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ondas de paixão

a orillas del amor

aloe azid

cabelos ruivos como fogo e olhos verdes como algas, atraente como um abismo e
deslumbrante como uma montanha, emma contemplava o horizonte do mar como se dali
lhe viesse o amor por que tanto ansiava.
sentada na fina areia, escrevia.
??para quando o amor? para quando? era a pergunta obsessiva que lhe preenchia a mente. a
falta de amor fazia-a experimentar um vazio. havia dias em que sentia a necessidade fisica
de abraçar alguém e só podia abraçar o ar. pensava: ??tenho tanto amor em mim que ele se
me escapa pelos poros da pele.?? escrevendo, podia desabafar, podia transportar-se para lá
de si mesma, podia viver mais do que na vida real, podia inclusive amar. escrevia para
receber amor. com o título ??a carícia??, escreveu:
tenho a pele seca e áspera de solidão, ávida de amor. está tão pálida e mortiça que se tornou
intermitentemente translúcida ao olhar. tão delgada que qualquer olhar pode fazê-la tremer.
procura, neste invernoso acristalado solidão e ali te encontrarás no outro lado da vida. a
minha pele irisa-se; com a esperança, tiro o calor do teu sorriso de luz, tinge-se de miragens
nesta janela em que apareceste. inventa os teus desenhos; inventa dimensões para os olhos.
admiração, para engrandecer.
aspontas dos nossos dedos tocam-se atraindo cristal. por isso escrevo, para sentir a tua
caricia virar a página, o único cristal de tacto quente.
de repente, fitou as ondas, fechou o caderno, suspirou e levantou-se para se dirigir para a
cidade.
enquanto, como sucedia todos os dias, emma estava a contemplar o mar, dulce e stela
falaram dela:
- não te parece, stela, que ultimamente a emma anda apática?
- também reparaste? É verdade que anda sempre de sorriso e nunca deixa de nos falar, mas
há já uns dias que. . . não sei, falta-lhe brilho nos olhos. desde que o último namorado a
abandonou, deixou de ser a mesma.

atravessou três ruas afastadas da marginal e entrou no cabeleireiro onde trabalhava.


três jovens encontravam-se ali. tinham-se tornado amigas na escola de cabeleireiros.
quando passaram a dominar bem o ofício, decidiram arriscar- se e trabalhar por conta
própria. conseguiram muntar um negócio com muito esforço, muito trabalhlo e crédito que
levariam trinta anos a pagar (se tudo corresse bem), alugaram um salão, mobilaran-no e
compraram tudo o que era necessário: secadores, escovas, tintas, etc. estavam juntas há
poucos meses e haviam conseguido granjear uma boa clientela naquele bairro modesto.

emma cumprimentou dulce e stela e as duas clien tes que estavam a ser atendidas. dirigiu-se
ao vestiário para vestir a bata. ao sair, viu que um rapaz esperava a vez. era louro e magro.
- boas tardes - cumprimentou-o. - que deseja?
- boas tardes. queria cortar o cabelo - respondeu.
- sente-se aqui.
emma começou o procedimento rotineiro.
emma assumiu um ar profissional e perguntou ao jovem:
- diga-me: como quer o corte de cabelo? ele mostrou um amplo sorriso:
- um corte à escovinha, mas antes queria que mo lavasse.
- muito bem. então, terá de passar para aqui - respondeu emma, sem poder evitar franzir a
testa num gesto de surpresa e certo enfado.
o rapaz instalou-se, atirou a cabeça para trás até a pousar no bordo do lavatório e fechou os
olhos. emma molhou-lhe os cabelos com vigor, aplicou o champô e começou a massajar-lhe
o couro cabeludo e a nuca. a princípio, de forma descuidada, depois cada vez com maior
suavidade, num ritmo cada vez mais hipnótico. os dedos entrelaçavam-se com os
compridos cabelos do rapaz e os olhos dirigiam-se para o mar, que podia ver ao longe, e
que os deixou quedados. na nuca, demorou-se mais do que o necessário. uma veloz gaivota
despertou-a do transe.
o rapaz havia adormecido. emma enxaguou as
mãos e passou por água morna os cabelos do jovem, ?fazendo a massagem devagar, muito
devagar; concentrou-se uma vez mais na nuca, mais do que o necessário. stela passou a seu
lado e estalou os dedos. ema e o rapaz abriram os olhos ao mesmo tempo. ema secou-lhe o
cabelo apressadamente. quando
acabou, ele ainda levou meio minuto a abrir os olhos. então, emma pôde ver- lhe os olhos
velados como se regressassem de um sonho profundo num pa?is longínquo, sem reconhecer
o que o rodeava.
- tem um fio muito bonito - disse-lhe ela com um sorriso.
?e levou tempo a perceber. quando, por fin, chegou a um entendimento, não soube que
responder: ' hum..., ah, pois.
levou a mão ao fio e acariciou-o, ainda confuso. riu lentamente e olhou à sua volta,
tentando levantar-se.
emma conduziu-o até à cadeira.
como é que disse que queria o corte?
a escovinha.
ema começou a cortar-lhe o cabelo com a máquina. o jovem fechou os olhos. emma passou
a máquina pelo lado esquerdo, depois pela nuca do lado direito. aparou a nuca com a
navalha e depois, com a mesma navalha, esmerou-se a desenhar o contorno da orelha
esquerda e depois a orrelha direita. ele seguia-a de olhos fechados. ema passou então para a
zona frontal e viu que ele a fitava intensamente. emma corou. a partir desse momento, ele
não deixou de a fitar. a timidez permitiú a emma comprovar furtivamente como a admirava,
fascinado pela sua cabeleira ruiva e sua pele branca. sentiu que a admiravam como nunca
antes fora admirada. acabou os últimos retoques do corte.
o rapaz pagou e foi- se embora sem proferir palavra.
dulce piscou o olho a emma.
ao fim de um mês, o rapaz tornou a aparecer.

- À escovinha - disse ao sentar-se, fitando ema durante vários segundos, até que ela
começou a aplicar-lhe a máquina na nuca.
então, ele fechou os olhos. quando emma estava acabar o corte de cabelo, o rapaz abriu os
olhos, fitou-a e disse-lhe:
- chamo-me hector.
emma ficou sem saber o que responder, sorriu e ao fim de alguns segundos apresentou-se:
- eu sou a ema.
não disseram mais nada. emma acabou de o pentear e ele pagou com uma nota que deixou
no balcão. saiu depressa dizendo: ??até à próxima". debaixo da nota, estava um bilhete para
o cinema; o filme era out ofafrica, para a sessão das seis da tarde do dia seguinte no cinema
paraíso.
emma gostava de cinema e aquele era o filme que estava desejosa de voltar a ver. ficou
estupefacta a contemplar o bilhete e a porta por onde ele acabara de sair. até que dulce lhe
chamou a atenção.
- que se passa, emma?
- ofereceu-me um bilhete.
- um bilhete?
- sim, de cinema.
- verdade? - exclamou dulce, com um sorriso e a boca aberta de espanto.
- sim, olha.
e emma mostrou-lho. dulce apreciou longamente o bilhete.
- parece verdadeiro.
- claro que é verdadeiro, tonta - respondeu emma, sorrindo para a piada de dulce. - isto é
incrível. estou a ficar nervosa.
- não te preocupes. se quiseres, eu e a stela vamos contigo.
- obrigada, mas também não quero estragar o filme.
- já sei o que podemos fazer, emma. a stela e eu vamos incógnitas e ficamos a vigiar-vos à
distância. de acordo?
emma olhou-a de alto a baixo sem poder conter o riso.
- de acordo.
e as duas jovens romperam em gargalhadas ante a perspectiva da aventura e foram explicar
o plano a stela.
de imediato, dulce comentou para stela:
- estás a ver como emma tem os olhos brilhantes? não há nada que chegue a uma romântica.
e piscou-lhe um olho. era o seu gesto favorito.
emma chegou pontualmente e nervosa ao cinema. viu hector e cumprimentaram-se com um
sorriso. emma olhou à volta para se assegurar da presença de dulce e stela, que se
dissimulavam como mata-haris profissionais. viram o filme. depois, saíram para ? jantar,
sempre seguidos pelo par de espias. falaram longamente de filmes e de actores, de actrizes
e de realizadores. depois, despediram-se. sempre galante, ele acompanhou-a a casa.
ao ir-se embora, hector cruzou-se com dulce e stela que se puseram a admirar as montras,
comentando em voz alta o lindo vestido vermelho e como ficava bem acompanhado com
umas luvas negras de manga comprida e um colar de pérolas rente ao pescoço.
- olá, stela - disse hector, quando passou a seu
lado, de sorriso rasgado. - olá, dulce.
ruborizadas e confusas, apressaram-se a retribuir o
cumprimento.
- olá, olá.

- olá, hector. hector, já de costas, ergueu uma mão em sinal de saudação.


dulce e stela correram para a porta da casa de emma, que estava à espera delas e
atropelaram-se tentando entrar.
- então, que tal? segurou-te na mão durante o filme? - perguntou dulce.
- como correram as coisas? de que falaram? indagou stela.
- o normal - respondeu emma, evasiva. ao ver a expressão ansiosa das amigas, cedeu de
seguida. falámos de cinema, dos nossos actores favoritos, de nossas actrizes preferidas, dos
filmes de que mais gostamos. . . ah, e também de amor. . .
- de amor!!! - gritaram dulce e stela em uníssono.
- bem, de filmes de amor.
dulce e stela voltaram a soltar um grito inarticulado, comentando de seguida:
- que emocionante!
- que romântico!
e começaram a falar todas ao mesmo tempo. emma pegou-lhes na mão e fê-las sair de casa.
fredo lia um livro.
- olá,fredo! - cumprimentou-o emma,agarrando-se-lhe ao pescoço, com o que fez cair o
livro que ele lia.
fredo era alérgico às substâncias mais inverosímeis, segundo ele próprio garantia. no
seu quadro de alergias figuravam várias palavras,sendo uma delas azar.
assim,desde cedo ensinou emma
a dizer emma e ensinou-lhe também a dizer fredo.
- era bom que todos os dias me cumprimentasses
assim - exclamou ele.
fredo segurou-a nos braços e afastou-a um pouco
para lhe ver a cara.
- hum! vejo demasiada felicidade nesses olhos.
conhecia-a muito bem.
- foi porque estive a ver um filme maravilhoso.
- estou a perceber - respondeu fredo.o sorriso converteu-se em gargalhada e fredo mudou
de assunto.
- veio uma carta para ti.
ema inquietou-se.
onde está? ?
- calma,calma. a.está em cima da mesa do teu quarto!
não sei o que andas a tramar,mas espero que não
seja mais nenhuma confusão das tuas.
emma não esperou que ele acabasse a frase e correu
para o quarto. as amigas não se atreveram a segui-la.
e ficaram na sala,sem saber o que fazer.ao cabo de
alguns momentos,emma regressou a gritar:
- fredo! fredo!
- não saí daqui.
- consegui, consegui! - exclamou emma, enquanto abraçava o pai com tanta força que
acabaram os dois por cair em cima do sofá. - consegui!
- está bem, emma, já ouvi - disse fredo, com aquela explosão de júbilo. - não falamos a
mesma língua.
emma não percebeu a ironia das suas palavras e continuava a repetir:
- consegui, fredo!
e correu a abraçar dulce e stela, que estavam sem compreender nada.
fredo decidiu juntar-se à festa, imitando emma e levantando os punhos nuna cómíca:
- conseguiste! uauuuu! bravo! parabéns; fredo, dando pulos de alegria e fazendo piruetas
até que as raparigas se puseram a rir com o espectáculo.
quando fredo se deu conta de que estava a chamar a atenção, retomou a compostura, alisou
e compôs a barba, aproximou-se de emma, segurou-a pelos ombros e disse-lhe:
- escuta agora, minha querida, meu favo de mel, diz-me. . - e fazendo ? voz terrível,
continuou: - mas que raio conseguiste tu?
emma, com os olhos verdes inundados e com uma careta, mostrou-lhe a carta:
- ah! obrigado - replicou fredo, com voz meiga. - hum. deixa ver o que aqui está: ??prezada
senhora ou menina: agradecendo a sua participação em. . .??
- então, fredo, não troces. lê o que está escrito em letras grandes.
- desculpa-me, filha, mas parece que ultimamente ando um pouco decrépito.
emma deu-lhe um ligeiro soco no ombro.
- já vou, já vou, emma. deixa ver. . . ??foi agraciada com o xv prémio de contos da revista
panorama. . . ??
as três raparigas gritaram emocionadas, abafando com as suas exclamações de júbilo as
palavras de fredo, que continuava a ler.
fredo fora sempre complacente com a tendência literária de emma. nunca pensou que fosse
mais do que um passatempo efémero que, em todo o caso, acabaria por se transformar no
culto de um diário pessoal. aquilo ultrapassava as suas expectativas, mas reagiu com
rapidez:
- temos de comemorar isto. vamos a el ancla. e1 ancla era o bar onde fredo se reunia com
os amigos marinheiros, amizades fortes, de ferro, que foram sendo forjadas nas fadigas e na
dureza do mar. emma era a sereia de e1 ancfa, como lhe chamavam os marinheiros do bar,
que a haviam adoptado como mascote desde que a mãe morrera, tinha ela oito anos. passara
ali muitas tardes fazendo os trabalhos escolares num canto afastado, ante o olhar amistoso
dos marinheiros, que se orgulhavam de ter no seu bar uma sereiazita tão estudiosa.
foi aí que emma travou amizade com david, filho
de um marinheiro, que costumava acompanhár os trabalhos escolares.
foram amigos de infância, compartilharam horas de travessuras com que brindavam os
marinheiros. aprenderam juntos a pescar, a navegar, a apanhar conchas, a nadar no mar
impetuoso, a conhecer a maré, a reconhecer a anatomia humana, isto é, o fundamental da
vida.
alguém foi avisá-lo e david também se juntou à festa.
em el ancla, o vinho correu entre os marinheiros, inclusive abriu-se uma garrafa de
champanhe para as raparigas, bebida pouco corrente entre aqueles homens. dançaram,
cantaram, emma recitou e todos aplaudiram. fredo fixou o conto numa parede com um
prego e ali ficou durante vários meses. a sereiazinha não ficou no bar durante mais tempo,
tinha de ir ver um príncipe, pelo que deixou nas mãos dos marinheiros a celebração mais
alcoólica da festa, despediu-se das amigas e foi a correr àprocura de hector.

