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FLORIANÓPOLIS-SC
1999
AGRADECIMENTOS
2
Ao encerrar mais esta etapa da vida acadêmica, após as mais diversas dificuldades e
obstáculos ultrapassados, é, com satisfação e por dever de justiça que agradeço:
Ao Prof. Dr. Christian Guy Caubet, que apesar de todos os compromissos profissionais, a
maioria deles permeados pela luta que marca a rotina dos que não aceitam o desrespeito ao
meio ambiente e à legislação que o protege, orientou o presente trabalho com intervenções
coerentes quanto ao ponto de vista a ser adotado e às questões de mérito mais relevantes;
Aos demais membros da banca examinadora, pelas observações pertinentes e sugestões
apresentadas;
Aos companheiros de turma, que sempre demonstraram interesse por minhas atividades,
companheirismo nos momentos de dificuldade e compreensão nas horas menos felizes;
Aos meus pais, Luis Enrique e Maria Teresa, e meus irmãos, Andrés e Maria Carolina, que
sempre prestaram apoio em tudo que puderam, contribuindo decisivamente para o alcance de
mais este almejado objetivo;
E à minha tão amada companheira de todas as horas e momentos, Juliana Mendes, que
esteve sempre próxima em meu pensamento, fortalecendo-me, amparando-me e enchendo-me
de amor e carinho durante o transcorrer deste árduo caminho, marcado pela conclusão deste
trabalho monográfico.
SINOPSE/RESUMO
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
.
ANEXOS
ANEXO I – Jurisprudência selecionada
ANEXO II – Acórdão n.º 40.190, em apelação cível de mesmo número,
de 14 de
dezembro de 1995, da Comarca de Biguaçú
ANEXO III – Acórdão n.º 37.164, em apelação cível de mesmo número,
de 03 de
setembro de 1991, da Comarca da Capital
INTRODUÇÃO
Nos dias de hoje, a preocupação com a proteção ao meio ambiente ocupa lugar
de destaque entre aquelas de maior importância para toda a sociedade.
Cada vez mais, se voltam as atenções para a inviabilidade da idéia de explorar os
bens naturais como se estes fossem inesgotáveis. Assim, se percebeu que o desenvolvimento
indiscriminado pode afetar o equilíbrio ecológico, a qualidade de vida e a própria vida,
passando a ecologia a ser discutida crescentemente.
Inicialmente o termo “ecologia” era utilizado para definir o estudo da relação
entre as espécies animais e o seu ambiente orgânico e inorgânico. Atualmente serve para
designar um amplo e variado movimento social, no qual também deve estar inserido o direito.
Dessa maneira, se pode dizer que a Ecologia não é uma compacta e homogênea
forma de pensamento. Ao contrário, abarca diferentes áreas de pensamento, onde podem
destacar-se quatro vertentes principais, denominadas de Ecologia Natural e Ecologia Social,
ambas de caráter mais teórico científico; e Conservacionismo e Ecologismo, estas com
objetivos mais práticos de atuação social.
6
1
SAMPAIO, Francisco José Marques. Responsabilidade Civil e Reparação de Danos ao Meio Ambiente. Rio de
Janeiro. Ed. Lumen Juris, 1998, p. 7.
8
natureza e, em uma visão mais completa, o ambiente, incluindo-se tudo aquilo em que o
homem participou modificando-o através de suas obras e construções.2
Diante do observado, constitui a intenção principal do presente capítulo
apresentar os conceitos elementares a respeito do Direito Ambiental, expondo primeiramente,
de maneira breve, o caminho percorrido pela legislação ambiental brasileira, dentro do
desenvolvimento do quadro geral mundial. A seguir, dar-se-á um sucinto estudo do instituto
da responsabilidade civil, como este se apresenta no direito pátrio em seus aspectos subjetivo
e objetivo, complementando-se com a análise dos princípios mais importantes estabelecidos
em conferências e reuniões internacionais realizadas para debate e incentivo à questão
ambiental.
2
Nesse sentido observa o Prof. Michel Despax, preferindo o conceito de “ambiente” ao de , por tê-lo como mais
amplo: “Seria algo arbitrário restringir o campo de estudo, limitando-o aos elementos naturais tais como a água e
o ár que o homem encontrou sobre a terra, com exclusão, dessa forma, de tudo aquilo que ele mesmo construiu
ou remodelou”. Droit de l’environnement. Librairies Techniques, 1980.
9
- 1965 – Lei n.º 4.771, de 15 de setembro, alterada pela lei n.º 7.803/89:
instituiu o Código Florestal, que, entre outras disposições, reconheceu a
atribuição dos Municípios elaborarem os respectivos planos diretores e
leis de uso do solo (art. 2º , parágrafo único), previu a recuperação da
cobertura vegetal (art. 18), definiu o que são as áreas de preservação
permanente (art. 20), e teve aplicação ampla na área penal (art. 26 e
seguintes);
- 1967 – Decreto-lei n.º 221, de 28 de fevereiro: instituiu o chamado
Código de Pesca, que, entre outros dispositivos, estabelece proibições à
pesca (art. 35), regulamenta o lançamento de efluentes das redes de
esgoto e os resíduos líquidos ou sólidos industriais às águas (art. 37),
estabelece penas às infrações (art. 57 e seguintes);
- 1980 – Lei n.º 6.803, de 02 de julho: refere-se ao Estudo de Impacto
Ambiental.
- 1981 – Lei n.º 6.938, de 31 de agosto: dispõe sobre a Política Nacional de
Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação.
