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aula
03
Governo Federal Revisoras de Língua Portuguesa
Presidente da República Janaina Tomaz Capistrano
Luiz Inácio Lula da Silva Sandra Cristinne Xavier da Câmara
Diversidade química do ambiente / Ademir Oliveira da Silva, Otom Anselmo de Oliveira. – Natal, RN, :
EDUFRN, 2006.
292 p. : il
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da UFRN -
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Apresentação
V
ocê já sabe que a caracterização das espécies químicas como ácidas ou básicas
depende dos tipos de partículas (cátions, ânions ou elétrons) transferidas entre essas
espécies durante as reações químicas. Nessas reações, um aspecto importante é a
habilidade ou, para maior clareza, a força com que cada espécie química recebe ou doa tais
partículas, gerando produtos de maior estabilidade. É esse aspecto que começaremos a estudar,
analisando alguns fatores determinantes das interações entre os átomos ou íons constituintes
dessas espécies químicas.
Nesta aula, inicialmente, analisaremos a acidez dos hidretos binários puros e,
posteriormente, as forças de alguns ácidos bem conhecidos, a acidez dos íons metálicos e a
acidez ou basicidade dos óxidos binários.
Para expressar a acidez dos hidretos binários, serão usados parâmetros termodinâmicos,
enquanto para os três últimos (ácidos, íons metálicos, óxidos binários), serão utilizados
parâmetros relacionados a equilíbrios químicos verificados em meio aquoso. Outras formas
de expressão da acidez ou basicidade serão discutidas na aula 4 – Basicidade das aminas e
outras formas de expressão de acidez.
Objetivos
Ao término desta aula, se bem aproveitada, você estará apto a utilizar
alguns parâmetros relacionados às forças dos ácidos e das bases
puros ou em meio aquoso, além de compreender como certas forças
químicas atuam sobre a acidez ou basicidade das espécies químicas,
afetando as interações entre tais espécies.
P
ara se dimensionar com precisão a acidez ou a basicidade das espécies químicas,
seria necessário que se dispusesse de parâmetros que expressassem as interações
entre essas espécies sem influências do meio reacional ou, em alguns casos, de
fatores estruturais relativos a tais interações. Isso, porém, é praticamente impossível e, por
conveniência experimental, a maioria dos estudos sobre ácidos e bases é feita utilizando-se
dados obtidos de reações realizadas em solução.
Como conseqüência, para se compreender os mecanismos e as intensidades das reações
entre os ácidos e as bases, é importante que se possam estimar os efeitos causados pelos
solventes, ou, então, minimizá-los. Para isso, os químicos têm utilizado vários procedimentos,
entre os quais destacam-se os estudos termodinâmicos – que permitem quantificar os efeitos
da solvatação e calcular as entalpias de ligação ácido-base – e o uso de solventes apolares ou
pouco polares (pouco coordenantes), nos quais os tais efeitos são pequenos.
Outra possibilidade, que será a mais enfatizada nesta e na aula 4, é utilizar-se de
parâmetros relacionados às interações entre os solutos (ácidos ou bases) e o solvente
(a água, nos casos que serão estudados) como indicadores da acidez ou basicidade das
espécies químicas consideradas.
Para ilustrar como essas análises são feitas, será discutido como a acidez ou a basicidade
varia em alguns grupos de substâncias semelhantes, interagindo sob condições análogas.
+e− − ∆H
∆HI(BH)
l(H) ∆HI(BH)
−e− ∆H l(BH)
B(g) + H +(g)
B→ (g) B+(g);H ++
+
BH
(g) (g)
+ = −P A +
∆H
H→ → (g)BH +(g)
(g) BH
∆H = − ∆H
∆Hl(H)
I(H)
− ∆HA(BH) + ∆
∆I(BH)
l(BH)
∆ A(BH)
= entalpia de atomização;
∆ I (H)
= potencial de ionização do hidrogênio;
∆ I (BH)
= potencial de ionização do BH.
GeH3
– –2
AsH2 SeH
–
Br
–
GeH4 ≈ AsH3 < H2Se < HBr
1315
Ao mesmo tempo, verifica-se que, entre as bases conjugadas desses ácidos, o iodeto
–
(I ) é a que apresenta menor afinidade protônica. Portanto, é a que deve ser desprotonada
com mais facilidade e, pelos dados apresentados na Tabela 1, essa conclusão é confirmada,
podendo-se dizer que a basicidade dos haletos varia na seqüência:
– – – –
F > Cl > Br > I
ou que, de fato, a acidez dos haletos de hidrogênio cresce do flúor para o iodo.