hector fitou-a, incrédulo. não sabia que ema escrevia e menos ainda com tanto talento. era u
conto sobre a mãe ausente, a mãe morta. emma teve de lhe explicar:
- É uma homenagem à minha mãe, que morreu quando eu tinha oito anos. É um vazio
impossível depreencher, percebes? além de ser incompreensível não conseguirias perceber
que a nossa mãe ne abandonou desta forma. o meu pai ajudou-me
muito. É a pessoa a quem mais quero neste mundo. para os dois foi dificil, mas
conseguimos seguir em frente. - caíram- lhe lágrimas dos seus olhos verdes.escrever sobre
as coisas ajuda-me a entendê-las, ou pélo menos a ultrapassá-las.
hector enxugou-lhe as lágrimas com os dedos e beijou-a. foi o seu primeiro beijo.
hector continuava a frequentar o cabeleireiro uma vez por mês. estava a terminar o curso
de medicina. era um jovem de princípios. acreditava que tinha de agir para aliviar o
máximo possível as misérias deste mundo.
iam ao cinema, falavam de amor e de literatura. emma gostava de lhe ler contos. para isso,
costumavam juntar-se num café pouco frequentado do porto, em que soava sempre uma
música decadente. emma aproximava-se do balcão, pedia ao empregado que baixasse o
volume do som porque ia ler um conto ao amigo e, por alguma estranha razão, aquele
empregado obedecia-lhe sempre com respeito, dizendo também aos outros clientes,
jogadores habituais de bilhar, que não fizessem demasiado barulho.
então, emma lia contos a hector. ele escutava, encantado, aquela bela voz que recitava
contos, uma voz de que sempre se recordaria. mas aquele dia era especial. emma leu o
título num sussurro: ??primeira vez,? e em voz baixa leu-lhe o conto:
aqui estamos os dois, um diante do outro. nervosos, mas decididos. sabemos que qualquer
inexperiência será superada com vantagem pelo nosso amor. sorri, digo-te, e os teus
olhosfazem-no pelos teus lábios; fala-me e o teu silêncio fá-lo pela tua voz; quer-me,
suplico-te, e despeja o teu olhar no meu, fazendo-o. e abraças-me.
executamos com lentidão cada gesto, com receio de nos enganarmos, para dilatar o tempo e
saborear o instante, cinzelando-o na língua. a tua respiração chega-me cada vez mais
agitada à medida que me vais despindo. lentamente, despojamonos das roupas e preparamo-
nos para cometer o acto miraculoso de confluir numa vida como se a aprisionássemos.
detemo-nos em cada caricia para precisar o sentido do outro, para nos permitir calar até ao
mais profundo e transcender os corpos. deixamos que as bocas se bebam, que as carnes dos
lábios se choquem, que as linguas enlouquecidas se enredem, que as comissuras se
alonguem na sua avidez por se engolir. amolecem os ossos, endurece-se a carne. as peles
eriçam-se de desejo que acalmam submergindo-se uma na outra. a procura culmina na
união ainda desajeitada, depois certa.

abandonados os corpos a si mesmos, começamos a derramar-nos no outro. o prazer


emergente vence as pálpebras. começa o roçar dos fios de alma, o ondear do cosmos, o
vaivém de oceanos abissais. o sol pôs-se, é tempestade e noite, relâmpagos cortantes
rompem o negrume, raios e estampidos do trovão cravam-se na coluna dorsal, a mente
dilui-se no choque, grita até se desfazer e os seus pedaços tilintam em ecos solitários que
vão desaparecendo cada vez mais longe na escuridão. os olhos entreabrem-se enquanto
chove com mansidão e do?ura e se expandem, amontoando-se, nuvens de paz que navegam
até ao horizonte, onde morrem.
quando caimos nos nossos corpos, já está. tu leste-me. eu escrevi-te. criámos um filho, um
amor, o conto.
hector nunca tinha escutado nem lido nada de semelhante. ficou quedo, fitando os olhos
verdes e a cabeleira ruiva da jovem e não disse palavra. durante todo o caminho até à casa
onde vivia, não lhe largou a mão. a luz era muito ténue. emma entrava ali pela primeira vez.
havia um aquário com luz que difundia por toda a sala reflexos de uma tonalidade marinha.
beijaram-se, longa e profundamente.
- És muito bonita, emma. despe-te, quero ver-te nua.
emma entrou no jogo e começou a despir-se languidamente, enfeitiçando os olhos do seu
amado. emma excitava-se por dominar o desejo que provocava e por isso foi-se despindo
lentamente. hector mal conseguia controlar a paixão.
- gosto muito do teu corpo - disse-lhe hector.não aguento mais.
e atirou-se a emma, que desatou a rir. hector
pegou nela e atirou-a para cima da cama. beijou-lhe
uma pálpebra,depois a outra. beijou-lhe os lábios,
beijou-lhe o pescoço com lábios húmidos.
com uma mão percorreu-lhe os seios entumecidos.os dedos cravaram-se nos mamilos
rijos.uma mão acariciava as nádegas de emma.o cheiro do desejo excitou a jovem.com os
dedos explorou-lhe o cabelo louro e sedoso,a força dos seus ombros,a
forma dos seus fortes braços,a curvatura do peito.
queria-o dentro de si.hector beijou-lhe os mamilos.
e emma sentiu o primeiro orgasmo.então,hector ?
fez a penetração com cuidado,enterrando a cabeça ???
no seu cabelo ruivo.a anca erguida começou a
mover-se de forma imperceptível. emma arqueou-se para se encaixar nele ansiando sentir
aquela dureza no seu interior.o movimento em busca do máximo prazer foi adquirido com
ritmo, profundidade,até que o êxtase os dominou por completo.as convulsões cessaram,mas
hector não se afastou de emma.
? oxalá pudesse ficar sempre dentro de ti.
então,com os lábios,a língua,as mãos, percorreu-lhe todos os centímetros da pele.cobriu-a
com uma película de amor e voltou a penetrá-la,fazendo amor até ao amanhecer.
aquele conto,??primeira vez?,,foi publicado com
um grande êxito.a jovem e promissora escritora
tornou-se uma pequena celebridade.começou a falar-se dela nos círculos literários.
?? meses depois, hector acabava os seus estudos de medicina. comemoraram a sua
licenciatur? em e1 ancla. naquela noite comemoraram até ao fim. emma e hector foram os
últimos a sair, sentados no recanto de emma. hector pegou-lhe nas mãos e disse-lhe:
- sabes como desejava licenciar-me e sabes que tenho de fazer um estágio para poder
conseguir o título - começou hector a dizer, sem desviar o olhar do copo.
- bem sei - confirmou emma, sem saber onde ele queria chegar e fitando-lhe o cabelo louro.
- tenho uma magnífica oportunidade para fazer o meu estágio e ao mesmo tempo servir de
ajuda aos mais necessitados.
- isso é formidável, hector.

- sim, sim. sabes que sempre pensei que temos de agir para conseguir as coisas e não posso
ficar de braços cruzados sem me envolver minimamente.
- que queres dizer-me, hector?
- quero ir com uma organização não governamental ajudar os indígenas da amazónia. e já
me aceitaram. posso partir dentro de dois meses. É preciso evitar que desapareçam todos
aqueles povos, as suas culturas, os seus conhecimentos. . .
- queres dizer que dentro de dois meses partes para o brasil? - sim.
- mas isso é formidável - replicou emma, ainda pesando as consequências dessa decisão.
- sim, emma, é formidável - disse ele, erguendo a cabeça, para fitar pela primeira vez desde
que começara a falar os olhos verdes de emma. como se lhe saísse um peso de cima dos
ombros, acrescentou:fico por lá um ano.
emma contemplava o horizonte do mar como se o mar lhe tivesse roubado o amor por que
tanto ansiara.
a bola de sabão rebentara.
pegou no barco de fredo e dirigiu-se para a enseada solitária, para pensar. invadia-a uma
profunda tristeza. os seus olhos verdes contemplaram o vaivém da massa de água. apoiou-
se na borda. o cabel ondeava-lhe ao vento. as lágrimas caíam-lhe. todos os projectos que
imaginara compartilhar com hector haviam-se esfumado de um só golpe.
a história repetia-se mais uma vez: abandonavam-na. por muito que hector repetisse que
continua riam juntos, um ano era muito tempo. emma respei tava a decisão de hector, mas
no fundo não deixava de a considerar de certo modo uma traição. sobretudo, parecia-lhe
injusto, quando por fim conhecera uma pessoa com quem se entendia na perfeição, com
quem encaixava tão bem. continuaram a ver-se durante aqueles dois meses mas de cada vez
era uma pequena despedida que antecipava a ida de hector. e de cada vez faziam amor com
maior paixão e desespero, bebendo o cállice até àúltima gota. no dia da despedida no
aeroporto, mal se fitaram, hector viajava com outra voluntária, marga, tamb?m médica
recém-licenciada e companheira de promoção de hector. houve lágrimas. "escreve-me", foi
a última coisa que emma lhe disse.
todos os dias, hector telefonava-lhe. ainda andava por lugares" civilizados," mas quando
começou a estar na floresta, aí é ?ca comunicou por carta.
emma, é indescritivel tanta beleza, tanta exuberância. há tanta vida, tantos animais, tantas
plantas diferentes. aqui, a natureza é surpreendente, esmagadora. de manaus, subimos o rio
negro até a uma aldeia chamada barcelos. dali, interná mo-nos na zona indígena. as
primeiras sensações são espantosas: o calor é tão sufocant e tão húmido que parece
estarmos mergulhados num líquido quente, que milhares de linguas estão a lamber nos; ? o
odor é perturbador. flui um denso aroma defruta bem madura, embora também cheire a
queimado, devido à queima que tradicionalmente se faz na selva para se conseguirem
terrenos para pastagens e cultivos. em santarém, desfrutámos de um maravilhoso entardecer
nas margens do rio tapajós.