Estabeleceu seus objetivos (art. 4 º) e a constituição do Sistema Nacional
do Meio Ambiente (art. 6º , alterado pela lei n.º 8.028/98);
- 1988 – Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em
05 de outubro: prevê um capítulo integralmente dedicado ao meio
ambiente (capítulo VI, do título VIII, da Ordem Social) que é, em suma, o
artigo 225, onde estabelece:
-
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder público a à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
3
Alter Ágora. nº 2. Novembro de 1994. Florianópolis, p. 36.
10
“É a ação criativa do ser humano que vai determinar aquilo que deve e
o que não deve ser entendido como meio ambiente.”5
A poluição é outro fenômeno, se pode ser assim chamado, que tem que ser
estudado na intenção de buscar uma definição que possibilite avançar nos trabalhos com o
máximo de compreensão das características da mesma bem como de suas conseqüências.
9
SAMPAIO, Francisco José Marques. Responsabilidade Civil e Reparação de danos ao Meio Ambiente. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 1998, p. 126.
10
PRIEUR, Michel. Droit de l ‘environnement. Paris: Dalloz, 1984, p. 2.
11
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Introdução ao direito ecológico e ao direito urbanístico:
instrumentos jurídicos para um futuro melhor. Rio de Janeiro: Forense, 1077, p. 14.
12
Conseil International de la Langue Française – Ministère de la Qualité de la Vie, Vocabulaire de
l’environnement, Hachete. – Paris, 1976, p. 48. In: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Obra citada, p. 127.
13
Os autores também têm dedicado parte de suas obras à questão que envolve a
elaboração de um conceito para definir o que é poluição, sendo nesse propósito bastante
abrangentes.
Como leciona o professor Paulo Affonso Leme Machado13, inicialmente a
atenção do legislador nacional estava voltada preponderantemente para a poluição das águas,
sendo definida como:
Nessa mesma linha de pensamento, o autor José Afonso da Silva define poluição
como:
“Qualquer modificação das características do meio ambiente, de modo
a torná-lo impróprio às formas de vida que ele normalmente abriga”.16
Por sua vez, mostrando-se mais completa e atualizada, a Lei n.º 6.938, de 31 de
agosto de 1981, dispõe que para fins legais entende-se poluição como a degradação da
qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde,
a segurança e o bem estar da população, criem condições adversas às atividades sociais e
econômicas, afetem desfavoravelmente a biota, afetem as condições estéticas ou sanitárias do
meio ambiente ou, ainda, que lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões
ambientais estabelecidos. Nota-se que com essa abrangência, a legislação protegeu o homem,
a comunidade, o lazer, o desenvolvimento econômico, o patrimônio público e o privado, a
paisagem, os monumentos naturais e seus arredores, além dos locais de valor histórico ou
artístico.
13
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 7ª Ed., São Paulo: Malheiros, 1998.
14
Art. 3º , do Decreto n.º 50.877, de 29 de junho de 1961.
15
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir, Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo, 4ª ed., 1983, p. 178.
16
SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro .,São Paulo: Ed. Revista dos tribunais, 1981, p. 443.
14
18
SAMPAIO, Francisco José Marques. O dano ambiental e a responsabilidade. In: Revista Forense. V. 317. Rio
de Janeiro: Forense, 1992, p. 115.
19
SAMPAIO, Francisco José Marques. Obra citada, p. 115.
20
CUSTÓDIO, Helita Barreira. Responsabilidade civil por danos ao meio ambiente. Tese apresentada ao
concurso de Livre-Docente para o Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo. São Paulo, 1983, pp. 16-17.
21
SAMPAIO, Francisco José Marques. Obra citada, p. 115.
16
29
DINIZ. Obra citada. p. 45.
19
30
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 6ª edição. Forense, 1979.
31
DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 5º edição. São Paulo: Gaia (divisão da
Ed. Global), 1998.
20
32
SAMPAIO, Francisco José Marques. Obra citada, p. 202.
33
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Obra citada, p. 282.
21
Por todos os níveis de ensino deve ser entendida a educação primária, secundária
e, também , a educação superior, devendo ser estabelecidos os conteúdos mais
adequados a cada grau de conhecimento, não excluindo-se do Poder Público a
responsabilidade pela orientação e fiscalização do referido ensino nas escolas e colégios
particulares.
Reveste-se de grande importância a inserção de tópicos relativos à prevenção de
atividades e comportamentos poluidores, por menores que sejam, e estudos básicos de
legislação ambiental nos meios acadêmicos em geral, e não apenas em uma minoria de cursos
privilegiados com tal valorização curricular.
Manifesta grande preocupação com a situação brasileira o professor da
Universidade de Brasília e autor de obras na área da Ecologia, Genebaldo Freire Dias:
35
DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 5ª edição. São Paulo: Ed. Gaia (divisão
da Ed. Global) 1998, p. 11.
36
. DAVID, René. Os grandes sistemas de direito contemporâneo. Tradução de Hermínio A. Carvalho. São
Paulo: Martins Fontes, 1986, Prefácio.
23
sobre o chamado Direito Ambiental, por parte dos futuros magistrados, membros do
Ministério Público e advogados.
37
MEIRELLES, Hely Lopes. Proteção ambiental e ação civil pública. RT 611/11.
24
38
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Obra citada, p. 157.
39
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Obra citada, p. 161.
25
40
Carta do Rio de Janeiro sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente. 1992, Princípio n.º 10.
26
A supracitada lei, que dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, têm,
segundo lê-se no artigo 4º, inciso VII, como um de seus objetivos a imposição ao poluidor e
ao predador, da obrigação de recuperar ou indenizar os danos causados e, ao usuário, impor
uma contribuição pela utilização dos recursos ambientais com fins econômicos.
Torna-se relevante analisar o que dispõe a Constituição Federal de 1988 sobre o
assunto, no artigo 225, parágrafos 2º e 3º, respectivamente:
41
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Obra citada, p. 284.