Mesmo em presença de solventes, esses efeitos ainda são significativos, e os
experimentos mostram que, em solução aquosa, o HF se comporta como um ácido fraco,
enquanto os demais são ácidos fortes.
Os dados da Tabela 1 indicam, ainda, que a acidez dos hidretos dos ametais, com
relação às posições na tabela periódica, cresce da esquerda para a direita. Isso acontece
porque o número atômico aumenta ao longo de cada período, e, como conseqüência, as
cargas nucleares efetivas e as eletronegatividades também aumentam no mesmo sentido.
Outra explicação para o aumento da acidez em cada período pode ser deduzida
analisando-se a relação entre a carga do íon e o número de pares de elétrons isolados da
–
respectiva base conjugada. Assim é que o íon amideto (NH2 ) é uma base conjugada mais
–
forte do que o íon hidroxila (OH ), em virtude da relação entre a carga do íon e o número de
pares isolados no primeiro ser igual a 1/2, enquanto, no segundo é igual a 1/3. Ou seja: pode-
se considerar que, no amideto, a carga do íon fica mais concentrada sobre os dois pares
isolados do nível de valência do nitrogênio, enquanto, no íon hidroxila, carga semelhante se
distribui sobre os três pares isolados do nível de valência do oxigênio, estando, portanto,
mais dispersa e, conseqüentemente, atraindo o próton com menos intensidade.
Para consolidar alguns conceitos e se familiarizar com interpretações sobre a natureza da
acidez ou basicidade das espécies químicas, desenvolva as atividades apresentadas a seguir.
2 Explique por que o HBr é um ácido de Bronsted mais forte do que o HF.
– – – –
Explique por que entre os ânions HO , HS , HSe e HTe , o primeiro é o
3 de maior e o último é o de menor basicidade.
– – –
Por fim, explique por que a basicidade do CH3 , do SiH3 e do F varia
4 – –
na seqüência: CH3 > SiH3 > F .
–
V
ocê já sabe que uma mesma substância pode funcionar ora como ácido ora como
base, dependendo das espécies químicas com as quais esteja interagindo. A água,
por exemplo, pode receber um próton de uma molécula ou um íon ácido (como HCl,
+
CH3COOH ou NH4 ), funcionando como uma base, mas, também, pode doar um próton para
–
uma base (como NH3, Na2O ou CN ), funcionando como um ácido, sendo, portanto, uma
substância anfiprótica (ou anfótera).
Você sabe, também, que substâncias dessa natureza podem transferir prótons entre
suas próprias moléculas, conforme acontece na reação de auto-ionização da água, discutida
anteriormente, a qual pode ser expressa na forma:
[H3 O+ ][OH − ]
K=
[H2 O]2
–14
O valor de Kw é igual a 10 e, na água pura, as concentrações dos íons hidroxiônio e
+ –
hidroxilo (H3O e HO ) produzidos pela auto-ionização da água, são iguais entre si, portanto,
–7 –1
iguais a 10 mol.L .
Assim, nas soluções aquosas, quando se adiciona um ácido, a concentração de H3O+
–
aumenta, e, quando se adiciona uma base, a concentração OH aumenta. Porém, nas duas
situações, o produto das concentrações deve permanecer constante, mostrando que, quando a
+ –
concentração de um dos íons (H3O ou OH ) aumenta, a concentração do outro deve diminuir na
mesma proporção, assumindo valores que variam numa faixa de ordem de grandeza bastante
elevada. Então, para facilitar a expressão da acidez (ou basicidade) das soluções aquosas,
seria conveniente que se dispusesse de parâmetros numéricos menos complexos do que as
concentrações em molaridade. Isso foi conseguido em 1909, por Sorensen, ao criar o pH
(também conhecido como potencial hidrogênio iônico), que é definido como o logaritmo
+
negativo da concentração de íons H3O , e é expresso, portanto, pela equação:
pH = −log[H3 O+ ]
Os valores do pH variam, apenas, entre 0 e 14, a partir dos quais pode-se construir
uma escala numérica muito mais simples do que seria se a acidez fosse expressa pelas
molaridades do H3O+ nas soluções.
Para ilustrar tal fato, basta ver que a acidez de duas soluções de HCl expressa em
+ –5 –6
termos de concentrações de H3O , iguais a 2,56 x 10 M e 7,58 x 10 M, são expressas em
termos de pH simplesmente pelos valores de pH 4,59 e 5,12, respectivamente.