e emma sonhava com aquelas paisagens selváticas. trocaram correspondência durante um


ano. ema começou a escrever um romance fruto das suas frustrações e das cartas de hector.
um romance de amor e aventuras no rio amazonas. hector parecia cada vez mais envolvido
na luta social dos indígenas.
emma, estou muito contente com o trabalho que faço aqui, sinto-me realmente útil e tenho a
sensação de fazer algo que ao mesmo tempo me enriquece. É muito gratificante colaborar
na sobrevivência destes povos tão ameaçados pela desflorestação implacável. os governos
não podem ou não querem fazer nada. É grande a pressão de grupos paramilitares pagos
pelos proprietários. assim, não só tratamos doenças, como curamos maisferidas á bala e de
catana comojamais eu imaginara. também se nos torna muito dificil conseguir bons medi
camentos, pois são muito caros. É durissimo ver pessoas a morrer por causa da falta de
dinheiro para os remédios que as salvariam. sei que é um mundo muitoprecário o dos
indigenas e que muito provavelmente será impossivel conservá-lo de todo ? - (torna-se
patético ver os ianomamis de calças desportivas de marca, de roupa desportiva ou a
transportar água em garrafões de plástico). o nosso? mundo está a contaminá-los dia após
dia. mas temos de lutar para levarem uma vida digna e para que não esqueçam o seu
património cultural.
começo a imaginar impossivel a vida fora daqui, emma. pediram-me que ficasse mais um
ano e penso que vou aceitar. gostaria que viesses: porque não nos encontramos em manaus?
tenho de lá ir dentro de dois meses para receber medicamentos.
emma começava a convencer-se de que estava a perdê-lo, que hector já estava a criar raízes
naquele lugar tão remoto e que ela não era para ele nada mais que uma boa recordação, uma
recordação longínqua. nas suas cartas, lia nas entrelinhas que, de facto, ele se sentia parte
daquela comunidade. emma compreendia, inclusive admirava a sua luta, mas ele nunca a
tornara participante e ela tão-pouco se sentira envolvida na sua luta. hector nunca lhe pediu
conselho se devia partir ou ficar.
- tenho de ir a manaus ou vou perdê-lo! - decidiu emma.
- emma, emma! - chamou um homem de barba ruiva comprida e longa cabeleira,
agarrando-se a ela.
emma deu um grito:
- que é isso? que está a fazer? solte-me.
- emma, sou eu! hector!
- hector?! És tu, hector?! - perguntou, pondo-se a um metro de distância, fitando-o de cima
a baixo, esquadrinhando-o através da barba, através daquela pele acobreada que ela sempre
conhecera branca.
- sou eu, emma.
abraçaram-se com força.
- oh, hector! hector, hector, hector!
- ainda gastas o meu nome.
- É que. . . estás tão mudado!
- passou-se muito tempo.
- sim, muito tempo.
fitaram-se longamente, sorrindo.
- a marga também veio. lembras-te dela? - perguntou hector pegando pelo braço uma
mulher morena, alta, muito bonita. - quis vir receber-te e ajudar-nos com a bagagem.
emma não notara a sua presença.
- bem-vinda - disse marga.
- obrigada - foi tudo quanto emma conseguiu dizer.

hector colocou a bagagem num jipe. depois, dirigiram-se a uma embarcação e subiram o rio
negro até uma aldeia chamada barcelos.
- o rio é a única auto-estrada da amazónia - disse hector a emma que, na realidade, olhava
mais para marga do que para a paisagem.
quando se acalmou, ficou impressionada com o horizonte sem fim do rio. era como um mar.
nas margens do rio começava outro mar de cor verde a que chamavam selva. emma
observara que inclusive manaus era uma cidade que lutava contra a selva, ansiosa por
reclamar o que lhe pertencia.
em barcelos, alojaram-se na casa onde estava instalada a ong, chamada saúde e vida.
deram-lhe uma hamaca (rede balouçante que serve de cama). no amazonas não havia
camas; dormia-se em hamacas. assim que se instalaram, hector levou-a a dar um passeio
por barcelos. tinham tanto que falar que passearam em silêncio. emma segurou-lhe a mão e
não a soltou. necessitava de lhe tocar, de o sentir. ele parecia inseguro. sentaram-se na
margem do rio, em cima da areia. o entardecer dourava as escuras águas do rio negro. uma
canoa com um rapazinho rompia a calma da superficie do rio. ambos ficaram a ver o sol a
pôr-se. por fim, a pouco e pouco, começaram a falar. hector estava retraído.
que se passa contigo, hector?
- como?
- sinto-te distante. porque quiseste que eu viesse? estava tudo a precipitar-se com
demasiada rapidez. emma não imaginara que tão cedo falassem assim tão cruamente.
- quero saber se gostarias disto aqui, se serias capaz de viver esta vida comigo. e não quero
forçar-te a tomar nenhuma decisão. porque quanto a mim, só conseguiria agora viver aqui.
quero ensinar-te a amar esta terra e esta gente.
- deixa-me pensar, hector, deixa-me pensar.
- vamos dar uma volta - sugeriu ele.
emma ergueu-se e atirou-lhe a pergunta que a atormentava:
- já dormiste com ela?
- que estás a dizer? com quem?
- sabes perfeitamente. com marga.
hector corou de repente. emma não contava com isso, não acreditava que aquele homem tão
endurecido ainda tivesse capacidade para se ruborizar. mas hector não respondeu, o que
equivalia a uma afirmativa. emma enfureceu-se e virou-lhe as costas, pronta para se ir
embora. hector segurou-a pelo braço.
- uma única vez.
o que disseste, hector?
- disse que apenas uma vez.
emma suspirou profundamente.
- muito bem, héctor. explica-me a diferença entre uma única vez e muitas vezes, porque não
vejo nenhuma - disse-lhe em voz baixa. - allém disso, que pretendes, exibindo-a à minha
frente: chantagear-me? pretendes dizer-me que se não ficar contigo, já tens alguém que me
substitua?
deu meia volta e foi-se embora. hector, confuso, apenas balbuciava incoerências atrás dela:
- não. . . , não. . . , não, não é nada disso. foi um acidente... nunca mais voltou a acontecer. .
.
emma virou-se para lhe lançar um olhar furibundo, com o qual hector se calou.

emma e marga eram vizinhas de hamaca. emma procurou dormir, mas não conseguiu.
levantou-se. marga despertou.
- passa-se alguma coisa, emma?
- para ser sincera, passam-se muitas coisas.
- posso ajudar-te?
?? - talvez. podes responder-me a uma pergunta?
- claro,emma.
?? ? - foi tua a ideia de vir para cá?
- bem, hector e eu sempre pensámos em ajudar os
carenciados.
sim,mas também há carenciados no nosso pais,não achas?
- sem dúvida,mas,..
foi ou não foi tua a ideia de virem para o brasil?
- sim, é verdade, mas não compreendo que importância tem isso.
- claro que tem importância, marga, e muita. porque assim pudeste separá-lo de mim,
pudeste isolá-lo e tê-lo só para ti. que inteligente foste, marga!
- não digas disparates, emma. isso é uma barbaridade.
- por acaso não estás apaixonada por ele? achas que não vejo como olhas para ele? por
acaso não dormiste já com ele?
- emma, parece-me bem que estás a ficar fora dos eixos.
- não me mintas, marga. dormiste com ele. soube-o por ele.
marga ficou calada uns instantes.
- não tens nada a dizer, marga?
- não podes dar-lhe a vida que ele quer.
- claro, marga. mas tu podes, não é?
- sim. que pode uma pobre cabeleireira oferecer a hector?
- diz-me uma coisa, marga: que pode úma patética serpente oferecer-lhe?
- dei sentido à vida dele, dei-lhe uma razão de ser.
aqui,sente-se em casa. .
- não te preocupes,marga,agiste muito bem. o
hector é todo teu.demonstraste uma falta de personalidade que me defraudou. levaste-o para
onde querias e não percebi.É todo teu.
?hector levou-a a percorrer as maravilhas mais fascinantes da selva amazónica e todas as
noites emma
encontrava na sua hamaca uma flor a pedir perdão e
todas as manhãs havia um ?coco fresco aberto junto da sua hamaca.e com isso não fazia
mais senão aumentar a tristeza e a melancolia de emma.
faltavam três dias para emma regressar.hector
tornou a sondá-la.mal tinham trocado dois dedos de
conversa.
- emma,quis que viesses para saber se serias capaz
de viver aqui,se gostarias de viver assim.
- junto da tua amante? para nos teres às duas?
- vamos lá,emma,sabes que não é nada disso.foi
um acidente,de que me arrependerei toda a vida, mas
escuta-me,por favor.pedi-te que viesses para estar contigo e para compartilhares a minha
vida nesta terra,porque te amo,porque quero casar-me contigo.
emma fitou-o longamente com os seus olhos verdes.atirou a cabeleira ruiva para trás.
- hector,estás com febre.ou então enlouqueceste.
- emma,perdoa-me.juro-te que nada disto voltará a acontecer.quero que saibas que és a
pessoa que eu amo, com quem quero viver o resto da minha vida. casa comigo.

- vai pedir a um dos teus curandeiros amigos uma poção contra o delirium treméns.
- emma, estou louco mas é por ti. - fez uma pausa, fitou-a profundamente. - quero-te,
emma.
emma começou a chorar. demasiada tensão acumulada, demasiadas sensações agitavam-se
no seu íntimo: humilhação, frustração, impaciência, ciúnes, desejo, mas o pior era a
profunda solidão que a atravessava.
hector abraçou-a dizendo-lhe:
- quero-te, quero-te.
e não se cansava de o repetir.
na última noite, quando todos dormiam, emma pôs-se a pensar. a insónia não a deixava
dormir. tomou uma decisão.
deslizou até ao alpendre do barracão de hector. havia vários médicos e enfermeiros a dormir
fora, onde o calor e a humidade eram um pouco mais suportáveis. emma aproximou-se
silenciosamente da hamaca de hector. ele despertou ao sentir entre as pernas o rocegar de
uns cabelos e viu que era emma. ela fez deslizar uma mão por dentro das calças dele. pegou
no membro, acariciou-o e lambeu-o até ficar retesado e subiu para a hamaca, para cima de
hector e começou a cavalgá-lo com lentidão. a hamaca movimentava-se ao ritmo que o
corpo de emma marcava, agitando as ancas como as ondas. o pescoço de emma erguia-se e
caía ao mesmo ritmo, arrastando a exuberante cabeleira ruiva como o fogo. quando ela
começou a mordiscar-lhe uma orelha, hector sentiu-se dominado pelo prazer. não se
conteve mais e abandonou-se com um grito. os dedos de emma na sua boca conseguiram
transformá-lo num
gemido. naquela noite, hector conheceu a felicidade.
ema partiu ao alvorecer, sem dizer nada.
- fredo, preciso fazer tábua rasa, mudar de ares,mudar de gente,mudar de cidade. necessito
de mudar tudo para me reconstruir, porque agora sinto-me em ruínas.
fredo fitou-a com a distância que lhe conferia a sabedoria da idade e só lhe respondeu: ?
- conta comigo.
emma dirigiu-se ao cabeleireiro. ficou contente por ver stela e dulce.comunicou-lhes a
decisão de deixar o cabeleireiro para se dedicar à escrita e informou-as também de que
hector ficava na amazónia.
só a elas e a fredo deu a conhecer o local onde ia refugiar-se e convidou-os a irem visitá-la.
com os rendimentos de dois novos contos publicados em revistas de certa fama,refugiou-se
numa aldeia de pescadores.alugou um quarto em casa de um casal amigo de fredo,mário e
maria,e todos os dias,frente ao mar,escrevia um pouco do romance
que o seu íntimo mais profundo lhe exigia.era inverno,fazia frio.o mar estava agitado.emma
deixava-se ficar a admirar as ondas a bater com força na praia. emma refugiou-se no
trabalho. no romance derramou toda a sua dor, todo o seu desencanto e a sua raiva. decidiu
viver de verdade naquele romance, porque nele contou como deveria ter sido o seu com
hector e esqueceu a realidade. quis assim conjurar a solidão imensa que se lhe cravava nasu
nhas, o lento e doloroso correr do tempo.