27
Sem dúvida, também no que se refere à causa do meio ambiente, o fato de arcar
de alguma forma com o prejuízo torna menos provável a aceitação de práticas nocivas à
coletividade.
De posse de uma noção sucinta porém essencial dos conceitos básicos do Direito
Ambiental, seu histórico e seus princípios mais destacados, já possibilitando visualizar
42
BENJAMIN, Antônio Herman V. O princípio poluidor-pagador. In: BENJAMIN (Coord.) Dano Ambiental -
Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: RT, 1993, p. 235.
43
BENJAMIN, Antônio Herman V. Obra citada, p. 229.
28
algumas questões fundamentais, pode empreender-se o avanço para a abordagem dos danos
ambientais e seu entorno propriamente ditos.
44
ATHIAS, Jorge Alex Nunes apud BENJAMIN, obra citada, Responsabilidade Civil e Meio Ambiente – Breve
panorama do Direito Brasileiro.
30
Juntamente com o veto presidencial ao artigo 5º, deu-se também o veto ao artigo
1º do Projeto de Lei n.º 1.164-E/91, que estabelecia que condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente seriam punidas “com sanções administrativas, civis e penais, na forma estabelecida
nesta Lei”, sendo que a ementa da Lei n.º 9.605/98 não prevê disposição sobre sanções civis,
somente administrativas e penais, ou seja, não trata o assunto completamente.
Assim, com a impossibilidade de considerar que a nova lei afasta as anteriores
por supostamente englobar completamente o tema, permanecem os mandamentos dispostos na
nova lei como normas complementares e compatíveis com o princípio da reparabilidade de
danos ao meio ambiente e a terceiros, como estabelecido na Lei n.º 6.938, de 1981.
45
Observe-se o texto do artigo 5, do Projeto de Lei 1.164-E/91: “Sem prejuízo do disposto nesta lei, o agente,
independentemente da existência de culpa, é obrigado a indenizar ou reparar os danos por ele causados ao meio
ambiente e a terceiros afetados por seus atos”.
46
SAMPAIO, obra citada, p. 140. O autor recomenda verificar as reportagens veiculadas a respeito no Jornal O
Globo, nos dias 9 e 13 de fevereiro de 1998.
31
que culminaram com a aprovação do Decreto n.º 79.347/77 e da Lei n.º 6.453/77, sendo
posteriormente estendida aos danos ambientais de qualquer natureza.
Para Antônio Herman Benjamin, a instituição da responsabilidade objetiva no
âmbito da defesa do meio ambiente é decorrente da constatação da impossibilidade de
alcançar, sem ela, esse objetivo de defesa e garantir um mínimo de proteção desejada. Essa é
também uma tendência do direito estrangeiro. Segundo Benjamin, os princípios clássicos e
tradicionais da responsabilidade civil nunca funcionaram adequadamente, como ele explica:
alguma sorte, deve ser apanhado nas tramas da responsabilidade objetiva); c) a inversão do
ônus da prova; d) a irrelevância da licitude da atividade; e, ainda, e) a atenuação do relevo do
nexo causal.48
A respeito da responsabilidade objetiva no âmbito do direito ambiental, é, ainda,
interessante proceder a uma sucinta verificação no posicionamento e nos ensinamentos
básicos proporcionados pelos principais doutrinadores.
Aquele autor ainda menciona que ao não perquirir da existência de culpa, melhor
se tutela o bem-interesse que se quer preservar e faz pequena crítica à Lei n.º 6.938/81:
Paulo Affonso Leme Machado, referindo-se a quem por ação ou omissão agride
o meio ambiente, observa51:
50
MILARÉ, Édis. Legislação Ambiental e participação Comunitária. In: Universidade e sociedade em face à
política ambiental brasileira. IV Seminário Nacional sobre Universidade e meio ambiente, 19 a 23 de novembro
de 1990, UFSC.
51
Em referência feita por RUI STOCO, em sua obra: Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial,
p. 269.
34
julgado com pedido procedente, realizado em ação civil pública. Dessa forma, ao já ter sido
julgado e condenado o agente pelos danos causados a interesses difusos e coletivos, não
necessitam os particulares propor novo processo de conhecimento para buscar a reparação de
danos desta vez individuais que tenham origem no mesmo fato danoso.
Para alguns autores, o dispositivo apresentado veio a expor a diferenciação
existente entre os danos ambientais propriamente ditos e suas conseqüências aos patrimônios
particulares.
Em virtude do estabelecido pelo artigo 103, parágrafo 3º, discutem diversos
autores sobre a aplicabilidade ao Direito Ambiental daquele pensamento, inclusive pelo que
dispõe o artigo 117 do mesmo CDC, a seguir transcrito:
Pelo que se entende dos argumentos e posições de diversos autores, entre eles o
último citado, parece ser de difícil absorção por parte destes a idéia do pensamento pró-
ambiente na esfera jurídica, ao passo que facilmente se constrói um raciocínio restritivo
quanto à defesa contra danos causados na esfera do meio ambiente.
Deve, ainda, ser evidenciado entre os pontos de inter-relacionamento
observados, a previsão expressa da responsabilidade civil objetiva inserida nos artigos 12 a 14
do Código de Defesa do Consumidor.
55
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública: comentários por artigo. 1ª ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1995, p. 381-384.
56
DIAS, José de Aguiar. Obra citada, p. 35
57
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 42.
37
58
MACHADO. Obra citada, p. 277, ressaltando a importância das obras de Patrick Girod, “La réparation du
dommage écologique” e de Giles Martin, “Le droit à L’Environnement”.