Deve-se registrar que um procedimento semelhante poderia ser adotado tendo como
–
referência as concentrações de íons OH e, nesse caso, o parâmetro indicador da acidez ou
basicidade do meio seria o pOH, definido como o logarítimo negativo da concentração de
–
OH . Ou seja:
pOH = −log[OH − ]
A + Água H3 O(aq)
+
+ A−
(aq) [H3 O+ ][A− ]
Ka =
Ácido Base Ácido Base [HA]
;
B + Água B(aq)
+ −
+ OH(aq)
[B + ][OH − ]
Kb =
Base Ácido Ácido Base [B]
;
–5
Essa constante de acidez a 25 oC é igual a 1,8 x 10 , pelo fato de apenas uma pequena
quantidade do ácido acético se dissociar, liberando prótons para a solução, o que o caracteriza
como um ácido fraco.
Se a substância dissolvida na água for básica, como é o caso da amônia (NH3), o próton
é transferido da água para as moléculas da base, e as equações que expressam o equilíbrio
químico e a constante de basicidade passam a ser:
N H3 + Água N H4 + −
(aq) + OH(aq)
Dessas equações, obtém-se valores de pKa ou de pKb, que são tanto menores quanto
mais fortes forem os respectivos ácidos ou bases, como pode ser visto na Tabela 4.
N
as soluções de sais de metais em água, ocorrem interações de intensidades variadas
entre os íons e as moléculas do solvente. Se a interação é fraca, diz-se que ocorre
hidratação dos íons, isto é, cada íon fica, apenas, envolvido por uma certa quantidade
de moléculas do solvente. Quando a interação é forte, além da hidratação, ocorre rompimento
e
[F e(H2 O)6 ]3+
(aq) + água [F e(H2 O)5 (OH)](aq) 2+ + H3 O(aq) +
.
[F e(H2 O)5 (OH)](aq) 2+ + água [F e(H2 O)4 (OH)2 ](aq) + + H3 O(aq) +
3+
Esta é, portanto, uma reação de hidrólise e, nela, o íon Fe funciona como um ácido
por qualquer das definições que se queira utilizar, exceto a de Lux e Flood.
Z2
ξ= ,
r+d
+
Por fim, nas soluções de KCN, as quais têm um ácido fraco (K ) e uma base conjugada
– –
forte (CN ), também ocorre hidrólise da água, mas, nesse caso, com liberação de íons OH ,
como se observa no equilíbrio:
De transição d +3 Moderada
Óxidos de não-metais
em meio aquoso
Na aula 1 (Estudo dos óxidos), foi mostrado que os óxidos de não-metais, ao se
dissolverem na água, geralmente formam soluções de ácidos do tipo XOn(OH)m.
Nessas reações, verifica-se que a acidez dos oxiácidos formados (H2SO4, por exemplo)
depende da eletronegatividade do átomo central e da quantidade de oxigênio ao redor desse
átomo. Se o oxiácido inclui outros grupos (HSO3F e HSO3I), a acidez varia em função do
efeito indutivo causado por tais grupos.
Isso acontece porque esses fatores afetam a polaridade da ligação H–OX, e esta, por
sua vez, influi na interação entre o oxiácido e a água, causando mais ou menos liberação do
próton (H3O+) no meio solvente, alterando, portanto, a acidez observada nas soluções.
Pode-se ver, por exemplo, que:
Esses efeitos são bem demonstrados através dos dados contidos na Tabela 6 a
seguir, em que são apresentados alguns parâmetros relativos a ácidos formados a partir
de alguns oxiácidos.
O principal efeito do número de átomos de oxigênio sobre a acidez das espécies se deve
às mudanças na polaridade da ligação O–H, causada pela variação da eletronegatividade do
grupo ligado ao oxigênio de onde é liberado o próton. Prova disso é que esse efeito também
é observado quando se introduz outros átomos ou grupos substituintes que façam aumentar
a eletronegatividade do oxigênio do grupo ácido.
Pode ser visto, por exemplo, que, ao se substituir os hidrogênios metílicos do ácido
acético por átomos de cloro, formando o ácido tricloroacético, ocorre um aumento na acidez
de cerca de dez mil vezes (o pKa passa de 4,75 para 0,52).
