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Análise literário comparativo dos livros.

(Angela Sánchez)

"Dois Irmãos". "O quarto fechado". "Lavoura arcaica"

"Eu sei que qualquer coisa de ruim habita em mim, em minha carne; eu dou meus
ossos a outro que está em mim, que está em guerra com minha lei. Quem me liberará
deste corpo de morte?" São Paulo, Carta aos romanos
É evidente a importância da dimensão espacial nos relatos que estamos analisando,
onde a casa carrega um valor predominante, tornando-se ator fundamental na
narração, quase um personagem a mais. “...o coração doente da casa explodia...” (O
quarto fechado).
No relato de Lia Luft, a casa aparece personificado desde o começo através da
descrição que nos apresenta a autora, incidindo na estranha atmosfera que a rodeia.
Os espaços apequenam-se, porque as relações que ali se estabelecem, no que diz
respeito ao afeto, são proporcionalmente exíguas. A casa exerce um influxo negativo
“... Aquela que sem sua permissão reinava na casa ... ”(...) “... a névoa chegara
sorrateira. Grudava-se na casa... ” (O quarto fechado)
Essa identificação é manifestada, por exemplo, quando é declarado, “... A sala, a casa,
um tanque de água turva onde giravam criaturas de gosma e sombra. Medo” (...) “...o
zumbido do inseto gigante, cujas instalações permeavam a casa toda...” (O quarto
fechado).
No relato de Hatoum é dito que Zana perambulava falando “... Eles andam por aqui,
meu pai e Halim vieram me visitar... eles estão nesta casa”... (Dois irmãos). Por sua
parte, em Lavoura arcaica fala- se “... o poço de penumbra do meu quarto...”
CASA-família-psiquismo, va emergindo em direção à superfície da consciência,
identificada finalmente com o exterior da CASA. “... para os gêmeos, o quarto era uma
ferida úmida que se cobre com as roupas, não se deixa tocar, mas continua latejando.
Tal vez imaginassem o tempo todo o que haveria lá: animal raro, planta singular,
criatura de charco, enviando sinais pela casa a toda hora.
Medo. Medo?...” (O quarto fechado) “...essa claridade que mais tarde passou a me
perturbar, me pondo estranho e mudo, me prostrando desde a puberdade na cama
como um convalescente: essas coisas nunca suspeitadas nos limites da nossa casa ...”
(Lavoura arcaica)
A relação espaço-mente, simbolizando os fenômenos que acontecem no espaço não
são senão metáforas dos processos psíquicos dos personagens “... na atmosfera da
casa que era densa também, um leite espesso, águas, algas, medusas, lama ...” (O
quarto fechado)
O adjetivo silêncio, é também uma manifestação da identificação da CASA com o
psiquismo, pois o silencio frente ao ruído é precisamente a simbolização que se realiza
no relato para referir à repressão e à emergência do reprimido respectivamente. “... o
nevoeiro tragara tudo, contorno e cores, a casa isolada num silencio branco...” (O
quarto fechado) “... não, de Yacub não saía nada. Ele se retraía, encasulava-se no
momento certo. Às vezes, ao sair do casulo, surpreendia...” (Dois irmãos) “... cordial
Análise literário comparativo dos livros. (Angela Sánchez)

mas reservada: alguma coisa a recobria, um vidro, um verniz, impedindo-a de vibrar...”


(O quarto fechado)
Existe também o antigo conflito de família versus sociedade, que não é senão o
conflito endogamia versus exogamia das sociedades primitivas, onde precisamente o
incesto era a norma. Pequenos grupos humanos fechados sobre si mesmos se
perpetuavam sempre em relações que não podiam senão ser incestuosas, porque a
proibição era justamente as relações com membros de outros grupos. Portanto parece
haver uma chave antropológica na leitura destes relatos que nos permite compreender
esse isolamento como resultado de uma relação incestuosa, por mais latente que esta
seja no começo. Prova disso é a aceitação de tal relação, que sobrevêm determinada
pela própria casa, identificada com a linhagem e a família “... o amor, a união e o
trabalho de todos nós junto ao pai era uma mensagem de pureza austera guardada em
nossos santuários... ” (...) “ ...estando a casa de pé, cada um de nós estaria também de
pé, e para manter a casa erguida era preciso fortalecer o sentimento do dever,
venerando os nossos laços de sangue, não nos afastando da nossa porta...”(...) “...
trabalho da família, trazendo os frutos para casa....” (Lavoura arcaica)
Esse isolamento, assim como o encerramento das famílias sobre si mesmas, conduz
finalmente a sua destruição, “... ela morreu quando o filho caçula estava foragido. Não
chegou a ver a reforma da casa, a morte a livrou desse e de outros assombros. Os
azulejos portugueses com a imagem da santa padroeira foram arrancados, e o
desenho sóbrio da fachada, harmonia de retas e curvas, foi tapado por um ecletismo
delirante. A fachada que era razoável, tornou-se uma máscara de horror, e a idéia que
se faz de uma casa desfez-se em pouco tempo” (Dois irmãos)
Tal é a idéia das obras onde a linhagem se extingue finalmente em si mesma e é
simbolicamente engolida “... quanto mais estruturada, mais violento o baque, a força
e a alegria de uma família assim podem desaparecer com um único golpe ...” (Lavoura
arcaica) Se trata da autofagia à que, mais cedo ou mais tarde conduz a endogamia, não
porque o incesto em si leve à morte senão porque o isolamento a que essa situação
conduz é a destruição. Os grupos endogâmicos acabavam por solapar-se
espacialmente com outros, o que produzia uma mutua hostilidade, por isso o homem
acabou enfrentando-se, como diz Lévi-Strauss, relembrando a Tylor, à disjuntiva entre
"casar-se" fora do grupo, ou ser morto dentro do grupo. Evidentemente optou-se pela
primeira solução; por tanto, a proibição do incesto não tem uma origem moral, como
poderia considerar-se na atualidade, senão "política" já que foi uma forma de evitar os
conflitos entre grupos fechados entre si e que, por outra parte, se necessitavam
mutuamente. A proibição do incesto supôs o passo da família à sociedade já que,
como diz Lévi-Strauss, "se a organização social teve um principio este só pode ter
consistido na proibição do incesto".
A relação incestuosa dia um sinal antropológico que explica o isolamento dos irmãos,
e também da-nos um sinal psicológico, pois o incesto aparece como desejo normal e
habitual nos primeiros passos da vida do ser humano, quem evidentemente, tem nos
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membros da sua família os primeiros objetos de desejo sexual, como na infância da