cinco meses de intensíssimo trabalho terminaram num soalheiro dia de primavera. emma
enviou o manuscrito a parvula editora, independente e de prestígio. esperou, acompanhada
de mário, fredo e david na pesca. esperou passeando pela praia. david vinha
visitá-la de vez em quando. a sua generosa companhia e capacidade de escutar tornou-o o
amigo ideal naquela situação. converteu-se no pilar que a susteve durante toda aquela
amarga travessia.
dois meses depois obteve uma resposta afirmativa. uma carta que louvava o misto de
exotismo, aventuras, paixão, sentimentos, crueza, denúncia... e um bélo título: voragem na
amazónia. o editor enviou-lhe o contrato, que ela assinou e devolveu pelo correio. outros
dois meses mais tarde, chegaram as primeiras provas que corrigiu e, ao cabo de um mês,
recebeu o livro preciosamente encadernado. três semanas mais tarde, o romance começou a
receber excelentes críticas e a vender-se de forma magnífica. tornou-se a sensação literária
da temporada.
começaram a chamá-la de todo o tipo de jornais,
revistas,rádios e televisões para ser entrevistada, e de repente, emma viu-se envolvida numa
nuvem de
actos promocionais impensáveis.conheceu muita gente nova: jornalistas, críticos,
escritores...o fáto ultrapassou fronteiras.voragem na amazónia foi traduzido em várias
línguas, converteu-se num best-seller internacional.a sua editora patrocinou um percurso
por vários países da europa e da américa latina.emma não quis visitar o brasil.
??os seus rendimentos começaram a ser espectaculares.uma produtora cinematográfica
contratou os direitos audiovisuais.com o dinheiro,emma comprou uma casa sobre um
alcançado.sempre que podia,refugiava-se na sua nova casa.nunca quis ver o filme.
contudo, emma começou a superar o luto quehavia guardado no seu coração. voltou a
cultivar amizades, sobretudo algumas novas conhecidas dos círculos literários.
david acompanhou-a nas alegrias que o romance lhe proporcionou. ele também não tinha
sorte com as raparigas e mostrava-se muito compreensivo. a pouco e pouco também, ele
foi-lhe confiando os seus desamores, pois sempre se mantivera muito reservado. david saía,
ia beber uns copos com os amigos e nunca conseguia conquistar nenhuma rapariga. certa
noite, desanimado, foi refugiar-se em casa de emma. recordaram velhos tempos enquanto
bebiam um copo.
- lembro-me da primeira vez que te vi - recordou emma. - estavas na praia, muito atarefado
com uma corda de cânhamo, meia cenoura e uma caixa ? de madeira. aproximei-me
intrigadíssima e vi-te atar a corda a um pau e colocar a caixa de boca para baixo na areia.
depois, ergueste-a de um dos lados e encai xaste o pau como costuma fazer-se na boca dos
crocodilos.em seguida,puseste debaixo da caixa o pedaço de cenoura,esticaste a corda até te
esconderes atrás
de uma duna de areia e ali ficaste à espreita.
- sim,ah,ah,ah! - riu-se david.- e foi então que
chegou a menina perguntadora. ?
- claro,não consegui conter-me e fui perguntar-te
o que era aquilo.e lembro-me da tua resposta com a maior perplexidade de toda a minha
vida.respondeste-me que ias caçar um coelho branco.pus-me a olhar à minha volta para me
certificar do lugar onde estava: numa praia.fiquei éstonteada ali e disseste-me: ??agacha-
te!" já ali havia visto muitos animais: caranguejos, peixes, amêijoas,etc.,mas um coelho

branco na praia era tão irreal como um unicórnio.


ficámos à espera como dois tontos que na armadilha
caísse um coelho e ainda por cima branco.ao anoitecer,fomos para casa.inclusive,perguntei
a fredo se havia coelhos na praia e ele riu-se como um danado durante meia hora. quando
lhe expliquei o que fazias na praia,disse-me que dentro de dias nos levaria a ver coelhos
brancos.
- sim,quando mo disseste,passei várias noites sem
conseguir dormir.
- e fredo levou-nos a casa do meu tio berto, que tinha uma herdade com todo o tipo de
animais e também coelhos e entre eles um coelho branco.o tio berto deu-nos folhas de
alface para lhe darmos de comer.como ficaste triste ao vê-lo na jaula! como te fascinava o
movimento do seu nariz! o tio berto pôs-te o coelho branco nas mãos e ficaste tão
emocionado que ele fugiu.
- ah! ah! como o perseguimos entre as galinhas, que saltavam a cacarejar por todos os
lados! a ti passou-te entre as pernas! ah! ah!
- ah! ah! ah! por fim, lá conseguimos encurralá-lo e o meu tio voltou a metê-lo na jaula e
ainda o acariciaste um pouco. foste embora a chorar. não voltaste a preparar a tua espantosa
armadilha caça-coelhos.
- mas víamo-nos quase todos os dias na praia e tu contavas-me histórias maravilhosas de
animais fabulosos: sereias, centauros, pégasos, unicórnios e coelhos brancos, sobretudo
coelhos brancos. lembro-me perfeitamente: o coelho branco era sempre o centro do
labirinto, o tesouro guardado no cofre, o amuleto que salvava da catástrofe, o prisioneiro
que era preciso libertar, o mago que por causa do encantamento resolvia o problema. já
então eras uma boa contadora de histórias. . . passávamos horas a contemplar o mar. . . -
david calou-se e perguntou:porque é que ninguém me quer, emma?
- porque andas sempre à procura de coelhos brancos na praia.
david ficou silencioso.emma voltou a falar:
- gosto de ti,david.
- não me refiro a esse tipo de amor.
- lá chegarás,david.És uma excelente pessoa,com
muitas qualidades.
- sim,claro; só tenho de andar com um cartão luminoso pendurado nas costas a fazer
publicidade.
- tem paciência.
- sim,mas porque me é negada a capacidade para amar?
- quem ta nega?
- as mulheres.
- ah! eu também?
- não; tu és minha amiga. . .
- mas também sou mulher, não achas?
- claro que és. . . a verdade, emma, é que já não me lembro como é fazer amor com uma
rapariga e a todas é o que pareço: um rapaz muito simpático, mas mais nada. . . só sirvo
para amigo. . . -ao dar-se conta do que dissera, acrescentou: - desculpa, não me referia a ti.
- está bem, david, está bem. anda, vamos jantar e ouvir um pouco de música.

??esta é que é a questão - pensou emma -, a importância que os homens dão ao sexo. parece
que sempre é verdade quando se diz que as mulheres dão sexo para receber amor e os
homens dão amor para receber sexo. . . ?
começaram a jantar e david pôs-se a explicar o seu último fracasso sentimental:
- eu não acreditava na sua existência, emma, mas afinal sempre existem.
- quem é que existe?
- ? brancas de neve.
- as quê?
- ? brancas de neve.
emma soltou uma gargalhada.
- e quem são as brancas de neve?
- vais ver, emma. as brancas de neve são aquele tipo de mulheres que um homem venera
com toda a alma, sem condições. eu fui o anãozinho de uma branca de neve. - emma sorriu.
- sim, são princesinhas doces, adoráveis seres com vocação de peluche, genuinamente
meigas e gatunas, subtis e vaporosas, almas à flor da pele que se alimentam das carícias que
roubam às outras peles, doces, muito doces. É por isso que os anõezinhos gostam delas, por
serem muito gulosos.
emma acomodou-se no sofá. percebeu que a história iria ser longa. david era um magnífico
narrador e muito divertido.
- estas princesinhas têm sempre como noivo um príncipe,esses tipos de perfil heróico,tão
convincentes da sua perfeição inclusive quando se enganam, tão perigosamente sedutores
que até os anõezinhos eram capazes de ir para a cama com eles. ?
emma não pôde reprimir uma sonora gargalhada. david prosseguiu:
- os anõezinhos são seres pequenos,mal proporcionados,pelo que precisam de se tornar
simpáticos (os engraçados) ou cultivar a alma (os que não têm graça) para serem
apreciados.a sua natureza é tal que a lei os impede de serem amados pelas brancas de neve.
elas gostam muito deles, mas amam apenas os príncipes.sabes o que me sucedeu?
emma abanou a cabeça, divertida.
- violei a lei.eu,um anãozinho,apaixonei-me por
uma princesa.e não cumpri o castigo que se costuma
decretar para estes casos: desaparecer.eu conhecia a
lei,mas ela era uma branca de neve muito,muito
doce e eu um anãozinho tonto,apaixonado e muito
guloso.quis ir-me embora um dia sem dizer nada,
mas faltou-me a coragem.queria-a como querem as ?
crianças,dessa forma nova e caprichosa,mimada e ?
divertida que elas têm de gostar.e ela,como boa ?
branca de neve,destilava carinho por todos os poros
e nem imaginas como gostava de mim.gostava muito de mim e eu estava tão faminto de
carinho que tragava glutonamente a sua ternura sem medir as consequências.
emma serviu-lhe vinho.
- bebe ou vais ficar com a garganta seca. david engoliu um trago e prosseguiu:

- ela gostava de me atirar piropos que sabíamos serem mentiras: meu lindo, meu amor; eu
cumprimentava-a todos os dias com dispositivos como: ??olá, meu algodão doce, meu favo
de mel. até logo, bombonzinho?,. ela estendia-se no parque solitário onde estudávamos e eu
acariciava-lhe o cabelo, ou deitava-me eu e acariciava-mo ela, sobretudo depois de tu o
cortares no cabeleireiro, porque então tinha-o bem curto na nuca e ela quando me passava a
mão sucedia-me como os gatinhos quando se lhes acaricia a garganta: fecham os olhos e
põem-se a ronronar, melados de tanto prazer que sentem. outras vezes, ficávamos ali e
bastava-nos o ar morno, a amizade, o toque amável, o artista da rua que tocava música
barroca ao fundo. eu sentia-me como se estivesse no fim do mundo.
emma interveio com um brilho irónico nos olhos:
- não poupes os pormenores, david. conta como se tivéssemos a noite toda só para nós.
david fingiu não ouvir e prosseguiu:
- em plena simbiose angelical, em plena demonstração de carinho mútuo, uma cegueira de
amor. percebes o que quero dizer.
- não, david, garanto-te que não consigo imaginar. que te disse?
- atenção. disse-me: por favor, não te apaixones nunca por mim, mesmo que eu me
apaixone por ti.
- ela disse-te isso?
- palavra por palavra.
- inacreditável!
- É tal como te estou a contar, emma. e eu, que até
então havia sido um anãozinho vulgar e normal, de repente senti um baque no coração,
centenas de furacões movimentaram-se no meu peito e, precisamente no momento em que
ela me disse isso, apaixonei-me por ela.
- quem poderia ter resistido àquele olhar de biscoito acabado de sair do forno, àqueles
gestos de gazela, àquele rosto pálido de lua cheia, àquela alma de algodão? era preciso ser
sobre-humano e eu não passava de um anão. mas, emma, ela percebeu.
- não me digas!
- sim, enma ela percebeu. e ainda por cima telefonou-me para me consolar.
- o que se passa contigo?", disse-me. e respondi-lhe: ??perdoa-me por te amar, apesar de
não quereres, por me apaixonar por ti, por achar beleza em ti.
- uff, david! que bonito!
- não é meu. plagiei unz poemas.
- a! ?! ah! david, és fantástico.
- sin, plagiei-o, mas reflectia perfeitamente o que sentia.
- e que te respondeu ela?
- deixou-se ficar mais do que nunca impressionada e quis ser mais amiga do pobre
anãozinho. foram os
dias mais tristes da minha vida, embora agora me ria. provoquei de propósito uma zanga
entre nós para nos deixarmos de ver. agora, vemo-nos de vez em quando, sem querer, mas
de longe.
david bebeu mais um gole de vinh?o e calou-se.
emma procurou animá-lo. conseguiu a custo. a ironia de david não conseguia dissimular a
sua solidão, a sua tristeza.
uma vez terminado o jantar e depois de falar durante um pedaço de livros e de filmes, david
consultou o relógio e disse:
- já é tarde, emma. tenho de ir-me embora.
- acompanho-te à porta.
o beijo ia ser de despedida, mas emma abraçou david a quem beijou os lábios, apanhando-o
desprevenido. emma segurou-o pelo braço e levou-o até ao quarto para lhe dar uma
pequena hora de amor.

