espalhados na alma do exilado pelo fim do longo
interregno imperial e pela chegada à Itália de Arrigo VII e inútil seria confrontar os seus programas,
os seus projetos, as suas esperanças como a realidade e as possibilidades da Europa do século XIV.
Mas, fora das contingências históricas, permanecerá sempre vivo aquilo que podemos tornar a
chamar como a substância do pensamento político-jurídico de Alighieri.
Será sempre viva a reafirmação substancial da união do gênero humano, que é o marco
de partida e a preocupação contínua do pensamento dantesco. União dos seres humanos, que, no seu
pensamento não significa diminuição e, muito menos, negação das suas várias e múltiplas
formações políticas e da soberania dos Estados, mas, pelo contrário, o seu reconhecimento nas
formas complexas, que elas assumem nos povos e nos tempos diversos, como as lembrou e celebrou
o Poeta, convergindo cada uma para um determinado fim particular.
Mas essa variedade de povos e de regimes políticos, particulares a cada povo, não
deprecia a unidade fundamental da família humana, da qual derivam as lindes à ação de cada Estado
particular, manifestando-se, segundo o seu pensamento, no Império a que Dante chama de
"Romano", porque, criado como uma necessidade lógica, acima de todas as eventualidades
históricas, não podia ser ligado senão a essa Roma eterna, onde "Christo é romano", e que, no
decorrer da história, lhe apareceria igualmente personificado no espanhol Traiano e no alemão
Arrigo. Esse princípio já se avolumava no seu espírito como um acontecimento bíblico infalível, da
mesma maneira que, na história da Torre de Babel, a derrocada inevitável da consciência desta
unidade era coisa biblicamente indicada. Esse princípio foi biblicamente revelado e, depois,
filosoficamente argumentado pelos filósofos gregos até a doutrina tomista, tornando-se então, tarefa
dos doutos o indagar os precedentes e as várias manifestações dessa teoria na história do pensaento.
No seu espírito, assim como na tradição, para a qual imediatamente se volta, o Império
se identificava com o Direito Romano e a unidade imperial se identificava com a unidade jurídica
européia, fundada sobre esse Direito que teve a sua renascença na Escola de Bolonha. Unidade
jurídica positiva e real, manifestada no universal reconhecimento da época, e pelas práticas
quotidianas, oriundas da vasta aplicação do Direito Romano, que, adaptado às condições e às
necessidades do tempo, ia conquistando o mundo civilizado, sem armas. O renascimento do Direito
Romano e sua expansão progressiva em toda a Europa continental, a partir do Século XII é um
fenômeno único e singular. Ressuscitado com os ensinamentos da escola Bolonhesa e, novamente,
estudado nas obras dos juristas, o Direito Romano torna a ser um Direito de prática aplicada,
desenvolvido e remoçado pela obra de interpretação. E essa aplicação estende-se para adiante, para
os séculos sucessivos. Abrange praticamente toda a Europa continental. Influi até sobrea Inglaterra.
Espalha-se tanto que, ainda hoje, podemos reconhecer, no Direito Romano, a base comum das
legislações da Europa continental e América Latina. O Direito Romano aparecia como um direito
de razão, comum a todos, como se fora o esqueleto natural do edifício jurídico, que cada Estado,
depois, completava, diversamente, segundo os próprios estatutos. Como base comum era, por isso
mesmo, logicamente superior e anterior às várias leis particulares e era a expressão jurídica dessas
exigências elevadas e básicas, que não encontram confins nos Alpes e nos Pirineus. Era, portanto,
natural chegar da unidade jurídica à política surgindo, espontaneamente, da tradição romana, o
conceito da unidade da família humana, que se avantajava à concepção aristotélica do Estado
autárquico, numa visão mais ampla de caráter jurídico e político. Esse ideal não foi casualmente
encabeçado pelos juristas e, já no século XIV, Bartolo de Sassoferrato, que, entre os homens de leis,
mais deveria contribuir para a doutrina jurídica omum ao mundo civil, através dos séculos, agarrou
e defendeu o ideal de Dante. E a insistência com que esse jurista, seguindo embora a trilha desse
ideal, se bateu pelas novas tendências do seu tempo, afirmando, em contraste com as tradições
medievais a ampla soberania dos Estados particulares, estabelece nova prova de tudo aquilo, que,
acima das contingências históricas da sua formulação, constitui o mais profundo significado do
ideal político do poeta da "Comédia".
