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3 Grandes Períodos do Direito Português:

- Período da Individualização do Direito Português (1)


- Período do Direito Português de inspiração romano-canónica (2)
- Período da formação do Direito Português Moderno (3)

(1) Inicia-se em 1140, data da fundação da nacionalidade, ou melhor, ano em que D.


Afonso Henriques se intitula rei de Portugal. Termina em 1248 com o início do
reinado de D. Afonso III. Caracterização: a independência política de Portugal
não envolveu uma imediata autonomização no campo do Direito. Manteve-se o
sistema jurídico herdado do estado Lionês, só paulatinamente surgindo fontes
tipicamente portuguesas. Estamos face a um direito de base consuetudinária
(costume) e foraleira (forais), caracterizado pelo empirismo (experiência do dia-
a-dia) jurídico com predomínio da actividade dos tabeliães.
(2) Inicia-se em meados do século XIII encerrando-se em meados do século XVIII.
É a época da penetração do chamado direito comum. Podem assinalar-se dois
períodos:
2.1. Época do direito romano e do direito canónico renovado (ou direito
comum) – Inicia-se entre 1248 e 1446/47. É caracterizada, por um lado, pelos
resultados alcançados, pelas escolas dos glosadores e dos comentadores, que foram
responsáveis pelo chamado renascimento do direito romano e, por outro lado, por
um fenómeno daquele indissociável, a renovação do direito canónico. Ambos os
movimentos contribuirão para a formação do direito comum, isto é, o sistema
normativo de fundo romano que constituiu, embora não uniformemente, a base da
experiência jurídica europeia até ao século XVIII.
2.2. Época das ordenações – Inicia-se em 1446/47, data do início da vigência das
ordenações afonsinas, primeira codificação oficial de preceitos extensivos a todo o
país, traduzindo um fenómeno de centralização legislação. Continuam a verificar-se
as influências romanísticas e canonísticas.
(3) O seu início coincide com o consulado do Marquês de Pombal, apontando-se
como datas emblemáticas 1769 e 1772, datas, respectivamente, da lei da boa
razão e dos estatutos da universidade de Coimbra, que concretizaram uma
viragem expressiva da ciência e da prática do direito, bem como da pedagogia
jurídica. Compreende 3 sub-períodos:
3.1. Época do Jusnaturalismo racionalista – Situa-se entre a segunda metade do
século XVIII e 1820, data da revolução liberal. É marcada pelas correntes
doutrinárias do direito natural racionalista e do iluminismo.
3.2. Época do Individualismo – Tem início em 1820 com o advento do liberalismo,
subsistindo até à primeira metade do século XX. É marcada pelo liberalismo político
e económico, pelo positivismo jurídico e pelo movimento da codificação.
3.3. Época do Direito Social – Inicia-se por alturas da 1ª Guerra Mundial
(1914/18), embora, entre nós, em termos legislativos, se possa fixar a partir de finais
da década de 20, início da de 30. Caracterizada por uma maior intervenção do estado
na limitação de autonomia privada.

Período da Individualização do Direito Português


Fontes de Direito:
- Fontes do Reino de Lião que se mantiveram em vigor (1)
- Fontes posteriores à nacionalidade (2)

1.1. O código visigótico – permaneceu como fonte do direito português durante todo o
século XIII. O código visigótico é o produto do cruzamento de influências romanas,
germânicas e canónicas, mas o contributo mais importante foi o romano. O direito
romano que influenciou o código visigótico foi o ante justinianeu, ou seja, o
anterior ao Corpus Iuris Civilis.
1.2. Leis emanadas das cúrias e concílios reunidos em Lião, Coiança ou Oviedo.
Mantiveram-se vigentes no território português as leis gerais saídas de algumas
cúrias e concílios que se realizaram antes da fundação da nacionalidade em Lião,
Coiança e Oviedo. A cúria era um órgão auxiliar do rei que tinha carácter
eminentemente político. Já os concílios tinham natureza eclesiástica. Como altos
dignitários da igreja participavam em reuniões da cúria. Os concílios eram por
vezes convocados pelo rei e neles participavam leigos. As duas instituições tendiam
a confundir-se. Parece que se pode falar da cúria de Lião e dos concílios de Coiança
e Oviedo.
1.3. Forais de terras portuguesas anteriores à independência. Foral – diploma
concedido pelo rei ou por um senhorio laico ou eclesiástico a uma determinada
terra e que continham normas disciplinadoras das relações dos habitantes entre si e
destes com a entidade outorgante. O foral era a espécie mais importante das
chamadas cartas de privilégio, que eram diplomas que criavam para certa
comunidade uma disciplina jurídica específica mais favorável do que a geral. Numa
primeira fase verificaram-se instrumentos muito rudimentares denominados Cartas
de Povoação, através dos quais a entidade outorgante, a respeito do seu domínio
fundiário (terra), dirigia-se aos que quisessem fixar uma determinada localidade,
mediante a adesão às cláusulas do diploma. Não existiu quebra de continuidade
entre Carta de Povoação e Foral. Matérias tratadas nos forais: liberdades e
garantias das pessoas e bens dos habitantes; impostos e tributos; composições e
multas devidas por delitos; serviço militar. Portanto, incluem-se essencialmente
normas de direito público.
1.4. Costumes – Nesta época o conceito de costume era usado em sentido amplo,
abrangendo as fontes de direito tradicional sem carácter legislativo. Aí se incluíam
sentenças da Cúria régia, sentenças de juízes municipais e de juízes arbitrais e ainda
pareceres de juristas consagrados.

2.1. Leis gerais dos primeiros monarcas – embora pouco, alguma coisa se legislava.
2.2. Forais – Sobretudo durante os primeiros reinados concederam-se muitos Forais e
Cartas de Povoação.
2.3. Concórdias e concordatas – Acordos efectuados entre o rei e as autoridades
eclesiásticas, reconhecendo direitos e obrigações mútuos relativos ao Estado e à
Igreja. Os acordos entre o rei e as autoridades eclesiásticas nacionais denominavam-
se concórdias. Já, se neles interviesse o papa, denominavam-se concordatas.

Alguns Aspectos do Sistema Jurídico da Época

Vislumbra-se um direito de base consuetudinária onde o código visigótico perdia


terreno e a legislação aflorava timidamente. O esforço de fomento económico conduzia
à difusão de fontes de direito local (forais e cartas de povoação). O empirismo presidia à
criação jurídica orientada no direito privado pelos tabeliães (notários) através dos
contratos e outros actos que praticavam. A título de exemplo referiremos alguns
contratos que constituíram traves-mestras da vida socio-económica medieval:
Contratos agrícolas: assinalam-se a enfiteuse e a complantação, que reflectem um
movimento através do qual o concessionário de prédio alheio conquista uma posição
mais firme face ao senhorio. O aspecto propriamente jurídico revela-se no princípio da
conquista da prosperidade através do trabalho.
Enfiteuse: contrato pelo qual se repartia pelos contraentes aquilo a que a ciência do
direito chamava mais tarde domínio directo e domínio útil. O domínio directo pertencia
ao senhorio e consistia na faculdade de receber do foreiro ou enfiteuta a quem pertencia
o domínio útil uma pensão anual denominada foro ou cânone, que, em regra, consistia
uma parte proporcional dos frutos que o prédio produzia. O agricultor assumia o
encargo de aplicar diligente esforço no aproveitamento da terra, podendo o enfiteuta
alienar a respectiva posição contratual a um terceiro com ou sem direito de preferência
do senhorio.
Complantação: neste contrato o proprietário de um terreno cedia-o a um agricultor para
que o fertilizasse, em regra com a plantação de vinhas ou outras espécies duradouras.
Decorrido o prazo estabelecido, normalmente de 4 a 8 anos procedia-se à divisão do
prédio entre os contraentes, normalmente, em partes iguais.

Contratos de crédito: refiram-se agora dois outros contratos, que tendo a terra por
objectivo, desempenharam relevante função financeira ou de crédito:
- compra e venda de rendas (censo consignativo) – o proprietário de um prédio, carecido
de capitais, cedia a outra pessoa, em compensação de uma soma para sempre recebida, o
direito a uma prestação monetária anual e imposta como encargo sobre o prédio. A
quantia para sempre recebida não tem que ser devolvida, pois quem fica devedor da
renda é quem for proprietário do prédio. Se este for vendido, é o novo proprietário quem
tem a obrigação de pagar a renda. A função deste negócio era semelhante à do
empréstimo a juros mas sem que fosse abrangido pela proibição da usura (cobrança de
juros por empréstimo de dinheiro).
- penhor imobiliário – aqui a transmissão do prédio pelo proprietário devedor podia ser
feita com diferentes objectivos como garantir o crédito e compensar a cedência do
capital ou ainda proporcionar o reembolso progressivo da dívida que se ia amortizando
com o desfrute do prédio.
Período do Direito Português de inspiração romano-canónica
Época da recepção do direito romano renascido e do direito canónico renovado ou
direito comum
O direito romano justinianeu, desde o séc. VI até ao séc. XI – Entramos num ciclo da
história jurídica portuguesa marcada por uma revitalização intensa do direito romano
justinianeu, o que se inicia em Itália durante o século XI mas que se desenvolve a partir
do séc. XII e que é marcado por um novo interesse teórico e prático nas colectâneas do
Corpus Iuris Civilis na Europa Ocidental. È o fenómeno do chamado Renascimento do
direito romano – é certo que jamais se verificou uma absoluta falta de conhecimento
do direito romano justinianeu na Europa Ocidental entre os sécs. VI e XI, mas a
qualificação de renascimento de direito romano justifica-se para assinalar o contrato
entre uma difusão modesta ou indiferença nesse período e o interesse decisivo que o seu
estudo, já com antecedentes do séc. XI, assumirá do séc. XII em diante.
Factores determinantes do renascimento do direito romano:
Factores políticos – a restauração do império do ocidente, o chamado sagrado império
sacro-germânico, que encontrava no direito romano o seu sistema jurídico. Procurava-se
no direito justinianeu apoio para o robustecimento da posição imperial
Factores religiosos – o universalismo decorrente da fé e do espírito de cruzada unifica
os homens acima das fronteiras da raça e da história, permitindo o surgimento de uma
base jurídica comum
Factores culturais – assistiu-se a um progresso geral de cultura
Factores económicos – a expansão económica que se verificou nesta época, com o
aumento da população, o êxodo rural e as potencialidades da nascente economia
citadina fez com que se colocassem ao direito problemas de maior complexidade e se
recorresse a um corpo jurídico mais perfeito

Escola de Bolonha ou Glosadores


O estudo sistemático e a divulgação em larga escala do direito romano justinianeu dá-se
no séc. XII com a escola de Bolonha, onde se destaca um nome fundamental: Irnério, a
lucerna iuris (candeia do direito).
Método de trabalho dos Glosadores
O principal instrumento de trabalho dos juristas desta escola foi a glosa, que consistia
num método de exegese (interpretação) textual que, de início, consistia num pequeno
esclarecimento imediato com o objectivo de tornar inteligível algum passo do Corpus
Iuris Civilis considerado obscuro ou de interpretação duvidosa. Inseriam-se entre as
linhas das normas analisadas, eram as chamadas Glosas interlineares. Com o tempo, as
glosas tornaram-se mais complexas e extensas, passando a referir-se não apenas a um
excerto ou preceito, mas a todo um título, escrevendo-se, por isso, nas margens do texto.
Eram as chamadas Glosas marginais. Os glosadores tiveram um respeito quase sagrado
pelo Corpus Iuris Civilis. O seu esforço interpretativo nunca se desprendeu
suficientemente dos preceitos romanos e, por isso, nunca chegaram a soluções
inovadoras. Tiveram uma atitude tipicamente dogmática e legalista em face do Corpus
Iuris Civilis, atribuindo-se-lhes também uma profunda ignorância nos domínios
filosófico (linguístico) e histórico. Desconheciam as circunstâncias em que as normas
do direito romano tinham surgido, o que os levam a interpretações inexactas ou à
manutenção de princípios antigos. Todavia, a sua actividade contribuiu para a
transformação do conjunto de normas justinianeias num todo sistemático, chegando-se a
uma estrutura doutrinal de conjunto. Nas primeiras décadas do séc. XIII verifica-se a
decadência dos glosadores. Já não se estudava o texto da lei justinianeia mas a
respectiva glosa, fazendo-se glosas de glosas. Entre 1220 e 1240, Acúrsio ordenou esse
material procedendo a uma selecção das glosas anteriores, conciliando ou apresentando
criticamente as opiniões discordantes mais credenciadas. Deste trabalho surge a Magna
Glosa, também conhecida por Glosa de Acúrsio, tendo passado a acompanhar as cópias
do Corpus Iuris Civilis.