59
MARTIN, Giles. Le droit à environnement – De la responsabilité civile pour faits de pollution au droit à
environnement. Publications Périodiques Specialisées, 1978.
38
Esse pensamento, que norteia a teoria da responsabilidade civil, deve ser visto
sempre no contexto da legislação ambiental, ou seja, levando em consideração, por exemplo,
a inversão do ônus da prova, que é uma importante conseqüência da adoção da
responsabilidade objetiva, através da qual pode-se partir da presunção de que o agente causou
o prejuízo e, por isso, este deverá provar, no sentido de excluir sua responsabilidade.
No caso de que a atividade do agente seja potencialmente capaz de produzir
efeitos danosos ao meio ambiente, deverá ser logo invertido o ônus da prova, produzindo-se
imediatamente a presunção de responsabilidade quanto ao agente, a partir da qual o
presumido poluidor procurará as provas que lhe excluam a responsabilidade.
A causa exata de um ou de vários danos simultâneos causados ao meio ambiente
pode ser algo de difícil descoberta, inclusive havendo a possibilidade de pluralidade de
autores, ou seja, vários focos poluidores, o que pode tornar muito mais trabalhoso o
estabelecimento de uma relação de causalidade que possa indicar certamente aquele que deve
ocupar-se da reparação correspondente.
Desse modo, a relação de causalidade tem que ser comprovada, sendo incabível
a reparação quando esta não o for, ou, no caso da inversão do ônus da prova, o agente
comprovar que não deu causa ao dano.
Ainda no plano da conexão causal, o Prof. Andreas Joachim Krell, tem opinião
peculiar a respeito do assunto, como pode-se concluir da recente observação:
62
KRELL, Andreas Joachim. Concretização do Dano Ambiental – algumas objeções à teoria do “risco
integral”. Http:/www.jurinforma.com.br/artigos/0024.htm (06/06/99).
63
Os primeiros referem-se aos interesses difusos, como o direito, de toda a coletividade, a um meio ambiente
equilibrado e saudável. Os segundos são afetos aos patrimônios individuais ou de grupos definidos ou
delimitáveis, apesar de serem conseqüências de danos ambientais.
40
“Responsabilidade Objectiva:
1 – Existe obrigação de indemnizar, independente de culpa, sempre
que o agente tenha causado danos significativos no ambiente, em
virtude de uma acção especialmente perigosa, muito embora com
respeito do normativo aplicável.”
Nota-se que apesar de ser adotada a responsabilidade civil com base no risco
pelo exercício de atividade, a legislação portuguesa não a coloca como princípio absoluto,
sendo necessários determinados requisitos para a decretação da responsabilidade sem culpa,
como a obrigação do dano ser significativo e ter resultado de atividade especialmente
perigosa, diferentemente do que ocorre no Brasil, pois a Lei n.º 6.983/81 não faz esse tipo de
referência. Imaginem-se as controvérsias que podem surgir em torno de conceitos como dano
ambiental significativo e atividade especialmente perigosa.
Na legislação alemã, país largamente industrializado e que abrange a antiga
Alemanha Oriental, seriamente afetada por problemas ambientais, evidencia-se um tratamento
distinto ao que se observa nos ordenamentos brasileiro, francês e italiano entre outros, na
esfera civil, pelo fato de não existir uma regra geral para a reparação de danos, nem mesmo a
tipificação das infrações geradoras da obrigação de indenizar.
64
PRIEUR, Michel. Obra citada, p. 1.040.
41
65
Apud PERALES, Carlos Miguel. La responsabilidad civil por daños al médio ambiente. Madri: Editora
Civitas S. A., 1994.
42
todos os danos que contribuem para a degradação dos elementos naturais, como é o caso da
água, do ar e do nível de ruído, sendo portanto, o dano causado pelo homem ao meio
ambiente.70
Baseando-se no texto da Constituição Federal, em seu artigo 225, parágrafo 3º, e
em harmonia com este, José Afonso da Silva admite como dano ecológico qualquer lesão ao
meio ambiente causada por condutas ou atividades de pessoa física ou jurídica de direito
público ou de direito privado.71 Deve ser ressaltada a radical mudança de enfoque desse autor,
em relação aos conceitos básicos no que diz respeito ao meio ambiente, passando de uma
postura eminentemente antropocêntrica, no início dos anos 80, para uma nova visão que
contempla o meio ambiente em todas as suas formas de vida, exibida em sua última obra
citada, datada de 1998.72
Sérgio Ferraz, define o dano ambiental como “toda lesão defluente de qualquer
agressão à integridade ambiental”.73
Conceituar dano ambiental, para diversos autores parece ser atividade bastante
simples, situação na qual não se pode comparar com a importante tarefa de comprovar a
ocorrência desse dano. Seguindo essa linha de pensamento, desenvolver-se-á no próximo sub-
capítulo uma análise quanto à referida comprovação e seus maiores obstáculos.
70
GIROD, Patrick. La réparation du dommage écologique. Paris: Librairie Genérale de Droit et de
Jurisprudence, 1974, p. 13.
71
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 207.
Constituição Federal, artigo 225: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de
reparar os danos causados”.
72
SILVA, José Afonso da. Obra citada, p. 2.
73
FERRAZ, Sérgio. Responsabilidade Civil por dano Ecológico. RDP 49/50, p. 35.
45
por produtos químicos. Da mesma maneira acaba sendo difícil comprovar que um dano
ambiental realmente tenha ocorrido.
Não é raro ocorrer, que na proposição de uma ação civil pública de
responsabilidade por danos ambientais, o Poder Público, ou as associações civis de proteção
ao meio ambiente, também legitimadas pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 198574, se depare
com um obstáculo ao ter que apresentar ao juízo provas claras e conclusivas da ocorrência do
dano ambiental.
