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IMS - Texto de imprensa sobre a crise contemporânea

As raízes da crise financeira dos EUA


As desesperadas tentativas, por parte da Reserva Federal norte-americana, de
impedir que a economia do país entre em recessão, são extraordinárias devido a,
pelo menos, dois motivos. Em primeiro lugar, até há poucos meses o pensamento
convencional era de

Jornal de Negócios Online

negocios@negocios.pt

Agora, a recessão é tida como certa. Em segundo lugar, as acções da Fed não parecem ser
eficazes. Apesar de ter reduzido as taxas de juro e de ter injectado liquidez num sistema
financeiro em apuros, a crise continua a acentuar-se.

Na verdade, a crise norte-americana foi, em larga medida, criada pela Reserva Federal, com a
ajuda da iludida Administração Bush. Um dos grandes culpados foi Alan Greenspan, que deixou o
actual presidente da Fed, Ben Bernanke, a braços com uma situação muito complicada. Mas
Bernanke foi governador da Fed durante o mandato de Greenspan e também ele foi incapaz de
diagnosticar correctamente os crescentes problemas resultantes das políticas que a autoridade
monetária ia assumindo.

A actual crise financeira tem as suas raízes imediatas em 2001, entre o final da expansão
tecnológica e o choque dos ataques terroristas de 11 de Setembro. Foi nessa altura que a Fed
abriu a torneira monetária para tentar combater um abrandamento económico. A Fed injectou
dinheiro na economia norte-americana e cortou a sua taxa de juro directora – a taxa dos fundos
federais – de 3,5% em Agosto de 2001 para apenas 1% em meados de 2003. A Reserva Federal
manteve esta taxa demasiado baixa durante demasiado tempo.

A expansão monetária costuma facilitar a obtenção de empréstimos e diminui os custos que lhe
estão associados em toda a cadeia económica. Além disso, tende também a enfraquecer a moeda
e a aumentar a inflação. Tudo isto começou a ser uma realidade nos Estados Unidos.

Desta vez, a diferença foi que os novos tomadores de empréstimos estiveram concentrados no
mercado imobiliário. É costume as menores taxas de juro levarem a um aumento da compra de
casas mas, desta vez, como tão bem é sabido, os bancos comerciais e de investimento criaram
novos mecanismos financeiros de expansão do crédito imobiliário a tomadores de empréstimos
com historiais creditícios pouco sólidos. A Fed não quis regular estas práticas dúbias. Praticamente
qualquer pessoa podia comprar casa, avançando apenas com um pequeno – ou nenhum – sinal, e
com encargos com os juros adiados para muito mais tarde.

À medida que a expansão do crédito à habitação ia ganhando fôlego, foi tendo um “feedback”
muito positivo. O aumento das compras de habitações elevou os preços das casas, o que fez com
que a banca sentisse que era seguro emprestar dinheiro a mutuários pouco fiáveis. Afinal de
contas, se não conseguissem pagar as prestações e entrassem em situação de incumprimento, os
bancos ficariam na posse das casas, que valeriam muito mais. Teoricamente, seria assim. É claro
que só funcionou enquanto os preços das casas subiram. Assim que os preços atingiram um pico e
começaram a descer, as condições de concessão de crédito ficaram mais apertadas e os bancos
aperceberam-se que estavam a ficar na posse de casas cujo valor não cobria o montante da
dívida.

O surpreendente foi a forma como a Fed, ainda com Greenspan no comando, se manteve
impassível enquanto o “boom” do crédito começava a dissipar-se, dirigindo-se a alta velocidade
para o desastre subsequente. Foram manifestadas algumas perspectivas pessimistas, mas poucas
partiram do próprio sector financeiro. Os bancos estavam demasiado ocupados a cobrar comissões
sobre novos empréstimos e a pagarem avultados bónus aos seus gestores.