Causas da difusão do direito romano justinianeu e da obra dos glosadores

Na Europa em geral:
- estudantes estrangeiros em Bolonha: Bolonha tornou-se o centro para onde convergia
um número avultado de estudantes de outros países da Europa, que no regresso traziam
consigo a nova ordem jurídica
- fundação de universidades: assiste-se durante os sécs. XII e XIII à criação progressiva
de universidades, onde se cultivavam os ramos do saber. Entre estes figurava, ao lado
do direito canónico, o direito romano das colectâneas justinianeias professado segundo
o método das escolas italianas
Na Península Ibérica (especialmente em Portugal):
O direito romano renascido, apesar de não desconhecido anteriormente, só entrou nas
práticas dos tribunais e do tablionato nos começos do séc. XIII, sendo principalmente a
partir dos seus meados que se desenvolve a recepção do direito romano justinianeu.
Além dos 2 elementos já indicados que permitiram a difusão da romanística na Europa
em geral, quanto à Península Ibérica acrescentam-se outros:
- estudantes peninsulares em escolas jurídicas italianas e francesas e presença de
jurisconsultos estrangeiros na Península: desde os começos do séc. XIII existem
testemunhos de uma presença significativa de estudantes peninsulares, especialmente
eclesiásticos, em centros italianos e franceses de ensino do direito. As preferências
favoreciam a universidade de Bolonha. Alguns juristas peninsulares chegaram mesmo a
ocupar cátedras de direito romano e direito canónico. Normalmente regressavam ao país
após concluir os estudos, ascendendo a postos cimeiros na carreira eclesiástica política
ou do ensino e tornando-se mensageiros da difusão do direito romano. Resultado
análogo decorria da vinda de jurisconsultos estrangeiros para a península,
desempenhando importantes funções junto dos monarcas ou exercendo a docência
universitária.
- difusão do Corpus Iuris Civilis e da Glosa: os referidos juristas traziam do estrangeiro,
além da especialização, textos relativos à disciplina que cultivavam.
- o ensino do direito romano nas universidades – no nosso país o estudo geral surgiu no
reinado de D. Dinis, assinalando-se tradicionalmente a data de 1 de Março de 1290. A
____ confirmatória do papa Nicolau IV faz referência expressa à obtenção dos graus de
licenciados em direito canónico e direito civil.
- legislação e prática de inspiração romanística – na lei e no tablionato sentiu-se também
a influência do direito romano renascido.
- obras doutrinais e legislativas de conteúdo romano:
Obras doutrinais – salientam-se as Flores de Derecho e os Nuevos Tiemplos de
los Pleitos (discussão em Tribunal), que eram compêndios relativos ao processo civil de
inspiração romano-canónica que tendia a substituir o sistema consuetudinário e foraleiro
vigente de raiz germânica
Obras legislativas – decorreram da política do rei castelhano Afonso X, o Sábio,
que procurou reivindicar para o monarca a criação jurídica assim como a uniformização
e a renovação do direito dos seus reinos. Destacam-se o fuero real (compilação de
normas municipais destinada às cidades sem fuero ou às que o tivessem mas quisessem
substituí-lo por um mais perfeito e actualizado; era constituído por preceitos do código
visigótico e por costumes territoriais castelhanos, mas nele existem importantes reflexos
romanísticos e canonísticos, sobretudo através da recepção de soluções jurídicas
concretas) e as Siete Partidas (exposição jurídica de carácter enciclopédico
essencialmente inspirada no sistema do direito comum romano canónico; desempenhou
relevante papel na formação dos juristas e receberia em meados do séc. XIV
consagração legal de fonte de direito subsidiário.

Escola dos Comentadores

- Desenvolveu-se durante o séc. XIV


- Instrumento de trabalho: o comentário
- Método de trabalho: o método dialéctico ou escolástico que se comunicou ao estudo
do direito com uma aberta utilização da dialéctica aristotélica
Os esquemas de exegese textual são agora acompanhados de um esforço de
sistematização das normas e dos institutos jurídicos muito mais perfeito do que o dos
Glosadores. Encara-se a matéria jurídica de uma perspectiva lógico-sistemática e não
sobretudo exegética. A sua atitude foi de grande pragmatismo, com uma dogmática
dirigida à solução de problemas concretos que, ao contrário dos glosadores, desprendeu-
se progressivamente da colectânea justinianeia. Em vez de estudar os próprios textos
romanos, aplicaram-se às respectivas glosas e comentários. Ao lado de tais elementos
socorreu-se de outros fontes, designadamente de costumes locais e do direito canónico.
Chegaram assim à criação de novos institutos e de novos ramos de direito. Ao longo da
segunda metade do séc. XV inicia-se o declínio dos comentadores. O método
escolástico, que tinha sido criativo e permitia descobrir a razão dos preceitos legais,
passou a ter um emprego rotineiro, conduzindo à estagnação e à mera repetição de
argumentos e autores. Abusou-se do princípio da autoridade, registando-se um excesso
de casorismo. Limitaram-se a citar, a propósito de cada problema, os argumentos e
autores favoráveis e desfavoráveis a determinada solução. A opinião comum assim
obtida era considerada a exacta. A partir da primeira metade do séc. XV essa opinião
comum foi restringida ao parecer dos doutores, a chamada opinião comum dos
doutores, isto é, a doutrina.

Renovação do direito canónico


Entende-se por direito canónico o conjunto de normas jurídicas que disciplinam as
matérias de competência da igreja católica. Verificou-se do séc. XII em diante uma
grande renovação do direito canónico, que encontra causas justificativas idênticas às do
renascimento do direito romano e que foi caracterizada por 2 vectores:
1º. A organização de colectâneas mais perfeitas de normas em substituição das
anteriores
-- Colectâneas de direito canónico elaboradas desde o séc. XI – inicia-se um esforço
pontifício (do papa) de unificação normativa da igreja. Contrária a particularismos
nacionais ou regionais e que atribuía à Santa Sé a criação dos preceitos jurídico-
canónicos. Nesta linha enquadram-se:
 O decreto de Graciano de 1140 – que procurou fazer uma síntese e compilação
dos princípios e normas vigentes
 As decretais de Gregório IX – colectânea de normas pontifícias posteriores à
obra de Graciano que São Raimundo de Peñafort organizou mediante solução do
papa Gregório IX, que a promulgou em 1234. Estava organizada em 5 livros.
 O sexto de Bonifácio VIII – colectânea de 1298 que abrangeu as normas
canónicas aparecidas depois das decretais. A designação deriva da sua
complementaridade relativamente às decretais
 As clementinas – colectânea ordenada pelo papa Clemente V e promulgada em
1317 por João XXII
 As extravagantes de João XXII e as extravagantes comuns – as 4 colectâneas
anteriores foram publicadas juntas por volta de 1500 e o editor acrescentou-lhes
duas compilações de decretais posteriores a 1317, uma com decretais de João
XXII e a outra com decretais dos papas subsequentes. A palavra extravagantes
indica que são textos que se encontram fora das colectâneas autênticas. Estas
colectâneas de direito canónico vieram a integrar o Corpus Iuris Canonici,
promulgado em 1580 por Gregório XIII e que vigorou até 1917.

2º. A reelaboração científica do direito canónico baseada nesses corpos legais


Renovação do direito canónico com base nas colectâneas elaboradas – a construção
do direito canónico teve lugar mediante o recurso sucessivo à metodologia dos
glosadores e dos comentadores. Os processos de exegese, em em particular as glosas e
os comentários que os legistas utilizavam em face dos textos romanos foram transpostos
para a interpretação das colectâneas de direito canónico, designadamente o decreto e as
decretais. Consoante os canonistas se dedicavam à primeira ou à segunda dessas
colectâneas, eram denominados decretistas ou decretalistas.

Factores de penetração do direito canónico na Península Ibérica


- Os peninsulares que se deslocavam aos centros italianos e franceses do ensino do
direito eram maioritariamente eclesiásticos e, apesar de também estudarem direito
romano, dedicavam-se sobretudo ao direito canónico
- Divulgação dos textos de direito canónico através de cópias e de traduções
- Ensino do direito canónico nas universidades peninsulares

Aplicação judicial do direito canónico


Aplicação nos tribunais eclesiásticos – certas matérias pertenciam à jurisdição canónica
como, por exemplo, o matrimónio, os bens da igreja, os testamentos com legados e
outros benefícios eclesiásticos. Além disso, só podiam ser julgados pelos tribunais da
igreja os clérigos e todos aqueles a quem se concedesse tal privilégio.
Aplicação nos tribunais civis – num primeiro momento o sistema jurídico canónico foi
direito preferencial, mas, a breve texto, passaria a ser fonte subsidiária, ou seja,
aplicável apenas na falta de direito pactum (nacional).

As fontes do direito desde meados do séc. XIII até às ordenações afonsinas


As fontes do direito da época da recepção do direito romano renascido e do direito
canónico renovado caracterizam-se por uma autonomização progressiva em face das
ordens jurídicas de outros Estados Peninsulares e pelo reflexo da introdução do direito
romano justinianeu e do novo direito canónico.
- A legislação geral transformada em expressão da vontade do monarca – O surto
legislativo verificado resultou do reforço da autoridade do rei com a centralização
política e a unificação do sistema jurídico. A lei passa a considerar-se um produto da
actividade do soberano e uma actividade normal. Verifica-se o progressivo recurso do
monarca ao apoio técnico de juristas de formação romanística e canonística. O início de
vigência da lei não obedecia a um regime uniforme, tendo sido habitual a sua aplicação
imediata.
- As resoluções régias – providências tomadas pelos monarcas nas cortes em resposta
aos agravamentos feitos pelos representantes das três classes sociais. Se contivessem
normas para o futuro substancialmente eram leis.
- O costume – diminuiu o seu significado, cedendo primazia à lei. Os jurisconsultos
passam a vê-lo como expressão da vontade do monarca, tal como decorria das
concepções romanísticas. Se o rei não publica leis contrárias ao costume, revogando, é
porque, tacitamente, o aceita.
- Os forais e os foros, costumes ou estatutos municipais – a importância dos forais
manteve-se. Surge agora e assume grande relevo outra fonte de direito local: os foros,
costumes ou estatutos municipais, que eram compilações mais extensas do que os forais
e que eram concedidas aos municípios ou criados por estes. Abrangiam normas de
direito político e administrativo, normas de direito privado e de direito e processo penal.
Na elaboração destas colectâneas eram utilizados preceitos consuetudinários, sentenças
de juízes arbitrais ou concelhios, opiniões de juristas, normas municipais sobre polícia,
higiene e economia e até normas jurídicas inovadoras de natureza legislativa. Podem
descobrir-se influências de direito romano renascido.
- Concórdias e concordatas – persistiram múltiplos diferendos entre o clero e a realeza,
aumentando os acordos que lhes punham termo.

