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Arte brasileira: real e ficção

Por Aracy Amaral

Historiadora comenta o artigo "Mercado de arte: global e desigual", sobre a produção


artística do Brasil no mundo

O artigo de Ana Letícia Fialho, “Mercado de arte: global e desigual”, publicado em


Trópico, é muito oportuno e interessante pelas razões que as pessoas que viajam já
conhecem bem: o real e o fictício na valorização no exterior da arte brasileira. E isso se
vê não apenas no que tange às artes visuais, mas também em relação à música popular e
à literatura contemporânea.

Uma coisa é o circulo de iniciados que acompanham, no caso das artes visuais, as
bienais e documentas (mais de 60 pelo mundo) e que são sempre os curadores,
marchands, artistas envolvidos e "alguns" raros colecionadores. São os que estão em
trânsito permanente em aeroportos e se cruzam constantemente. Nem críticos podem
acompanhar essa movimentação tão intensa quanto os marchands e os curadores
diretamente envolvidos.

Outro dado: a tendência que todos temos de considerar o nosso epicentro como o centro
do universo. Isso ocorre aqui, como no Cairo, em Istambul, em Buenos Aires, em
Madri, em Nova York (tão divorciado de Chicago quanto de Los Angeles), de Tóquio,
como de Pequim ou Xangai, ou de Nova Déli. Ou seja, para nós, o nosso meio é o
centro do mundo.

Mas para cada um dos centros, seja ele Paris ou Munique ou Londres, todos eles se
consideram "o centro". E o que vem de fora, pouco interessa. Aliás, pior ainda quando
você é da América Latina, Ásia ou África. Daí sim, é periferia da pesada.

Há muito escrevi sobre esse preconceito contra os latino-americanos, e que ainda está
vigente, sem dúvida, seja na Europa como nos Estados Unidos. Só quem viveu em Nova
York em fins dos anos 60 e nos anos 70 sabe da fama de um local expositivo como o
Center for Interamerican Relations, na Park Avenue, onde pouca gente queria expor por
razões... políticas, digamos, sobretudo no período ditatorial na América Latina, pois o
local era (ou é) claramente um centro do empresariado norte-americano com interesses
na América do Sul.

Barbara Duncan pertencia a esse círculo onde imperavam os Rockefeller. É claro que
hoje todo esse "peso" desapareceu muito das preocupações dos artistas, e as coisas
aparentemente mudaram...

Outro dado: poucos brasileiros parecem lembrar (também já registrei isso) que não foi
por acaso que Ligia Clark, Oiticica ou Camargo surgem em exposições na Inglaterra.
Isso se deu por que um crítico britânico de prestigio como Guy Brett, ligado à Signals,
colocou neles os olhos, e de Camargo passou para Oiticica (que teve através de seu
interesse a exposição na Whitechapel, em Londres, em fins dos anos 60, sua primeira
apresentação internacional). A partir de 1989, também Cildo Meirelles e Tunga teriam
textos escritor por Guy Brett, que ainda iria se interessar por Mira Schendel, e depois
escreveu sobre Jac Leirner (lembro-me que falei a ele de Jac, quando, em São Paulo,
veio conhecer a coleção de Adolpho Leirner).

E por que Guy Brett se interessaria por esses artistas brasileiros, quando os críticos
estrangeiros em geral não se interessam por artistas que não pertençam a seu repertório?
Como explicar esse dado?

A explicação que tenho sobre esse assunto é muito pessoal. É porque, creio eu, Guy
Brett -não sei nem se ele tem noção de quanto foi influente para todos esses artistas do
Brasil- tinha uma abertura muito rara e sensível que o distingue de outros críticos
europeus ou norte-americanos -que até hoje somente esperam de "latino-americanos"
uma arte política ou exótica; o que passa daí é tendência de Primeiro Mundo, mas de
segunda água, como se diz; e a antológica exposição "Magiciens de la terre" é exemplo
disso.

Guy Brett é casado com uma chilena. Ou seja, exercita o olhar sobre o que é de fora de
maneira diferenciada, com sensibilidade. Escreveu até um ensaio sobre arte popular do
Chile. Há muitos anos não o vejo, por isso não estou a par sobre o que tem produzido
ultimamente. Mas vejo nessa ligação dele a explicação pelo interesse não-exótico pelo
"outro" -raríssimo entre europeus.