União dos povos e união jurídica! Supremacia geral de uma lei comum acima dos
estatutos particulares! Era isso, no pensamento do Filósofo e do Poeta, o meio para a conquista da
paz tanto assim que o ambicionado Imperador, como se lê na conclusão do "De Monarchia", "li regi
tenga contenti ne li termini de li regni si' che pace tra loro sia, ne la quale posino le eitadi e in questa
pace le vicinanze si amino, in questo amore le cose prendono egni loro bisogno, lo qual preso,
l'uomo vive felicemente, che é quello per lo che esso é nato".
"Nella selva selvaggia ed aspra e forte", onde o Poeta, perdido, inicia a sua viagem, três
feras lhe vão ao encontro, esbarrando-lhe o caminho, que o conduziria àquele monte deleitoso,
símbolo da felicidade terrena. E é com dificuldade que ele consegue safar-se às insídias da "lonza" e
do leão, quando, bruscamente, diante de seu caminho, uma loba, mais sanguinária e mais cruel, lhe
arranca qualquer possibilidade de salvação. Aparece-lhe, então, o "montovano" Virgílio, oráculo de
antiga sabedoria e vaticinador da revelação, anunciando-lhe uma viagem mais longa, necessária
para a salvação. Pois que a famélica loba "non lascia altrui passar per la sua via, - ma tanto
l'impedisce che l'uccide; e ha natura sí malvaggia e ria - che mai non empie la bramosa voglia - e
dopo il pasto ha piú fame che pria". Mas esta cupidez, simbolizada pela loba será vencida pelo
"Veltro", "che la fará morir con doglia" - "Questi non ciberá terra né peltro, ma sapienza, amore e
virtute e sua nazion sará tra Feltro, e Feltro". A mais dscutida das alegorias de Dante arrasta-nos, de
novo, à sua Mensagem político-jurídica. Na alegoria do "Veltro", o qual, desdenhando gozos e
riquezas, vencerá a cupidez, encontramos mais uma vez a mensagem do Poeta e a invocação ao
Imperador, ministro de superior justiça. Justiça elevada que poderá dominar a cupidez e abrir o
caminho rumo ao deleitoso monte da felicidade e da paz. Justiça superior, representada por ministro
invulnerável a qualquer paixão.
O FUNDAMENTO DO DIREITO
O Poeta dá a esse Império e Direito um cunho divino. É por inspiração divina que
Justiniano, nos seus versos, recolhe e transmite os monumentos da sabedoria jurídica romana.
"Cesare fui e sono Giustiniano, che per voler del primo amor ch'io sento dentro le leggi trassi il
troppo e il vano!" O direito não é para o poeta a interpretação de uma transitória correlação de força
das várias categorias sociais ou simples manifestação da soberania estatal, pois, se assim fosse, a
base da sua validade não repousaria senão sobre a manifestação da vontade soberana, e o Estado,
por sua vez, surgiria como um simples postulado, antes de ser justificado. Ao contrário reconhece as
bases de cada direito positivo numa justiça elevada, derivando desta a justificativa e, juntamente, os
limites da autoridade estatal. Por isso, distingue dos estatutos particulares e eventuais um direito
geral e eterno de valor superior. Espalha-se aí, nesta concepção, a teoria tomista do direito natural e,
também, o fascínio do Direito Romano conceido como um direito de razão, limite e base das leis
particulares.