Direito Subsidiário (que se aplica na falta de direito nacional)


Só com as ordenações afonsinas se regulou completamente o preenchimento de lacunas.
Até então, o problema foi deixado ao critério dos juristas e dos tribunais. Recorria-se
em larga escala ao direito romano e ao direito canónico, mas os juízes encontravam-se
manifestamente impreparados para um acesso directo a essas fontes. Daí que
circulassem com carácter de fontes subsidiárias obras jurídicas castelhanas, as Flores de
Derecho, os Nueve Tiempos de los Pleitos, o Fuero Real e as Siete Partidas. A aplicação
complementar das referidas obras derivava apenas da autoridade intrínseca do seu
conteúdo romano-canónico. A sua utilização abusiva em detrimento dos genuínos
preceitos romano-canónicos foi objecto em meados do séc. XIV de protestos levados ao
rei e, por este, acolhidos. Pela mesma época começaram a traduzir-se os
correspondentes textos legislativos e importantes textos de doutrina que os esclareciam.
Colectâneas Privadas de Leis Gerais Anteriores às Ordenações Afonsinas
O progressivo acréscimo de diplomas avulsos tornava necessária a sua compilação.
Existiram colectâneas de leis do reino anteriores às ordenações afonsinas, mas tiveram
carácter privado, ou seja, não foram objecto de promulgação legislativa. Temos, assim,
duas colectâneas privadas:
- Livro das leis e postinas – data dos fins do séc. XIV e inícios do séc. XV. Não visou
coordenar a legislação mas apenas coligi-la, não tendo plano sistemático e verificando-
se repetição de textos.
- As Ordenações de D. Duarte – pertenceu à biblioteca do rei D. Duarte, que lhe
acrescentou um índice e um discurso sobre as virtudes do bom julgador. Contém um
maior número de leis, sendo raras as repetições. Os diplomas estão dispostos por
reinados e dentro destes por matérias.

Considerações sobre sistema jurídico da época


Produziu-se uma crescente penetração das normas e da ciência dos direitos romano e
canónico com progressiva substituição do empirismo que dominava a fase precedente.
Revelou-se importante a influência dessas novas doutrinas no que toca ao
desenvolvimento do poder real, com a hostilidade à justiça privada e a cisão entre
processo civil e processo criminal. A administração da justiça passa a ser vista como
algo exclusivo do poder público. É a partir desta época que, de forma crescente, o rei
passa a assumir o papel de criador de direito, moldando o seu poder à imagem e
semelhança do imperador romano. Ora, em muitos aspectos as soluções derivadas do
costume e aquelas que provinham do direito romano e do direito canónico não
coincidem, o que determina um conflito que vai ser arbitrado pelo rei, que se pronuncia
ou pela manutenção do costume ou pela adopção do mero direito. Na verdade, os reis
portugueses nesta época vão com frequência corrigir os costumes considerados maus ou
inconvenientes, substituindo-os por instituições do direito comum. Ao seu lado, o rei
tem, nesta tarefa, a igreja e os letrados da sua corte. Em oposição encontram-se muitas
vezes a nobreza e o povo, profundamente apegados aos seus costumes.
Um interessante caso ocorreu no reinado de D. Afonso IV, que pretendeu impor o
direito comum face à nobreza que, por sua vez, lutava pela manutenção dos seus foros
ou costumes. Diz o rei numa lei de cerca de 1326 que cada um vingava a morte e a
desonra dos seus parentes sem recorrer a tribunais. Ora, ponderando os graves
inconvenientes que advinham desta prática, radicada especialmente entre os fidalgos,
Afonso IV determinou que estes, no caso de morte ou de desonra de parentes, devem
trazer o caso perante o rei, perante a corte e perante os tribunais das terras sob pena de
morte em caso de desobediência. A insatisfação da nobreza leva Afonso IV a promulgar
sobre esta matéria nova lei, que surge nas ordenações afonsinas com data de 1347. Aí se
expõe que os fidalgos levaram até ao rei os seus protestos, pedindo-lhe que lhes
mantivesse o costume ou que, no caso de confirmar a lei, suavizasse as suas
consequências conforme os casos. O monarca, em resposta, e ouvidos os seus
conselheiros, confirmou a lei, embora tenha concordado, no tocante à pena, que ela
deveria ser suavizada em casos de injúrias menores feitas a pessoas de condição social
inferior. Repare-se que os fidalgos apontam como único requisito do costume a sua
antiguidade, mas o rei, imbuído na nova doutrina romano-canónica, vem dizer que a
prática da vingança privada não pode ser considerada costume, pois contrariava o
direito divino e o direito natural. Todavia nem sempre o costume saiu vencido na luta
contra o direito comum, pois, por vezes, encontrava-se demasiado radicado. Foi o que
aconteceu, por exemplo, com o costume antigo que isentava de pena o marido que
matasse a mulher adúltera. Segundo as ordenações, D. Afonso IV, apesar de
aconselhado em sentido contrário pelos seus conselheiros, considerou tal prática um
costume válido e, com base nela, chegou a proferir sentenças de absolvição. Vê-se, pois,
que, neste caso, o direito comum, apesar de apoiado pelos conselheiros do rei, não foi
suficiente para vencer a força do costume.
Quanto ao direito criminal substantivo, apura-se uma tendência para o predomínio das
penas corporais em detrimento das sanções pecuniárias.
No direito privado, salientam-se as mudanças introduzidas nas instituições familiares e
sucessórias, bem como novas doutrinas sobre obrigações e direitos reais.
Num balanço de conjunto, as influências romanísticas foram predominantes. Sectores
houve, todavia, onde prevaleceram as orientações do direito canónico, como foi o caso
da disciplina jurídica da família.

Época das Ordenações

Ordenações Afonsinas
Elaboração e início de vigência
Pedidos insistentes foram sendo formulados nas cortes no sentido de ser
elaborada uma colectânea do direito vigente que evitasse a incerteza derivada da grande
dispersão e confusão de normas. Neste sentido, D. João I encarregou João Mendes de
preparar a obra pretendida. Depois da morte de ambos, D. Duarte confiou a continuação
dos trabalhos preparatórios a Rui Fernandes. Falecido D. Duarte, o Infante D. Pedro,
regente na menoridade de Afonso V, incitou aquele compilador a dedicar-se à tarefa.
Rui Fernandes viria a considera-la concluída em 28 de Junho de 1446. Após ter
recebido alguns retoques, procedeu-se à sua publicação com o título de “Ordenações”
em nome de D. Afonso V. Os anos 1446/47 foram presumivelmente o da entrega do
projecto concluído e o da publicação. Mostra-se difícil a determinação da data de
entrada em vigor, mas a efectiva generalização deve ter-se operado depois de dobrada a
primeira metade do séc. XV. Facilitou a divulgação o facto de não apresentar inovações
profundas.

Fontes utilizadas e técnica legislativa


Utilizaram-se na sua elaboração as várias espécies de fontes anteriores, designadamente,
leis gerais, resoluções régias, concórdias e concordatas, costumes gerais e locais,
jurisprudência dos tribunais superiores, bem como normas extraídas das Siete Partidas e
preceitos de direito romano e direito canónico. Quanto à técnica legislativa, empregou-
se, em regra, o chamado estilo compilatório, transcrevendo-se na íntegra as fontes
anteriores e declarando-se depois os termos em que estes preceitos eram confirmados,
alterados ou afastados. Contudo, em quase todo o Livro I utilizou-se o estilo decretório
ou legislativo, que consiste na formulação directa das normas sem referência às
eventuais fontes precedentes.

Sistematização e conteúdo
Encontravam-se divididas em 5 livros precedidos de um proémio, livros esses divididos
em títulos e os títulos em parágrafos.
Livro I – tem um conteúdo jurídico-administrativo com matérias relativas a governo,
justiça, fazenda e exército
Livro II – continha providências de natureza política ou constitucional como os bens e
privilégios da igreja, direitos do rei e sua cobrança, prerrogativas da nobreza e estatuto
dos judeus e mouros
Livro III – trata do processo civil
Livro IV – direito civil substantivo → direito das obrigações, direito das coisas, direito
da família e direito das sucessões
Livro V – contém normas de direito e processo criminal

Importância da obra
Foram a síntese de consolidação da autonomia do sistema jurídico nacional no conjunto
peninsular, representando o suporte da posterior evolução do direito português. Por
outro lado, acentua-se a independência do direito próprio do reino em face do direito
comum, subalternizado, como veremos, no posto de fonte subsidiária.

Ordenações Manuelinas
Elaboração
Em 1505, D. Manuel encarregou uma comissão de juristas de proceder à actualização
das ordenações do reino. Motivos de tal reforma:
- Introdução da imprensa em finais do séc. XV – ora, já se impunha levar à tipografia a
colectânea jurídica básica do país, convinha um prévio trabalho de revisão e
actualização
- Não era indiferente a D. Manuel, que assistiu a pontos altos dos descobrimentos,
associar o seu nome a uma reforma legislativa de vulto. Só em 1521, ano da morte do
rei, se verificou a edição definitiva das ordenações manuelinas.

Sistematização, conteúdo e técnica legislativa


Mantém-se a estrutura básica de 5 livros divididos em títulos e parágrafos, conservando-
se a distribuição das matérias. Todavia, as ordenações manuelinas tiveram consideráveis
diferenças de conteúdo, como a supressão dos preceitos relativos aos judeus e mouros
que tinham sido entretanto expulsos do país, a saída da matéria financeira para umas
autónomas ordenações da fazenda, a inclusão da disciplina da interpretação vinculação
da lei através dos assentos da casa da suplicação e as alterações em matéria de direito
subsidiário.
Os preceitos apresentam-se agora redigidos em estilo decretório.

Colecção das leis extravagantes de Duarte Nunes do Lião


A breve texto, as ordenações manuelinas viram-se rodeadas por inúmeros diplomas
avulsos a que acrescia uma multiplicidade de interpretações vinculações da lei por parte
dos assentos (decisões que eram assentadas num livro) da casa da Suplicação.
O cardeal D. Henrique, regente na menoridade de S. Sebastião, encarregou Duarte
Nunes do Lião de organizar uma compilação do direito extravagante, ou seja, aquele
que vigorava fora das ordenações manuelinas. Em vez de uma transcrição das leis e
assentos anteriores, procedeu-se ao resumo ou excerto da essência dos preceitos. A essa
síntese o alvará de 14 de Fevereiro de 1569 atribuiu a mesma autoridade das disposições
originais. Para solucionar eventuais dúvidas interpretativas o caminho seria o de
consulta dos originais. A colectânea estava dividida em 6 partes que compreendem
títulos cujos preceitos se designam leis, ainda que fossem extraídos de fontes da
natureza diversa.

Ordenações Filipinas

Elaboração
Impunha-se uma reforma profunda das ordenações manuelinas, até porque estas não
realizaram a transformação jurídica que o seu tempo reclamava. A oportunidade
permitiria a D. Filipe I demonstrou pleno respeito pelas instituições portuguesas e
empenho em actualizá-las dentro da tradição jurídica do país.
Os trabalhos preparatórios foram iniciados entre 1583 e 1585, tendo as ordenações
filipinas ficado concluídas em 1595, mas só no reinado de Filipe II em 1603 iniciaram a
sua vigência.