a david, fez-lhe muito bem. sentiu a vida com maior alegria. ambos sabiam que aquilo era
momentâneo, que eram dois solitários que se consolavam, que o seu amor era um amor
ligeiro. como diria depois emma, num conto sobre este tipo de amores:
foi um amor de solidão, de sorrisos momentâneos, um amor volátil, dos que sucedem, um
amor sem tragédia e sem pranto. aquele foi um amor real, um amorporque sim e sem mais,
sem partida e sem chegada, despojado de tudo.
ao fim de três meses, david conheceu uma rapariga, começou a sair com ela e apaixonaram-
se. emma ficou satisfeita quando soube. ela e david continuaram a gostar um do outro como
antes de ter acontecido aquele episódio mais íntimo.
emma não gostava de jantares de cerimónia. demasiada formalidade, demasiados risos
forçados, demasiadas pessoas. emma considerava-se imune a eles e aos sonhos convertidos
em realidade. apareceu apenas porque zara, a sua agente literária, insistira; já não lhe
agradavam aquelas fogueiras de vaidades. disse que se limitaria a marcar presença e que
logo que possível ir-se-ia embora para casa. mas decidiu deslumbrar todos os homens
presentes. maquilhou-se cuidadosamente diante do espelho, com delicada exactidão, como
se pintasse um auto-retrato. vestiu o vestido de cetim negro e veludo que melhor lhe
desenhava as curvas, com um perturbador decote (que parecia prometer o inferno ou a
glória) e que lhe caía por trás com uma abertura que deixava à vista os seus ombros
sinuosos. completou a toilette com umas luvas negras e um colar e brincos de diamantes.
para as compridas unhas escolheu uma cor acobreada, a combinar com os cabelos.
suportou como pôde as habituais personagens do umundo"cultural e, enquanto pôde, esteve
na mesa que lhe destinaram. compartilhou a refeição com outros doze convidados. por
sorte, apenas sentiu necessidade de falar com as duas pessoas que a ladeavam: a sua agente
zara e um crítico de conhecida insipidez. quando pronunciaram o nome do vencedor,
supostamente secreto mas já conhecido de todos uma semana antes, levantou-se com o que
atraiu numerosos olhares masculinos. os meios de comunicação agruparam-se à volta dela.
o nomiado, um jornalista da televisão que após anos de experiência televisiva adquirira um
nítido talento literário. emma decidiu ir-se nesse momento. houve um fotógrafo que hesitou
entre quem fotografar: se o jornalista- escritor premiado de microfones se as maravilhosas
costas que se ausentavam com a cabeleira ruiva ondeando .
ao sair, dirigiu-se a uma cabina telefónica no bar do hotel. queria falar com fredo e havia
vários dias que não via o pai, mas antes deu com um homem alto, bem vestido, moreno,
que falava ao telemóvel. fazia gestos de assentimento que se tornaram mais acentuados ao
vê-la aparecer. o homem fitou-a descaradamente, detendo-se inclusive sobre seus seios
salientes que o vestido realçava.
- que beleza! - disse o homem olhando-a fixamente, quase bebendo os lábios de emma com
seus decididos olhos negros, lânguidos, de águas mansamente paradas.

emma ruborizou-se, sentia como se estivessem a despi-la com o olhar. pôs-se nervosa e
inclinou-se sobre o auricular do telefone para ocultar a sua confusão. procurou moedas no
bolso, mas as que tinha eram demasiado pequenas. irritou-se. foi então que sentiu a
respiração de alguém atrás de si, dizendo-lhe num sussurro:
- acho que tenho aquilo que procura.
emma virou-se e deu com uns olhos negros, fixos, duros, fascinantes. as palavras
sussurradas provocaram-lhe um formigueiro na pele.
- tome. espero-a naquela mesa.
emma, aturdida, mal reagiu para evitar que o telemóvel não lhe caísse das mãos e esboçou
um sorriso um tanto forçado.
sempre odiara aqueles aparelhos. nunca gostara de sentir-se localizável, preferia a sensação
de ser livre. contudo, reconheceu que podiam revelar-se úteis.
falou com fredo. combinaram ver-se no fim-de-semana.
o homem esperava-a, observando-a. parecia um tipo duro, muito duro e solitário. as suas
feições marmóreas eram inescrutáveis, era parco em palavras e gestos. semblante
impassível, olhar frio e directo, emma pôde sentir como os seus olhos lhe percorriam os
ombros, como lhe tacteavam os seios, como lhe deslizavam pelas ancas e resvalavam pelas
pernas. sentiu calor nas coxas.
- por fim chegaste - disse ele aspirando profundamente o cigarro.
vacilante, emma limitou-se a entregar-lhe o telemóvel e a dizer:
- obrigada.
- senta-te. encomendei uma bebida para ti. emma, subjugada, escravizada pelo seu olhar,
obedeceu e sentou-se. ele voltou a contemplar-lhe os seios. os mamilos de emma retesaram-
se, anelantes, marcando o leve tecido e ele deteve o percurso acariciador dos olhos, nas
firmes protuberâncias que denunciavam o estado ardente de emma. quando ela deu conta do
ponto para onde o honem olhava, sentiu o sexo húmido, como se milhares de línguas de
duendes minúsculos lambessem e chupassem todos os pedacinhos da sua pele. emma não
conseguia perceber o que lhe estava a suceder, limitava-se a deixar-se levar e a única coisa
em que pensou foi dar liberdade ao corpo. para apagar um tanto o constrangimento, sorveu
um gole do seu copo.
ele não parava de a mirar com o olhar impassível, fumando. ela pousou o copo. ele pegou
no copo dela, virou-o até que à frente dos seus lábios ficou no bordo do copo onde havia
colocado os seus, fitou-a fixamente e bebeu sem desviar os olhos de emma. a pele de emma
arrepiou-se.
- estou a jogar à procura do tesouro - disse, lambendo-lhe o pescoço com os olhos.
- como?
- são precisos dois para procurar o tesouro. durante o jantar na minha mesa começámos a
jogar e tem de ser com pares. apetece-te jogar comigo?
emma sentiu um súbito ataque de pânico:
- tenho de ir para casa - disse, levantando-se.
ele agarrou-a por um punho.
- vem, ajuda-me a procurá-lo - insistiu ele. a firmeza da sua mão, aquele primeiro contacto,
desarmou-a. ele levantou-se também e segurou-a pela cintura. aquele braço, aquela mão na
sua anca derrotaram qualquer possível resistência de emma. deixou-se levar.

ele levou-a até ao carro e ao abrir-lhe a porta e convidá-la a entrar, pôs-lhe a mão nas
costas, ao que emma respondeu com um calafrio ao contacto. quando ele entrou, dirigiu
uma mão para a nuca de emma e aproximou os lábios dos dela, que se entreabriram. o beijo
foi eléctrico, voraz, de duração insondável para emma, mas quando terminou, ele mantinha
a mão na sua nuca. emma fez o primeiro gesto por vontade própria e segurou aquela mão e
os seus lábios vermelhos chuparam-lhe o indicador. ele deixou-se ficar a olhá-la. depois,
ofereceu-lhe a outra mão e ela lambeu os dedos um a um. ele beijou, lambeu delicadamente
o pescoço de emma e fez desaparecer os dedos húmidos pelo decote, segurando e apertando
o mamilo erecto fazendo-o girar. emma sentiu o primeiro orgasmo. mas ele não lhe deu
tréguas. a mesma mão desceu um pouco mais abaixo e introduziu, devagar, muito devagar,
um dedo no sexo húmido e movimentou-o para a frente e para trás, para cima e para baixo.
emma suspirou outra vez e deixou escapar um pequeno grito.
ele retirou o dedo e cheirou-o.
- És uma menina muito boa, emma.
emma limitou-se a sentir os últimos restos de prazer e a deixar-se embalar pelo vaivém do
carro. a cena foi-se impondo na sua mente e perguntou:
- como sabes o meu nome?
- chamo-me giacomo pombal - disse-lhe, sem responder à pergunta, - sabia que ias gostar
do jogo.
pôs o carro em andamento.
emma procurou tocar-lhe, pôs-lhe a mão no pénis mas ele afastou-a suavemente. excitada,
quis abrir-lhe a braguilha, mas ele voltou a afastá-la. chegaram a uma herdade. deixaram o
carro à porta diante de uma grande mansão. emma saiu e compôs o vestido. seguiu giacomo
pombal até à entrada da casa, em cuja recepção havia um espesso tapete vermelho. emma
não pôde esperar, agarrou giacomo pombal e quis beijá-lo, mas ele não deixou:
- espera, tem calma - respondeu ele.
segurou-a pelos braços e inclinou a cabeça para lhe chupar os seios através do vestido. o
mamilo ergueu-se de imediato e ele mordiscou-o. ela gemeu. afastou a roupa e continuou a
morder insistentemente um mamilo, enquanto beliscava o outro.
- gostas, não gostas?
emma encontrava-se no limite.
- possui-me, giacomo, por favor, não aguento mais.
ele ignorava a sua impaciência. despiu-a devagar.
- temos todo o tempo do mundo - respondeu, dei? tando-a no chão. a carne endureceu, os
ossos amol? ceram.
giacomo pombal pousou os lábios e a exigente língua nos lábios do sexo de emma e no seu
clítoris; enquanto as mãos acariciavam os túrgidos seios. reparou como o seu sexo ondeava
na boca de giacomo e como ele se demorava ali, extasiando- se, recreando-se. ela sentiu
então como que uma explosão no seu interior. perdeu a noção das coisas, a casa começou às
voltas e teve de fechar os olhos. giacomo pombal lambia-a sem descanso. sentia como se ali
estivessem todas as partes do seu corpo capazes de experimentar prazer. giacomo foi
desfolhando orgasmos como pétalas na rosa de emma. nunca sentira um orgasmo final tão
selvagem.

então, ele penetrou naquele corpo recentemente conquistado e emma soluçou porque de
forma incrível um prazer ainda mais arrasador se apoderou dela e teve uma cadeia de
orgasmos imparável que a aniquilou. com um grito agónico, ficou exausta no tapete
vermelho, inerte, sem alento.
ainda conseguiu ouvi-lo dizer:
- a procura do tesouro terminou.
?emma não conseguia perceber o que lhe sucedera. as mãos de giacomo pombal, a sua
força irresistível, os seus olhos desapiedados subjugavam-na de modo hipnotizador. saiu de
casa de giacomo pombal ainda envolta numa nuvem de irrealidade, atemorizada com o
arrebatamento irreprimível que havia sentido. foi-se embora era ainda madrugada, sem
deixar nunero de telefone, sentindo uma estranha leveza nas coxas.
quando enfiou a mão no bolso à procura do lenço,encontrou um papel dobrado em forma de
pomba. fitou-o com curiosidade, sem saber como lá fora parar. viu que tinha qualquer coisa
escrita, mas não conseguia ler o que dizia. teve de o desdobrar. as linhas desenhadas
diziam:
enredar me no teu corpo
como gavinhas de uma trepadeira e beijar tua pele com aflor em que meus lábios se
converteram. . .
emma leu-o duas vezes para perceber todo o sentido. a sensação de irrealidade não a
abandonava. as reticências indicavam continuidade. parecia um poema inacabado. em
diagonal, aparecia uma espécie de dedicatória:
com, por, para, de e para emma.
e uma assinatura enigmática terminava a estranha nota.
o telefone tocou. sem largar o poema e ainda intrigada, atendeu.
- emma - disse a voz.
custou-lhe reconhecê-la. era a voz de giacomo pombal.
- emma - insistiu.
- sim, sim, sou eu - conseguiu articular a custo.
- emma, gosto de ti - disse a voz sussurrante. emma não respondeu.
- voltaremos a ver-nos - e desligou.
três dias depois, recebia uma pequena caixa vermelha. emma abriu-a. dentro, estava uma
rosa de papel, também com algo escrito. desdobrou-a, esticou o papel e leu:
acariciemos o outro pescoço, caiamos nas nossas bocas, estique-se um mamilo e beije-se a
glande, lambe-se por baixo de um seio e as curvas, respire-se sobre o sexo, sopesem-se os
testiculos, beba-se o botão da rosa, empurre-se o baloiço cada vez mais rápido, que aforça
centrifuga desfaça o nosso equilibrio, ergamos catedrais de prazer para nos
desmoronarmos. sobre o macio cascalho agonizaremos de prazer ? sorridentes, deixar-nos-
emos morrer de pequenas mortes.
quem era aquele sujeito? esta pergunta martelava constantemente na cabeça de emma. dizia
chamar-se giacomo pombal, mas. . . quem era ele de facto? gostava tanto de mistérios, mas
achava que já era altu ra de jogar a partida em igualdade de circunstâncias. de resto, a
curiosidade estava a consumi-la. encarregou zara das averiguações.