Várias outras anotações poderiam ser registradas, como a preocupação norte-americana


e britânica, por exemplo, de ter livros sobre arte latino-americana não traduzidos de
originais "made in Brazil" ou "made in Argentina", mas feitos, digo, escritos por autores
norte-americanos ou britânicos, por conhecerem melhor "our audience". E assim tem
sido, e irremediavelmente temos a nossa arte, ou a arte dos mais diversos países sempre
vistas sob a ótica "deles". Não se oferece, ou não se é dado oferecer a eles o nosso
produto sob o nosso ponto de vista (ou, o que é mais grave, o nosso ponto de vista é
insuficiente ou deficiente...).

Enfim, acho que a problemática do mercado é uma consequência de tudo isso. Através
de minha atuação no comitê da Holanda de que participo há quase quatro anos tenho
registrado o total desconhecimento por lá, mesmo dentro de uma fundação prestigiosa,
de nomes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Maria Bethania, por exemplo.
Ninguém conhece (ou seja: devem ser conhecidos por caribenhos que vivem lá, ou, na
Europa, por uma elite de profissionais que frequenta festivais de música, bienais e
documentas ou festivais de cinema).

O resto é sonho. É claro que temos alguns artistas conhecidos no exterior. Mas são raros
e excepcionais. E não é a aquisição de uma ou outra obra de sua autoria que os faz
"unanimidade" (como Nam June Paik, "arroz de festa" de eventos antológicos de vídeo).
Ao contrário, mesmo fora de um mercado que talvez o ignore, o nosso maravilhoso
precursor Palatnik, cujas obras deveriam ser requisitadas constantemente, apenas neste
ano teve um merecido reconhecimento internacional na Califórnia.

Nos anos 90 tivemos no Brasil a entusiástica figura de Marco Antonio Villaça, que,
movimentando-se internacionalmente como jovem marchand, participando de feiras de
arte e não se poupando a desgastes com deslocamentos (sem falar nas exposições em
sua galeria de São Paulo), obteve contatos antes impensáveis em esforço bem sucedido
para colocar artistas brasileiros no exterior. Creio mesmo que é graças a ele que
surgiram colecionadores de arte jovem brasileira em países como a Argentina, por
exemplo.

Mas é difícil ao Primeiro Mundo reconhecer de forma regular ou acompanhar a


exuberância da produção de arte brasileira, ou latino-americana, ou africana ou do
Oriente Médio ou asiático. Não interessa, simplesmente. É só examinar o último
catálogo do MoMA para nos darmos conta de como eles colocam, mesmo artistas de
ponta do cinetismo internacional, como os venezuelanos, como "crosscurrents", e não
vinculados ou precursores do que o Primeiro Mundo faria. Queiramos ou não, um país
só passa a interessar quando ascende à condição de potência econômica relevante. É o
caso atual da China.

E por que estamos distantes -ou sempre estivemos- da interlocução com o Primeiro
Mundo? Por que, quando se publica -como nos conta Paulo Malta, segundo informação
de Marta Rossetti, especialista em Anita Malfatti- um livro sobre os artistas que
pintaram na segunda década do século XX vistas da ilha de Monhegan, próxima a Nova
York, tema obrigatório à época, e comparecem Bellows, Hopper, entre outros, não está
a nossa maravilhosa Anita, com "O farol" (hoje na coleção Gilberto Chateaubriand)?

Por que nunca ocorre aos gringos baixar os olhos ou buscar os artistas "afins" em outros
países? (Podemos nos ofender, mas a responsabilidade e a deficiência é tanto nossa
quanto deles?)

link-se
Mercado de artes: global e desigual, por Ana Letícia Fialho -
http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2551,1.shl

Aracy Amaral
É crítica e historiadora de arte. Participa do Prince Claus Awards Committee, na
Holanda, no qual atuam também Niek Biegman, o filósofo sírio Sadik Jalal Al-azm, o
poeta indonésio Goenawan Mohamad, o produtor de cinema moçambicano Pedro
Pimenta, a especialista em gastronomia Claudia Roden e o arquiteto Mick Pearce.

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