Sistematização, conteúdo e legislação revogada


Continuou a sistematização anterior. Procurou-se realizar uma pura revisão
actualizadora das ordenações manuelinas. Apenas se procedeu à reunião num único
corpo legislativo dos dispositivos manuelinos e dos muitos preceitos posteriores que se
mantinham em vigor. Introduziram-se, contudo, certas alterações:
- a matéria do direito subsidiário passou do livro II para o livro III, relativo ao processo
civil, o que revelou uma perspectivação muito diferente sobre o problema do
preenchimento de lacunas;
- pela primeira vez inclui-se um conjunto de preceitos sobre o direito da nacionalidade
(estabelece quem é nacional num país)

Confirmação por D. João IV


Sobreviveram as ordenações filipinas à revolução de 1640. Através de lei de 29 de
Janeiro de 1643 o rei D. João IV procedeu à expressa reafirmação e revalidação das
ordenações.

Os filipismos
Os compiladores filipinos tiveram a preocupação de rever e coordenar o direito vigente
mas reduzindo ao mínimo as inovações. Apenas se acrescentou o novo ao antigo, daí
subsistirem normas revogadas ou caídas em desuso, verificarem-se frequentes faltas de
clareza e, até, com tradições resultantes da inclusão de disposições opostas a outras que
não se eliminaram. A ausência de originalidade e os restantes defeitos receberam pelos
finais do século XVIII e designação de filipismos.

FONTES DE DIREITO NA EPOCA DAS ORDENAÇÕES


Fontes de direito pátrio:
A LEI:
A colectânea filipina viria a ser alterada ou complementada por numerosa legislação
extravagante. Qualificava-se como lei toda e qualquer manifestação da vontade
soberana destinada a introduzir alterações na ordem jurídica. Embora se reconhecesse
que a lei propriamente dita devia ser de aplicação geral e abstracta não repugnava dar-se
a mesma designação a diplomas sem tais características.
Espécies de diplomas: os mais importantes eram as cartas de lei e os alvarás que
apresentavam o traço comum de passar pela chancelaria régia.
Cartas de Lei: começavam pelo nome próprio dos monarcas aparecendo na assinatura a
expressão – El-rei. Eram o modo de promulgação das disposições que se destinassem a
vigorar mais de um ano.
Alvarás: iniciavam-se pela expressão – Eu el-rei – aparecendo na assinatura somente –
rei. Serviam para promulgar disposições que vigorassem menos de um ano.
Desde cedo os diplomas confundiram-se aparecendo os alvarás de lei, com força de lei
ou em forma de lei.
Publicação e início da vigência da Lei:
As ordenações manuelinas atribuíram ao chanceler mor a publicação das leis na
chancelaria da corte, com o envio dos traslados respectivos aos corregedores das
comarcas.
As ordenações filipinas repetiam o preceito.
Por finais de 1518 providenciou-se sobre o inicio da vigência das leis que teriam
eficácia em todo o país decorridos três meses sobre a sua publicação na chancelaria.
O preceito transitou para as ordenações manuelinas mas reduzindo o prazo de vacatio
legis a oito dias quanto à corte.
As ordenações filipinas conservaram esses prazos.
Em 1749 estabeleceu-se que as leis apenas se tornavam obrigatórias nos territórios
ultramarinos depois de publicadas nas cabeças de comarcas.

Interpretação da Lei através dos Assentos


O problema da interpretação da lei com sentido universalmente vinculativo para futuro
foi disciplinado por um alvará de 1518 cujos dispositivos se incluíram nas ordenações
manuelinas e filipinas.
Determinou-se que surgindo dúvidas aos desembargadores da Casa da Suplicação sobre
o entendimento de algum preceito tais dúvidas seriam levadas ao regedor do mesmo
tribunal que por sua vez convocaria os desembargadores que entendesse e com eles
fixava a interpretação que entendesse mais adequada.
O Regedor poderia aliás submeter a dúvida a resolução do monarca se subsistissem
dificuldades interpretativas.
As soluções definidas ficavam registadas no chamado Livro dos Assentos e tinham
força imperativa para futuros casos.
Surgem deste modo os assentos da Casa da Suplicação como jurisprudência obrigatória.
A Casa da Suplicação era o tribunal superior do reino que acompanhava a corte mas que
acabaria por se ficar em Lisboa.
Os desembargadores da relação do Porto arrogaram-se o direito de também proferir
assentos normativos embora nenhum texto legal lhes outorgasse semelhante faculdade.
As relações de Goa, da Baía e do Rio de Janeiro seguiram o exemplo.
Só no século XVIII a Lei da Boa Razão pôs cobro a esse abuso estabelecendo que só os
assentos da casa da Suplicação teriam eficácia interpretativa obrigatória.
OS ESTILOS DA CORTE:
Jurisprudência uniforme e constante dos tribunais superiores em bom rigor apenas da
Casa da Suplicação.

Requisitos a que deviam obedecer para serem fonte de direito:


1º Não serem contrários à lei;
2º Possuírem uma antiguidade de 10 ou mais anos;
3º Serem introduzidos através de dois actos conformes do tribunal superior;
Um diploma de 1605 veio ocupar-se da imperatividade dos estilos antigos da Casa da
Suplicação preceituando que as respectivas dúvidas e alterações fossem objecto de
assento.

O COSTUME:
O costume mantinha a sua eficácia da fonte de direito quer fosse secundum legem,
praeter legem ou contra legem.
As ordenações afonsinas limitaram-se a consagrar a vigência do costume antigamente
usado.
Já as ordenações manuelinas salientam a validade dos costumes locais no mesmo plano
dos costumes gerais mas restringindo a observância de ambos como fonte imediata aos
casos em que a doutrina romanística e canonistica admitissem a sua vigência.

Requisitos do Costume:
1º Tornou-se corrente a doutrina do direito comum que exigia um período igual ou
superior a 10 anos. Porém no âmbito do direito canónico havia autores que para o
costume contrário à lei preconizavam duração mínima de 40 anos.
2º Número de actos necessários à demonstração da sua vigência: as opiniões divergiam
entre um e dez actos mostrando-se mais seguida a que se contentava com dois actos
nomeadamente de natureza judicial.

Fontes de Direito Subsidiário:

O problema do direito subsidiário:


Entende-se por direito subsidiário em sistema de normas jurídicas chamado a colmatar
as lacunas de outro sistema.
Trata-se respectivamente de direito subsidiário geral ou especial quando
respectivamente se preenchem lacunas de uma ordem jurídica na sua totalidade ou tão
só de um ramo do direito ou simples instituição.
Na época das ordenações havia um direito subsidiário geral.

Fontes de direito subsidiário segundo as ordenações afonsinas:


I – Direito romano e direito canónico:
Na falta de direito nacional ou seja de lei, estilo da corte ou costume caberia utilizar
antes de mais o direito romano e o direito canónico que se designavam respectivamente
leis imperiais e santos cânones. Em questões jurídicas de natureza temporal e prioridade
pertencia ao direito romano excepto se da sua aplicação resultasse pecado.
Portanto o direito canónico prevalecia sobre o direito romano nas matérias de ordem
espiritual e nas temporais em que a observância do último conduzisse a pecado.
As ordenações afonsinas exemplificavam com a usucapião admitida pelo direito romano
em benefício do possuidor de má fé ao fim de 30 anos mas que o direito canónico
rejeitava.
II – Glosa de Acúrsio e Opinião de Bártolo
Se o caso omisso não fosse decidido directamente pelos textos de direito romano ou de
direito canónico devia atender-se à Glosa de Acúrsio e em seguida à Opinião de
Bártolo, o mais significativo jurista da Escola dos Comentadores ainda que outros
doutores se pronunciassem em sentido diverso.

III – Resoluções do monarca


Se através das sucessivas fontes indicadas não se conseguisse solução para o caso
omisso impunha-se a consulta do rei, cuja estatuição valeria de futuro para todos os
casos semelhantes. Determinava-se o mesmo procedimento quando a hipótese
considerada não envolvendo matéria de pecado nem sendo disciplinada pelos textos de
direito romano tivesse soluções diversas nas glosas e doutores de leis.

Alterações introduzidas pelas Ordenações Manuelinas e Filipinas:


Já vimos que nas ordenações filipinas o direito subsidiário deixou de ser disciplinado a
propósito das relações entre o Estado e a Igreja no Livro II deslocando-se para o Livro
III relativo ao processo. Assim se desliga a questão do direito subsidiário da ideia de
conflito entre poder temporal e espiritual/eclesiástico tornando-se um simples problema
técnico jurídico. Todavia as mudanças substanciais surgem logo nas ordenações
manuelinas. Além de passar a ser justificada a aplicação subsidiária do direito romano
através da sua autoridade intrínseca e não de qualquer subordinação do reino português
ao império assinalam-se duas diferenças essenciais em relação ao texto afonsino:
1º Quanto à aplicação dos direitos romano e canónico deixa-se de distinguir entre
problemas temporais e espirituais apenas se consagrando o critério do pecado.
2º Conserva-se a ordem da precedência entre a Glosa e a Opinião de Bártolo mas
estabelece-se o requisito de a opinião comum dos doutores não contrariar essas fontes.
Relativamente a Bártolo essa restrição era definida apenas pelos autores que tivessem
escrito depois dele.
O facto de a letra da lei colocar a opinião comum como filtro da Glosa e da Opinião de
Bártolo levou à interpretação não pacifica de que constituía em si mesma uma fonte
subsidiária, ou seja, na falta de direito pátrio, de direito romano e de direito canónico
caberia recorrer à opinião comum antes da Glosa e da Opinião de Bártolo.

Utilização das fontes subsidiárias:


Assumiam relevo as confusões e os atropelos frequentes à letra e ao espírito do sistema.
Não raro o direito pátrio era preterido pelo direito romano ou pelo menos prevalecia a
regra interpretativa de que as normas jurídicas do país deveriam receber interpretação
extensiva ou restritiva conforme se apresentassem conformes ou opostas a esse direito.
Abusava-se da opinião comum especialmente cristalizada nos tribunais superiores.
Chegou até a aplicar-se direito castelhano que se encontrava fora do quadro das fontes
subsidiárias.

Reforma dos forais:


Os forais foram-se desactualizando. Uma parte do seu conteúdo encontrava-se revogada
pela legislação geral designadamente preceitos respeitantes à administração, ao direito e
processo civil e ao direito penal.
Mesmo quanto às normas ainda vigentes relativas aos encargos e isenções tributárias era
manifesto o seu carácter absoluto.
Pois, por um lado referiam-se a pesos, medidas e moedas em desuso e por outro lado as
providências estabelecidas com vista à actualização das prestações devido à
desvalorização monetária originavam incertezas e arbitrariedades. Além disso muitos
forais apresentavam-se em grande estado de deterioração ou não ofereciam garantias de
autenticidade.
Já em 1472/73 os procuradores dos concelhos alegaram as deficiências dos forais
solicitando a D. Afonso V a sua reforma para se pôr cobro às opressões de que os povos
eram vítimas.
Idêntico pedido foi formulado nos começos do reinado de D. João II que determinou o
envio à Corte de todos os forais a fim de se proceder à respectiva reforma sob pena de
perderem validade.
A reforma só ficou concluída em 1520 no reinado de D. Manuel I.
Surgem assim os forais novos ou manuelinos em contraposição aos forais velhos que
eram os anteriores. Os forais concedidos após a reforma, aliás em número
reduzidíssimo, são chamados forais novíssimos.
Os novos forais limitaram-se a regular os encargos e tributos devidos pelos concelhos
ao rei e aos donatários das terras.
Assim se encerrou a sua carreira como estatutos político-concelhios em consequência
do robustecimento do poder real.