giacomo pombal telefonava-lhe todos os dias. agora, emma encontrava-se num dos seus
períodos de descanso, não escrevia. dedicava-se a desfrutar das coisas que apreciava, como
o mar. no seu barquinho, dirigiu-se à sua baía perdida, sempre solitária e, estendida na
areia, contemplando as ondas, procurou reflectir.
quando chegou a casa, o telefone tocou. atendeu.
- olá, minha vida.
- giacomo pombal! - exclamou, surpreendida: como vais?
como sempre, giacomo pombal não respondeu. atirou-lhe uma pergunta:
- como estás?
- bem.
- onde estavas? telefonei-te durante toda a manhã. ?
- fui à praia, a uma baía que conheço.
- só tenho pensado em ti. só penso em voltar a ver-te. em voltar a fazer amor contigo.
emma sentiu a coxa a tremer-lhe. que tinha aquele homem que a desarmava com poucas
palavras, com poucos gestos, despertando em si um desejo tão violento? emma não disse
nada.
- apetece-te irmos comer juntos? - convidou-a giacomo pombal.
- bom...
era-lhe agradável despertar tanta paixão naquele homem.
convidou-a a ir comer a um restaurante escondido na montanha, à beira de um barranco, de
onde se dominava uma grande extensão de vinhedos. a comida estava excelente, mas
giacomo pombal não quis esperar pela sobremesa e disse-lhe:
- a sobremesa é em minha casa. na verdade, tu és a minha sobremesa.
e não houve parte nenhuma da pele de emma que não tenha sido de facto bebida, sorvida,
comida. demorou-se sobretudo nos seios, que bebeu com ferocidade, como se fossem
líquidos e depois no seu sexo, que se desfez na boca daquele homem. o êxtase voltou a
deixá-la devastada, exânime, sem forças para se levantar do tapete. porque se deitavam
sempre naquele fofo tapete vermelho, onde a pele branca de emma se destacava tanto. e ali
ficou estendida até que ele aproximou o seu membro dos lábios entreabertos de emma e
fizeram amor. enquanto ele se movia, emma segurou-lhe os testículos e arranhouos com as
unhas. nesse instante, giacomo pombal atingiu um violento orgasmo.
nesse dia, giacomo pombal já não a deixou escapar. emma teve de cancelar a visita a fredo
porque durante horas ficaram a fazer amor. giacomo pombal nunca se satisfazia o suficiente
e emma estava hipnotizada com aquela paixão irrefreável que lhe dava gozo como nunca
antes e que a levava até paraísos dos sentidos até então desconhecidos. descobriu prazer em
lugares insuspeitados do seu corpo, que giacomo pombal parecia conhecer melhor que ela
própria.
? três dias depois, com grandes olheiras, emma apareceu em casa de fredo.
depois dos beijos e abraços, fredo fitou-a atentamente e disse:
- sentes-te bem, emma?
- ah, fredo. conheci um homem maravilhoso.
- pela extensão das tuas olheiras deve ser.
- não troces. foi uma experiência quase mística. encontraste deus?
- vamos, fredo. encontrei ??o homem. foi maravilhoso, como uma revelação. . . É um tipo
tão mágico!.
- gostava de o ver tirar coelhos da cartola.

ao fim de duas semanas, zara perguntou-lhe por giacomo pombal.


- não sei o que se passa comigo, zara. É algo que não consigo dominar, é superior às minhas
forças e tenho a sensação de não dispor de vontade própria. ele consegue atrair-me como
nenhum outro homem o havia feito antes. os seus poemas apaixonados são fascinantes.
envia-mos escritos em folhas de papel com as formas mais belas. É um mestre no orgasmo.
e embora seja verdade que na cama, perdão, no tapete seja genial. . . - emma soltou uma
gargalhada e zara acompanhou-a. quando recuperaram a compostura, emma prosseguiu: -
pois, além disso, o incrível é que reparo que estou apaixonada por ele, pelo que ele escreve,
por esses poemas com forma de pássaro, de rosa, de unicórnio... - emma calou-se por
segundos, procurou no bolso. - vê este:
com um rasgado sorriso, zara leu em voz alta:
sempre acreditei que talvez um verso, uma canção, um olhar bastasse para mudar o meu
destino. dei o meu afã por ler todos os livros, escrever todas as músicas, procurar em todos
os olhos, atéque encontrei os teus.
- este chegou em forma de unicórnio.percebes agora, zara? as suas palavras
transformam-me e estão
a mudar-me.
- estou a perceber,emma.mas escuta-me e então
irás entender. ele é uma pessoa que não deixa rasto. tive de contar com a ajuda de uma
agência de deteectives.
- o quê? mandaste segui-lo?
- tenta compreender,emma - defendeu-se zara, enquanto tranquilizava emma, segurando-a
pelo braço.- É um homem muito escorregadio e era necessário saber de quem se tratava,se
era de confiança ou não.não quero que caias nas mãos de un
qualquer.
- pedi-te apenas que te informasses de quem se tratava,não que o mandasses seguir como
um delinquente.acho que te excedeste, zara.
- era a única maneira de averiguar o que descobri - respondeu zara, para despertar o
interesse de
emma que de imediato substituiu os protestos por
um olhar de curiosidade; então, zara prosseguiu; ?
giacomo pombal é um poeta que publica com pseudónimo.É um poeta de culto,que não se
envolve em actos sociais nem em promoções de livros.na realidade,até agora ninguém sabia
muito bem quem era. permaneceu oculto aos seus próprios editores,que
anualmente ou de dois em dois anos, apenas recebem por correio poemas que publicam.
parece ser um estudioso da cabala e da alquimia e é licenciado em psicologia.
- com que pseudónimo publica?
- aloe azid.
- aloe azid - repetiu emma. - sim, já ouvi falar, mas nunca li nada dele.
- trouxe-te um livro.
- obrigada, zara. És um amor. deixa-me vê-lo. zara entregou-lho. emma apressou-se a abri-
lo.
- não tens de quê. emma. só quero o teu bem, disse zara, acariciando-lhe os cabelos;
escapou-se-lhe uma lágrima que enxugou rapidamente com a outra mão e deu a volta para
dissimular. acrescentou:tenho de ir-me embora. tenho de estudar uma oferta para uma
edição de bolso do teu querido voragem na amazónia.

- adeus e mais uma vez obrigada - disse emma sem tirar os olhos do livro de misteriosa
capa negra, sem título nem nome de autor.
zara dirigiu-se para a porta. lá fora, já não conseguiu conter-se mais e chorou. só vacilou
um instante. depois, refez-se e encaminhou-se para o?carro.
emma abriu o livro negro. na primeira página, com letras muito pequeninas, aparecia o
nome do autor. com letra um pouco maior, surgia o título: poemas secretos. emma leu o
livro de poemas nessa mesma noite. o último era um conto enigmático:
outra vez
nada voltará a ser o mesmo entre nós dois.
mais outro véu se soltou. ler me-ás e nunca mais
a leitura voltará a ser apenas leitura.decifrar
a tatuagem da minha pele,desenvolver a palavra com
sua encarnação efazê-la retornar ao espirito nunca
mais voltará a ser apenas leitura; será também
cópula.
poderás ler-me sozinha ou diante dos outros
? poderás ler-me como um lento crescendo ou em
impulsos ritmicos,poderás ler-me do principio ao
fim ou escolher a página que te apetecer. poderás
ler-me de trás para diante ou de diante para
trás...mas o melhor de tudo é que,sempre que
desejares,poderás reler-me.
e nessa mesma noite,emma concluiu que valia a pena amar aquele homem durante toda a
vida.
giaacomo era um ser muito particular. transformava em notícias coisas inusitadas e contava
a emma como uma confidência que no tanque da casa de enna vira a flutuar os peixes muito
quietos ou então chegava tarde, não por causa do aguaceiro que caíra, mas porque se
entretivera a ver como caíam as gotas da chuva das folhas das árvores. giacomo era capaz
de contar com magia a preparação de uma simples receita culinária. surpreendia-a sempre.
de repente, falava de um país imaginário como se realmente existisse e tivesse de ir até lá
de viagem, como quando descrevia Última tule, país setentrional, muito para lá da grã-
bretanha, uma ilha onde se juntavam terra, ar e mar, que flutuava de forma indefinida, pelo
que os barcos não podiam atracar, sendo impossível pôr o pé em terra.
giacomo falava todas as línguas imagináveis. tocava violino, guitarra e piano. a guitarra e o
piano tocava-os para os outros, mas o violino só para ele. uma vez, emma deixou-se ficar
no jardim a ouvir aquele violino que sabia que se calaria se entrasse em casa.
"? giacomo pintava quadros de uma concepção
curiosíssima: eram sempre ilusões de óptica impossíveis na realidade; uma escada que
subia em espiral.
contudo,com os erros de perspectiva,ligava-a,formando um círculo.ou uma cascata de água
que caía num tanque de onde saía um riacho que depois da volta,subia e caía pela mesma
cascata,com o que se transformava num rio circular,em que a água subia. ou pintava um
quadro dentro do quadro que saía
da moldura e absorvia a ??realidade?? que o rodeava.?

então desenhava uma mão que desenhava outra mão; que por sua vez desenhava a primeira
.ou o mais enigmático de todos os seus quadros: um olho meio que fitava o espectador,mas
que no centro da pupila continha uma caveira.
a casa de giacomo estava cheia de quadros na pared,e da escada que dava para o piso
superior estava pintada uma varanda,por trás da qual se divisava uma paisagem balnear.em
todos os quartos havia pelo menos uma parede pintada como se não houvesse parede e
desse para o exterior.numa delas,pintara uma paisagem campestre,com uma aldeia ao fundo
da qual se distinguia claramente o campanário, com as suas cegonhas.noutro,estava
representado um frondoso bosque em que surgia um lago.noutro aparecia pintado um
assombroso país de fadas, bosques sombrios, lagos, um castelo fabuloso.noutra
parede,aparecia um jardim romântico com um labirinto de ciprestes.algumas portas estavam
pintadas como se estivessem abertas, de modo que não se podia evitar a sensação de ser
uma casa aberta, de uma casa encantada. por fora, pintara diversas janelas falsas que
mostravam por entre as ?cortinas uma parte do interior, como se por dentro houvesse um
jardim com um tanque de nenúfares.
três meses mais tarde, emma e giacomo casaram-se numa ilha dos mares do sul.
foram viver para casa de giacomo. conservaram a casa de emma para passarem uma
temporada. no primeiro dia, giacomo encontrou um passarinho de papel, não muito bem
dobrado, em que estava escrito o seguinte:
sedução
oaroma de umafruta desconhecida,um gesto
carinhoso, a insinuação de uma forma, a casual
exibição de pele branca e delicada em que transparece a brandura de uma carne marmórea,
atravessada porfrágeis veias azuladas; o delicioso perfume genital que já te chegou ao
olfacto que, glútão e curioso,procura o sabor que envolve a lingua que se move, acaricia;
provoca o brotar de um vapor, génio de prazer estonteante, um vapor de noite estrelada em
vertigem para o centro do universo que é o eixo das aspasformadas e pelos teus braços e
pernas.e não poder fugir ao ar,não poder soltar o corpo que te envolve como soltar os olhos
do fundo das outras pupilas e deixar se cair nelas e enredar-se nessas linhas cantadas pela
minha boca e tatuadas por ti na minha pele.
emma.
emma abraçou-o.
- É assim que me fazes sentir, giacomo.
- faço-te sentir assim?
abriu-lhe a blusa com ímpeto e de imediato assomaram os formosos seios que ele começou
a lamber, a mordiscar. emma ria às gargalhadas e soltava alegres guinchos. giacomo deitou-
a no chão, esticou-lhe as pernas e afastou-as. emma pontapeou fingindo resistência, mas ele
agarrou-a com mais força.
- vamos ver se é de verdade isso que sentes. emma procurou responder, mas giacomo
começou a brincar com o seu soco e quando lhe roçou o clítoris com a língua, emma ficou
definitivamente calada. já não era capaz de ligar as ideias, via faíscas.
- diz-me, emma, como te faço sentir?
- giacomo, és. . .
- o que sou eu?-És.:.
o que ele lhe fazia impedia-a de acabar a frase.
- vá, diz de uma vez só.