Houve um momento crucial em 2005, quando o governador mas ainda não presidente da Fed, Ben
Bernanke, descreveu a expansão do mercado imobiliário como reflectindo um sistema financeiro
prudente e bem regulado, não uma bolha perigosa. Defendeu que os bancos norte-americanos
estavam a direccionar grandes quantias de capital estrangeiro para o sector imobiliário porque os
investidores internacionais apreciavam “a profundidade e complexidade dos mercados financeiros
do país (que, entre outras coisas, permitiu que as famílias pudessem facilmente ser donas das
suas casas).”

No decorrer de 2006 e 2007 deu-se o auge da bolha que está agora a afectar as outrora
poderosas instituições financeiras. Os balanços da banca eram, na altura, preenchidos com
elevadas quantias de créditos hipotecários de alto risco, embrulhados de formas tão complicadas
que dificultavam a avaliação dos riscos. Os bancos começaram a abrandar a concessão de novos
empréstimos e os incumprimentos no crédito à habitação começaram a aumentar. Os preços das
casas chegaram a um pico enquanto a concessão de crédito diminuía e, depois, começaram a
descer. A bolha do mercado imobiliário estoirou no Outono do ano passado e os bancos com
grandes volumes de activos em hipotecas começaram a declarar avultadas perdas, nalguns casos
com dimensão suficiente para levarem ao colapso da própria instituição financeira, como
aconteceu com o Bear Stearns.

Com o colapso do mercado imobiliário a reduzir o consumo, a Fed, num esforço para evitar a
recessão e ajudar os bancos em apuros, tem estado a reduzir os juros desde o Outono passado.
Neste momento, a expansão do crédito não está a direccionar-se para a construção de casas, mas
para a especulação nas matérias-primas e divisas estrangeiras.

A flexibilização da política monetária da Fed está actualmente a atear a inflação dos EUA, em vez
de fomentar uma recuperação. Os preços do petróleo, dos alimentos e do ouro atingiram máximos
históricos e o dólar caiu para mínimos de sempre. Um euro custa actualmente cerca de 1,60
dólares, contra 0,90 dólares em Janeiro de 2002. Ainda assim, a Reserva Federal, no seu
desespero para impedir uma recessão no país, continua a injectar mais dinheiro no sistema
financeiro, intensificando as pressões inflacionistas.

A Fed, que alimentou um “boom”, não consegue, agora, impedir um declínio, pelo menos de curto
prazo, da economia norte-americana, se é que não vai ser pior do que isso. Se continuar a insistir
demasiado numa contínua expansão monetária, não impedirá um estoiro e, em vez disso, poderá
criar estagflação – inflação e contracção económica. A Fed deve tentar impedir qualquer colapso
ao nível da liquidez, ao mesmo tempo que deverá manter a inflação sob controlo e evitar prestar
ajuda financeira injustificada - no âmbito dos empréstimos bancários arriscados - financiada pelos
contribuintes.

Um pouco por todo o mundo, poderão existir alguns efeitos semelhantes, na medida em que os
bancos estrangeiros também apresentam crédito hipotecário norte-americano de má qualidade
nos seus balanços. E poderá ser ainda pior se se verificar uma crise financeira geral. No entanto,
existe ainda uma boa probabilidade de este abrandamento da economia se limitar apenas aos
Estados Unidos, onde a expansão e a depressão se concentraram. Estou convicto de que os danos
que se sentirão na restante economia mundial poderão ser limitados.

As raízes da crise financeira dos EUA


Jornal de Negócios Online, 26-3-08
http://www.jornaldenegocios.pt/default.asp?Session=&CpContentId=314015

Em breve: Capitalismo 3.0


Cambridge - O capitalismo está a sofrer uma das suas crises mais severas em
muitas décadas. Uma combinação de recessão profunda, de desarticulações
económicas globais, e de nacionalizações efectivas de largas faixas do sector
financeiro em economias avançadas perturbou profundamente o equilíbrio entre os
mercados e os Estados. Onde vai ocorrer o novo equilíbrio é a pergunta que todos
fazem.

