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Pode-se afirmar que os saduceus e os essénios, especialmente

os de Qumran, tinham um cânon das Escrituras diferente do


resto dos judeus?

Não, não pode afirmar-se com absoluta certeza. Em particular, não está claro se os
qumranitas incluíam algum outro texto entre os considerados "inspirados" além dos
pertencentes ao cânon hebreu actual. [1]

Sobre o tema em geral, as seguintes observações são pertinentes:

"A investigação nas últimas décadas pôs em dúvida posições mantidas há muito
tempo relacionadas com a história da formação do cânon bíblico hebreu e a
existência de um cânon grego alexandrino. Até há um par de décadas costumava-
se distinguir três etapas na história do cânon do Antigo Testamento. Para isso
tomava-se como ponto de referência o cisma samaritano, que supostamente tinha
tido lugar no século V a.C. Dizia-se que o Pentateuco adquiriu reconhecimento
canónico antes do cisma dos samaritanos, dado que estes reconhecem valor
canónico a esta colecção de cinco livros. A colecção de livros proféticos, que não foi
reconhecida pelos samaritanos, teve de formar-se e de adquirir estatuto canónico
posteriormente ao cisma, por volta do século III a.C. Por fim a colecção de escritos
constituiu-se e entrou a formar parte do cânon numa época muito tardia. O
processo final terminou em finais do século I d.C., com ocasião do chamado Sínodo
de Yabneh [Yamnia], em que ficou definitivamente fechado o cânon da Bíblia
hebraica.

Por outro lado, dizia-se também que, junto a este «cânon palestino», existiu
também outro «cânon alexandrino», próprio do judaísmo da diáspora. Estava
representado por uma colecção de livros que aparece recolhida na versão grega dos
LXX. O cristianismo fez seu esse cânon antes de os rabinos de Yabneh terem
fechado definitivamente o cânon hebreu em finais do século I. d.C., deixando
«fora» os livros «exteriores» ou apócrifos, alguns dos quais figuravam na Bíblia
grega dos cristãos.

Os descobrimentos do Mar Morto e outra série de estudos deitaram por terra esta
hipótese clássica, que pode encontrar-se ainda em muitos livros. Hoje reconhece-se
que o chamado cisma samaritano ocorreu seguramente em finais do século II a.C.,
ou seja, quando a colecção de livros proféticos estava já formada desde há muito
tempo. A teoria do cânon judeu alexandrino caiu por terra ao não existir
prova alguma da sua existência.
...

Uma corrente importante da investigação actual tende a considerar que o cânon


hebreu se formou na época macabeia, em meados do século II a.C. Esta
explicação deixa, no entanto, no ar a questão do que mais tarde veio a ser o cânon
cristão do Antigo Testamento. Se já não cabe dizer que os cristãos herdaram da
diáspora judaica uma colecção mais ampla que a da Bíblia hebraica, ter-se-á que
procurar uma explicação que justifique o facto de os cristãos não se sentirem
obrigados a ater-se ao estrito cânon hebreu. Este facto pode ter antecedentes na
comunidade essénia de Qumran. Seguramente os essénios de Qumran não
tinham consciência nem intenção alguma de reabrir um cânon
supostamente já fechado. No entanto, dá a impressão de que reconheciam a
alguns escritos, como pode ser o caso do livro dos Jubileus, um carácter sagrado
comparável ao de outros livros incluídos no cânon."
(Florentino García Martínez e Julio Trebolle Barrera, Los hombres de Qumrán.
Literatura, estructura social y concepciones religiosas. Madrid: Trotta, 1993, p.
132-133; negrito acrescentado)

Ofereço agora as seguintes explicações de um dos mais destacados eruditos


evangélicos contemporâneos, F.F. Bruce [2]. Depois de examinar a evidência de
Qumran, Bruce diz:

"É provável, de facto, que no começo da era cristã os essénios (incluindo a


comunidade de Qumran) estivessem em substancial acordo com os
fariseus e os saduceus sobre os limites da Escritura hebraica. Podem ter
havido algumas diferenças de opinião e prática em relação a um ou dois dos
'Escritos', mas as discordâncias entre partidos lembradas na tradição judaica têm
muito pouco que ver com os limites do cânon. A ideia de que os saduceus (como os
samaritanos) reconheciam somente o Pentateuco como sagrada escritura baseia-
se num mal-entendido: quando Josefo, por exemplo, diz que os saduceus «não
admitem nenhuma observância fora das leis» [41], não quer dizer o Pentateuco
com exclusão dos Profetas e dos Escritos mas a lei escrita (do Pentateuco) com
exclusão da lei oral (a interpretação e aplicação farisaica da lei escrita, a qual,
como a própria lei escrita, se defendia em teoria ter sido recebida e transmitida por
Moisés) [42]. Seria compreensível que os saduceus não aceitassem Daniel, o qual
contém a afirmação mais explícita sobre a esperança da ressurreição em todo o
Antigo Testamento [43]." [3]

Notas

[41] Josefo, Antiguidades, 18.16; o seu significado é esclarecido em Antiguidades


13.297, onde se diz que os saduceus 'sustentam que só as leis escritas devem ser
tidas por válidas, mas que aquelas transmitidas por tradição dos pais não
necessitam ser observadas. Foi provavelmente uma interpretação errada de Josefo,
directa ou indirectamente, o que levou Orígenes (Contra Celso, 1.49) e Jerónimo
(Comentário sobre Mateus, sobre 22:31s) a dizer que os saduceus aceitavam como
escritura os livros de Moisés apenas.

[42] Esta lei oral é a 'tradição dos anciãos' mencionada em Marcos 7:5.

[43] Daniel 12:2. Quando Jesus apelou à Escritura na sua refutação da negação da
ressurreição pelos saduceus, citou Êxodo 3:6, baseando o seu argumento no
carácter de Deus (Marcos 12:26s).

(F.F. Bruce, The Canon of Scripture. Downers Grove: InterVarsity Press, 1988, p.
40-41; negrito acrescentado).

Em conclusão, não foi demonstrado que os saduceus e os essénios tivessem um


cânon particular.

Por outro lado, autores modernos indicam que provavelmente o cânon ficou
estabelecido consensualmente na época dos macabeus, ou seja, na segunda
metade do século II a.C. A partir daí, houve ocasionalmente discussões de se havia
que excluir algum outro livro, nunca de incluir algum até onde sabemos.

De modo que até onde pode emitir-se um juízo histórico cabe aceitar que no século
I existia substancial acordo em todo o judaísmo em relação à lista de livros
considerados sagrados.
Notas

[1] Há quem diga que os homens de Qumran rejeitavam o livro de Ester, e


aceitavam Jubileus. Mas a evidência de que os qumranitas «rejeitavam» o livro de
Ester (que por outro lado sempre andou próximo da margem do cânon entre judeus
e cristãos) é basicamente negativa: não se encontraram fragmentos deste livro
entre os manuscritos do Mar Morto. Mas não há nenhuma declaração explícita a tal
respeito.

Por outro lado, há evidência positiva de que os qumranitas consideravam os livros


da Bíblia hebraica como inspirados.

Além de existir manuscritos completos ou fragmentários de todos eles excepto


Ester, muitos deles (das três divisões do Tanach) são citados como «assim foi
escrito». A parte mais citada é o Pentateuco, seguido pelos Profetas e pelos
Escritos, nessa ordem.

Num dos rolos, 4QMMT, menciona-se uma divisão tripartida como a que já se
encontra em Jesus ben Sirá (Eclesiástico), Josefo, e o Novo Testamento: «no livro
de Moisés, nas palavras dos Profetas, e em David».

Os homens de Qumran também escreveram comentários (pesharim) sobre diversos


livros do Tanach, como por exemplo Isaías, Salmos, Oseias, Habacuque; mas não
há vestígios de tais comentários a livros apócrifos.

Finalmente, é verdade que os qumranitas tiveram em grande estima livros pseudo-


epigráficos como Jubileus, 1 Enoc e o Rolo do Templo; mas não é absolutamente
claro que os tivessem ao mesmo nível que os livros canónicos. Seja como for, estes
livros não figuram nem no cânon palestino nem no católico.

[2] Outros autores de dizem mais ou menos o mesmo que Bruce sobre os saduceus
são:

The Ecole Initiative (http://ecole.evansville.edu/articles/sadducees.html)

Nas suas descrições das três filosofias Josefo contrasta os saduceus com os fariseus
e os essénios ... Nota também que ... aceitam somente as leis escritas em
contraste com as tradições dos fariseus.