emma suspirou e por fim exclamou:


- És um canalha.
giacomo agarrou-a com fingida violência e fez amor com ela no chão daquele extravagante
estúdio.
o novo livro de emma,contos do impossivel amor,foi um novo êxito,embora desta vez os
críticos se mostrassem divididos.na segunda obra,tiveram tempo de se posicionar e de
militar a favor ou contra uma autora que se negava a participar em grupos mediáticos ou de
poder.mas emma arvorava a sua
independência face a todos eles.contos do impossivel
amor começou a ser traduzido noutros países,o que
exigiu a emma uma nova digressão de promoção
internacional.divertia-lhe viajar por todos aqueles
países,mais o contacto com o público na assinatura
de exemplares,a troca de palavras com os entrevistadores,os actos de apresentação em
lugares originais
(mosteiros,castelos),produto da imaginação de zara.
encontrava-se em praga quando teve um sonho
estranho,sobretudo porque nunca se recordava dos
? sonhos.sonhou que se perdera num bosque sombrio, que era perseguida,que junto de
uma fonte encontrou um anel,que quem a perseguia era um cavaleiro com uma armadura
negra,montado num
cavalo negro.o cavaleiro trazia um elmo prateado e
uma capa negra que se movia ao vento e disse-lhe: ??vem. sonhou que enfiou no dedo o
anel enfeitiçado para se proteger e que então o cavaleiro lhe disse: ??esse é o anel do amor.
e ela apaixonou-se perdidamente pelo cavaleiro negro. subiu para o seu cavalo. cavalgaram.
detiveram-se diante de um lago para se refrescar. quando se inclinou sobre a superficie do
lago e introduziu as mãos na água cristalina para beber, a água ficou-lhe com o anel.
enquanto o cavaleiro gritava não, a água do lago transformou-se em sangue vermelho e o
cavaleiro evaporou-se. emma, assustada, tentou descobrir o anel no fundo do lago, mas a
água era como um espelho ondulante impenetrável em que se via com o cabelo verde cor de
algas e os olhos vermelhos de sangue. e então, emma apaixonou-se perdidamente pelo lago
vermelho e já não conseguia afastar-se da margem, pois aquele anel continha o seu amor
enfeitiçado.
uma campainha começou a soar, mas ela procurou não deixar fugir aquele sonho que se
desfazia em farrapos ondulantes ao vento. emma encolheu-se e fechou os olhos com mais
força para tentar agarrá-lo, sem conseguir mais que sentir como se desfaziam os seus
andrajos por entre a sua mão fechada. emma deixou-se submergir numa indolente semi-
inconsciência, enquanto o incómodo zumbido da campainha lhe martelava o cérebro. por
fim, começou a subir a um nível mais consciente à procura do despertar e soltou-se da teia
tecida por aquele sonho.
localizou o som: era o telefone. consultou o relógio. eram duas e meia da madrugada. pegou
no auscultador.
- emma, emma, estás a ouvir-me?
era o david.
- david?
- sim, sou eu. sei que já é tarde, mas acho que é melhor voltares para casa.
- que se passa?
- É fredo; não se encontra bem.
emma sentiu um baque no coração.

- teve um enfarte e está no hospital.


- meu deus! meu deus! - sussurrou emma. o auscultador caiu-lhe das mãos. com lentidão,
voltou a pegar nele.
- mas está vivo, david? diz-me, david, está vivo? david só dizia:
- tens de regressar, emna, tens de regressar.
o nó que sentia na garganta apertou-se mais. emma conteve-se e disse num soluço:
- está bem, david, está bem, meu querido. vou no primeiro avião.
emma deixou-se ficar quieta, absorta a contemplar a janela. sentiu um mau gosto na boca.
mastigou gostosamente para procurar fazê-lo desaparecer. a pegajosa preguiça da
sonolência, inpediu-a de convencer os membros
adormecidos de que deviam pôr-se em movimento, pelo que se manteve encostada à cama,
como se fosse um gesto irremediável, o corpo dorido, prostrado como animal abatido.
o torpor do sonho ou talvez da súbita orfandade voltou a derrotá-la. ao fim de meia hora,
despertou sobressaltada mas mal conseguiu abrir os olhos e combater o adormecimento que
lhe dominava a mente. todos os sons lhe pareciam graves, surdos, distantes; nem sequer
engolindo saliva conseguia aclará-los. não obstante a diferença temporal entre o cérebro e o
corpo, o atraso com que os músculos lhe obedeciam, conseguiu aproximar-se da janela,
abri-la e respirar o odor da madrugada. deixou-se cair devagar no chão frio, apoiada de
costas à parede. assim passou, como uma imagem de pedra, o resto da noite, sem pensar em
nada, contemplando a branca parede fronteira, debilmente iluminada pelo resplendor da lua.
a luz da alvorada desfez o torpor que a dominava. atraída por aquela claridade límpida e
fria, ergueu-se devagar em direcção à janela aberta. viu a branca lua pintada no céu vazio
ainda cheio do profundo azul nocturno. as ruas solitárias ganhavam a aparência de um
sonho.
contudo, começava o amanhecer. as sombras cediam a pouco e pouco o lugar à claridade. o
interior sombrio do quarto de hotel pareceu-lhe então o interior de uma garganta, a janela
pareceu-lhe uma boca aberta num grito.
emma deixou-se cair sobre a cama. de vez em quando passava um carro que rugia vindo do
nada em direcção ao nada. os verdes olhos de emma pareciam precipícios de pupilas
emigradas, emma refugiou-se na solidão,alheou-se do mundo,dos amigos,do próprio
giacomo que compreendia muito bem a sua necessidade de ficar sozinha.decidiu-se apenas
a ser,sem tentar compreender o sentido das coisas.onde vivia de verdade era em seus
romances,neles tudo era controlável,tudo
mais fácil.a vida real era demasiado dura.
giacomo também se foi retraindo.refugiou-se
no conhecimento porque ele,sim,necessitava de dar
sentido ao mundo. cada vez passava mais
tempo fechado no seu gabinete, a pintar, a escrever, sobretudo a estudar os mistérios da
cabala e da alcquimia. viam-se pouco,cada um encerrado em sua casa. giacomo emagreceu
notoriamente.uma tosse esporádica foi-se convertendo em tosse constante, nenhum dos dois
lhe deu a menor atenção.
um dia,emma viu giacomo, que lhe pareceu
desconhecido. estava macilento,com uma barba
de vários dias.

- que está a passar-se connosco, giacomo? - perguntou-lhe.


giacomo estava à sua frente perdido no vazio, com o olhar perdido. tossiu, pigarreou e
respondeu:
- como dizes no teu romance, silenciosos muros
de nada encerram-nos?,.
fitaram-se em silêncio abriram os lábios e
fecharam-nos, para não pronunciarem palavra. em silêncio afastaram-se.
a solidão é uma doença congénita do ser humano
contra a qual não existe cura. temos apenas algum alívio. a beleza, a amizade, o amor, o
suicidio. .
quando regressou à casa do mar, decidiu pôr a correspondência em ordem. havia uma carta
diferente. cheirou-a. cheirava a selva.
vi o teu nome num livro de uma livraria de manaus e comprei-o. e li-o. emocionei-me. creio
que te tornaste u ma escritora famosa. alegro-me. merece-lo. com a leitura, recordei muitas
coisas. fui um estúpido.
perdi a mulher que amava na mesma noite em que
gozei com nunca havia gozado com outro corpo. a tua vingança foi doce. desde então, não
consegui preencher o meu vazio e choro-te todos os dias, apesar de já se terem passado três
anos. os indigenas chamam-me ??saudade". diz o bruxo que éporque na minha alma chove
todos os dias. acho que depois de ter tocado o céu com as mãos e depois de o ter perdido,
um homem esquece a alegria. desejo-te as maiores felicidades e que recordes que te amarei
para sempre.
hector
emma leu a carta. escondeu-a. nessa noite, voltou a sonhar com o cavaleiro negro e o lago
vermelho. o
que mais a desesperava era ver-se eternamente na
margem do lago vermelho, o seu amor cativo, amarrado no fundo das águas.
giacomo estava sentado diante do quadro que andava a pintar: um cavalo de corpo branco,
cabeça vermelha e olhos azuis, com uma mancha sanguinária na testa, dobra as patas
dianteiras para beber " num lago de águas cristalinas e provoca ondas na superficie. a seu
lado, um chifre de unicórnio com
sangue na base, no fundo do lago uma donzela de
roupas etéreas a dormir com um anel no dedo anelar
da mão direita. giacomo pegou na paleta de cores e
mergulhou o pincel no vermelho. tossiu uma, duas
três vezes e expulsou o primeiro escarro de sangue.
o médico obrigou-o a sujeitar-se a um exame completo. o diagnóstico foi-lhe dado ao fim
de poucas semanas. agora, estava a voltar a lê-lo, talvez para ter a certeza de algo que lhe
parecia tão distante. no final dos resultados, indicava-se a conclusão: ??tumor cancerígeno
pulmonar". giacomo leu-o várias vezes. expeliu o fumo pelo nariz e apagou o cigarro,
esmagando-o no cinzeiro. não disse nada a ninguém.
giacomo decidiu ocultar a informação médica na biblioteca, dentro de um livro. atrás do
livro surgiram umas cartas. cheiravam a selva. tão-pouco disse nada a ninguém, mas,
curioso, pegou nelas e leu-as.
na tiragem seguinte de correio, giacomo procurou uma carta com cheiro a selva e
descobriu-a. antes que emma a recebesse e a lesse. depois, giacomo foi buscá-la à
biblioteca e leu-a:

emma querida. preciso de te ver. tens de vir. aqui, poderás esquecer e viver e poderei amar-
te. preciso de te amar. porfavor vem depressa.
a nossa organização está a exercer um saudável efeito na prevenção de doenças nos
indigenas. precisamos de ter grande cuidado para não induzir novas doenças. contudo, as
desgraças não cessam. sabemos de uma zona secreta da selva, grande como um país,
chamada cuiabá, para a qual estão a atrair gente pobre necessitada, com promessas de
grandes rendimentos. quando chegam a cuiabá, isolada em plena selva, convertem-nos em
escravos. utilizam-nos no derrube de árvores para uma fábrica de papel que construíram ali
mesmo. parece que háenvolvimento governamental. patrulham as fronteiras com uma
policia paramilitar de quem contam coisas espantosas. nos próximos dias procuraremos
tirar algumasfotos do lugar e dos escravos, para denunciar o assunto.
quero ver-te depressa. na próxima carta, comtar-te-ei em que datas posso estar em manaus
para te receber.
um beijo.
hector.
emma comentou com giacomo que teria de promover o seu último romance no brasil e que
provavelmente a viagem seria dentro de dois meses. giacomo não disse nada.
algo a impelia até à amazónia. tinha de ir. pressentia que ali poderia voltar a sentir-se viva.
ao fim de um mês, chegou um carteiro com uma carta registada. emma não estava e
giacomo assinou o aviso de recepção. vinha do brasil, mas trazia o logótipo da organização
não governamental saúde e vida. parecia oficial. uma estranha intuição levou giacomo a
abri-la. dirigiu-se ao seu gabinete. leu-a. ergueu os olhos e fitou a janela e ali ficou um bom
pedaço a contemplar o infinito.
emma já não recebeu mais cartas com cheiro a selva. esperava com impaciência a carta
seguinte, mas ela não chegava e começou a mostrar inquietude, que acalmava com passeios
junto ao mar. decidiu enviar várias cartas, mas não recebeu resposta alguma. resolveu
comprar o bilhete de avião e informou giacomo que apenas respondeu com um gesto de
assen timento.
giacomo empreendeu uma actividade febril, escrevia a todas as horas. enviou unì embrulho
a um grafólogo. duas semanas mais tarde, este remeteu-lhe um embrulho similar.
no dia em que devia partir para o brasil, emma saiu pela manhã a fazer compras. zara
acompanhou-a. precisava de vestuário apropriado e esquecera-se de algumas coisas. quando
terminaram as compras, zara foi preparar as malas. mais tarde, passaria em casa de emma
para irem para o aeroporto. o voo saía à ùma da tarde. quando emma chegou a casa
descobriu na caixa de correio um sobrescrito com aroma especial. abriu-o e do seu interior
caiu uma orquídea seca e uma carta. reconheceu a letra de hector. leu- a.
quem sabe o que é viver à beira do desespero e enfrentar dia a dia a morte e amar acima de
tudo. quem sabe o que é utilizar em cada segundo os cinco sentidos?