Dani Rodrik

© Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org

Cambridge - O capitalismo está a sofrer uma das suas crises mais severas em muitas décadas.
Uma combinação de recessão profunda, de desarticulações económicas globais, e de
nacionalizações efectivas de largas faixas do sector financeiro em economias avançadas perturbou
profundamente o equilíbrio entre os mercados e os Estados. Onde vai ocorrer o novo equilíbrio é a
pergunta que todos fazem.

Aqueles que prevêem a morte do capitalismo têm que lidar com um facto historicamente
importante: o capitalismo tem uma capacidade quase ilimitada de se reinventar. De facto, a sua
maleabilidade é a razão que lhe permitiu ultrapassar períodos de crise ao longo dos séculos e
sobreviver às críticas desde Karl Marx. A verdadeira pergunta não é se o capitalismo consegue
sobreviver - consegue - mas sim se os líderes mundiais vão demonstrar a liderança necessária
para o levar à sua próxima fase, à medida que emergimos do actual dilema.

O capitalismo não tem igual no que toca a desencadear as energias económicas colectivas das
sociedades humanas. É por essa razão que todas as sociedades prósperas são capitalistas no
sentido lato do termo: estão organizadas em torno da propriedade privada e permitem ao
mercado desempenhar um papel importante na afectação de recursos e na determinação das
recompensas económicas. A questão é que nem os direitos de propriedade, nem os mercados,
podem funcionar sozinhos. Precisam do apoio de outras instituições sociais.

Assim, os direitos de propriedade dependem dos tribunais e do cumprimento legal, e os mercados


dependem dos reguladores para controlarem os abusos e corrigirem as falhas do mercado. Ao
nível político, o capitalismo requer mecanismos de transferência e compensação que tornem os
seus resultados aceitáveis. Como a actual crise voltou a demonstrar, o capitalismo necessita de
mecanismos de estabilização, como empréstimos de emergência e políticas orçamentais
anticíclicas. Por outras palavras, o capitalismo não é auto-criador, auto-sustentável, auto-
regulador ou auto-estabilizador.

A história do capitalismo tem sido um processo de aprendizagem e reaprendizagem destas lições.


A sociedade de mercado idealizada por Adam Smith requer um pouco mais que um "guarda-
nocturno estatal". Tudo o que os governos precisavam de fazer para garantir a divisão do trabalho
era fazer respeitar os direitos de propriedade, manter a paz, e cobrar alguns impostos para pagar
uma gama limitada de bens públicos.

Durante o início do século XX, o capitalismo era governado por uma visão limitada do que as
instituições públicas precisavam de fazer para o defender. Na prática, o alcance dos governos foi,
muitas vezes, além desta concepção - como, por exemplo, a introdução das pensões de reforma
por Bismarck, na Alemanha, em 1889. Mas os governos continuaram a ver o seu papel em termos
restritos.

Isto começou a mudar à medida que as sociedades se tornaram mais democráticas e os sindicatos
e outros grupos se mobilizaram contra os abusos do capitalismo. As políticas anticoncorrenciais
começaram a aparecer nos Estados Unidos. A utilidade das políticas monetárias e orçamentais
activas tornou-se amplamente aceite na sequência da Grande Depressão.
A percentagem de gastos públicos no rendimento nacional cresceu rapidamente nos actuais países
industrializados. De uma média inferior a 10%, no final do século XIX, para mais de 20% antes da
Segunda Guerra Mundial. E, no período pós-Segunda Guerra Mundial, a maioria dos países
lançaram políticas sociais elaboradas em que o sector público cresceu, em média, para mais de
40% do rendimento nacional.