HUMANISMO JURÍDICO

Causas do seu aparecimento:


1ª. O progresso do humanismo renascentista;
2ª. Decadência ocorrida na segunda metade do século XV da obra dos comentadores;
assiste-se ao uso rotineiro do método escolástico.
A partir de certa altura os bartolistas limitam-se, em regra, a amontoar nos seus escritos
uma série interminável de questões, distinções e subdistinções ao lado de uma quase
exclusiva citação das opiniões dos autores precedentes. A normal impreparação e o
menosprezo dos comentadores quanto a aspectos históricos provocaram viva censura
dos espíritos cultos da época bem como a deselegância do seu estilo.
Características do humanismo jurídico:
Começou a encarar-se o direito romano como uma das manifestações da cultura
clássica. Foram os juristas desta escola os iniciadores do estudo crítico das fontes
romanas e os primeiros que procuraram detectar as interpolações nos textos
justinianeus.
O seu postulado básico reportava-se ao livre exame das fontes romanas (sem a
intermediação a opinião comum dos doutores).
Precursores e apogeu da escola:
O italiano Alciato é geralmente considerado o fundador da escola tendo sido em França
que o humanismo jurídico conseguiu incremento decisivo.
Considera-se a época de Cujácio como a do apogeu da escola humanista tornando-se
esse o mais representativo jurista do século XVI.

Contraposição do humanismo ao bartolismo:


Nem mesmo em França o humanismo jurídico conseguiu um triunfo absoluto sobre o
bartolismo. Iria assistir-se do século XVI ao século XVIII a um debate entre o método
jurídico francês – “mos gallicus” – e o método jurídico italiano – “mos italicus”.
Tem-se destacado que os humanistas construíram um direito teórico de tendência
erudita enquanto os processos dos comentadores levaram a um direito prático, quer
dizer à utilização do sistema romano com o espírito de encontrar soluções para os casos
concretos.
O programa do “mos gallicus” apresentava-se não só mais difícil de executar mercê da
preparação cientifica que exigia mas também menos atractivo para a rotina forense.
O humanismo jurídico cumpriu um ciclo efémero não vencendo critérios enraizados.
Contudo lançaram-se inegáveis sementes que o setecentismo iluminista faria frutificar.

O humanismo jurídico em Portugal:


Verificou-se no período imediato à instalação definitiva da universidade em Coimbra
em 1537 uma certa abertura às ideias do humanismo jurídico que eram adversas ao
princípio da autoridade.
Contudo o surto parece ter sido muito fugaz não sobrevivendo ao desaparecimento de
uns mestres mais progressivos e à decadência dos nossos estudos universitários pouco
depois da primeira metade do século XVI.
Então os rumos bartolistas prosseguiram a sua mal interrompida carreira.

A Segunda Escolástica
Analisaremos agora os contributos jurídicos e políticos da corrente desta época que
ficou conhecida como Segunda Escolástica.
- O direito natural na escolástica medieval:
Na idade média as questões tocantes ao direito natural foram estudadas pelos teólogos
que nomeadamente estudaram a sua relação com a vontade divina.
Surgiram assim duas posições: idealismo e voluntarismos.
O idealismo que teve São Tomás de Aquino como expoente entende que Deus
sancionou o direito natural porque nesse direito existe uma verdade racional eterna.
O voluntarismo defendido por Duns Escoto e Guilherme de Ockam defende ao
contrário que o direito natural só o é porque Deus assim o quis e diferente seria se outra
fosse a vontade divina.
O exasperar de argumentação por parte da corrente idealista levou a que a pouco e
pouco se restringisse a ligação de Deus ao direito natural.
Significativo disto mesmo é o raciocínio levado a cabo pelos autores idealistas embora
sempre ressalvando o seu carácter de redução ao absurdo: mesmo que não existisse
Deus haveria sempre algo que faria com que o conteúdo da recta razão fosse o mesmo.

- O direito natural na Segunda Escolástica:


A posição idealista de base tomista vai ser trabalhada pela chamada escolástica
espanhola do século XVI, escolástica espanhola de direito natural ou Segunda
Escolástica. Também esta na defesa do princípio do idealismo afirmará que o direito
natural existiria ainda que se admitisse o caso impossível de Deus não existir.
A Segunda Escolástica correspondeu à necessidade de repensar a compreensão cristã do
homem e da convivência humana em face da conjuntura do tempo e portanto
envolvendo o direito e o Estado.
A especulação teológica jurídica da Segunda Escolástica conseguiu uma abertura ampla
aos novos problemas e soluções dentro de uma coerência firme aos postulados tomistas
essenciais.
Como já vimos esta corrente caracterizou-se pela sua posição jusnaturalista em que se
reafirma o direito e o Estado metafísica e ontologicamente alicerçados numa concepção
teocêntrica.
A partir da existência de uma ordem jurídica superior os teólogos juristas aferem o
direito positivo.
Trouxeram contributos muito relevantes para a edificação ou o desenvolvimento de
muitos séculos desde a teoria do Estado e a ciência jusinternacionalista até ao direito
penal e à elaboração de categorias dogmáticas modernas do direito privado.
Merece destaque o impulso dado para a criação do Direito Internacional Público
moderno.
Os descobrimentos suscitaram uma multiplicidade de questões designadamente a da
liberdade dos mares, a da legitimidade da ocupação dos territórios descobertos ou
conquistados e da condição jurídica dos respectivos habitantes.
Os nomes mais representativos do pensamento jusnaturalista e jusinternacionalista da
2ªEscolástica foram Francisco Vitória, que se considera o fundador do Direito
Internacional Público moderno, Domingo de Soto, Luís Molina e Francisco Suarez.
Pelo que respeita ao DIP, a grande polémica da época centrava-se na querela sobre o
exclusivo da navegação e do comércio nos mares e territórios descobertos. À doutrina
da liberdade de navegação – mare liberum – que encontrou o seu grande defensor em
Hugo Grócio opunha-se a teoria do monopólio dos mares por parte dos países que
abriram as novas rotas – mare clausum – não era, obviamente, uma pura controvérsia
científica desligada de interesses políticos e económicos.

Influência no pensamento jusracionalista


Autores modernos vêm sustentando que o jusracionalismo laico do século XVIII que
estudaremos de seguida se filia no direito natural de raiz religiosa da escolástica
medieval. A corrente mediadora terá sido a 2ª Escolástica, daí derivando a importância
atribuída a essa escola para a formação dos tempos ulteriores.
Mesmo Hugo Grócio, fundador do jusnaturalismo moderno, não deixou de afirmar que
o direito natural é aquele que teria existido mesmo se Deus não existisse.
No que repete a 2ª escolástica não como último argumento de redução ao absurdo no
seio de uma polémica teológica mas como premissa de um novo sistema que
desvinculará o direito natural da teologia.
A ordem jurídica superior a partir da qual se afere o direito positivo deixa de ser de
cariz divino mas sim fundada nos axiomas da razão humana.

O período da formação do direito português moderno:

Época do jusnaturalismo racionalista:


- Correntes do pensamento jurídico europeu
Outro período se inaugura na evolução do direito português com as reformas do ciclo
pombalino. Comecemos por analisar as orientações filosóficas e jurídicas que marcaram
os horizontes europeus na época jusracionalista e que inspiraram aquelas reformas.
- Escola racionalista do direito natural: Grócio manifestamente influenciado pela 2ª
Escolástica, representou como que uma ponte de passagem dos correspondentes
concepções teológicas e filosóficas para o subsequente jusnaturalismo racionalista. O
novo sistema de direito natural seria verdadeiramente construído pelos autores que
desenvolveram os postulados ínsitos à obra de Grócio como Hobbes, Locke, Pufendorf,
Thomasius e Wolf.
Com os aludidos autores a compreensão do direito natural desvincula-se de
pressupostos metafísico-religiosos.
Chega-se ao direito racionalista, isto é, produto da razão humana.
Considera-se que tal como as leis universais do mundo físico também as normas que
disciplinam as relações entre os homens são imanentes à sua própria natureza e
livremente encontrados pela razão sem necessidade de recurso a postulados teológicos.
- Usus Modernus Pandectarum:
Surgiu na Alemanha de onde passou a outros países uma nova metodologia de estudo e
aplicação do direito conhecida por usus modernus pandectarum e que traduz o reflexo
das ideias jusracionalistas no campo do direito.
Encarava o direito com os olhos postos na realidade distinguindo no sistema do corpus
iuris civilis o que se considerava direito vivo do que se tornava obsuleto.
Por outras palavras, importava separar as normas susceptíveis de uso moderno, ou seja,
adaptadas às circunstâncias do tempo das que correspondiam a circunstâncias romanas
peculiares. Só as primeiras deveriam considerar-se aplicáveis.
Numa segunda fase, tal aferição da actualidade dos preceitos romanísticos beneficiou do
refinamento teórico da referência ao direito natural racionalista.
Tinha-se também em conta o próprio direito pátrio que integrava o ordenamento vigente
ao lado dessas normas susceptíveis de prática actualizada sendo esta uma das maiores
consequências do usus modernus.
Vemos assim que, nesta orientação, confluem vectores práticas racionalistas e de
nacionalismo jurídico.
- Jurisprudência elegante:
O século XVI correspondeu à época áurea do humanismo jurídico francês. No século
imediato o ponto de gravitação da Escola deslocar-se-ia para a Holanda.
Despontou assim com sede holandesa a Escola dos jurisconsultos elegantes apesar da
crescente difusão do usus modernus. O nome adveio da preocupação de rigor das
formulações jurídicas e da expressão escrita dos seus adeptos que já na primeira metade
do século XVIII continuaram a estudar o direito romano dentro do método histórico-
crítico. Não deixou, contudo, pelo menos na posição de alguns dos seus autores, de
assumir uma orientação prática que combinava as finalidades do usus modernus com as
puras tendências do humanismo jurídico.
-Iluminismo
Esta designação prende-se à ideia de os seus cultores serem iluminados como que tendo
recebido as luzes da razão. Trata-se de um período que abrangeu todo o século XVIII.
Entre nós, todavia, corresponde apenas à sua segunda metade assiste-se a uma
hipertrofia da razão e do racionalismo. Verifica-se o desenvolvimento de um sistema
das ciências do espírito baseado nas ciências naturais.
Em suma, tudo se alicerça na natureza e tem a sua validade aferida pela razão do
indivíduo ou seja por uma razão subjectiva e crítica.
Quanto aos problemas da filosofia jurídica e política, o iluminismo definiu uma vincada
concepção individualista liberal da compreensão do direito e do Estado. Na base
colocam-se os direitos originários e naturais do indivíduo. Afinal de contas tiram-se as
últimas consequências do espírito individualista que se desenvolvera desde o
Renascimento e que as concepções jusracionalistas tinham acentuado.
- Humanitarismo
No âmbito específico do Direito Penal e do tratamento penitenciário à que mencionar as
correntes humanitaristas derivadas do iluminismo jurídico.
Três aspectos básicos:
1º Conteúdo do direito penal: entendia-se que esta deveria desvincular-se de todos os
pressupostos religiosos reduzindo-se à função exterior de tutela de valores ou interesses
gerais necessários à vida colectiva. Afirmava-se a ideia de necessidade ou utilidade
comum como critério delimitador do direito penal por oposição a uma axiologia
eminentemente ético-religiosa.
2º Fim das penas: as sanções criminais passam a ter como fundamento predominante já
não um imperativo ético mas uma pura ideia de prevenção e defesa da sociedade. A
pena justificava-se não como castigo pelo facto passado mas antes como meio de
prevenir futuras violações da lei criminal, quer intimidando a generalidade das pessoas
(prevenção geral), quer agindo sobre o próprio delinquente, intimidando-o ou
reeducando-o (prevenção especial).
3º Respeito pela dignidade humana: a acção preventiva do direito penal teria de ser feita
dentro dos limites da justiça e da dignidade da pessoa com a exigência de
proporcionalidade entre a pena e a gravidade do delito e o fim das antigas penas
corporais ou infamantes e a sua substituição pela pena prisão.

