o debatesobreo analfabetismoganhou impulso no Brasil a partir dos
anosquarenta,quando Lourenço Filho e Clementi Mariani passarama par- ticipar de discussõespara a formulação do Projeto Principal da UNESCO, com vistasao o desenvolvimentodo setor educacionalpara a América Lati- na no pós-guerra.Tratava-sede um movimento dos paísesmembros que deveria redefinir o conceito de analfabeto,ampliando o sentido do termo para além do letramento. Das discussõesoriundas dessarelação,o Brasil organizou a Campanha de Alfabetização em 1947, cujo projeto deveria articular diferentessetoresda sociedadecivil na irradiaçãodo programa que deveria proposto para atingir três mil pessoasem todo o país!. Desseprocessofoi criado o Movimento de Educaçãode Basepelo Mi- nistério da Educaçãona gestãoClementi Mariani, sendoconveniadaa Igreja Católica para sera organizadorado projeto a partir de programasde educa- ção rural atravésdo rádio. Nesseprocesso,a Igreja estruturou num amplo sistema de monitores as formas organizativasde um reconhecimento da ~ realidadesocialdo aluno, com objetivos de estabelecerum sistemacomuni- cativo que garantisseeficáciaa açãoeducativa2. Naquele período um outro modelo educacionalfoi concebido e orga- nizado, visando uma nova forma de entendera relaçãoentre o educadore o educandoa partir dainteração e troca de conhecimentos,rompendo com a noção do educar como o treinamento técnico para o trabalho, difusão de valores morais e familiares ou mesmo num modelo homogeneizadore ur- bano do universo das elites.Tratava-sedo trabalho desenvolvidopor Paulo Freire, que propugnavaum processoeducacionallibertador, realizadopela incorporaçãodosvaloresculturaisda própria populaçãoe dos elementossig- nificativos do seuvivido paragarantir na incorporaçãoda linguagemescrita. Não se tratava, deste ponto de vista, de um processoiluminista que opusessecivilização/modernização,ao rural/popular, entendido como atra- so ou ignorância, maso reconhecimentode atributos e valoresculturais do modo de vida dos trabalhadores,camponeses,donas de casa,crianças e, todosaquelesque compõemo complexoquadro populacionaldo país.Freire, opondo-se à visão dual Quecompunha o pensamentotanto dos ceDalinos como de outros setoresda esquerda,entendia sera exclusãosociale cultural oriunda do modelo de desenvolvimentoeconômico e não o subdesenvolvi- mento que deveriaserenfrentado, destacandoo direito daspopulaçõesser- tanejase pobres à cultura letrada. De certo modo, o objetivo seria romper com os estereótiposda indolência do caipira como doente, fraco, miserável concebido por Monteiro Lobato, em obrascomo Urupês,CidadesMortas e mesmo em sua regeneraçãona obra Zé Brasil. Freire, em Pedagogiado Opri?nidoprocurava apresentarum conjunto de argumentossignificativos sobreos valoresculturais e a necessidadede se construir elosde ligaçãoidentitários, cuja positividade representariaa von- tade de potência, como a concebeuNietzsche.Esteselementossugeriam a necessidadede recuperaçãohistórica dos sujeitosculturais e sua incorpora- ção positiva no processode trabalho do educador/educando.Inúmeros fo- ram os contributos do pensamentofilosófico-pedagógiconestereconheci- mento. Na própria comissãoda UNESCO, Jean Piaget apresentavasuas reflexõessobre os vários momentos do processocognitivo das crianças, Dewei3 definia o sentido da liberdade e a pedagogiade JanuzKorjack4 era 10 estudadano sentido de se estruturar na educaçãoformal um sentido de justiça, de democracia,valorizaçãoda experiênciahistórica e autoconfiança. Esta efervescênciafez com que inúmeros debatesseestruturasseme as experiênciasdesenvolvidasrevolucionaram o sentido dos projetos, permi- tindo um amplo campo de disputassobreessaaçãoconsideradasubversiva pelas forças conservadorasnas décadasde 1960 e 1970, que preferiram reafirmar a exclusãoa correr o risco de verem libertados os milhares de jovens e adultos excluídosda cultura letrada. Da experiênciarememoradaficou um conjunto de valorese perspecti- vas que hoje fazem parte da formação de muitos educadores.Entretanto, seu manejo concreto no processoeducacionalainda não se tornou prática de trabalho, e destemodo a escolaformal ainda padecedesteestranhamento da cultura popular e, mesmoa historiografia,ainda não incorporou de modo efetivo o ponto de vista das camadaspopularesno processohistóric05. Deste modo a Suplência de Jovense Adultos, no Projeto realizado no Município de Diadema, procurou empreenderum esforço conjunto com os educadoresenvolvidos nestaparceria, um amplo processode investiga- ção identificando os valoresda população moradora na cidade, suasexpe- riências culturais, para recuperar através deste univ~rso reconhecido os elos de integração entre o letramento e o conhecimento pragmático da- queles que participariam do processoeducacional. É preciso destacarque havia já se desenvolvidopelo serviço de educa- ção em Diadema uma ampla valorizaçãodestametodologia participativa, de modo que nesteprojeto, aprofundamose sistematizamosos estudosteó- ricos na organizaçãodos programase dos materiais utilizados no processo de ensino aprendizagem.