humanidade, os membros do grupo se relacionavam sexualmente entre si. “... ela
sabia fazer as coisas, essa minha irmã, esconder primeiro bem escondido sob a língua
sua peçonha e logo morder o cacho de uva que pendia em bagos túmidos de saliva
enquanto dançava no centro de todos, fazendo a vida mais turbulenta, tumultuando
dores, arrancando gritos de exaltação...”(Lavoura arcaica) O passo desse estado
primitivo a um mais avançado, como acontece com o desenvolvimento da criança, leva
a proibição do incesto num caso, e à repressão psíquica do mesmo, no outro,
produzindo -segundo Freud- elementos fundamentais do psiquismo humano. Em
ambos os casos o incesto é substituído por outro tipo de manifestações sexuais “...
crescendo, penosamente adivinhara que as almas precisam dos corpos para se tocar.
Tentava transmitir isso a Carolina, mas ela entenderia. Teria resposta, solução,
compreensão?...”(...) “... iam fundir-se num só?...”(...) ”...o que vai ser de nós? Por que
você já não me basta? ...” (O quarto fechado)
Inominável não é senão o reprimido –o desejo incestuoso- que vai pouco a pouco
escapando do inconsciente e tentando fluir à consciência “... que culpa temos nós
dessa planta da infância, de sua sedução, de seu viço e constância? Que culpa temos
nós se fomos duramente atingidos pelo vírus fatal dos afagos desmedidos? Que culpa
temos nós se tantas folhas tenras escondiam a haste mórbida desta rama...”(...) “...
Ana, tudo começa no teu amor, ele é o núcleo, ele é a semente, o teu amor pra mim é
o principio do mundo...”(Lavoura arcaica)
“... o que o teria impelido para lá naquela tarde? O que o puxara? Quem estaria
encostado no portão da fazenda, braços abertos, insinuante? Alguma coisa que
provocava repulsa e atracão, como no quarto? Como no amor? ....”(...) “...Camilo
encontrara afinal o que procurava tanto: noutra parte qualquer, vivia, amava, fazia
descobertas. Libertara-se daquela obsessão, da impossível ligação com Carolina...” (O
quarto fechado)
“... dois seres do mesmo sangue, irmãos , vivendo longe de tudo, sem nenhum sinal de
vida humana por perto...” (...) “... viviam que nem bichos...”(...) “...isso mesmo, bichos.
Só que pareciam felizes...” (Dois irmãos)
O parentesco de sangue da conta da solenidade macabra do relato melhor que o amor
culpável “... era realmente permitido, era normal, aquele amor? Incesto: a palavra
pesava sobre eles. Não queriam magoar Mamãe, isto é, Martim não queria: sentia-se
seu devedor, e sua vontade forte, a urgência do coração e do corpo entravam em
conflito com o dever. (O quarto fechado)
Por outra parte, as imagens da viajem de Yacub ao Líbano (expulsão como o ato do
nascimento) em Dois irmãos, o irmão que foge (em Lavoura arcaica), e a busca da
morte de Camilo (O quarto fechado) são a imagem dos irmãos enxotados do paraíso da
casa-mãe e tem igualmente relação com a imagem da expulsão de Adão e Eva, pois a
parábola bíblica tem sido vista como uma metáfora do nascimento individual. “... não
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deveria ter sido mais severa, exigindo que se separassem, que preservassem suas
identidades, que ao menos dormissem separados? ...” (O quarto fechado)
Em qualquer caso a história de Adão e Eva nos leva à infância da humanidade que nos
conduz ao sinal antropológico que tentamos desenhar e que explica o isolamento dos
irmãos como resultado de uma situação endogâmica dos grupos primitivos, em tanto
que a imagem do nascimento nos leva à infância individual na que também os desejos
incestuosos são fundamentais para dar origem ao erotismo humano e configurar o
caráter individual derivado dos conflitos que essa primeira sexualidade provoca.
Enquanto aos gêmeos, é desde as primeiras narrativas semíticas até a novela gótica
que encontramos obras de psico-terror que utilizam o recurso dos irmãos gêmeos
para arrastar ao leitor a um estado de alteração da consciência de sua própria
identidade. “....sempre suspeitara dos filhos, que absurdo. Imaginara sinistras
combinações em seus silêncios, pequenos sinais, sorrisos. Saberiam de segredos
inquietantes? O que teria acontecido naquele dia com o Anjo Rafael? ...”(O quarto
fechado)
A historia revela-se na literatura nessa dramática busca da sua própria identidade. “...
não, fôlego ele não tinha para acompanhar o irmão. Nem coragem. Sentia raiva, de si
próprio e do outro, quando via o braco do Caçula enroscado de um curumim do cortiço
que havia nos fundos da casa. Sentia raiva de sua impotência e tremia de medo,
acovardado ao ver o Caçula desafiar três ou quatro moleques parrudos agüentar o
cerco e os socos deles e revidar com fúria e palavrões” (Dois irmãos)
Nada melhor que dois seres idênticos, nascidos de um mesmo óvulo para visualizar o
drama humano, o eterno dilema entre o bem e o mal “... nem a maternidade
resolvera: ao contrario, desdobrando-se em mais dois ...” (O quarto fechado) A parte
escura, primitiva, demoníaca, brutal e a sensível, delicada e generosa “... Camilo
sempre tivera o comando nas mãos, Carolina só o seguia, com aquele olhar de
veneração...”(O quarto fechado) O trauma universal de não saber realmente quem
somos e que domina nossos atos e nossos desejos “... um se machuca, o outro
sangra...”(O quarto fechado)
Essa força que se domestica ou castra em função do momento histórico ou as
circunstâncias. “Pouco falaram, e isso era tanto mais estranho porque, juntos,
pareciam a mesma pessoa...” (Dois irmãos) “...Camilo iluminava-se no afeto de
Carolina. Como certos animais que, destruída a sua toca, tentam desesperadamente
refazê-la os gêmeos labutavam dia a dia, urdindo um mundo seu...”(O quarto fechado)
Dois irmãos gêmeos representam, fisicamente, o medo mais ancestral que se oculta
em nossa mente desde que nascemos até a morte: o medo que sentimos de nós
mesmos “... havia algo entre os gêmeos, zonas de segredo entre os dois: sombras.
Camilo e Carolina, um estranho ser saído do seu ventre, duplo por engano, falha
dela...” (O quarto fechado)
Os irmãos gêmeos tem sido considerados em diferentes culturas indígenas como
deuses e como mensageiros do diabo. Assim Jeremy Narby, doutor em antropologia da
Análise literário comparativo dos livros. (Angela Sánchez)

