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O Japão sofre, mas ensina

Não sei se você se lembra de um anúncio já meio antigo que dizia que "nossos japoneses são
melhores do que os outros"? Era de uma multinacional japonesa e tinha uma dupla
mensagem: exaltava o avanço tecnológico de que os japoneses tanto se orgulham e a
criatividade tapuia, capaz de tornar ainda melhor o que os outros já fazem bem.
A tragédia em curso no Japão me fez pensar em uma inversão desse slogan: dá a sensação de
que "os japoneses deles" [do próprio Japão] são melhores do que somos, pelo menos em
matéria de prevenção e enfrentamento de catástrofes.
Sheila Smith, pesquisadora do Council on Foreign Relations (EUA) para o Japão, chamava a
atenção, na segunda-feira, para a "calma e a dignidade" com que tanto a população como o
governo reagiram a um desastre "cuja intensidade não pode ser subestimada", conforme ela
própria ressaltava.
De fato, chamo a atenção do leitor para uma foto eloquente, publicada na segunda-feira, na
página A12 da "Folha": uma fila de pessoas serpenteava em busca de água em uma escola de
Sendai, a cidade mais atingida, seguindo marcas de giz traçadas no chão. O incrível é que
ninguém furava a fila, por mais improvisados que tivessem sido os riscos.
No jornal "El País" desta terça-feira, também de Sendai, os enviados especiais Georgina
Higueras e José Reinoso espantavam-se com o fato "de que mal houve saques, e nenhum
comerciante ou transportador aumentou os preços".
Nesta mesma Folha.com, o brasileiro Ricardo Uehara, há 16 anos no Japão, confirmava que
"as pessoas esperam em filas e não ocorrem saques. Nós latinos, sempre nos queixamos de
que os japoneses são frios, mas hoje compreendo que esta tranquilidade é muito útil nestes
momentos."
Mais: segundo a Tokyo Electric Power, responsável pelo abastecimento energético, disse que
os "apagões" que chegaram a ser previstos estão por ora descartados porque o público
espontaneamente passou a poupar energia o suficiente.
Preciso lembrar que, no Brasil, após tragédias, mesmo de proporções infinitamente menores,
os saques são comuns (em outros países também, é bom que se diga)? Preciso lembrar que,
no Brasil, há "apagões" mesmo sem terremotos ou tsunamis?
À reação pós-catástrofe some-se a prevenção. Sheila Smith, a especialista em Japão, do CFR,
lembra que a população japonesa está entre as mais bem treinadas e mais bem informadas
do mundo sobre a eventualidade de fenômenos naturais.
Depois do terremoto em Kobe, faz 16 anos, a prevenção avançou ainda mais, na medida em
que os currículos escolares passaram a incluir informações e treinamento para lidar com
situações como a que aconteceu a partir de sexta-feira.
Além disso, os japoneses desenvolveram os chamados "edifícios inteligentes", capazes de
resistir a choques como os de um terremoto violento. É bom notar que os grandes estragos
foram provocados muito mais pelo tsunami do que pelo terremoto em si.
Prevenção contra tsunamis da força do que atingiu o Japão é ainda uma arte em
desenvolvimento. Não funcionou na sexta-feira e talvez seja de fato impossível erguer um
muro preventivo capaz de barrar ondas tão altas. Só mesmo afastando a população das
costas o máximo possível, o que não é trivial, se se considerar que as cidades vão crescendo
sempre, por muito baixo que seja o índice de natalidade.
O curioso é que, em meio aos elogios que se leem em toda parte a respeito do Japão, surja
um político relevante para criticar o espírito de seus concidadãos. É o governador de Tóquio,
Shintaro Ishihara, para quem o desastre foi "uma punição dos céus", porque os japoneses se
tornaram "gananciosos".
Pode ser, mas o fato é que os danos do terremoto/tsunami, mesmo que as mortes passem de
10 mil, como se começa a supor, serão infinitamente inferiores às 230 mil do grande tsunami
de 2004, nas costas da Ásia.
Parece, portanto, que os "japoneses deles" são realmente dignos de estudo, especialmente
para um país como o Brasil que lida tão precariamente com catástrofes de dimensões
comparativamente bem mais modestas.

Clóvis Rossi – Repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha de São Paulo

No trabalho, nossas ações costumam ser movidas ora pela força de uma obrigação, ora pelo senso do dever, ora pelo
sentimento da vontade. Mas as ações mais produtivas são aquelas em que esses três impulsos encadeiam-se numa escala
ascensional: o imperativo mecânico de se obrigar a fazer alça-se ao discernimento de um dever fazer, e este ganhará pleno
impulso quando resultar de um obstinado querer. Qualquer que seja nossa função, a realização plena do nosso trabalho
depende, em grande parte, desse encadeamento de impulsos. Por isso, a ação mais eficaz e objetiva jamais dispensa o
concurso da vontade íntima.
(Nicolau Vergueiro, inédito)

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