Reformas pombalinas respeitantes ao direito e à ciência jurídica


As correntes que acabámos de referir constituíram a base orientadora das reformas
pombalinas. Estas traduziram-se em três sectores: modificações legislativas pontuais;
o da ciência do direito e o do ensino do direito
Modificações legislativas pontuais: algumas dessas providências trouxeram um
progresso significativo e permaneceriam. Não faltaram outras, contudo, que eram sinal
de um reformismo jurídico desligado da nossa tradição histórica. Estas tiveram uma
vigência efémera não ultrapassando a vida política do Marquês, como aconteceu, por
exemplo, com os diplomas que regularam em moldes totalmente novos as matérias do
direito necessário, nomeadamente, excluindo a liberdade de fazer testamento em
prejuízo de determinados parentes. A vigência desses diplomas foi em grande parte
suspensa por D. Maria I no ano seguinte ao da queda de Pombal, voltando a vigorar as
soluções anteriores consagradas nas ordenações.
Reformas no âmbito da ciência do Direito:
A Lei da Boa Razão – trata-se da lei de 18 de Agosto de 1769 que só no século XIX
receberia o nome de Lei da Boa Razão dado o seu apelo insistente à boa razão ou seja a
recta ratio jusnaturalista.
Soluções consagradas na Lei da Boa Razão:
Quanto aos estilos da corte – Os diferendos submetidos à apreciação dos tribunais
deviam ser julgados antes de tudo pelas leis pátrias e pelos estilos da corte. Determinou-
se todavia que estes só valessem quando aprovados através de assentos da Casa da
Suplicação, o que significa que os estilos da Corte perdem a eficácia autónoma que
antes lhes era reconhecida.
Quanto ao valor dos assentos – confere-se autoridade exclusiva aos assentos da Casa da
Suplicação declarando-se que os assentos das relações apenas alcançariam valor
normativo mediante confirmação daquele tribunal superior.
Quanto ao costume – estatui-se expressamente que, para que o costume valesse como
fonte de direito, deveria subordinar-se a três requisitos: ser conforme à boa razão; não
contrariar a lei; ter mais de 100 anos de existência. O direito consuetudinário, deste
modo, só conservou validade secundum legem e praeter legem, nunca contra legem.
Quanto ao direito subsidiário – na falta de direito pátrio caberia o recurso ao direito
subsidiário. Neste domínio verificaram-se quatro alterações fundamentais:
1º O direito romano só era aplicável desde que se apresentasse conforme à recta ratio
jusnaturalista – este critério mostrava-se vago mas logo em 1772 os Estatutos da
Universidade fixaram um conjunto de regras destinadas a aferir a boa razão dos textos
romanos. Aponta-se ao intérprete o critério prático de averiguar o uso moderno que dos
preceitos romanos faziam os jurisconsultos das nações europeias modernas.
Daí que o direito romano aplicável subsidiariamente por força da lei da Boa Razão se
reconduzisse ao aceite nas obras doutrinais da Escola do Usus Modernus Pandectarum,
que, assim, adquiriam entre nós o valor normativo indirecto de fontes supletivas.
2º Se a lacuna dissesse respeito a matérias políticas, económicas, mercantis ou
marítimas, determinava-se o recurso directo às leis das nações cristãs iluminadas e
polidas. Neste caso, o direito romano era liminarmente posto de lado, pois entendia-se
que, pela sua antiguidade, se revelava de todo inadequado à disciplina de tais domínios.
3º A aplicação do direito canónico é relegada para os tribunais eclesiásticos, deixando
de se contar entre as fontes subsidiárias
4º Também se proibiu que a Glosa de Acúrsio e a Opinião de Bártolo fossem aplicadas
e alegadas em juízo. A mesma solução estava implícita a respeito da opinião comum
dos doutores. Para justificar esta providência, alegou o legislador as imperfeições
jurídicas atribuídas à falta de conhecimentos históricas e linguísticas daqueles autores e
à sua ignorância das normas fundamentais de direito natural e de direito divino.
Reformas no âmbito do ensino do direito
Os novos Estatutos da Universidade – Em 1770 foi nomeada uma comissão com o
nome de Junta de Providência Literária incumbida de emitir parecer sobre a decadência
do ensino universitário e o critério adequado à sua reforma. Essa comissão apresentou,
em 1771, um relatório com o título de compêndio histórico da Universidade de
Coimbra, onde se faz uma crítica implacável da organização existente, apontando-se
como graves defeitos dos nossos estudos jurídicos os seguintes:
1º Preferência absoluta dada ao ensino dos Direitos Romano e Canónico,
desconhecendo-se praticamente o direito pátrio;
2º Abuso que se fazia do método bartolista;
3º Respeito cego pela Opinião Comum dos Doutores;
4º Desprezo pelo direito natural e pela história do direito;
À Junta de Providência se deve ainda a subsequente elaboração dos novos Estatutos da
Universidade também conhecidos por Estatutos Pombalinos, aprovados em 1772.
Alterações consagradas pelos novos estatutos:
- Inclusão de novas matérias: direito natural, história do direito e instituições de direito
pátrio. Não obstante o núcleo central dos cursos de leis e cânones continuou a ser
constituído respectivamente pelo Corpus Iuris Civilis, especialmente o digesto e pelos
Corpus Iuris Canonicis, ainda que encarados de modo diverso.
- Determinou-se a utilização do método de ensino que se designava sintético,
demonstrativo, compendiário: sintético porque se impunha fornecer aos estudantes uma
ideia geral de cada disciplina através de definições e da sistematização das matérias do
mais fácil para o mais difícil; demonstrativo porque passar-se-ia de umas proposições
ou conclusões para as outras só depois de esclarecidas as primeiras e retirando-se as
seguintes como sua dedução; compendiário porque tudo isto devia ser acompanhado de
manuais adequados elaborados pelos professores, que substituíram as tradicionais
postilas que consistiam em apontamentos manuscritos que circulavam entre estudantes,
reproduzindo grosseiramente as aulas. Com excepção das obras de Pascoal José de
Mello Freire dos Reis, esta orientação compendiária não teve o êxito esperado. O
método analítico utilizado até então, consistindo muitas vezes na análise pormenorizada
de uma única lei ou título de direito romano ou canónico apenas sobreviveu em duas
cadeiras do final do curso para aprendizagem da interpretação e execução das leis.
- Traçou-se minuciosamente o programa das várias cadeiras e impôs-se aos professores
a Escola de Jurisprudência julgada preferida. No tocante aos direitos romano e
canónico, o método bartolista foi substituído pelas directrizes histórico-críticas ou
cujacianas. Mas, tendo em vista a aplicação subsidiária do direito romano, determinada
pela lei da Boa Razão, consagravam-se os princípios da corrente do usus modernus
pandectarum.

Novo Código
Em 1778, D. Maria I criou uma comissão, tendo por objectivo a reforma geral do direito
vigente, projecto que ficou conhecido por Novo Código. Dever-se-ia averiguar as
normas contidas nas ordenações e em leis extravagantes que conviria suprimir por
antiquadas mas também aquelas que se encontravam total ou parcialmente revogadas, as
que vinham levantando dúvidas de interpretação e as que a experiência aconselhava a
modificar. Estava-se perante os trabalhos preparatórios de um novo projecto legislativo,
embora se procurasse a simples actualização das ordenações. Algum trabalho feito sobre
temas de direito privado e de processo deixa entrever certa actualidade e que se esteve
em vias de elaboração de um autêntico código, mas a comissão não chegou a propostas
de vulto. Em 1783 Mello Freire foi encarregado de rever os livros II e V das
ordenações, do que resultaram os projectos de código do direito público e de código
criminal. Na apreciação do projecto de código do direito público, Mello Freire,
partidário do absolutismo, e António Ribeiro dos Santos, adepto dos princípios liberais,
envolveram-se em forte polémica, conhecida por Formidável Sabatina. O projecto do
código do direito público acabou por não vingar, o do código criminal nem discutido
foi. Assim fracassou mais uma tentativa de reforma das antiquadas ordenações filipinas.
As circunstâncias não lhe eram favoráveis pois vivia-se um período de transição ou
compromisso em que o despotismo esclarecido encontrava-se no ocaso e as ideias da
revolução francesa mal se avistavam entre nós.

Evolução do Direito Subsidiário

Época do renascimento do direito romano e da renovação do direito canónico


A regulamentação das lacunas foi deixada ao critério dos juristas e dos tribunais.
Recorria-se em larga escala ao direito romano, ao direito canónico e a obras jurídicas
castelhanas de conteúdo romano-canónico, como por exemplo as Siete Partidas.

Época das ordenações


Ordenações Afonsinas – na falta de direito pátrio devia recorrer-se, em 1º lugar, ao
direito romano para as questões temporais à excepção daquelas que conduzissem a
pecado e ao direito canónico para as questões espirituais ou para as temporais em que o
direito romano conduzisse a pecado; em 2º lugar recorrer-se-ia à Glosa de Acúrsio e à
Opinião de Bártolo; em 3º lugar, recorria-se às resoluções do monarca, às quais tudo se
deveria recorrer no caso de não se tratar de matéria de pecado e o direito romano não
oferecesse solução e as soluções do direito canónico e da Glosa e da Opinião de Bártolo
fossem opostas.
Ordenações Manuelinas – Quanto à aplicação do direito romano e do direito canónico,
conservou-se apenas a destruição do pecado, em 2º lugar a opinião comum dos doutores
surge como filtro da Glosa e da Opinião de Bártolo, embora, quanto a esta, apenas se
tivessem em conta os autores que escreveram depois de Bártolo
Ordenações Filipinas – o problema das lacunas passa do livro II para o livro III,
tornando-se um mero problema processual e já não a propósito das relações entre
Estado e Igreja.

Época do Jusnaturalismo racionalista


A lei da Boa Razão consagrava duas fontes de direito subsidiário:
1º O direito romano, sempre que for conforme à Boa Razão – os estatutos da
universidade vieram dizer que o direito romano é conforme à Boa Razão quando for
susceptível de uso moderno, o que se reconduzia ao que era aceite pela Escola do usus
modernus pandectarum;
2º As leis das nações cristãs iluminadas e polidas para matérias políticas e económicas,
mercantis e marítimas.