Este modelo de "economia-mista" foi o feito supremo do século XX. O novo equilíbrio que se
estabeleceu entre o Estado e o mercado criou as condições para um período sem precedentes de
coesão social, estabilidade e prosperidade nas economias avançadas que durou até meados dos
anos 70. Este modelo começou a ficar gasto a partir dos anos 80, e agora parece ter-se quebrado.
A razão pode ser expressa numa palavra: globalização.

A economia mista do pós-guerra foi construída e gerida ao nível dos Estados-Nações, e precisava
de manter à distância a economia internacional. O regime Bretton Woods-GATT implicava uma
forma "superficial" de integração económica internacional que exigia o controlo das entradas de
capitais internacionais, que Keynes e os seus contemporâneos consideravam crucial para gestão
da economia doméstica.

Aos países era exigido que assumissem apenas uma liberalização comercial limitada, com muitas
excepções em sectores socialmente sensíveis (agricultura, têxteis e serviços). Isto deixou-os livres
para construírem as suas próprias versões do capitalismo nacional, desde que obedecessem a
poucas e simples regras internacionais.

A actual crise mostra o quão longe nos afastamos deste modelo. A globalização financeira, em
particular, lançou a confusão com as antigas regras. Quando o capitalismo chinês se encontrou
com o capitalismo americano, com poucas válvulas de segurança a funcionar, deu origem a uma
mistura explosiva.

Não existiram mecanismos de protecção para impedir que o excesso de liquidez global se
desenvolvesse, o que, em combinação com as falhas das autoridades reguladoras norte-
americanas, acabou por produzir um espectacular "boom" e "crash" imobiliário. Nem existiram
nenhumas barreiras internacionais que impedissem esta crise de se espalhar a partir deste
epicentro.

A lição não é que o capitalismo está morto. É que precisamos de o reinventar para um novo século
em que as forças da economia globalizada são muito mais poderosas do que antes. Tal como o
capitalismo minimalista de Smith foi transformado na economia mista de Keynes, precisamos de
considerar a transição da versão nacional da economia mista para a equivalente global.

Isto significa imaginar um melhor equilíbrio entre os mercados e as suas instituições de apoio a
um nível global. Por vezes, vai exigir o alargamento das instituições para fora das nações e o
reforço da regulamentação global. Outras vezes, vai significar prevenir que os mercados se
expandam além do alcance das instituições que devem permanecer nacionais. A abordagem
correcta vai diferir de país para país, de acordo com as suas preocupações específicas.
Desenhar o próximo capitalismo não vai ser fácil. Mas temos a história do nosso lado: a graça
salvadora do capitalismo é que ele é quase infinitamente maleável.

© Project Syndicate, 2008.


www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

William Baumol, Robert E. Litan e Carl Schramm


Bom capitalismo, mau capitalismo
Jornal de Negócios, 17-3-08
http://www.jornaldenegocios.pt/default.asp?Session=&CpContentId=313513

Bom capitalismo, mau capitalismo


Muitas pessoas partiram do princípio, quando o Muro de Berlim caiu em 1989, que
o “capitalismo” tinha ganho a Guerra Fria ideológica e que o “comunismo” tinha
sido derrotado. No entanto, se bem que o “capitalismo” – definido como um
sistema económico cria

William Baumol, Robert E. Litan e Carl Schramm

Julgamos ser útil dividir as economias capitalistas em quatro grandes categorias. Ainda que muitas
economias conjuguem algumas destas categorias, a maioria enquadra-se essencialmente apenas
numa delas. A tipologia que se segue ajuda a explicar o porquê de algumas economias crescerem
mais rapidamente do que outras.
O capitalismo oligarca existe quando o poder e o dinheiro estão fortemente concentrados em meia
dúzia de pessoas. É a pior forma de capitalismo, não só devido à extrema desigualdade de
rendimentos e riqueza que esse tipo de economias permite, mas também porque as elites não
promovem o crescimento como objectivo central da política económica. Em vez disso, os oligarcas
estabelecem as regras que os ajudam a maximizar os seus próprios rendimentos e riqueza. Esses
esquemas predominam em vastas regiões da América Latina, do Médio Oriente árabe e de África.

