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- É branca.
- Não, o Vado disse que conseguiu ver na sala de aula e é vermelha.
Alguém deu a idéia e foi assim que iniciaram a construção do túnel, todos os
dias a tarde, uma turma com cinco meninos, liderados por Tomate, traziam as
ferramentas e uma vela para a iluminação e partiam para a escavação. No interior
do túnel só podia trabalhar um menino de cada vez num revezamento, os outros
ficavam dando cobertura e retirando a terra.
O caminho que dava para a escola e que Cláudia utilizava, era uma trilha que
passava a uns cinco metros de um barranco e foi onde se começou a escavação. O
segredo sobre a escavação era total, se alguma menina ou um puxa-saco qualquer
avisasse a diretora todo o trabalho ficaria perdido.
O túnel foi construído com uma passagem estreita, só para uma pessoa
caminhar agachada, quase se arrastando, e no final, embaixo da trilha, foi
escavado um compartimento maior que dava para uns quatro meninos se
acomodarem, o teto deste compartimento ficou a 1,00 metro de profundidade, e no
teto se fez um pequeno buraco, na vertical, que servia de respiradouro ligando o
compartimento ao centro da trilha, o que exigiu diversas medições utilizando a
trena do pai de Vavá. Toda a obra demorou uma semana para ficar pronta.
- Calcinha de menina não tem graça, se eu quiser ver uma, levanto a saia
dela no recreio. - Decretou Tomate, como de fato já havia feito diversas vezes.
No dia seguinte lá vinha, inocente e pontualmente as 1:15 horas da tarde, a
professorinha caminhando pela trilha. Foram colocados galhos e pedras para guiá-
la diretamente por sobre o buraco, sem poder se desviar. A turma estava
posicionada ao longo do caminho para não dar nada errado. Algumas meninas
souberam e na última hora tentaram se aproximar para avisá-la e foram
impedidas à força.
Claudia começou achando estranho a quantidade e o olhar disfarçado dos
meninos ao redor do caminho.
- Devem estar aprontando algo, mas o quê?
Ficou ainda mais intrigada quando precisou dar um passo maior sobre um
buraco rodeado de pedras, que não existia no caminho, e da comemoração de
alguns meninos erguendo os braços para o ar num gesto de vitória e, então, seguiu
para a escola.
Todos os meninos correram para a boca do túnel, gritando:
- Mais uma!!! Mais uma!!!
Tomate estava ali, olhando para a Irmã Solange, se pudesse diria a ela que
não tinha visto suas calcinhas, apesar de que ele havia dito para todos, depois de
um acordo tácito com Vavá, que ela usava um cuecão parecido com o de um
homem.
Quando ela passou por sobre o buraco tudo ficou preto, escuro por causa de
sua roupa de freira e, então, não pode ver nada, apesar de ter feito o túnel para
isto, na realidade não era esta a sua intenção, nem previra que Irmã Solange
passaria sobre o mesmo, agora isto era o que menos importava, aquilo fora apenas
para fazer uma brincadeira, uma obra, uma construção, ter uma atividade, um
objetivo e um ponto de união de todos.
Mas não sabia falar tudo isso e se conformou, a expulsão lhe parecia algo
certo, impossível de ser impedido, pois quer fosse a sua mãe ou o seu pai a entrar
por aquela porta o fato ficaria consumado e pouco importava, já estava no último
ano do primário e pelo que ouvira falar em casa este seria o seu último ano de
estudo, e então, porque não antecipar um pouquinho.
Só não se sentia bem porque não queria ter magoado Irmão Solange,
gostava dela e nos anos em que estivera estudando ali, apesar de tudo o que ele
fizera, ela sempre lhe castigara merecidamente, sempre fora justa e até
demonstrara com ele, em algumas ocasiões um certo carinho, que ele sempre ficou
querendo retribuir mas não conseguira.
O pai de Tomate, seu Alcides era especialmente duro para com ele, a vida
era muito difícil, tinha um pedaço de terra próximo a cidade onde plantava um
pouco de tudo para vender e sempre o levava junto para trabalhar na preparação
da terra, limpeza com a enxada, pulverização e colheita. Fora daí o apelido de
Tomate, alguém o viu vendendo tomate de porta em porta e não teve dúvida,
colocou o nome que pegou na hora, ele era grande, forte, bruto e tinha a pele
avermelhada.
Quando alguém chegou na sua casa avisando que a diretora havia
mandado chamar alguém, Seu Alcides resolveu ir pessoalmente ver o que havia
acontecido com aquele malandro, por ser um homem simples que não sabia usar
palavras, ficou calado ouvindo o discurso da diretora, Irmã Solange, e concordou
na mesma hora com a punição, achando que seu filho deveria mesmo ser expulso
da escola. Daí desandou a falar.