Época do Individualismo

Correntes do Pensamento Jurídico europeu da Época


Trata-se das linhas e orientações europeias situadas no horizonte da especulação
jusfilosófica ou directamente respeitantes à dogmática do direito. Inserem-se num
processo evolutivo marcado pela reacção ao jusnaturalismo de sentido teológico.
- O positivismo jurídico, a Escola da Exegese
Recortamo-nos ao positivismo jurídico do séc. XIX. Os seus dogmas afiguram-se muito
precisos: o direito identifica-se com a lei, a lei materializa ou positiva o ideal de
inspiração racionalista, a ordem jurídica constitui um todo acabado, a plenitude da
ordem jurídica atinge o momento definitivo num conjunto de códigos modernos
sistemáticos e completos.
A identidade da jurisdicidade com a legalidade conduziu à negação da importância do
costume como fonte de direito, inclusive no plano supletivo, a favor da analogia. Do
mesmo modo implicou a subalternização do papel da jurisprudência e da doutrina.
Expressão exacta no plano metodológico do positivismo jurídico era Escola da Exegese,
raiz francesa, que surge ligada ao movimento codificador, dominou a ciência do direito
na maioria dos países da Europa continental. Os autores desta corrente encaram a lei
como manifestação de vontade soberana. Dada a sua rigorosa imperatividade, devia-se
interpretá-la segundo um método lógico-gramatical.
- A Escola Histórica do Direito
A oposição ao direito natural clássico verificou-se também pelo caminho do
historicismo, negando-se ao mesmo tempo a validade do direito natural racionalista.
Esta orientação contrapõe ao racionalismo o carácter necessariamente histórico do
direito. Tal como a língua e as restantes expressões culturais, o jurídico resulta de uma
manifestação do espírito do povo. A Escola Histórica situa-se no contexto alemão do
começo do séc. XIX. O sistema jurídico então aí vigente era constituído por leis e
costumes germânicos, aplicando-se subsidiariamente o direito romano. Começou aí,
dentro da Escola Histórica, um paralelo dualismo de juristas, conforme o objecto do seu
estudo. Mas reconhecem-se em ambas as tendências traços fundamentais que conferem
unidade a toda a Escola Histórica. Proclama-se a ideia historicista da origem histórico-
cultural do direito no espírito do povo. Este é um postulado que se contrapõe à
existência de um qualquer direito natural permanente no espaço e no tempo. Foi a
vertente romanista da Escola Histórica, que revelou influência significativa no
pensamento jurídico europeu, projectando-se na Pandectística e na jurisprudência dos
conceitos.
- A Pandectística e a jurisprudência dos conceitos tem-se assinalado à Escola Histórica
uma incongruência, pois enquanto se afirma uma concepção de direito como produto do
povo, admite-se a existência de um direito independente dessa consciência colectiva. A
linha mais influente da Escola Histórica dedicou-se à elaboração de uma doutrina
moderna a partir do direito romano. Para preservar a coerência, entendia-se que isso
cabia no sentido amplo de consciência colectiva. É assim que a Escola Histórica chega à
formulação de um direito erudito e acaba na pandectística. O seu objectivo foi o de
reunir todo o universo jurídico de um novo positivismo que está longe do adoptado pelo
jusracionalismo. Procura-se edificar um sistema dogmático completo e fechado, onde se
encontraria resposta para todos os problemas jurídicos. Chega-se, por esta via, à
Jurisprudência dos Conceitos. A pandectística alemã defendia a aplicação de um método
sistemático de compreensão do direito bem distante da casuística romana, deduzindo as
soluções individuais dos princípios a que as mesmas são subsumíveis. Estavam criados
os pressupostos que levariam a uma progressiva acentuação conceptualista, mediante a
redução do método jurídico e operações de lógica formal. Nesse encadeamento de
espécies e subespécies de conceitos, a ciência do direito opera, ignorando a relevância
das valorações extra-jurídicas.
Dia 21 de Maio de 2008 História do Direito Português
Transformações no âmbito do direito privado
A vitória das ideias liberais que tão importantes reformas legislativas irá originar no
Direito Político e noutros ramos do Direito Público não introduziu em Portugal
reformas de vulto no domínio do Direito Privado antes do Código Civil de 1867. O
próprio código comercial de 1833 não apresenta nenhuma inovação profunda pois o seu
autor apenas compilou disposições dos códigos das nações cultas da Europa. Os quais já
eram direito subsidiário em matéria mercantil por força da lei da boa razão. Isto
significa que a fixação de novos rumos na evolução das nossas instituições jurídico-
privadas no período que vai dos começos do liberalismo até ao 1º Código Civil vai ser
obra fundamentalmente da actividade dos nossos jurisconsultos. Essa actividade
doutrinal vai expressar-se em 3 campos fundamentais:
1º Na fixação de novas regras de interpretação e integração de lacunas;
2º Na formação de novas interpretações de textos legislativos que se mantinham
plenamente em vigor com base nos critérios fixadas na legislação pombalina;
3º Na implantação ou defesa de iure constituendo de novas doutrinas em
contradição alerta com as ordenações a pretexto das regras destas terem caído em
desuso;
De iure constituendo o direito que deveria ser; a fazer; a ser feito de futuro
De iure constituto o direito que aí está
Novas regras de interpretação e integração de lacunas
Não houve nesta época ao contrário do que sucedeu na época anterior uma forte
disciplina filosófica para nortear o legislador na tarefa de reformar o direito privado e
menos a houve capaz de fixar novas regras de interpretação e fixação de lacunas. Os
juristas tiveram de contentar-se com as regras hermenêuticas que a época anterior tinha
formulado e toda a habilidade estava agora em saber dar um sentido novo aos seus
dispositivos adaptando-os a uma linha de pensamento muito diferente daquela presidira
à sua promulgação. A lei da boa razão, os estatutos pombalinos da Universidade e os
assentos da casa da suplicação da época jusnaturalista continuaram a ditar em plena
época liberal as normas relativas à interpretação das leis e à integração das lacunas.
Recta, Ratio e Usus Modernus continuavam a ser portanto as normas supremas a que os
juristas deviam submeter-se. Simplesmente essas expressões tinham perdido quase por
completo o seu antigo significado e eram utilizadas para defender pontos de vista novos.
A Boa Razão vestia agora o figurino do individualismo. O liberal e o uso moderno
deixava de ser o jusnaturalismo da Escola do Usus Modernus Pandectae para passar a
ser o abundante --------------- dos códigos individualistas. A licitude da utilização destes
códigos estrangeiros como subsidiário do nosso direito foi justificada de forma simplista
através do argumento de que se os estatutos da Universidade permitiam averiguar o uso
moderno das nações nos escritos dos seus juristas, por maioria de razão devem permitir
procurá-lo nas suas leis. Nenhuma importância se atribuía ao facto desse uso moderno
referido nos estatutos de 1772 ter um significado doutrinal e filosófico muito próprio
simbolizando o pensamento de uma escola jurisprudencial de que os códigos
individualistas se achavam por vezes muito distanciados.
Formação de novas interpretações de textos legislativos que se mantinham em vigor
com base nos critérios fixados na legislação pombalina. A pretexto de mera
interpretação e utilizando critérios para tal proclamados na legislação pombalina
conseguiram os nosso juristas introduzir inovações profundas no regime vigente.
Exemplos : No direito romano vigorava no âmbito do testamento o principio da
essencialidade da instituição de herdeiro, ou seja, o testamento tem de contar essa
instituição deserdando-se simultaneamente quem tivesse direito à herança. Sempre se
tinha considerado que essa velha regra romana estava consagrada nas ordenações por
exemplo: se A pai de B e C quer deixar a B a terça tem no testamento instituir
expressamente B como herdeiro e deserdar expressamente C. Entendia-se assim porque
num preceito das ordenações se recorria ao expediente de pressupor uma instituição
tácita de herdeiro para considerar válido num determinado caso concreto um testamento
sem instituição via herdeira. Se se sentir a necessidade de recorrer a este expediente
seria porque se desejou em princípio considerar essencial aquela instituição. Esta
interpretação caiu em desgraça como um jusnaturalismo e isso bastou para que os
juristas do inicio do liberalismo passassem a interpretarem às avessas a citada passagem
das ordenações. Como a norma era de interpretar as leis de acordo com a Boa razão e
esta condenava a essencialidade de instituição de herdeiro passou a entender-se que se
as ordenações aceitavam num caso concreto a validade do testamento sem instituição é
porque baniam a velha regra romana.

Algo de semelhante aconteceu com a regra também oriunda do direito romano de que
ninguém pode morrer em parte com testamento e em parte sem ele, isto é, se o testador
não deixar toda a herança aos herdeiros testamentários os herdeiros legítimos não
podem herdar o restante que vai reverter para os herdeiros testamentários.
As ordenações diziam que os soldados podiam contudo morrer em parte com testamento
e em parte sem ele.
Como esta era a reprodução fiel da doutrina romana que considerava o testamento
militar uma excepção à regra geral entendia-se que as ordenações acolhendo a excepção
também queriam acolher a regra.
Como porém essa regra romana foi condenada pelas doutrinas jusnaturalistas houve que
forjar aqui uma nova interpretação.
Passou a afirmar-se que o facto de as ordenações terem adoptado a excepção não
significa que tivessem querido acolher a própria regra pois para isso seria necessário
que o tivessem dito expressamente e não disseram.

Implantação ou defesa de iure constituendo de novas doutrinas em contradição com as


ordenações a pretexto de estas terem caído em desuso:
Já não se trata de interpretar de maneira diferente os textos legais mas de defender
doutrinas que os contrariam expressamente.
Esta faceta da actividade dos jurisconsultos da época divide-se em duas situações:
1ª – Em certos casos salta-se por cima dos textos legais considerando-os caducos e
implantando-se soluções opostas.
Ex: O preceito das ordenações que exigia boa fé na prescrição extintiva
fundamentando-se na razão do pecado foi considerado antiquado com base na boa razão
e sem execução na parte que exigia boa fé do devedor. Esta nova doutrina acabou por
prevalecer até ser consagrada no Código Civil de 1867.
2ª – Noutros casos os juristas sem se aventurarem a considerar caducos os preceitos das
ordenações criticam-nos defendendo de iure constituendo a necessidade da sua
modificação.
Ex: a eficácia meramente obrigacional do contrato de compra e venda
consagrada no direito romano e nas ordenações. Significa isto que a transferência da
propriedade não se operava por efeito do contrato mas pela entrega da coisa que àquele
acrescia.
Como esta solução das ordenações foi expressamente confirmada por um alvará de
1810 não ousaram os nossos juristas defender a sua caducidade mas não cessavam de
acentuar a maior justiça do código civil francês ao prescrever que o direito de
propriedade se transferia por mero efeito do contrato de compra e venda o que veio a ser
consagrado pelo Código Civil de 1867.
A velha doutrina romana seguida pelas ordenações de que o comprador do prédio
arrendado não seria obrigado a manter o arrendamento podendo despejar o locatário –
emptio tollit locatum –. Ninguém ousava considerar em desuso tal doutrina mas a
opinião dominante era a de que devia ser substituída de iure constituendo pela doutrina
oposta já perfilhada pelo código napoleónico.
O código de Seabra veio a seguir o mesmo caminho – emptio non tollit locatum –.
Dia 28 de Maio de 2008
Iniciou-se o nosso movimento de codificação pelo Código Comercial de 1833 que ficou
a dever-se a Ferreira Borges. Para a sua elaboração fizeram-se largas incursões no
Direito Comparado utilizando-se especialmente o código comercial francês o projecto
de Código Comercial italiano e o Código Comercial espanhol. Representou um
considerável avanço no direito mercantil português mas a obra esteve longe de ser
satisfatória. Um excessivo apego à legislação anterior levou a que se esquecessem
soluções evoluídas do Direito Comparado como em matéria de sociedades comerciais
tinha também o defeito de exagerar nas definições e qualificações e de ter misturado
normas de direito comercial substantivo com regras processuais e até de Direito Civil. A
breve trecho existia um significativo corpo de legislação avulsa. Tudo isto levou a que
se promulgasse em 1888 um novo Código Comercial o chamado: Código Veiga Beirão,
ainda está em vigor mas profundamente alterado e completado por numerosíssimas
legislação avulsa como por exemplo o código das sociedades comerciais.