Não foi por mera casualidade que o poeta colocou na própria estrutura do seu poema, ao
fim da escalada do Purgatório, o Paraíso terrestre, a conquista dessa felicidade terrena, simbolizada,
no primeiro canto do poema, pelo monte deleitoso, cujo acesso as feras impediam. Esse mérito da
vida terrena abrangia, naturalmente, a dignidade do Estado e do Direito, tão necessários, como
necessária é a vida material, cuja felicidade constituía a sua finalidade. Em virtude disto, o Estado é
independente do poder espiritual, com igual dignidade. Paridade de dignidade moderada, mas não
incompatível pelo respeito filial, ao qual, segundo o pensamento de Dante, o poder temporal é
sempre mantido nos confrontos do espiritual. Não importa se esta concepção aparenta contrastes
julgados então heréticos com a "ordinatio ad unum" medieval, tão esmiuçada pelo pensamento do
Poeta, e que, na literatura da época, punha sempre e inevitavelmente fim à superioridade de um ou
de outro sol.
Quer o papado, quer o império não sabiam criar-se a não ser com a força do poderio,
que, religioso e político ao mesmo tempo, acabava absorvendo um ou outro. Essa concepção
dantesca é profundamente viva e decisivamente moderna nessa reafirmação e distinção dos dois
poderes, reivindicando contemporaneamente, Cesar e Pedro com igual dignidade. E, estribado nesta
concepção, desgarra-se Dante do tempo medieval e estaca na soleira do mundo moderno, que,
através de séculos de lutas cruentas, devia encontrar, depois, na distinção da esfera política e da
consciência religiosa, alguns fatores da sua liberdade. Reivindicação da independência espiritual,
contra qualquer tentativa de assalto, sempre usado na história, para subordinar aos poderes
temporários o poder espiritual e elevar o Estado a uma única autoridade, não só política, mas,
também, moral. Reivindicação da independência do Estado e do Direito, imprescindíveis na luta
diária para a conquista de uma felicidade terrena. Reivindicação da nobreza da vida na terr e do
significado das suas lutas e dos seus esforços, e, também, confirmação integral do valor e da
independência do mundo espiritual, sem o qual a terra estaria privada de luz.
O EQUILÍBRIO DANTESCO
Unidade que nunca foi tão profunda como naqueles tempos tempestuosos, que pareciam
afunda-la no fragor das armas e no desenfrear da cupidez da loba dantesca.
O DELEITOSO MONTE
Dante sabe que não pode haver paz e harmonia entre os homens, se não tiverem como
base essa paz íntima que se oriunda da elevação moral do indivíduo e na boa vontade, para além da
qual a paz não foi anunciada. O Poeta sabe que não pode haver verdadeira liberdade a não ser
fundada nessa íntima liberdade, que torna o homem senhor das próprias paixões. O problema
jurídico reconduz ao problema moral. O progresso nas relações humanas irrompe, antes de tudo,
subordinado ao progresso moral individual, sem o qual toda a lei cai no vácuo. A "Comédia" mostra
precisamente essa constante necessidade do Estado ideal, ambicionado pelo Poeta e indica o único
meio que poderá levar de vencida aquela loba cúpida, que impede o caminho para a escalada do
monte da harmonia e da paz.
A VERDADEIRA LIBERDADE
O poeta e o homem vencem uma longa e penosa viagem através da selva do próprio
extravio, pois não fora feita com renúncia ascética e, sim, no meio dos tumultos e das paixões,
contidas, mas jamais negadas.
Por isso, o Poeta conduz o homem pelos círculos do inferno, e para a escalada dolorosa
do monte do Purgatório, porque, somente ao fim dessa viagem, - preparação imprescindível a uma
salvação mais elevada, - o homem "fatto ormai esperto e degli vizi umani e del valore" pode julgar-
se vitorioso e livre e entrar no reino da harmonia e da paz.
LIBERDADE E PAZ!