James F. Driscoll, Sadducees (The Catholic Encyclopedia, vol. 13)

Eles rejeitavam igualmente as tradições orais que os fariseus mantinham e


enfatizavam como um suplemento divinamente ordenado para a lei escrita.

W.J. Moulder, Sadducees. Em Geoffrey W. Bromiley (Ed.), International Standard


Bible Encyclopedia, Rev. Ed. Grand Rapids: W.B. Eerdmans, 1988; 4:279; negrito
acrescentado.

Josefo indicou que os saduceus não concediam autoridade vinculante à lei oral
porque «não está registada nas leis de Moisés» (Ant. XIII, 10:6 [297]). Os fariseus,
em contraste, afirmavam que as ...«tradições dos anciãos» remontavam até ao
próprio Moisés e eram portanto obrigatórias. Até que ponto a rejeição saduceia da
tradição oral se estendia até a negação do status canónico dos Profetas e Escritos
veterotestamentários (como afirmavam vários Padres; por exemplo Hipólito, Ref.
IX,29; Orígenes Contra Celso 1,49; Jerónimo In Matt 22:31s...) é outro assunto, no
entanto, já que durante o período intertestamentário estes escritos eram
considerados como Escrituras por todos os judeus. Já que nem Josefo nem o
NT dizem nada sobre os saduceus rejeitarem estas porções da Escritura, a maior
parte dos eruditos modernos crê que os Padres estavam num erro.

R. Le Déaut, Los saduceos. Em Augustin George e Pierre Grelot (Dir), Introducción


Crítica al Nuevo Testamento. Trad. J. Cabanes y M. Villanueva. Barcelona: Herder,
1983 1:159

A sua atitude fundamental é uma fidelidade ao sentido literal da escritura, a


manutenção da Sola Scriptura, perante as tradições e a lei oral dos fariseus ...
Os saduceus tinham as suas tradições e a sua halakha, que defendiam tenazmente;
mas nunca lhes deram a mesma categoria que a lei escrita.

Emil Schürer, Historia del pueblo judío en tiempos de Jesús, 175 a.C.-135 d.C., Ed.
Rev. Por Geza Vermes, Fergus Millar e Matthew Black. Trad. J. Valiente Malla.
Madrid: Cristiandad, 1985; 1:530-531.

A opinião de numerosos Padres da Igreja de que os saduceus reconheciam


unicamente o Pentateuco e rejeitavam os Profetas não conta com apoio algum em
Josefo e, por conseguinte, é considerada errónea pela maior parte dos
investigadores modernos. [25].

Nota 25. Cf. Le Moyne, op. cit., 358-359; é possível que tanto os fariseus como os
saduceus estimaram que os profetas e os escritos tinham menor autoridade que a
Torá ...

[3] Como os Saduceus podiam aceitar a canonicidade do livro de Daniel se


negavam a ressurreição que está claramente expressa em Daniel? Não é ilógico?

Não, não é absolutamente ilógico. É bem sabido que na história da interpretação


bíblica diversos grupos ignoraram ou reinterpretaram porções que não se
enquadravam com as suas ideias. Um exemplo manifesto é o Targum de Isaías 53,
um texto messiânico que é reinterpretado ou ignorado pelo judaísmo tradicional até
hoje. É pois possível que o texto de Daniel 12:1-2 fosse tratado de igual forma
pelos saduceus.

Não sabemos muito acerca dos saduceus, mas o pouco que sabemos indica que
aceitavam as Escrituras mas rejeitavam as tradições orais, pelo menos as dos
fariseus, e se negavam a pô-las como estes ao mesmo nível das Escrituras.

Existe, além disso, evidência de que no judaísmo sempre houve um «cânon dentro
do cânon»: a Torá sempre foi considerada suprema acima dos Profetas e dos
Escritos, ainda que estes dois últimos se considerassem também Escritura. Isto vê-
se ainda em certas regras talmúdicas, como por exemplo que é lícito vender um
rolo dos Profetas ou Escritos para comprar um rolo do Pentateuco, mas o inverso
não é permitido.

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