Uma das grandes dificuldades se configura quando é necessário provar danos
cuja natureza faz com que se manifestem ao longo do tempo, podendo ser em anos ou
décadas.
A dificuldade que se verifica na realização da prova dos danos ao meio ambiente
fica evidenciada na jurisprudência selecionada, como pode ser verificado no correspondente
anexo ao presente trabalho. É comum nos tribunais, como poderá ser visto oportunamente, o
entendimento judicial no sentido da insuficiência das provas, negando por esse motivo a
condenação dos supostos poluidores ou a adoção de medida preventiva requerida.
Assim, se manifestou o Desembargador Eder Graf, ao relatar apelação cível, da
Comarca de Florianópolis, publicada no DJESC em 13 de setembro de 1991, cujo acórdão
encontra-se também incluído nos anexos:
74
Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a
bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e dá outras providências. Por motivo
de delimitação de tema, não constitui objetivo deste trabalho o estudo pormenorizado dos meios processuais de
proteção ambiental.
75
BENJAMIN. Obra citada, p. 234.
46
Comprovar alguma coisa que ainda não aconteceu, ou seja, que ainda está no
plano futuro, certamente não é das tarefas mais simples, sendo no âmbito da defesa do meio
ambiente uma das questões mais discutíveis. Como comprovar e avaliar um dano ambiental
que vai sendo provocado aos poucos, se os seus efeitos somente se manifestarão no futuro?
Sobre a possibilidade de fazê-lo ou não, há opiniões bastante divergentes entre aqueles que,
de alguma forma, se debruçaram sobre o tema.
O maior problema desse tema é verificar que muitos danos ocorridos por todo o
mundo, alguns irreparáveis, eram deveras previsíveis e, talvez em muitos dos casos passíveis
de ser comprovados.
Muitas vezes o dano futuro não pode ser comprovado de plano, vindo assim a
ocorrer efetivamente no futuro, sem que se tenha podido adotar qualquer medida em sentido
contrário. Por isso, devem ser medidos seus efeitos, tanto quanto seja possível, através de
provas periciais. Sendo viável demonstrar que um certo efeito decorre normalmente de um
dano ocorrido, mesmo que não fique evidente que já ocorreu, ou que vá ocorrer, deveriam ser
adotadas medidas, no sentido de minimizá-lo. Estas ficariam a cargo do causador, ou seriam
custeadas por este.
Nessa linha de pensamento se expressa Francisco José Marques Sampaio:
76
BENJAMIN. Obra citada, p. 234. In: A responsabilidade objetiva do poluidor no direito ambiental brasileiro.
Monografia de conclusão de curso de graduação em direito na Universidade Federal de Santa Catarina,
apresentada em dezembro de 1996, pela bacharelanda Daniele Cana Verde Fernandes.
47
“Em geral, eles ( Tribunais brasileiros) têm adotado uma postura que
exige o dano real e não apenas o dano potencial. Parece-me que não
têm sido aplicado e observado o princípio da cautela em matéria
ambiental que, como se sabe, é um dos princípios básicos do Direito
Ambiental”.78
Dessa forma, acaba sendo admitido, em alguns casos, uma espécie de “perigo
socialmente aceitável”. Assim, muitas vezes o interesse financeiro, principalmente
relacionado a grandes obras, se sobrepõe ao interesse da coletividade em preservar ou
proteger, demonstrando a influência dos fatores econômicos também na área ambiental.
É nesses casos que se evidencia a importância do princípio da precaução,
proclamado pela Carta do Rio de Janeiro, em 1992.
77
SAMPAIO. Obra citada, p. 230.
78
ANTUNES, Paulo de Bessa. Obra citada, p. 148.
48
Avaliar um dano ambiental é considerada uma tarefa complexa e que pode ficar
envolta em uma grande controvérsia. Surgem inevitavelmente certos questionamentos como:
é possível, ou não, fixar um valor justo para a vida de um animal ou para a de toda uma
floresta ? Qual o preço da vida existente em um determinado trecho de um rio ? A morte de
um animal ou de uma planta pode ser compensada arbitrando-se um valor a ser pago pelo
responsável ? E a extinção de uma espécie ?
Como pode ser percebido, a discussão sobre o assunto é de uma complexidade
muito elevada, sendo que as questões supracitadas não estão próximas de obter uma resposta
de consenso ou que seja aceita facilmente.
Para Antônio Herman V. Benjamin, um problema sério em relação à avaliação de
um dano ambiental é o fato de que se calcula o valor global e final da indenização sobre o
dano imediatamente visível, que ele chama de a ponta do iceberg.79 Essa comparação
sugerida pelo autor, demonstra sua idéia de que grande parte do dano ambiental não é sequer
constatada, discutida ou reparada.
Esse autor ainda referindo-se às deficiências do sistema legal, lembra em sua
obra já citada que a grande maioria das ações civis públicas propostas no Brasil está
absolutamente parada exatamente na fase de cálculo do dano causado.
Finalmente, no sub-capítulo 3.4 ainda serão observados aspectos da natureza
econômica que possui o Direito Ambiental, através de diversos fatores econômicos presentes
e que não devem ser desconsiderados.
quantidade de árvores, pela “idade” das mesmas, pela quantidade de espécies que na dita
floresta habitam ou por qualquer outro critério ?
Como foi visto anteriormente, comprovar um dano ambiental é muito difícil,
sendo consequentemente de tanta ou mais dificuldade fazer essa comprovação em termos de
quantificação ou de gradação.
A exatidão, que normalmente é o ideal buscado em casos de reparação, é mais
difícil de ser alcançada quando o bem em tela é o meio ambiente, considerando-se toda a
gama de modos de vida que podem ser atingidos por uma atividade poluidora.