O capitalismo dirigido pelo Estado descreve economias em que o crescimento é um objectivo


económico central (como acontece nas restantes duas formas de capitalismo), mas tenta alcançá-
lo favorecendo empresas e indústrias específicas. Os governos atribuem crédito (através de
bancos estatais ou orientando decisões de concessão de crédito tomadas por bancos de capital
privado), atribuem subsídios directos e/ou incentivos fiscais, garantem protecção comercial ou
recorrem a outros instrumentos regulatórios na tentativa de “seleccionarem vencedores”.

As economias do sudeste asiático demonstraram um enorme sucesso com o dirigismo estatal e,


até finais da década de 90, surgiram apelos nos Estados Unidos para que se imitassem as suas
práticas. Mas o calcanhar de Aquiles do dirigismo estatal é que, assim que essas economias se
aproximam da “fronteira das possibilidades de produção”, os estrategas políticos ficam sem
indústrias e tecnologias para imitar. Quando os responsáveis governamentais, em vez dos
mercados, tentam seleccionar os vencedores que se seguem, correm um enorme risco de
escolherem as indústrias erradas ou de canalizarem demasiado investimento – e,
consequentemente, excesso de capacidade – para os sectores existentes. Essa tendência
contribuiu significativamente para a crise financeira da Ásia de 1997-98.

O capitalismo das grandes empresas ou empresarial caracteriza as economias em que grandes


empresas – frequentemente chamadas “símbolos nacionais” – dominam a produção e o emprego.
Existem empresas de menor dimensão, mas são tipicamente do sector do retalho ou dos serviços,
com apenas um ou poucos empregados. As empresas crescem por meio da exploração das
economias de escala, aperfeiçoando e produzindo em massa as inovações radicais desenvolvidas
por empreendedores (discutidos mais adiante). As economias da Europa Ocidental e do Japão são
importantes exemplares do capitalismo empresarial que, como o dirigismo estatal, também
apresentam uma sólida “performance” económica.

Mas o capitalismo empresarial também tem o seu calcanhar de Aquiles. As empresas burocráticas
são, por norma, alérgicas a assumirem grandes riscos – ou seja, a desenvolver e comercializar as
inovações radicais que impulsionam a fronteira da possibilidade de produção e que geram
enormes saltos sustentados em matéria de produtividade e, consequentemente, em termos de
crescimento económico.

As grandes empresas são relativamente avessas ao risco não só porque se tratam de burocracias,
com vários níveis de gestão necessários para aprovar qualquer inovação, mas também porque não
estão dispostas a apoiar inovações que tornem obsoletos os produtos ou serviços que actualmente
são responsáveis pelos seus lucros. Na nossa perspectiva, os limites do capitalismo empresarial
explicam por que razão é que, depois de se aproximarem dos níveis norte-americanos do
rendimento per capita em finais dos anos 80, tanto a Europa Ocidental como o Japão foram
incapazes de se equiparar ao ressurgimento da produtividade fomentada pelas tecnologias de
informação nos EUA, que teve início na década de 90.

Isto conduz-nos ao quarto tipo: o capitalismo empreendedor. As economias em que o dinamismo


provém de novas empresas têm comercializado, historicamente, as inovações radicais que
continuam a impulsionar a fronteira da possibilidade de produção. Entre os exemplos dos dois
últimos séculos incluem-se produtos e inovações transformadores, como as autoestradas,
automóveis e aviões; telégrafo, telefones, rádio e televisão; ar condicionado, e, conforme já
salientámos, as várias tecnologias responsáveis pela revolução nas tecnologias de comunicação,
incluindo os computadores de grande porte e os computadores pessoais, “routers” e outros
dispositivos de “hardware”, bem como grande parte do “software” que neles corre.