Eletronegatividade Número de
Ácido Estrutura pKa
de X oxidação de X
Ácido hipoiodoso, HIO I—O—H 2,7 +1 10,64
Ácido hipobromoso,HBrO Br—O—H 3,0 +1 8,69
Ácido hipocloroso, HClO Cl—O—H 3,2 +1 7,53
O
Ácido cloroso, HClO2 | 3,2 +3 2,00
Cl—O—H
O
|
Ácido clórico, HClO3 Cl—O—H—O 3,2 +5 Forte
|
O
O
|
Ácido perclórico, HClO4 O—Cl—O—H—O 3,2 +7 Forte
|
O
X – Átomo ligado ao grupo O—H ácido.
Isto ocorre porque, por indução, a eletronegatividade do grupo ligado ao O–H aumenta,
tornando essa ligação mais polarizada, o que fortalece as interações com moléculas de
água e facilita a liberação do íon H+, resultando num ácido muito mais forte, como se pode
visualizar na representação a seguir:
A análise de fatos como estes levaram Linus Pauling a propor duas regras importantes
sobre o comportamento dos óxidos ácidos.
A primeira regra estabelece que, nos poliácidos do tipo XOn(OH)m, os valores de pKa
podem ser estimados pela expressão:
pKa = 8 – 5n.
n Significando que quanto maior o valor de n, maior será a constante de acidez e, portanto,
mais forte será o ácido, como pode ser observado na Tabela 7.
n é o número de átomos
de oxigênio além dos A segunda regra diz que, nos óxidos ácidos, as constantes de acidez sucessivas
integrantes dos grupos OH
(igual a m).
diminuem da ordem de 10.000 a 100.000 vezes, ou, expressando de outra forma, os valores
de pKa aumentam de cinco unidades de uma dissociação para a seguinte. Ou seja:
Isso ocorre porque a carga gerada na formação do ânion pode ser mais extensivamente
deslocalizada nas espécies com maior número de oxigênios. Assim, em espécies com
muitos oxigênios e poucos prótons, como o HNO3 ou o HClO4, a carga negativa dos ânions
– –
(NO3 ou ClO4 ) resultantes da dissociação desses ácidos ficam espalhadas sobre os três
ou quatro átomos de oxigênio dos ânions, conferindo estabilidade aos mesmos, o que
favorece a dissociação dos ácidos.
O
s óxidos metálicos geralmente reagem com a água produzindo hidróxidos de fórmula
geral M(OH)m ou formando soluções básicas, especialmente se os metais estiverem
em baixos estados de oxidação, em processos como os que são apresentados nas
equações a seguir, conforme representados na Figura 1.
N a2 O(s) + água → 2N a+ −
(aq) + 2OH(aq) ou
6 Ácidos
4 Anfóteros
2 Básicos
Elementos Sc Ti V Cr Mn Fe Co Ni Cu Zn
Grupos
1 2 13 14 15 16 17
Períodos
Basicidade
2 Li Be B C N O F
3 Na Mg Al Si P S Cl
4 K Ca Ga Ge As Se Br
5 Cs Sr In Sn Sb Te I
6 Fr Ba S Pb Bi
Conforme você pôde ver, em todos os fenômenos discutidos nesta e nas duas primeiras
aulas desta disciplina, a acidez ou a basicidade (que são propriedades químicas antípodas)
se correlacionam diretamente com a eletronegatividade das espécies químicas, o que
demonstra a importância dessa propriedade em interpretações ou em previsões sobre o
comportamento reacional das espécies químicas.
Atividade 3
Explique por que soluções aquosas de KBr são neutras, de CoCl3 são
1 ácidas e de NaCH3COO são básicas.
a) HClO e HClO3
b) H2SO3 e H2SO4
c) HNO2 e HNO3
Auto-avaliação
Utilizando valores de próton afinidades, explique como a acidez dos hidretos
1 binários varia na tabela periódica.
2 Explique por que o anidrido fórmico (HCOOH) não é ácido quando dissolvido no H2SO4.
3 Explique por que o NaHSO4 é cerca de dez mil vezes menos ácido do que o H2SO4.
–5
Explique por que a constante de acidez do ácido acético (H3CCOOH) é 1,8 x 10 , a do
4 –4 –1
ácido fórmico (HCOOH) é 1,8 x 10 e a do ácido tricloroacético (Cl3CCOOH) é 3,0 x 10 .
Referências
HESLOP, R. B.; JONES, K. Química inorgânica. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulvernkian, 1976.
HUHEEY, J. E.; KEITER, E. A.; KEITER, R. L. Inorganic chemistry: principles of structure and
reativity. New York: Harper Collins College Publishers, 1993.
SHRIVER, O. F.; ATKINS, P. W. Química inorgânica. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2003.