O movimento da codificação ( No direito Civil)


O nosso 1º C.Civil assentou no projecto de António Luis de Seabra e foi aprovado em 1
de Julho de 1867. Os fundamentos teóricos do diploma encontram-se e nas concepções
sobre o Direito e a sociedade ligadas ao jusnaturalismo racionalista e ao individualismo
liberal. Reconheça-se que este ideal liberalista foi recebido no Código com prudente
moderação principalmente quando se equacionava interesses não puramente
económicos como os de natureza familiar. Consagra-se ao lado do casamento católico o
casamento civil num corte com a tradição que deixava a disciplina do matrimónio para
o Direito canónico. O código satisfaz as exigências de justiça praticabilidade e certeza
que lhe foram ditadas, mas teve consideráveis defeitos. Foi obra de um homem só numa
altura em que o Direito Civil já era demasiado amplo para isso. Em determinadas
matérias como a responsabilidade civil é apontado o seu excesso de originalidade daí
resultando disciplinas pouco felizes ou decurso dos anos fez com que fossem sendo
cada vez mais as figuras jurídicas que não encontravam nele reconhecimento como por
exemplo a propriedade horizontal e o abuso do direito a respeito de muitas áreas como o
direito da família, o direito do trabalho e as restrições ao Direito de propriedade
verificou-se uma quebra de unidade entre o código e leis posteriores especialmente à
medida que se ia entrando na época do direito social com as suas novas preocupações
impunha-se uma completa uma completa revisão foi realizada pelo Código Civil de
1966 ainda hoje vigente.
Evolução do costume
O código de Seabra remeteu definitivamente o costume para o quadro das fontes de
direito mediatos ou seja, valendo apenas na medida em que o legislador o admitisse.
Assim resulta do artigo 9º que afasta a inobservância da lei com fundamento em desuso
isto é, costume contrário. Resulta também do artigo 16 onde não se consagra o direito
consuetudinário como fonte subsidiária. Em conclusão, afasta-se a vigência autónoma
do costume contra legem e preter legem ( para alem da lei ) ou integrativo.

Nova perspectiva do direito subsidiário


O artigo 16 do Código de Seabra determinou que face a uma lacuna devia recorrer-se
primariamente à Analogia, quer dizer à disciplina estabelecida para uma situação
semelhante quando a razão substancial de decidir seja a mesma no caso omisso e no
caso previsto na fonte de direito vigente. Se não se encontrasse norma susceptível de
aplicação da lógica o legislador remetia para os princípios de direito natural conforme
as circunstâncias de caso omisso. Estes princípios segundo as doutrinas positivistas
correspondiam aos princípios gerais de direito ou seja, da própria ordem jurídica tal
como estava legislado. Já para as doutrinas jusnaturalistas visava-se algo de
metajurídico situado para alem do direito positivo prevaleceu posteriormente uma 3ª
interpretação a de que a referência aos princípios de direito natural conforme as
circunstâncias do prazo equivalia a confiar ao juiz a tarefa de preenchimento de lacunas
tendo em conta a solução que presumisse adoptada pelo legislador se tivesse previsto as
circunstâncias do caso concreto. Deixou de existir pois, um direito subsidiário nos
termos tradicionais que consagrava o recurso directo a um direito subsidiário
estrangeiro. Tudo se passa agora dentro do sistema jurídico português.

As transformações no âmbito do Direito Político


O constitucionalismo monárquico
O sistema liberal português inaugurou-se com a revolução de Agosto de 1820. Já em
1808 fora apresentada uma suplica de Constituição onde se pedia a Napoleão a outorga
de uma Constituição que vigorasse em Portugal.
Em finais de 1820 completou-se um processo eleitoral através do qual os cidadãos
maiores de 25 anos com emprego oficio ou ocupação útil escolheram eleitores de
comarca que por sua vez elegeram os deputados às cortes constituintes esta Assembleia
Constituinte aprovará em 1822 a nossa 1ª Constituição. São consagrados os princípios
ligados aos ideais liberais da época.
Princípio da soberania nacional, princípio democrático, princípio representativo,
princípio da separação de poderes, princípio da igualdade jurídica e o respeito pelos
direitos pessoais do cidadão como a liberdade, a segurança e a propriedade. O princípio
da igualdade levou à supressão de alguns privilégios consagra-se contudo o sufrágio
censitário, ou seja, baseado na capacidade económica, o que se manterá nas várias
constituições monárquicas. A revolta absolutista da Vila Francada colocará termo À
vigência da Constituição de 1822. Em 1826 entra em vigor a carta constitucional
outorgada por D.Pedro IV e que reflecte um liberalismo de tendência conservadora a
carta estabeleceu um sistema bicameralista (parlamento com duas câmaras) para as
cortes gerais, sendo a câmara dos pares composta por membros hereditários e vitalícios
nomeados pelo rei sem número fixo a que acresciam pares por direito próprio em
virtude do nascimento ou do cargo. A 2ª câmara designada: Câmara dos deputados
passa a ser eleita por sufrágio indirecto e censitário. Nas eleições primárias elegiam-se
os eleitores de província que por sua vez elegiam os deputados. O poder legislativo
continua a pertencer às cortes mas a Carta Constitucional atribui ao rei um poder de
veto efectivo com efeitos absolutos designado sanção real. Esta alteração relativamente
ao estatuído na Constituição de 1822 é uma das consequências da adopção pela Carta
Constitucional da teoria dos 4 poderes ( legislativo, executivo, judicial e moderador). O
poder moderador neutro pertencia ao rei enquanto chefe supremo da nação. O rei no
exercício do seu poder moderador passa a poder dissolver a câmara dos deputados. A
iniciativa legislativa pertencia indistintamente às duas câmaras ou ainda que
directamente ao poder executivo a Carta Constitucional terminaria a sua 1º vigência no
reinado absolutista de D.Miguel entre 1828 e 1834. No final do qual seria reposta.
Voltaria a ser abolida com o movimento setembrista de 1836 mais radical. Então entra
de novo em vigor a Constituição de 1822 mas logo em Novembro são eleitos por
sufrágio directo novas cortes constituintes de onde nascerá a Constituição de 1838
jurada por D.Maria II mantém-se o sistema bicameralista mas a câmara dos senadores
passa a ser electiva e temporária. A iniciativa legislativa passa a pertencer apenas às
câmaras. A vigência da Constituição de 1838 terminará em 1842 com o golpe de Costa
Cabral sendo reposta pela 3ª vez a Carta Constitucional que vigorará até ao fim da
monarquia embora alterada por vários actos adicionais.
Constitucionalismo Republicano
Uma vez implantada a Republica em 5 de Outubro de 1910 foi eleita uma Assembleia
Nacional Constituinte tendo apenas direito a voto os chefes de família e os cidadãos
alfabetizados maiores de 21 anos. A nova constituição acabaria por ser aprovada em
1911 seguindo os ideais liberais consagrou-se o sufrágio directo na eleição parlamento
bem como a soberania da Nação e a tripartição de poderes. É afastado o sufrágio
censitário mas não se estabeleceu o sufrágio Universal pois desde logo estavam
impedidos de votar as mulheres e os analfabetos. O parlamento designado por congresso
da República era composto por 2 câmaras: A câmara dos deputados e o Senado. O
congresso elegia o Presidente da República que com a revisão Constitucional de 1919
passou a poder dissolver o 1º. O poder legislativo pertencia exclusivamente ao
parlamento sem direito de veto do Presidente. Este podia ainda ser destituído pelo
Congresso.
Resumo da Evolução do Costume
Período da individualização do Direito Português
O costume é entendido num sentido amplo como todas as fontes de direito tradicionais
que não tenham carácter legislativo, é a principal fonte de direito.
Época do renascimento do direito romano e da renovação do direito canónico
Inicia-se a decadência do costume, o costume passa a ser considerado expressão da
vontade tácita do monarca pois se não foi revogado pela lei é porque tacitamente o
monarca o aceita.
Na época das ordenações
O costume tinha validade quer fosse contra a lei segundo a lei ou para alem da lei.
Requisitos da validade do costume:
1º deixa ter, pelo menos 10 anos ou 2º determinada doutrina do direito Canónico 40
anos se fosse contrário à lei.
2º Era necessário que se tivesse manifestado através de pelo menos dois actos
designadamente de natureza judicial. As ordenações Manuelinas estabelecerão que os
costumes locais têm a mesma validade dos costumes gerais mas vão restringir a
observância dos costumes aos casos em que a doutrina romanística o admitisse.
Na época do jusnaturalismo racionalista
Segundo a lei da Boa Razão para que o costume fosse fonte de direito tinha de obedecer
a 3 requisitos:
1º Ser conforme à Boa Razão
2ºNão podia ser contrário à lei
3ºEra necessário que tivesse cem anos de existência
Época do Individualismo
Com o Código Civil de 1867 o costume torna-se numa fonte mediata ou indirecta isto é,
sem força própria valendo apenas na medida em que o legislador o admitisse. O artigo
9º afastava a inobservância da lei com fundamento em desuso isto é, costume contrário.
O artigo 16 tratava do direito subsidiário mas nele não inclui o costume. Da conjugação
destas duas normas resulta a rejeição da vigência autónoma do costume contrário à lei e
do costume integrativo ou praeter legem.
Resumo da evolução do direito subsidiário
Época do renascimento do direito romano e do renascimento do direito canónico
A regulamentação das lacunas foi deixada ao critério dos juristas e dos tribunais.
Recorria-se em larga escala ao Direito Romano ao direito canónico e a obras jurídicas
castelhanas de conteúdo romano-canónico como por exemplo as “Siete Partidas”.
Época das Ordenações
Ordenações Afonsinas
Na falta de direito pátrio aplicava-se em 1º lugar o direito romano e o direito canónico.
O direito romano era o aplicável em matérias temporais com excepção daquelas em que
as suas soluções conduzissem a pecado. Já o direito canónico aplicava-se Às questões
espirituais ou ás temporais em que o direito romano conduzisse a pecado. Em 2º Lugar
aplicava-se a bolsa de Acúrcio e se esta não oferecesse solução a opinião de Bartolo.
Em 3º lugar aplicavam-se as resoluções do monarca às quais também se devia recorrer
no caso de não ser matéria de pecado e simultaneamente o direito romano não
oferecesse solução e as soluções do direito canónico e de bolsa e da opinião de Bartolo
fossem opostas.
Alterações com as ordenações Manuelinas
1ª alteração: o critério de divisão dos campos de aplicação do direito romano e do
direito canónico passa a reger-se apenas pelo critério do pecado.
2ª alteração: a opinião comum dos doutores surge como o filtro da Glosa e da opinião
de Bartolo embora quanto ao último apenas se tivessem em conta os autores que
tivessem escrito depois dele.
Alterações com as ordenações Filipinas
O problema das lacunas passa do livro 2º para o livro 3º tornando-se um mero problema
processual e já não a propósito das relações entre Estado e igreja.
Na Época do jusnaturalismo Racionalista
A lei da Boa Razão consagrava duas fontes subsidiárias.
1ª O direito romano sempre que for conforme à Boa razão. Os estatutos Pombalinos da
Universidade vieram dizer que o Direito Romano é conforme à Boa Razão quando for
susceptível de Uso Moderno o que se reconduzia ao que era aceite nas obras dos autores
do Usus Modernus Pandectae.
2ª As leis das nações cristãs iluminadas e polidas para matérias políticas económicas
mercantis e marítimas.
Época Individualismo
No Código de Seabra a integração das lacunas é deslocada para o âmbito exclusivo do
direito interno segundo o artigo 16 perante uma lacuna recorrer-se-ia em 1º Lugar à
analogia. Existe analogia sempre que a razão substancial de decidir seja a mesma no
caso omisso e num caso previsto numa fonte do direito vigente, se mesmo assim não se
colmatar a lacuna recorrer-se aos princípios de direito natural conforme as
circunstâncias do caso. Surgiram 3 interpretações para este conceito, segundo as
doutrinas positivistas ele corresponde aos princípios gerais de direito ou seja da própria
ordem jurídica tal como estava legislada, conforme impunha o dogma da plenitude do
sistema jurídico. Segundo a interpretação das teorias jusnaturalistas visava-se algo de
metajurídico para além do direito positivo. Acabou por prevalecer uma 3ª opinião que
entendia que a referência aos princípios do direito natural conforme as circunstâncias do
caso equivalia a confiar ao juiz a tarefa do preenchimento das lacunas tendo em conta a
solução que presumisse adoptada pelo legislador se este tivesse previsto o caso omisso.
Esta solução acabou por ser consagrada no artigo 10º/3 do actual código Civil.

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