Não há dúvida que nenhuma economia consegue consumar o seu pleno potencial tendo apenas
companhias empreendedoras. A combinação ideal de empresas contém uma saudável dose de
grandes empresas, que dispõem de recursos financeiros e humanos para aperfeiçoarem e
produzirem em massa as inovações radicais, a par com empresas mais recentes.

A título de exemplo, foi necessário que a Boeing e outros grandes fabricantes de aviões
comercializassem o terreno que os irmãos Wright desbravaram, ou que a Ford e a General Motors
produzissem automóveis em massa, e assim por diante. No entanto, sem empreendedores,
poucas das inovações realmente ousadas que moldaram a nossa economia moderna e as nossas
vidas estariam disponíveis.

Assim sendo, o desafio que se coloca a todas as economias que procuram maximizar o seu
potencial de crescimento reside em encontrar a combinação correcta de capitalismo empresarial e
empreendedor. As economias nas quais os empreendedores começam agora a florescer não
devem tornar-se complacentes. As economias dirigidas pelo Estado podem manter a sua rota de
crescimento acelerado, mas acabarão por ter de fazer uma transição para uma mistura compatível
com as outras duas formas de “bom capitalismo” se quiserem continuar a crescer de forma rápida.

A Índia e a China, cada uma à sua maneira, já estão a caminhar nessa direcção. O maior desafio
estará nas economias atoladas no capitalismo oligarca, que terão mais dificuldades em conseguir
uma transição desse tipo. Poderá exigir uma revolução – idealmente pacífica, é claro – que
substitua as elites que neste momento dominam essas economias e sociedades e para as quais o
crescimento não é a meta central.

Dani Rodrik
Em breve: Capitalismo 3.0
© Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org
Jornal de Negócios, 19 FEV 2009
http://www.jornaldenegocios.pt/index.php?template=SHOWNEWS_OPINION&id=355268

Os bancos só devem receber mais fundos públicos se for para emprestar a empresas e
consumidores
Maria João Rodrigues: "Quando o crédito bloqueia é como se houvesse uma paragem cardíaca"
06.03.2009 - 09h25 Teresa de Sousa

Entre Portugal e Bruxelas, Londres e Pequim, entre as aulas na universidade e o aconselhamento


das instituições multilaterais, incluindo a Comissão, Maria João Rodrigues, economista, desfruta de
uma posição privilegiada para observar uma crise mundial
de dimensões inéditas que levou a economia global para uma espiral recessiva que está longe de
bater no fundo.

A antiga ministra de António Guterres critica a falta de liderança e de visão dos governos europeus
e crê que a Europa está numa encruzilhada: ou aprofunda a integração ou corre o risco de
regredir. Considera ainda que a próxima reunião do G20 será um teste à liderança de Obama e a
oportunidade para lançar um novo New Deal, desta vez à escala mundial.

Esta crise não tem precedentes?

É completamente inédita. Mais do que uma recessão é uma crise de sistema e global. Por isso,
falar apenas de planos de recuperação talvez não seja a melhor linguagem para utilizar nesta
altura. Fica-se com a ideia de que, se conseguirmos regressar ao estádio precedente, fica tudo
bem. É uma mera ilusão. Houve o colapso de um sistema.

A primeira razão desse colapso está no sistema financeiro, que descolou da lógica da economia
real a partir dos anos 90 e criou uma outra lógica, subordinada à rentabilidade imediata sobre os
activos financeiros, independentemente de terem ou não correspondência na economia real. A
partir de um certo momento, grande parte das decisões financeiras eram tomadas sem qualquer
avaliação do seu impacte real em termos de investimento, criação de emprego, transformação
económica, criando a grande ilusão de lucros fáceis que, em grande medida, eram ilusórios...

Mas esse sistema serviu durante algum tempo para um crescimento bastante acentuado.