A jurisprudência tem entendido que a avaliação feita de um determinado dano
ambiental não deve ser necessariamente exata, em razão das dificuldades que cercam essa
tarefa. Essa postura têm reflexos positivos para a tutela que se procura implementar, na
medida em que diminui a possibilidade de retardos desnecessários no processo de avaliação
dos danos.
80
BENAKOUCHE, Rabah & SANTA CRUZ, René. Obra citada, p. XI.
50
84
Para estudo do Impacto Ambiental, ver: ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 1998, p. 159 e seguintes; MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São
Paulo: Malheiros, 1998, p. 157 e seguintes; e CAPELLI, Silvia. O Estudo de impacto Ambiental na Realidade
Brasileira. In: BENJAMIN, Obra citada, p. 152 e seguintes.
85
MACHADO. Obra citada, p. 174.
52
Não é difícil perceber, pelo que foi anteriormente explicitado, que quase
invariavelmente interesses econômicos e de preservação ambiental se contrapõe uns aos
outros, quando vistos em casos concretos.
Outra conseqüência de caráter econômica, advêm do reconhecimento, por parte
da legislação ambiental, da responsabilidade civil objetiva por danos ao meio ambiente,
reconhecendo o risco como fundamento da indenização. Desse fato decorre consequentemente
um aumento dos custos das atividades potencialmente perigosas, em razão da necessidade de
prever o pagamento de indenizações a eventuais vítimas.
Também se pode considerar como um aspecto econômico do Direito do Meio
Ambiente, a relação existente entre sua preservação e as condições de vida da maior parte da
população. De tal maneira, é possível aproveitar o que observa Fritjof Capra, referindo-se à
importância do pensamento sistêmico em relação aos problemas de nossa época:
86
CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida – uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix,
1996, p. 23.
53
Realmente, a sua faceta econômica, deve ser uma das grandes dificuldades a ser
superadas pelo Direito Ambiental, para tutelar eficazmente o meio ambiente. Assim, afim de
evitar que o poder econômico se sobreponha ao interesse e o bem comum, será preciso um
árduo, porém valioso trabalho dos operadores do direito.
Entre as tantas lutas incluídas no referido trabalho, certamente se encontra a
valorização da reparação do dano ambiental, como ponto de essencial importância à questão
do meio ambiente.
4. A REPARAÇÃO DO DANO COMO PONTO ESSENCIAL
Do estudo realizado neste trabalho, até o presente capítulo, pôde ser percebido o
conjunto de fatores que envolve o tema da preservação do meio ambiente e da importância
que isso têm para todos os tipos de vida e, principalmente, para as gerações futuras. Isto
posto, se vê que toda essa análise desemboca no fato evidente de que os danos já causados, e
os que ainda não o foram, deverão ser reparados.
Para autores como Antônio Herman V. Benjamin, as modificações legislativas
que incorporaram, entre outros, o princípio do poluidor pagador ao Direito Ambiental não
conseguiram superar um obstáculo intransponível. O autor julga ser esse obstáculo, o fato de
o dano ambiental nem sempre ser reparável.88 Traduz essa idéia, sua seguinte observação:
87
CAUBET, Christian Guy. Recursos Hídricos e participação dos usuários na gestão. Seminário de doutorado,
UFSC – CPGD, 12 de junho de 1999.
88
BENJAMIN. Obra citada, p. 235.
89
BENJAMIN. Obra citada, p. 235.
54
90
OLIVEIRA JÚNIOR, Waldemar Mariz de. Série de estudos jurídicos – A tutela dos interesses difusos. Editora
Max Limonad, 1984, p. 159-160.
91
Nesse sentido se manifesta Paulo de Bessa Antunes, em obra já citada, na qual o autor observa que a atividade
ambiental deve ser regida fundamentalmente pelos critérios preventivos.
55
92
SAMPAIO. Obra citada, p. 130.
93
Lei n.º 9433/97, Apresentação – Estágio Atual dos Aspectos Institucionais da Gestão de Recursos Hídricos no
Brasil, p. 03.
94
Constituição Federal, artigo 20: “São bens da união: (...) III – os lagos, rios e quaisquer correntes de água em
terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se
estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais”.
Artigo 26 : “Incluem se entre os bens dos Estados: I – as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes
e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União”.
56
Além da citada lei, diversas outras se referem às águas de maneira geral, como a
Lei n.º 5.318, de 1967, que institui a Política Nacional de Saneamento; a Lei n.º 5.357,
também de 1967, que estabelece penalidades para embarcações marítimas e fluviais que
lancem detritos ou óleo em águas brasileiras; o Decreto n.º 94.076, de 1997, que instituiu o
Programa Nacional de Microbacias Hidrográficas; e a Lei n.º 7.661, de 1988, que instituiu o
Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro.
4.1.2 A PROTEÇÃO DA QUALIDADE DO AR
Em relação ao ar, sua proteção contra poluição por vapor, gás, fumaça e poeira,
objetiva manter o grau de pureza no qual se considera saudável. Ensina Paulo Affonso Leme
Machado que, vapor é o gás que pode condensar-se em condição normal como o vapor
d’água; gás é a substância que normalmente mostra-se no estado gasoso e não se condensa;
poeira são as partículas sólidas finamente divididas e fumaça são partículas sólidas com
gotículas de líquidos e vapores.95
O ar é tutelado através da fixação de padrões de qualidade, estabelecidos pela
Portaria do Ministério do Interior n.º 231, de 27 de abril de 1976, padrões estes que são:
95
MACHADO. Obra citada, p. 287.
57
96
MACHADO. Obra citada, p. 449.
58
97
MACHADO. Obra citada, p. 50.