conheço o valor do amor, vi como piranhas devoravam metade de um homem. passei


alvoradas maravilhosas e impressionantes. escutei o silêncio de milhares de seres, que
me?tavam com os seus olhos por entre a exuberante vegetação de odor doce, prestes a
fermentar. a música da selva de dia, tão diferente da música da selva de noite.
devias conhecer o sabor dos peixes do amazonas: o sabor do tambaqui, o sabor
do?lhot? o sab, do pirarucu. a vida aqui entra pelos cinco sentidos e, no entanto, sei que há
muito tempo que não estou junto de ti sem poder apreciar a beleza do mundo. aqui na selva
chove todos os dias, embora os meus vizinhos sejam todos indigenas e tu estejas a meio
mundo de distância, ponho sempre dois copos na minha mesa.
tem paciência. ainda não posso ir a manaus. escrevo-te depois.
um beijo.
hector
emma voltou a ler a carta que agitava sentimentos antigos no seu íntino.
- tornaste-te poeta, hector - disse emma. - será o amor que nos devolve a poesia?
zara chegou, preparada com as malas.
foi despedir-se de giacomo para partir para o aeroporto. bateu à porta do gabinete, fechada
como sempre nos últimos tempos. bateu sem que lhe respondessem. abriu a porta. giacomo
estava no chão com uma mancha de sangue junto da boca.
a ambulância não tardou a chegar e levaram- no para o hospital. um enorme
sentimento de culpa abateu-se sobre emma. giacomo doente e ela a fugir para ir ver um
antigo noivo.
? durante toda a madrugada estiveram à espera dos resultados das análises. david e zara
acompanhavam-na. não dormíram durante toda a noite. visitaram com frequência a
máquina de café da sala de espera, percorreram vez após vez os corredores para suportar a
espera.
Às primeiras horas da madrugada, a médica revelou-lhes o diagnóstico:
- minha senhora, considerámos a possibilidade de o seu marido poder sofrer de um tipo de
hemorragia interna leve, de alguma úlcera, mas as análises deram-nos uma má notícia.
parece que há já algum tempo que o seu marido sofria de cancro pulmonar bastante
difundido. o prognóstico é grave. procuraremos proporcionar-lhe um tratamento de choque,
mas não posso ocultar-lhe que as perspectivas não são boas. só lhe restam alguns meses
de vida, talvez dias.
quando conseguiu ver giacomo, este encontrava-se sedado. sentira umas dores terríveis que
apenas os calmantes puderam aliviar. esteve no quarto do hospital durante todo o dia sem
poder dormir. ao fim da tarde, passaram-lhe os efeitos dos calmantes, mas a dor continuou
sem parar e tiveram de voltar a aplicar-lhe drogas mais fortes. passou outro dia em que
emma não saiu de junto dele. por fim, david conseguiu convencê-la a ir para casa, pelo
menos para descansar e dormir um pouco.
quando emma voltou ao hospital, giacomo entrara em coma. o cancro estendera-se e
afectara outros órgãos vitais e giacomo consumia-se. emma mantinha-se constantemente de
guarda junto da sua cama. ouvia-o respirar, entubado, cada vez com maior dificuldade.
emma temia que cada momento fosse a sua última inspiração, pois por vezes era dificil para
o seu débil corpo a tarefa de respirar.
a médica revelou-lhe que há já algum tempo que
ele recebia tratamento médico, embora se tivesse negado a sujeitar-se à quimioterapia.
preferira uma morte rápida e discreta.

a sua agonia durou três dias.


aquela morte afectou-a de forma diferente. não foi capaz de verter uma lágrima. a tristeza
ficou presa dentro dela. ia umas horas à praia e apenas david ou zara conseguiam afastá-la
da visão das ondas. passaram-se muitos dias que foram como se não passassem, porque
todos os dias eram iguais para ela.
quando conseguiu entrar no gabinete, encontrou um pégaso feito de papel. teve dificuldade
em desdobrar o papel, tanto lhe tremiam os dedos. alisou as dobras com lentidão, com uma
profunda tristeza e pôde ler o último poema que giacomo lhe dedicara:
eu, que me afogava nas mulheres como onda no mar, sentirei na cama a falta do teu odor,
do teu cabelo, sentirei a falta de entrar em ti, sair da vida. o tempo do êxtase agora que sou
fim de sonhos derrubados. quando os meus olhos esquecerem a luz e for um pouco mais de
pó em todo o pó, quando a morte me soprar grão a grão entre os seus dedos, o silêncio
sobre mim, apenas silêncio, voltaremos a ver nos para nos amar, porque nós, emma,
estamos sós. . . até amarmos ou morrermos.
ca?belos ruivos como fogo e olhos verdes como algas, atraente como um abismo e
deslumbrante como uma montanha, emma contemplava o horizonte do mar como se o mar
conhecesse as respostas por que tanto ansiava.
a vida ausentou-se das veias de emma. sem fredo, sem giacomo, a existência tornara-se-lhe
demasiado pesada. david e zara mostravam-se muito prestáveis, mas emma estava rodeada
de muita ausência. nem sequer tinha forças para escrever.
pensou que talvez reanimasse se viajasse e fosse ver hector, mas hector só enviava cartas de
lugares cada vez mais distantes no interior da selva. contudo, cada vez se interessava menos
pelas coisas, pelo que apesar de tudo decidiu ir. sozinha.
um dia antes de sair, chegou um sobrescrito que continha uma orquídea seca e uma carta.
estamos agora na época das chuvas. chove todo o dia. É uma má época para os
seringueiros. estamos no mais profundo da selva, em rondónia.
ontem d noite, estivemos a pescar na companhia de botos vermelhos, os golfinhos dos rios
amazónicos. são animais inteligentissimos, muito respeitados pelos pescadores. têm um
corpo muito flexivel, que serpenteia por entre troncos e raízes quando as inundações
cíclicas invadem a selva, muito hábeis a perseguirem perxes. gostam muito de fazer
piruetas no rio. À volta do boto vermelho circulam inúmeras lendas. o botofascina as
mulheres e conquista-as. quando durante a noite alguma acorda e verifica que a sua hamaca
está a mexer-se, diz-se quefoi um boto que a visitou.
emma, não reparaste que numa destas noites acordaste com a sensação de alguém ter estado
ao teu lado? ah, emma, quem me dera ser o teu boto!
um beijo.
hector
emma preparou as malas e empreendeu a longa viagem. chegou a manaus e quis esperar ali
por hector. aproximou-se do barracão da organização saúde e vida, em que hector
trabalhava. encontrou marga ali a quem se dirigiu:
- olá, marga.

marga fitou-a e reconheceu-a, mas a surpresa deixou-a aturdida.


- emma, que fazes aquí?!
- vim ver hector - respondeu emma, com firmeza. - já sei que está no interior da selva, mas
gostava de saber se há alguma forma de comunicar com ele.
marga ficou a observá-la, como se não acreditasse no que estava a suceder.
- então não sabes? - perguntou ela, com as lágrimas a assomar-lhe aos olhos.
- não sei o quê?
- enviámos-te uma notificação oficial por correio registado. . como é possível que não a
tivesses recebido?
- de que estás a falar, marga?
marga sentou-se e pôs-se a chorar.
- que se passa, marga?
mas marga não conseguia falar.
uma voluntária da organização que emma já conhecia da outra vez em que ali estivera
aproximou-se de marga, afagou-lhe os cabelos e consolou-a. por fim, marga conseguiu
falar:
- o hector morreu.
emma despertou numa hamaca.
desmaiara. queria estar a sonhar, esquecer-se de tudo, ir-se embora, mas não foi capaz de
levantar-se. marga acalmou-a.
- não pode ser, não pode ser - disse enma.
- infelizmente, é verdade.
- mas como aconteceu?
- foi morto pelos paramilitares. desafiaram um proprietário que escravizava os índios.
- sim, ele falou-me disso numa carta. quando foi?
- há já uns três meses.
- três meses... É impossível - contrapôs emma.
- há três meses e uma semana.
- impossível. tenho estado a receber cartas dele depois disso. pouco antes de partir para
aqui, recebi uma
carta datada do mês passado.
- não pode ser, emma. reconhecemos o cadáver e
enterrámo-lo.
- então vê estas cartas.
marga consultou as datas.
- ainda estará vivo? não será tudo um equívoco?disse emma.
- olha, emma, não entendo que partida macabra é esta, mas garanto-te que ele morreu.
pergunta aos meus companheiros. a sílvia também reconheceu o cadáver.
- não compreendo nada. que pesadelo é este?murmurou emma, entre lágrimas.
- posso ler as cartas?
- sim, claro.
marga levou-as para fora, para junto do alpendre e leu-as atentamente até à última.
- emma, alguém falsificou estas cartas. não são de hector.
- o quê?
- são cartas muito bonitas e, perdoa que o diga, quase demasiado bonitas para hector, mas
não foi isso que me chamou a atenção. a letra parece de hector. contudo, há um erro que
denuncia o autor.

- qual?
- nesta última carta, diz que estamos na época das chuvas. ora, a época das chuvas terminou
este ano três semanas antes da data desta carta. quem a escreveu não vivia aqui.
emma regressou de avião. a cabeça era um torvelinho de especulações e emoções
contraditórias. quem poderia ter feito uma coisa daquelas?
telefonou ao investigador que zara contratara para averiguar quem era giacomo. expôs-lhe o
caso e entregou-lhe as cartas. e esperou.
o detective precisou de algumas semanas para esclarecer o assunto. um dia, chamou emma
para uma entrevista e disse-lhe:
- o melhor é consultar este perito grafólogo. ele explicar-lhe-á tudo.
e entregou-lhe um cartão de visita.
emma, intrigada, encontrou-se com o grafólogo.
era uma casa antiga, de pedra, de muros compridos. a parte inferior era um alfarrabista. ali
o pó acumulava-se dando um ar de antiguidade. o grafólogo era um idoso de barbas
compridas e brancas, de uma paciência oriental.
- entre, minha senhora, venha por aqui. há lugar para os dois.
levou-a à parte interior do estabelecimento. havia uma mesa muito velha, robusta. o idoso
convidou-a a sentar-se e depois sentou-se ele. em cima da mesa havia vários mapas antigos
e afastou-os.
emma deu-lhe as cartas, que o idoso recebeu com um sorriso, mirou-as e devolveu-as.
- eu próprio escrevi estas cartas.
emma empalideceu.
- mas, mas... não entendo nada. que partida é esta?
- acalme-se que eu explico-lhe tudo - respondeu o idoso. recostou-se na cadeira e começou
o seu relato:
- há muitos anos que conheço giacomo pombal.emma esbugalhou os olhos. - um dia,
chegou aqui com umas cartas que eu devia escrever a imitar a letra de outra pessoa.
garantiu-me que era para um bom fim, nada fraudulento e aceitei o encargo.
- giacomo!
- minha senhora, ele amava-a profundamente. disse-me que se alguma vez cá aparecesse
lhe desse esta outra carta.
estendeu-lhe uma carta oficial da organização não governamental saúde e vida.
emma leu a notificação do óbito de hector. ergueu-se lentamente, sentiu uma náusea e
voltou a sentar-se.
- preciso de ir aos lavabos.
ali, vomitou.
dirigiu-se à porta como um autómato, acompanhada pelo grafólogo que disse algumas
palavras de despedida que emma não escutou.
passou por uma farmácia. comprou um teste de gravidez.
quando regressou a casa, fez o teste. deu positivo.
emma dirigiu-se à praia e pôs-se a contemplar o mar durante horas a fio e chorou, chorou
frente às suas ondas, as ondas da paixão.
fim

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