É importante separar o trigo do joio. A própria globalização teve imensos aspectos positivos. Como
houve uma parte da inovação financeira que foi útil. O problema, agora, é precisamente distinguir
a boa inovação financeira da má. A má é aquela que assenta na atribuição de investimentos pelas
entidades financeiras sem que assumam a responsabilidade respectiva.

Havia risco sem responsabilização?

Exactamente. Foi a invenção de produtos financeiros que permitem desconectar a tomada de risco
da responsabilidade por esse risco: os chamados derivados.

Mas temos de ir mais fundo na explicação da crise. Por trás dela há um funcionamento dos
sistema que se perverteu, o que quer dizer que este tipo de sistema capitalista já não é
sustentável. A isso somam-se os grandes desequilíbrios na procura mundial entre países que só
gastam e outros que dependem desse gasto...

O caso extremo tem a ver com a relação entre os Estados Unidos da América (EUA) e a China?

Sim. A partir da crise asiática (1997), a China, para conseguir furtar-se à intervenção clássica do
Fundo Monetário Internacional (FMI), constituiu reservas monetárias gigantescas. A partir de um
certo momento, essas reservas adquiriram uma nova importância que foi permitir-lhe manter a
sua divisa suficientemente desvalorizada para catapultar as suas exportações. Criou-se uma
relação umbilical entre a China e os EUA de tal ordem que, se é verdade que os EUA dependem da
China para financiar os seus défices, a China também depende dos EUA para vender os seus
produtos. Isto traduz uma relação completamente desequilibrada que tem de ser corrigida, se
quisermos ir ao fundo da origem desta crise. Os EUA vão ter de encontrar um maior equilíbrio
entre aquilo que gastam e aquilo produzem. A China terá de fazer um esforço maior para produzir
para o seu mercado interno.

É preciso ver também o que se passa nos países em desenvolvimento, cuja capacidade de
consumir está limitada por grandes estrangulamentos financeiros. Esta não é uma crise de
sobreprodução. É, pelo contrário, uma crise de falta de procura.

Disse que era uma crise de sistema.

Houve um rastilho desses desequilíbrios mundiais que contaminou o sistema financeiro com uma
rapidez alucinante. Sobre isso surge, agora, um outro grande factor de crise que é o ciclo vicioso
que se criou entre crise financeira e recessão económica, que se alimentam uma à outra. A crise
começou no mercado de acções mas agora está a atingir em cheio o coração do sistema, que são
os bancos - todos eles.

As instituições que dão crédito às pessoas e às empresas para puderem funcionar.

Exactamente. Quando o crédito bloqueia é como se houvesse uma paragem cardíaca. Nós
estamos aí. Estamos a correr o risco de uma crise bancária ao longo dos próximos meses bem
mais grave do que aquela que já tivemos. Estamos agora numa espiral recessiva em que a
recessão bloqueia o crédito e a falta de crédito acentua a recessão

O risco é passar da recessão para a depressão - um período prolongado de crescimento negativo


sem que se consiga sair dessa armadilha.

Estamos cada vez mais próximo desse cenário, apesar das intervenções dos governos?

É esse o paradoxo. Temos de reconhecer que os governos aprenderam com a crise de 1929.

Mas não houve resultados ou, pelo menos, os esperados?

Se tivesse havido hesitação e paralisia dos governos estaríamos muito pior. Apesar de tudo,
conseguiram impedir o colapso financeiro de Outubro, que foi travado à beira do precipício. Só que
essa intervenção, embora vasta e importante, não é ainda suficiente. No sistema bancário, o que
isto mostra é que não chega comprar os chamados activos tóxicos, dar garantias aos empréstimos
entre bancos, ou recapitalizar os bancos.

O que é que chegará, então?