98
CUSTÓDIO, Helita Barreira. Obra citada, p. 128.
59
102
CAPRA, Fritjof. Obra citada, p. 24.
103
ANTUNES, obra citada, p. 17.
104
MACHADO, obra citada, p. 290.
61
Verdade é que não há como escapar da idéia de retorno a uma situação da qual
não se deveria ter saído. Não deve ser admitida com facilidade a hipótese de que um
determinado dano é irrecuperável.
105
Ver Acórdão n.º 40.190, em apelação cível, da Comarca de Biguaçú, cujo inteiro teor se encontra em anexos à
presente monografia.
106
Vocabolario della Lingua italiana, Firenze, Le Monnier, 1994.
62
É sabido que em Direito Penal, quando a morte de uma pessoa é provocada por
outra, não cabe condenação do culpado no sentido de fazer a vítima retornar ao estado
anterior. Se essa possibilidade existisse, independentemente do tempo para isso necessário,
desconsiderando-se as implicações de ordem religiosa, provavelmente haveria sua previsão
legal.
Pois bem, comparando um rio a uma pessoa na situação de vítima, pode ser
verificado que o rio “morto” pode vir a ser recuperado; uma área de mangue “morta”
igualmente pode ser passível de recuperação, ou , no mínimo pairam dúvidas quanto a isso.
Essa questão é colocada, em virtude da constatação de uma tendência a se
considerar danos ambientais como irrecuperáveis.107
Nota-se que na realidade o que acontece não é a irrecuperabilidade do bem,
ainda que parcial, mas o fato de não compensar de acordo com análise custo-benefício.
Se espera que a degradação ambiental não chegue ao ponto de que se tornem
necessárias condenações a “ressuscitar” rios, mangues e outros.
Infelizmente, pelo que se pode constatar em diversos momentos do estudo do
Direito Ambiental, principalmente no que se refere à reparação dos danos ambientais, há,
ainda, muitos obstáculos no caminho a ser percorrido. Alguns deles, podem ser considerados
como óbices ao alcance dos resultados buscados.
A seguir, esse tema será, por sua pertinência, convenientemente analisado.
107
Ver acórdão anexo, apelação cível n.º 40.190, da Comarca de Biguaçú.
63
Assim, é possível imaginar a atenção dada (ou a falta dela) à proteção ambiental
nos cursos de direito realizados pelos atuais magistrados.
Assim expõe Paulo de Bessa Antunes:
O referido autor critica o Poder Judiciário pelo fato, segundo seu entender, de
que este têm abdicado de sua função cautelar em favor de uma atividade eminentemente
repressiva que, no âmbito do Direito Ambiental, é de eficácia discutível.
Ainda no âmbito do judiciário, outro óbice considerado é a necessidade de
perícias para a resolução de grande número de ações, as quais sofrem com as deficiências de
ordem material e de pessoal. Dessa forma, não é raro o fato serem inviabilizadas condenações
à reparação em virtude da inexistência de prova científica do dano ambiental.109
Para Antônio Herman V. Benjamin o processo civil também se constitui em um
óbice:
Esse caso, pelo que se vê, seria bom assunto para uma possível reforma
processual. O autor lembra que a grande maioria das ações civis públicas propostas no Brasil
está absolutamente parada na fase de cálculo do dano causado.
Também entre os óbices, se incluem as dificuldades em comprovar a existência
do dano e o nexo de causalidade, tratados especificamente em capítulos anteriores.
Inicialmente a prova do nexo causal ainda é encargo da vítima do prejuízo ou de seu
representante, Ministério Público ou Organização Não Governamental – ONG.
108
ANTUNES, Paulo de Bessa. Obra citada, p. 150.
109
Ver jurisprudência selecionada – apelação cível n.º 211.502-1 – Tribunal de Justiça de São Paulo, datada de o8
de março de 1995, em anexo.
110
BENJAMIN. Obra citada, p. 234.
64
Não pode ser esquecido como um dos óbices, no contexto geral da questão do
meio ambiente, o vultuoso interesse econômico que gira em torno dos bens que compõe o
meio ambiente. É provável que este interesse esteja na base de diversos outros óbices ainda
não solucionados. Como foi observado no espaço destinado ao caráter econômico do meio
ambiente, os recursos naturais podem gerar lucros gigantescos, não sendo prudente
subestimar as conseqüências desse fator.
Dentro do quadro geral onde se apresentam tantos obstáculos à reparação efetiva
dos danos ambientais, se torna imprescindível que sejam apresentadas, igualmente,
alternativas e outros procedimentos que auxiliem a reduzir as conseqüências desses óbices.
Dessa forma, serão expostas as alternativas e modificações propostas por autores
mencionados neste trabalho.
111
BENJAMIN. Obra citada, p. 234.
112
MACHADO. Obra citada, p. 287.
113
ANTUNES. Obra citada, p. 25.
66
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não se quer apontar nada como absoluto, haja vista a rápida evolução de alguns
conceitos e posicionamentos atualmente, em especial no que se refere à prioridade que deve
receber a questão da proteção do meio ambiente, mas destacar aqueles pontos de maior
relevância e que se mostram mais evidentes.
Assim, se verifica a importância de desenvolver um estudo versando sobre a
responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente e sua respectiva reparação, em
virtude da vasta gama de ameaças advindas do desenvolvimento mal planejado, das ações
pouco fiscalizadas e da falta de consciência a respeito. Por esse motivo principal foi o assunto
escolhido como objeto deste importante trabalho monográfico de conclusão de curso.
A monografia que ora se conclui, foi dividida basicamente em quatro partes,
cada uma compondo um capítulo específico. Em seu primeiro capítulo, a intenção maior foi
transmitir uma noção inicial a respeito do histórico da legislação ambiental brasileira, da
conceituação doutrinária sobre meio ambiente e poluição e, também, apresentar os princípios
básicos da questão ambiental.