Universidade de Stanford, menciona em seu livro "The Cosmic Serpent" a freqüente e


notória presencia de gêmeos nas lendas dos indígenas da América do sul. Quetzalcoatl,
a serpente emplumada dos astecas de México, que representa a sagrada energia da
vida e seu irmão gêmeo Tezcatlipoca, ambos são filhos da serpente cósmica Coatlicue.
O antropólogo Claude Lévi-Strauss explica que na linguagem asteca o sufixo "coatl"
significa ao mesmo tempo serpente e gêmeo. Assim, Quetzacoatl significa Serpente
emplumada e Gêmeo Magnífico “... se pudesse falar o morto diria: no fundo do poço
encontrei o enlace, a Vida e a Morte, masculino e feminino, o Eu e o Outro,
entredevorando-se como uma serpente que engole a própria cauda....”(...) “... a vida:
serpente voltando para dentro de si mesma, começo e fim, masculino e feminino,
prazer e destruição ...” (O quarto fechado)
“... negar o amor era negar a vida: toda negação do amor gera a morte, não importa
que amor, não importa que proibição ...”
Cabe lembrar aqui a gêmeos famosos nas lendas e na história: Anfión e Zeto, Rômulo
e Remo (filhos de Rea Silva e do deus Marte), Esaú e Jacó (filhos de Isaac e Rebeca),
Caim e Abel (filhos de Adão e Eva), Castor e Pólux (filhos de Leda e Zeus), Eres e Zeraj
(Judá e Tamar, Gênesis 38,27), Tomás, um dos apóstolos (Tomás significa gêmeo em
siríaco), Artemísia e Apolo (filhos de Zeus e Leda), São Cosme e Damião, mártires, Zeus
e Hera (filhos do deus Cronos e de Rea), Ares e Eris (filhos de Zeus e Hera), Osíris e Set.
O próprio William Shakespeare foi pai de gêmeos: Hamnet (o menino) e Judith (a
menina).
Angela Sánchez
Manilkara
Publicado no Recanto das Letras em 03/11/2007.Código do texto: T721849
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