É preciso criar uma situação de completa transparência e de responsabilização dos bancos. Os


bancos têm de dizer claramente qual é a sua verdadeira situação financeira e onde estão os
activos não confiáveis. E, se houver mais injecção de capital público, ele tem de ser dado com a
contrapartida de que tem mesmo de transformar-se em crédito às empresas e aos indivíduos.
Deve também ser acompanhado pela alteração das regras de remuneração dos executivos.
Já se está a caminhar para aí.

Não se trata apenas de introduzir alguma justiça redistributiva. O que está em causa é alterar as
decisões de investimento dos bancos criando uma relação entre a remuneração dos executivos e a
rentabilidade de longo prazo, e não de curto prazo.

Temos a percepção de que os EUA já iniciaram a reacção estratégica a esta crise e que a Europa
continua a acreditar que o pior não vem aí. É assim?

À partida, o modelo europeu devia ser mais resistente a este tipo de crise que o modelo
americano. Nos EUA uma crise no crédito transmite-se imediatamente a quase tudo. O acesso à
educação depende do crédito, o acesso à saúde depende do crédito. Na Europa muita coisa é
coberta pelos serviços públicos. Podíamos esperar, pois, que tivesse maior resistência.

E tem?

Tem consequências para a saída da crise. Os EUA precisam de uma reconversão económica e
social muito mais profunda do que a Europa.

E que o Presidente Obama já começou a fazer, como se viu nos últimos dias com o Orçamento.

Ele tem a clara percepção de que tem de ir para padrões de consumo e produção muito mais
sustentáveis, que tem de dotar a economia americana de um sistema de "welfare" muito mais
robusto. É uma transformação muito profunda.

A Europa está melhor defendida nesse ponto de vista, tem objectivos ambiciosos no que respeita a
questão energética, um "welfare system" muito mais robusto. A fragilidade europeia está na
questão da liderança política para organizar uma resposta potente. Como esta liderança não tem
emergido, a crise está a abalar os próprios fundamentos da construção europeia. Creio que a
palavra encruzilhada é a mais apropriada para o momento em que estamos. A opção é muito
clara: ou bem que há um aprofundamento da construção europeia ou vai haver uma regressão
muito preocupante.

Não estamos a ver sinais desse aprofundamento.

Quando a Europa esteve à beira do precipício, do colapso financeiro em Outubro, houve uma
resposta relativamente bem coordenada para um problema de emergência.

Mas o que se seguiu foi o lançamento de planos nacionais de recuperação numa mera lógica
nacional. Em Dezembro, esboçou-se algum esforço de articulação que se traduziu em adoptar uma
chamada "caixa de ferramentas" da qual os Estados-membros podiam retirar o que lhes fosse
mais adequado. Mas é uma resposta ainda muito débil.

Depois passou-se a uma outra discussão sobre como coordenar as políticas nacionais. Esta
discussão é extremamente insuficiente e o problema já não está só aí. É preciso coordenar as
políticas nacionais e é preciso criar instrumentos europeus que ainda não existem.

Que instrumentos?

Há medidas concretas que serão, elas próprias, um teste. A primeira é decidir que se vai expandir
a despesa pública para estimular o crescimento da economia, garantindo que há mais margem de
utilização dos critérios do Pacto de Estabilidade e Crescimento. De forma clara e colectivamente.
Um segundo problema resulta de os países-membros estarem em condições muito diferentes para
lançar os seus programas de estímulo à economia: uns têm muito mais meios do que outros. E o
que está a acontecer é que alguns países, ao aumentarem o défice e a dívida, estão fazê-lo com
taxas de juro elevadíssimas porque são considerados economias mais frágeis. É esse o verdadeiro
teste à solidariedade europeia. A única forma de responder a este problema é lançar um
instrumento que ainda não existe e que são os "eurobonds" [títulos de dívida europeus].

Suplemento de Economia

Maria João Rodrigues: "Quando o crédito bloqueia é como se houvesse uma paragem cardíaca"
Por Teresa de Sousa
Público, 6-3-09
http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1367992&idCanal=57

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