Em um segundo momento, foi motivo de análise, a relação estabelecida entre a
responsabilidade civil e os danos ambientais, verificando como se deu a instituição da
responsabilidade objetiva na legislação brasileira. Contou ainda, o referido capítulo, com uma
breve abordagem dos pontos de tangência entre a proteção ambiental e a defesa do
consumidor.
O terceiro capítulo tratou do dano ao meio ambiente e o problema que envolve
sua comprovação e conseqüente valoração, passando por questões como a avaliação
monetária do meio ambiente e o dano futuro.
Assim, restou ao quarto capítulo ater-se à reparação do dano em seu caráter
essencial para que se alcance o almejado objetivo de evitar ou, pelo menos, retardar efeitos
maiores de degradação ambiental. Nesta última parte ainda tiveram lugar a exposição de
alguns óbices levantados pelos principais doutrinadores, bem como sucintas sugestões de
alternativas e modificações, que se julgadas cabíveis, podem reduzir as conseqüências dos
obstáculos apresentados.
Twenty-two points, plus triple-word-score, plus fifty points for using all my
letters. Game's over. I'm outta here.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 2ª edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
1998.
68
CAPRA, Fritjof. A teia da vida – uma nova compreensão científica dos sistemas vivos.
São Paulo: Cultrix, 1996
ECO, Umberto. Como se faz uma tese. 12ª edição. Trad. de Gilson César Cardoso de
Souza. São Paulo: Perspectiva, 1995. 170 p.
LACOSTE, Yves. A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra.
Campinas: Papirus, 1988.
LAGO, Antônio & PÁDUA, José Augusto. O que é ecologia. 12ª edição. São Paulo:
Brasiliense, 1993.
LEITE, Eduardo de Oliveira. A monografia jurídica. 3ª edição. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997.
69
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 7ª edição. São Paulo:
Malheiros, 1998.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação civil pública. 3ª edição. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1994.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil – responsabilidade civil. 14ª edição, volume 4. São
Paulo: Saraiva, 1995.
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 2ª edição. 3ª tiragem. São
Paulo: Malheiros, 1998.
70
INTERNET:
Http://www.jurinforma.com.br/artigos/0024.htm
Http://home.techno.com.br/vidagua
67
ANEXO I
JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA
Ação Civil Pública – Dano Ambiental – Área de mangue aterrada para fins de
loteamento – Aprovação pela Prefeitura – Irrelevância – Direito adquirido
inexistente – Responsabilidade objetiva – Prejuízo ecológico irrecuperável. Ao
poluidor responsável por fato lesivo ao meio ambiente descabe invocar a
ilicitude da atividade ensejada pela autorização da autoridade competente. A
responsabilidade no âmbito da defesa ambiental é objetiva. O mangue constitui-
se numa reserva natural de árvores e arbustos, abrigando variadas espécies de
aves e animais. Bastante é a prova do nexo causal entre a ação do poluidor e
o dano, para que nasça o dever de indenizar. (TJ/SC - Apelação Cível n.º
40.190, Comarca de Biguaçú – SC. Ac. Unân. – 4 Câm. Cív. - Relator Des.
Alcides Aguiar. Fonte: DJSC, 07/02/96, pág. 12).
71
Ação Civil Pública – Cana de açúcar – Queimada para limpeza do solo, plantio
e colheita – Inadmissibilidade – Liberação de gases altamente poluentes –
Inexistência de prova científica de dano ambiental – Responsabilidade
objetiva, contudo configurada – Prejuízos causados à saúde da população –
Recursos não providos. Ínfima é a relevância de eventual dano ao meio
ambiente quando causado dano à população, visualisado sob a égide da
72
67
ANEXO I
JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA
Ação Civil Pública – Dano Ambiental – Área de mangue aterrada para fins de
loteamento – Aprovação pela Prefeitura – Irrelevância – Direito adquirido
inexistente – Responsabilidade objetiva – Prejuízo ecológico irrecuperável. Ao
poluidor responsável por fato lesivo ao meio ambiente descabe invocar a
ilicitude da atividade ensejada pela autorização da autoridade competente. A
responsabilidade no âmbito da defesa ambiental é objetiva. O mangue constitui-
se numa reserva natural de árvores e arbustos, abrigando variadas espécies de
aves e animais. Bastante é a prova do nexo causal entre a ação do poluidor e
o dano, para que nasça o dever de indenizar. (TJ/SC - Apelação Cível n.º
40.190, Comarca de Biguaçú – SC. Ac. Unân. – 4 Câm. Cív. - Relator Des.
Alcides Aguiar. Fonte: DJSC, 07/02/96, pág. 12).
Ação Civil Pública – Cana de açúcar – Queimada para limpeza do solo, plantio
e colheita – Inadmissibilidade – Liberação de gases altamente poluentes –
Inexistência de prova científica de dano ambiental – Responsabilidade
objetiva, contudo configurada – Prejuízos causados à saúde da população –
Recursos não providos. Ínfima é a relevância de eventual dano ao meio
ambiente quando causado dano à população, visualisado sob a égide da
responsabilidade civil objetiva. (Apelação Cível n.211.502-1 – Comarca de
Sertãozinho. Relator: Cambrea Filho – CCIV 7 – V.U. – 08/03/95).
Fumus boni iuris e periculum in mora não configurados – Recurso não provido.
(Agravo de instrumento n.º 5.197-5. Nuporanga – Tribunal de Justiça de São
Paulo. 3ª Câmara de Direito Público – Rel. Viseu Júnior – 30/04/96)